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SOBRE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

DA PESSOA HUMANA
  

1. INTRODUÇÃO

O tema Direitos Humanos tem sido, na atualidade, objeto de inúmeros debates. Muito
embora, há vários séculos, os homens tenham consciência de que a pessoa humana tem
direitos fundamentais, cujo respeito é indispensável para a sobrevivência do indivíduo
em condições dignas e compatíveis com sua natureza.
Esses direitos fundamentais nascem com o indivíduo e, por isso, não podem ser
considerados como uma concessão do Estado. É por essa razão que, no preâmbulo da
Declaração Universal dos Direitos do Homem (ONU-1948), não se diz que tais direitos
são outorgados ou mesmo reconhecidos, preferindo-se dizer que eles são proclamados,
numa clara afirmação de que eles pré existem a todas as instituições políticas e sociais,
não podendo, assim, ser retirados ou restringidos por essas instituições. Essa
Proclamação dos Direitos Fundamentais da Pessoa Humana torna claro que as
instituições governamentais devem proteger tais direitos contra qualquer ofensa.
Cada pessoa, portanto, deve ter a possibilidade de exigir que a sociedade e todas as
demais pessoas respeitem sua dignidade e garantam os meios de atendimento das suas
necessidades básicas.
Quais seriam estes Direitos Fundamentais, esses Direitos Humanos? A evolução
histórica e a experiência jurídica é que ditam o conteúdo desses direitos nos aspectos
civis, políticos, econômicos, sociais, culturais, etc.
Os direitos humanos assumem uma posição bidimensional ao constituírem, por um lado,
um ideal a atingir: o ideal da conciliação entre os direitos do indivíduo e os da
sociedade; e, por outro lado, por assegurarem um  campo legítimo para o embate
democrático em oposição ao totalitarismo, negação de qualquer direito.
No entender do ilustre Professor J.J.Gomes Canotilho, as expressões “direitos do
homem” e “direitos fundamentais” são freqüentemente utilizadas como sinônimas.
Segundo a sua origem e significado, poder-se-iam distingui-las da seguinte maneira:
direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos
(dimensão jusnaturalista-universalista) e direitos fundamentais, que são os direitos do
homem jurídico-institucionalizadamente garantidos. Os direitos do homem adviriam da
própria natureza humana e daí o seu caráter inviolável, intemporal e universal; os
direitos fundamentais seriam os direitos objetivamente vigentes em uma ordem jurídica
concreta.
Os direitos fundamentais cumprem a função de direitos de defesa dos cidadãos sob uma
dupla perspectiva:
§         Constituem, num plano jurídico-objetivo, normas de competência
para os poderes públicos, proibindo, fundamentalmente, as
ingerências destes na esfera jurídico-individual;
§         Implicam, num plano jurídico-subjetivo, o poder de exercer
positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de
exigir omissões dos poderes públicos, de forma a evitar agressões
lesivas por parte dos mesmos (liberdade negativa).
Portanto, o estudo dos direitos do homem leva a fixar as circunstâncias concretas e
históricas de seu difícil reconhecimento e sua polêmica inserção no cotidiano dos
indivíduos e dos povos.
Para estudo e análise do tema ora proposto, a posição dos ilustres autores Norberto
Bobbio, Cançado Trindade, Celso Lafer e os constitucionalistas Gomes Canotilho e
Paulo Bonavides constituem o marco teórico desta dissertação.
O ponto central da questão dos direitos humanos, sobretudo no âmbito do terceiro
mundo, concentra-se na efetividade dos mecanismos internos e internacionais de
implantação desses direitos e no papel dos Estados e das Organizações não
Governamentais (ONG’s).
No relatório da ONU-1993 sobre o Desenvolvimento Humano recomenda-se que as
pessoas sejam o sujeito de toda a produção tecnológica, econômica e política. Já
Aristóteles ensinava que “a política rege todas as artes e ciências porque ela detém a
visão global daquilo que convém produzir para o bem de todos os cidadãos”. Coincide,
de certa maneira, a posição do grande filósofo, com as medidas sugeridas pela ONU,
abaixo mencionadas:
§         Reorientação dos mercados que sirvam às pessoas e não pessoas
aos mercados;
§         Desenvolvimento e investimento em novos modelos de
desenvolvimento centrados na pessoa humana e sustentáveis
ecologicamente;
§         Enfoque na cooperação internacional nas necessidades humanas e
não nas prioridades dos Estados;
§         Desenvolvimento de novos padrões de administração global e
nacional, com maior descentralização e possibilitando maior
autoridade aos governos locais.
Os Direitos Humanos têm um lugar considerável na consciência política e jurídica
contemporânea. Implicam, com efeito, um estado de direito e o respeito das liberdades
fundamentais sobre as quais repousa toda democracia.
 

2. A VIDA COMO VALOR SUPREMO DO SER HUMANO

“Não está em saber quais, quantos são


esses direitos, qual a sua natureza e o seu
fundamento, se são direitos naturais ou
históricos, absolutos ou relativos; mas sim
qual é o modo mais seguro para garanti-los,
para impedir que, apesar das solenes
declarações, eles sejam continuamente
violados”.

O direito humano à vida compreende um “princípio substantivo” em virtude do qual


todo ser humano tem como direito inalienável a que sua vida seja respeitada; e um
“princípio processual”, segundo o qual nenhum ser humano haverá de ser privado
arbitrariamente de sua vida.
O direito à vida é básico ou fundamental porque “o gozo do direito à vida é uma
condição necessária do gozo de todos os demais direitos humanos”.
Tomado em sua dimensão ampla e própria, o direito fundamental à vida compreende o
direito de todo ser humano de não ser privado de sua vida e o direito de todo ser
humano de dispor dos meios apropriados de subsistência e de um padrão de vida
decente (preservação da vida, direito de viver). Como bem assinalado por F.Przetacznik,
“o primeiro pertence à área dos direitos civis e políticos; o segundo, à dos direitos
econômicos, sociais e culturais”.
Em suma, o direito fundamental à vida pertence, a um tempo, ao domínio dos direitos
civis e políticos e, em outro, ao dos direitos econômicos, sociais e culturais.
Ilustram assim, a indivisibilidade de todos os direitos humanos.
A atual doutrina internacional dos direitos humanos efetivamente se inclina no sentido
de aproximar o direito à vida em sua ampla dimensão do direito de viver.
 
3. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
 
Como princípio da “dignidade humana” entende-se a exigência enunciada por Kant
como segunda fórmula do imperativo categórico: “Age de forma que trates a
humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre também
como um fim e nunca unicamente como um meio”.
Esse imperativo estabelece, na verdade, que todo homem, aliás, todo ser racional, como
fim em si mesmo, possui um valor não relativo, mas intrínseco, isto é, a dignidade.
Substancialmente, a dignidade de um ser racional consiste no fato de que ele “não
obedece a nenhuma lei que não seja também instituída por ele mesmo”. A moralidade,
como condição dessa autonomia legislativa, é, portanto, a condição da dignidade do
homem; e moralidade e humanidade são as únicas coisas que não têm preço.
A filosofia Kantiana mostra que o homem, como ser racional, existe como fim em si e
não simplesmente como meio. Os seres racionais estão submetidos à lei segundo a qual
cada um deles jamais se trate a si mesmo ou aos outros simplesmente como meio, mas
sempre e simultaneamente como fins em si.
Isso, em suma, quer dizer que só o ser humano, o ser racional, é pessoa.
Todo ser humano, sem distinção, é pessoa, ou seja, um ser espiritual, que é, ao mesmo
tempo, fonte e imputação de todos os valores.
A dignidade é atributo intrínseco da essência da pessoa humana, único ser que
compreende um valor interno, superior a qualquer preço, que não admite substituição
equivalente.
A dignidade da pessoa humana não é uma criação constitucional, pois é um desses
conceitos a priori, um dado preexistente a toda experiência especulativa, tal como a
própria pessoa humana.
A Constituição, reconhecendo a sua existência e a sua eminência, transformou-a num
valor supremo da ordem jurídica quando a declara como um dos fundamentos da
República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito. Convém
ressaltar que não se trata de um princípio constitucional fundamental. Esclarece o
eminente Professor Afonso da Silva que, a partir da promulgação da Constituição de
1988, a doutrina passou a tentar enquadrar tudo nesse conceito, sem atentar que ele é
um conceito que se refere apenas à estruturação do ordenamento jurídico.
 

4. O VALOR DA PESSOA HUMANA E O RECONHECIMENTO DOS


DIREITOS HUMANOS

 
O valor da pessoa, enquanto conquista histórico-axiológica, encontra a sua expressão
jurídica nos direitos fundamentais do homem. É por essa razão que a análise da ruptura
– o hiato entre o passado e o futuro, produzido pelo esfacelamento dos padrões da
tradição ocidental – passa por uma análise da crise dos direitos humanos, que permitiu o
“estado de natureza”, e não é um fenômeno externo, mas interno à nossa civilização,
geradora de selvageria, que tornou homens sem lugar no mundo.
Afirma Miguel Reale que, se o homem, em dado momento de sua história, adquire
consciência de seu próprio valor como pessoa, é sinal que nele havia a priori a condição
de possibilidade da aquisição desse valor, o qual, uma vez adquirido, se apresenta como
uma invariante axiológica. É a luz desse entendimento, que corresponde a um
“historicismo axiológico”, que apresenta a pessoa como valor-fonte do Direito.
Chama a atenção ainda o fato de que o conceito histórico-axiológico de pessoa não
resulta de uma fusão entre o ser e o dever ser – consoante ocorre na teoria hegeliana -
mas sim de sua correlação ou complementaridade – de tal modo que o que é põe o que
deve ser e vice-versa, mantendo-se, porém, distintos, numa dialética essencial de
polaridade. É a razão pela qual não deve prevalecer nem o aspecto subjetivo ou
individual, nem o aspecto objetivo ou social do homem, na idéia de pessoa, pois ambos
se exigem recíproca e completamente.
O conceito de Direitos do Homem encontra-se estritamente vinculado ao conceito de
Direito Subjetivo que, compreendido como os direitos inerentes ao indivíduo,
originados na tradição européia, são uma descoberta relativamente recente no
pensamento jurídico ocidental.
Com a declaração da independência dos Estados Unidos, consagra-se a vinculação entre
direitos subjetivos universais inerentes ao indivíduo e liberdade, considerada como um
direito tão primordial como o direito à vida e o direito à busca de felicidade.
As diferentes Declarações posteriores retomaram, com variações, este tema, até que,
com a DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO, de 28 de
agosto de 1789, a própria liberdade, em nome dos alienáveis e sagrados direitos naturais
do homem, passa a ser considerada como uma faculdade, a liberdade de poder fazer
tudo que não incomoda o outro.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 configurou-se como a primeira
resposta jurídica da comunidade internacional ao fato de que o direito “ex parte
populi” de todo ser humano à hospitalidade universal (apontado por Kant no terceiro
artigo definitivo do seu Projeto de Paz Perpétua) só começaria a viabilizar-se se “o
direito a ter direitos” (para falar como Hannah Arendt) tivesse uma tutela internacional
homologadora do ponto de vista da humanidade.
No mundo contemporâneo continuam a persistir situações sociais, políticas e
econômicas que contribuem para tornar os homens supérfluos e, portanto, sem lugar no
mundo.
O totalitarismo representa uma proposta de organização da sociedade que almeja a
dominação total dos indivíduos. Trata-se, em verdade, de um regime que não se
confunde nem com a tirania, nem com o despotismo, nem com as diversas modalidades
de autoritarismo, pois se esforça por eliminar, de maneira historicamente inédita, a
própria espontaneidade – a mais genética e elementar manifestação da liberdade
humana.
O “tudo é possível”, na dinâmica do totalitarismo, parte do pressuposto de que os seres
humanos são supérfluos. Tal pressuposto contesta a afirmação Kantiana de que o
homem, e apenas ele, não pode ser empregado como um meio para a realização de um
fim, pois é fim de si mesmo, uma vez que, apesar do caráter profano de cada indivíduo,
ele é sagrado, já que na sua pessoa pulsa a humanidade.
A tese de que os indivíduos não têm “direitos”, mas apenas “deveres” em relação à
coletividade, na medida em que estes deveres são estipulados “ex parte principis”, sem
um controle e uma participação de cunho democrático dos governados, levou, no
totalitarismo, à negação do valor da pessoa humana enquanto “valor-fonte” da ordem
jurídica. Ora, este “valor-fonte” da tradição, que afirma a dignidade do homem graças à
“invenção dos direitos humanos” na interação histórica entre governantes e governados,
teve e continua tendo como função, na perspectiva “ex parte populi”, servir de ponto de
apoio para as reivindicações dos desprivilegiados. No totalitarismo isto não ocorreu,
pois os indivíduos foram vistos como supérfluos pelos governantes.
O direito subjetivo é uma figura jurídica afim com a dos direitos do homem e da
personalidade, todos representativos, no seu desenvolvimento teórico, do
individualismo.
No jusmaterialismo, que inspirou o constitucionalismo, os direitos do homem eram
vistos como direitos inatos e tidos como verdade evidente a compelir a mente. Por isso,
dispensavam, tanto a violência, quanto a persuasão e o argumento.
Com a proclamação dos direitos do homem, a fonte da lei passa a ser o homem e não
mais o comando de Deus ou os costumes. De fato, para o homem emancipado e isolado
em sociedades crescentemente secularizadas, as Declarações de Direitos representavam
um anseio muito compreensível de proteção, pois os indivíduos não se sentiam mais
seguros de sua igualdade diante de Deus, no plano espiritual e no plano temporal, no
âmbito dos “estamentos” ou ordens das quais se originavam.
Segundo Bobbio, a Declaração Universal “contém em germe”: a síntese de um
movimento dialético, que começa pela universalidade abstrata dos direitos naturais,
transfigura-se na particularidade concreta dos direitos positivos e termina na
universalidade, não mais abstrata, mas também concreta, dos direitos positivos
universais.
A Declaração é algo mais do que um sistema doutrinário, porém algo menos do que um
sistema de normas jurídicas. Uma remissão às normas jurídicas existe, mas está contida
num juízo hipotético. A Declaração proclama os princípios de que se faz, não como
normas jurídicas, mas como “ideal comum a ser alcançado por todos os povos e por
todas as nações”.
Quando os direitos do homem eram considerados unicamente como direitos naturais, a
única defesa possível contra a sua violação pelo Estado era um direito igualmente
natural, o chamado direito de resistência. Mais tarde, nas constituições que
reconheceram a proteção jurídica de alguns desses direitos, o direito natural de
resistência transformou-se no direito positivo de promover uma ação judicial contra os
próprios órgãos do Estado.
Sabe-se hoje que os direitos humanos são o produto, não da natureza, mas da civilização
humana. Enquanto direitos históricos, eles são mutáveis, ou seja, suscetíveis de
transformação e de ampliação. Hobbes, por exemplo, conhecia apenas o direito à vida.
O desenvolvimento dos direitos do homem passou por três fases: num primeiro
momento, afirmava-se os direitos de liberdade, isto é, todos aqueles direitos que tendem
a limitar o poder do Estado e a reservar para o indivíduo, ou para os grupos particulares,
uma esfera de liberdade em relação ao Estado; num segundo momento, foram
propugnados os direitos políticos, os quais, concebendo a liberdade não apenas
negativamente, como não impedimento, mas positivamente, como autonomia – tiveram
como conseqüência a participação cada vez mais ampla, generalizada e freqüente dos
membros de uma comunidade no poder político (ou liberdade no Estado); num terceiro
momento, foram proclamados os direitos sociais, que expressam o amadurecimento de
novas exigências – de novos valores – como os do bem-estar e da igualdade, não apenas
formal, e que poder-se-á chamar de liberdade através ou por meio do Estado.
A Declaração Universal representa a consciência histórica que a humanidade tem dos
próprios valores fundamentais na segunda metade do século XX. É uma síntese do
passado e uma inspiração para o futuro: mas suas tábuas não foram gravadas de uma
vez para sempre.
 
5. AS GERAÇÕES NOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
 
Do ponto de vista teórico, pautado por novos argumentos, Bobbio afirma que os direitos
do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos
em certas circunstâncias caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades, contra
velhos poderes e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez. Nascem quando
devem ou podem nascer.
Nascem quando o aumento do poder do homem sobre o homem – que acompanha
inevitavelmente o progresso técnico, isto é, o progresso da capacidade do homem de
dominar a natureza e os outros homens – ou cria novas ameaças à liberdade do
indivíduo.
Os direitos fundamentais passaram, na ordem institucional, a manifestar-se em três
gerações. E, mais ainda, os direitos de quatro gerações:
 
§            Os direitos da primeira geração são os direitos da liberdade, os primeiros a
constarem do instrumento normativo constitucional, a saber, os direitos civis e
políticos, que, em grande parte, correspondem, por um prisma histórico, àquela fase
inaugural do constitucionalismo do Ocidente.
Os direitos da primeira geração – os direitos de liberdade – têm por titular o
indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da
pessoa e ostentam uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são
direitos de resistência ou de oposição perante o Estado.
Os direitos da primeira geração – direitos civis e políticos – já se consolidaram em
sua projeção de universalidade formal, não havendo Constituição digna desse nome
que os não reconheça em toda a extensão.
 
§            Os direitos da segunda geração dominam o século XX. São os direitos sociais,
culturais e econômicos, bem como os direitos coletivos ou de coletividades,
introduzidos no constitucionalismo das distintas formas de Estado social, depois que
germinaram por obra da ideologia e da reflexão antiliberal deste século.
Da mesma maneira que os da primeira geração, esses direitos foram, inicialmente,
objeto de uma formulação especulativa, em esferas filosóficas e políticas de
acentuado cunho ideológico; uma vez proclamados nas Declarações solenes das
Constituições marxistas e também, de maneira clássica, no constitucionalismo da
social-democracia (a de Weimar, sobretudo), dominaram por inteiro as
Constituições do segundo pós-guerra.
Os direitos fundamentais da segunda geração tendem a tornar-se tão justificáveis
quanto os da primeira. Até então, em quase todos os sistemas jurídicos, prevalecia a
noção de que apenas os direitos da liberdade eram de aplicabilidade imediata, ao
passo que os direitos sociais tinham aplicabilidade mediata, por via do legislador.
Com a introdução dos direitos fundamentais da segunda geração, cresceu o juízo de
que esses direitos representam, de certo modo, uma ordem de valores.
De acordo com a nova teorização dos direitos fundamentais, as prescrições desses
direitos são também direitos objetivos e isso levou, segundo Carl Schmitt, à
superação daquela distinção material entre as duas partes básicas da Constituição,
em que os direitos fundamentais eram direitos públicos subjetivos, ao passo que as
disposições organizatórias constituíam unicamente direito objetivo.
A concepção de objetividade e de valores, relativamente aos direitos fundamentais,
fez com que o princípio da igualdade, tanto quanto o da liberdade, tomasse também
um sentido novo, deixando de ser mero direito individual, que demanda tratamento
igual e uniforme, para assumir, conforme demonstra a doutrina e a jurisprudência do
constitucionalismo alemão, uma dimensão objetiva de garantia contra atos de
arbítrio do Estado.
 
§            Os direitos fundamentais da terceira geração, dotados de altíssimo teor de
humanismo e universalidade, tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto
direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses dos
indivíduos, de um grupo ou de um momento expressivo de sua afirmação como
valor supremo em termos de existencialidade concreta. Os publicistas e juristas já os
enumeram com familiaridade assinalando-lhes o caráter fascinante de coroamento
de uma evolução de trezentos anos de esteira da concretização dos direitos
fundamentais.
Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao
meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade.
Admite o jurista E. Mbaya que a descoberta e a formulação de novos direitos é e
será sempre um processo sem fim, de tal modo que, quando “um sistema de direitos
se faz conhecido e reconhecido, abrem-se novas regiões da liberdade que devem ser
exploradas”. Com base nessa constatação, clama o jurista a adequação e a
propriedade de linguagem relativa ao reconhecimento de três gerações de direitos
fundados no princípio da solidariedade.
 
§            A globalização política na esfera da normatividade jurídica introduz os direitos da
quarta geração que, aliás, correspondem à derradeira fase de institucionalização do
Estado social.
São direitos da quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o
direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro,
em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se
no plano de todas as relações de convivência.
Os direitos da quarta geração não somente culminam a objetividade dos direitos das
duas gerações antecedentes, como absorvem-na, sem, todavia, removê-la – a
subjetividade – dos direitos individuais, a saber, os direitos da primeira geração.
 
Concluindo, poder-se-á dizer que os direitos da segunda geração, da terceira e da quarta
não se interpretam, concretizam-se. É com base nessa concretização que reside o futuro
da globalização política, a seu princípio de legitimidade, a força incorporadora de seus
valores de libertação. Enfim, os direitos da quarta geração compreendiam o futuro da
cidadania e o porvir da liberdade de todos os povos. Tão somente com eles será legítima
e possível a globalização política.
 
6. CONCLUSÃO
 
Algumas questões merecem ser ressaltadas diante dessa complexa e permanente
problemática – os Direitos Fundamentais da Pessoa Humana:
 
§    O valor da pessoa, enquanto conquista histórico-axiológica, encontra a sua
expressão jurídica nos direitos fundamentais do homem;
 
§    Os direitos fundamentais da segunda geração tendem a tornar-se tão
justificáveis quanto os da primeira geração. Com a introdução dos direitos
fundamentais da segunda geração, cresceu o juízo de que esses direitos
representam, de certo modo, uma ordem de valores;
 
§    A dignidade da pessoa humana e o exercício da cidadania são considerados
princípios fundamentais da Carta Magna Brasileira de 1988;
 
§    A partir da Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), uma série de
instrumentos internacionais veio à luz para abordar os temas mais variados dos
direitos inalienáveis da pessoa humana;
 
§    Os direitos contidos na Declaração Universal são uma conquista da humanidade
que conclama a uma luta permanente para dar-lhes vigência e permanente
responsabilidade. Não é suficiente que estejam declarados e escritos. Devem
torná-los realidade a fim de se evitar que permaneçam no plano do discurso
teórico.
 
 
7. PALAVRAS-CHAVES
 
Direitos Fundamentais . Direitos Humanos . Pessoa Humana . Dignidade Humana.
 
 
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia.2. ed. São Paulo: Mestre Ju, 1982.
BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos.Rio de Janeiro: Campus, 1992.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 6. ed. ver. atual. e ampl. São
Paulo: Malheiros, 1996.
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional.6. ed.rev. Coimbra: Almedina,
1995.
LAFER, Celso. Desafios: Ética e Política. São Paulo: Siciliano, 1995.
REALE, Miguel. Nova Fase do Direito Moderno. São Paulo: Saraiva, 1990.
TRINDADE, A.A. Cançado. Direitos Humanos e Meio Ambiente. Porto Alegre:
Sérgio Fabris, 1993.
 

CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional. p. 517

BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. p. 30

TRINDADE, A.A. Cançado. Direitos Humanos e Meio Ambiente. p. 71

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. p. 259

REALE, Miguel. Nova Fase do Direito Moderno. p. 62

(ibid, p. 63)
LAFER, Celso. Desafios: Ética e Política. p. 217 et seq.

“contém em germe” – Bobbio chama a atenção para o fato de que a


Declaração Universal é apenas o início de um longo processo, cuja realização
final ainda não somos capazes de ver.

BOBBIO, Norberto. op. cit., p. 31

BOBBIO, Norberto. op. cit. p. 34

BOBBIO, Norberto. op.cit.p. 5

BOBBIO, Norberto. op.cit.p.6

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. p.514 et.seq.

E. Mbaya, o jusfilósofo de Colônia, formulador do chamado “direito ao


desenvolvimento”, usa para caracterizar os direitos da terceira geração a
solidariedade e não fraternidade. O direito ao desenvolvimento diz respeito
tanto a Estados como a indivíduos, segundo assevera E. Mbaya, o qual
acrescenta que, relativamente a indivíduos, ele se traduz numa pretensão ao
trabalho, à saúde e à alimentação adequada.

BONAVIDES, Paulo. op.cit. p.523 et.seq.

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