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(Artigo) Barbosa Amadeo Sociologia Da Musica Gravada Musicologia Produtor Musical
(Artigo) Barbosa Amadeo Sociologia Da Musica Gravada Musicologia Produtor Musical
Apresentação
O presente texto apresenta enfoque específico de pesquisa mais ampla que busca
colaborar com o desenvolvimento de uma sociologia da música gravada no Brasil.
Propõe uma reflexão sobre elementos do trabalho de um dos agentes que tem posição
central nessa arena: o produtor musical. Atuando na fronteira entre arte e economia,
entre música e business, sua atividade atual se transforma substancialmente dadas as
radicais mudanças vividas no âmbito dos registros fonográficos a partir do advento das
tecnologias digitais. Quando sua atividade estava restrita aos quadros das grandes
empresas do setor, o produtor musical administrava e acompanhava tecnicamente todas
as etapas da feitura dos discos (dispostas nas áreas artística, técnica, comercial e
industrial1), participando das decisões sobre os discos que seriam realizados, da escolha
do repertório, das transformações estéticas a serem estrategicamente propostas ao perfil
de determinados artistas, sempre com a responsabilidade de realizar os projetos
cumprindo rigorosamente o orçamento previsto. Assim, além da dimensão propriamente
empresarial, pela via da proposição de conteúdos, o produtor musical atuava de forma
intensa e decisiva no processo de formação do gosto e das referências musicais,
efetivados a partir dos processos e mecanismos próprios à grande mídia. Um conjunto
denso de contradições sempre fundamentou, portanto, o trabalho do produtor musical,
contradições estas que traduziam várias dimensões de todo o processo. O acesso
irrestrito às tecnologias digitais de produção e difusão tem agregado novos elementos ao
trabalho do produtor, transformando-o. Expandida para além dos quadros formais das
grandes gravadoras, sua atividade atual pode tanto tomar a forma tradicional acima
apontada, como pode mesclar-se à atuação do artista/ músico, ora de posse da condução
das formas de registro de seu trabalho, ou pode ainda permitir ao produtor tornar-se ele
mesmo o artista. A análise busca explorar alguns pontos de vista de produtores que
atuaram em grandes companhias fonográficas sobre seu processo de trabalho e sobre
1
De acordo com a classificação proposta por O. Jambeiro, Canção de Massa: as Condições de Produção,
2
tais mudanças que o afetam. Trata-se de considerar tais trajetórias como emblemáticas e
reveladoras do panorama atual de um dos setores mais dinâmicos de nossa vida cultural.
Gravada e difundida pelos meios de comunicação, a música alcança cada vez maior
proximidade com os indivíduos (ouvintes, receptores, consumidores). Nenhuma outra
mercadoria cultural tem demonstrado tamanha capacidade de interação com os demais
media. Seus suportes e reprodutores praticamente eliminam as fronteiras para a sua
difusão, como acontece atualmente por meio da miniaturização, da “comunicação
móvel” e da portabilidade, trazidas pelas tecnologias digitais4. Os registros fonográficos
estão no rádio, na televisão, no cinema, no teatro, na publicidade, nos computadores,
nos “ambientes” (supermercados, consultórios, aeroportos, rodoviárias...) nas ruas, nas
rodas de amigos, no cantarolar, no assoviar, na alma das pessoas. Deles, ficou
praticamente impossível isolar sua dimensão de produto que tem no mercado seu locus
privilegiado de circulação e difusão. O consumo musical, no entanto, transcendeu desde
logo a relação física de compra e venda de um suporte; pode mesmo apresentar-se na
forma de consumo aleatório e, muitas vezes compulsório a que o cidadão do mundo está
exposto, mesmo que como simples transeunte.
Considerando a vereda aberta por pesquisas realizadas no Brasil e no exterior a
partir dos anos 19705, sobre a configuração do mercado fonográfico, o funcionamento e
organização das empresas produtoras de discos e as condições técnicas e artísticas de
produção, realizei um estudo sobre a produção de discos nas grandes empresas
produtoras no Brasil, me dedicando ao período compreendido entre os anos 70 e 90.
4
Patrice Flichy, Une histoire de la communication moderne, pp. 234-236, fala no advento da
“comunicação nômade” promovida pelas tecnologias digitais.
5
No Brasil, refiro-me a O. Jambeiro, Canção de Massa: as Condições de Produção; W. Caldas, Acordes
na Aurora: Música Sertaneja e Indústria Cultural; R. Morelli, Indústria Fonográfica: Um Estudo
Antropológico, E. Paiano, Berimbau e Som Universal: Lutas Culturais e Indústria Fonográfica nos anos
60; E. Vicente, A Música Popular e as Novas Tecnologias de Produção Musical e J. R. Zan, Do fundo do
quintal à vanguarda. No exterior, R. A. Peterson e D. G. Berger, “Cycles in simbol production: the case
of popular music”. American Sociological Review, vol. 40, abril,1975, e A. Hennion, Les Professionnels
du Disque - Une sociologie des variétés, citando aqui somente os estudos pioneiros. Neles encontramos
análises que, de algum modo, operam procedimentos de pesquisa próprios às Ciências Sociais. R. Morelli
em “O campo da MPB e mercado moderno de música no Brasil: do nacional-popular à segmentação
contemporânea”, ArtCultura, nº16, jan-jun, 2008, faz importante revisão de temas e problemas presentes
na porção brasileira da bibliografia, revelando dimensões sociológicas e antropológicas dos estudos.
4
6
Fundamentalmente T. W. Adorno e M. Horkheimer, Dialética do Esclarecimento; T. W. Adorno,
“Ideias para a sociologia da música”, Os Pensadores, pp. 259-268; “O fetichismo na música e a regressão
da audição”, idem, pp. 165-191 e “Sobre Música Popular”. Theodor W. Adorno, Col. Grandes Cientistas
Sociais, pp.115-146.
7
Ofereceu base ao livro minha dissertação de mestrado, Sobre mundialização da indústria fonográfica,
IFCH/ UNICAMP, 1997.
5
popular e sobre a dinâmica dos meios de comunicação eram (e são) o alvo privilegiado.
Também de maneira muito frequente e mesmo fora do âmbito das Ciências Sociais,
encontra-se a expressa adesão ao referencial teórico oferecido por Pierre Bourdieu,
mesmo que limitada a conceitos específicos.
No que toca à minha experiência de pesquisa, a natureza dos próprios objetos dispôs
a Sociologia da música gravada que procuro desenvolver, em posição de grande
proximidade com alguns momentos da obra de Theodor Adorno, contra todas as
advertências, impedimentos e críticas lançados pelos pares, com todas as dificuldades e
mesmo entraves que essa proximidade pôde conter. Sendo a primeira pesquisa uma
dissertação de mestrado, tomei como guias os ensaios de Adorno que apresentam um
programa de pesquisa mínimo necessário para se enfrentar as relações que a música
estabelece com os meios de massa. Em etapa posterior da exploração, encontrei em
muitos depoimentos oferecidos à pesquisa pelos empresários do setor, claras e
desconcertantes explicitações das indicações feitas por Adorno.
Atualmente ganhou grande nitidez, não sua simples inadequação ao estudo da
música gravada inclusive na contemporaneidade, mas a “difícil reconciliação”, tal como
Gabriel Cohn conceitua os desafios postos para os que procuram uma aplicação mais
prática do referencial teórico e metodológico proposto por Adorno10. O que se passa
com o conceito de indústria cultural constitui o clássico exemplo de tal dificuldade, o
que permite vislumbrar o atalho no qual parte de sua crítica se perde. No entanto, as
possibilidades postas pela potencialidade da crítica imanente do objeto – uma condição
programática desse conjunto de ideias - deve impulsionar a sofisticação dessa
aproximação fundamental. Mais que isso, pode gabaritar e provocar a ida da perspectiva
sociológica a campo enfrentando a questão da presença dos media em todos os liames
da vida social, procurando reparar um déficit histórico e inexplicável de seus
compromissos como ciência11.
2. O produtor musical12
10
G. Cohn, “Difícil Reconciliação: Adorno e a Dialética da Cultura”. Lua Nova, nº 20, maio, 1990.
11
Uma primeira problematização do inquietante distanciamento que a Sociologia tem alimentado com
relação aos meios de comunicação e aos media encontra-se em M. T. Dias, “Sociologia da Comunicação
e as possibilidades da crítica”. XV Congresso Brasileiro de Sociologia. Curitiba/PR, julho de 2011.
12
Esta reflexão toma como base ideias apresentadas em “Produção e difusão de música gravada no Brasil
contemporâneo: o papel do produtor musical”, XXVII Congresso Internacional da ALAS – Associação
Latino Americana de Sociologia, Buenos Aires, Agosto-Setembro de 2009, GT 03.
8
outra via, um autor como Antoine Hennion, em seu estudo citado, considerou a
produção de discos como resultado de um processo coletivo, realizado por um “criador
coletivo”, por mais que posteriormente a autoria fosse conferida a um determinado
artista. Considerando a fragilidade dos limites existentes entre as várias etapas
envolvidas, questionava a existência de rígida divisão do trabalho nesse tipo de
produção industrial.
Investindo em outra possibilidade, procurei mostrar que a divisão do trabalho
existente fazia frequentemente aparecer sobrepostas, a dimensão material e a artístico-
cultural na ação de uma instância executora daquilo que, por outro lado, era planejado
pela administração central. O trabalho material propriamente dito, ao realizar o então
planejado, acabava por envolver também o trabalho do artista no estúdio, além daquele
de gravação, tratamento técnico, gráfica, dentre outros15. Portanto, o planejamento, de
um lado, e a execução da produção, de outro, sintetizariam a essência da divisão do
trabalho tal como se realizava na grande indústria fonográfica.
Vale frisar que não se quis, com essa equação, simplesmente retirar do processo sua
dimensão eminentemente artística, que é sua razão de ser. O que ainda hoje deve ser
alvo de questionamento é a autonomia do artista sobre a sua obra no raio de ação das
grandes empresas de media. Uns poucos a conquistaram quase que por inteiro, por mais
que sempre precisem de aprovação para seus projetos. No entanto, no mundo da canção
de sucesso, em suas várias cepas, sempre foi alta a subordinação à racionalidade
empresarial.
Retomando a argumentação, temos que, em seu modelo clássico, a instância
definidora dos rumos e do desenvolvimento da produção era (e ainda é) a do alto
executivo da empresa - o diretor geral ou presidente e do diretor artístico. Nesse âmbito,
encontramos o produtor musical, por mais que suas atividades situem-se entre a esfera
do planejamento e a da execução16.
Como parte dos quadros das grandes companhias, o trabalho do produtor musical se
efetivava, portanto, em várias etapas do processo: colaborando na escolha do repertório,
15
M. T. Dias, Os Donos da Voz, pp. 69-76.
16
Vale distinguir nomenclaturas que frequentemente aparecem embaralhadas e suas respectivas funções:
o diretor artístico é o responsável pela política de atuação da empresa, juntamente com o diretor geral ou
presidente. Definiam cast, segmentos, lançamentos, regras gerais para o marketing e orçamentos globais.
O produtor musical era o coordenador da execução do projeto, o que detinha conhecimentos específicos
que possibilitavam a realização da produção da forma como foi pensada. Partilhava da elaboração musical
do produto, ao mesmo tempo que representava, nesta esfera, o executivo da empresa. Para o
conhecimento da trajetória de um alto executivo brasileiro dessa área e que passou pelas várias funções,
ver o livro já citado de A. Midani.
10
3. Trajetórias exemplares
quais podemos extrair elementos caros à compreensão dos rumos que o universo da
música gravada tem tomado.
Pena Schmidt é um produtor musical na acepção mais ampla do termo, na medida
em que sua trajetória foi fazendo transbordar sua atividade por setores os mais diversos
no mundo da música gravada20. Envolvido desde cedo com música, como ouvinte/
consumidor, ainda jovem começou a trabalhar inicialmente como técnico em aparelhos
eletrônicos na fábrica de instrumentos musicais Giannini. Em seguida, atuou como
gerente do estúdio Gravodisc da gravadora brasileira Continental, onde foi também
gerente de Produção Artística.
Nos anos 80, foi diretor artístico da Warner, num momento importante de
consolidação da empresa no mercado nacional. Dessa empreitada – na qual foi braço
direito de André Midani - surgiram artistas como Ira! Titãs, Ultraje a Rigor, dentre
outros integrantes do amplo movimento de consolidação do mercado de música
dirigido ao público jovem, via rock brasileiro. Ao lado da produção de discos e artistas,
reúne-se seu trabalho como técnico de som, engenheiro de gravações e stage manager.
Nessa última área, foi aprimorando sua ligação com os grandes espetáculos musicais ao
vivo, tendo sido responsável pela coordenação de palco de grandes eventos musicais
(festivais de jazz, blues, rock, apresentações de artistas da cena pop internacionais -
Free Jazz, Nescafé in Blues, Heineken Concerts, Hollywood Rock, show de Madonna,
Oasis, dentre outros).
Em 1992, decidiu criar o selo independente Tinitus – uma indie dos tempos da
globalização. A idéia era a de investir na produção de artistas, formando-os tanto para
seguirem carreiras autônomas, quanto para potencialmente integrarem os quadros das
grandes companhias, oferecendo assim o inédito trabalho terceirizado na área de
Artistas & Repertório, pronto para a promoção e difusão. Apesar de ter estabelecido
parcerias com empresas como a então PolyGram (hoje Universal Music), o desinteresse
da gravadora por discos de novos artistas, que inicialmente vendem pouco mas que
precisam de grandes investimentos em promoção, inviabilizou o negócio.
Depois de dedicar-se a empresa de montagem de palcos para grandes espetáculos,
atuou, durante um ano, como diretor artístico junto à gravadora brasileira Trama. Em
seguida, em 2004, assumiu a superintendência e a direção artística do Auditório
Ibirapuera, na cidade de São Paulo.
20
Fontes: M. T. Dias, idem, pp.145-155; entrevista realizada pela autora com Pena Schmit em São Paulo,
em 18/01/2008; e na entrevista concedida por ele a P. A. Sanches, já citada, versão online.
12
21
Fontes: M. Mazzola, Ouvindo Estrelas; R. Morelli, Indústria Fonográfica: Um Estudo Antropológico e
M. T. Dias, Os Donos da Voz.
22
R. Morelli, idem, destacou o papel desempenhado por Mazzola na trajetória de Belchior.
23
Vale lembrar que é a partir desse momento que as gravadoras deixam de investir na atualização de seus
estúdios, considerando a necessidade de altos e constantes investimentos, dada a rapidez com que os
equipamentos precisam ser substituídos. Com esse movimento, potencializaram a autonomização de mais
essa área da produção de música gravada. Sobre o tema, ver M. T. Dias, idem, pp.95-129).
24
MZA é a atual responsável pela organização da Noite Brasileira no Festival de Jazz de Montreaux, na
Suíça, onde se apresentam grandes músicos brasileiros, que em geral estão ligadas a grandes gravadoras.
13
de prospectar talentos (tarefa que, nessa altura, as grandes empresas já não mais
realizavam), buscando candidatos ao sucesso, foi absorvendo aos poucos, o contingente
excedente de artistas que, apesar de apresentarem potencial de mercado, não
interessavam às grandes e teriam que buscar gravadoras independentes. Com o tipo de
formação que dispunha, passou a produzir discos de uma nova safra de artistas
brasileiros (Chico César, Zeca Baleiro, Ivete Sangalo, Rita Ribeiro, Banda Eva) e a
absorver um cast de artistas renomados sem contrato com as grandes gravadoras ou que
estavam, de alguma forma, buscando mudanças em suas trajetórias (casos de Emílio
Santiago, João Bosco, Ney Matogrosso, Gal Costa, Jair Rodrigues, dentre outros).
O modelo de negócios articulava o investimento na produção do disco e a assinatura
de um contrato de marketing e distribuição com uma grande companhia; as primeiras
parceiras foram a Warner e a PolyGram. O modelo vigora até hoje. Da carta de serviços
que a MZA Music oferece na atualidade, além do estúdio disponível para locação,
destaca-se a Consultoria disposta em três modalidades (Consulta, Consultoria Prime e
Consultoria Golden). No modelo mais elementar - o primeiro - o artista tem uma
consulta de uma hora com o “renomado produtor”, ocasião em que vai receber pareceres
sobre suas chances no mercado e orientações sobre modificações que deve fazer em sua
carreira. Na modalidade Golden, “o serviço é 100% completo”, a empresa coordena a
produção de toda a obra. “Aqui o artista não precisa se preocupar com nada, a MZA
executará o projeto”. Mas acrescentam no finalzinho do texto: “o artista só precisa
aprovar”25.
25
De acordo com site oficial da MZA http://www.mzamusic.com.br/site.htm, acesso em 28/11/2011.
14
Por outro lado, a oferta ampla, geral e irrestrita de música para download gratuito na
web, ao chocar-se com a questão dos direitos autorais e conexos, derrubando o clássico
modelo de negócio dos discos, fez a música gravada perder a centralidade que até então
detinha, no conjunto da cultura musical contemporânea. Se, para a carreira profissional
de um músico ou banda, gravar um disco significava atingir um dos pontos mais altos,
hoje o registro na forma de disco constitui apenas mais uma das estratégias
desenvolvidas em um variado conjunto dominado pelo show, pela apresentação ao vivo
- umas das formas principais de se fazer a música chegar ao ouvinte, mas que
atualmente se tornou a fundamental quando se trata de se ganhar a vida, de se viver de
música. Claro que a música ao vivo sempre ocupou lugar distinto, sempre houve grande
valorização das apresentações musicais; o que muda é a relação que estas estabelecem
com o produto disco. Fazia-se o show para divulgar o disco (mesmo que não
funcionasse) e a tendência atual é a de fazer o show e aproveitar para vender o disco; o
disco se torna assim uma maneira de prolongamento da experiência do show. Do ponto
de vista dos negócios, note-se que, de certa forma, essa sempre foi a estratégia utilizada
26
Um exemplo: a banda recifense Nação Zumbi, para o disco Fome de Tudo (Deck, 2007, feito a partir da
troca de arquivos entre os músicos pela rede) contratou os serviços do produtor brasileiro radicado nos
EUA Mario Caldato. Cf. MATHIAS, A.“Nações Unidas”. Rolling Stones, SP: Spring Publicações,
dezembro de 2007, pp.98-100. O universo da atividade do músico que é também produtor é analisada por
T. Bacal, “Sonoridades artificiais: os produtores e suas considerações acerca das características do som
digital”. 34º Encontro da ANPOCS, ST 33, 2010.
15
pelos músicos independentes; como não tinham os seus discos nas lojas (que em geral
ofereciam somente o catálogo das grandes gravadoras) eles eram vendidos nos shows.
Já Marco Mazzola ainda acredita que a saída para o embate entre gravadoras e
downloads ilegais está na regularização das vendas de música no suporte digital, que as
grandes empresas acabaram de implantar. “Você fica três meses dentro de um estúdio
criando com o artista um CD, gastando em músicos, estúdios, capa, marketing etc. e em
seguida ao lançamento, e muitas vezes até antes do produto estar no mercado, este
produto já está disponibilizado na rede”29. Confirma, dessa forma, a impressão de que
em sua atividade, reproduz, em espaço diferenciado, a lógica do grande business.
27
Entrevista concedida à autora por email, em 19/02/2009. Disponível no blog http://penas.blogspot.com/
28
De acordo com artigo citado de P. A. Sanches, versão online.
29
Idem, ibidem.
16
Como apontou Ana Maria Bahiana, o produtor era visto muitas vezes como um músico
frustrado (muitos tinham de fato experiências como músicos profissionais) que
procurava impingir ao artista um modelo que ele próprio não tinha conseguido seguir30.
Antoine Hennion apresentou opiniões de produtores musicais que reclamavam o
reconhecimento do seu trabalho, com o argumento de que lhes restava sempre o lugar à
sombra do artista, com uma diferença: se o disso era bom, o mérito era do artista; se era
ruim, a culpa era do produtor31. Das várias possibilidades aqui apresentadas, Tatiana
Bacal, em seu artigo citado, constata a situação na qual se encontram e convergem, por
meio das tecnologias digitais, o trabalho e a atuação do antigo engenheiro de som, do
músico, do artista e do produtor musical. O músico tecnologicamente informado se
transforma no produtor, que por sua vez é também artista, no sentido de não atuar
somente nos bastidores das gravações, mas ganhar o centro da cena. Para os estudiosos
da música gravada resta o desafio de saber se, em suas novas configurações, o trabalho
do produtor transformado teria superado as velhas e fundantes contradições numa nova
síntese. O sentido e o alcance dessas transformações devem, portanto, continuar sendo
objeto de nossa atenta observação.
BIBLIOGRAFIA
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Habermas, Horkheimer e Adorno. 2ª ed. SP: Ed. Abril, 1983, tradução de Roberto
Schwarz, pp. 259-268.
________“O Fetichismo na Música e a Regressão da Audição”. Os Pensadores.
Benjamin, Habermas, Horkheimer e Adorno. 2ª ed., SP: Ed. Abril, 1983, tradução de
João Luís Baraúna, pp. 165-191.
________“Sobre Música Popular”. Theodor W. Adorno. SP: Ed. Ática. Col. Grandes
Cientistas Sociais, nº 54, Org. Gabriel Cohn, 1986, tradução de Flávio Kothe, pp.115-
146.
ADORNO, T.W e HORKHEIMER, M. Sociológica. Madrid: Ed. Taurus, 1971,
tradução de Víctor Sánches de Zavala.
_____________ Dialética do Esclarecimento. SP: Jorge Zahar Editor, 1985, tradução
de Guido de Almeida.
ARRUDA, M.A.N. Sociologia da Cultura e Sociologia da Comunicação de Massa:
Esboço de uma Problemática. MARTINS, H.H.S. e MARTINS, C.B. (Orgs.) Horizontes
das Ciências Sociais no Brasil – Sociologia. SP: Discurso Editorial, Barcarolla e
Ciência Hoje, p. 253-277.
30
A. M. Bahiana, Nada será como antes. MPB nos anos 70, pp. 240.
31
A. Hennion, Les Professionnels du Disque, pp.75-76.
17