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FACULDADE DE DIREITO SANTO AGOSTINHO – FADISA

Caroline Pereira Novais

Jonatas Medrado Silva

Karen Larissa Alves dos Santos

Natália Saraiva Soares

Nathalia Santos Oliveira

Pablo Daniel Antunes Fernandes

Thaís Soares Nobre

Tiago Mendes Costa

Victória Campagnac Costa

DIREITOS HUMANOS

Montes Claros/MG
Maio/2019
Caroline Pereira Novais

Jonatas Medrado Silva

Karen Larissa Alves dos Santos

Natália Saraiva Soares

Nathalia Santos Oliveira

Pablo Daniel Antunes Fernandes

Thaís Soares Nobre

Tiago Mendes Costa

Victória Campagnac Costa

ANÁLISE DO CASO XIMENES LOPES VS. BRASIL

Trabalho apresentado como requisito parcial para


avaliação na disciplina Direitos Humanos,
ministrada pelo Prof. Dr. Reinaldo Silva Pimentel
Santos, realizado pelos alunos do 8º Período
Noturno A - Faculdade de Direito Santo Agostinho -
FADISA.

Montes Claros/MG
Maio/2019
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..............................................................................................

2 O SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS


2.1 Histórico e importância
2.2 Comissão Interamericana de Direitos Humanos
2.3 Corte Interamericana de Direitos Humanos

3 CASO XIMENES LOPES VS. BRASIL


3.1 Fatos apresentados pelos denunciantes
3.2 Defesa apresentada pelo Estado brasileiro

4 ATUAÇÃO DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS


4.1 Indicação de direitos violados
4.2 Sentença
4.3 Cumprimento de sentença e acompanhamento de medidas

5 CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS ..................................................................................................
1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho acadêmico tem por objetivo a análise do Caso Ximenes Lopes Vs.
Brasil, da primeira condenação sofrida pelo Estado Brasileiro em decorrência de violações a
direitos humanos, imposta pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, como produto do
julgamento que culminou em sentença condenatória proferida em agosto do ano de 2006.
Denúncia essa realizada pela família da vítima, vez que esse morreu espancado em hospital
psiquiátrico em Sobral, no Ceará.
Diante do exposto, o presente trabalho irá analisar o Sistema Interamericano de
Direitos Humanos acerca de seu histórico constitutivo e órgãos essenciais no âmbito da
temática elencada, como Comissão Interamericana de Direitos Humanos e Corte
Interamericana de Direitos Humanos , bem como, da análise do caso objeto deste trabalho, e
ainda, da atuação da Corte Interamericana de Direitos Humanos considerando os reflexos da
sentença e o Cumprimento de sentença e acompanhamento de medidas
2 O SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS

O sistema interamericano de Direitos Humanos busca internacionalizar em seu plano


regional, os direitos humanos. Dessa maneira facilita um consenso político, já que é existente
uma aproximação geográfica entre os Estados membros, além de possuírem características
similares relacionados à língua, cultura e tradições.
O SIDH iniciou-se formalmente com a aprovação da Declaração Americana de
Direitos e Deveres do Homem na Nona Conferencia Internacional Americana realizada em
Bogotá em 1948, onde também foi adotada a própria Carta da OEA, que afirma os “direitos
fundamentais da pessoa humana” como um dos princípios fundadores da Organização.1

2.1 Histórico e importância

O sistema interamericano de Direitos Humanos respalda-se no trabalho de dois órgãos,


sendo eles a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Corte Interamericana
de Direitos Humanos.
Nos ensinamentos de Hanashiro (2001, p.25):

Do ponto de vista teórico, os direitos humanos, por mais fundamentais que sejam,
são direitos históricos, ou seja, nasceram de modo gradual conforme as
modificações das condições sociais. Dessa forma, esses direitos têm recebido
diversas interpretações e aplicações em diferentes momentos e regiões.

Ademais, os instrumentos internacionais criam um complexo conjunto de regras


nos sistemas geral e internacional, podendo ter destinatários diferentes, conforme
Piovesan (2013). Segundo a autora, estas regras poderão se aformosar de maneiras cada
vez mais complexas e especialidades quando do acréscimo de um componente
denominado de geográfico-espacial.
Assim, têm-se dois sistemas segundo Piovesan (2013), quais sejam: um sistema
regional dos direitos humanos e um sistema global. Enquanto no primeiro temos uma
1
Comissão Interamericana de Direitos humanos. O que é a CIDH?. Washington, 2006. Disponível em:
<https://www.oas.org/pt/cidh/mandato/que.asp>. Acesso em: 22 maio 2019.
aplicabilidade em áreas específicas, o segundo é mais abrangente, podendo alcançar
qualquer Estado integrante da ordem internacional.
Aos sistemas regionais caberia a função de internalizar as normas discutidas no
sistema global e dar a elas a devida aplicação.
Reputa-se considerar o entendimento de Heyns e Viljoen apud Piovesan (2013,
p. 326) acerca dos sistemas regionais:

(...) os sistema regionais de proteção dos direitos humanos apresentam vantagens


comparativamente ao sistema da ONU: podem refletir com maior autenticidade as
peculiaridades e os valores históricos de povos de uma determinada região,
resultando em uma aceitação mais espontânea e, devido à aproximação geográfica
dos Estados envolvidos, os sistemas regionais têm a potencialidade de exercer
fortes pressões em face de Estados vizinhos, em casos de violações. (...) Um efetivo
sistema regional pode consequentemente completar o sistema global em diversas
formas.

Entendem os autores que os sistemas global e regional possuem uma relação de


complementaridade, uma vez que os Estados podem pressionar seus vizinhos, quando
da não adequação de suas práticas conforme o que se estabelece no sistema global.
Corroborando este entendimento temos em Piovesan (2013) que, o relatório da
Commisssion to Study the Organization of Peace dispõe que os sistemas regional e
global são complementares, devendo respeitar os princípios dispostos na Declaração
Universal dos Direitos Humanos, que é considerada como um código comum a todas
as Nações.
Enquanto o sistema global se responsabiliza por ditar os limites e os parâmetros
mínimos de aplicação de direitos, os sistemas regionais se encarregarão de tratar das
especificidades de sua região, implementando medidas que assegurem a proteção aos
elementos inseridos.
Conforme Piovesan (2013), o sistema global é composto por uma série de
instrumentos das Nações Unidas, como o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, bem como a
Declaração Universal dos Direitos Humanos e outras Convenções internacionais.
Há também três sistemas regionais de proteção, que são os sistemas europeu,
africano e interamericano, cada qual com seu aparato jurídico. Complementando este
entendimento temos em Mazzuoli (2015, p. 958 e 959):

Merece destaque o sistema interamericano, composto por quatro principais


instrumentos: a Carta da Organização dos Estados Americanos (1948); a
Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948), a qual, apesar
de não ser tecnicamente um tratado, explicita os direitos mencionados na Carta da
OEA; a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969), conhecida como
Pacto de San José da Costa Rica; e o Protocolo Adicional à Convenção
Americana em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, apelidado de
Protocolo de San Salvador (1988).

Assim estabelecido, segundo Piovesan (2013), o sistema aplicado ao Brasil é o


sistema interamericano, sendo a Convenção Americana de Direitos Humanos do ano de
1969 é o principal instrumento do sistema interamericano de proteção dos direitos
humanos. Além disso, esta Convenção estabelece a Corte Interamericana e a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos.
Conforme ensinamentos do doutrinador Mazzuoli (2015), com a promulgação da
Carta da Organização dos Estados Americanos, em 1948, o sistema interamericano de
proteção dos direitos humanos teve a sua origem histórica. Esta Carta teve sua
aprovação na 9a Conferência Interamericana, em conjunto com a celebração da
Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem.
Tendo esses esclarecimentos acerca da Declaração Americana dos Direitos e
Deveres do Homem aduz Mazzuoli (2015, p. 959):

formou a base normativa de proteção no sistema interamericano anterior à


conclusão da Convenção Americana (1969) e continua sendo o instrumento de
expressão regional nessa matéria, principalmente para os Estados não partes na
Convenção Americana.

Segundo Piovesan (2013) esta convenção foi assinada em 1967 em San José na
Costa Rica, razão pela qual também é denominada de Pacto de San José da Costa Rica,
e a sua entrada em vigor foi no ano de 1978.
No cenário interno temos que o Brasil subscreveu a Convenção Interamericana em 25
de setembro de 1992, pela assinatura do Decreto 678.
A convenção Americana de Direitos Humanos, segundo Mazzuoli (2015)
cooperou para o fortalecimento do sistema de direitos humanos, que foi implementado
com a Carta da OEA e com a Declaração Americana. Além disso, segundo Mazzuoli
(2015, p. 960):

também pode-se dizer que a Convenção Americana estabeleceu nas Américas


um padrão de “ordem pública” relativa a direitos humanos até então
inexistentes.

Assim, complementando os ensinamentos de Mazzuoli, ensina Piovesan (2013,


p. 333) que,

a Convenção Americana não enuncia de forma específica qualquer direito social,


cultural ou econômico; limita-se a determinar aos Estados que alcancem,
progressivamente, a plena realização desses direitos, mediante a adoção de
medidas legislativas e outras que se mostrem apropriadas, nos termos do art. 26
da Convenção.

Conforme salienta Piovesan (2013) em seus ensinamentos, os Estados signatários


da Convenção devem se esforçar na persecução dos objetivos desta, assumindo
compromissos e estabelecendo medidas assecuratórias dos direitos e garantias previstos
para a proteção dos direitos humanos.
Corroborando este entendimento temos em Buergenthal apud Piovesan (.2013, p.
334)

Os Estados têm, consequentemente, deveres positivos e negativos, ou seja, eles


têm a obrigação de não violar os direitos garantidos pela Convenção e têm o
dever de adotar as medidas necessárias e razoáveis para assegurar o pleno
exercício destes direitos.

Conforme lição de Piovesan (2013, p. 334) “a Convenção Americana estabelece


um aparato de monitoramento e implementação dos direitos que enuncia”. Esse aparato
é composto pela Corte Interamericana e a Comissão Internacional de Direitos
Humanos.

2.2 Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Começar aqui!!

2.3 Corte Interamericana de Direitos Humanos

Leciona Sayán (2012) que a Corte Interamericana de Direitos Humanos - CIDH é uma
instituição autônoma que foi formalmente estabelecida em setembro de 1979 e tem por
objetivo aplicar e interpretar a convenção Americana sobre direitos humanos.
A Corte tem sede em San José na Costa Rica, e, de acordo com Mazzuoli (2015), a
Corte Interamericana de Direitos Humanos é o segundo órgão da Convenção Americana, que
tem como objetivo resolver os casos de violação de direitos humanos infligidos pelos Estados
membros da OEA e que tenham ratificado a Convenção Americana.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos - CIDH é um dos três órgãos
jurisdicionais de proteção dos Direitos Humanos dentro do sistema regional americano
composto por sete juízes nacionais dos Estados-partes da Organização dos Estados
Americanos – OEA2. Os juízes da Corte possuem um mandato de seis anos podendo ser
reeleitos somente uma vez. Os mandatos são contatos a partir do dia 1° de janeiro até 31° de
dezembro e a eleição dos juízes se dá por meio da Assembleia Geral da OEA, conforme o
Estatuto da Corte Interamericana de Direitos Humanos, artigo 5.2. 3
Ademias, Sayán (2012, p.5) leciona que “o Presidente e o Vice-Presidente são eleitos
pelos próprios Juízes por um período que dura dois anos e podem ser reeleitos”.
A corte compreende duas jurisdições: contenciosa e consultiva. De acordo com a
Convenção, a Corte possui a faculdade de ditar medidas provisórias4.
Segundo Mazzuoli (2015), será de competência consultiva quando se relacionar com
interpretação das disposições da Convenção e das disposições de tratados concernentes à
proteção dos direitos humanos nos Estados Americanos. No mesmo sentido Piovesan (2013,
p. 343):
no plano consultivo, qualquer membro da OEA – parte ou não da Convenção – pode
solicitar o parecer da Corte em relação à interpretação da Convenção ou de qualquer
outro tratado relativo à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos.

Segundo Hanashiro (2001,p.39):

A possibilidade de solicitar à Corte opiniões consultivas fortalece essa insituição


ante os Estados-membros, pois interessa também àqueles Estados que não aderiram
à Convenção. Essas opinões consultivas não ajudam de imediato na proteção desses
direitos, mas reforçam os princípios e a interpretação dos instrumentos de proteção
aos direitos humanos que devem orientar o sistema interamericano, criando uma
“espécie de jurisprudência emergente.

2
Biblioteca Virtual dos Direitos Humanos . Corte Interamericana de Direitos Humanos, o que é?.
Universidade de São Paulo. Disponível em: <https://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Corte-
Interamericana-de-Direitos-Humanos/o-que-e.html>.Acesso em: 25 maio 2019.
3
“Os mandatos dos juízes serão contados a partir de 1º de janeiro do ano seguinte ao de sua eleição e estender-
se-ão até 31 de dezembro do ano de sua conclusão.” Estatuto da Corte Interamericana de Direitos Humanos
(Bolívia, 1979).
4
Corte Interamericana de Direitos Humanos. Relatório Anual de 2012. Disponível em: <http://
www.corteidh.or.cr/sitios/informes/docs/POR/por_2012.pdf />. Acesso em: 27 maio 2019.
Quanto à competência contenciosa, de acordo com Mazzuoli (2015), esta é própria
para o julgamento de casos concretos em que há alegação de violação de algum dos preceitos
da Convenção Americana pelos Estados membros.
Nesse sentido Sayán (2012, p.6) explica que:

Por esta via, a Corte determina, nos casos submetidos à sua jurisdição, se um Estado
incorreu em responsabilidade internacional pela violação de algum direito
reconhecido na Convenção Americana ou em outros tratados de direitos humanos
aplicáveis ao sistema interamericano e, se for o caso, dispõe as medidas necessárias
para reparar as consequências derivadas da vulneração de direitos. Outrossim,
através da mesma função, o Tribunal realiza a supervisão de cumprimento de suas
próprias sentenças. O procedimento seguido pelo Tribunal para resolver os casos
contenciosos submetidos à sua jurisdição possui duas fases: 1) Fase contenciosa.
Esta fase compreende quatro etapas: a) etapa de apresentação do caso pela
Comissão; a apresentação do escrito de solicitações, argumentos e provas por parte
das supostas vítimas, e a apresentação do escrito de contestação aos dois escritos
anteriores por parte do Estado demandado; os escritos de contestação às exceções
preliminares interpostas pelo Estado, no caso de que corresponda; o escrito de lista
definitiva de declarantes; a resolução de convocatória a audiência; b) etapa oral ou
de audiência pública; c) etapa de escritos de alegações e observações finais das
partes e da Comissão, e d) etapa de estudo e emissão de sentença; e 2) Fase de
Supervisão de cumprimento de sentenças.

Assim, quando for reconhecida a competência contenciosa da Corte, as decisões por


ela proferidas possuirão força jurídica vinculante e obrigatória cabendo ao Estado o
cumprimento imediato.
Ainda sobre a jurisdição contenciosa, Hanashiro (2001, p.39-40) acredita que:

O expediente de um processo judicial é essencial para se combater a violação dos


direitos humanos, uma vez que apenas princípios de conduta moral, embora
fundamentais, não são suficientes para fazer com que os Estados cumpram seus
compromissos em relação aos direitos humanos. A corte pode decretar uma
obrigação legal a ser cumprida pelo estado que tenha violado esses direitos, desde
que tenha reconhecido sua jurisdição contenciosa ou a sua competência para julgar
um caso especifico. Nesses casos, a Corte tem ampla faculdade de decretar provas,
dirigir solicitações ou citar Estados, pessoas ou instituições que sejam necessárias a
diligencias de provas. A sentença da corte é definitiva e inapelável.

Afirmando o entendimento de , Olaya Silvia Machado Portella Hanashiro, leciona


Mazzuoli (2015, p. 970) que: “um Estado-parte na Convenção Americana não pode ser
demandado perante a Corte se ele próprio não aceitar a sua competência contenciosa”.
Pode-se dizer que, relacionado à competência os membros ao ratificarem a
Convenção, aceitam automaticamente a competência consultiva, ao mesmo tempo que a
competência contenciosa é facultativa, podendo ser aceita posteriormente.
No que diz respeito a legitimidade para propor um caso a Corte interamericana de
Direitos Humanos explana Piovesan (2013, p. 347) que:

Apenas a Comissão Interamericana e os Estados-Partes podem submeter um caso à


Corte Interamericana, não estando prevista a legitimação do indivíduo, nos termos
do art. 61 da Convenção Americana. Em 2001, contudo, a Corte revisou
substancialmente as suas Regras de Procedimento para, de forma mais efetiva,
assegurar a representação das vítimas perante a Corte. Ainda que indivíduos e ONGs
não tenham acesso direto à Corte, se a Comissão Interamericana submeter o caso
perante a Corte, as vítimas, seus parentes ou representantes podem submeter de
forma autônoma seus argumentos, arrazoados e provas perante a Corte.

Assim, quando for reconhecida a competência contenciosa da Corte, as decisões por


ela proferidas possuirão força jurídica vinculante e obrigatória cabendo ao Estado o
cumprimento imediato.
A ação da Comissão deve ser proposta perante a Secretaria da Corte, e é esta que
notifica sobre a sentença às partes. Informa Mazzuoli (2015) que enquanto às partes não são
notificadas, os textos, os argumentos e os votos permanecem em sigilo.
Para eficácia interna das sentenças proferidas pela Corte, em relação ao Brasil, elas
devem ser homologadas pelo Superior Tribunal de Justiça. Tal assunto é regulado, em âmbito
brasileiro, pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 em seu artigo 105, I,
a; pela Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – artigos 15 e 17; pelo Código de
Processo Civil de 2015 e pelo Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal – artigos 215
a 224, como aduz Mazzuoli (2015).
3 CASO XIMENES LOPES VS. BRASIL

O presente tópico tem por objetivo a análise acerca dos fatos e fundamentos
apresentados pelos denunciantes do caso Ximenes Lopes perante a Corte Interamericana de
Direitos Humanos, bem como das contrarrazões apresentadas pelo Estado Brasileiro, a
sentença foi proferida em 4 de julho de 2006, integrada em tal ocasião pelos juízes: Sergio
García Ramírez (Presidente); Alirio Abreu Burelli (Vice-Presidente); Antônio Augusto
Cançado Trindade; Cecilia Medina Quiroga; Manuel E. Ventura Robles; e Diego García-
Sayán. Ademais, os presentes fatos foram extraídos da decisão proferida pela Corte. 5

3.1 Fatos apresentados pelos denunciantes

Na secretaria da comissão Interamericana de Direitos Humanos, em 22 de novembro


de 1999, foi apresentada denúncia por Irene Ximenes Lopes, irmã de Damião, do qual esta foi
submetida a Corte, por meio de uma petição relatando os fatos ocorridos.
A peticionaria, Irene Ximenes, alega que seu irmão, Damião Ximenes, havia sido
internado duas vezes, porém, em sua última internação em 1998, disse que se dirigiu até a
clínica de internação onde encontrou a vítima ferida e machucada, com cortes pelo corpo,
feridas nos tornozelos e nos joelhos. Assustada com o que havia visto, Irene pediu explicações
aos funcionários da Casa de Repouso Guararapes que informaram a ela que as feridas
ocorreram em decorrência de uma tentativa de fuga por parte de Damião. Explicações essas
que a alegada confiou.
Relata ainda que no dia 4 de outubro de 1999 a mãe de Damião se deslocou a Casa de
Repouso Guararapes, mas ao chegar achou seu filho agonizando em dores, fato este que a
levou a procurar um médico da clínica para socorrê-lo, no entanto o médico se recusou e
Damião veio a óbito.
Irene questionou o laudo do óbito que os médicos deram a Damião que constava
como causa, a morte natural por parada cardiorrespiratória. Desconfiada, assim como os

5
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 20 maio 2019.
demais familiares, levaram o corpo de Damião para ser efetuada uma necropsia, laudo este
que também se concluiu como morte indeterminada. Inconformados com os resultados, uma
vez que nenhum dos laudos explicava as marcas de torturas no corpo de Damião Ximenes
Lopes, suspeitou-se manipulação e omissão dos resultados.
Expõe ainda que, houve tentativas de realização de denúncias no Estado Brasileiro,
mas a Delegacia de Polícia de Sobral não se interessou sobre o caso, e sobre o processo penal
foi alegado falta de diligências no expediente. Após a morte do Senhor Damião Ximenes,
foram relatados outros casos de mesma espécie na Casa de Repouso Guararapes, no entanto
pelo medo, não eram denunciados.
A prova documental apresentada pelos representantes da denunciante na Corte exibe
as declarações de um ex-paciente de Instituições Psiquiátricas que sofrera maus tratos da
época de sua internação, confirmando as alegações da denunciante sobre o acolhimento
precário das unidades psiquiátricas no Brasil. A comissão ainda demonstrou as alegações
verídicas de Irene Ximenes Lopes para investigação sobre o sistema de saúde psiquiátrico
brasileiro ao apresentar prova testemunhal de Francisco das Chagas Melo, ex-paciente da
referida Casa de Repouso de Guararapes que foi capaz de identificar as pessoas responsáveis
por cometer os atos de violências.
A respeito da necropsia realizada em Damião Ximenes Lopes após o laudo duvidoso
dos médicos, no momento da sua exumação, a perita proposta pelos representantes constatou
o crânio aberto, fato que constata que, a necropsia seguiu o procedimento comum, porém em
seu resultado não foi apresentado nenhuma descrição do cérebro, muito menos das lesões
apresentadas que deveria seguir os padrões de análise do protocolo de Istambul, que
caracteriza as lesões com mortes suspeitas.
Frente ao Artigo 4.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos6, e analisando ao
ocorrido ocasionando à morte do Senhor Damião Ximenes Lopes, alega os representantes que
o Estado foi omisso em não impedir a morte da vítima, bem como em não investigar
efetivamente o ocorrido, e ainda falho por não fiscalizar a Casa de Repouso Guararapes,
constata assim a violação a este artigo da Convenção.
Captado os maus-tratos na Casa de Repouso de Guararapes, nota-se também a
violação aos Artigos 5.1 e 5.2 da Convenção Americana de Direitos Humanos 7 do qual, os

6
“Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral,
desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente.” Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Costa Rica, 1969).
7
”Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua integridade física, psíquica e moral”. “Ninguém deve ser
submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada da liberdade
representantes alegam que Damião não teve sua integridade física, psíquica e moral
respeitadas, uma vez que, a vítima foi submetida a tratamentos degradantes por aqueles de
detinham sua custódia. A internação da vítima numa clínica psiquiátrica autorizado pelo SUS
deveria ser propiciada pelo cuidado e resguardo de sua saúde e de sua integridade pessoal,
mas não ocorreu.
As alegações dos representantes trazidas à Corte, também colocou em pauta a violação
do Artigo 8.1 da Convenção Americana 8 frente aos familiares de Ximenes Lopes, analisando
o descaso das autoridades nas denúncias realizadas, inclusive as irregularidades das
investigações policiais e a falta de responsabilização dos culpados pelo ocorrido. Transcorrido
o lapso temporal e havendo ainda a inércia do processo penal, constata-se o descumprimento
do Estado em prover a todos “as devidas garantias e dentro de um prazo razoável” nos termos
da convenção, tal qual o referido artigo.
Defende ainda que, quanto o exercício da jurisdição, a família de Damião Ximenes
Lopes, como parte interessada, não se manteve inerte em nenhum momento, utilizando de
todos os meios possíveis para cooperar com as investigações de forma ativa como assistente
do Ministério Público, e apenas esta ação não pode ser interpretada como um modo de
substituir a responsabilidade que o Estado possui em realizar uma investigação efetiva e
prover o direito as garantias judiciais.
Justifica ainda a demanda à Corte, que o Estado deve ser responsabilizado, visto que,
conforme o Artigo 1.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos, o Estado tem o dever
de respeitar os direitos e as liberdades constantes na Convenção, no entanto, feriu e
descumpriu deveres frente ao Senhor Damião Ximenes Lopes e aos pacientes da Casa de
Repouso Guararapes, utilizando da omissão para tratar os casos ocorridos.
Dispõe o Artigo 1.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos – Decreto nº 678
de novembro de 1992:

Os Estados Partes nesta Convenção comprometem-se a respeitar os direitos e


liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa
que esteja sujeita à sua jurisdição, sem discriminação alguma por motivo de raça,
cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem

deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano.” Convenção Americana sobre
Direitos Humanos (Costa Rica, 1969).
8
Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou
tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer
acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil,
trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Costa Rica,
1969).
nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição
social. (1992, s/n9)

Desse modo, a fim de finalizar as alegações frente a Corte, conforme se observa no


Artigo 63.110 da Convenção Americana de Direitos Humanos, quando houver prejuízo
oriundo de uma violação de direito ou liberdade, cabe ao prejudicado a reparação das
consequências na medida dos danos causados.
Observado isso, alegam por fim a reparação do Estado, quanto: aos danos materiais,
vista as despesas de transporte entre os municípios de Sobral e Fortaleza, bem como o
transporte do corpo da vítima para necropsia, o sepultamento de Damião Ximenes Lopes e os
medicamentos e prejuízos materiais causados para com os familiares afetados
emocionalmente pela perda do ente; aos danos imateriais, em que se destacam os de cunho
emocional, ocasionados pelo sofrimento dos familiares e pelo desgaste mental e emocional ao
almejo de justiça; as custas e despesas para o cumprimento das diligências necessárias; e
ainda, a reparação sem cunho valorativo a fim de regularizar, fiscalizar e adequar as clínicas
psiquiátricas no país, para que, casos como o de Ximenes Lopes não fiquem esquecidos, sem
responsabilização e não voltem a se repetir.

3.2 Defesa apresentada pelo Estado brasileiro

Os peticionários da ação demandaram uma investigação séria, íntegra e satisfatória por


parte do Estado brasileiro, concernentes a todos os fatos pertinentes à morte de Damião, na
busca de estipular responsabilidade a todos os envolvidos, direta ou indiretamente, seja por
ação ou omissão, juntamente com a punição efetiva dos membros. Por esse motivo, solicitou-
se à Corte, consoante a Jurisprudência (2014), referente ao caso em tela, além de medidas nas
quais deveriam ser tomadas pelo Estado, para a garantia da não reincidência de tratamentos de
crueldade, barbaridade e degradação de situações psiquiátricas.

9
BRASIL, Decreto Nº 678, de 6 de novembro de 1992. Dispõe sobre, Promulga a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em 26 maio 2019.
10
Quando decidir que houve violação de um direito ou liberdade protegidos nesta Convenção, a Corte
determinará que se assegure ao prejudicado o gozo do seu direito ou liberdade violados. Determinará também,
se isso for procedente, que sejam reparadas as conseqüências da medida ou situação que haja configurado a
violação desses direitos, bem como o pagamento de indenização justa à parte lesada. Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Costa Rica, 1969).
O Estado brasileiro então interpôs uma exceção preliminar de não esgotamento dos
recursos internos, em que indagou quanto à regularidade do procedimento diante da
Comissão, acionando o artigo 46 da Convenção Americana de Direitos Humanos 11, além de
uma contestação frente à demanda apresentada, conforme ostentado na Jurisprudência (2014).
Nas datas do dia 30 de novembro e 1º de dezembro de 2005, em audiência pública
promovida na Corte Interamericana, o Estado brasileiro assentiu quanto aos maus-tratos
ocorridos para com a vítima Ximenes Lopes, antes da sua morte, resultando em violação ao
artigo 5 da Convenção, exceto quanto ao reconhecimento referente a sua responsabilidade
internacional pela provável transgressão normativa disposta nos artigos 8, quanto às garantias
judiciais, e 25, proteção judicial, do aludido diploma legal, em detrimento dos familiares da
vítima. Todavia, na presente audiência, houve negatória do provimento, por parte da Corte, à
exceção preliminar interposta pelo Estado, à exceção preliminar interposta pelo Estado,
Jurisprudência (2014, p.139).
O Estado brasileiro salientou, ainda acerca das alegações de violação dos artigos 8.1 e
25.1 da Convenção, que houve demonstração de austeridade na busca da justiça, sendo ela
demonstrada de forma devida na instrução do caso, concomitantemente com a exposição dos
eventos e alegações ostentadas na contestação da demanda, descrevendo-se todas as medidas
exercidas pelo Estado na investigação das circunstâncias do óbito do senhor Damião Ximenes
Lopes e na sanção dos responsáveis tanto pelos maus-tratos quanto pelo falecimento do
presente paciente na Casa de Repouso Guararapes.
Houve ainda, consoante defesa apresentada, a adoção de todas as medidas por parte do
Estado na responsabilização dos causadores do falecimento da vítima na esfera penal. Não
obstante, segundo o Estado brasileiro, devem ser observadas, na esfera supramencionada, as
garantias fundamentais dos acusados.
Ao que tange a efetividade investigativa, a defesa alega que não há a presença de
violação por parte do Estado, em que as funções relacionadas às investigações de acusação,

11
 Para que uma petição ou comunicação apresentada de acordo com os artigos 44 ou 45 seja admitida pela
Comissão, será necessário: a. que hajam sido interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com
os princípios de direito internacional geralmente reconhecidos; b. que seja apresentada dentro do prazo de seis meses,
a partir da data em que o presumido prejudicado em seus direitos tenha sido notificado da decisão definitiva; c. que a
matéria da petição ou comunicação não esteja pendente de outro processo de solução internacional; e d. que, no caso
do artigo 44, a petição contenha o nome, a nacionalidade, a profissão, o domicílio e a assinatura da pessoa ou pessoas
ou do representante legal da entidade que submeter a petição. 2.As disposições das alíneas a e b do inciso 1 deste
artigo não se aplicarão quando: a.   não existir, na legislação interna do Estado de que se tratar, o devido processo
legal para a proteção do direito ou direitos que se alegue tenham sido violados; b não se houver permitido ao
presumido prejudicado em seus direitos o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver sido ele impedido de
esgotá-los; e c. houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos. Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Costa Rica, 1969).
bem como de defesa e decisórias são operadas por órgãos distintos e autônomos. Do mesmo
modo, defende que a possível omissão probatória na investigação policial, não ocasionou
prejuízo, visto que as mesmas poderiam ser supridas em juízo. Assim sendo, as presentes
provas foram suficientes para certificar ao Ministério Público a presença de materialidade
delitiva e indícios de uma autoria.
O Estado reitera, portanto, que não houve violação das disposições presentes nos
artigos 8 e 25 da Convenção Americana de Direitos Humanos, uma vez que as investigações
atinentes ao falecimento do senhor Damião Ximenes Lopes observaram as decisões legais,
considerando-se os princípios do processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
Quanto à morosidade do processo penal é considerada razoável, por basear-se na
pretensão da verdade real, na complexidade do pleito e nas singularidades do processo penal
brasileiro.
Em relação às reparações, a defesa do Estado alegou que não há de se falar em
reparação relativa aos familiares do senhor Damião, exceto quanto à senhora Albertina Viana
Lopes, na qual já foi reparada civil e simbolicamente ao que tange ao dano moral por ela
sofrido. Concernente ao dano material defende-se que não houve perda patrimonial ou lucro
cessante por parte da senhora Albertina, visto que recebe uma pensão mensal e vitalícia por
morte, do Instituto Nacional do Seguro Social, na qual só é atribuída às pessoas dependentes
financeiramente do falecido, não cabendo, portanto, aos demais familiares, pelo fato destes
possuírem renda própria, não dependendo economicamente do senhor Damião.
No tocante aos danos emergentes, o Estado brasileiro alega a sua inexistência, já que o
processo penal foi viabilizado pelo Ministério Público, e quanto à ação civil reparadora de
danos, foi litigada pela senhora Albertina de modo gratuito.
Ao contrapor-se aos gastos em que incorreram os familiares da vítima, o Estado
defendeu que aqueles foram exercidos de forma voluntária, na qual afasta a obrigação
indenizatória por parte do Estado brasileiro. Ademais, houve a concessão do estado do Ceará,
à senhora Albertina, de uma pensão mensal e vitalícia valorada em R$308,00 (trezentos e oito
reais), correspondente ao salário mínimo do estado cearense, sendo ajustado pelo mesmo
índice de revisão geral aplicado aos servidores públicos estaduais. A presente pensão
contribui no orçamento familiar, sendo perfeitamente adequada como compensação pelo dano
padecido, sem que haja a caracterização de enriquecimento sem causa.
Concernente ao dano imaterial, trazido nas alegações dos representantes, a defesa
informou que o pedido da aludida reparação, foi direcionado contra particulares e não contra o
Estado, em que esse processo foi suspenso, uma vez que deveria aguardar o resultado da ação
penal. Reiterou-se ainda, que poderia ocorrer o instituto bis in idem, na possibilidade de
condenação na ação civil, na qual haveria o pagamento indenizatório, juntamente com a
possível condenação pela Corte ao Estado brasileiro, a mais um pagamento de indenização
por danos morais à senhora Albertina, sendo o mesmo dano, portanto, reparado duas vezes.
Ao referir-se ao senhor Cosme Ximenes Lopes, irmão de Damião, o Estado declarou
que não há reparação de danos imateriais, pelo fato de que aquele não tomou conhecimento
do óbito deste, e com isso, não há aplicação de reparação quanto aos danos morais com base
no desconhecido. Já a senhora Irene Ximenes Lopes, também irmã da vítima, não foi reparada
quanto ao aludido dano, pelo motivo de que não foi considerada parte diretamente lesada, pois
não possuía relação próxima com o senhor Damião. Ao pai, senhor Francisco Leopoldino
Lopes, não foi reconhecido relação familiar com o filho falecido, não podendo ser, por
conseguinte, beneficiário de indenização alguma por dano imaterial.
A defesa justificou também, que pelo fato do falecido ter nove irmãos, não seria justo
conceber o pagamento apenas a dois deles, em consideração à noção de “justiça justa”,
Jurisprudência (2014, p.189), devido à impossibilidade de mensurar a dor da família
decorrente da morte de um ente, a ponto de utilizarem-se dos mesmos critérios para a
reparação da dor moral resistida por um irmão e a do dano psíquico dos demais.
Não obstante, o Estado reconheceu os danos morais, juntamente com o dever de
indenização material para com a mãe do senhor Damião, efetuando assim, o pagamento de
uma indenização justa no âmbito interno, por meio de uma pensão mensal e vitalícia estadual,
em conjunto com a federal e vitalícia por morte, devendo ocorrer, por isso, apreciação por
parte da Corte. E pelo motivo da senhora Albertina já ter sido alcançada pela reparação do
dano moral e civil ocasionados, os demais familiares da vítima apontados tanto pela Comissão
quanto pelos representantes, são automaticamente atingidos pelas demais formas de
reparação.
No tocante as outras formas de reparação, o Estado afirmou ter admitido todas as
diligências esperadas de um Estado Democrático de Direito, para que não mais ocorra a
reincidência de situações semelhantes ao ocorrido com o senhor Damião Ximenes Lopes.
Acrescentou ainda, a tomada de medidas consideráveis no município de Sobral, a exemplo de
unidades especializadas no tratamento de portadores de enfermidades diversas, a aprovação
da Lei nº 10.216/2001, – Lei de Reforma Psiquiátrica – um seminário sobre o Direito à Saúde
Mental, além de implementar vários programas voltados aos serviços de saúde.
Na defesa pelo não ressarcimento de custas e despesas aos familiares do senhor
Damião, alegou-se que não houve “despesas com a tramitação deste caso, seja perante a
Comissão, ou perante este Tribunal, e caso isso tenha ocorrido, não foram elas comprovadas”,
consoante Jurisprudência (2014, p.190).
Por fim, o Estado brasileiro destacou que realizou reparações simbólicas ao modificar
a nomenclatura do Centro de Atenção Psicossocial de Sobral (CAPS), para Centro de Atenção
Psicossocial Damião Ximenes Lopes, na busca de homenagear a vítima, na Terceira
Conferência Nacional de Saúde Mental, ocorrida na sala denominada Damião Ximenes
Lopes, juntamente com a declaração pública em audiência perante a Corte, de reconhecimento
parcial quanto a sua responsabilidade internacional por violar direitos consagrados na
Convenção Americana, em seus artigos 4 e 5.
4 ATUAÇÃO DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS

Ramos (2004) pontua-se que o direito internacional dos direitos humanos resguarda
um conjunto de direitos no qual protege a dignidade da pessoa humana, bem como,
privilegiam as garantias internacionais.

Diante do cenário internacional fica mais evidente a violação dos direitos


essenciais à dignidade humana. Além disso, antes a responsabilidade do estado se pautava
apenas entre os conflitos estado vs estado, entretanto com as revoluções no âmbito
internacional, percebeu-se que tais conflitos afetava não somente o estado mas também
observou-se a necessidade de trazer uma proteção também os indivíduos nacional.

Ramos (2004) ainda reitera que a responsabilidade do estado no que tange a violação
de direitos humanos é objetiva, o mesmo ainda dispõe que toda vez que houver violação de
uma norma internacional, necessariamente surge o dever de reparação pelo estado.

Neste sentido, observa-se que o caso em questão, Ximenes vs Brasil, alguns direitos
foram violados pelo estado Brasileiro, pontua-se que em observância ao artigo 62.3 a Corte é
o órgão competente para julgar o estado brasileiro, visto que, o citado estado faz parte da
convenção Americana desde 25 de setembro de 1992 e reconheceu também no ano 1998
competência contenciosa da corte.

No que tange o referido caso, de acordo com a Corte (2006) 12 no dia primeiro de
outubro de 2004 em conformidade com os dispositivos 50 e 61da convenção Americana, a
comissão interamericana de direitos humano levou ate a corte aquele demanda contra o estado
brasileiro e que por consequência resultou na denuncia de numero 12.237, denúncia esta, que
foi acolhida pela secretaria da comissão no dia vinte dois de novembro de 1999. Tal demanda
foi apresentada com a finalidade de que a corte resolvesse acerca da responsabilidade do
estado brasileiro diante da violação de alguns direitos descritos na Convenção Americana.

4.1 Indicação de direitos violados


12
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 20 maio 2019.
Diante de tudo que foi exposto, no que diz respeito ao caso Ximenes Lopes, percebe-
se a violação de alguns direitos prevista na convenção Americana, tais como, o direito a vida,
direito a integridade pessoal, as garantias judiciais, bem com, a proteção judicial. Interessante
dizer que todos estes direitos estão ligados com o artigo 1.1 da convenção, ou seja, a
obrigação de respeitar os direitos, o mencionado artigo dispõe:

Os Estados-Partes nesta Convenção comprometem-se a respeitar os direitos e


liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa
que esteja sujeita à sua jurisdição, sem discriminação alguma por motivo de raça,
cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem
nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição
social.13

Nesta mesma perspectiva, se faz necessário uma análise mais detalhada dessas
violações, a corte atestou que houve violação do artigo 4º, qual seja o direito a vida,
segundo a corte o Brasil não resguardou a vida de Damião, o referido artigo diz:

Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser
protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser
privado da vida arbitrariamente14.

Segundo a corte (2006) tal violação só foi perceptível porque houve a morte do Sr.
Ximenes, em sua alegação esta alegou que o estado brasileiro foi descuidado, uma vez que
não exerceu seu papel de vigilante na casa repouso onde se encontrava o senhor Damião.
Conforme prevista na Convenção Americana o mencionado direito é direito humano
fundamental, que deve ser respeito e não admite nenhum cerceamento. Ressalta que é dever
do Estado garantir que os direitos fundamentais de cada indivíduo sejam respeitados, além
disso, a Corte atestou que morte do Sr. Ximenes ocorreu devida aos maus tratos e por causa
de mas condições de funcionamento da casa de repouso Guararapes, além do mais, no que
tange ao atendimento do médico, no caso citado, houve restrição, sendo que é dever do estado
prestar um tratamento adequado para que pessoa humana se tenha uma vida digna15.

13
BRASIL, Decreto Nº 678, de 6 de novembro de 1992. Dispõe sobre, Promulga a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em 26 maio 2019
14
BRASIL, Decreto Nº 678, de 6 de novembro de 1992. Dispõe sobre, Promulga a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em 26 maio 2019
Outro artigo violado no caso, diz respeito ao artigo 5 º em relação ao artigo 1.1 da
Convenção da Americana que diz:

5.1 Toda pessoa tem o direito de que se respeito sua integridade física, psíquica e
moral.
5.2 Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos
ou degradantes. Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com o respeito
devido à dignidade inerente ao ser humano.16

A corte Americana (2006) traz de forma expressa a proteção ao direito à integridade, e


diante das alegações das Corte, o estado não respeito e nem garantiu este direito ao senhor
Ximenes.
Além do que, o ficou atestado pela corte que as condições hospitalares onde ele ficou
na casa de repouso não era digno para uma pessoa, visto que, ele foi internado onde não tinha
condições de proporcionar-lhe um tratamento humano, de acordo com a Corte a vítima foi
sujeitado há um tratamento precário e desumano, ademais, frisa que as pessoas que se
encontravam naquele local, estavam sobre a eminencia de violência, isto porque ali não
tinham pessoas qualificadas para cuidar de pessoas com deficiência mental. Interessante dizer
que além da violência física, havia também as condições de precariedade, no que diz respeito
à conservação e manutenção de higiene, e ainda de um amparo medico, sendo perceptível a
violação a dignidade humana17.
Para adentrar ao assunto dos direitos violados, vale transcrever abaixo a letra da lei
disposta nos respectivos arts. 8.1 e 25.1 da Convenção Americana, que aduzem:

8.1 Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um
prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial,
estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal
formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de
natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.

15
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 20 maio 2019.
16
BRASIL, Decreto Nº 678, de 6 de novembro de 1992. Dispõe sobre, Promulga a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em 26 maio 2019
17
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 25 maio 2019.
25.1 Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro
recurso efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a proteja contra atos
que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela constituição, pela lei ou
pela presente Convenção, mesmo quando tal violação seja cometida por pessoas que
estejam atuando no exercício de suas funções oficiais.

Destaque-se que a natureza objetiva dessas supracitadas obrigações legais de proteção


de direitos humanos, consagra a proteção do indivíduo cidadão como foco principal da
responsabilidade internacional do Estado por violação de direitos humanos. Nesse sentido, e
conforme Ramos (2004), os tratados de direitos humanos que incumbem aos Estados o dever
de proteger e garantir os direitos declarados naquele tratado, não há nenhuma menção do
elemento "culpa" no que tange à caracterização da responsabilidade internacional do Estado.
Desta maneira, mesmo não incorrendo em culpa, inobservando qualquer premissa o
Estado comete a violação de direitos humanos, sendo que o fundamento da responsabilidade
internacional deste Estado recai justamente sobre a inobservância do direito previsto na norma
internacional.
Voltando ao tema principal em questão, isto é, aos artigos 8.1 e 25.1 da Convenção
mencionados, eles estabelecem respectivamente que o Estado deve prestar um tratamento
jurisdicional eficaz ao indivíduo que teve o seu direito lesado, oferecendo-o uma tramitação
processual de duração razoável perante um tribunal ou juiz; prevendo ainda o amplo direito ao
recurso facilitado e efetivo, de maneira tal que resguarde o indivíduo de ameaças de violação
e violações aos seus direitos fundamentais, reconhecidos constitucionalmente ou pela própria
convenção.
Conforme as declarações da Corte (2006)18, houve a violação dos direitos do senhor
Damião Ximenes, previstos nos artigos citados, devido ao fato de que o trâmite processual, da
ação penal movida com vistas à resolução do caso violatório, estendeu-se por um longo
tempo, estando pendente após um período de seis anos. Além disso, a sentença reparatória
cível ainda não tinha sido prolatada.
Assim, com base em análises aprofundadas, a despeito do procedimento investigatório
policial e do processo penal, a Corte19 chegou à conclusão de que o Estado falhou de maneira
grave em sua incumbência de resguardar e respeitar os direitos fundamentais do Sr. Damião
Ximenes, não lhe protegendo a vida e nem impedindo os atos de violência praticados no
18
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 27 maio 2019.
19
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 20 maio 2019.
recinto da tortura, que era denominado de "casa de repouso". Nestas análises, foi constatado
que o médico Francisco Ivo de Vasconcelos, diretor clínico à época, era conhecedor de todas
as condições e práticas cruéis realizadas na instituição Casa de Repouso Guararapes.
Ocorrendo o óbito de Damião Ximenes, o médico examinou o corpo e ocultou a causa mortis
da vítima, não descrevendo as lesões externas sofridas.
Quanto à violação do art. 25.1 da Convenção, a Corte (2006) comprovou a leniência
do Estado em relação ao trâmite processual, que foi arrastado por anos, mesmo com a assídua
cooperação da família do Sr. Damião Ximenes, vítima de uma transgressão implicitamente
"permitida", pelo descaso total do Estado.
Assim, a Corte (2006, p. 68) concluiu que o Estado:

não proporcionou aos familiares de Ximenes Lopes um recurso efetivo para garantir
o acesso à justiça, a determinação da verdade dos fatos, a investigação,
identificação, o processo e, se for o caso, a punição dos responsáveis e a reparação
das consequências das violações.

Desta feita, foi constatada a responsabilidade do Estado pelos atos violatórios em


desfavor dos direitos fundamentais constitucionais do Sr. Ximenes, causando-lhe grande
sofrimento físico que culminou em sua morte, bem como os direitos às garantias judiciais e
proteção judicial, relacionados ao art. 1.1 da Convenção20, que não foram prestados aos
familiares da vítima na busca pela resolução do caso e pela justiça.

4.2 Sentença

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos submeteu à Corte a estudada


demanda contra a República Federativa do Brasil, em 1999. Prolatou sentença em 04 de julho
de 2006, constituindo, uma forma de reparação. Neste ponto, foi analisado o óbito do Sr.
Damião Ximenes Lopes priorizando as disposições legais da Convenção Americana de
Direitos Humanos, de 1969. Desta forma, por unanimidade de votos, ficou decidido na
sentença:

20
“Os Estados-Partes nesta Convenção comprometem-se a respeitar os direitos e liberdades nela reconhecidos e
a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que esteja sujeita à sua jurisdição, sem discriminação alguma
por motivo de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional
ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social”. Convenção Americana sobre
Direitos Humanos (Costa Rica, 1969).
Admitir o reconhecimento parcial da responsabilidade internacional efetuado pelo
Estado pela violação dos direitos à vida e à integridade pessoal consagrados nos
artigos 4.1, 5.1 e 5.2 da Convenção Americana, em relação com a obrigação geral de
respeitar e garantir os direitos estabelecida no artigo 1.1 deste tratado, em detrimento
do senhor Damião Ximenes Lopes, nos termos dos parágrafos 61 a 81 da presente
sentença.21

Como se vê, a Corte Interamericana, no exercício de sua função litigiosa, aplicou e


interpretou a Convenção Americana e, quando um caso foi submetido a sua jurisdição, tem a
faculdade de declarar a responsabilidade internacional de um Estado-Parte na Convenção por
violação de suas disposições. Nesse sentido, Ramos (2004, p. 410) disciplina:

A responsabilidade internacional do Estado por violação de direitos humanos é,


inegavelmente, uma responsabilidade objetiva. O cerne deste instituto está no dever
de reparação que nasce toda vez que houver uma violação de uma norma
internacional. Basta a comprovação do nexo causal, da conduta e do dano em si.

Deste modo, ressalta-se que responsabilidade direcionada ao Brasil foi fundamentada


com o art.1.1 da Convenção Americana, artigo este que versa sobre os direitos a serem
preservados pelos Estados-Partes em detrimento das pessoas sujeitas à sua jurisdição.
Acrescenta-se que foi indicada as violações cometidas pelo país, que enfrentavam os arts. 4º,
que versa sobre o direito à vida, 5º, que trata-se do direito à integridade pessoal), 8º, que
corresponde à Garantias Judiciais, e, por fim, o artigo 25, que elucida acerca da Proteção
Judicial, todos os artigos do mesmo texto legal.
No que tange os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla
defesa, observa-se que foram desconsiderados frente as Sras. Albertina Viana Lopes e Irene
Ximenes Lopes Miranda, familiares do Sr. Damião Ximenes Lopes. A Corte Interamericana
(2006) constatou que o Brasil não proporcionou um recurso efetivo para garantir o acesso à
justiça, a determinação da verdade dos fatos, a investigação, identificação, o processo e,
ainda, capaz de punir os responsáveis e, ainda, propor uma reparação justa as consequências
das violações cometidas pelo Estado. Desta forma, o Juiz da corte Antônio A. Cançado
Trindade, relatou sobre a inércia do Estado brasileiro frente ao caso exposto, em seu voto
destacou “O direito de acesso à justiça lato sensu pressupõe o entendimento de que trata de
direito à pronta prestação jurisdicional. Sua fiel observância não se constatou no presente caso
Ximenes Lopes, como se depreende claramente dos próprios fatos”. Logo, restou-se

21
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 27 maio 2019.
incontroverso a morosidade do Estado de ofertar a devida prestação jurisdicional, por ele
responsável.
Além disso, o Brasil foi julgado pela Corte, também em relação a sua responsabilidade
particular, no que tange a supervisão e fiscalização do poder público. Isto é, a Corte entendeu
que é responsabilidade do Estado-parte criar meios de regularização, bem como fiscalizar os
atos realizados pelas entidades públicas e privadas, quando estas prestarem serviço na área da
saúde. Neste sentido, a Corte (2006, p.26) 22 aduz que “a falta do dever de regular e fiscalizar
gera responsabilidade internacional em razão de serem os Estados responsáveis tanto pelos
atos das entidades públicas quanto privadas que prestam atendimento de saúde”. Destaca-se
que no caso em questão, tratava-se de instituição médica privada que prestava serviço por
delegação do Estado, através do SUS, Sistema Único de Saúde, o que incidiu, diretamente, a
responsabilidade do Estado diante das inobservâncias do direito universal de proteção à saúde.
No caso do Sr. Damião Ximenes Lopes, a Corte, em sua sentença, ainda ponderou
acerca da abstenção pelo Brasil com as violações dos direitos humanos de pessoas com
doença mental, requerendo do Estado a adoção de medidas positivas, em favor das
necessidades particulares de proteção do indivíduo. Deste modo, decidiu:

Ficou provado neste caso que no momento dos fatos não se dispensava adequada
atenção ao tratamento e internação de pessoas portadoras de deficiência mental,
como no caso da Casa de Repouso Guararapes, instituição que oferecia esse serviço
no Sistema Único de Saúde. Embora se destaque o fato de que o Estado adotou
diversas medidas destinadas a melhorar esse atendimento, este Tribunal considera
que o Estado deve continuar a desenvolver um programa de formação e capacitação
para o pessoal médico, de psiquiatria e psicologia, de enfermagem e auxiliares de
enfermagem, bem como para todas as pessoas vinculadas ao atendimento de saúde
mental, em especial sobre os princípios que devem reger o tratamento a ser
oferecido às pessoas portadoras de deficiência mental, de acordo com as normas
internacionais sobre a matéria e as dispostas nesta Sentença. 23

Ademais, quanto à reparação civil do dano causado, a Corte impôs obrigações de


pagar por dano material e moral.
Ficou decidido a condenação em que o Estado pagaria o reembolso no valor de
US$10.000,00 (dez mil dólares dos Estados Unidos da América) ou seu equivalente na moeda
brasileira, que ficou devido à Albertina Viana Lopes, a fim de compensar as despesas em que
incorreram os familiares de Damião.
22
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 27 maio 2019.
23
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 27 maio 2019.
Ao Sr. Damião Ximenes Lopes, o Estado foi condenado a pagar a quantia de
US$50.000,00 (cinquenta mil dólares dos Estados Unidos da América). Que ficou dividido
entre as Sras. Albertina Viana Lopes (genitora do Damião) e Irene Ximenes Lopes Miranda
(irmã), e os Srs. Francisco Leopoldino Lopes (genitor) e Cosme Ximenes Lopes (irmão).
Além disso, a Corte condenou o Brasil ao pagamento de cada familiar uma quantia por
dano moral. Nestes termos, aplicou em favor de Albertina Viana Lopes (genitora do Damião)
a condenação no valor de US$25.000,00(vinte e cinco mil dólares), a Francisco Leopoldino
Lopes (genitor do Damião) a quantia de US$10.000,00(dez mil dólares), a Irene Ximenes
Lopes Miranda, irmã da vítima, o valor de US$25.000,00(vinte e cinco mil dólares) e, por
fim, a Cosme Ximenes Lopes, o importe de US$10.000,00(dez mil dólares). Insta salientar
que todos os valores ora mencionados tratam-se de dólares dos Estados Unidos da América,
que podem ser substituídos por quantia equivalente na moeda pátria brasileira.
A Corte acolheu, como justificativa para a condenação por dano imaterial, o parecer
demonstrado pela Comissão Interamericana que elucidou o fato de estar provado que o Sr.
Damião Ximenes Lopes, que:

não recebeu assistência médica nem tratamento adequados como paciente portador
de deficiência mental, que por sua condição era especialmente vulnerável e foi
submetido a tratamentos cruéis desumanos e degradantes enquanto esteve
hospitalizado na Casa de Repouso Guararapes, situação que se viu agravada com sua
morte.24

Assim, a partir da intimação da sentença, a Corte concedeu ao Brasil o prazo total de


1(um) ano para cumprimento integral da sentença, além de apresentar relatório sobre as
medidas impostas, se foram adotadas, tendo por finalidade o cumprimento integral das
reparações impostas.

4.3 Cumprimento de sentença e acompanhamento de medidas

Antes de adentrar de fato quanto ao cumprimento ou não da sentença proferida, far-se-


á necessário enfatizar alguns aspectos previstos na Convenção Americana de Direitos
Humanos, convenção esta que o Brasil é Estado-parte.
Observa-se que no artigo 65 da Convenção Americana, tem-se:

24
CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. 2006. Caso Ximenes Lopes vs . Brasil. Sentença
de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em:< https://www. corteidh.or.cr/docs/
casos/articulos/seriec_149 _por.pdf>. Último acesso em: 29 maio 2019.
A Corte submeterá à consideração da Assembléia-Geral da Organização, em cada
período ordinário de sessões, um relatório sobre suas atividades no ano anterior. De
maneira especial, e com as recomendações pertinentes, indicará os casos em que um
Estado não tenha dado cumprimento a suas sentenças.25

Partindo neste pressuposto, a Corte deverá enviar à Assembleia Geral da Organização


dos Estados Americanos um relatório das suas atividades no ano anterior, indicando,
inclusive, os acontecimentos em que algum Estado cumpriu, não tenha dado início ao
cumprimento ou que tenha cumprido parcialmente suas sentenças e, ainda, se foram
observadas as recomendações pertinentes.
Neste sentido, nota-se que o cumprimento da sentença pelos Estados partes, não se
limitam apenas às condenações e obrigações, mas também aos atos processuais e
recomendações indicadas, direcionando o dever de cumprimento a integralidade do disposto
nas sentenças proferidas pelos Tribunais internacionais.
Agregado a isso, o artigo 68.1 da Convenção Americana de Direitos Humanos,
confirma que “os Estados-Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da
Corte em todo caso em que forem partes” 26. Deste modo, o Estado-parte acolhe e,
consequentemente, obriga-se a cumprir toda sentença que lhe for submetida, nos casos de
violação dos direitos e liberdades pactuados.
No caso em questão, Ximenes Lopes vs. Brasil, observa-se que desde a publicação da
sentença, proferida no dia 04 de julho de 2006, até a presente data decorreu o período superior
há 12 anos. A publicação da sentença foi realizada no dia 17 de agosto de 2006, dando início
ao decorrer do prazo de cumprimento dos 07(sete) pontos resolutivos elucidados no texto
condenatório. Ressalta-se que foi dado ao Brasil o período de 01(um) ano a contar da
publicação para que fosse integralmente cumprida a sentença e dado como por concluído o
caso.
Entretanto, há uma contumaz inércia do Estado Brasileiro no que diz respeito ao
cumprimento integral da sentença imposta. Visto que, apesar do decorrer do tempo, até a
presente data não foi cumprida tais medidas em sua totalidade.
Em 14 de agosto de 2007, por intermédio do Decreto de nº 6.185/07, foi autorizado a
Secretaria Especial dos Direitos Humanos a dar início ao cumprimento da sentença e, pagar o
25
BRASIL, Decreto Nº 678, de 6 de novembro de 1992. Dispõe sobre, Promulga a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em 27 maio 2019.
26
BRASIL, Decreto Nº 678, de 6 de novembro de 1992. Dispõe sobre, Promulga a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em 26 maio 2019
valor indenizatório aos familiares de Damião Ximenes Lopes, no valor calculado em
US$146.000,00 (cento e quarenta e seis mil dólares), bem como as custas processuais do
litígio, o que foi pago.
Foi instaurado ação civil em desfavor da casa de Repouso Guararapes, entretanto,
mesmo com a condenação, de acordo com Almeida (2016, s/n):

A Casa de Repouso Guararapes, o médico Francisco Ivo de Vasconcelos e o diretor


clínico, Sérgio Antunes Ferreira Gomes, foram condenados - em ação cível -, pela
Justiça do Ceará a pagar R$150 mil de indenização aos familiares de Damião
Ximenes, pagamento que ainda não foi efetivado27.

Outrossim, como afirma Loureiro (2008), houve cumprimento no sentido de publicar


os Capítulos VII e XII da sentença no Diário Oficial da União. Contudo, há ações que
deveriam ser totalmente executadas pelo Estado brasileiro, mas que se encontram em
cumprimento parcial até a presente data.
Tal parcialidade é vista no caso de investigar os fatos nos processos em tempo
razoável para a família Ximenes Lopes, de acordo com Rosato e Correia (2011), de modo que
evite as longas demoras e, consequente, ineficácia do sistema jurídico brasileiro. Ainda que o
tempo razoável do processo seja previsão da própria Constituição Federal, como afirma
Loureiro (2008), depende também do interesse político de tornar tal procedimento mais
célere. É notável que os processos judiciais brasileiros tem um período de duração longínqua.
Além disso, outra recomendação que não foi cumprida em sua totalidade é seu dever
para com toda a população brasileira de “estabelecer programas de capacitação para
profissionais que atuam em saúde mental”, segundo Rosato e Correia (2011, s/n), que, apesar
de ser de grande interesse social, ainda tem sido desassistido pelo Estado Brasileiro.

27
ALMEIDA, Valdir. Caso Damião: 1ª condenação do Brasil na OEA completa 10 anos.
Publicado em: 30/08/2016. Disponível em: <http://g1.globo.com/ceara/noticia/2016/08/caso-
damiao-1-condenacao-do-brasil-na-oea-completa-10-anos.html>. Acesso em: 21 maio. 2019.
5 CONCLUSÃO

Diante o exposto é possível concluir que o caso Damião Ximenes Lopes foi um marco
com relação à atuação da Corte Interamericana de Direitos Humanos e, a aplicação à
Convenção Americana de Direitos Humanos, haja vista que foi a primeira condenação sofrida
pelo Brasil, como decorrência de violações a direitos humanos.

A Corte ao condenar o Estado Brasileiro, demonstra presente a violação dos direitos


essenciais à dignidade humana, por parte do Brasil. Além disso, anteriormente a
responsabilidade do Estado se pautava apenas entre conflitos de Estado vs Estado, porém com
as revoluções no âmbito internacional percebe-se que tais conflitos não afetava somente o
Estado, mas também aos indivíduos. Houve uma maior observância da necessidade de trazer
uma proteção aos indivíduos nacionais.

Por fim, referente ao Caso Damião Ximenes Lopes, a Corte declarou que houve não só
violação dos direitos à integridade pessoal da vítima como também da sua família. Ademais, não
houve cumprimento pelo Estado Brasileiro das determinações realizadas pela Corte, todavia,
tal descumprimento não descaracteriza o avanço que significou a presente decisão no cenário
jurídico interno e externo.
REFERÊNCIA

ALMEIDA, Valdir. Caso Damião: 1ª condenação do Brasil na OEA completa 10 anos.


Publicado em: 30/08/2016. Disponível em: <http://g1.globo.com/ceara/noticia/2016/08/caso-
damiao-1-condenacao-do-brasil-na-oea-completa-10-anos.html>. Acesso em: 21 maio. 2019.

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de agosto de 2007. Disponível em
<https://presrepublica.jusbrasil.com.br/legislacao/94566/decreto-6185-07 >. Acesso em 26
maio 2019.

BRASIL, Decreto Nº 678, de 6 de novembro de 1992. Dispõe sobre, Promulga a Convenção


Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de
novembro de 1969. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/ D06
78.htm>. Acesso em 26 maio 2019.

CIDH, Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Convenção Americana sobre


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maio. 2019.

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Brasil. Sentença de 04 de julho de 2006. Mérito, Reparações e Custas. Disponível em: <
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