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Herbert R.

Lottman

A dinastia
Rothschild
A trajetória da grande família de banqueiros
ao longo de dois séculos

Tradução de Ana Ban

a 3
Um

O FIM E O COMEÇO

O debate no Parlamento francês, apesar de a questão ser delicada – o


questionamento do caráter sagrado da propriedade privada –, con-
cluiu-se com um golpe surdo de marreta: rápido e irrevogável. Com a che-
gada ao poder de François Mitterrand, o primeiro presidente socialista da
França, em maio de 1981, logo seguida por eleições legislativas que deram a
seu partido a maioria parlamentar, a esquerda francesa parecia tomada por
um fervor quase religioso e, com isso, a atmosfera de bom-senso econômi-
co deu lugar a uma ira implacável. Para muitos políticos bem-intenciona-
dos, parecia justiça pura estatizar a riqueza, e por que não mexer com os
Rothschild? Não fazia diferença se a maioria parlamentar estava apagando
um século e meio de história da França; o mais importante era perseguir
e acabar com a imagem de “tão rico quanto um Rothschild” (uma frase
e uma ideia que remontam a Stendhal).1 “Está achando que eu sou um
Rothschild?” era a resposta instintiva de todo pai exasperado a qualquer
filho que não parasse de pedir coisas.2
A determinação do lado esquerdo da assembleia (comunistas aliados
a socialistas) deixou estupefata uma família de banqueiros que tinha experi-
mentado o desprezo em vários formatos – a espoliação durante a ocupação
nazista da França e a humilhação pelo regime de Vichy de Philippe Pétain,
sem mencionar os arroubos de vitupério e violência anticapitalista e antisse-
mita tanto da esquerda quanto da direita, que remontavam a um século ou
mais. A informação recebida era de que eles não poderiam mais fazer o que
sempre tinham feito, refletiu o barão Guy de Rothschild, chefe do banco da
família (depois de seu pai, Edouard, e do pai de Edouard, Alphonse, e do pai
de Alphonse, Jacob ou James, fundador da dinastia francesa). Mas era pior
do que isso. Era como se estivessem lhes dizendo para sair de sua própria
casa – já que para eles era isso que representava o Banque Rothschild, que
fazia parte de suas vidas e que se localizava havia mais de um século na Rue
Laffitte.3

O fim e o começo / 1
A reação inicial dele foi de raiva; melhor isso, ele refletiu, do que abrir
caminho à depressão. Depois de um debate que se estendeu por 13 dias e 33
sessões, o Parlamento votou pela estatização do banco dos Rothschild e de
mais três dúzias de instituições e grupos financeiros, juntamente com cinco
grupos industriais, no dia 26 de outubro de 1981.4
Em poucos dias, Guy já estava pronto com uma despedida de arrasar;
ela ganhou as manchetes dos jornais mais influentes de Paris. “Uma família
cujo nome está associado a uma instituição bancária capitalista proeminente
estava fadada a ver o encolhimento de suas atividades na medida em que a
sociedade francesa ia se tornando cada vez mais socializada desde o início
deste século.” Ele citou algumas das depredações a que a família Rothschild
tinha sido submetida em seu tempo: a apreensão das estradas de ferro (cam-
po tradicional dos Rothschild) pelo governo da Frente Popular de meados da
década de 1930 e a extensão da autoridade estatal sobre o Banque de France
(do qual o pai de Guy tinha sido diretor influente).
Rothschild sabia que, com o passar dos anos, sua família tinha se
transformado no “símbolo proverbial da riqueza” e que tinha feito jus a essa
imagem. Mas será que eles eram os únicos capitalistas da França? Em outros
lugares, ele observou, notadamente nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, a
prosperidade e a experiência eram incentivadas. Mesmo na França, o serviço
prestado por sua família a seus concidadãos – os hospitais, as escolas e as
moradias de baixo custo dos Rothschild, as obras de arte doadas a museus es-
tatais, os subsídios às artes e à ciência – não tinha passado despercebido. No
entanto, ele sabia que a família Rothschild necessariamente despertava senti-
mentos de inveja. Ele próprio tinha considerado seu sobrenome como uma
desvantagem, quando, por exemplo, depois de servir aos gaullistas na Segun-
da Guerra Mundial, não recebeu a nomeação que lhe permitiria continuar a
serviço de seu país. Antes, tinha sido o regime de Vichy que tirara de seu pai
e de seus tios a nacionalidade francesa e, é claro, que tinha se apropriado de
seu banco. “Um judeu para o regime de Pétain, um pária para Mitterrand;
para mim, já basta”, ele concluiu. “Ter de reconstruir sobre ruínas duas vezes
em uma vida só é demais.”5 Ao falar com um repórter do semanário alemão
Der Spiegel, ele declarou, de maneira mais ardente: “Os Rothschild estão can-
sados de trabalhar na França, onde os governos destroem suas propriedades
a cada quarenta anos”.
No entanto, o barão Guy ficou grato de ver que a imprensa e o rádio
na Europa e em lugares tão distantes quanto os Estados Unidos percebe-
ram o impacto ampliado de sua declaração. Isso significava que o sobrenome

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Rothschild ainda fazia diferença. O banco – que empregava duas mil pessoas,
tinha setenta mil clientes e um grupo de indústria e comércio que, com suas
subsidiárias espalhadas pelo mundo, era responsável por mais trinta mil em-
pregos – não poderia ser engolido pelo Grande Governo sem derramamento
de sangue.6
Talvez houvesse uma maneira de fazer o que o governo julgava necessá-
rio ser feito (pelo menos foi o que ele disse a um entrevistador) sem pratica-
mente expulsar os Rothschild. Mas estava claro que isso não serviria para satis-
fazer àqueles que exigiam uma solução radical. Guy divulgou a informação de
que ele próprio tinha votado nos socialistas depois da Segunda Guerra Mun-
dial – uma reação natural aos anos de Vichy. Mas os bancos pertenciam ao se-
tor privado e operavam em atmosfera de concorrência; quando já não tinham
mais permissão para operar com liberdade, era a economia que saía perdendo.
Indo contra isso, ele sabia que também estava sendo contrário à França. “Para
os políticos da extrema esquerda, nós somos o arquétipo do mal.”7
Uma prima de Guy, a cineasta Nicole Stéphane, achou que o mínimo
que ela poderia fazer era uma visita ao banco na Rue Laffitte; chegou lá
e encontrou Guy empacotando tudo. Apesar de ele não ter feito nenhum
esforço para esconder seus sentimentos, ela reparou que ele não abaixou a
cabeça. “Está obviamente aflito”, ela pensou. “Mas também é petulante.”8
Ao receber um correspondente do jornal diário britânico The Guardian, o
barão Guy mostrou seu escritório despojado de qualquer objeto pessoal.
“Este aqui foi o meu lar”, ele explicou, “talvez mais ainda do que o lugar em
que eu moro, porque eu me mudei de casa. Este aqui foi meu lar constante
em todos os aspectos nos últimos cinquenta anos.” Ele caracterizou o ato do
governo como precipitado, “como se eles estivessem sendo seguidos por um
inimigo e quisessem incendiar tudo antes de serem alcançados, o que é um
absurdo completo”. Será que a família continuaria com sua atividade? “Se
algo que seria respeitável e valioso o suficiente para ser chamado de ‘Casa de
Rothschild’ na França vai sobreviver ou reviver eu não posso afirmar”, foi a
resposta dele.9
Pouco depois disso, na tradicional recepção de fim de ano para os
funcionários do banco, o barão Guy tomou consciência do estado das pes-
soas que trabalhavam com ele havia tanto tempo – algumas delas estavam
com os olhos marejados. Para elas, assim como para ele, era o fim de um
mundo.10

O fim e o começo / 3
O filho de Guy, David, celebraria seu aniversário de 39 anos durante
as semanas em que se deu a saída da Rue Laffitte; também para David, o que
mais doía era ser expulso de um local que era seu verdadeiro lar. Ele tinha
praticamente crescido naquela rua – primeiro na casa histórica de James,
fundador da dinastia Rothschild francesa, uma mansão neoclássica de três
andares que fora a residência do temido ministro da Polícia de Napoleão,
Joseph Fouché, e depois no prédio funcional que a substituíra na década de
1960. Seus amigos estavam ali; ele estava sendo separado à força desses ami-
gos. Em retrospecto, ele havia concluído que a estatização era mais um cho-
que psicológico do que um desastre financeiro, já que os Rothschild estavam
sendo desprovidos de seus investimentos em um momento em que o clima
dos negócios não era nada promissor (mas isso já não era mais preocupação
dos Rothschild!).
Mais tarde ainda, a experiência aterradora poderia até parecer posi-
tiva. Afinal, ela removeu camadas de atividades com as quais os Rothschild
tinham se envolvido ao longo dos anos, que com frequência se comprovaram
mais complicadas do que valia a pena. De fato, graças à tomada social-co-
munista dos gigantes econômicos da França, parecia possível que os Roths-
child retomassem seu talento histórico, as atividades de banco mercantil, ao
espírito do fundador da família, James, conhecido como o Grande Barão.11
Talvez sua dedicação à moda século XIX fosse o que o final do século XX
mais precisava.
Eles tinham uma base sobre a qual construir. Em Nova York, por exem-
plo, a família francesa compartilhava parceria financeira com os primos bri-
tânicos, que tinham escapado da estatização; Guy iria se mudar para lá para
ver o que poderia ser feito quanto ao desenvolvimento de seu potencial.12 Na
França, eles ainda eram donos de uma pequena firma de investimentos para
gerenciamento de carteira de ações chamada Paris-Orléans, até então um dos
veículos que a família usava para exercer controle sobre o banco de Paris. À
medida que a ameaça de estatização cresceu, David de Roth­schild – que fa-
zia parte do trio de diretores com seu primo Nathaniel e um administrador
de banco de longa data, Jacques Getten – começou a transformar a Paris­-
Orléans em uma instituição financeira que não era exatamente um banco,
mas que podia, da mesma forma, exercer algumas das funções de um banco
de investimento, mobilizando os recursos de seus parceiros e clientes para
iniciativas lucrativas na indústria e nas finanças.
Eles teriam seis meses pela frente – ou pelo menos acreditavam ter,
na época da eleição de Mitterrand. Enquanto outros grupos almejados pelo

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governo tomavam atitudes mais decisivas para deixar seus recursos fora do
alcance da estatização, ou trabalhavam por baixo dos panos para se proteger
da ocupação, os Rothschild decidiram permitir que o governo fizesse aquilo
que os governos fazem e simplesmente começar tudo outra vez.
O nome Rothschild desapareceu da placa na porta do prédio da Rue
Laffitte; mas voltaria a aparecer em outra placa, sobre outra porta.

O fim e o começo / 5
Dois

LUTA CONTRA NAPOLEÃO

P ara compreender o início da fabulosa família Rothschild, vale lembrar


como é importante estar no lugar certo na hora certa – Mayer Amschel
Rothschild estava lá – e em seguida levar em conta o papel de um indivíduo
que é ao mesmo tempo elevado e humilhado à condição condescendente de
“judeu da corte”, desprezado pelo que era, admirado e solicitado pelo que era
capaz de oferecer. Por não terem permissão de possuir ou usar terras, os ju-
deus da Europa pré-revolucionária podiam lidar com dinheiro, trocando ou
emprestando, e comercializar metais preciosos; quando eram considerados
úteis por um príncipe, tornavam-se fornecedores da corte, administrando os
negócios do patrão (e, às vezes, suas propriedades também). Poucas famílias
reinantes na Europa pós-feudal deixavam de ter em sua entourage um judeu
que emprestasse dinheiro; não é para menos que, quando a época dos bancos
chegou, os judeus estavam preparados para ela (juntamente com outra mi-
noria desprezada, a dos protestantes).
Não dá para imaginar um meio mais deprimente do que o gueto euro-
peu; havia limites em relação àquilo que a ambição ou até mesmo o sucesso
de alguém podia fazer para aliviar suas aflições, e nenhuma atitude que se pu-
desse tomar para fugir disso. A cidade livre de Frankfurt am Main, na Europa
pós-medieval, era tudo menos livre para os judeus, que eram obrigados a
morar em casas apinhadas de gente em uma alameda sem sol – na desordem
daquele pátio de prisão sem esgoto, delimitado pelas antigas muralhas da ci-
dade de um lado e por um fosso de outro, fechado à noite e aos domingos –,
sujeitos ao uso de vestimentas especiais para distingui-los e obrigados a pagar
impostos e pedágios discriminatórios; estavam à constante mercê de insultos
gratuitos e não raramente eram alvo de violência. Impedidos de exercer pro-
fissões ou de vender certos tipos de alimentos e de ter propriedades, os judeus
também não tinham sobrenome; podiam inventar um nome de família ou
colocar uma placa qualquer, sem significado, na porta de sua loja (Rothschild
vem do alemão “escudo vermelho”). Nascido no gueto, no dia 23 de feve-
reiro de 1744, Mayer Amschel foi criado no estabelecimento comercial dos

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pais, sem lugar para brincar nem jardim. Seu pai era comerciante de bens
variados, incluindo material de construção, e complementava a renda com a
troca de moedas.
A história e a lenda mostram que o filho tinha habilidade extrema na
lida de moedas novas e raras, mas ninguém precisa dizer que Mayer Amschel
era mesmo excepcional. De que outra maneira explicar a riqueza e a influên-
cia que ele adquiriu ao longo da vida, além do fato de ter encaminhado nos
negócios cinco filhos que transformariam a história econômica do continen-
te europeu?1

Durante toda a vida, Mayer Amschel morou em cima do local em que


trabalhava, no escuro Judengasse, em condições sub-humanas e de cativos;
ao longo dos anos em que seus filhos, em outras capitais europeias, passa-
ram a ser tratados como iguais (pelo menos) pelos colegas no mercado das
finanças, sua situação e a da família, que permaneceu em Frankfurt, só foi
melhorando muito lentamente. A história de Mayer já foi contada inúmeras
vezes: assistente de trocador de dinheiro do pai aos dez anos, órfão aos doze e
obrigado a agir como pai para os irmãos mais novos. Aprendeu o suficiente a
respeito de moedas antigas para se tornar consultor e também procurador de
colecionadores cheios de títulos. E, apesar de um arquivista dos Rothschild
nos lembrar de que na verdade não temos certeza se a experiência do rapaz
realmente conquistou a corte de Hesse, de algum modo, aos 25 anos, ele foi
nomeado fornecedor oficial dessa corte; era também fornecedor de moedas
raras e objetos de arte preciosos a toda e qualquer pessoa que tivesse dinheiro
para pagar por essas coisas.2
Os príncipes de Hesse, por sua vez, também eram fornecedores formi-
dáveis – fornecedores de súditos em bom estado físico, que eram treinados
como soldados e contratados no exterior como mercenários. Conta-se uma
história horrível a respeito do príncipe Frederico II, pai de Guilherme IX:
segundo um acordo, o príncipe recebia uma indenização quando os inte-
grantes de sua força mercenária morriam a serviço de um empregador es-
trangeiro; quanto mais soldados morriam, mais rico ele ficava. “Seus homens
não morrem com facilidade”, ele reclamou a um de seus generais. “Não se
esqueça de que meus cofres estão vazios.”3
Verdadeira ou não, a história é indicativa das condições em que os
governantes daquela província enriqueciam ao vender corpos em troca de
dinheiro. Quando Guilherme IX herdou o trabalho do pai em Kassel, era

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um negociante extremamente próspero, mais rico do que príncipes que go-
vernavam domínios mais extensos. Esses príncipes empreendedores utiliza-
vam homens das finanças igualmente empreendedores, como Carl Frederick
Buderus, que só entra nesta história por ter reconhecido os talentos e a uti-
lidade de Mayer Amschel, o cambista do gueto que conhecia bem moedas
antigas. Naquele tempo, quando dinheiro significava volumosas barras de
ouro ou prata ou moedas tilintantes, que no mínimo eram ruins de carregar
e geralmente perigosas, os mercadores e cambistas incipientes, cuja palavra
e assinatura eram capazes de substituir transferências físicas, valiam as co-
missões exigidas. Era ainda mais útil usar um Rothschild bem afastado da
comunidade de banqueiros para fazer transferências discretas de dinheiro e
para converter com rapidez moedas estrangeiras. A fortuna de Mayer Ams-
chel estava a caminho.4
O mesmo pode ser dito a respeito de sua família. Em agosto de 1770,
aos 26 anos, Mayer Amschel casou-se com Gutele Schnapper, de dezessete
anos, filha de um comerciante do gueto; o primeiro filho deles que sobrevi-
veu foi uma menina, seguida, em 1773, 1774 e 1777, pelos meninos Amschel
– os primeiros da família a usar Rothschild como sobrenome5 –, Salomon e
Nathan; na época e até bem mais tarde, apenas os filhos homens contavam (e
eram contados). O casal ainda teve duas outras meninas, depois Carl (1788),
de novo duas meninas e então, no dia 15 de maio de 1792, veio ao mundo o
último filho de Mayer Amschel e Gutele, Jacob Mayer, que ficaria conhecido
internacionalmente como James, fundador do ramo francês dos Rothschild,
o herói da nossa história.
Nessa época, a família vivia em instalações mais amplas (esta casa, no
entanto, tinha um escudo verde em cima da porta). Mas o endereço – Juden-
gasse – não tinha mudado, nem as privações. Na época, a renda disponível
naquele lar podia ser comparada à de outra família de Frankfurt, a dos Goe-
the, mas a casa deles era uma mansão.
Não temos nenhum retrato de Mayer Amschel, o fundador do clã
Rothschild, nem como jovem empreendedor nem como sábio idoso, apesar
de ele com certeza estar entre os homens mais ricos do gueto de Frankfurt e,
de todo modo, ser o mais famoso de seus moradores (os retratos viriam com
a geração seguinte). Mas uma testemunha do início do século XX, o conde
Corti, teve a oportunidade de visitar e descrever a casa da placa verde em
cima da porta em algum momento anterior à Segunda Guerra Mundial. Nós
não podemos fazer a mesma coisa, porque as bombas dos aliados colocaram
abaixo a antiga Frankfurt, e o gueto foi junto.6

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Em janeiro de 1800, quando os filhos de Mayer Amschel já eram ho-
mens feitos e tinham sua parte nos negócios – pai e filhos então tinham fun-
ções oficiais sob as ordens do príncipe –, os Rothschild deram mais um enor-
me passo e se transformaram nos agentes da corte do imperador austríaco
em Viena. Sua atividade mais lucrativa continuava sendo a movimentação
de dinheiro, sempre que possível por meio de cartas de crédito em vez de
sacos de moedas entre a Grã-Bretanha e o continente. Eles também assu-
miram uma proporção cada vez maior dos investimentos do príncipe, com
frequência na forma de empréstimos a outros Estados. Às vezes, esperava-se
que os Rothschild ocultassem o papel do príncipe na transação, colocando-se
pessoalmente como intermediários. Sua reputação, assim como sua comis-
são, cresceu.7
A essa altura – com o nascimento da carreira internacional e o início
das viagens ao exterior que seria seguido pelo estabelecimento de filiais es-
trangeiras –, os contemporâneos atentos já eram capazes de observar sinais
daquilo que mais tarde seria reconhecido como o estilo Rothschild: lealdade
absoluta entre os membros da família, discrição na condução dos negócios
alheios e rapidez e eficiência na transmissão de mensagens e dinheiro, ex-
traordinárias para a época. Acima de tudo – e apesar de seu sucesso inigua-
lável na obtenção de bens e moedas, independentemente de qualquer fron-
teira e entre nações em guerra –, eles tinham uma forte noção de honra e se
recusavam a tomar atalhos ou lesar aqueles a quem prestavam serviço (essas
qualidades deixariam seus clientes contentes e conquistariam reis).
A França revolucionária declararia guerra contra a Áustria em 1792.
Guilherme de Hesse ficou do lado da Áustria, e Napoleão jamais iria se es-
quecer disso. Mas Guilherme não entrou na guerra; ele emprestou dinheiro e
alugou mais soldados para a Inglaterra; os Rothschild, como agentes discre-
tos, não sofreram com o fato. Em 1795, Mayer Amschel atingiu a categoria
mais alta de impostos em Frankfurt, com base em sua declaração de ganhos
estimados. No final do século, a cidade tinha se transformado em ponto de
contato entre a Inglaterra e o resto do continente, tanto como centro ban-
cário quanto como aduana para mercadorias inglesas destinadas a todos os
Estados germânicos, a ponto de fazer sentido a exportação de um Rothschild,
Nathan, de 21 anos, para representar a família em Londres. Nascia a firma
britânica.8
Nathan levou parte da fortuna consigo. A partir de então, durante
as guerras napoleônicas, ele se tornou um elo vital para a transferência de
fundos e de bens, sendo que boa parte deles precisava passar por barreiras.

Luta contra Napoleão / 9

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