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Doença de

Huntington
Fernando Andersson Chemale
Guilherme Fagundes Bassols
Marcelo Tonding Ferreira
Rodrigo Sponchiado da Rocha

Introdução
•A coréia de Huntington é uma afecção degenerativa do sistema
nervoso com padrão de herança autossômica dominante e
penetrância completa;

•Os pacientes apresentam uma expansão da trinca CAG no gene


IT15 do cromossomo 4;

•O quadro sindrômico caracteriza-se por movimentos involuntários


coreiformes e alterações cognitivas, que se desenvolvem em
torno dos 40 anos de idade, progredindo até a morte em um
período de aproximadamente 15 anos;

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Histórico
• George Huntington primeira descrição

• Coréia hereditária

• 1872 The Medical and Surgical Reporter

A doença comumente se inicia por leves abalos dos


músculos da face, que aumentam gradativamente em
violência e variedade. As pálpebras são mantidas
piscando, a testa franzida depois elevada, o nariz torcido
para um lado e depois para outro e a boca se volta em
direções variadas, dando ao paciente a aparência mais
ridícula que se possa imaginar. Parece haver alguma força
oculta, algo que de certa forma está brincando com a
vontade e de algum modo dificultando e pervertendo os
seus desígnios; e depois que a vontade pára de exercer
sua força, assume o controle e mantém a pobre vítima
numa agitação contínua enquanto ela permanece
acordada.

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Particularidades
• Natureza hereditária;

• Tendência à insanidade;

• Idade tardia de aparecimento;

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Histórico
T. Meynert em 1877 demonstrou que os
sintomas da DH estão associadas com
alterações no núcleo caudado;

Anton em 1896 e Alzheimer em 1911


demonstraram que a DH atinge todo o estriado
que corresponde ao núcleo caudado e putâmen

Gusella, em 1983, conseguiu localizar o


gene responsável pela síndrome de
Huntington;

Em 1993, o ‘Huntington Disease


Collaborative Research Group’ descobriu
que a alteração gênica responsável pela DH
era a expansão da repetição dos
trínucleotídeos CAG localizados na
extremidade 5’ do gene IT15 no braço curto
do cromossomo 4.

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Epidemiologia
• 5 a 10 por 100.000 indivíduos

• Regiões de alta prevalência: Tasmânia e


lago Maracaibo na Venezuela

• Regiões de baixa prevalência: Japão,


China, Finlândia

GENÉTICA

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Tipo de herança
• Autossômica dominante, com penetrância
completa;

• Todo indivíduo afetado possui um genitor


afetado;

• Distribuição igual entre homens e mulheres;

• Todo indivíduo afetado transmite a


característica para metade de sua prole;

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Homozigotos X Heterozigotos

• Expressão fenotípica idêntica;

• Lago Maracaibo (Venezuela):


Homozigotos e heterozigotos;
“Efeito do fundador”

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Cromossomo 4

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Interesting Transcript
15 (IT15)
• O gene mutante foi localizado na extremidade
telomérica do braço curto na região 4p16.3 do
cromossomo 4;
• Extremidade 5’ Múltiplas cópias do
trinucleotídeo CAG em tandem;
• CAG Glutamina;
• Repetições CAG Poliglutamina;

Gen IT15

Huntingtina

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A Mutação do Gene
IT15

Extremidade telomérica do gene IT15

Repetições do trinucleotídeo CAG

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Mutação do gene
IT15

Gene IT15 normal

Até 35 repetições de trinucleotídeo


CAG

Mutação do gene
IT15

Genótipo intermediário

35 a 40 repetições CAG

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Mutação do gene
IT15
Doença de Huntigton
Gene mutante

Acima de 40 repetições CAG

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Instabilidade das repetições
na gametogênese
Herança materna Herança paterna

Ovulogênese Espermatogênese

Aumento ou diminuição Duplicação do número


de 3 a 4 CAG de CAG

Antecipação Genética
na DH

• Prole com idade precoce de manifestação e/ou


uma expressão mais grave da doença;

• Herança paterna DH juvenil

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Polimorfismos adjacentes à
repetição CAG
• A deleção de 3 nucleotídeos adjacentes ao CAG
tem correlação com diminuição na idade de
início da doença;

• 96% dos pacientes com DH apresentaram


repetições de 7 trinucleotídios CCG adjacentes à
repetição CAG, não havendo influência
fenotípica;

Mutações novas

• Evento raríssimo Baixa taxa mutacional

• Suspeita de Investigar o genótipo


mutação nova dos pais

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Repetições expandidas
instáveis
Fora da região Dentro da região
codificadora codificadora

Síndrome do X frágil Doenç


Doença de Huntington,
Huntington
(CGG e GCC) e AEC1, ADRPL,
distrofia miotônica doença de Machado-
Joseph, AMEB

Interferem na Não interferem na


transcrição transcrição

FISIOPATOGENIA

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HUNTINGTINA
• Proteína codificada pelo gene IT15 normal;

• presente em vários tecidos do corpo, embora


esteja concentrada no cérebro;

• a Huntingtina normal é encontrada quase


exclusivamente no citoplasma;

Huntingtina
Tamminga et cols : no citoplasma a
huntingtina estaria associada em parte com as
membranas das vesículas do C. de Golgi

Migração vesicular e exocitose de substâncias


( Neurotransmissores, enzimas,...)

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Huntingtina
• Também é creditado a huntingtina um
papel no mecanismo de apoptose celular,
sugerindo que ela se ligaria a outras
proteínas neuronais, formando complexos
citotóxicos

HUNTINGTINA
MUTANTE
• Na DH a huntingtina possui uma cadeia anormal de
poliglutaminas que confere à sua estrutura novas
propriedades que desencadeiam interações
anômalas com outras proteínas;

• A huntingtina mutante encontra-se


predominantemente no núcleo da célula, em
comparação à huntingtina normal, que se encontra
no citoplasma;

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• não há aumento nem diminuição da
expressão do RNA huntington em neurônios
dos núcleos caudado e putâmen, locais de
maior severidade da DH

• Existência de outros fatores que interagem


com a huntingtina, fazendo com que as
células dos núcleos da base sejam mais
vulneráveis

proteínas HAP1, GAPDH,...

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Huntingtina mutante

Portanto, a interação mais intensa da


huntingtina anormal com determinadas proteínas
do cérebro causaria uma alteração ainda incerta
no mecanismo de apoptose e na exocitose de
substâncias pelos neurônios, causando
progressiva degeneração dos núcleos da base e
conseqüente atrofia cerebral

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Núcleos da base

A modalidade de comprometimento do
tecido cerebral na DH apresenta potencial
capacidade de depletar substâncias
próprias dos neurônios, como GABA,
encefalinas e substância P.
Há perda principalmente dos neurônios
gabaérgicos do caudado e putâmen
(Estriado).

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Mecanismo da coréia
Perda da maioria dos corpos dos neurônios
do caudado e putâmen e dos neurônios
secretores de Ach de várias áreas do cérebro

Perda da inibição do globo pálido e da


substância negra

descargas espontâneas de atividade do globo


pálido e da substância negra

MOVIMENTOS DE DISTORÇÃO

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DEMÊNCIA

Perda dos neurônios secretores de


acetilcolina (Ach), especialmente os
localizados nas áreas de pensamento
do córtex cerebral

MANIFESTAÇÕES
CLÍNICAS

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Idade atrasada de
manifestação
• A DH apresenta sintomas que em geral
não são vistos antes dos 30 anos;
• Seleção natural Progenitores
passam o gene para sua prole mesmo
sem saber que são carreadores da
mutação;
• Herança paterna Fator de risco para
DH juvenil.

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Manifestações
clínicas
•Distúrbios motores progressivos, com
comprometimento dos movimentos
voluntários e aparecimento de movimentos
involuntários;

•Declínio da capacidade cognitiva global e


presença de transtornos psiquiátricos

Manifestações
motoras

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Coréia
•É o sinal motor mais notável da
doença, estando presente em cerca
de 90% dos afetados;

• As manifestações coreiformes na
face são representadas por
contrações da bochecha,
franzimento das sobrancelhas,
movimentos labiais e nistagmo;

Coréia
•Nos membros, há envolvimento de múltiplas
articulações;

•Num estágio avançado pode haver o aparecimento de


movimentos semelhantes ao balismo;

•Os movimentos estão continuamente presentes;

•Em geral, a coréia inicia-se distalmente e, com a


evolução, torna-se generalizada, podendo interromper
os movimentos voluntários.

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Distonia
• Presente em 95,2% dos pacientes
clinicamente sintomáticos;

• É caracterizada por movimentos


lentos anormais e por alterações
posturais, tornando-se proeminente
apenas no estágio final das
doença;

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Distúrbios oculomotores
• São observados na maioria dos pacientes,
estando presentes no estágio inicial da
doença;

• A lentidão dos movimentos sacádicos está


presente em 75% dos doentes, sendo os
movimentos verticais mais afetados que os
horizontais;

Bradicinesia e rigidez
• São infreqüentes nas fases iniciais
da doença. Entretanto,
gradualmente, essas manifestações
podem dominar no estádio final da
doença, no qual o paciente torna-se
severamente rígido e acinético;

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Alterações na marcha

• Os distúrbios da marcha tornam-se mais


pronunciados com a progressão da doença;

• Os pacientes podem apresentar quedas


freqüentes.

Discinesia

• A perda da motricidade voluntária


progride, com o curso da doença, até
atingir a incapacidade de efetuar qualquer
movimento proposto.

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Alterações da fala
• A disartria, lentidão e a falta de
iniciativa perturbam a fluência e a
fala espontânea. Entretanto, a
estrutura semântica, o vocabulário
e a compreensão do discurso estão
preservados até os estágios tardios
da doença.

Disfagia

•A asfixia e a aspiração
decorrentes da disfagia são
causas comuns de morbidade

• Ocorre tardiamente na DH

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Reflexos hiperativos
• Ocorrem precocemente em até 90%
dos pacientes;

• A resposta plantar em extensão é


predominante nos casos juvenis ou em
adultos em casos avançados da
doença;

Incontinência urinária
e fecal
• Raras entre os doentes
recentemente diagnosticados;

• Acometem 20% dos pacientes em


fase terminal;

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Manifestações
psiquiátricas e
cognitivas

Diminuição da
memória
• Freqüente redução da capacidade de
memorização, inicialmente afetando a
memória visual, espacial e auditiva;
• A memória verbal é secundariamente
afetada;
• A orientação em tempo e espaço é
preservada até as fases finais da doença;

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Déficit de atenção e
concentração
• Presentes no estágio inicial da
doença, e estão relacionados com
alteração da percepção visual dos
pacientes;

Demência
• É o sintoma inicial em 10% dos casos;

• 90% dos pacientes desenvolvem durante


o curso da doença;

• A lentidão do pensamento pode ser


observada precocemente;

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Mudanças no humor e
afeto
• A depressão é o principal sintoma
psiquiátrico e acomete 40% dos doentes;

• Maior taxa de suicídio;

• Distúrbios de conduta: apatia, ansiedade,


agressividade, desinibição sexual e
alcoolismo;

• Cerca de 50% dos pacientes com


DH em estágio avançado
apresentam pensamentos ilusórios;

• Na fase terminal, podem ser


observados distúrbios do sono e
inversão do ritmo circadiano;

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DH juvenil
• 5,4% dos casos;

• Manifesta-se inicialmente com parkinsonismo


progressivo, demência e convulsões, sendo
menos freqüente a coréia, diferentemente da
forma adulta;

• Deterioramento clínico mais acelerado;

Relação
genótipo/fenótipo
• O número de repetições CAG está diretamente
relacionado a rapidez da deterioração clínica
do paciente, e inversamente associado à idade
de aparecimento da doença;

• Não parece haver nenhuma relação entre o


número de repetições CAG e o tipo de
sintomas (motores ou comportamentais)
iniciais da DH;

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Prognóstico
• A pneumonia por aspiração é a causa mais
comum de morte na fase terminal da
doença;

• A duração da doença entre o início e a


morte do paciente é de 15 a 20 anos na DH
do adulto e de 8 a 10 anos na variante
juvenil;

DIAGNÓSTICO

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Diagnóstico
• Clínico

• Imagético

• Genético

Diagnóstico clínico

• Disfunções motoras Movimentos coreicos;

• Distúrbios cognitivos;

• História familiar positiva;

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Diagnóstico imagético
• Alterações básicas Atrofia do estriado;
Atrofia cortical

• TC = RNM;
» RNM permite medidas volumétricas;

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Diagnóstico genético
• Confirmação da doença de Huntington;

• Melhor método para realizar diagnóstico


diferencial;

• Implicações médicas, psicológicas, éticas


e financeiras;

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Técnica
• DNA isolado de linfócitos periféricos;
• Amplificação utilizando a reação da polimerase em
cadeia (PCR);
• Eletroforese;
• Hibridização com sonda (CAG)15 ;
• Contagem do número de repetições CAG;

Menos de 35 Mais de 40
Repetições CAG Repetições CAG

Normal DH

Teste genético para


pacientes sintomáticos
• Sintomas neurológicos compatíveis com DH;

• Diagnóstico diferencial de outras doenças que se


apresentam com manifestações coreiformes;

• Se o paciente apresentar a expansão do


trinucleotídeo e não tiver história familiar positiva

Investigar paternidade

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Teste genético em
pacientes assintomáticos
• Filhos de pais portadores de DH;

• 50% de chance de desenvolver a doença;

• Perspectivas de trabalho, planejamento pessoal e


familiar;

• Alterações psiquiátricas ao saber que irá desenvolver


uma doença assustadora que evoluirá para o óbito;

Aconselhamento
genético
Proposto pela “International Huntington Association” e pela
“World Federation of Neurology”.

“Guidelines” sobre as recomendações que devem ser dadas


aos pacientes que procuram os laboratórios de genética.

Recomendações baseadas nos princípios éticos, no


conhecimento da DH e nas técnicas de genética molecular.

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Aconselhamento
genético
1) Todo indivíduo que quiser realizar o teste deve receber
informações atualizadas e relevantes, para dar seu consentimento
voluntário.

2) Fazer o teste é uma decisão única e exclusiva do indivíduo


interessado. Não devem ser consideradas solicitações de terceiros.

3) O participante deve ser encorajado a escolher uma pessoa para


acompanhá-lo em todas as etapas do teste.

4) O teste e o aconelhamento devem ser realizados em unidades


especializadas, preferencialmente em um departamento universitário.

Diagnóstico pré-natal
• Cordocentese
• Amniocentese
• Análise de vilosidades coriônicas

• Muitos centros de genética não realizam, pois além de


ser um método invasivo, causa um grande impacto nos
pais e não implica em nenhuma estratégia terapêutica.
Tais centros preferem apenas o aconselhamento.

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Diagnóstico
diferencial
Grupos em que o diagnóstico é difícil:

• Pacientes com quadro clínico de coréia, mas sem


história familiar positiva;

• Pacientes com risco de desenvolver coréia e que se


encontram com sintomas psiquiátricos, mas sem coréia;

• Pacientes com coréia provocada por outra doença;

Diagnóstico
diferencial
Neuroacantocitose:
• Provoca movimentos involuntários, demência e atrofia
do caudado.
• Provocada por defeito nas membranas plasmáticas.

Coréia de Sydenhan:
• Manifestação tardia da febre reumática.
• Confunde-se com DH juvenil.
• Manejo e prgnóstico diferentes.

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Diagnóstico
diferencial
• Hipertireoidismo
• Coréia de Huntington
• Lúpus eritematoso sistêmico
• Neurosífilis
• Doença de Wilson
• Encefalite
• Infartos dos gânglios da base
• Discinesias tardias provocadas por fármacos

Tratamento
• A DH é uma enfermidade incurável;

• O tratamento é puramente sintomático, com


drogas bloqueadoras dos receptores
dopaminérgicos (fenotiazinas ou Haloperidol);

• Esses fármacos podem induzir um quadro de


discinesia tardia superposta ao distúrbio crônico

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Conclusão
A doença de Huntington é a mais comum doença
neurodegenerativa hereditária. Os mecanismos moleculares envolvidos na
gênese desse distúrbio ainda não foram suficientemente esclarecidos.

As manifestações clínicas da DH são severas e comprometem


dramaticamente a qualidade de vida dos doentes.

O diagnóstico genético, por sua vez, envolve aspectos complexos


que devem ser analisados e discutidos tanto com o doente quanto com os
seus familiares.

Por fim, é imperiosa a necessidade uma atitude efetiva da equipe


médica com o objetivo de otimizar o diagnóstico e manejo de pacientes
com DH.

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