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20/04/2020 16º Encontro Nacional da ABRAPSO - Reflexões sobre a história da Psicologia Social

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Sobre o evento
Comissões Reflexões sobre a história da Psicologia Social
Eixos temáticos Apresentação Oral em GT
Autor(es): Maria da Conceição Gomes da Silva (FATECI), Deyseane Maria Araújo Lima
Modalidades
Resumo: O trabalho traça uma breve história da psicologia social desde suas bases, sua solidificação na psicologia
Valores social cognitiva, a crise desencadeada pela sua inadequação à realidade dos países latino-americanos que resultou
Inscrição na busca de novos caminhos e sua superação na psicologia sócio histórica. O estudo bibliográfico refere-se às
Envio de resumos reflexões teóricas e práticas surgidas entre a psicologia social tradicional e a psicologia sócio histórica. Para esta
discussão fomos buscar nos estudos de Sílvia Lane, Ana Bock e Bader Sawaia, o aporte teórico para a
Perguntas frequentes
compreensão das causas que levaram a crise da psicologia social e os caminhos percorridos para a superação
Programação desta crise. Embora tenha bases européias a psicologia social se concretiza na América do Norte, quando da
Convidados migração de estudiosos alemães e austríacos. Daí, a fusão da fenomenologia e positivismo, ocasiona o surgimento
Notícias da Psicologia Social Cognitiva, centrada no estudo do comportamento (behaviorismo). A psicologia tradicional
atingiu seu auge quando da publicação do livro “O soldado americano” em 1949 que tratava da readaptação dos ex-
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combatentes da segunda Guerra Mundial. A psicologia social psicológica, centrada no indivíduo, sem levar em
Entre em Contato consideração o contexto social que o rodeava, foi importada diretamente da América para os países colonizados,
graças principalmente ao fato de renomados professores terem feito seus cursos de graduação nos Estados
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Unidos; exemplo disso, no caso do Brasil, foi Aroldo Rodrigues, o grande precursor da Psicologia Social Cognitiva
neste país. Nos anos 60, surge a Associação Latino Americana de Psicologia Social (ALAPSO). Em rechaço à
Busca Geral ALAPSO e na busca de uma psicologia com postura crítica que oferecesse resposta à realidade latino americana,
surgem os movimentos que resultariam na psicologia social sócio- histórica. Deste confronto, surgiu a chamada
“crise” que tomaria corpo nos congressos da Sociedade Interamericana de Psicologia (SIP) de 1976 e 1979. Desta
crise se originariam a Associação Venezuelana de Psicologia Social (AVEPSO) e Associação Brasileira de
Psicologia Social (ABRAPSO). Vários teóricos se empenharam em buscar novos rumos para a Psicologia,
destacando-se Martin-Baró, que convoca os psicólogos para a luta pela libertação dos povos, e Sílvia Lane que
buscou no materialismo histórico dialético as bases para uma psicologia social crítica que compreende o homem
como ser que interage no meio, transforma-o e é transformado por ele. Desta perspectiva surge a psicologia sócio-
histórica, que é voltada para a realidade brasileira, que encara o homem como ser histórico, portanto, produtor de
mudanças. Estudar a história da psicologia social, conhecer seus avanços, se constitui de fundamental importância
na revisão da atitude profissional dos psicólogos sociais que, de agente mantenedor da ordem, se transforma num
agente transformador da realidade, exercendo o papel libertador inerente à psicologia.

Texto completo: Reflexões sobre a história da Psicologia Social

Maria da Conceição Gomes da Silva


Deyseane Maria Araújo Lima

O trabalho traça uma breve história da psicologia social desde suas bases, sua solidificação na psicologia social
cognitiva, a crise desencadeada pela sua inadequação à realidade dos países latino-americanos que resultou na
busca de novos caminhos e sua superação na psicologia sócio histórica. O estudo bibliográfico refere-se às
reflexões teóricas e práticas surgidas entre a psicologia social tradicional e a Psicologia Sócio- Histórica. Para esta
discussão fomos buscar nos estudos de Sílvia Lane, Ana Bock e Bader Sawaia, o aporte teórico para a
compreensão das causas que levaram a crise da psicologia social e os caminhos percorridos para a superação
desta crise. Embora tenha bases européias a psicologia social se concretiza na América do Norte, quando da
migração de estudiosos alemães e austríacos. Daí, a fusão da fenomenologia e positivismo, ocasiona o surgimento
da Psicologia Social Cognitiva, centrada no estudo do comportamento (behaviorismo). A psicologia tradicional
atingiu seu auge quando da publicação do livro “O soldado americano” em 1949 que tratava da readaptação dos ex-
combatentes da segunda Guerra Mundial. A psicologia social psicológica, centrada no indivíduo, sem levar em
consideração o contexto social que o rodeava, foi importada diretamente da América para os países colonizados,
graças principalmente ao fato de renomados professores terem feito seus cursos de graduação nos Estados
Unidos; exemplo disso, no caso do Brasil, foi Aroldo Rodrigues, o grande precursor da Psicologia Social Cognitiva
neste país. Nos anos 60, surge a Associação Latino Americana de Psicologia Social (ALAPSO). Em rechaço à
ALAPSO e na busca de uma psicologia com postura crítica que oferecesse resposta à realidade latino americana,
surgem os movimentos que resultariam na psicologia social sócio- histórica. Deste confronto, surgiu a chamada
“crise” que tomaria corpo nos congressos da Sociedade Interamericana de Psicologia (SIP) de 1976 e 1979. Desta
crise se originariam a Associação Venezuelana de Psicologia Social (AVEPSO) e Associação Brasileira de
Psicologia Social (ABRAPSO). Vários teóricos se empenharam em buscar novos rumos para a Psicologia,
destacando-se Martin-Baró, que convoca os psicólogos para a luta pela libertação dos povos, e Sílvia Lane que
buscou no materialismo histórico dialético as bases para uma psicologia social crítica que compreende o homem
como ser que interage no meio, transforma-o e é transformado por ele. Desta perspectiva surge a psicologia sócio-
histórica, que é voltada para a realidade brasileira, que encara o homem como ser histórico, portanto, produtor de
mudanças. Estudar a história da psicologia social, conhecer seus avanços, se constitui de fundamental importância
na revisão da atitude profissional dos psicólogos sociais que, de agente mantenedor da ordem, se transforma num
agente transformador da realidade, exercendo o papel libertador inerente à psicologia.

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Introdução

Identifico-me com a humanidade como um todo. O que puder fazer em termos de humanidade, estou lá... se tudo o
que se faz em função de um bem comum é religioso, eu sou religiosa”. (Lane)
O presente trabalho tem como objetivo estudar a história da psicologia social desde suas bases europeias, seu
enraizamento nos Estados Unidos, a crise na América Latina e a superação na Psicologia Sócio-Histórica.
O estudo bibliográfico destinou-se a realizar reflexões práticas e teóricas surgidas entre a Psicologia Social
Tradicional e Psicologia Sócio-Histórica. Essas reflexões baseiam-se fundamentalmente, nos estudos teóricos e
práticos de Sílvia Lane, Bader Sawaia, Ana Bock, Martín-Baró e outros, na busca da compreensão das origens da
chamada crise da psicologia social e os caminhos percorridos na sua superação.
Esta crise tratava-se de contestação à psicologia tradicional, psicológica, com fortes elementos positivistas, de
caráter adaptacionista, que pretendia moldar o indivíduo à sociedade (LANE, 1989) apropriada aos objetivos dos
Estados Unidos do pós- segunda guerra, mas totalmente inadequada à realidade da América Latina e suas
especificidades histórico-culturais. Neste objetivo, elaborou-se em alguns países como El Salvador, propostas como
a de Martín-Baró (1996), de rever a prática profissional dos psicólogos. No Brasil, Sílvia Lane seria o expoente de
uma nova forma de pensar a psicologia, e através de aprofundamentos teóricos e práticos, desenvolveu a que mais
tarde viria a ser chamada de Psicologia Sócio-Histórica.
Acompanhando o pensamento de Lane (1989, p.19) de que “Toda a Psicologia é social”, consideramos de extrema
relevância este estudo no sentido de propor uma revisão na prática profissional do psicólogo, em busca de exercer
um “quefazer” (MARTÍN-BARÓ, 1996, p.7) que teria como ponto de partida “quebrar as cadeias de alienação”
(MARTÍN-BARÓ, 2009, p. 215) e exercer o papel libertador inerente à Psicologia.

1. A psicologia social norte americana: um instrumento de adequação do homem

Para traçarmos a história da psicologia social faz-se necessário que conheçamos seu percurso ao longo do tempo,
seus avanços, retrocessos e construções.
A psicologia social teve bases europeias, mas apresenta os seus fundamentos enraizados nos Estados Unidos, por
ocasião das migrações de cientistas gestaltistas da Áustria e da Alemanha expulsos pelo nazismo. Além da fusão
entre fenomenologia e positivismo, de que teria nascido a psicologia social cognitiva, afirma Farr (1996) apud
Bernardes (2010, p. 26): “os psicólogos sociais da América eram teóricos cognitivistas numa época em que estão
em moda, isto é, no auge do behaviorismo.”
A psicologia social experimental atingiu seu auge, com a publicação do livro “O soldado americano” em 1949, um
estudo sociológico referente ao período da guerra que trata da adequação dos soldados, bem como da eficácia dos
treinamentos sobre seu comportamento.
Esta psicologia pragmática, como enfatiza Lane (1989, p. 10), visava:
[…] alterar e/ ou criar atitudes interferir nas relações grupais para harmonizá-las e assim
garantir a produtividade do grupo - é uma atuação que se caracteriza pela euforia de uma intervenção que
minimizaria conflitos, tornando os homens ‘felizes’ reconstrutores da humanidade que acabava de sair da destruição
de uma II Guerra Mundial

É interessante ressaltar, nesta fase, os “handsbboks of social Psychology” de Murchison (1935), Lindzey (1954) e
Lindzey & Aronson (1968-1969; 1985). Nestes manuscritos, Lindsey afirma romper com a metafísica da psicologia
social européia e criar uma psicologia social científica, com bases positivistas.
Aqui chamamos a atenção para o que Bernardes denomina de concepções teóricas que se desdobraram ou que se
atravessaram na psicologia social: são as formas elencadas por Farr (1996): psicológica e sociológica. Na primeira,
as explicações do coletivo e do social são reduzidas a leis individuais. O indivíduo é o centro da análise, suas
relações com o contexto social não influem. Há uma separação entre o homem e o social. O que importa, neste
caso, é o comportamento do indivíduo (behaviorismo); na forma sociológica, os estudiosos valorizam a relação
entre o individual e o coletivo.
É exatamente esta psicologia social psicológica que se desenvolve na América do Norte, com o coroamento do
positivismo com seu caráter adaptador e lema de “ordem e progresso”, a naturalização dos fenômenos sociais e a
responsabilidade centrada no indivíduo isolado, como é ressaltado por Bernardes (2010, p. 27):
Seus princípios básicos nas explicações dos fenômenos sociais são: tratá-los como fenômenos naturais através de
métodos experimentais, sendo que seus moldes explicativos nos remetem sempre, em última instância, a
explicações centradas no indivíduo.

Referenciais teóricos como o de George Mead, que coloca o “estudo da linguagem e do pensamento humano
dentro de um contexto evolucionista” (BERNARDES, 2010, p. 29) e seu modelo de mente: “seu modelo de mente
era síntese de fenômenos tanto em nível coletivo quanto em nível individual” (BERNARDES, 2010, p. 29), foi
ignorado na constituição da Psicologia Social norte- americana.
Outra perspectiva deixada de lado foi a histórico-crítica, centrada nas ideias marxistas de ideologia, alienação e
consciência de classe, com objetivos de transformação. Constitui-se então uma psicologia ideologizada, de caráter
classista.

2. A crise na América Latina: busca de novos rumos

A condição de colonizado dos países latino-americanos levou a importação do modelo de psicologia social

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predominante na América do Norte, visto que segundo Farr (1996) apud Bernardes (2010), os renomados
professores de psicologia social na América Latina fizeram seus cursos de graduação nos Estados Unidos, exemplo
disso foi Aroldo Rodrigues, o grande representante da psicologia social cognitivista no Brasil. Nos anos de 1960
surge a Associação Latino - Americana de Psicologia Social (ALAPSO), criada nos preceitos da psicologia social
norte- americana.
Em rechaço à ALAPSO e procurando uma psicologia com postura crítica e adequada a realidade dos países latino-
americanos é que surgem os movimentos que resultariam na Psicologia social sócio-histórica. Esta reação à
psicologia tradicional e seus conceitos que não se aplicava à realidade latino-americana, levou à chamada “crise da
psicologia social”, é que tomou corpo nos Congressos da Sociedade Interamericana de Psicologia (SIP) em 1976,
em Miami nos Estados Unidos, e em Lima no Peru, em 1979. Segundo Bernardes (2010, p. 30):
Como pontos principais da crise da psicologia social, estavam a dependência teórica metodológica, principalmente
dos Estados Unidos, a descontextualização dos temas abordados, a simplificação e a superficialidade das análises
destes temas, a individualização do social na psicologia social, assim como a não preocupação política com as
relações sociais no país e na América Latina. A palavra de ordem era a transformação social.

Esta crise deu origem às associações como a Associação Venezuelana de Psicologia Social (AVEPSO) e a
Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO).
É oportuno ressaltar que a crise da psicologia social não era um acontecimento isolado da América Latina, na
Europa, já acontecia desde a década de 60 e onde, como ensina Guareschi (2007, p. 25) foi elaborado um
verdadeiro “Plano Marshal Acadêmico” para que a psicologia social nos moldes norte americano tivesse êxito.
Esta crise se atingiu seu auge principalmente na França, pois segundo Lane (1989, p.11)
Na França, a tradição psicanalítica é retomada com toda veemência após o movimento de 68 e sob sua ótica é feita
uma crítica à psicologia social- norte americano como uma ciência ideológica, reprodutora dos interesses da classe
dominante, e produto de condições históricas específicas, o que invalida a transposição tal e qual deste
conhecimento em outros países, em outras condições histórico-sociais. Esse movimento também tem suas
repercussões na Inglaterra, onde Israel e Täjfell analisam a crítica sob o ponto de vista epistemológico com os
diferentes pressupostos que embasam o conhecimento científico – é a crítica ao positivismo, que em nome da
objetividade perde o ser humano.

Moscovici torna-se um ícone dessa contestação vinda dos centros europeus, repudiando o caráter individualista da
psicologia social norte americana, e questionando sua capacidade de responder ao social, elabora a Teoria das
Representações Sociais visando “superar dicotomias, como entre o individual e o social, o externo e o interno, o
estruturante e o estruturado, o processo e a estruturação e, ao mesmo tempo, pudesse dar conta também de novos
contextos sociais.”(Guareschi, 2007, p. 25)
Voltando ao caso específico da América Latina, os estudiosos da Psicologia Social, trilharam novos caminhos
buscando uma prática de psicologia que atendesse à realidade latino-americana. Martim Baró, com seu texto, o
Papel do Psicólogo, convida os psicólogos à luta pela libertação dos povos, representando uma nova visão de
psicologia social para a América Latina.
A obra de Martin-Baró, se reveste de fundamental importância no estudo da Psicologia Sócio-Histórica, defendendo
uma psicologia específica para cada país, compreendendo suas diferenças culturais e visando a superação da
miséria dos povos excluídos. O posicionamento político de Martín-Baró, a práxis comprometida com os problemas
sociais latino-americanos, levou- o a elaborar a uma prática da psicologia cuja tarefa ele mesmo nos conta:
Há uma grande tarefa adiante se queremos que a Psicologia latino americana realize uma contribuição significativa
para a Psicologia universal e, sobretudo para a história de nossos povos. À luz da situação atual de opressão e fé,
de repressão e solidariedade, de fatalismo e lutas, que caracteriza os nossos povos, essa tarefa deve ser a de uma
Psicologia da Libertação. Mas uma Psicologia da Libertação requer uma libertação prévia da Psicologia e essa
libertação chegará apenas por meio de uma práxis comprometida com os sofrimentos e esperanças dos povos
latino- americanos. (MARTÍN-BARÓ, 2009, p.196)

No Brasil, na procura destes caminhos, surge uma figura extremamente importante para a constituição de uma
psicologia social que respondesse às necessidades brasileiras: Sílvia Lane, uma professora da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) que mudou os rumos da psicologia social. Em seu trabalho na
Universidade, Sílvia primou pela militância transformadora (SAWAIA, 2006, p. 91-92):
O contato com alunos sempre foi a grande paixão de Lane. Suas aulas eram um exercício lúdico de descoberta de
relações insuspeitas, de recriação de ideias, sempre com muito respeito e profundo conhecimento da teoria
analisada. Sua atuação como docente foi especial em 68, período da ditadura militar no Brasil. Ela participou
ativamente para transformar os campos de estágio, a pesquisa e a teórica em espaços de reflexão crítica e de
potencialização da ação transformadora, sem perder o rigor científico. Estabelecendo, assim, uma relação dialética
entre militância e pesquisa científica sem temer a vigilância do Ministério da Educação e Cultura, atento a qualquer
ação de resistência, dentro do clima de opressão que culminou, naquele ano, com o ato institucional nº 5, visando
sufocar todas as possibilidades de mudança.

Esta postura de Lane levou-a a ser criticada por Aroldo Rodrigues de apenas fazer política e não ciência, pois para
o grande representante da psicologia experimental, a psicologia social seria uma ciência “básica e neutra”
(RODRIGUES, 1986, apud SAWAIA, 2002; BOCK 2007). Como resposta Lane enfatizava a necessidade da
psicologia rever sua prática, “pois teoria e prática têm que vir juntas” (LANE, 1986, apud SAWAIA, 2002, BOCK,
2007, p.50)
Partindo do pressuposto de uma práxis transformadora, e em busca da superação da “crise” Sílvia Lane foi buscar
no marxismo as bases epistemológicas para um novo referencial para a psicologia social e com a compreensão do
homem como ser que interage no meio, transforma-o e revela o ser dialético descrito por Heráclito de Éfeso (540-
480 a.C,) nos tempos da Grécia Antiga quando dizia que um homem não toma banho no mesmo rio por duas vezes,
pois da segunda vez nem ele nem o rio serão a mesma pessoa (KONDER, 1987, p.8).
O materialismo dialético fornece o referencial “para construção do conhecimento que atenda à realidade social e ao
cotidiano de cada indivíduo e que permita uma intervenção efetiva na rede de relações sociais que define cada
indivíduo - objeto da Psicologia Social” (LANE, 1989, p. 16). Seguindo esta linha, Sílvia ancora-se na Teoria
Histórico Cultural da Mente, desenvolvida por Vygotsky, Leontiev e Luria, elaboram as categorias do psiquismo,
consciência, atividade, identidade, conceitos que alavancariam os estudos da psicologia social numa perspectiva

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crítica.
Nesta perspectiva, surge a psicologia sócio-histórica, baseada nas pesquisas e elaborações de conceitos de Sílvia
Lane, um trabalho feito em conjunto no qual, conforme Bock (2007, p.52) ressalta: “nos permite perceber a coerente
articulação entre suas proposições teóricas e práticas por meio da compreensão de duas importantes questões: a
dialética subjetividade-objetividade; e a formação e mudança de valores”.
A militância de Lane, suas viagens e contatos com estudiosos comprometidos com uma psicologia social
transformadora, que atendesse os anseios populares levaram à fundação da ABRAPSO e proporcionou a
discussão de forma mais ampla e como, Sawaia (2002) apud Bock (2007, p.51) nos conta sobre a fundação da
referida associação:
Segundo Sílvia, uma das principais realizações do encontro foi a de conscientizar os participantes psicólogos de
que suas perplexidades, percebidas até então como sentimentos individuais, eram compartilhados por cientista de
diversas áreas.

A partir desta conscientização surge uma psicologia voltada para a realidade brasileira, não uma psicologia que
como Lane (1989, p.12), ressalta, busque a objetividade nos moldes positivistas, mas compreenda o homem como
ser histórico, produtor de mudanças. E o papel do psicólogo social deixa de ser de um mantenedor da ordem e
passa a ser de um agente de transformação.

Considerações Finais

A psicologia sócio-histórica apresentada, como uma alternativa à psicologia norte- americana, rejeita a forma
individualista como a psicologia era conduzida e busca “alternativas metodológicas para se construir a base de uma
teoria consistente” (BOCK, 2007, p. 51) para compreensão da realidade. Caracteriza-se por um movimento
semelhante ao realizado por Florestan Fernandes sociologia que, para Ianni (1996, p.25) “descortina novos
horizontes para a reflexão teórica e a interpretação da realidade social [...]”.
A inquietação de Lane, sua convicção de que “o conhecimento produzido deveria ser útil para a transformação da
realidade na direção da criação de condições dignas de vida para todos” (BOCK, 2007, p.51), levou-a a se tornar
uma revolucionária nos estudos da psicologia social, na elaboração de uma práxis transformadora que seria
responsável pela deselitização da psicologia e construção de um compromisso ético-político para a profissão de
psicólogo.
Lane (1989) liberou a psicologia de seus fundamentos experimentais, de uma realidade estática, programada,
ideologizada e a colocou em contato com o “homem em movimento”, homem dialético, concreto, instável, subjetivo,
transformador da natureza e transformado por ela.
Trazendo à lume as categorias do psiquismo como consciência, atividade e identidade oferecem uma visão holística
do homem, os diversos ângulos constitutivos do ser social, o homem do “vir-a-ser” como ensina Ciampa (1998, p.
211): “o homem é um ator- e não um marionete-, ator que, já vimos, é participante ativo e solidário de uma produção
coletivamente realizada. Todos somos co- criadores [...]”
A compreensão do homem como criador de si mesmo, nos leva a questionar a existência de tanta miséria social ao
nosso redor, de tanta forma de vida que denuncia o descaso com o ser humano e refletir sobre o papel
conscientizador do psicólogo social como agente mediador de transformação de realidades sociais injustas. Este, a
nosso ver constitui-se objetivo primordial da profissão de psicólogo.

REFERÊNCIAS

BERNARDES. J. S., História. In STREY, M.N.e outros (organizadores) Psicologia Social Contemporânea.
Petrópolis, RJ: Vozes. 2010. P. 19-33.

BOCK, A.M.B.; FERREIRA, M. R., GONÇALVEZ, M.da G. M. & FURTADO, O. Sílvia Lane e o projeto do
"Compromisso Social da Psicologia”. Psicol. Soc., Porto Alegre, v. 19, 2007. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010271822007000500018&script=sci_arttext-> Acesso em 23/05/2011.

CIAMPA, A.C.. A estória do Severino e a história de Severina. Um ensaio de Psicologia Social. São Paulo:
Brasiliense. 1998.

GUARESCHI, P.A. Psicologia Social e Representações Sociais: Avanços e novas articulações. In VERONESE,
M.V.; GUARESCHI, P.A. (organizadores) Psicologia do Cotidiano. Petrópolis, RJ: Vozes. 2007.p.17-40

IANNI, Octávio. A Sociologia de Florestan Fernandes. Estud. av. [online]. 1996, vol.10, n.26, p.25-33. Disponível em
http://www.scielo.br/pdf/ea/v10n26/v10n26a06.pdf. Acesso: 12 de outubro de 2011.

KONDER, L. O que é dialética. Coleção Primeiros Passos. Rio de Janeiro: Brasiliense, 1987.

LANE, S. M. T. & CODO, W (Orgs.) Psicologia Social: O homem em movimento. São Paulo: Brasiliense, 1989.

MARTIN-BARÓ, I. O papel do Psicólogo. Estudos de Psicologia, 2(1), 7-27, 1996.

________________. Para uma psicologia da libertação. In: GUZZO, Raquel S.L... LACERDA JÚNIOR, Fernando.
Campinas (organizadores)Psicologia Social para a América Latina: o resgate da Psicologia da Libertação .São
Paulo. Alínea, 2009.

RODRIGUES, A. Psicologia Social. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.

SAWAIA, B. Sílvia Lane: a psicóloga da ação política. Mnemosine, v. 2, nº 1, p. 87-97, 2006. Disponível
http://www.mnemosine.cjb.net/mnemo/index.php/mnemo/article/view/205/314>. Acesso: 21 de maio de 2011.

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