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Ficha técnica:

Título: Família e poder no Alentejo: elites de Avis, 1886-1941.

Autora: Maria Antónia de Figueiredo Pires de Almeida

Editora: Colibri

Lisboa, 1997

Capa: Ricardo Moita, motivo fotográfico da autora.

Depósito legal: 116953/97

ISBN: 972-8288-77-8.
Índice:

Nota introdutória
Prefácio
Introdução
Capítulo 1 - Abordagem Metodológica e Fontes
1.1 - O Arquivo da Câmara Municipal de Avis
1.1.1 - As Actas das Eleições e os Livros de Actas das Sessões da Câmara
1.1.2 - Os Livros do Recenseamento Eleitoral
1.1.3 - Outras fontes
1.2 - Inventários por Morte
1.2.1 - Recolha dos Inventários
1.2.2 - Dificuldades e problemas levantados no tratamento desta fonte
1.2.3 - Bens apresentados com maior frequência
1.2.3.1 - Bens móveis
1.2.3.2 – Semoventes
1.2.3.3 - Bens imóveis
1.2.3.4 - Dinheiro e dívidas activas e passivas
1.2.4 - Importância desta fonte
1.2.5 - Autores que trataram este tipo de fonte
1.3 - Arquivo Particulares
1.4 - As fontes iconográficas
1.5 - Os cemitérios
1.6 - Imprensa distrital, regional e nacional
1.7 - Arquivos dos Ministérios
1.8 - Anuários Comerciais
1.9 - As Fontes Orais
1.10 - Fontes Literárias
1.11 - Variações ortográficas
Capítulo 2 – Avis
2.1 - Localização e descrição
2.2 - Resumo histórico
2.3 – População
2.4 - Economia do concelho
2.4.1 - O Gado: "burros, porcos e... ovelhas!
2.4.2 - O Pão: cereais e moagens
2.4.3 - "Chaparros"
2.4.4 - O azeite e outras indústrias
2.4.5 – Comércio
2.4.6 – Trabalho
2.4.7 – Resumo
Capítulo 3 - Circunscrição e identificação das elites locais: factores de homogeneização
e de diferenciação social
3.1 - Critérios de definição das elites de Avis
3.1.1 - Critérios económicos
3.1.2 - O controlo do poder político local
3.1.3 - As manifestações da diferença social
3.2 - Composição da elite social local
3.2.1 - Os proprietários
3.2.1.1 - Origens de algumas famílias
3.2.1.2 - A elite fundiária local e a posse da terra com factor fundamental
3.2.1.3 - As propriedades urbanas e a transferência dos montes para as
vilas
3.2.2 - As elites urbanas
3.2.2.1 - Os Bacharéis em Direito
3.2.2.2 - Os Médicos e Farmacêuticos
3.2.2.3 - Os Comerciantes
3.2.2.4 - Os funcionários públicos
3.2.2.5 - Os Professores
3.2.2.6 - Os Padres
3.3 - Factores de aproximação e de separação entre estes grupos: alguns aspectos do
comportamento económico das elites
3.3.1 - A transmissão da propriedade
3.3.2 - A conservação e aumento do património familiar: tipos de investimento,
dinheiro, depósitos e dívidas
3.3.3 - As alianças matrimoniais
3.4 - Algumas considerações sobre o grupo das elites de Avis
Capítulo 4 - As manifestações da diferença: comportamentos sociais, actuações,
vivências e sociabilidades
4.1 - Vivência Rural
4.2 - Vivência Urbana
4.2.1 - Dimensão, localização e mobiliário das casas de habitação
4.3 - Representação Social
4.3.1 - Formas de tratamento
4.3.2 – Caridade
4.3.3 - Homenagens públicas aos membros da elite
4.3.4 - A cidade dos mortos
4.3.5 – Religiosidade
4.3.6 – Vestuário e aspecto exterior
4.4 - Educação e Instrução
4.5 – Comportamentos sexualmente diferenciados
4.5.1 - As Senhoras e a casa
4.5.2 - Os Senhores e o clube
4.6 – Sociabilidades
4.6.1 – Alimentação
4.6.2 - Festas familiares
4.6.3 - Festas sazonais, cerimónias religiosas e feiras
4.6.4 - Os bailes e os rituais de namoro
4.6.5 – Caçadas
4.6.6 - As viagens
4.6.6.1 - Deslocações e meios de transporte. Dificuldades
4.6.6.2 - A ida à capital; praias, termas e touradas
Capítulo 5 - Elites sociais locais e mudança política
5.1 - Participação das elites sociais locais no poder político
5.2 - Eleições e mudanças de regime; os períodos de transição
5.3 - Padrão de continuidade ou renovação das elites políticas
Capítulo 6 - Resumo das permanências e mudanças
Anexos:
1. Profissões na Política Local
2. Profissões dos eleitores do concelho de Avis
3. Moradas dos eleitores no concelho de Avis
4. Famílias de Avis
5. Outras instituições do poder político local: a Santa Casa da
Misericórdia e os organismos corporativos
6. Resumo dos Anuários Comerciais e Livros do Recenseamento
Eleitoral
7. Iconografia

Fontes e Bibliografia
Para a Catarina, o Sebastião e a Maria Carolina.
Agradecimento:

Aos professores do mestrado em História Social Contemporânea que me abriram


os horizontes para os novos rumos da História Social, especialmente os meus
orientadores Profs. Nuno Monteiro e António Costa Pinto.
Ao Prof. Doutor José Manuel Sobral, arguente na minha prova de dissertação de
mestrado, pelos elogios e simpatia com que me tratou, pelos conselhos que me deu e
pelo prefácio que escreveu para este livro.
À Junta Nacional de Investigação Científica e Técnica, que me deu uma bolsa
durante o ano de elaboração da tese.
À Câmara Municipal de Avis, sobretudo na pessoa do vereador da Cultura, Sr.
Dr. Joaquim Nuno Silva, pela disponibilidade em facultar o acesso aos arquivos e pelo
apoio que deu à edição deste livro.
Ao tio Eurico, que passou horas seguidas a contar-me as histórias das pessoas
todas de Avis e das caçadas da sua juventude.
À minha avó Catarina Varela Gomes de Figueiredo Pais, a primeira menina de
Avis a frequentar o ensino superior nos anos 20 deste século e que sempre incentivou os
filhos e os netos a estudarem e serem os melhores profissionais.
Principalmente à minha mãe que me proporcionou viagens pelo mundo inteiro,
pois “o que está dentro da cabeça já nunca mais se perde”. O seu maior orgulho são os
diplomas dos filhos! Além da ajuda como avó e baby-sitter dos meus filhos enquanto eu
fiz este trabalho, ainda teve a paciência de rever todo o texto.

A autora
Nota introdutória:

Seria atrevimento da minha parte propor-me prefaciar, tal como me foi pedido, esta tese
de Mestrado que, pela densidade de informação e pela qualidade de conteúdo, merece uma
abordagem, mesmo sob a forma de prefácio, de uma outra profundidade analítica que a
disponibilidade de tempo não permitiu.

No entanto, fácil é concluir que estamos perante um trabalho de investigação de grande


mérito e um simples passar de olhos pelo índice permite retirar indicadores da seriedade do
trabalho realizado e do esforço de reunir o máximo de dados e factos relevantes para que o fio
condutor do tema elegido não perdesse consistência e coerência internas.

Ambicioso, sem dúvida, o projecto: pela temática envolvida, pela dificuldade de acesso
a fontes adequadamente tratadas, pela ausência do factor de distanciamento.

Mas o resultado da labuta investigatória e do processo paralelo e permanente de


comparação dos dados históricos acumulados veio a definir finalmente um todo coerente e sem
fissuras aparentes das diferenciadas dimensões que era necessário entrecruzar.

E, assim, acabamos por ter à disposição um verdadeiro manancial de informação


histórica sobre o Conselho de Avis que, abrangendo embora um período curto da sua história,
não deixa de constituir uma valiosa contribuição para outras análises mais alargadas – social,
política e economicamente relevantes – que não podem ficar apenas pela faixa limitada das
elites sociais locais.

Conhecedora do projecto, a Câmara Municipal de Avis não lhe poderia ficar indiferente
e propôs-se impulsionar a publicação desta tese de Mestrado como contributo muito importante
que é para a História Local

J. Nuno Pires da Silva

Pelouro da Cultura/C. M. Avis


Prefácio:

Este trabalho estuda as elites de Avis entre 1886 e 1941, inserindo-as no


contexto mais global das mudanças de regime político que entretanto tiveram lugar,
bem como no espaço socio-económico e cultural em que detiveram um lugar
preponderante.

Ao falar de um espaço agrícola – o concelho de Avis – foi naturalmente procurar


a génese da elite local no seu enraizamento na propriedade fundiária. Para isso socorreu-
se de várias fontes, entre as quais destaco, pela sua importância, os inventários por
morte e os recenseamentos eleitorais. Analisou o seu modo de vida, sem contudo a
isolar do tecido social a que pertence. Pelo contrário, situou-a num contexto povoado
igualmente por pequenos proprietários, comerciantes e funcionários, artesãos e
trabalhadores rurais. Inseriu-a numa teia de relações sociais. O retrato que emerge nas
suas páginas é de uma grande sobriedade científica, sem eufemismos, quanto às
implicações sociais da existência deste tipo de elite. De facto, este trabalho não se lhe
circunscreve, antes abrange o conjunto da sociedade local.

A autora não enveredou propriamente por uma descrição teórica do conceito de


elite, mas cingiu-se ao seu uso habitual entre investigadores: grupo restrito, formado
através de inter-relações entre os seus membros e detendo o poder. Poder político, poder
económico e outras formas de poder simbólico ou prestígio, de que fala Bourdieu.

A riqueza deste trabalho reside, antes de mais, no facto de ser uma história
atenta aos detalhes mais reveladores do universo social. Depois, porque mostra uma
verdadeira sensibilidade sociológica e antropológica da parte de quem não teve uma
preparação específica nestas disciplinas, mas que a compensou por mérito próprio,
vindo a aprender com os seus contributos.

Esta elite não foi propriamente estática. A genealogia das famílias permite
detectar as raízes da mesma no fim do Antigo Regime, em coerência com a análise da
sociedade desse tempo feita por Albert Silbert. Nesse período, embora dominantes a
nível local, enfrentavam ausentes de maior peso, como a grande aristocracia. Um único
exemplo: a herdade de Camões da Casa Cadaval revela o peso enorme da aristocracia
mesmo em relação a estes abastados lavradores, constituindo deste modo a análise local
uma perspectiva que nos permite observar hierarquias sociais mais globais da sociedade
portuguesa.

A sua análise da elite é subtil e atenta às diferenças existentes no seu seio. Havia
quem vivesse exclusivamente dos rendimentos da lavoura e quem, por vezes sem
ligações aos anteriores, vivesse do comércio, fosse farmacêutico, etc. Os últimos
poderiam deter recursos económicos elevados, mas constituíam um sector subordinado
no grupo dominante local. Porém há distinções a ter em conta no seio do próprio sector
fundiário. Entre os seus membros há quem seja sobretudo lavrador e se auto-afirme
como tal e quem, também o sendo – ou grande proprietário – já detenha um capital
cultural e relações de sociabilidade fora do local que o separe dos anteriores.

Um tópico aliciante, entre tantos outros, e que mostra como o estudo da autora
contempla processos sociais inseridos no tempo e no espaço, é a observação dos efeitos
da mudança das elites fundiárias dos montes para a Vila. Aqui constroem amplas
residências e exibem um estilo de vida distinto. Frequentam-se, dão jantares, tomam
parte activa nas instituições de sociabilidade por eles animadas ou fundadas, abandonam
inclusive o traje de lavradores. Em sumo, a pouco e pouco começam a adquirir alguns
hábitos mais urbanos.

A interpretação de várias dimensões dos estilos de vida locais é levada a cabo


com brilho. Percorremos as ruas, as casas, somos levados a determo-nos sobre os
sentidos da própria corporalidade. A gordura, hoje estigmatizada pelos olhares
dominantes sobre é corpo, é então símbolo de fortuna. Viviam-se tempos de fome e
escassez, pelo menos sazonais, para a maioria. Até certo ponto ao inverso do que veio a
suceder nos nossos dias, com a promoção dos corpos bronzeados, símbolo de vitalidade
e beleza, as senhoras da elite protegiam-se do sol que estragava a pele e distinguiam-se
assim do vasto sector, maioritariamente de trabalhadores, cuja pele era tisnada pelo
mesmo.

A análise das trajectórias dos membros da elite constitui outro momento alto da
pesquisa. A “urbanização” que leva os grandes proprietários dos montes para a Vila, por
exemplo, parece estar associada à tentativa de fazer com que alguns descendentes
adquiram capital escolar – títulos profissionais propiciadores de rendimento e posição
elevada, como os de médico ou advogado. Aliás, aparecem diferenças nos destinos
sociais dos homens e mulheres deste sector. Embora a autora não o afirme
explicitamente, as suas páginas revelam a condição dominada das mulheres do sector
dominante: os irmãos ou maridos podiam ter estudos superiores, para elas bastava a
primária e o aprenderem a ser senhoras. A análise do seu papel social – da esfera da
casa, da família, ao teatro e à caridade – é esclarecedora. Eram o complemento
subordinado dos membros masculinos e sobretudo do marido, quando casadas
(celibatárias, eram umas tias providenciais, que não afastavam o património,
“sacrificadas” no altar dos interesses familiares – passe a imagem).

Há outras duas temáticas fundamentais, a meu ver, neste trabalho. A primeira é a


análise dos modos de reprodução da elite local, observados ao nível das lógicas
matrimoniais e das práticas de herança. O texto permite detectar, ao tratar das primeiras,
uma nítida ascensão dos títulos profissionais elevados que faz dos mesmos já neste
século algo que possa equivaler no mercado matrimonial aos recursos fundiários. A
diversificação dos recursos era uma das vias possíveis para manter uma posição social
elevada.

O casamento era, contudo, estritamente regulado, recorrendo-se ao regime de


“separação de bens”, para que a herança, na falta de sucessores legítimos, ficasse entre
consanguíneos. Quanto aos filhos ilegítimos, produto masculino dos grandes
proprietários, a sua exclusão é total. A herança é uma instituição por que passa a
reprodução de uma instituição – a família como categoria oficial e ideal afectivo –, e
eles estavam completamente fora da mesma. As partilhas eram igualitárias, diz-nos a
autora. Mas há aqui algumas problemáticas sobre as quais virá ainda a ser necessário
ampliar a investigação. Qual a importância do celibato segundo o sexo? As celibatárias
administrariam directamente os seus bens? Por lado, embora os montantes da herança
pudessem ser idênticos para todos, será que não haveria algum – o varão mais velho
nomeadamente – favorecido em termos simbólicos, com a casa principal da família, por
exemplo?

Poderá parecer um pouco injusto colocar questões a um trabalho tão rico, ainda
para mais sujeito a constrangimentos de tempo na sua elaboração. Só o faço por duas
razões. Primeiro, por a sua elevada qualidade as suscitar. Segundo, por ter a certeza de
estarmos apenas perante o início de um percurso da autora no domínio da investigação.
Início aliciante com o qual ficou demonstrado que as elites fundiárias controlaram o
poder político local ao longo de três regimes políticos. Na verdade, só o processo da
Reforma Agrária, o impacto da PAC e o regime democrático o abalaram decisivamente.
Este trabalho, que se propunha abordar a elite de Avis, foi muito mais longo do que o
enunciado no título, constituindo um contributo valioso não só para o conhecimento do
Alentejo, como da própria sociedade portuguesa no período por ele focado.

José Manuel Sobral


Introdução:

Este trabalho tem como objectivo principal a descrição de um modo de vida e de


uma mentalidade característicos de um grupo social num dado momento histórico
aparentemente próximo no tempo, mas já completamente diferente da realidade rural
dos nossos dias. A escolha do Alentejo como objecto de estudo, e mais concretamente
de Avis, esteve relacionada com o facto de se tratar de um dos concelhos mais
politizados do Alto Alentejo, onde habitavam ou tinham terras algumas das famílias
mais significativas da região situada entre Évora e Ponte do Sor. Este pequeno conjunto
de vilas, aldeias e montes resume alguns dos aspectos mais característicos da vivência e
das relações sociais da região alentejana ao longo deste século. Nesta escolha pesaram
também as afinidades familiares com a vila de Avis, o que facilitou o acesso aos
arquivos locais e a alguns arquivos particulares.

A delimitação deste estudo ao grupo específico das elites, teve como ponto de
partida a leitura da tese de doutoramento do Prof. Doutor Hélder Fonseca da
Universidade de Évora sob o título Economia e Atitudes Económicas no Alentejo
Oitocentista, a qual lançou as bases para vários trabalhos sobre as Elites Rurais
Alentejanas. O estudo das elites locais e suas redes de sociabilidade é um tema
actualmente a ser estudado por vários investigadores, dos quais destaco os trabalhos de
Reinhard (Brito, 1993) sobre a Cúria Romana e de François Heran sobre as elites
sevilhanas (Heran, 1980).

As teses de José Cutileiro e Maria Manuela Rocha, sobre comunidades rurais


alentejanas, apresentam-nos duas sociedades locais com todos os seus componentes. Os
principais temas abordados por estes autores serviram também de base para a
elaboração do esquema e objectivos principais desta dissertação. No entanto, as fontes
disponíveis no local e o prazo estipulado para a apresentação desta tese, levaram a uma
maior selecção e delimitação dos temas. Assim, por uma questão de acessibilidade às
fontes escritas e aos mais variados testemunhos materiais e orais, e uma vez que se trata
de uma tese de História Social, todo o ênfase foi colocado na definição dos grupos de
elite e sua representação no concelho de Avis, especialmente no que diz respeito às suas
redes de sociabilidade e alianças políticas aí estabelecidas, suas trajectórias e
comportamentos típicos.
Ficará para um outro trabalho de maior fôlego o estudo dos restantes
componentes da sociedade avisense, assim como a tentativa de análise dos
comportamentos económicos das elites, uma vez que o objectivo inicial desta tese
estava relacionado com uma tentativa de entendimento dos problemas sociais surgidos
no período pós - 25 de Abril de 1974, com as ocupações de terras e casas dos maiores
proprietários alentejanos. Estas expropriações provocaram situações de grande
violência, particularmente no concelho de Avis, e atingiram sobretudo os lavradores
mais activos do concelho.

Foi uma situação única cujas origens se encontram naturalmente numa


conflituosidade latente, apenas explicada pelo grande contraste social e económico
existente entre os detentores da terra e meios de produção e os trabalhadores rurais,
maioritariamente jornaleiros que dependiam apenas da venda da sua força de trabalho
para subsistir.

Esta situação motivou-me para o estudo mais amplo das condições históricas e
sociais da "Questão Agrária" no Alentejo contemporâneo, do qual se destacam os
problemas do latifúndio, do trabalho sujeito a flutuações sazonais e dependente mesmo
das condições climatéricas, o que provocava e continua a provocar situações frequentes
de desemprego temporário. Na falta de organismos estatais vocacionados para a solução
destes problemas, foi aos mais favorecidos que se atribuíram responsabilidades e
deveres, os quais este grupo recusava na maior parte dos casos. Com o Estado Novo
surgem as Casas do Povo e os Grémios, instituições corporativas cujas funções incluíam
a tentativa de resolução destes problemas, mas que encontraram alguma resistência por
parte dos grandes proprietários/lavradores. A situação era ainda levada a extremos pelo
modo de vida das elites locais em confronto com as situações de indigência vividas
pelos mais desfavorecidos.

O limite temporal estabelecido (1886 - 1941) obedece a uma tentativa de situar o


comportamento das elites avisenses face à sucessão de regimes políticos que em poucos
anos se verificou em Portugal: Monarquia, República e Estado Novo. Pretende-se aqui
analisar as permanências e mudanças a nível local perante um poder político central que
sofre alterações profundas e a participação activa ou indirecta das elites económicas do
concelho de Avis em todo este processo. Esta análise começa pela definição e
caracterização das elites do concelho, descrição do seu modo de vida, relações e partilha
de espaços de sociabilidade. São estes os indicadores principais para verificarmos a
existência de coesão ou de heterogeneidade neste grupo social, cuja principal
característica é o controlo do poder, seja ele económico, intelectual ou político, e cuja
evolução seguiremos ao longo deste período de tempo.

A relação das elites avisenses com o poder político municipal, distrital e central
é tratada num capítulo próprio, no qual se analisam os resultados eleitorais e a evolução
partidária dos órgãos municipais do concelho em comparação com o poder distrital e
central. Pretendo aí descrever as permanências e mudanças mais significativas da
política local ao longo deste meio século, com as respectivas concordâncias e
divergências em relação aos acontecimentos vividos a nível nacional. Analiso também a
composição sócio-profissional dos órgãos de poder local, desde a Câmara Municipal ao
Grémio da Lavoura já em 1940, para verificar se de facto as elites económico-sociais
locais detêm a liderança do poder político municipal.

Do concelho de Avis, mais propriamente da vila do Ervedal, foram eleitos dois


deputados da Assembleia Nacional pertencentes a famílias de grandes proprietários
rurais: José Pais de Vasconcellos Abranches e José Pais da Silva Marques, cujos
antecedentes familiares e percurso político são analisados nos capítulos seguintes, a
partir do levantamento das fontes disponíveis.

Enquanto na parte política as fontes usadas para a elaboração das listas do


pessoal político eleito para os cargos municipais foram as mais directas (as actas das
eleições e das sessões da Câmara Municipal de Avis, além de outras indirectas, como os
jornais distritais), no que diz respeito ao tema da caracterização do estilo de vida, o
retrato que aqui se apresenta foi elaborado a partir de fontes indirectas, que nos dão
apenas uma aproximação à realidade.

Passo de seguida à análise destas fontes, das quais se destacam os Inventários


por morte, os Anuários Comerciais, as fotografias de época recolhidas em arquivos
particulares, mas sobretudo as fontes orais. Estas fontes são de facto umas das principais
para a compreensão do período histórico que se viveu em Portugal na primeira metade
do século, apesar de toda a sua subjectividade, pois a memória pessoal é muito selectiva
e condicionada. Porém, face aos condicionalismos impostos pelos períodos de crise que
se viveram na 1ª República e por outros ainda mais fortes durante o Estado Novo, não
há dúvida que a maioria das fontes escritas nos apresentam uma imagem parcial e
certamente adulterada, como aliás em qualquer outra época.
A recolha dos mais variados testemunhos impõe-se urgentemente, pois o nível
etário dos protagonistas é já bastante elevado e os seus contributos para a História
podem perder-se irremediavelmente. Registamos aqui o precioso testemunho duma
senhora com 93 anos, D. Alzira Lopes Varela, que morreu poucos meses depois da
entrevista que gentilmente nos concedeu, na qual forneceu elementos fundamentais para
este trabalho.
Capítulo 1 - Abordagem Metodológica e Fontes

1.1 - O Arquivo da Câmara Municipal de Avis. Após a leitura atenta das


obras de referência já enunciadas, iniciei a recolha da extensa bibliografia sobre os
temas de História Social e História Política dos finais do século XIX e 1ª metade do
século XX. O estudo da viabilidade deste projecto teve como base o levantamento das
fontes existentes nos arquivos da Câmara Municipal de Avis. Com alguma surpresa,
verifiquei que o arquivo estava relativamente bem organizado, com acesso fácil e
suficientemente completo no que diz respeito aos elementos necessários para o estudo
do período escolhido. Os vários livros de registo, desde o extenso arquivo da Santa Casa
da Misericórdia, aos registos dos testamentos, dos vencimentos dos funcionários da
Câmara, etc., possibilitaram a formação de uma imagem clara dos interesses e modo de
vida do grupo estudado. Foi assim possível iniciar o processo de definição das elites
sociais locais, o qual teve como ponto de maior relevância o apuramento das elites
políticas locais nos livros de actas das eleições e das sessões da Câmara.

O facto de ter identificado o pessoal político para chegar à definição das elites
sociais locais explica-se por apenas poderem ser eleitos ou nomeados para os cargos
administrativos os cidadãos do próprio concelho (ver legislação). Esta abordagem
revelou a composição sócio-profissional da Câmara de Avis entre 1886 e 1941 e
permitiu ter uma ideia do peso de cada categoria profissional no poder local. Serviu
assim de ponto de partida para a elaboração das listas das famílias da elite económica e
social do concelho.

Verifiquei que os mais altos cargos da Câmara Municipal de Avis estiveram


durante quase todo este período nas mãos de representantes das famílias dos maiores
proprietários do concelho. Dos 14 Presidentes da Câmara de Avis neste período (entre
17 eleições, 2 substituições pelo vice-presidente e 7 nomeações por alvará do
governador civil do distrito de Portalegre), apenas 4 não eram grandes proprietários (ver
anexo 1). No conjunto do pessoal político eleito e nomeado para os cargos
administrativos, os grandes proprietários rurais ocuparam a mais alta percentagem de
lugares de poder, com algumas variantes durante os períodos de mudança de regime.

Os cargos de vereadores foram ocupados por gerações mais novas destas


mesmas famílias, parentes muito próximos destes e membros de famílias com algum
poder económico, sobretudo comerciantes. Há também casos de "artistas" (artesãos),
como sapateiros, carpinteiros, ferreiros, mas são poucos e ocupam maioritariamente os
lugares de suplentes.

Quanto aos eleitos para as Juntas de Freguesia, a regra é a grande variedade de


profissões, das quais se salientam alguns seareiros, mas principalmente os "artistas", o
grupo dos artesãos. Curiosamente predominam os sapateiros, havendo mesmo uma
Junta de Freguesia (Benavila), eleita em 1922, composta inteiramente por profissionais
deste ramo. Há alguns (raros) proprietários, mas quase sempre dos mais pequenos. A
partir das informações fornecidas pelos livros do recenseamento eleitoral pude ainda
tirar muitas outras informações sobre este grupo, mas que saem do âmbito deste
trabalho.

Outro motivo que me levou a eliminar as Juntas de Freguesia e este grupo do


meu estudo é a falta, nos arquivos, das actas das eleições entre 1908 e 1922; de 1922 em
diante as actas existem, mas estão assinadas em branco. A falta de informações entre
1922 e 1941 inutilizaria o estudo.

A elaboração das listas dos cidadãos eleitos no concelho para os vários cargos
políticos num período de 55 anos e três regimes diferentes foi um processo que obrigou
à consulta de diversas fontes, uma vez que as alterações das leis eleitorais levaram a que
os elementos fornecidos pelas mesmas e os próprios órgãos do poder municipal e
distrital variassem significativamente.

1.1.1 - As Actas das Eleições e os Livros de Actas das Sessões da


Câmara. Para apurar as elites políticas municipais até 1908 foi necessário o
levantamento das informações das actas das eleições seguido da leitura das actas das
sessões da Câmara, nas quais se registava a distribuição dos vários cargos a
desempenhar pelos vereadores eleitos. Esta distribuição dos cargos era realizada por
uma eleição entre os próprios vereadores na data de tomada de posse. Após a eleição, os
assuntos tratados nas assembleias gerais e ordinárias eram variados e mereciam um
tratamento específico, no sentido de apurar o tipo de preocupações do poder municipal
face aos problemas do concelho. Porém, variados factores dificultariam este tipo de
apuramento: a falta de alguns livros e o facto de a maior parte dos assuntos correntes do
concelho serem despachados regularmente pelo Administrador do Concelho. A partir da
República este apuramento só foi possível com a leitura dos livros de actas das sessões
da Câmara, complementada pela consulta da imprensa distrital, uma vez que não existia
imprensa local.
1.1.2 - Os Livros do Recenseamento Eleitoral. O passo seguinte foi a
consulta dos livros do recenseamento eleitoral, nos quais procurei os nomes dos
cidadãos eleitos para a Câmara Municipal e para as Juntas de Freguesia. Estes livros
praticamente anuais e divididos por freguesias são uma fonte preciosa, pois fornecem
uma considerável quantidade de informações sobre os indivíduos recenseados,
especialmente no período da Monarquia. Destacam-se por exemplo, as categorias de
"elegível" e de "Maior Contribuinte", as quais foram essenciais para a definição e
hierarquização das elites económicas do concelho.

1.1.3 - Outras fontes. Neste arquivo foi possível também fazer a recolha
de outro tipo de fontes importantes para a caracterização das elites, como foi o caso do
livro de registo de licença de uso e porte de armas, licença de caça, registos dos
consumidores de energia eléctrica, etc. Naturalmente os mesmos nomes surgiam em
quase todas as ocasiões, o que possibilitou a elaboração de um retrato mais fiel dum
certo estilo de vida que desenvolvo no capítulo 4. Igualmente importante foi a recolha
dos mapas do concelho e da vila de Avis, além das cartas militares que permitem a
localização dos montes nos quais os lavradores e proprietários residiam ou tinham a
sede da sua lavoura. A localização espacial é algo fundamental para se conseguir uma
noção mais correcta do tema a tratar, desde as distâncias percorridas a cavalo, a
dificuldade das deslocações, etc. Este enquadramento geográfico foi complementado
com os mapas de estradas recolhidos na Biblioteca Nacional, uma fonte importantíssima
e raramente tratada, inclusivamente pelo Automóvel Club de Portugal que não mantém
um arquivo com os seus mapas mais antigos.

1.2 - Inventários por Morte. Com a lista dos nomes das principais figuras da
elite política e económica de Avis foi então possível requisitar os respectivos
Inventários por Morte arquivados na Repartição de Finanças de Avis. Estas fontes
permitiram um estabelecimento pormenorizado dos bens dos indivíduos que neste
concelho viveram e morreram, isto é, das famílias da elite social local, que em Avis
possuíam a sua primeira residência, a sua família, a sua actividade profissional e
interesses económicos e onde exerciam o seu direito de voto.

1.2.1 - Recolha dos Inventários. Neste arquivo foi possível recolher 46


Inventários por Morte ou por Doação em Vida, aos quais se somaram 4 inventários
orfanológicos encontrados no Tribunal de Fronteira. Destes 50, 31 (= 62%) pertencem a
pessoas que exerceram cargos para os quais foram eleitos ou nomeados por alvará do
Governador Civil do distrito de Portalegre (a partir de 28/6/1926), 17 (= 34%) não
exerceram cargos electivos, mas também estão incluídos na categoria de MC ou
pertencem às famílias detentoras de maior poder económico e influência local,
geralmente parentes próximos dos anteriores; e 2 (= 4%) são funcionários da Câmara
Municipal várias vezes eleitos para as juntas de freguesia.

Logo de início surgiu o problema de não se encontrarem nesta repartição os


inventários por morte de todas as pessoas das listas que eu elaborara. Este facto tem
várias explicações: 1. No caso de uma pessoa morrer deixando filhos ou outros
herdeiros menores ou "dementes", é necessária a instituição de um processo judicial, no
qual se realiza o chamado "Inventário Orfanológico". Em Avis, estes processos
transitaram para a Comarca de Fronteira, à qual este concelho pertencia pelo menos até
1900. Assim, foi necessário ir ao Tribunal de Fronteira, no qual o arquivo sofre dois
problemas: a organização dos ficheiros e catalogação dos processos é deficiente, sendo
necessário procurá-los aleatoriamente em prateleiras com inúmeros maços; esta
pesquisa provoca por vezes a destruição dos mesmos processos, pois o papel está
envelhecido e desfaz-se ao toque. Perdem-se assim, ou não se conseguem encontrar,
informações valiosas. 2. Algumas pessoas das listas morreram noutros concelhos,
alguns desconhecidos, logo os seus inventários foram lá realizados. 3. Algumas famílias
têm processos de inventário ainda em curso, arrastados por décadas devido a problemas
legais, filhos dementes, ocupações de terras, etc. Felizmente, o funcionário das Finanças
disponibilizou-me alguns, após eu ter descoberto os números de processo por vias
indirectas, como por exemplo em testamentos de parentes. 4. Não se encontram
processos anteriores a 1894 (o 1º é o nº 6 do anexo 2). Ninguém me forneceu uma
explicação para este facto, mas penso que se tenham deteriorado ou tenham sido
destruídos: Isto dificultou o processo de reconstituição da evolução da situação
económica das famílias, cujo estudo das origens ficou então dependente das fontes
orais, na falta de arquivos familiares.

Quanto aos inventários de facto encontrados, são bastante significativos e


representam a maioria das famílias mais importantes da elite política e económica local.
Quadro 1:

As informações fornecidas pelos inventários são variadas e, na maior parte


dos casos, muito completas e esclarecedoras:

1º Começam por indicar a data de instauração do processo, geralmente


poucos dias após a data do óbito, o qual é minimamente descrito, sempre com
indicação do local.

2º Referência ao tipo de processo: por morte ou por doação em vida. Neste


segundo caso, os bens inventariados são apenas os que são doados e não a totalidade
dos bens da pessoa ou pessoas que fazem a doação. Quando há doações com reserva
de usufruto, estes processos referem no fim a data da morte do(s) doador(es).

3º Há sempre um declarante, parente próximo ou procurador da família.

4º Descrição dos herdeiros, respectivos cônjuges e regime de casamento, com


morada, idade (no fim dos processos, por vezes há mesmo a especificação dos bens
que são distribuídos por cada um, mas só nos casos de haver testamento e em
fortunas consideráveis; há mesmo um caso, o nº 10, em que se apresentam as
certidões de baptismo de todos os filhos, que por acaso eram 10): este dado é
fundamental para o estabelecimento das relações de parentesco e para a verificação
do processo de transmissão dos bens.

5º Por vezes há a descrição completa do falecido, com a indicação do nome


dos pais, da idade na data da morte (nem sempre coincidente com as informações
recolhidas nos recenseamentos eleitorais) e da morada. Infelizmente estas
informações não são fornecidas em todos os inventários.

6º Descrição do estado civil do falecido e do cônjuge e respectivo regime de


casamento (quase sempre).

7º O facto de haver ou não testamento: se há está sempre incluído no


processo e é uma peça fundamental.

8º Descrição e inventário dos bens: logo no princípio ou no fim da lista dos


bens, apresenta-se o valor total dos mesmos, separado em:

a) "bens móveis" ou "bens mobiliários",

b) "semoventes" (o gado vivo),

c) "bens imóveis", "de raiz" ou "imobiliários",

d) dinheiro,

e) dívidas activas e passivas.

A descrição dos objectos (que são sempre numerados) de cada uma destas
categorias é bastante pormenorizada, incluindo os valores monetários de cada um. A
atribuição de um valor monetário aos bens inventariados pode ser feita pelos
familiares, mas correntemente aparece a referência a avaliadores oficiais, como num
caso em que surge a expressão: "que os louvados avaliaram em...". Nos objectos
móveis é frequente a utilização da expressão "muito usado"; nos semoventes, alguns
inventários chegam ao pormenor de referir os nomes e cores dos animais descritos,
enquanto outros apenas os avaliam colectivamente; quanto aos imóveis, apresentam a
classificação de "rústico" ou "urbano", o uso que se lhe dá, o tipo de terra das
propriedades rústicas, as árvores existentes, raras vezes o número de hectares, a
freguesia e concelho de localização, por vezes com os nomes dos vizinhos cujas
propriedades fazem fronteira com a que está a ser descrita, o número de inscrição na
matriz da conservatória do registo predial (onde o prédio está completamente
descrito, incluindo a localização precisa, mas esta informação só é fornecida em raras
ocasiões) e o valor matricial. Os bens imóveis têm ainda a caracterização do tipo de
propriedade: plena, enfitêutica (com a referência do proprietário pleno e do valor do
foro anual a pagar) ou arrendada (neste caso indicando o proprietário e o valor da
renda a pagar). Muitos destes bens estão ainda descritos como pertencendo ao
falecido em apena 1/2, ou outras porções por não terem sido divididos anteriormente,
sendo o resultado de heranças ou compras familiares em conjunto. Salienta-se ainda
na descrição dos bens a existência por vezes de inventários separados para os bens do
casal e do falecido como pessoa individual, nos casos bastante frequentes de
casamentos com separação de bens.

9º No final existe sempre um ou vários quadros dos valores especificados com a


apresentação das contas

feitas para apurar o total dos impostos de transmissão a pagar pelos herdeiros.
Geralmente são apresentados os valores separados a pagar a cada herdeiro, mas
noutros apresenta-se apenas o valor total a pagar.

1.2.2 - Dificuldades e problemas levantadas no tratamento desta


fonte. Como já foi referido, por vezes a idade do falecido apresentada nos inventários
por morte não corresponde à idade referida em recenseamentos eleitorais com datas
anteriores. Contudo as diferenças não são suficientemente grandes para serem
significativas, à excepção de um caso em que não ficou claro se a data referida era a da
morte ou a da instauração do processo e a diferença era de mais de 10 anos.

A grande dificuldade destas fontes é a impossibilidade de confirmar a veracidade


dos valores apresentados e mesmo a apresentação ou não por parte dos herdeiros da
totalidade dos bens. Isto tem uma justificação lógica: os herdeiros tentam sempre pagar
o mínimo possível de impostos sucessórios. Sobretudo a partir dos anos 30 nota-se uma
diminuição considerável dos valores declarados nos inventários, assim como da
quantidade e qualidade dos bens descritos. Ao mesmo tempo, regista-se um grande
desfasamento entre os valores matriciais dos bens imóveis e os seus valores reais.
Assim, surge um problema grave na apreciação dos inventários a partir destas datas:
enquanto no início do século, os inventários nos descrevem grandes fortunas em termos
monetários e recheios de casa bastante especificados, incluindo mesmo os objectos de
luxo, como as peças de ouro e prata, os cristais e serviços de louça de representação
social, tal como os de uso diário; a partir de meados do século, as mesmas famílias, que
eu conheço por verificação directa ou por fontes orais, passam a apresentar inventários
que dão uma imagem de precaridade de posses completamente afastada da realidade.
Torna-se então muito difícil acreditar na fiabilidade desta fonte, excepto nos inventários
orfanológicos, bastante mais rigorosos e obrigatoriamente verificados por um avaliador
oficial.
1.2.3 - Bens apresentados com maior frequência.

1.2.3.1 - No inventário dos bens móveis da casa de habitação,


predomina a descrição das mobílias dos quartos, das salas de jantar e de estar e em raras
ocasiões de mobiliário de escritório. Fica-se com a impressão de que não era muito
importante para estas famílias a existência em casa de bibliotecas (são raras as
referências a livros, apenas no caso de um médico) ou mesmo de um escritório, pois a
descrição de escrivaninhas ou secretárias é muito esporádica e só encontrei alguns
cofres.

Há grande pormenor na descrição do mobiliário das salas de jantar, de estar e


cozinha e dos respectivos utensílios, assim como de louças, vidros, talheres e de todas
as roupas de uso doméstico, incluindo toalhas, cobertores, lençóis, fronhas, etc. São
geralmente apresentados também máquinas de costura, relógios de parede, bacias, baús
e arcas. Há apenas um caso de uma tina de banho. Ainda nos bens móveis, aparece por
vezes a descrição dos alimentos guardados na dispensa da casa e do respectivo
vasilhame: o azeite, os cereais, a farinha, as carnes fumadas.

Muito importante para a definição das funções agrícolas, a descrição dos trens,
carroças, carros de parelha, arados, etc., e dos maquinismos para moagem de cereais e
lagares de azeite. Mais tarde, a partir dos anos 30, surgem os automóveis e as
"camionettes a gasogénio", os jeeps "Willies" e mesmo os carros de luxo, incluindo
Mercedes descapotáveis do final dos anos 30, aliás uma das únicas estravagâncias de
algumas destas famílias que se caracterizam pela apego ao dinheiro, que só era gasto na
compra de mais terras, de preferência herdades vizinhas às que já possuíam. A maioria
dos objectos de luxo referidos faz parte dos enxovais das senhoras.

1.2.3.2 – Semoventes. A descrição dos gados do falecido é uma


peça fundamental destes inventários, pois ilustram os principais interesses económicos
dos lavradores do concelho e a actividade das respectivas casas agrícolas. Dos animais
enunciados destaca-se o elevado número de efectivos de gado ovino e suíno e a
existência constante de gado bovino, muar e asinino para funções de tracção. O gado
tem aliás, na maior parte dos casos, um peso considerável nas explorações agrícolas do
concelho de Avis. Isto verifica-se no predomínio do montado de azinho e de sobro para
a alimentação dos suínos e no número de unidades dos rebanhos de ovelhas e cabras e
das varas de porcos. Além das terras de semeadura e das oliveiras, que praticamente
todas as propriedades descriminam, os inventários de alguns dos maiores
proprietários/lavradores do concelho ilustram bem esta realidade do forte interesse na
criação de gado ao longo de todo o período considerado.

1.2.3.3 - Bens imóveis, "de raiz" ou "imobiliários": Nos 50


inventários recolhidos estão descritas as seguintes propriedades no concelho de Avis
(excluindo todas as situadas fora do concelho):

Quadro 2:

Das 71 herdades possuídas pelos 21 grandes proprietários / lavradores cujos


inventários foram levantados, 64 são em propriedade plena e 7 pagam foro em trigo ou
em dinheiro ao dono do domínio directo, muitos ainda em 1952, pois esta situação só
foi abolida em 1976 (Decreto-Lei nº 195-A/76); os donos dos foros incluem grandes
proprietários de concelhos vizinhos e de Évora, um grande proprietário de Avis, o Dr.
Júlio Mário da Cunha e Sá, a Misericórdia de Avis e a Câmara Municipal de Avis;
destes proprietários, 6 recebem também foros de terras, casas e azenhas, pagos
anualmente em dinheiro, cereais, azeite e, no caso de Manuel Joaquim da Costa Braga
que morreu em 1895, além dos outros foros, recebia o pagamento do foro de uma casa
em galinhas. Do total dos inventariados, 10 são proprietários de domínios directos sobre
terras de várias dimensões, casas e azenhas e 8 pagam foros.

As herdades inventariadas apresentam na maioria dos casos a seguinte descrição:


"terras de semeadura, montado de azinho e de sobro, oliveiras, horta com árvores de
fruto, casa de habitação...", mas algumas apresentam descrições mais completas que
incluem lagares, moinhos e vários edifícios com funções diversas: celeiros, forjas de
ferreiro e muitas outras instalações coincidentes com a descrição que José da Silva
Picão nos dá dum Monte alentejano. Por exemplo, a herdade "Quinta do Pinheiro",
residência de José Valentim Varela que morreu em 1914, apresenta a seguinte
descrição: "terras de semeadura, horta, vinha, algumas oliveiras, casa de habitação,
celeiro, adegas, cavalariça, palheiro, abegoaria, lagar, moinho, turbina hidráulica,
prensa, fonte e depósito de água de nascente; fábrica de moagens com aparelhos a
vapor." Porém, este era um lavrador com grande iniciativa, que saía da média.

Nos inventários também se pode verificar o grande peso das casas que estas
pessoas possuem nas vilas: em 50 inventários surgem 97 casas, além de alguns celeiros,
anexos, etc. Todos apresentam pelo menos uma "morada de casas de habitação" urbana,
grande, e algumas outras mais pequenas que arrendam. As descrições destas são
também por vezes muito pormenorizadas, com o número de divisões (a casa de José
Godinho de Abreu, em Benavila, tem 41 divisões e vale 200.000$00 em 1946) e as
dependências, que podem incluir "altos e baixos, quintal, cavalariça, celeiro, pátio,
jardim, varanda", etc.

Os inventários de pessoas de outras profissões, como comerciantes, industriais


ou farmacêuticos, não referem geralmente propriedades rústicas, ou então referem
apenas uma horta com árvores de fruto perto da vila, ou semelhante. Algumas das
propriedades urbanas possuídas por membros deste grupo são comparáveis em valor e
até ultrapassam as propriedades urbanas do grupo dos grandes proprietários. Isto pode
ser verificado não só pelos valores e número de divisões descritos nos inventários, mas
também pelas fotografias (da época e actuais) das próprias casas.

1.2.3.4 - Dinheiro e dívidas activas e passivas. Apenas 21 dos


inventários apresentam referência a este tipo de bem. Só há 3 quantias em dinheiro: no
inventário do Dr. Cosme dos Campos Callado, por exemplo, diz "dinheiro em cofres".
Quanto a depósitos em bancos, só aparecem a partir de 1921 e as quantias vão
nitidamente aumentando. No entanto, já em 1914 surgem dívidas a bancos de Lisboa e
de Évora. Pode extrair-se desta fonte quais os bancos com delegações em Avis em
diferentes épocas, em conjugação com as informações dos anuários comerciais, que
indicam os respectivos agentes bancários. A secção das dívidas nos inventários é uma
fonte importante para o estudo do peso que a elite de Avis tinha como entidade
fornecedora de crédito, face à ainda incipiente presença dos bancos na vida económica.
A lista dos credores dá-nos a referência das pessoas que se dedicavam a emprestar
dinheiro, a maior parte das vezes a juros, e que será analisada no capítulo 3.

1.2.4 - Importância desta fonte. Apesar de ser uma fonte indirecta a


apresentar todas as deficiências e dificuldades (incluindo a própria fiabilidade) atrás
descritas, permite-nos ao menos fazer uma definição da hierarquia dentro das elites e
retratar um tipo de vida e uma sociedade. Os imóveis e semoventes, dão-nos um retrato
do tipo de riqueza da família, dos investimentos, da produção agrícola e dos maiores
interesses considerados. Para a elaboração deste retrato, os inventários fornecem-nos a
descrição das casas rústicas ou urbanas (a casa da vila e a do monte), a mudança da
residência principal (na geração que casou no princípio do século) do monte para a vila,
o mobiliário destas casas, os objectos de uso comum e os de representação social. Todos
estes pormenores podem ser verificados nos inventários por morte, sobretudo quando se
tem acesso aos de várias gerações da mesma família, como foi o caso em pelo menos
três. "Ao permitir uma análise da composição do património familiar, no mais ínfimo
pormenor dos instrumentos e bens que rodeavam a vida quotidiana das populações do
passado, abria-se a via para uma compreensão dos padrões de consumo e estilo de vida,
das actividades económicas que constituíam a fonte dos rendimentos familiares ou das
formas em que se processava a transmissão de bens e poder entre as gerações" (Rocha,
1988: 163).

A descrição dos bens de uso doméstico e da distribuição dos espaços dentro da


habitação permitem-nos tentar elaborar uma "História da vida privada", a qual terá
necessariamente de ser complementada e conjugada com as informações fornecidas
pelas fontes orais. Os dados fornecidos por esta fonte permitir-me-ão ainda apurar
outras informações valiosas para o estudo da religiosidade e das estratégias
matrimoniais, as quais desenvolvo nos capítulos 3 e 4. Por exemplo a percentagem de
casamentos com separação de bens e os casamentos pela igreja ou apenas pelo registo
civil. Também o apuramento das datas de nascimento e de morte é importante para o
estudo demográfico deste grupo: os meses de maior mortalidade, as causas de morte
(fornecidas só algumas vezes), a existência de um número maior de viúvos ou viúvas,
consoante as épocas, etc.

Esta fonte foi ainda fundamental para o estabelecimento dos laços de parentesco
entre as pessoas apuradas como pertencentes à elite política e económica de Avis e a
elaboração das respectivas árvores genealógicas. Apenas com os nomes recolhidos nos
recenseamentos e nas actas das eleições não era possível relacioná-las, pois um dos
grandes problemas é a grande diversidade de apelidos dentro da mesma família, mesmo
entre irmãos, filhos do mesmo pai e da mesma mãe. Os inventários resolveram parte
desta questão, pois apresentam listas de filhos e herdeiros dos falecidos. Porém, a falta
de alguns inventários de elementos-chave dessas famílias tornaria esta reconstituição
inviável sem o precioso auxílio das fontes orais.

1.2.5 - Autores que trataram este tipo de fonte. Tal como já foi
referido, o ponto de partida para este trabalho foi a tese do Prof. Hélder Fonseca (1996).
Este autor define as características e tendências da Economia Alentejana na segunda
metade do século XIX e caracteriza a Elite Económica Alentejana, centrando o seu
estudo no concelho de Évora. O seu objectivo é uma definição e caracterização
sociológica desta elite, a qual, independentemente da diversidade de origens, percursos
e atitudes individuais, se constituiu como um grupo com um forte sentido de
solidariedade e elevado grau de coesão (parte II, capítulo 2). Pode acrescentar-se que
esta coesão se solidificou com as estratégias matrimoniais que levaram à concentração
da propriedade. Esta estratégia é descrita quando o autor faz a reconstituição do estilo
de vida e rede de parentesco destas famílias, nomeadamente no que diz respeito aos
critérios de recrutamento para o clube "Círculo Eborense".

Nos capítulos seguintes, o autor pretende mostrar que os interesses materiais da


elite económica alentejana se modificaram ao longo do século XIX, revelando grande
empenho tanto na aquisição imobiliária e na agricultura, como em aplicações no
domínio industrial, financeiro e bancário (em Avis, este tipo de investimento teve um
carácter bastante reduzido entre 1886 e 1941, mas com algum significado parcelar). No
entanto, foi ainda a terra que mais investimentos privados atraiu na região durante o
período estudado. Por isso, o autor analisa as estratégias de acumulação fundiária, as
modalidades de rentabilização e da organização das explorações, a tipologia do capital
empregue e o grau de modernização técnica. As principais fontes utilizadas são os
inventários por morte, declarados nas repartições de finanças para pagamento do
imposto sucessório (introduzido em Portugal em 1838) e os inventários orfanológicos,
recolhidos no Juízo de Órfãos.

Também Maria Manuela Rocha utilizou esta fonte para estudar o concelho de
Monsaraz na 1ª metade do século XIX.

1.3 - Arquivos Particulares. O único que está minimamente tratado como tal é
o Arquivo Pais Telles no Ervedal, organizado por Mário Pais da Cunha e Sá antes da
sua morte em 1971 e actualmente na posse da Junta de Freguesia. Reúne grande parte
dos livros e documentos possuídos por duas das famílias das elites do concelho, unidas
por casamentos vários: a família Pais e a família Cunha e Sá. Este arquivo inclui ainda
uma espécie de museu arqueológico, pois este proprietário, descendente de lavradores,
médicos e advogados, foi um estudioso da História de Portugal, chegando mesmo a
escrever um livro sobre as vias romanas. Viveu em Lisboa grande parte da sua vida, das
rendas das herdades em Avis, pertenceu ao círculo de amigos de Fernando Pessoa
escreveu vários livros bastante curiosos, mas condicentes com o espírito da época.
Pretendeu provar que Luís Vaz de Camões viveu em Avis parte da sua vida, quando
esteve exilado no Maranhão. Importante para este trabalho foi a genealogia que
escreveu da família Pais de Avis, remontando ao século XVI.

Neste arquivo encontrei algumas escrituras de compra das herdades das famílias
e alguns testamentos; porém, mesmo com os livros catalogados e arrumados, grande
parte dos papéis ainda estão atirados para dentro de gavetas, sem a menor possibilidade
de darem origem a um estudo mais aprofundado dos comportamentos económicos das
casas agrícolas destas famílias. Tal como na Fundação Abreu Callado, no Ervedal, estes
montes de papéis em caixas e gavetas não apresentam qualquer ligação entre si, datas ou
um mínimo de organização contabilística que permita a sua simples arrumação. Apenas
uma lista de pagamentos a tiradores de cortiça me deram a certeza de que a cortiça dos
sobreiros da herdade de Pêro Viegas era tirada pelos proprietários e só depois vendida,
mas que significado pode ter isto no conjunto da lavoura, se nem se sabe o valor da
mesma?

Se até numa instituição como a Fundação Abreu Callado é difícil fazer a história
da família, quanto mais nas outras casas, cujos descendentes na maior parte dos casos já
nem se dedicam à agricultura. Assim, os arquivos familiares foram mais importantes
noutro tipo de fontes: os livros, as revistas, as roupas, o mobiliário (incluindo um
gramofone), as fotografias de família, os objectos de uso pessoal. Na casa da família
que deu origem a esta Fundação, tudo está conservado como nos dias em que os
proprietários lá viviam. Com a autorização dos directores, pude ver a casa (confirmando
a veracidade inventários por morte dos dois irmãos Abreu Callado), fotografá-la, tocar
nos objectos, ver as gavetas das roupas de cerimónia e de uso corrente, tudo
acompanhado pelos comentários dos empregados da casa e seus descendentes, que lá se
mantêm pelos estatutos da Fundação. Esta observação em directo de uma realidade
parada no tempo, uma vez que esta família não teve descendentes que continuassem a
usar estes objectos ou que os alienassem, foi como uma viagem no tempo e uma fonte
importantíssima para a construção da imagem da vida do dia-a-dia destas famílias.

1.4 - As fontes iconográficas. Este mesmo arquivo foi uma fonte importante de
fotografias de época, postais enviados por parentes e vários afilhados em viagens
(incluindo uns parentes que moravam no Brasil), quadros nas paredes e gravuras,
gentilmente cedidas em fotocópias, as quais revelaram as caras, os modos de vestir, os
interesses, as actividades em períodos de lazer e mesmo algumas atitudes de pessoas
apenas conhecidas pelos nomes. Estes postais e retratos são uma fonte preciosa para a
História Urbana, pois mostram-nos a evolução das cidades, e para a História Social em
geral, pois revelam muito mais do que qualquer descrição por escrito, sobretudo no que
diz respeito à estética de cada época e aos gostos e preferências das diferentes gerações.
A apresentação destas fontes completa e enriquece a descrição, torna-a mais viva e
esclarecedora do que um relato apenas por escrito.

Para Avis e para o grupo estudado esta fonte é abundante, pois além de ser
frequente as pessoas tirarem o retrato e o enviarem umas às outras, seguindo o costume
da época de enviar fotografias na troca de correspondência, sobretudo no caso de
pessoas que moravam em terras distantes (e todas eram distante, devido às más vias de
comunicação), as famílias Figueiredo e Pais possuem uma colecção considerável de
fotografias das famílias nas situações mais variadas: piqueniques, caçadas, festas
religiosas, carnaval, reuniões familiares em ocasiões de aniversários, baptizados, etc.

Esta colecção abrange praticamente todo o período estudado, pois uma das
senhoras era fotógrafa amadora, tirava fotografias aos parentes (praticamente todos os
da elite estudada) e teve mesmo trabalhos seus publicados em revistas e nos postais
oficiais da vila encomendados pela Câmara Municipal. Em todas as colecções de
retratos dos arquivos familiares encontrei trabalhos assinados por "Cecília de
Figueiredo" e o acesso às chapas em vidro com os negativos das fotografias foi
verdadeiramente o desvendar de um mundo. Confirma-se assim o ditado que diz que
uma imagem vale mais que mil palavras.

Esta fonte já foi tratada por vários autores, como por exemplo Maria Filomena
Mónica, que explica: "No princípio do século já a fotografia era uma moda: vendiam-se
inúmeros postais e os cidadãos iam tirar retrato aos ateliers" (Mónica, 1983: 5).
Também o Prof. Hélder Fonseca, na sua exposição Retratos de família. As elites
eborenses no século XIX, comentou que "a fotografia consolidava sentimentos de
pertença entre os elementos do grupo, estreitava solidariedades e prolongava a memória.
(...) a fotografia ajuda ao exercício da memória, fortalece raízes, consolida pertenças,
perpetua o nome da família (...) Noutros casos em torno do patriarca, guardião das
referências familiares, reunia-se a descendência, que assegurava a continuidade e o
futuro do nome nas gerações seguintes." (1996). Em Avis esta moda também pegou
naturalmente, sobretudo entre as elites, que iam tirar retratos aos melhores fotógrafos da
época quando viajavam a Lisboa ou às praias mais famosas.

Simon Kuin, numa recensão ao livro O Século da Rússia comenta: "De


brinquedo dos mais abastados, servindo para solenizar os momentos altos do calendário
da sua vida privada (impressionante a fotografia da pilha de veados mortos numa caçada
organizada por Nicolau II, em 1912) e utensílio de etnógrafos que foi no início do
século, a fotografia rapidamente evoluiu para instrumento de propaganda, dos anos da
Grande Guerra até ao auge da colectivização da agricultura nos anos 30. (...) Nos anos
da Grande Guerra, predominavam os «retratos de heróis» que circulavam pelos
regimentos para levantar a moral (...)" (Kuin, 1996: 84). Isto aplica-se perfeitamente à
minha colecção de fotografias das elites nos momentos mais significativos da sua vida;
quanto à fotografia como propaganda, o Estado Novo também a utilizou e aí os jornais e
revistas recolhidas para este período são também muito ricas em fotografias dos
"ilustríssimos" membros da União Nacional, com as poses mais enfáticas e o elogio aos
grandes lavradores do concelho.

Sobre o período da 1ª Grande Guerra, encontrei várias fotografias dum


farmacêutico de Avis, Joaquim de Figueiredo (filho do farmacêutico que foi presidente
da câmara em 1886), mas não foi tirada pelo motivo aqui apresentado. Este oficial tirou-
a para mandar à família, para o verem fardado, num retrato imponente para marcar um
momento importante da sua vida, imediatamente antes de embarcar para a guerra, talvez
para a morte. Felizmente não morreu, mas a fotografia marcou um momento que a
família podia recordar caso ele tivesse morrido.

Como complemento à recolha e fotocópia de fotografias antigas, realizei


também um extenso trabalho de fotografia às casas da vila e aos montes de habitação
destas famílias na actualidade, uma vez que apenas possuía as fotografias de época de
algumas. Assim foi possível ilustrar com imagens praticamente todos os imóveis
referidos nos inventários por morte, apesar de muitos já não pertencerem às famílias
originais.

O mesmo fiz nos cemitérios, onde fotografei praticamente todos os jazigos e


campas, para grande curiosidade e surpresa dos passantes.

1.5 - Os Cemitérios. Sugerida numa entrevista com o Prof. Hélder Fonseca, a


visita aos cemitérios das várias freguesias do concelho foi uma experiência, se bem que
algo perturbadora, muito útil nos seguintes aspectos: comparação entre a cidade dos
mortos e a cidade dos vivos; a disposição das campas e dos jazigos, a sua
monumentalidade e decoração, as famílias mais destacadas e as menos, as datas de
morte e os nomes completos dos falecidos ajudaram na elaboração das árvores
genealógicas e todo este conjunto de elementos permitiu um retrato do grupo estudado
nas suas formas de demarcação dos restantes grupos. Infelizmente não foi possível o
acesso aos títulos de compra dos talhões, uma vez que as juntas de freguesia que
actualmente são responsáveis pelos cemitérios não os têm em arquivo.

1.6 - Imprensa distrital, regional e nacional. As fontes recolhidas em Avis


permitiram a elaboração das listas do pessoal político e da maior parte das informações
sobre as famílias em causa. No entanto, a falta de imprensa local até 1966, confirmada
na Biblioteca Nacional e nos Anuários Comerciais, obrigou-me a consultar outras fontes
para completar a listagem das eleições locais e distritais. Uma vez que não estavam
discriminados nas actas das eleições, nem nos livros de actas da Câmara Municipal, os
partidos políticos a que pertenciam os vereadores ou deputados eleitos, para poder
estudar o percurso das elites locais face às mudanças no poder central foi necessário
procurar os partidos vencedores de todas as eleições deste período de 55 anos na
imprensa distrital e regional.

Para ter uma noção da complexidade da História da Imprensa Periódica em


Portugal foi importante a consulta da obra de José Tengarrinha (1965), mas foi
sobretudo das obras do Prof. Oliveira Marques que retirei a maior parte das informações
sobre a História política do princípio do século e sobre as fontes a consultar para o
aprofundamento deste estudo (Marques, 1978, 1981). Além dos mapas já feitos por este
autor e seus assistentes com os resultados das eleições distritais na primeira república,
recolhi os nomes das principais publicações periódicas que me podiam informar sobre
as eleições. De igual importância foi a recolha das datas das eleições e da evolução
partidária numa época tão conturbada politicamente, com partidos que se formam,
mudam de nome e acabam por vezes em poucos meses. Com estes elementos foi então
possível consultar os principais jornais e revistas nacionais e regionais, nos quais
encontrei quase todos os resultados eleitorais pretendidos, sobretudo a nível distrital no
jornal O Distrito de Portalegre, com o sub-título "Não é órgão de Partido Algum
Político" e publicado a partir de 27/4/1884. Mas logo passa a ser órgão do Partido
Progressista; na República apoia os monárquicos e conservadores e apoia a revolução
do 28/5/1926.

Além destes elementos que permitiram reconstituir o percurso político de


algumas das principais personagens das elites do concelho de Avis, foi possível recolher
várias notas curiosas, como por exemplo as diferentes opiniões dos órgãos dos vários
partidos sobre a mesma pessoa. No caso de um grande proprietário que foi presidente da
CMA e deputado mais que uma vez em regimes diferentes, os comentários nos jornais
vão desde o pior insulto ao mais rasgado elogio.

Os jornais e revistas regionais apresentam também por vezes notícias sobre


festas locais, como a mais importante festa de Avis (a romaria à Senhora Mãe dos
Homens), feiras, jantares comemorativos de vitórias eleitorais e outras. No período do
Estado Novo, o Jornal da Situação e as revistas Álbum Alentejano e Expansão
Portuguesa apresentam artigos sobre Avis e as suas elites: os principais lavradores, a
composição das suas lavouras, os políticos e suas famílias, os representantes da União
Nacional, tudo, naturalmente, com enormes elogios aos seus contributos para o
progresso do concelho e a riqueza da nação! Saliento que o meu acesso a estas revistas
foi possível na Biblioteca Nacional, mas principalmente nos arquivos das famílias por
elas retratadas.

1.7 - Arquivos dos Ministérios. Infelizmente a longa pesquisa no Arquivo do


Ministério do Interior não deu os resultados esperados, principalmente no que diz
respeito às relações políticas entre as elites de Avis e o Estado Novo. Os parcos
resultados são analisados no capítulo 5. Quanto ao arquivo do Ministério das
Corporações, foi muito útil o acesso ao Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e das
Corporações, o qual me esclareceu quanto às instituições corporativas do Estado Novo,
nomeadamente os grémios e casas do povo. Importante também foi a visita ao INE e a
recolha dos censos da população.

No que diz respeito ao tema da escolaridade e da frequência das escolas por


parte dos filhos das elites estudadas, a escola de Avis não guardou os arquivos e foi-me
sugerida a visita ao Ministério da Educação, onde me foi informado que têm
quilómetros de papéis em caixas por organizar num armazém em Carnaxide... Assim,
tive de me limitar às informações recolhidas oralmente.

1.8 - Anuários Comerciais. O primeiro contacto com esta fonte foi no arquivo
particular de uma família de Avis. Mais tarde verifiquei que também era sugerida pelo
Prof. Oliveira Marques e após a recolha dos exemplares na Biblioteca Nacional cheguei
à conclusão que esta fonte era fundamental e insubstituível na quantidade e qualidade de
informações que fornece em tão pouco espaço.

1.9 - As Fontes Orais. Como já foi várias vezes repetido, as informações


fornecidas oralmente foram, se não as mais importantes, pelo menos fundamentais para
a organização dos elementos recolhidos em todas as outras fontes. Só o testemunho de
pessoas que ainda conviveram com a realidade descrita é que possibilitou, logo de
início, o interesse pelo tema e depois, a elaboração, por exemplo, das árvores
genealógicas. Por mais viva que seja a descrição de um monte alentejano por José da
Silva Picão (1983), não chega à conversa com um antigo empregado da casa agrícola
Abreu Callado, actualmente utente do centro de dia para reformado de Benavila. Até
porque há diferenças regionais nos nomes dados aos diferentes empregados duma
lavoura e este autor era de Elvas. As entrevistas com os vários descendentes das
famílias retratadas e o conhecimento das suas atitudes perante a vida, tipo de educação
recebida, etc., fornecem-nos um retrato da sua herança cultural que nos mostra um
pouco do que pensavam os seus antepassados.

1.10 - Fontes Literárias. O mesmo se passa com algumas fontes literárias,


como a obra de Saramago – Levantado do Chão, passada numa aldeia alentejana nos
anos 60 e 70 deste século. Ainda que descrevendo uma realidade posterior à época
abrangida por este trabalho, assim como a obra de Cutileiro, este autor retrata uma
sociedade com enormes semelhanças com a realidade de muitas outras aldeias e vilas
desta região. É um comentário crítico que descreve a vivência e o ambiente rurais do
ponto de vista dos trabalhadores, com a habitual riqueza de personagens e diálogos
característicos deste autor. A sua contribuição para o entendimento das relações sociais
na região estudada foi fundamental para esta tese. A outro nível situam-se as obras de
Noel Teles, pseudónimo do Dr. Manuel Telles de Carvalho, um advogado do concelho
de Avis, neto do 2º Maior Contribuinte de 1890, que escreveu alguns contos, novelas e
um romance. Estas obras interessam por serem escritas por um membro das elites
estudadas, um descendente de lavradores que passava as suas férias escolares na
herdade da família. Uma das suas actividades era a caça, durante a qual fazia grandes
caminhadas, tomando contacto com a realidade que o rodeava. As suas descrições da
paisagem alentejana são enriquecidas pela narração de cenas da vida de um grande
leque de personagens típicas da realidade alentejana. Inclui até numa das suas obras um
pequeno dicionário de vocábulos regionais utilizados. Todos estes elementos
permitiram uma abordagem mais fiel duma época e duma realidade cuja perda seria
lamentável.

1.11 - Variações ortográficas. É importante fazer ressalvas para a enorme


variação da ortografia dos nomes, absolutamente inconstante até para as mesmas
pessoas em ocasiões diferentes. Segundo o Prof. Oliveira Marques, em 1910 houve
"reforma ortográfica, simplificando a escrita numa aproximação fonética." (Marques,
1981: 226). De qualquer modo nada ficou muito rígido durante muitos anos. Quanto aos
nomes, a mesma pessoa usa várias versões em ocasiões diferentes, como os Pais ou
Paes, todos da mesma família, os Telles, Varellas, o Jeronymo ou Jerónimo, Manoel ou
Manuel, Christovam ou Cristovão, etc.
Capítulo 2 - Avis
Se algum dia fores a Avis,
toma bastantes cautelas
pois só lá encontrarás
burros, porcos e Varelas.

Esta quadra era habitualmente recitada no Carnaval pelas pessoas de fora que se
deslocavam a Avis para participar nestas animadas festas. Apesar do sentido pejorativo
que se pode encontrar nos seus versos, eles são muito apreciados localmente e até são
recitados com um certo orgulho pelos referidos Varelas, que assim se congratulam de
serem uma das famílias dominantes e mais numerosas da vila e do seu termo, tanto a
nível das elites como na classe dos pequenos proprietários. A sua disseminação foi
muito bem sucedida pela quantidade de filhos que foram tendo (e que chegavam a
adultos e tinham outros tantos) ao longo das várias gerações. Já em 1799 a pauta dos
elegíveis para vereadores na vila de Avis mencionava um Gonçalo Varela Leão, avô de
dois Simões Varela, lavradores de grandes herdades no termo da vila. Os seus
descendentes continuaram ao longo do século XIX e pelo menos até meados do século
XX a ocupar os lugares mais importantes na hierarquia política, económica e social
local: ainda em 1941, o presidente da câmara era primo direito dos Varelas e casado
com uma prima que era Varela pelo lado da mãe.

Também um grande número de Varelas pertence, sobretudo a partir de 1900, ao


grupo dos pequenos proprietários, resultado da divisão por partilhas das herdades em
courelas distribuídas por vezes por 11 irmãos ou mais. Pela sua permanência por vários
séculos no grupo das elites locais e pela sua grande difusão numérica, geográfica e
ocupacional em Avis, além do facto de terem relações de parentesco muito próximas
com todas as outras famílias, os Varelas constituem um dos principais objectos deste
estudo.

Quanto ao resto da quadra, ela é reveladora da realidade do concelho, no qual a


economia foi durante muitos anos baseada na produção de suínos, alimentados pelos
montados de azinho e mais tarde sobro. Também a quantidade de burros é muito
considerável, como aliás em todo o lado, mas neste caso como animais de tracção.

2.1 - Localização e descrição. Avis é uma vila e sede de concelho com o


mesmo nome no distrito de Portalegre. Já nos finais do Antigo Regime este concelho
existia com limites muito semelhantes aos actuais. Segundo informações dos anuários
comerciais, em 1901 Avis era um concelho de 2ª ordem pertencente à comarca de
Fronteira; já em 1908 Avis é apresentada como sede de comarca. Até aos anos 20 o
concelho é descrito nesta fonte como: "Concelho de 2ª ordem e fiscal de 3ª classe -
Comarca de 3ª classe - Relação de Lisboa - Pertence ao districto de Portalegre -
Arcebispado de Evora - Dista 47 kilom. de Portalegre e 45 kilom. de Evora - População:
5:200 hab. - Freguezia da séde do concelho: Nossa Senhora da Orada."(sic). Em 1928 já
aparece descrito como "Concelho de 3ª ordem". Foi sede de comarca até 1927, quando
passou a pertencer à comarca de Fronteira pelo Decreto-lei nº 13.917 de 9/7/1927.
Pertence ao Arcebispado de Évora. Situado no Alto Alentejo, este concelho tem como
vizinhos a norte os concelho de Ponte de Sor e Alter do Chão, a leste Fronteira e Sousel,
a sul Arraiolos e a oeste Mora. Compõem-se de 8 freguesias, as quais eram
representadas nas eleições até 1901 pelas respectivas paróquias (até à República as
eleições das Juntas de Freguesia eram para a "Junta da Parochia" ou para a "Assembleia
Parochial"):

Freguesias: Paróquias:
Alcórrego Santo António do Alcórrego
Aldeia Velha Santa Margarida d'Aldeia Velha
Avis Nossa Senhora da Orada
Benavila São Sebastião
Ervedal São Barnabé
Figueira e Barros São Braz da Figueira
Maranhão São Domingos de Bembelide
Valongo São Saturnino

A descrição da vila de Avis pelos anuários comerciais (por exemplo o de 1911,


vol. II, p. 1793) revela claramente as suas características principais: "Villa situada em
uma eminencia e foi outr'ora cercada de muralhas e torres, sendo estas em numero de
cinco (a maioria das fontes indica 6 torres), duas das quaes, segundo alguns, foram
demolidas em 1640 para com os seus materiaes serem edificados dois reductos em
harmonia com o systema de fortificações n'esse tempo. Tinha seis portas: a de Evora, de
Santo António, de S. Roque, do Postigo, do Anjo e Debaixo. De tudo isto se encontram
ainda hoje bastantes vestigios."(sic).

Avis foi a sede da ordem militar com o mesmo nome e nesta vila encontram-se
várias construções pertencentes ao Convento de S. Bento de Avis: "O conjunto é
formado pela Igreja - que já foi provisoriamente matriz, tendo como orago Nossa
Senhora da Orada - pela Sacristia, Sala do Capítulo, Refeitório, Cláustro e Torre Sineira
(todos manuelinos)", além do edifício do convento, cujas ruínas aparecem sempre como
o ex libris da vila. Outros edifícios de interesse são a Igreja Matriz do século XV; o
Pelourinho com a ave simbólica do concelho, a águia de asas abertas; a Capela da
Misericórdia; o Palácio do Prior-Mor, que já serviu de teatro e actualmente abriga a
Câmara Municipal; os Antigos Paços do Concelho Medievais; os vários Passos da
Procissão do Senhor do Passos; algumas casas nobres com Brasões e várias casas de
habitação popular com portais manuelinos, sobretudo nos chamados "arrabaldes", um
"conjunto de três ruas paralelas situadas a Norte da povoação, fora de Muralhas,
acessíveis pela porta que existiu junto à Torre de S. Roque. Aí se acantonariam todos os
que, da Idade Média ao século XVI, não eram bem tolerados dentro de portas, casos dos
judeus, almocreves e outra gente 'de fora'." (Rodrigues, 1993: 10, 30).

Igualmente fora da vila, mas do lado sul, situa-se a Cerca do Convento, uma
porção de terra na encosta entre o convento e a Ribeira de Avis, na qual os frades
cultivavam uma horta em socalcos com um sistema de rega por tanques herdado da
colonização árabe da região. Nesta horta, além de existir um microclima propício ao
cultivo de legumes e frutas para a alimentação dos frades, encontra-se uma fonte de
águas férreas (segundo os anuários comerciais do início do século era uma fonte termal,
mas desde os anos 1980 que está inquinada pelo esgoto da vila que desagua
directamente na ribeira) com um precioso trabalho em mármore do século XVI como o
edifício do convento. Também na mesma propriedade, actualmente submersa pela
Barragem do Maranhão, existe a chamada Lapa de S. Bento, um altar numa gruta no
meio da escarpa, considerada pré-histórica.

Das restantes freguesias do concelho, destacam-se as respectivas igrejas


paroquiais e a Igreja de Nossa Senhora de Entre-Águas, do século XV em Benavila.

Este concelho é rico em água, passando junto à vila de Avis a Ribeira de Raia, a
qual se junta à Ribeira de Sor para formar o Rio Sorraia que desagua no Tejo. O Raia
passa "pelas povoações de Monforte, Fronteira e Aviz, com a denominação de ribeira
Grande ou ribeira de Aviz". Já em 1911, quando Mário Vieira de Sá escreveu esta
descripção geral do Alentejo, se sentia a necessidade de construir barragens e albufeiras
para irrigar as terras (Sá, 1911: 18). Em Avis também se fez o projecto de uma
barragem durante o governo de Fontes Pereira de Melo (1883 - 1886), por iniciativa do
Presidente da Câmara Dr. Joaquim de Figueiredo, do Partido Regenerador e amigo
pessoal de João Franco. "O projecto foi então mandado executar por portaria de 9 de
agosto de 1888. Era este um emprehendimento de muito folego, visto que consistia
n'uma grande obra, cujo orçamento foi avaliado em 410 contos de réis (...) e em que se
dispenderam até julho de 1892, 47:610$450, em expropriações, algumas terraplanagens,
acquisição d'alguma pedra d'alvenaria e casa para abrigo do pessoal. D'estes trabalhos,
hoje nada se pode utilisar; porque, suspensas as obras em 1892, estão ha quasi 20 annos,
ao completo abandono!" (Sá, 1911: 178). De facto, a morte de Joaquim de Figueiredo
em 1890, o grande impulsionador da barragem, e a resistência dos grandes proprietários
do concelho, além da mudança do poder municipal e nacional do P. Regenerador para o
P. Progressista, fizeram com que a construção parasse por completo. A actual Barragem
do Maranhão, que fornece energia eléctrica e irriga todo o concelho e arredores foi
construída apenas em 1958, dentro do programa de obras públicas e de irrigação do
Alentejo levado a cabo pelo Estado Novo. Situa-se no Maranhão, a 14 Km de Avis. O
local anteriormente escolhido e as respectivas instalações, junto da vila de Avis,
funcionam como clube náutico e centro de lazer e tem como denominação "Barragem
Velha".

2.2 - Resumo histórico. A História de Avis confunde-se com a História da


Ordem de Avis a qual tem várias versões, cada uma mais elaborada. "Segundo a
inscrição da lápide que se encontra na Porta de S. Roque (uma das da vila), Avis foi
fundada em 1214, por Fernão Anes, que foi mestre da Ordem de Avis de 1196 a 1219.
Teve forais concedidos por D. Afonso II (1218), D. Dinis (1253) e D. Manuel
(1.1.1512)." (Ribeiro, 1965: 180).

D. Fernão Anes ou Enes foi o 3º Mestre dos chamados Freires de Évora que se
integravam na Ordem de Calatrava, com sede em Castela. Foi a esta ordem que D.
Afonso II doou em 1211 o lugar de Avis para aí construir um castelo, cujas muralhas
ainda existem, tanto de forma visível, como fazendo parte das casas que se foram
construído ao longo dos séculos. O mesmo se passou com as torres, das quais ainda
existem três: o acesso a duas das torres só é possível entrando nas casas particulares que
junto a elas foram construídas.

"Em 1211 El-Rei faz doação do logo de Avis e seu termo à Ordem de Evora que
logo mudando para aí o seu convento se ficou chamando Ordem e Cavalaria de S. Bento
de Avis. Era com a condição de acastelarem a vila e de a terem sempre povoada de
guarnição militar - que era êsse o sentido da expressão povoar castelos. (...) O sistema
administrativo da Ordem consistia em fundar povoações em terrenos incultos.
Determinavam uma dada área, o herdamento ou sêsmo, estabeleciam o sítio para a
construção de casas, davam-lhe nome, e depois redigiam um foral de póvoa declarando
aforada para todo o sempre a terra à razão do quinto ou do dízimo de tôda a produção
anual, e para quem a quizesse povoar. Era aforada à colectividade, e não à pessoa em
particular. Os povoadores elegeriam alcaides e meirinhos para a distribuição entre êles
das terras do sêsmo; e a Ordem arrendava vitaliciamente, e em condições de privilégio,
todo o rendimento da nova póvoa, a um dos seus freires que seria então o Comendador
do lugar. Quando os freires tiveram autorização para casar, a Comendadoria tornou-se
hereditária. Foi assim, por exemplo, que a Comenda das Galveias andou na casa dos
Melo e Castro, de que um representante foi o 1º Conde das Galveias. (...) Avis era
comenda do comendador-mór." (Sá, 1935: 239-244).

Avis passou a vila em 1229 e teve grande importância na região quando aí


viveram os mestres e a sua corte. "D. Pedro I fez com que o seu filho bastardo, D. João,
fôsse eleito mestre da Ordem de Avis, não obstante a sua tenra idade de sete anos. A
mãi do infante, D. Teresa Lourenço, foi residir nessa vila, numas casas que D. Pedro lhe
oferecera na rua da Mouraria. D. João foi educado no Mosteiro, e entretinha-se muito na
caça, diz Fernão Lopes, assim com exercícios venatórios se preparando para a guerra.
Aprendeu em Avis a matar castelhanos! Quando empunhou o scetro de Portugal
endossou o méstrado a seu dilecto aio D. Fernão Rodrigues de Sequeira (...) que até
então fôra comendador-mór de Avis (...), governou por muitos anos a Ordem, e depois
quando o Rei se foi à conquista de Ceuta, êle ficou governando o Reino e a Casa Real.
Jaz na Igreja do Convento de Avis." (Sá, 1935: 241).

Este foi o último mestre da Ordem de Avis. A partir da sua morte em 1433, o
título de mestre foi abolido e substituído pelo de "Governador e administrador da
Ordem", cujo 1º foi D. Fernando, o Infante Santo. "Porque esta abolição do título de
mestres? É que a Ordem tinha evolucionado num sentido verdadeiramente sacerdotal,
perdendo o seu carácter guerreiro, e como já os mestres não eram eleitos livremente,
mas da escôlha dos reis, e como o título de mestre, devia, pelo Estatuto, identificar-se
em espírito, com a corporação, e esta era religiosa, não fazia sentido que um príncipe
profano fôsse dentro da Comunidade outra coisa, àlém dum governador e
administrador" (Sá, 1935: 241).

Mário Pais da Cunha e Sá (que assinava Mário Saa), "publicista ilustre",


segundo a Revista Expansão Portuguesa, publicou outras versões da história de Avis,
como se pode ver na bibliografia. Na versão que tenho citado, este autor reafirma o
parentesco próximo entre algumas famílias de Avis e Luís Vaz de Camões: "Entre as
famílias nobres que habitavam Avis no século XVI estavam os Camões, que
representavam a família do poeta. Descendiam de Vasco Pires de Camões, bisavô de
Luís de Camões e um dos homens mais ricos de Portugal".

Segundo a mesma fonte, pode concluir-se que Avis era uma vila habitada
sobretudo por membros do clero, que incluíam o prior-mor, que residia no maior palácio
da vila, e vários padres e os frades do convento. Também há vestígios de casas de
algumas famílias nobres. O brasão da família Melo (Casa de Cadaval), por exemplo,
ainda é visível no portão de uma casa do século XVIII e também é possível localizar a
casa da família Camões na vila. Quanto às casas de habitação popular, encontravam-se
na sua maioria nos arrabaldes. Além de viver na vila de Avis, parte da população
residia também nas outras freguesias (Figueira, por exemplo, foi elevada a vila em
1271), sobretudo Ervedal e Benavila, pois as restantes não passavam de lugares com um
reduzido número de fogos, espalhando-se a sua população pelos montes, muitos dos
quais eram conventos.

Todas estas casas nobres referidas eram de dimensões reduzidas e encontravam-


se dentro da muralha. No entanto, os seus vestígios são muito limitados, pois as novas
elites dos finais do século XIX, ao transferirem a sua primeira residência dos montes
para a vila (até então mantinham lá apenas casas de pousada, pois residiam nas sedes
das suas lavouras), construíram grandes residências apalaçadas sobre as antigas, mais
pequenas. Só a partir dos anos 1920 é que se começou a construir fora das muralhas,
estendendo-se actualmente a vila para sul. O estudo das propriedades urbanas destas
famílias é desenvolvido no capítulo 4.

As restantes freguesias compunham-se sobretudo de montes de habitação de


grandes herdades com as respectivas capelas, como era o caso do Alcórrego ainda nos
anos 30 do século XIX. Apenas o Ervedal e a aldeia de Figueira e Barros se destacavam
deste conjunto.

2.3 – População. Avis situa-se no Alentejo, uma região de baixa densidade


populacional. Em 1910 a média nacional situava-se nos 65 habitantes por Km2,
enquanto este concelho tinha apenas 12 (Machado, 1957, Silva, 1980). Por outro lado,
esta é uma região com uma urbanização superior à média nacional: em 1890, esta era de
15%, enquanto no concelho de Avis era de 20,5% (Mattoso, 1994, vol. 6: 31). Em 1900,
este concelho já tinha 27,3% dos seus eleitores a residir na vila de Avis e em 1913 tinha
36,1%.

No anexo 3 pode ver-se o aumento da população das vilas e aldeias durante o


período estudado, com a transferência dos eleitores para as vilas e o abandono dos
montes como 1ª habitação. Falo em eleitores, pois foi dos livros do recenseamento
eleitoral que retirei a maior parte das informações referentes à população de Avis. Para
a definição dos critérios para se ser eleitor e elegível e respectiva evolução no período
estudado, ver legislação.

Neste concelho a percentagem dos eleitores em relação ao total da população é


de 20,57 em 1890. Este valor corresponde a 79,1% da população masculina adulta a
nível concelhio, o que é consideravelmente mais alto que a média nacional para esse
ano: os eleitores representavam 18,8% da população total e 72,3% da população
masculina adulta. Estas elevadas percentagens de eleitores foram explicadas por Pedro
Tavares de Almeida: resumindo, o interesse dum grande eleitorado encontra-se no facto
de as eleições se ganharem a partir do recenseamento eleitoral e este era controlado
pelos caciques locais que assim constituíam a sua clientela política e garantiam os
resultados mais favoráveis (Almeida, 1987: 36, 41, 190).

Com as alterações do código administrativo a partir da lei eleitoral de 1895 (cuja


diferença fundamental nos os critérios de eleitor em relação à lei de 1878 foi o facto de
exigir conhecimentos de leitura e escrita), a percentagem de eleitores diminuiu: logo em
1900 os eleitores passaram a ser 16,41% da população total, atingindo o ponto mais
baixo em 1913 com um valor de apenas 5,71%, segundo a lei nº 3 do código eleitoral de
3/7/1913. Essa mesma lei, por outro lado, alargou o número de elegíveis, eliminando o
critério do rendimento e deixando apenas como inelegíveis alguns eleitores referidos no
artigo 5º do capítulo 2.

Para uma definição das elites sociais locais, o recenseamento de 1890 foi sem
dúvida o que maior número de elementos forneceu, sobretudo no que diz respeito à
coluna dos elegíveis para deputado e dos Maiores Contribuintes da Contribuição Predial
(referidos como MC). A partir daqui foi possível elaborar uma lista hierarquizada da
elite económica do concelho e constatar que 22% dos eleitores são elegíveis para
deputado, mas apenas 3,7% são também MC1 (39 eleitores). Os restantes elegíveis para
Deputado incluem funcionários, artistas ou artesãos, pequenos proprietários e alguns
seareiros.
A partir de 1895 deixou de haver a coluna dos MC nos livros do recenseamento
eleitoral, mas as contribuições continuam a ser discriminadas até 1900, quando já são
dados apenas os totais destas. Com a lei eleitoral de 1895, os eleitores elegíveis para os
cargos administrativos passaram a ter os mesmos critérios de definição dos elegíveis
para deputados, aos quais se introduziu a inovação da habilitação escolar ou profissional
como alternativa ao critério do rendimento. Daí o aumento dos elegíveis do concelho
para 32% em 1900. Assim, nos últimos anos da Monarquia ainda é possível elaborar
listas com os maiores contribuintes e elegíveis do concelho, o que nos possibilita
hierarquizar os eleitores e caracterizar profissionalmente as elites.

Com as leis eleitorais da República, os elementos recolhidos nesta fonte


diminuem consideravelmente, sendo necessário o recurso a outras já referidas para a
hierarquização da população, como os inventários orfanológicos, etc. No entanto, ainda
é possível estudar com grande precisão a divisão profissional dos eleitores do concelho
e seguir a sua evolução ao longo de todo o período estudado: ver anexo 2.

As profissões que mais se destacam são naturalmente as ligadas à agricultura e


que se podem inserir numa pirâmide hierárquica com as seguintes categorias (as
denominações utilizadas são as mesmas encontradas na fonte e condizem com as
categorias profissionais descritas por José da Silva Picão):

 grandes proprietários, isto é: eleitores com a profissão de "proprietários"


no concelho de Avis, no qual residem, exercem a sua actividade profissional de
proprietários e pagam os seus impostos. Distinguem-se dos outros proprietários por
pertencerem à categoria de Elegíveis e Maiores Contribuintes até à Republica e a
partir de então com o critério da posse de pelo menos uma herdade verificada nos
inventários por morte. Em 1900 havia 30 no concelho, metade dos quais na freguesia
de Avis; o seu número desceu quase para metade entre 1900 e 1941, o que coincide
com a tendência do distrito de Portalegre (Rosas, 1994: 43). Constituem o principal
objecto deste estudo uma vez que lideram a elite económica e social local.

 pequenos proprietários, também chamados lavradores, agricultores ou


criadores de gado; trabalhavam as suas terras, geralmente pequenas courelas, hortas
ou ferragiais. Muitos eram filhos de grandes proprietários, cujas terras foram
divididas por herança. Outros eram rendeiros de grandes proprietários e tinham como
objectivo comprar sempre um pouco mais de terra para desenvolver a sua própria
lavoura. Este grupo representava 11% dos eleitores do concelho em 1900, com uma
pequena subida para 13% em 1941.

 seareiros, descritos por Picão como "caseiros (...) que lavram por sua
conta, a quarto ou quinto, terras cedidas pelo proprietário ou rendeiro geral" (Picão,
1983: 25-26). Este autor descreve as lavouras alentejanas nos finais do século XIX,
com todas as suas componentes. Nos anos 30 deste século, os seareiros ainda
exerciam as mesmas actividades: "Há em grande parte das herdades e casas agrícolas
alentejanas uma espécie de cultivo e lavoura de curiosas características (...) Constitui
uma espécie de arrendamento, baseado em moldes convencionados e segundo
combinação prèviamente estabelecida entre êsses cultivadores e o proprietário das
herdades. Representa uma modalidade típica em que só a terra pertence ao
proprietário, encarregando-se os cultivadores de ali fazerem a lavoura, colhendo os
resultados para si e pagando o prémio convencionado à herdade que amanham. (...)
Os ‘ceareiros’ exercem igualmente a sua actividade em grande parte das
propriedades da ‘Casa Abreu Calado’ (...), trabalhando por conta própria concorrem
com o seu contributo para a prosperidade e engrandecimento das herdades"
(Expansão Portuguesa, 1935: 166). Cutileiro descreve ao pormenor esta “classe
heroica” (Cutileiro, 1977: 69-75). Os grandes proprietários entregavam geralmente
aos seareiros a exploração das terras que mais se distanciavam do centro da sua
lavoura e que não tinham capacidade para cultivar directamente. Esta profissão
encontrava-se num plano intermédio entre o trabalhador rural (a diferença é que
trabalha por conta própria) e o pequeno proprietário (trabalhando porém em terra
alheia), tendo muitos deles conseguido chegar a esta última posição ou mesmo já lhe
pertencendo, pois nalguns casos o pequeno proprietário explorava a seara do vizinho
com um contrato deste tipo. A grande descida do grupo de 27% em 1900 para 7% em
1941 tem duas explicações possíveis: em primeiro lugar, alguns seareiros com mais
sucesso tornaram-se pequenos proprietários, subindo assim na escala social; por
outro lado, grande parte terá descido para a categoria de trabalhador por conta de
outrem à medida que as terras são cada vez mais exploradas directamente pelo
proprietário. A descida desta categoria profissional coincidiu com o enorme aumento
dos jornaleiros neste período. Os seareiros frequentavam os mesmos círculos sociais
e locais de sociabilidade que os artistas. No concelho de Avis temos o exemplo duma
família abastada, cujas origens são bastante humildes: Manuel Prates Pina (1854 -
1926) começou a vida como pastor, mais tarde foi "maioral de parelhas" e participou
no grande movimento de arroteia da charneca alentejana como seareiro da casa
agrícola de João Abreu Callado. Em 1907 tornou-se rendeiro de uma grande herdade
e "em 1914 o grupo de herdades do sr. Visconde de Alter foram por ele tambem
arrendadas". Seus filhos foram rendeiros e também já proprietários e um dos netos
formou-se em medicina, ascendendo assim na escala social ao ponto de casar com
uma senhora da elite fundiária de Avis. A história desta família está descrita no
artigo "Uma vida exemplar. Manuel Prates Pina. A sua odisseia e o seu triunfo -
Como o Concelho de Avís foi todo arroteado", Álbum Alentejano, dir. Pedro
Muralha, Edição da Imprensa Beleza, Lisboa, Tomo III - Distrito de Portalegre,
1937, pp. 629 - 633. Este artigo é muito revelador da mentalidade da época: diz o seu
autor, descrevendo a vida do patriarca desta família, e pretendendo emocionar o
leitor e motivá-lo para o trabalho árduo com o qual será recompensado, que "Ele
nasceu na obscuridade; ele que era nada, homem sem nome nascido apenas para ser
aproveitado como maquina para o trabalho, teve esta aspiração sublime: ‘Ser tratado
um dia por sr. Pina’. Senhor!... (...) será uma aspiração que constitua uma utopia?
Não é! A prova está na vida exemplar do alentejano Prates Pina..."

 empregados das lavouras, incluindo uma enorme gama de profissões:


feitores, abegãos, guardas rurais, hortelãos, carreiros, entre outros, incluindo os
ganadeiros, "Os campónios, a quem os lavradores encarregam a guardaria e
pastoreação dos seus rebanhos, são conhecidos pelo nome comum de ganadeiros,
quaisquer que sejam os gados de que se incumbam" (Picão, 1983: 117, 136-150):
pastores, vaqueiros, boieiros, cabreiros, etc. Esta profissão foi até muito tarde paga
em "comedorias" (ainda nos anos 70 deste século esta modalidade era a mais
corrente), que consistiam geralmente em carne de porco, farinha e azeite, com uma
parte mais reduzida em dinheiro. Residiam habitualmente nos montes e celebravam
contratos ao ano com "o Patrão". Tinham uma expressão muito reduzida no
recenseamento de 1900, uma vez que um requisito para se ser eleitor era a
alfabetização, à qual este grupo tinha um acesso muito limitado. Em Portalegre, o
valor médio de uma ração alimentar entre 1906 e 1910 era de $163 réis; o salário
médio de um homem por dia, a seco = $297. Isto era muito perto da média nacional,
de $285 (Marques, 1978: 318). Para Avis obtive apenas por informações orais o
valor da jorna cerca de 1930: 7$000. As pessoas entrevistadas foram unânimes na
descrição da composição das comedorias: carne de porco (conservada em sal ou no
fumeiro), sacas de farinha e azeite. Este tipo de pagamento de serviços enquadra-se
numa administração tipicamente paternalista.

 jornaleiros, descritos por José da Silva Picão com o nome de ganhões, em


Avis encontra-se sempre esta designação: são os trabalhadores "à jorna" (ao dia),
sem qualquer pedaço de terra próprio e sem qualquer vínculo ao patrão, sendo
contratados e pagos apenas nos períodos necessários; a isto chama-se o trabalho
sazonal. O seu trabalho dependia das épocas de sementeiras, colheitas, mondas ou
tratamento das árvores, estando sujeito até às condições meteorológicas. Eram pagos
em dinheiro e levavam a comida de casa, se contratados por um só dia (pagos "a
seco"). No entanto, podiam ser contratados à semana e neste caso ficavam com o
direito à alimentação. Podiam também ser contratados ao mês e até trabalhar anos
seguidos para o mesmo patrão: a estes chamava-se os justos. Trabalhavam do nascer
do sol ao sol-posto; no verão, na apanha do tomate ou dos grãos, a jorna começava
antes da madrugada e era interrompida na hora do calor. Esta profissão, agrupada
com o resto dos trabalhadores rurais, mas ocupando sempre a maior parte do
conjunto, representou em todo este período a percentagem mais alta. Sofreu um
aumento considerável entre 1900 e 1941: de 35% para 58%. A explicação mais óbvia
encontra-se na legislação eleitoral em vigor no fim do século XIX, cujos critérios
para se ser eleitor são os seguintes (código de 1896): "contribuições directas de $500
réis ou mais; saber ler e escrever". Naturalmente os jornaleiros, além de terem um
acesso muito limitado à alfabetização, não só teriam salários baixos, como pagariam
muito poucos impostos. No grupo dos trabalhadores rurais, os jornaleiros constituíam
a clara maioria: por exemplo em 1941, dos 189 encontrados no recenseamento
eleitoral na freguesia de Avis, 132 eram jornaleiros (70%). Residiam mais nas vilas
do que os trabalhadores fixos das lavouras: em 1890, dos 84 jornaleiros recenseados
na freguesia de Avis, 80% residia na vila e em 1900 a percentagem era já de 89%.
Estes valores confirmam uma das características mais marcantes da agricultura
alentejana: a grande falta de vínculo entre os donos da terra e a força de trabalho,
somada à importação dos chamados "ratinhos" ou galegos (nome dado a qualquer
trabalhador vindo do norte, não necessariamente da Galiza), o que resultava numa
mão-de-obra barata e sempre disponível. Curiosamente, desde 1912 que se
encontram informações sobre um certo associativismo nesta classe, o qual
desaparece por completo com o Estado Novo. Em Avis, os proprietários representam
14% dos eleitores em 1900, e em relação ao total dos eleitores ligados à agricultura
representam 18%. Em 1941 os proprietários são também 14% dos eleitores, mas em
relação à população agrícola são 17,7%.

Os jornaleiros tinham uma grande liberdade de mudar de emprego ou de terra;


porém, o seu objectivo era quase sempre alcançar um emprego fixo, comprar a sua casa
na vila, ter estabilidade. Esta situação é descrita numa novela do livro Lua Santa,
chamada "Malarranha", no qual um maltês pede emprego a um lavrador nos seguintes
termos: "A jorna está custosa... Hoje temos serviço, amanhã não, de maneira que, o que
me dava conta, era concertar-me... a ver se ao menos tinha assento..." (Teles, 194: 21).

As profissões ligadas ao sector agrícola ocupavam no concelho de Avis mais de


3/4 dos eleitores e, face aos critérios para eleitorais já explicados, até sofreram um
ligeiro aumento no período estudado (de 76 para 79%). As restantes categorias
profissionais, ligadas à pequena indústria artesanal (uma vez que só em nos anos 50
foram introduzidas as primeiras fábricas) e aos serviços, ocupavam no total uma
percentagem reduzida dos eleitores: 24% em 1900, 21% em 1941. Porém, na freguesia
de Avis, por ser a sede do concelho, representavam 43% dos eleitores em1900 e 32%
em 1941. No entanto, por ser exactamente uma zona agrícola, pode afirmar-se que
praticamente todas as outras actividades dependiam deste sector para a criação de
trabalho. "Os habitantes da freguesia mantêm-se à custa da terra. Mesmo aqueles que
não dependem directamente da agricultura, tais como lojistas, taberneiros e artífices, são
ainda condicionados pelos resultados do ano agrícola" (Cutileiro, 1977: 8).

As profissões dos eleitores de Avis ligadas aos sectores secundário e terciário


são as seguintes:

 artistas, denominação dada a todo o artesão ou mestre de um ofício, na


maioria dos casos trabalhando por conta própria. Grande parte dos seus produtos
eram consumidos nas actividades agrícolas, como é o caso das ferraduras, arreios e
selas para os cavalos e outros animais de tracção (ferrador, arrieiro e seleiro) ou as
albardas para os burros (albardeiro). Muitos outros artesãos trabalhavam directa ou
indirectamente com os produtos da agricultura e da pecuária: moleiros, padeiros,
tosquiadores, etc. Nas actividades de carácter mais urbano, distinguem-se os
sapateiros, os quais ocupam a maior parte das listas dos cargos das juntas de
freguesia e alguns são várias vezes eleitos vereadores. Quanto aos moleiros, alguns
possuíam moinho próprio, o que lhes conferia um estatuto superior aos empregados
dos moinhos dos grandes proprietários. Parte da indústria em Avis era de facto
realizada nos montes das lavouras em lagares de azeite e moinhos de cereais para
consumo próprio das famílias dos lavradores e para pagamento das comedorias.
Ocupam uma percentagem alta dos eleitores, sobretudo na freguesia de Avis: em
1900 - 25,3%, enquanto no total do concelho representam 15%; em 1941 descem
para 12% por causa do aumento da percentagem dos trabalhadores rurais. Estes
valores revelam uma taxa de alfabetização e um rendimento superior dos artistas em
relação aos trabalhadores rurais, o que os colocava numa posição social superior e
claramente representada em locais de sociabilidade separados. O grupo dos artistas
frequentava locais de sociabilidade bastante exclusivos, dentro duma ordem social
perfeitamente hierarquizada. As discriminações entre os grupos revelavam-se sob
várias formas, entre as quais se incluíam os clubes. O seu clube em Avis era a
Sociedade dos Artistas Avizense, referida nos Anuários Comerciais pelo menos
desde 1908 (em 1937 surge pela 1ª vez como Sociedade Artística Avizense), na
rúbrica das "Sociedades de Recreio". Neste clube não era permitida a entrada dos
trabalhadores rurais, pois não possuíam um ofício especializado, e mesmo entre os
artistas seguia-se uma rígida hierarquia: distinguiam-se, por exemplo, os sapateiros
(os que faziam sapatos) e os remendões (os que apenas os consertavam e punham
meias-solas).

 comerciantes: esta designação começa a ser encontrada nos eleitores só a


partir de 1900. Nesta categoria estão incluídos os lojistas, taberneiros, estalajadeiros
e forneiros, os quais têm um estabelecimento fixo aberto ao público. Os forneiros,
por exemplo, são uma profissão actualmente extinta, pois a maior parte do pão é
cozido industrialmente, mas ainda em 1941 havia 1 na vila de Avis e a sua função
consistia em cozer no seu forno (o forneiro é o dono do forno e não quem o fabrica)
o pão que era amassado em casa por cada família. Grande parte do comércio era
realizado por comerciantes ambulantes, como os almocreves e os caixeiros, que
vendiam produtos de terra em terra, ou os aguadeiros, peixeiros, etc., que iam buscar
fora os seus produtos e os vendiam de casa em casa, geralmente com o auxílio de um
burro. À medida que avançamos no século XX aumenta a quantidade de
"comerciantes" propriamente ditos, com lojas grandes e uma posição social
ascendente. O exemplo mais flagrante é o do comerciante João Marques Serrão, que
casou com a filha de um grande proprietário e teve um percurso económico e social
de grande sucesso. Ao mesmo tempo surge também a categoria de "negociante", esta
mais directamente ligada à lavoura, pois tratava-se sobretudo de negociantes de
cereais, gado ou mesmo de propriedades e incluía membros de algumas famílias de
grandes proprietários, como José Valentim Varela Jr., antes de ter herdado, ou João
d'Abreu Callado, irmão do maior proprietário de Benavila. Alguns comerciantes e
também certos funcionários públicos dedicavam-se igualmente a profissões paralelas,
como por exemplo agentes bancários ou de seguros. Incluí neste grupo um eleitor de
1941 cuja profissão era "industrial": era dono de um lagar de azeite. De qualquer
modo, a sua percentagem sobre o total dos eleitores é sempre das mais baixas: 4%
tanto em 1900 como em 1941, metade dos quais residentes na freguesia de Avis. O
que muda nestes anos é a mobilidade: enquanto em 1900, dos 39 eleitores do
concelho que se dedicavam a actividades comerciais, 48,7% eram almocreves e
caixeiros; lojistas eram apenas 25,6%; em 1941 já quase todos são fixos, com as
excepções apenas de 1 peixeiro e 2 aguadeiros na freguesia de Avis.

 profissões liberais e funcionários: estas categorias encontram-se


sobretudo na vila de Avis por ser a sede do concelho (dos eleitores aqui incluídos,
81% reside nesta vila em 1900 e 64% em 1941) e nelas foram incluídos os padres, os
professores e os médicos, advogados e farmacêuticos. A composição social desta
"elite dos serviços" é desenvolvida no capítulo 3, mas posso desde já afirmar que a
relação com a elite económica é muito próxima não só a nível de partilha de locais de
sociabilidade e de exercício do poder, como a nível familiar. No entanto, também
aqui foram incluídos os funcionários do estado e da Câmara Municipal, desde os
juízes, passando pelos polícias, até aos funcionários dos correios. Estas profissões
são claramente urbanas e verificou-se que nem um residia nos montes. Ocupam
apenas 4,8% dos eleitores do concelho em 1900 e 4,4% em 1941.

2.4 - Economia do concelho.

"Afolhamento do termo de Aviz no Século XV (...): À indústria da


criação de gados convinha a cultura das terras por afolhamentos,
porque, segundo dizia a vila de Aviz no (...) congresso de Évora, o
pão jaz em uma folha, e ficam as outras folhas coutadas para bois..."
(Silva, 1980: 75).
Esta citação de Gama Barros aplica-se ainda ao início do século XX,
substituindo os bois pelos porcos e as ovelhas. Quanto ao pão, assiste-se ao crescimento
da produção cerealífera e a um considerável investimento na produção de azeite, ao
mesmo tempo que se verifica a tendência para o abandono da criação de gado bovino:
"a cultura cerealífera no concelho de Elvas aumenta, é certo, mas aumenta cerceando as
pastagens dos invernadouros e coutadas. Alargam-se as searas, mas diminuem-se os
pousios, o que obriga a reduzir a criação de gado vacum, limitando também o regime
manadio das boiadas" (Picão, 1983: 284). Nos inventários por morte dos proprietários
de Avis encontram-se numerosas descrições de lagares de azeite nas sedes das herdades
e as descrições de Avis nos Anuários Comerciais começam sempre por: "Principal
Comércio do Concelho - Gado suíno, lanígero e caprino, cereaes, cortiça e azeite"
(1901, sem grandes alterações nos anos seguintes).

A estrutura da propriedade local tem origens tão antigas como a vila de Avis e
mantem-se até aos nossos dias por motivos relacionados com o solo e o clima:
predomina a grande propriedade, na qual se desenvolve a agricultura e a pecuária em
regime de sequeiro e de forma extensiva.

2.4.1 - O Gado: burros, porcos e... ovelhas! Dadas as condições do


solo, este concelho, como aliás o distrito em que se integra, tem grande propensão para
o montado de azinho e de sobro, sob o qual se engordava o gado suíno, alimentado a
bolota (ou "boleta") e a lande, respectivamente. Enquanto os porcos tinham interesse
para carne, o gado ovino era criado sobretudo para fornecer o leite e a lã, com a qual se
teciam os escuros e grossos capotes e safões típicos desta região e o gado caprino para o
leite e o fabrico de queijos. Este gado era também importante para a estrumação directa
da terra.

Os inventários por morte dos vários proprietários estudados são reveladores dos
interesses económicos desta elite fundiária: os produtos da terra, alguns com descrições
muito pormenorizadas das quantidades de sobreiros, azinheiras, oliveiras, árvores de
fruto, e mesmo alguns apresentando os valores da cortiça, das sacas de cereais ou dos
litros de azeite obtidos no ano em causa. A parte referente ao gado é muito
esclarecedora do peso que estes animais tinham no conjunto dos bens. Pertencem a uma
categoria separada dos bens móveis e dos imóveis e são denominados Semoventes.
Chegam a ter descrições de animais com o respectivo nome e características físicas e
são uma grande lição sobre as diferentes categorias de ovelhas e porcos, como as
ovelhas malatas, as afilhadas, etc. O gado bovino é também descrito com precisão, mas
verifica-se que não é criado para carne ou leite, mas sim com a função de tracção e
trabalho, na qual acompanha o gado muar. Segundo o censo da população pecuária do
Distrito de Portalegre em 1925, a distribuição percentual dos vários tipos de gado no
concelho de Avis e no distrito em geral destaca claramente os ovinos, seguidos dos
caprinos; os suínos ocupam a 3º posição, enquanto os bovinos, cavalares, muares e
asininos apresentam valores muito baixos.

Alguns lavradores do concelho dedicaram-se ao apuramento das raças de porcos


e de ovelhas, como foi o caso de José Godinho d'Abreu que levou as suas ovelhas a
concursos e ganhou prémios. Esta família tinha também uma coudelaria, da qual saíram
cavalos premiados em provas de salto internacionais, como por exemplo o seu cavalo
Kalifa, que ganhou um primeiro prémio no concurso de saltos em Nice em 1931. Há
várias fotografias deste cavalo expostas pela casa. O seu irmão Cosme dos Campos
Callado, herdeiro de todos os bens da família e também sem filhos, constituiu a
Fundação Abreu Callado, que funciona até agora. Diplomas expostos na Fundação: do
Ministério da Economia, "pela apresentação de um grupo de carneiros pretos, no 8º
Concurso de Gado ovino Alentejano. Portalegre, 7 de Maio de 1942." No mesmo
concurso ainda ganhou diplomas pela apresentação de "borregos pretos" e de "malatas
pretas". No V Concurso de gado ovino alentejano, em Portalegre, 24/4/1938, ganhou
diploma pelas suas "malatas pretas". Estes animais são da raça Merino Alentejano Preto,
bons para carne e muito apreciados pela sua lã escura, própria para fazer os capotes
típicos alentejanos e as samarras.

2.4.2 - O Pão: cereais e moagens. Dentro dos cereais, o trigo ocupava


uma posição predominante; porém, "quase metade (da sua produção) era consumida na
província, em grande parte distribuída dentro das propriedades sob a forma de
pagamentos aos trabalhadores agrícolas", portanto não era a base da economia da
região: "O trigo também não era o grande produto monocultural que por vezes se julga.
A economia alentejana no século XIX era razoavelmente diversificada, constituindo os
porcos, os bovinos, a cortiça, o azeite e a lã as outras fontes importantes do rendimento
agrícola" (Reis, 1993: 126-127). Nos finais do século XIX, o Estado português adopta
"um regime firmemente proteccionista" deste sector. Jaime Reis aprofundou este tema,
descrevendo a posição que a agricultura alentejana representava na economia nacional:
"aos três distritos de Évora, Portalegre e Beja se devia mais de metade da produção de
trigo em Portugal e eram eles os principais abastecedores do mercado de Lisboa (...) o
Alentejo era considerado nesta época a grande esperança de uma muito necessária
expansão do produto agrícola nacional, graças à sua área ainda considerável de terras
incultas e às suas supostas condições favoráveis para o cultivo de cereais" (Reis, 1980:
97-99; Ramos, 1994: 231).

A legislação proteccionista, que se traduziu na protecção tarifária do trigo


nacional face ao trigo americano, constituiu um estímulo ao aumento da área cultivável.
No concelho de Avis verificou-se um movimento de "arroteia da charneca alentejana
(que transformou) o nosso Alentejo que era então um matagal serrado, num autentico
jardim". Este fenómeno é descrito com um certo exagero no Álbum Alentejano em 1937,
nas biografias de Francisco Abreu Calado, um lavrador de Benavila, e de Manuel de
Prates Pina, o seareiro atrás referido. De facto, não houve assim tantos milhares de
hectares arroteados para trigo no concelho de Avis, nem tantos "velhos lavradores (...)
se sacrificaram para que todo o Alentejo fôsse arroteado, para que sôbre a secular
charneca brotassem campos vastíssimos de trigo, que representam ouro". Os trabalhos
foram sim mais variados e incluíram o alargamento das áreas de olival e das pastagens
para o gado atrás descrito. Quanto ao investimento propriamente dito das elites, este
consistiu sobretudo na compra das terras, pois o trabalho que se seguiu foi realizado por
mão-de-obra barata ou em sistemas de parceria com seareiros que realizavam todo o
trabalho, entregando a parte previamente estabelecida da produção.

Segundo o mesmo artigo, o procedimento geral no concelho de Avis nos finais


do século XIX foi o seguinte: "Possuindo diversos proprietários muitas centenas de
hectares de terras incultas e julgadas por muita gente mui pouco produtivas, ofereceram-
nas por 12 anos a quem as quizesse explorar. Prates Pina foi o primeiro a pedir; pediu
terra para 4 alqueires de trigo. Talvez o tomassem por um visionário. Pois quê? Como
poderia o nosso homenageado colher pão dum matagal coberto na sua maioria por
carrasqueiro de azinho? (...) Ha arroteamentos que se fazem com relativa facilidade (...)
Mas o mato bravo que, na sua maioria atapetava as terras do concelho de Avis? Este era
constituído por carrasqueiros ou moitas de azinho e de carapinha...". E o artigo
continua, explicando o difícil processo de arroteamento da terra, até chegar ao ponto em
que "A terra inútil, a terra de matagal fôra transformada. Ele, com uma alegria grande
viu nascer o trigo, acompanhava a sua gestação, dia a dia, hora a hora". Estas descrições
épicas apelavam às emoções do leitor mais despreparado, que decerto ficava
convencido, com toda esta propaganda, que o trabalho árduo era recompensado em
vida!

Como já foi dito, grande parte do trigo produzido destinava-se ao consumo


próprio do lavrador, ao pagamento das comedorias e a alguma distribuição pelo
comércio local. Desde os finais do Antigo Regime que os cereais eram transformados
em farinha ainda nos montes, onde cada grande proprietário tinha geralmente um
moinho. Nos livros das décimas em Avis nos princípios do século XIX abundam os
pagamentos deste imposto sobre moinhos, quer de grandes proprietários, quer de
moleiros individuais, foreiros a outrem. Os inventários por morte dos membros da elite
dos finais do século XIX também incluem moinhos nos respectivos montes. Pouco
depois observou-se em Avis um maior investimento de alguns lavradores neste sector
das moagens, como foi o caso de José Valentim Varela, que morreu em 1914 e cujo
inventário descrimina uma fábrica de moagens com aparelhos a vapor. O seu filho Dr.
Manuel Lopes Varela, médico, continuou esta actividade, assim como José Paes de
Vasconcellos Abranches que em 1917 também já tinha uma na sua herdade da Torre.
Saliento que o combustível, o carvão, provinha das próprias herdades, assim como a
matéria-prima e a mão-de-obra necessárias, por isso as despesas desta indústria
limitavam-se ao investimento inicial nas máquinas.

Tal como em 1890, também o Estado Novo iniciou uma Campanha do Trigo em
1929, com a qual pretendeu fomentar a sua produção. Em Avis esta campanha levou à
criação, nos anos 30, de duas organizações corporativas: o Sindicato Agrícola de Avis
(uma associação de produtores de trigo, não de empregados) em 1931 e o Celeiro dos
Produtores de Trigo do concelho de Avis, um grémio integrado na Federação Nacional
dos Produtores de Trigo, criada em 1933. Em 1940 foi criado o Grémio da Lavoura de
Avis, um dos últimos da região e antes da Casa do Povo. O Grémio da Lavoura integrou
as funções do Sindicato Agrícola e do celeiro da FNPT, tornando-se uma instituição de
verdadeiro poder político e económico municipal. A participação das elites de Avis
nestes organismos corporativos pode verificar-se no anexo 5. A sua principal função
económica era a colocação e venda dos produtos da lavoura no mercado, sobretudo o
trigo. Os estímulos criados por estas instituições, além de outras medidas pró-
cerealíferas tomadas entre 1932 e 1934, resultaram num real aumento da produção de
trigo. No entanto, o cereal passou a ser moído fora do concelho, sendo entregue
directamente às grandes fábricas de moagem. Em Avis, os moinhos tradicionais e as
poucas fábricas de moagem a vapor continuaram a funcionar apenas para o consumo
local durante alguns anos até ao seu desaparecimento por completo. Assiste-se assim ao
desinteresse (quase compulsivo) das elites pelo investimento na área da indústria da
moagem, e a um interesse crescente na área da produção do trigo.

2.4.3 - "Chaparros".

Alentejo não tem sombra,


senão a que vem do céu:
- Assente-se aqui, menina,
Debaixo do meu chapéu.

Esta quadra popular retrata uma realidade da terra alentejana: as searas, a


aridez... No entanto, o distrito de Portalegre, além da produção cerealífera, é também
muito rico em várias espécies silvícolas: azinheiras, sobreiros e oliveiras, os quais fazem
parte da vegetação tradicional mediterrânica. Tanto o sobreiro como a azinheira, além
da alimentação para os porcos, também forneciam madeira: nas épocas da limpeza das
árvores, os maiores paus eram aproveitados pelos carpinteiros para variadas peças, e os
mais pequenos serviam para lenha, a qual era consumida nos montes como combustível
base de praticamente todas as actividades, levada para as vilas ou então vendida em
grandes quantidades em estado bruto ou transformada em carvão. Este era "cozido" em
grandes "fornos" na própria herdade onde a lenha era recolhida, sendo depois levado
pelos carvoeiros para o abastecimento das cidades, sobretudo Lisboa. Para isto era
essencial o caminho-de-ferro, sendo a estação mais próxima a da Ponte de Sor.

A cortiça foi valorizada já neste século, sobretudo a partir de 1906, data em que
se assistiu a uma grande expansão do seu comércio devido à descoberta de novas
utilizações para esta matéria-prima. Além do fabrico de rolhas, a cortiça passou a ser
usada, a partir de 1905-1906 para o fabrico de palmilhas, de pontas de cigarro, de
armações de chapéus, de invólucros de charuto, etc. (Marques, 1978: 170, Ramos, 1994:
231). As fontes orais negligenciam-na em relação por exemplo à oliveira, afirmando que
ficava muito cara a sua recolha e que os industriais algarvios pagavam muito mal.
Chegam a afirmar que a ofereciam para que estes lhes limpassem as árvores. No
entanto, o inventário orfanológico de Manuel Joaquim da Costa Braga (m. 1895) dá um
valor de 32.400$000 para uma tiragem de cortiça a realizar 4 anos depois, o que nos
preços correntes neste concelho na mesma época daria para comprar mais de 3
herdades.
De qualquer modo, a plantação sistemática de sobreiros nesta região é um
fenómeno já deste século: João Fernandes, o "menino de ouro" de Évora, era
proprietário de várias herdades nos concelhos de Avis, Mora e Ponte de Sor, nas quais
plantou uma enorme quantidade de sobreiros por volta dos anos 20.

2.4.4 - O azeite e outras indústrias. A plantação de oliveiras de forma


alinhada só se iniciou no final do século XIX. Em Avis, destaca-se António Manuel da
Cunha e Sá, grande proprietário residente na herdade da Torre do Ervedal, que plantou
um olival na sua herdade de Pêro Viegas, freguesia da Aldeia Velha. Este lavrador
morreu em 1895 e o seu filho, Júlio Mário da Cunha e Sá, "Bacharel em Direito" e
residente nas Caldas da Rainha, onde era advogado do ministério público, arrendou as
propriedades a Francisco Pina, filho do já referido Manuel Prates Pina. Os rendeiros
podiam cultivar nas terras o que mais lhes interessasse; mas os produtos das árvores,
verdadeira riqueza daquelas terras, ficavam para o senhorio, como era o caso da cortiça
e da azeitona.

Esta última era usada na alimentação humana, mas sobretudo para o fabrico do
azeite. "O azeite servia para iluminação e para a indústria de conservas, mas a expansão
das oliveiras coincidiu sobretudo com a divulgação do uso do azeite para temperar
batatas e peixe seco" (Ramos, 1994: 231).

As actividades de transformação dos produtos agrícolas estavam mais ligadas


aos grandes proprietários, que as desenvolviam nas sedes das suas lavouras logo após as
colheitas, como complemento da sua lavoura, na maioria dos casos para consumo
próprio ou para abastecimento do pequeno comércio local. Nos livros das décimas dos
primeiros anos do século XIX abundam os lagares, tanto nas herdades dos grandes
proprietários como nas vilas e aldeias; nos inventários por morte dos grandes
proprietários dos finais do mesmo século também são constantes as referências a lagares
nas descrições das herdades, sobretudo quando eles lá residiam. Por exemplo, no
inventário de José Valentim Varela, que morreu em 1914, a descrição da sua
propriedade "Quinta do Pinheiro" condiz perfeitamente com a que José da Silva Picão
faz dum monte alentejano, uma verdadeira unidade de produção multifacetada, na qual
se realizavam todas as actividades de transformação das matérias-primas recolhidas:
terras de semeadura, horta, vinha, algumas oliveiras (o que confirma o facto de neste
lagar se fazer azeite não apenas das suas azeitonas, mas também de outros vizinhos),
casa de habitação, celeiros, adegas, cavalariça, palheiro, abegoaria, lagar, moinho,
turbina hidráulica, prensa, fonte e depósito de água de nascente, fábrica de moagens
com aparelhos a vapor. Esta propriedade, com todos estes atributos valia 4.000$000
com apenas 6 hectares, enquanto a herdade vizinha, do mesmo proprietário, com 800
hectares valia 18.000$000.

Tal como a moagem dos cereais, também a produção do azeite passou


progressivamente a ser mais industrializada no início do século XX, continuando a ser
feita pelos grandes proprietários, que assim vendiam o seu produto já transformado.

Embora não disponha de indicadores da produção de azeite no concelho, as


informações disponíveis sobre o aumento da área de olival e o crescimento do número
de lagares sugerem que este concelho terá acompanhado o resto do país no aumento da
produção a que se assistiu neste período, começando a verificar-se a sua venda para fora
do concelho. "Outra cultura que se expandiu nesta época foi a da oliveira que subiu do
Sul do País até ao Norte. No Sul, os olivais constituíam uma importante cultura de
rendimento, compondo plantações alinhadas (...) Entre 1874 e 1957, a área coberta por
olival aumentou 208%. Exportou-se imenso azeite para o Brasil" (Ramos, 1994: 231).
Os anuários comerciais revelam claramente a tendência das elites económicas para esta
indústria: o de 1908, por exemplo, apresenta 6 produtores de azeite na freguesia de
Avis, dos quais apenas 1 é pequeno proprietário; todos os outros ocupam os primeiros
lugares da lista dos Maiores Contribuintes. Em 1915, a família Abreu Callado de
Benavila vendia azeite para a fábrica de conservas de peixe "Brandão e Gomes", em
Espinho (segundo carta encontrada no arquivo da Fundação). Em 1917 a lista dos
produtores de azeite continua a ser maioritariamente constituída por grandes
proprietários que mesmo tendo mudado a sua residência para a vila continuaram a
produzir azeite nos montes, mas surgem também alguns pequenos proprietários que
possuíam lagares nas vilas e recebiam azeitona de outros pequenos produtores. Neste
ano os donos de lagares de azeite de Avis incluíam dois filhos de grandes proprietários,
António Pais da Silva Marques Jr., e Joaquim Pais Monteiro que, por causa das partilhas
com os irmãos, ficaram pequenos proprietários e tiveram de se dedicar a outras
actividades. No anuário de 1928 encontramos no Ervedal dois lagares pertencentes a
associações de pequenos proprietários e mesmo ao dono de uma hospedaria, apesar de a
maioria continuar a pertencer aos grandes proprietários. São descritos como "Lagares de
azeite a vapor" e verifica-se a ascensão social dos novos "industriais do azeite", os quais
passaram a incluir filhos de pequenos proprietários e rendeiros, cuja ligação à terra era
mais reduzida, trabalhando para a produção do azeite com matéria-prima de outros. Foi
o caso de Manuel António Botas nos anos 40, o qual alcançou uma posição elevada
entre as elites de Avis devido a esta actividade.

Em 1937 criou-se a Junta Nacional do Azeite, o organismo corporativo


regulador de toda a actividade ligada a esta indústria. Funcionava com dependência do
Ministério da Agricultura e incluía todos os olivicultores.

Tal como o azeite, também o vinho é produzido em lagares e os lavradores de


Avis interessavam-se por esta actividade. Os já referidos anuários comerciais são uma
fonte muito rica para a descrição das várias actividades a que cada grupo se dedicava.
Na secção dos vinicultores e viticultores surgem quase sempre os mesmos nomes (lista
de 1917): Dr. Manuel Lopes Varela, da Quinta do Pinheiro, José Pais de Vasconcelos
Abranches, da Herdade da Torre, Dr. José Pais Teles do Ervedal, o Dr. Júlio Mário da
Cunha e Sá na Aldeia Velha e em Benavila os Herdeiros de Francisco de Abreu
Callado. Nos anos seguintes já aparecem os respectivos filhos. Os mesmos nomes
surgem também nas listas de produtores de cera e mel, mas neste caso em conjunto com
outros grupos sociais que também se dedicavam a esta actividade. De qualquer modo,
estes produtos não ultrapassavam o consumo local.

Nota-se nesta época um crescente interesse de algumas famílias da elite


fundiária pela actividade industrial; mas assim como as moagens e os lagares de azeite e
vinho, as fábricas em que os lavradores investem constituem um complemento da sua
actividade agrícola. Por exemplo, em 1908 existem no concelho uma fábrica de sabão
(do bacharel Júlio Mário da Cunha e Sá, proprietário e 7º MC desse ano; a matéria-
prima era o azeite vindo das suas oliveiras e produzido no seu lagar) e 3 fábricas de
tijolos (feitos a partir do barro que se encontrava nas suas terras), das quais 2
pertencentes a lavradores (Belarmino da Costa Braga, 8º MC e Joaquim Telles Varella,
11º MC) e uma a Joaquim do Nascimento Lobato Júnior, funcionário público, com a
mesma profissão que o pai. Este último revela o início do interesse de outras categorias
profissionais por esta indústria: a partir da República, todas as fábricas de tijolos e
telhas pertencem a pequenos proprietários, donos de lagares ou outros industriais. Não
pode, no entanto afirmar-se que se desenvolveu uma classe industrial em Avis, pois
todas estas fábricas tinham uma dimensão e uma expressão muito reduzida na economia
do concelho, servindo apenas para escoar parte dos produtos agrícolas e para abastecer o
consumo local.
Como já foi referido no ponto sobre os "artistas", todas estas actividades estão
directamente relacionadas com a lavoura: por exemplo, o anuário de 1928 apresenta
uma lista dos fabricantes de carros. São carros de tracção animal para serem usados na
agricultura. Este grupo inclui alguns "industriais" que foram eleitos vereadores e que já
se consideram mais importante que os artistas. Porém a noção de indústria parece ser
muito alargada: no já referido Álbum Alentejano também é descrita a indústria dos
tarros no concelho de Avis e que não passa de um pequeno artesanato local: "são uns
pequenos vasos de cortiça circulares, com tampa e áza, esta de madeira que servem para
condução de comida ao campo. Têm a particularidade de conservar a comida, por algum
tempo, na temperatura em que está quando lá se mete. (...) É artístico e foi talvez o
precursor da moderna e útil garrafa térmica. (...) Durante as longas horas em que
apascentam o gado, os bons pastores de Avís, por aquelas planícies sem fim, enquanto o
sol doira as espigas do trigo e amadurece a bolota, entretêem-se no fabrico de tarros".
Indústria propriamente dita, este concelho só teve nos anos 50, também relacionada com
as produções agrícolas: fábrica de laticínios e fábrica de tomate, esta última trabalhando
apenas sazonalmente. Os investidores foram exteriores ao concelho.

Este concelho era também rico em legumes e leguminosas, como o grão-de-bico,


apanhado entre as 2 e as 10 da manhã no mês de Junho. O tomate era colhido apenas
para o consumo interno: foi instalada uma fábrica para a sua transformação apenas nos
anos 50 deste século. Os pimentos eram plantados já com o objectivo de transformação
nos anos 40, para fazer massa de pimentão para temperar as carnes.

2.4.5 – Comércio. O comércio local nos finais do século XIX era muito
limitado. Como se viu no ponto 2.3, quase metade dos eleitores que se dedicavam ao
comércio eram almocreves e caixeiros, o que é elucidativo do carácter bastante móvel
da actividade comercial. Os produtos alimentares tinham uma expressão muito reduzida
nas trocas comerciais, uma vez que grande parte da população tinha acesso directo a
eles, quer por possuir uma pequena horta ou por ter autorização para hortar no terreno
do patrão, quer por receber parte dos salários em comedorias. Os pastores, por exemplo,
eram autorizados a ter sempre algum do seu gado a pastar em conjunto com os rebanhos
que guardavam. A isto chamava-se ter o provilhal no rebanho, o qual era vendido nas
feiras, ficando o dinheiro para o pastor. Para não falar dos proprietários que iam buscar
praticamente todos os alimentos à sua lavoura. O mesmo se passava em relação ao
combustível: o pessoal que limpava as árvores tinha direito a uma porção de lenha,
enquanto o resto da população, sobretudo as mulheres mais pobres, apanhava os restos
de lenha do chão, sem que os proprietários lhes fizessem qualquer tipo de represálias.

"O roubo de pequenas quantidades de lenha, fruta, bolota, etc., é considerado


quase como um direito quando aqueles que o praticam vivem em miséria extrema,
especialmente se estão desempregados. (...) perdoar um roubo constitui ainda uma
maneira de mostrar generosidade" (Cutileiro, 1977: 96-98). Estes "direitos" de apanhar
lenha ou os empregados poderem fazer hortas nas terras incultas dos patrões, faziam
parte de entendimentos implícitos, mas não estavam escritos em nenhum contrato, o
patrão podia dar e tirar quando quisesse.

Assim, restava apenas o pequeno grupo de funcionários, profissões liberais ou


jornaleiros (cuja refeição não estivesse incluída na respectiva jorna) para comprar
alimentos no pequeno comércio local. Este abastecia também os produtos que não se
encontravam na lavoura alentejana: açúcar, arroz, especiarias, peixe, etc. Quanto aos
produtos manufacturados, estes eram vendidos directamente pelos artesãos, os quais
trabalhavam apenas por encomenda.

Todos os outros produtos eram vendidos pelo comércio ambulante, sobretudo


nas feiras. Era nestas que se realizava a maior parte do comércio, não só dos produtos
para consumo doméstico, como tecidos e fazendas para o vestuário, utensílios de
cozinha e casa, produtos alimentares manufacturados, como os enchidos e os queijos
(para quem não os fabricava em casa), ou ainda algumas novidades da capital ou do
estrangeiro; mas sobretudo as grandes transacções comerciais da lavoura: a compra de
leitões para engorda e a venda dos porcos já adultos. O mesmo se passava com o resto
do gado.

Enquanto algumas (raras) famílias tinham a possibilidade de se deslocarem uma


ou duas vezes por ano a Évora ou mesmo a Lisboa, a maior parte da população não
tinha qualquer outro contacto com o mundo exterior para além destas feiras que se
realizavam na vila de Avis a 3 e a 6 de Janeiro. A primeira era uma feira específica só
para os porcos (referida em todos os anuários comerciais do princípio do século) e a
segunda, no dia de Reis (a Feira dos Reis), era o grande acontecimento social do ano: a
feira de fazendas e quinquilharias, que atraía toda a população do concelho e arredores.
Logo a seguir, a 15 de Janeiro, realizava-se a feira dos porcos na Ponte de Sor. Em
Outubro realizava-se no Ervedal outra feira com gado e vários artigos, nos dias 18 e 19.
Havia ainda a grande feira da Ponte de Sor, à qual afluía gente de todo o distrito no dia
5 de Outubro e no final de Junho a feira de S. Pedro em Fronteira.

À medida que chegamos a meados do século XX, este panorama não se altera
muito. Por exemplo, no Álbum Alentejano encontramos o seguinte anúncio: “Edital da
Câmara Municipal do concelho de Avis em 1/7/1933: realizam-se anualmente as
seguintes feiras: Em Avis: No dia 3 de Janeiro feira de porcos gordos. No dia 6 de
Janeiro feira de quinquilharias. Em Ervedal: No dia 18 de Outubro, feira de gado e
quinquilharias. Em Figueira e Barros: No terceiro domingo de Março, feira de gado e
quinquilharias.”

Os porcos continuavam a ser um dos mais importantes produtos transaccionados


nas feiras, uma vez que nesta fase já os cereais estavam sob a alçada das instituições
corporativas. Eram engordados nos montados de azinho e sobro (para comerem as
bolotas e as landes, respectivamente) e no princípio de Janeiro eram levados a pé dos
montes para as feiras pelos porqueiros e alguns jornaleiros, que levavam carros de
parelhas com sacas de bolotas para os porcos comerem pelo caminho. O mesmo se
passava com as vacas que eram vendidas para carne e com as ovelhas. No entanto, para
as feiras começou a ir mais o gado de refugo, pois progressivamente os porcos passaram
a ser vendidos aos industriais das salsichas, como os Isidoro (de acordo com várias
fontes orais), aos quais os lavradores enviavam o gado vivo pelo caminho-de-ferro. A lã
das ovelhas também era vendida directamente às indústrias de lanifícios.

Quanto ao comércio local, e como referi no ponto 2.3, verificou-se o aumento do


número e da importância social de alguns lojistas que passaram a ser denominados
"comerciantes". Também já foi referido que tanto o comércio como a pequena indústria
estavam directamente relacionados com o sector agrícola, pois a maior parte dos seus
consumidores, os jornaleiros, trabalhavam na agricultura e dependiam da existência ou
não de trabalho. Assim, os comerciantes exerciam uma importante função social ao
fornecerem crédito ("venderem fiado") para os trabalhadores se abastecerem dos
produtos básicos de alimentação e vestuário nas épocas de desemprego, o qual só era
pago nos períodos de maior trabalho.

Esta tendência para o crescimento do comércio acompanhou o aumento da


população urbana e o processo de abandono dos montes como local de primeira
habitação. Esta mudança é analisada no capítulo 4. As feiras não perdem, contudo, a sua
importância tradicional.
2.4.6 – Trabalho. Este tema é dos mais interessantes e já foi
desenvolvido por vários autores, incluído nos estudos de história económica sobre o
latifúndio (Barros, 1980). O mais vivo relato dos trabalhos agrícolas alentejanos
encontra-se sem dúvida na já citada obra de José da Silva Picão, publicada em 1903. As
descrições deste autor são perfeitamente condicentes com os relatos orais recolhidos no
concelho de Avis, com algumas (raras), variações de nomes de funções. O trabalho era
sobretudo sazonal, mas uma lavoura ocupava grande número de trabalhadores fixos,
desde o feitor ao abegão e sobretudo os mais variados ganadeiros, pois o gado, como já
se viu, era uma parte importante da actividade e tinha de ser tratado durante todo o ano.
As mulheres realizavam também alguns trabalhos específicos, como as mondas
(apanhar as ervas daninhas do meio das searas), a apanha da bolota e as caianças das
casas. Nos períodos de maior trabalho, como as ceifas em Junho e Julho, a apanha da
azeitona em Novembro e Dezembro ou a limpeza das árvores para lenha em Janeiro, era
frequente a contratação de ranchos de trabalhadores do norte, pois a mão-de-obra
existente não era suficiente.

Picão dedica um capítulo inteiro, com a habitual descrição pitoresca, aos


ratinhos, os "milhares de homens e rapazes que de propósito, vêm das Beiras (...) ceifar
às terras alentejanas (...) como vantajoso que é para lavradores e serviçais. Ai das
colheitas do Alentejo, se lhes faltassem os ceifeiros beirões..." (Picão, 1983: 225-245).
O aumento demográfico que se verificou no início deste século (em Avis, a população
aumentou 76,1% entre 1890 e 1940), não foi acompanhado pelo aumento do trabalho
das lavouras: pelo contrário, a introdução de alguma modernização das alfaias agrícolas,
como foi o caso duma debulhadora comprada nos anos 20 por Asdrúbal Braga, um
lavrador de Avis, provocou a diminuição da necessidade de mão-de-obra. Esta máquina,
no entanto, foi a única no concelho e era alugada aos restantes lavradores; só nos anos
60 se assistiu à introdução das ceifeiras-debulhadoras. Apesar destas alterações, os
lavradores continuam a contratar a mão-de-obra exterior, mais barata que a local.
Assim, começa a assistir-se a crises de desemprego sazonais, um fenómeno que
preocupou as autoridades do Estado Novo.

As crises de desemprego já existiam antes: "As necessidades de mão-de-obra


decorrentes da exploração agrícola extensiva vieram aumentar a desigualdade resultante
da distribuição da terra, dando origem a prolongados lapsos de tempo durante o ano
agrícola durante os quais os trabalhadores rurais não eram necessários nas herdades. A
partilha dos baldios em 1874 e o substancial aumento da população a partir de fins do
século XIX transformaram estas fases de desemprego periódico num grave problema
social. A estes períodos deu-se o nome de crises de trabalho…" (Cutileiro, 1977: 89).

No que diz respeito a Avis e ao distrito em que este concelho se integra, esta
preocupação manifestou-se nos pedidos repetidos por obras públicas em períodos de
crise. A grande preocupação das autoridades do Estado Novo com estas crises de
desemprego sazonais, que ocorriam sobretudo no fim do verão, era a agitação social que
a falta de trabalho podia provocar. A solução de realizar obras públicas pelos vistos não
tinha tanto a ver com o desejo de modernizar a região, criando infra-estruturas. Isto
vinha como acréscimo, mas o motivo principal era empregar os trabalhadores para
evitar os "verdadeiros cadinhos de odio de classes e luta social"(sic), pois, como disse o
Governador Civil de Évora, "a fome (era o) principal agente subversivo da classe rural".
Quanto ao papel dos lavradores nesta questão, nota-se por parte do governador civil
uma certa responsabilização por esta situação, uma vez que a contratação dos ranchos
de trabalhadores de fora do distrito agravava as crises de desemprego.

Uma das respostas do Estado Novo a este problema do sector agrícola foi
estabelecer o novo Estatuto do Trabalho Nacional, instituído em 1933, o qual determina
que as caixas ou instituições de previdência sejam organizadas por iniciativa dos
organismos corporativos. As instituições criadas para esse fim foram as Casas do Povo,
com acção a nível das freguesias e auxiliadas na sua acção social pelos Grémios da
Lavoura de cada concelho. O concelho de Avis teve a sua primeira Casa do Povo na
freguesia da Figueira e Barros, com os estatutos aprovados no final de 1936. Seguiu-se
a Casa do Povo do Ervedal em 1940 e por último Avis e Benavila em 1941.

A acção social das Casas do Povo incluía a distribuição de trabalhadores


desempregados em períodos de crise pelas propriedades dos agremiados, os quais eram
obrigados a fornecer trabalho, mesmo que não necessitassem da mão-de-obra. Os
lavradores em geral, e os de Avis em particular, obedeciam a esta imposição com
alguma relutância, pois preferiam dar alguma esmola em produtos alimentares, do que
pagar salários por trabalhos que em princípio não necessitavam. Com o mesmo
objectivo social, foram instituídos a nível distrital, os salários familiares, isto é: "o chefe
de família era preferido para os trabalhos públicos, recebendo conforme a família que
possuía". Este facto vem referido num artigo de elogio ao capitão Vaz Monteiro,
Governador Civil de Portalegre em 1933 e cujo distrito foi o primeiro a tomar esta
medida (Álbum Alentejano, 1937: 554-555). A propaganda destas iniciativas era uma
parte fundamental da política do Estado Novo: no seguimento da tentativa de resolução
das crises de desemprego, o Modelo de estatutos para as Casas do Povo, publicado no
Boletim do INTP, Ano VIII, nº 4 de 28/2/1941, o artigo 6º diz que as Casas do Povo
devem: "Contribuir para a realização de melhoramentos locais (...), tendo, porém
sempre em vista o combate ao desemprego e devendo, para êsse efeito, cooperar em
obras de iniciativa e responsabilidade do Estado, das autarquias locais ou dos
proprietários, executadas em épocas de falta de trabalho" (Cutileiro, 1977: 100-102).

Apesar de Avis ser dos concelhos onde este problema se manifestou em menor
escala, assistiu-se durante muitos anos a concentrações pacíficas de trabalhadores
desempregados em frente da casa do Gerente do Grémio da Lavoura, Eurico de
Figueiredo Pais, para que este lhes conseguisse trabalho junto dos lavradores
agremiados.

Ao mesmo tempo, as revistas de propaganda não se cansavam de exaltar as


acções de pessoas consideradas exemplares por participarem directamente na resolução
destes problemas. Foi o caso do Governador Civil de Portalegre que em 1933 é elogiado
pelos melhoramentos que realizou no seu distrito, nos quais empregou muita mão-de-
obra, e de dois lavradores do concelho de Avis: José Pais de Vasconcelos Abranches e
José Godinho de Abreu, em cujas herdades, "mesmo com o desenvolvimento
industrializado da lavoura alentejana (...) ocupam-se diàriamente quási uma centena de
operários rurais e a quando das colheitas essa média de braços ali empregados sobe e
muito. A colheita da azeitona ocupa cêrca de cem mulheres e as ceifas,
aproximadamente, oitenta homens." A revista Expansão Portuguesa (1935) contém
artigos a elogiar o lavrador e político José Pais de Vasconcelos Abranches e a sua
Herdade da Torre: "em Portugal só a lavoura alentejana está apetrechada com alfaias
modernas. Debulhadoras, charruas, ceifadoras, enfim (...) À poesia da enxada e do arado
bíblico sobrepoz-se a sinfonia da máquina (...) Em todo o caso e mesmo com o
desenvolvimento industrializado da lavoura alentejana não há nenhuma herdade que não
ocupe diariamente bastantes dezenas ou centenas de braços nos trabalhos dos campos."
Também fala do mesmo em relação à casa Abreu Callado: "Ocupam-se diàriamente
quási uma centena de operários rurais e a quando das colheitas essa média de braços ali
empregados sobe e muito. A colheita da azeitona ocupa cêrca de cem mulheres e as
ceifas, aproximadamente, oitenta homens."
2.4.7 – Resumo. Enquanto no século XIX os produtos da lavoura eram
sobretudo transformados e consumidos localmente utilizando o pessoal e as infra-
estruturas próprias das grande propriedades, à medida que se avança neste século
observa-se a transferência das actividades industriais para a sede do concelho, no caso
do azeite, ou mesmo para fora dele, como foi o caso dos cereais, das lãs e dos porcos. A
produção deixou de ser pensada em função apenas do consumo local e passou a ter
como objectivo principal a venda para fora do concelho a unidades industriais que
operavam a nível nacional. Como consequência destas alterações, assistiu-se a uma
certa desindustrialização do concelho, com o desaparecimento da pequena indústria
local. Ao mesmo tempo, a especialização da agricultura nestas culturas, como os cereais
e as oliveiras, levaram à utilização em muito maior escala do trabalho sazonal: o pessoal
fixo das lavouras foi diminuindo enquanto a percentagem de jornaleiros e a utilização
de ranchos de ratinhos subiu bastante. Aumentou assim a percentagem da população
sem qualquer vínculo ao trabalho e à terra, o que levou a um agravamento dos níveis de
proletarização e dos problemas do trabalho precário, os quais estiveram claramente na
origem de grande parte dos conflitos que levaram às ocupações de terras no âmbito da
Reforma Agrária de 1975.
Capítulo 3 - Circunscrição e identificação das elites locais: factores de
homogeneização e de diferenciação social.

Neste capítulo pretendo definir as elites sociais locais de Avis no período


considerado. Sobre o conceito de elite: ao utilizá-lo pretendo analisar "uma classe
provável" de semelhantes. Nas palavras de Pierre Bourdieu, "Com base no
conhecimento do espaço das posições, podemos recortar classes no sentido lógico do
termo, quer dizer, conjuntos de agentes que ocupam posições e que, colocados em
condições semelhantes e sujeitos a condicionamentos semelhantes, têm, com toda a
probabilidade, atitudes e interesses semelhantes, logo, práticas e tomadas de posição
semelhantes (...) o que existe é um espaço de relações o qual é tão real como um espaço
geográfico, no qual as mudanças de lugar se pagam em trabalho, em esforços e
sobretudo em tempo" (Bourdieu, 1989: 136-137).

Depois da definição dos vários critérios que permitiram elaborar a lista das
famílias que constituem o objecto deste estudo, passo à análise da sua composição e dos
factores de diferenciação social para caracterizar o modo de vida de um grupo com
características próprias, distintas dos restantes grupos sociais, enfim, do resto da
população em geral, e descrever as suas vivências privadas e públicas.

Falo aqui em famílias: "Qué se debe entender por 'familia'? Esencialmente una
red de parentesco coherente, construida a través del juego de las filiaciones y de las
alianzas. Quien dice familia, dice, pues, política, estrategia, trayectoria familiares,
desarrolladas en el tiempo y en el espacio". François Heran define assim este termo que
ele usou na sua obra sobre as elites sevilhanas (Heran, 1980: 13). O objecto do seu
estudo foi a burguesia agrária andaluza, a qual ele afirma ter como unidade real de
decisão as famílias e não os indivíduos. O conceito de família que o autor utiliza foi o
de família alargada. Neste conceito está incluída a família nuclear, residente na mesma
casa e utilizando o mesmo apelido, o qual era atribuído sem qualquer regra: até à
República não existia legislação sobre isto, o que originava situações frequentes de
irmãos com apelidos diferentes; até meados do século XX em Avis continuou a haver
vários casos destes que complicaram bastante a construção das árvores genealógicas.
Porém, a família incluía também toda a rede de parentesco mais próxima, como sejam
avós, tios, irmãos, primos, e mesmo os parentes espirituais, isto é, os padrinhos dos
filhos. Cada membro de uma podia pertencer a outras e as relações com as famílias de
origem mantinham-se após o casamento, tanto para os homens como para as mulheres.
Do mesmo modo as obrigações para com as gerações mais velhas eram as mesmas tanto
na família da mulher como na do marido. Estas famílias não incluíam os criados ou
outras pessoas que faziam parte do conceito de família do Antigo Regime, o que não
impedia, porém, que alguns afilhados fossem tratados como parentes de facto.

Já aqui referi que o ponto de partida para este trabalho foi a obra do Prof. Hélder
Fonseca, que, tal como Heran para Sevilha, estudou os comportamentos económicos das
elites eborenses. No caso de Avis, a grande falta de fontes escritas e arquivos familiares
minimamente coerentes impossibilitou o desenvolvimento deste tema, o qual abordo
apenas a partir dos elementos recolhidos nos inventários orfanológicos, com todas as
dificuldades descritas no capítulo 1. Apenas uma casa agrícola me disponibilizou os
seus arquivos, de facto bem organizados: a Casa Telles de Carvalho, do Monte Padrão.
Porém, os seus livros de contabilidade datavam dos anos 30, o que também não ajudava
muito para a época em estudo.

O facto de se poderem apenas descrever alguns aspectos do comportamento


económico das elites de Avis não impede, contudo, a sua definição como elite
económica local. A lista hierarquizada dos Maiores Contribuintes (referidos como
"MC") do concelho no tempo da monarquia, elaborada a partir dos livros do
recenseamento eleitoral, possibilitou esta definição, a partir da qual, em conjunto com a
lista dos cidadãos eleitos para os cargos administrativos identifiquei as elites sociais
locais deste concelho. Os seus comportamentos sociais e simbólicos são descritos no
capítulo 4, e os comportamentos políticos no capítulo 5.

3.1 - Critérios de definição das elites de Avis.

As elites sociais locais eram constituídas por um número limitado de famílias


que residiam e participavam na vida económica, política, social e religiosa do concelho
de Avis. No capítulo 1 referi que comecei pela identificação da elite política para chegar
às elites sociais: Pierre Bourdieu diz que "a política é o lugar, por excelência, da eficácia
simbólica, acção que se exerce por sinais capazes de produzir coisas sociais e,
sobretudo, grupos" (Bourdieu, 1989: 159). Este critério de definição das elites locais foi
associado aos restantes critérios usados por este mesmo autor para "caracterizar as
classes sociais em função da posse de diversas espécies de capitais - económico,
cultural, social e simbólico (...) Simplificando, capital económico é o que decorre por
exemplo da propriedade ou rendimentos de ocupação, cultural, o que decorre da posse
de instrução (de nível elevado), bem como de conhecimentos que transcendem o mundo
da instrução formal, social o inerente ao valor da posição (pessoal/familiar) no espaço
social, simbólico - ou prestígio, qualquer propriedade ou qualidade
conhecida/reconhecida pelos outros" (Sobral, 1996: 2). Foram todos estes critérios que
utilizei para definir as elites de Avis e que passo a analisar.

3.1.1 - Critérios económicos. A já referida lista dos MC constituiu o


ponto de partida para a definição das elites económicas. Esta fonte implicou a consulta
da legislação sobre os critérios para se ser eleitor, a qual se encontra na bibliografia. Os
MC eram os maiores contribuintes do concelho, isto é, os eleitores que pagavam as
contribuições prediais mais altas; por prédios entenda-se prédios rústicos, pois as
propriedades urbanas eram referidas como "morada de casas com altos e baixos...". Até
1899 ainda estavam especificados nos livros do recenseamento eleitoral as várias
contribuições pagas. Mesmo que algum eleitor tivesse um total de contribuições
elevado, se a contribuição predial fosse baixa ficava fora da lista dos MC. O livro do
recenseamento eleitoral de 1890 apresenta a distinção entre os MC da contribuição da
predial e os MC da contribuição industrial, renda de casa e sumptuária: verifica-se que
os eleitores que desempenhavam profissões em meio urbano pagavam contribuições
mais altas na 2ª categoria, enquanto os grandes proprietários pagavam maiores
contribuições prediais. A partir de 1900 já não se faz esta distinção: apenas estão
apresentados os valores totais das contribuições pagas. Igualmente nos livros do
recenseamento eleitoral existem durante o período da Monarquia várias colunas onde se
inscrevem os eleitores elegíveis para os cargos de deputado e para os administrativos.
Os critérios de elegibilidade para deputado resumem-se, neste período, às contribuições
pagas serem superiores a 400$000 réis, com as inovações, em 1895, de os elegíveis para
os cargos administrativos terem os mesmos critérios dos elegíveis para deputado e de
incluir, como alternativa ao critério do rendimento, a habilitação com curso de instrução
superior, secundária, especial ou profissional.

Os elegíveis para deputado no concelho de Avis representam em 1890, 22% do


total dos eleitores; em 1900, 32%. Na freguesia de Avis essa percentagem é mais alta:
26% em 1890 e 45% em 1900. Incluídos nos elegíveis estão pessoas de todas as
categorias sociais, ocupando os artistas a percentagem mais elevada, seguidos dos
jornaleiros, por isso este trabalho não se ocupa de todos os elegíveis do concelho, mas
apenas dos MC: em 1890, a percentagem dos MC da contribuição predial em relação ao
total dos elegíveis era de 16,8%. Se por um lado, dentro da categoria de elegíveis para
deputados havia eleitores das profissões mais variadas, por obedecerem ao critério de
rendimento e/ou de habilitação literária, por outro, dentro da categoria dos MC havia
vários grandes proprietários que perderam a elegibilidade para deputados quando a
legislação passou a incluir a obrigatoriedade de saber ler e escrever (1895). Por
exemplo, na freguesia de Avis em 1900, dos 14 grandes proprietários recenseados, só 9
eram elegíveis, pois os restantes 5 não obedeciam ao referido critério. Esta questão é
mais desenvolvida no capítulo 4, mas é bastante reveladora do nível cultural baixo de
parte das elites de Avis, sobretudo de alguns lavradores que residiam nos montes.

A partir da República, os eleitores já não estão limitados pelos valores das


contribuições pagas, o que faz com que a definição das elites económicas tenha de ser
encontrada noutros indicadores: os inventários por morte são nesta fase a fonte mais
segura para o estabelecimento da elite fundiária, uma vez que o critério estabelecido foi
a posse de pelo menos uma herdade; quanto à elite mais urbana e menos ligada à posse
da terra, o seu universo é bastante mais reduzido e distingue-se por outros critérios, que
não os económicos. De qualquer modo, estão na sua maioria ligado por vários laços,
sobretudo familiares, à elite fundiária. Na lista dos MC as excepções aos grandes
proprietários são raríssimas.

3.1.2 - O controlo do poder político local. "a concentração do capital


político nas mãos de um pequeno grupo é tanto menos contrariada e portanto tanto mais
provável, quanto mais desapossados de instrumentos materiais e culturais necessários à
participação activa na política estão os simples aderentes - sobretudo o tempo livre e o
capital cultural" (Bourdieu, 1989: 164). Em Avis, esta diferença entre as elites e os
restantes grupos no que diz respeito à disponibilidade em tempo e ao grau de cultura era
de facto considerável e assim continuou até quase aos nossos dias. Não quer isto dizer
que as elites de Avis fossem muito instruídas; os trabalhadores rurais é que tinham um
acesso quase nulo à escolaridade, apesar de até disporem de algum tempo livre nos
períodos de desemprego forçado.

Estes factores estavam directamente relacionados e eram condicionados pela


posse de meios de subsistência acima da média, o que leva a uma grande coincidência
entre os critérios para se pertencer às elites económicas e às elites políticas. De facto,
pode ver-se no anexo 1 a lista dos cidadãos eleitos para a Câmara Municipal, a qual é
bastante esclarecedora do grande peso que as elites económicas possuíam no controlo
do poder político local. Basta ver que entre 1886 e 1941, 80% do tempo estiveram como
Presidentes da Câmara 10 grandes proprietários, dos quais 2 eram também bacharéis em
direito e 1 médico. Os restantes 4 incluíam: 1 farmacêutico em 1886 (que também era
MC, ver Joaquim de Figueiredo); 1 professor primário entre 1935 e 1941 que era
membro da União Nacional e tinha o apoio de um grande proprietário; tanto o padre em
1906, como o industrial do azeite em 1921 eram vice-presidentes que substituíram os
presidentes no final dos seus mandatos. No conjunto de todos os vereadores eleitos ou
nomeados (só depois das eleições é que estes se reuniam para entre si elegerem o
presidente), os grandes proprietários representam 47%. A sua posição de maioria
mantem-se durante todo o período estudado: até à Republica representam 62% dos
eleitos; entres os vogais nomeados administrativamente em 1910 baixam para 20%,
subindo os comerciantes; durante a República o seu peso sofre uma diminuição
considerável em relação à Monarquia, para 40%, voltando a subir para 44% no Estado
Novo. As restantes profissões correspondem a percentagens muito baixas e ocupam
maioritariamente posições de vogais substitutos.

Este facto veio confirmar a existência de uma forte hegemonia deste grupo no
poder e o exercício, por parte das elites económicas, da liderança do "sistema local de
dominação da classe". Como diz Sevilla-Guzman, "La dominación de classe se realiza,
predominantemente, por medio del poder económico que la propriedad de la tierra
otorga a la classe latifundista. El control de los medios de producción, la hegemonía del
aparato del Estado a nivel local y la sujección de las instituciones que permitem acesso
a medios de vida en la comunidad origina ciertas formas de hegemonia..." (Sevilla-
Guzmán, 1980: 34).

A comparação do pessoal político eleito ou nomeado para a Câmara Municipal


de Avis (anexo 1) com as listas de MC levantadas nos recenseamentos eleitorais permite
observar a grande coincidência de nomes e de famílias apresentadas. O mesmo se passa
com outras instituições do poder local como a Santa Casa do Misericórdia, o Sindicato
Agrícola de Avis (fundado em 1931), o Celeiro da FNPT e o Grémio da Lavoura, cujas
listas do pessoal directivo apresento no anexo 5. Verifica-se assim que a posse da terra
era o factor fundamental para a definição das elites deste concelho e era exactamente
esta realidade que conferia ao grupo dos proprietários rurais o seu papel de elite social e
política.
3.1.3 - As manifestações da diferença social. Além dos critérios
económicos e políticos, vários outros critérios distinguem as elites sociais dos outros
grupos. As diferenças manifestam-se de variadas formas:

- umas mais visíveis, que acentuam o aspecto exterior e marcam mais a sua
separação dos restantes componentes da sociedade; nestas salientam-se as casas, seu
tamanho e localização; o vestuário, os objectos que manifestam um elevado poder
aquisitivo, como os trens, os cavalos, mais tarde os carros; as ruas com os nomes dos
membros mais destacados destas famílias e as obras sociais que implicaram essa honra;
por fim a representatividade social no cemitério, a cidade dos mortos como retrato da
cidade dos vivos;

- outras mais privadas, reveladas em comportamentos e actuações sobretudo a


nível doméstico, no interior das habitações e dos espaços de sociabilidade, mas que não
deixam de sublinhar características únicas ao grupo.

Todos estes factores foram desenvolvidos pelo Prof. Hélder Fonseca nos seus
trabalhos sobre a elite eborense no século XIX. Em Avis, um meio muito mais pequeno,
é curioso encontrar várias semelhanças em comportamentos, actuações e vivências, as
quais desenvolvo no capítulo 4. São estes comportamentos diferentes que fazem incluir
nas elites sociais locais algumas famílias com ocupações e fontes de rendimento
desligadas da propriedade fundiária. Como já foi referido, num meio rural, nenhum
outro sector de actividade está inteiramente independente da agricultura. Porém, a
ligação de algumas das famílias da elite social local com a propriedade fundiária era,
por vezes, indirecta. Neste grupo incluem-se os médicos, os farmacêuticos, os padres, os
professores, alguns comerciantes mais abastados e os funcionários superiores da
administração. Residiam sobretudo na vila de Avis, sede do concelho, com alguma
dispersão pelo Ervedal e Benavila. De todos os que exerciam profissões liberais, apenas
um advogado residia num monte, pois era grande proprietário e lavrador ao mesmo
tempo.

Esta elite mais urbana e relacionada com o sector terciário tem outro tipo de
critérios de definição:

- os critérios económicos não são exactamente a posse de valores imobiliários


(pelo menos a nível de inventários por morte, os valores apresentados são muito baixos
comparativamente aos dos grandes proprietários fundiários), como a terra, ou mesmo as
casas da vila, por vezes arrendadas, mas antes um muito maior movimento de dinheiro.
Nas suas actividades profissionais, estas elites tinham bons ordenados e também
maiores despesas a nível do consumo diário que as elites fundiárias. Por exemplo,
Alfredo Barreto da Guerra Pais, um secretário da administração da Câmara, em 1898
ganhava 240$000. Teve 11 filhos e a todos pôde mandar estudar, inclusivamente em
Lisboa no Conservatório, e uma das filhas tirou o curso de professora primária.
Também os médicos tinham bons ordenados: por exemplo o Dr. Jaime Joaquim Pimenta
Prezado (ver ponto 3.2.2.2) era casado com a filha dum grande proprietário, mas
construiu a sua casa e sustentou a família com todo o conforto até que o sogro morreu e
a mulher herdou. Salienta-se, no entanto, que estas elites que não tinham uma ligação
directa à da propriedade fundiária desempenhavam na maioria dos casos várias
actividades profissionais simultâneas, o que possibilitava um aumento do rendimento
familiar: muitos comerciantes e funcionários acumulavam funções de agentes de
seguros e bancários, solicitadores; este médico acima referido foi também presidente do
celeiro da FNPT, o que lhe proporcionava um segundo ordenado bastante considerável.
Este tema é desenvolvido nos pontos que se seguem, nos quais se analisa o estilo de
vida destas elites, os critérios de escolha dos gastos e os investimentos familiares a
partir dos relatos dos seus descendentes, da observação directa e dos bens descritos nos
inventários por morte.

- critérios políticos: o grupo das elites urbanas participava muito mais


activamente na política do que os seus parentes que se dedicavam exclusivamente à
lavoura; de facto grande parte dos profissionais liberais ou funcionários que se
dedicavam à política tinham também ligações directas ou indirectas com a grande
propriedade (eram eles próprios proprietários ou parentes próximos de proprietários).

- critérios sociais ou o "capital simbólico" de Bourdieu: a representatividade


social deste grupo era o que mais o destacava no conjunto da população. Mesmo não
possuindo os mesmos níveis de capital, os funcionários, médicos e letrados em geral
viviam como os ricos, moravam em casas de dimensões semelhantes e nas mesmas ruas,
utilizavam os mesmos códigos de vestuário e aparência exterior, os mesmos locais de
sociabilidade, e sobretudo, recebiam o mesmo tipo de tratamento respeitoso por parte
das outras classes sociais. Esta distinção tinha origem na posse de um título ou de uma
habilitação escolar, o capital escolar que compensava nalguns casos a falta de capital
económico: "a lógica da nomeação oficial nunca se vê tão bem como no caso do título -
nobiliário, escolar, profissional -, capital simbólico, social e até mesmo juridicamente
garantido. O nobre não é apenas aquele que é conhecido, célebre, e mesmo conhecido
como bem, prestigioso, em resumo, nobilis. Ele é também aquele que é reconhecido por
uma instância oficial, ‘universal’, quer dizer, conhecido e reconhecido por todos. O
título profissional ou escolar é uma espécie de regra jurídica de percepção social, um
ser-percebido que é garantido como um direito. É um capital simbólico
institucionalizado, legal (e não apenas legítimo)". O autor acrescenta: “o capital
simbólico, geralmente chamado prestígio, reputação, fama, etc. (…) é a forma percebida
e reconhecida como legítima das diferentes espécies de capital” (Bourdieu, 1989: 135-
148). Esta distinção manifestava-se no título em si, mas sobretudo nos serviços que esta
elite prestava à comunidade: a posição de relevo ocupada pelo professor, o
farmacêutico, o padre, etc., era-lhe conferida também pelo facto de desempenharem
funções de utilidade para a população em geral e que exigiam conhecimentos a cujo
acesso a maioria da população estava vedada. Como diz José Manuel Sobral: "Os
médicos são tidos como socialmente úteis. Mais ainda, imprescindíveis. O seu saber, tão
esotérico e distante do conhecimento dos pacientes, é respeitado" (Sobral, 1993: 452).

A proximidade física e social do grupo dos letrados e funcionários com a elite


fundiária desenvolveu-se com a mudança dos lavradores dos montes para a vila e
revelou interesses vários, tanto no aspecto de ser conveniente relacionar-se com o
médico ou o advogado, como no aspecto sentimental: alguns casamentos se realizaram
entre membros destas duas elites, se bem que nunca inteiramente aceites pelos
lavradores mais conservadores. Por outro lado, os lavradores que não se chegaram a
mudar para as vilas do concelho, permanecendo nos montes, mas por outro lado
frequentando mais Lisboa ou Coimbra, nunca desenvolveram qualquer tipo de laços
com as elites sociais locais de Avis, mantendo-se afastados até do poder político. Como
exemplo pode referir-se a família Telles de Carvalho ou a família Cunha e Sá: o Dr.
Júlio Mário da Cunha e Sá, advogado e lavrador da herdade de Pêro Viegas, foi
presidente da Câmara de Avis apenas porque foi nomeado administrativamente em
1910, por ser republicano num concelho fortemente monárquico.

De qualquer modo o grupo dos profissionais independentes da agricultura


compunha-se de um número muito reduzido de famílias, pois grande parte destas
profissões era desempenhada por membros da elite fundiária que estudaram, ao
contrário dos seus irmãos e primos que se dedicaram exclusivamente à lavoura.
3.2 - Composição da elite social local.

No espaço de relações das elites de Avis movimentavam-se um número


reduzido de famílias que eram vistas pelos outros como diferentes. No fundo, o que se
pretende é estudar os ricos, em oposição aos artistas e aos trabalhadores rurais
(maioritariamente "à jorna"), os três componentes essenciais duma sociedade fortemente
hierarquizada que se estrutura a partir duma realidade económica baseada no latifúndio,
uma "forma de agricultura e sistema social que tem dominado em vastas regiões do Sul
da Península" (Barros, 1980: 11) e determinante para a compreensão das sociedades
mediterrânicas. Estas três categorias estão perfeitamente representadas nos três clubes
existentes nos anos 30 na vila de Avis, cada um reservado a um grupo exclusivo e sem
qualquer possibilidade de mistura (ver capítulo seguinte no ponto 4.5.2).

É de salientar o título dado por José Cutileiro à sua obra já aqui repetidamente
citada: Ricos e Pobres no Alentejo (Uma Sociedade Rural Portuguesa), o qual
demonstra a estrutura da sociedade alentejana que este autor pretendeu retratar.
Também, José Manuel Sobral utiliza esta designação para descrever as elites sociais
duma freguesia beirã: "os ‘ricos’, no entendimento local, não são, como vimos, apenas
os grandes proprietários enquanto tais: são também os donos das ‘casas’, as famílias de
proprietários antigas e com o prestígio inerente à própria antiguidade - embora o seu
prestígio seja objecto de contestação e controvérsia - os que governam (...), os que têm
estudos superiores que acarretam salários elevados, os que se podem permitir um modo
de vida que não passa pelo trabalho manual e gozam de rendimentos muito superiores;
em suma todos os que partilham atributos que faltam precisamente aos que se vêm
como ‘pobres’" (Sobral, 1993: 153).

Este tipo de abordagem coincide com a visão que em Avis as outras classes
tinham dos ricos. Para os pobres, os membros da elite seriam todos pelo menos muito
parecidos, sobretudo nos aspectos em que se distinguiam deles. Num contexto social
muito polarizado, verificava-se também por parte dos mais desfavorecidos uma
identificação entre os ricos e o Estado, e a respectiva responsabilização por todos os
problemas sociais e económicos. José Manuel Sobral desenvolveu o tema da relação
entre Espaço e Poder, o que pode perfeitamente ser aplicado ao espaço rural alentejano
e à imagem que as elites projectavam como proprietários dos meios de produção e
detentores do poder político. Essa imagem e posição raramente eram afirmadas pelos
próprios: "nunca alguém considerado como ‘rico’ admite publicamente e sem
reticências sê-lo, ou que a sua posição social seja vista como decorrendo
exclusivamente dos rendimentos e não de outros factores que, com regularidade, são
referidos para explicar a sua situação pessoal ou familiar: o mérito próprio ou o dos seus
antepassados já falecidos, a própria antiguidade da família e traços que lhe estão
associados - a cultura e bom gosto" (Sobral, 1993: 148-149). Entre os descendentes das
elites de Avis ainda hoje se ouvem frases como: "o meu avô era o melhor lavrador da
região, com a maior casa agrícola" ou "a família tinha muito prestígio a nível local
desde há muitas gerações" e várias outras afirmações que coincidem perfeitamente com
o que este autor apurou em relação ao espaço rural que estudou, o que nos pode levar a
uma certa generalização deste comportamento entre as elites rurais. Nota-se também
alguma nostalgia em relação a um passado glorioso e um pouco mitificado, o que
corresponde de facto à realidade dum espaço rural extremamente activo e productivo do
início do século XX, em contraste com a actualidade decadente do sector agrícola
português.

Enquanto a imagem popular punha os ricos quase todos ao mesmo nível, este
grupo via-se como muito diferente entre si: entre os grandes proprietários/lavradores e
as elites "mais urbanas" havia grandes desníveis de riqueza, sobretudo no que diz
respeito aos bens imobiliários e ao respectivo rendimento; mas as diferenças
manifestavam-se principalmente nos comportamentos e mentalidades.

No conjunto da população, o grupo das elites sociais locais ocupa uma


percentagem muito baixa. Face ao total dos eleitores, a elite fundiária somada à elite dos
funcionários e profissões liberais representa apenas 7,8% em 1900 e 5,5% em 1941.
Mesmo somando os comerciantes a este grupo, não passam de 11,7% dos eleitores em
1900 e 9,2% em 1941. Como se pode ver no anexo 2, o número de grandes proprietários
baixou para metade nestes anos. Os membros deste grupo tão limitado, mas não
necessariamente fechado, são um pequeno conjunto de famílias residentes no concelho,
na sua maior parte detentoras de grandes propriedades nas quais se dedicam à
agricultura e à pecuária, o que lhes confere grande poder económico, uma posição social
destacada e poder político forte. Nos recenseamentos eleitorais até à Republica podemos
encontrar os eleitores que pertencem às categorias de MC e de elegível e as respectivas
contribuições pagas, as quais podemos contabilizar face ao total das contribuições pagas
pelos eleitores do concelho. Na falta de outras fontes que permitissem hierarquizar a
população de Avis, esta fonte permitiu uma imagem bastante clara dos desníveis de
riqueza existentes pelo menos no período entre 1890 e 1910, uma vez que já se viu que
os eleitores ocupavam quase 80% da população masculina adulta do concelho (ver
capítulo 2).

Assim, confrontando os quadros seguintes, podemos observar que o grupo dos


40 MC pagava mais de metade das contribuições totais dos eleitores do concelho e o
primeiro MC de 1890, António Manuel da Cunha e Sá, chegou a pagar 12,7% do total
das contribuições pagas pelos eleitores do concelho. Ainda em 1910, o seu genro José
Pais de Vasconcelos Abranches pagava 7,2% do total dos eleitores do concelho, o que
torna esta família Cunha e Sá a 1º na hierarquia económica e social do concelho.
Curiosamente, esta foi uma das famílias com menor participação na vida social e
política local, destacando-se do conjunto das elites pelo afastamento das vilas, por ter
permanecido nos montes, e possuir uma maior ligação à capital. Também se destaca por
ter ascendência nobre e ser recente no concelho, relativamente ao conjunto dos
lavradores que já faziam parte das elites locais desde pelo menos finais do século XVIII.

Pode resumir-se que menos de 4% dos eleitores pagavam mais de 60% das
contribuições totais dos eleitores do concelho e que mais de 90% pagavam menos de
10$000 de contribuições, sendo a sua maioria jornaleiros que pagavam menos de $500
(geralmente apenas pagavam contribuição paroquial). Também se pode observar que
por vezes 1 só proprietário pagava mais de 60% das contribuições totais dos eleitores da
sua freguesia de residência, como era o caso de Manuel de Carvalho na freguesia da
Figueira em 1890. É claro que este critério está dependente da importância da freguesia,
pois em Avis, sede do concelho e freguesia "mais urbana", onde se concentravam mais
proprietários, profissões liberais e funcionários, um só MC ocupava sempre uma
posição relativa mais baixa que numa freguesia rural dominada por uma ou duas
famílias no máximo.
Quadro 3:

Neste capítulo fala-se maioritariamente em homens, os chefes das famílias que


exercem as actividades profissionais descritas. Isto porque eram raras as mulheres que
desempenhavam uma actividade profissional, com excepção das professoras e das
funcionárias dos correios. Assim, o papel que as mulheres desempenhavam nos grupos
das elites estava normalmente reservado ao círculo familiar. Não deixavam, contudo, de
possuir características que as distinguiam das outras e de desempenhar funções sociais
específicas. As Senhoras e todas as suas manifestações de diferenças em relação aos
outros grupos são analisadas no capítulo 4.

3.2.1 - Os proprietários. No Alentejo a designação mais corrente para as


pessoas que se dedicam à exploração agrícola é a de lavradores, os que possuem a
lavoura. "O dono da lavoura conhece-se pelo nome de lavrador, acrescentando-se-lhe o
subtítulo de rendeiro se as herdades que disfruta são propriedade de outrem a quem ele
as arrendou" (Picão, 1983: 13). O grupo dos lavradores inclui tanto os proprietários das
terras como os rendeiros, podendo os lavradores ser simultaneamente proprietário e
rendeiros. As elites sociais locais eram constituídas pelos lavradores de Avis e não por
todos os proprietários das terras do concelho. Os Anuários Comerciais são uma fonte
importante para o conhecimento das actividades económicas locais e das pessoas que a
elas se dedicavam. O Anuário Comercial de 1928 apresenta uma novidade em relação
aos anteriores: enquanto até então esta fonte enumerava apenas os lavradores do
concelho em causa, este inclui nas listas de proprietários, lavradores e produtores de
cortiça, cereais, azeite, etc., também os que residem fora do concelho e o respectivo
local de residência ou da sede da casa agrícola. Foi assim possível classificar os
seguintes grupos dentro desta elite fundiária, num universo de 144 proprietários,
lavradores ou agricultores que se dedicavam à actividade agrícola com o objectivo de
produção para o mercado (desta divisão resulta o título de "elites sociais locais" e não
de "elites rurais"):

Quadro 4:
Quadro 5:

1º - os proprietários/lavradores que possuem ou arrendam terras no concelho, as


quais são exploradas directamente. Têm a sede da sua casa agrícola no concelho de Avis
e como actividade principal a lavoura. Representam 58,33% do total, que se podem
ainda subdividir em lavradores/proprietários (apuram-se a partir da comparação com as
listas anteriores dos MC e pelo facto de serem produtores de cortiça, pois a cortiça
ficava sempre para os proprietários, mesmo tendo as terras arrendadas) que representam
34% (49 unidades) e lavradores/rendeiros que representam 24,3% (35 unidades). Por
vezes os rendeiros de grandes propriedades tinham uma maior participação no grupo das
elites económica e política do concelho do que os proprietários. Era o caso da família
Prates Pina ou de Simão Teles Varela, o rendeiro da herdade de Camões, com 5.000
hectares pertencentes à Casa de Cadaval. Estas famílias detinham um enorme poder a
nível local e podiam ter um estilo de vida semelhante à dos grandes proprietários. Ainda
dentro do grupo dos lavradores que exploram as suas terras directamente, incluem-se
outros cuja dimensão das propriedades era tal que entregavam algumas das terras mais
afastadas do centro da sua lavoura a seareiros. Era o caso da família Abreu Callado, de
Benavila. Isto porém, não os torna proprietários absentistas.
2º - os proprietários absentistas: residentes maioritariamente em Lisboa ou em
concelhos afastados que arrendam as suas terras no concelho de Avis. Representam
25% do universo considerado em 1928 e podem distinguir-se os que têm parentes
próximos como rendeiros e os que têm a terra entregue a estranhos. Por exemplo, a
família Braga residia quase toda em Lisboa e nas Galveias e tinha as terras que possuía
em Avis arrendadas a Asdrúbal Braga, irmão e sobrinho. Por outro lado, a família
Cunha e Sá, quando residiu em Lisboa teve as terras entregues ao rendeiro Francisco
Prates Pina.

3º - os grandes proprietários que exploram a terra directamente e residem ou têm


a sede da casa agrícola nos concelhos limítrofes, onde exercem toda a sua actividade
política, económica e fiscal. A sua residência principal, assim como os seus inventários
por morte também lá se encontram. Representam 16,7% dos proprietários (24
unidades).

Pode assim dizer-se que os lavradores de Avis representavam quase 60% do


total dos proprietários do concelho. Destes, apenas os maiores proprietários se incluem
no grupo estudado: os MC e seus descendentes.

O pequeno grupo da elite económica local de Avis teve como principais famílias
os Cunha e Sá das freguesias da Aldeia Velha e Ervedal, os Teles de Carvalho da
Figueira e Barros, os Abreu Callado de Benavila e os Lopes, os Varela, os Pais e os
Braga de Avis (ver anexo 4). Cada uma destas famílias tinha pelo menos um membro
que se dedicava à lavoura e era detentora de 1 ou mais herdades, na qual tinha a sede da
sua casa agrícola e monte de habitação, até ao final do século XIX. A transferência dos
locais de residência é desenvolvida no capítulo 4. Até 1941 nenhuma destas famílias
abandonou por completo a lavoura ou vendeu as propriedades, mesmo quando se
verifica o exercício de outras actividades complementares ou mesmo desligadas da
actividade agrícola. Mais tarde assiste-se ao fim de algumas delas, sobretudo as que
tiveram poucos filhos e registaram uma elevada concentração de casamentos entre
primos muito próximos (caso dos Braga que ficaram em Avis: esta família está
praticamente extinta por falta de descendência, apenas subsistem uns ramos que já não
têm quaisquer laços com o concelho). A mudança para Lisboa das gerações mais novas
e as ocupações de terras no âmbito da Reforma Agrária de 1975 levaram à quase total
ausência destas e de quase todas as famílias dedicadas à agricultura do concelho de
Avis.
Nesta sociedade fortemente hierarquizada, os pequenos proprietários
representavam apenas 11% dos eleitores em 1900 e 13% em 1941 (ver anexo 2). Muitos
eram originários de famílias de grandes proprietários, cujas terras foram divididas por
herança: caso da família Varela da herdade do Monte Outeiro de Baixo. Como pode
ver-se no referido anexo 4, esta família teve um número considerável de filhos, pelos
quais foram divididas as herdades, o que fez com que todos se tornassem pequenos
proprietários. A descida no nível económico da segunda geração desta família foi
agravada pelo facto de terem casado todos com membros de famílias de pequenos
proprietários. Pelo contrário, o ramo Varela do Monte Outeiro de Cima teve um número
muito mais reduzido de filhos, incluindo alguns que ficaram solteiros. Casaram com
primos da família Lopes, também lavradores e grandes proprietários e as poucas
divisões das herdades foram compensadas por outras herdades que os respectivos
cônjuges trouxeram para os casamentos.

A continuação dos pequenos proprietários filhos de antigos MC no grupo das


elites sociais de Avis foi determinada pela actividade complementar à qual alguns se
dedicaram, às amizades políticas com os lavradores mais poderosos, ou pelos
casamentos: por exemplo, Manuel Pais Monteiro, o presidente da CMA em 1921, era
filho do 20º MC de 1890 e dividiu as terras herdadas com os irmãos. Como pequeno
proprietário que era dedicou-se a outras actividades complementares: tinha um lagar de
azeite e negociava em propriedades. Alcançou assim uma posição social que a falta de
poder económico lhe teria impossibilitado. A maioria dos pequenos proprietários, no
entanto, teve origens mais humildes, em rendeiros ou seareiros, nunca chegando a
pertencer às elites, nem a partilhar qualquer tipo de espaço de sociabilidade.

3.2.1.1 - Origens de algumas famílias: Na sua maioria as elites


que se encontram em Avis entre 1886 e 1941 são descendentes das famílias que, pelo
menos desde os finais no Antigo Regime, ocupavam as mais altas posições dentro da
elite social local, constituída maioritariamente por lavradores / rendeiros de
propriedades pertencentes a ordens religiosas e a nobres absentistas que recebiam foros
e rendas sobre as mesmas. O estudo das listas dos arrolados para vereadores da vila de
Avis e seu termo desde 1799 permitiu concluir que quase 2/3 tinham descendentes entre
os elegíveis e Maiores Contribuintes do concelho nos finais do século XIX e ainda nos
lugares mais destacados da elite económica e política de meados do século XX. Nestes
anos as freguesias de Benavila (incluindo Valongo), Ervedal e Fronteira eram vilas
separadas do concelho de Avis. Pelas suas pequenas dimensões e importância relativa,
não enviaram (ou pelo menos não chegaram até aos nossos dias) as respectivas listas de
elegíveis, o que deixou de fora deste estudo alguns nomes das elites destas freguesias.
Isto permite supor que eventualmente o número de famílias da elite do actual concelho
de Avis com ascendentes no Antigo Regime fosse superior.

Quadro 6:

Este quadro resume as referidas listas que dizem respeito às elites locais em
1799, 1829 e 1832, 1890 e 1910 e demonstra uma grande permanência das elites locais
nas posições de maior relevo durante mais de um século. Os recenseamentos eleitorais a
partir da República deixaram de mencionar as contribuições pagas, perdendo-se assim
uma fonte importante para a hierarquização económica da população.

Em 1799 existiam em Avis, entre as elites, ascendentes das famílias Godinho,


Teles, Varela (incluindo Luís Martins, o pai ou avô do sogro de José Varela Teles),
Lopes, Simas e Cunha e Sá (pois António Manuel da Cunha e Sá casou com uma
descendente do Capitão João de Andrade de Sousa, cujo capital estava descrito como
"bens vinculados").

Os maiores "cabedais" pertenciam neste ano a Luís António Falcão, sem


descendentes conhecidos, e a Manuel Lopes Pereira Conde, da família dos Lopes que
dominam as elites de Avis na maior parte do século XX. Seguem-se Gonçalo Varela
Leão e o seu cunhado, o Capitão-Mor de Ordenanças João Vaz Teles, que ocupavam o
3º lugar na hierarquia, cada um com o capital de 8.000 cruzados. O casamento deste
Varela com a irmã do Capitão Teles deu origem aos vários Teles Varela e Varela Teles
que abundam nas listas de MC dos finais do século XIX e que eram os proprietários da
maior parte das terras situadas entre a vila de Avis e Sousel, passando pelo Ervedal,
Alcórrego e Casa Branca. No século XX assistiu-se à dispersão das terras no seio destas
famílias devida à enorme quantidade de descendentes que tiveram, o que originou
quadras populares como a que inicia o capítulo 2.

Já no início do século XVII havia um lavrador chamado Francisco Telles, que


era rendeiro da Herdade do Padrão, na freguesia da Figueira, por isso esta família há
muito estava instalada na região. Um seu descendente chamado João Teles Bom
comprou a herdade da Defunta (ao lado do Padrão) em 17/4/1800 ao Conde de Óbidos,
anexando mais tarde a herdade vizinha (remiram o foro em meados do século XIX).
Esta família estava relacionada com a do Capitão João Vaz Teles, cuja descendente D.
Maria Luísa Teles casou com Manuel de Carvalho (2º MC de 1890), dando origem a
outra das mais importantes famílias do concelho de Avis: os Teles de Carvalho, ainda
proprietários da mesma herdade do Padrão na actualidade.

No início do século XIX verificaram-se algumas aquisições para o concelho,


como por exemplo José Pais Teles (n. 1764, m. 1853), que se mudou das Galveias para
Avis, instalando-se na Quinta de Sant'Anna, onde nasceram os últimos dos seus 22
filhos. Nos concelhos de Avis e arredores é difícil encontrar alguém que não descenda
deste lavrador que também era parente do Capitão-Mor João Vaz Teles.

Nas pautas dos anos 1829 a 1834 surgem outras famílias, como os Castro, que já
nos finais do século XVIII registaram a sua passagem pelo concelho: Joaquim José de
Castro foi o Juiz de Fora (o seu nome encontra-se numa fonte mandada construir na vila
de Avis em 1787) e o seu filho com o mesmo nome era casado em 1832 com a filha do
2º mais rico dos arrolados: Vasco José da Silva. Um dos descendentes deste casal foi
Luís António da Silva e Castro, o 7º MC de 1890. Em Avis, o largo onde se situam
algumas casas das mais importantes famílias da elite que se mudaram para a vila nos
finais do século XIX tem o nome de Largo Sérgio de Castro.

Também na pauta de 1832 surge pela primeira vez José Ignácio de Torres
Macedo "Capitão de Malta e Lavrador", cujo filho ou neto é referido por Mário Sá nos
seus artigos sobre o concelho como o último morgado de Avis: "Ele se chamava José
Inácio Tôrres de Macedo, e se finou, solteiro, com 36 anos de idade em 1887. De
nobresa rural, que já não da primeira do reino que outróra habitára Avis, era, todavia, de
boa linhagem..." (Sá, 1935: 243). As famílias da nobreza, como os Melo, já não constam
destas listas, assim como os Camões, da família do poeta (segundo os livros de
linhagens de Manuel Rosado Marques de Camões e Vasconcelos), donos de várias
herdades no concelho de Avis, mas cujas casas e sedes de lavoura se situavam em Alter
do Chão.

De qualquer modo, nestes anos não se encontram em Avis membros da primeira


nobreza do reino: a mais alta categoria encontrada foi a de Capitão-Mor de Ordenanças,
título atribuído aos lavradores João Vaz Teles, Joaquim Gomes Leão e João Maria de
Lemos. A maioria dos arrolados eram lavradores que exploravam directamente a sua
lavoura, pagavam décimas sobre os rendimentos das suas herdades e foros aos
respectivos senhorios, muitos dos quais se mantiveram até 1976. Segundo o livro das
décimas de Avis e seu termo em 1828, grande parte das terras eram foreiras ao Real
Convento da Ordem de Avis; também o Concelho de Avis, os Paulistas, a Misericórdia
e o Congregado de Estremoz recebiam foros sobre algumas terras deste termo. O maior
proprietário do concelho, no entanto, não pertencia às elites locais, nem sequer lá tinha
casa: o Duque do Cadaval pagava décimas sobre 11 herdades e outras tantas courelas no
Maranhão. Os descendentes da família Lopes contam que a Casa de Cadaval tentou
adquirir todas as terras desta freguesia, mas nunca conseguiu comprar a herdade do
Serrado, pois o patriarca José Lopes sempre resistiu. De facto, em 1828 um lavrador
com este nome pagava décimas sobre esta herdade, que continuou na posse da família
Lopes até meados do século XX (segundo fontes orais, esta família descende de um
galego que se terá instalado no concelho no século XVI).

Basicamente, as herdades tinham nos finais do Antigo Regime o mesmo nome e


dimensões muito semelhantes às do presente. Algumas mantiveram-se na mesma
família durante mais de dois séculos, como foi o caso da já descrita herdade do Padrão,
desta do "Serrado" em relação aos Lopes; a da "Cortesia", que em 1828 era explorada
por um Lourenço Teles que pagava foro ao Congregado de Estremoz e nos finais do
século XIX pertencia a Joaquim Teles Varela, o 17º MC de 1890 e apenas nos anos 90
deste século foi alienada polos seus descendentes a um "novo-rico" da capital; a Quinta
de Santa Anna, arrendada a José Pais Teles desde 1810, mais tarde comprada por ele ou
pelo seu 18º filho, José Olegário Pais, o 18º MC de 1890, que a deixou ao seu neto José
Diogo Pais, várias vezes presidente da câmara de Avis; as herdades da "Carapeta",
"Giralda", "Castelo Velho" e "Taçalho", de José Godinho de Campos em 1828 e
transmitidas por via directa pela sua filha que casou com um Braga e ainda hoje
pertencem aos descendentes desta família. Esta família Godinho é das mais importantes
em Avis e nos concelhos vizinhos, tanto pela quantidade de descendentes, como pelas
alianças matrimoniais realizadas com praticamente todas as outras famílias da elite
local.

Portanto, com algumas aquisições e mudanças pontuais, a estrutura da


propriedade e as famílias da elite local revelam uma forte permanência ao longo destes
dois séculos, durante os quais as mudanças de regime provocaram alterações muito
menos significativas do que seria de esperar. Mesmo no período da venda dos bens
nacionais, a compra de propriedades no concelho de Avis foi muito reduzida, limitando-
se às aquisições realizadas por António José da Cunha e Sá. Esta família não tinha
registos no concelho antes dos anos 30 do século XIX. A sua origem encontra-se em
Évora, com este senhor que era médico e membro da elite eborense e comprou as
herdades da Torre e dos Covões em 1937. Segundo fontes orais ambas estas herdades
pertenciam a ordens religiosas; no entanto o antigo nome Torre de Sepúlveda sugere
que terá pertencido ao Visconde do Ervedal, António Câmara de Castro Sepúlveda que
em 1816 era o comendador da Alcaidaria-Mor de Avis. O filho de António José da
Cunha e Sá, António Manuel, foi viver com a sua segunda mulher, dona da Herdade de
Pêro Viegas, para a herdade da Torre do Ervedal na segunda metade do século XIX.
Este monte, antigo convento, mantinha todas as características de grandiosidade
deixadas pelos religiosos, incluindo uma capela.

António José da Cunha e Sá e seu filho António Manuel tiveram percursos de


algum modo parecidos com o descrito por Wallerstein: “por alguna razón y en
determinado momento de su vida, el burgués parece renunciar tanto a su estilo cultural
como a su rol sociopolítico en favor de un rol ‘aristocrático’, que desde el siglo XIX no
ha sido necesariamente el de la aristocracia nobiliaria, sino simplemente de la riqueza
antigua. Tradicionalmente, el simbolo formal de este fenómeno ha sido la aquisición de
propiedades agrarias, hecho que marca el paso del burgués propietário de fábricas y
urbano al noble terrateniente y rural” (Wallerstein, 1991: 215). António Manuel da
Cunha e Sá viveu parte da sua vida em Paris, onde casou com uma senhora da nobreza e
foi industrial. Quando ficou viúvo instalou-se então no seu monte no termo de Avis e
casou com D. Maria José Andrade, descendente dum lavrador da elite local, o capitão
João de Andrade de Sousa, referido na Pauta dos officiaes da Comarca desta Villa de
Aviz para os annos futuros de 1799, 1800 e 1801 (ANTT, Desembargo do Paço.
Alentejo e Algarve. Pautas. Maço 750, caixa 844), com 54 anos. Em Avis passou a
comportar-se como se de facto pertencesse à nobreza tradicional local, utilizando
símbolos de poder, incluindo um canhão! A Herdade de Pero Viegas pertencia à família
da senhora, enquanto o seu foro (senhorio directo) foi vendido a uma família Alarcão de
Lisboa. Em 1920 o "senhor directo" era o Dr. José Osório Cabral de Alarcão e o
enfiteuta era a família de Júlio Mário da Cunha e Sá, mais tarde os seus filhos. O foro
anual era de 27$50 c. 1920. Até lá era pago em trigo, mas fora transformado em
dinheiro. Nos anos 30, o Estado Novo fixou o preço dos foros os quais, com a
desvalorização do dinheiro, passaram a ter um valor apenas simbólico, até que em 1976
foi abolida a enfiteuse. Só então passou a ser propriedade plena da família, ao mesmo
tempo que era ocupada pela UCP de Avis. Nos anos 80 foi desocupada e devolvida à
família que actualmente a utiliza como quinta de recreio, integrada numa reserva de
caça turística denominada Calatrava.

António Manuel da Cunha e Sá era considerado grande lavrador e plantou um


olival em Pero Viegas. Enquanto viveu no monte, passava o verão na Lagoa de Óbidos,
onde tinha uma propriedade com 1.800ha: a Quinta do Bom Sucesso. Os seus filhos
foram todos estudar e viver para Lisboa e durante este período as herdades foram
arrendadas a dois filhos do lavrador José Pais Teles. Quando voltaram para Avis, os
filhos de António Manuel da Cunha e Sá tornaram-se lavradores como o pai: na lista
dos Maiores Contribuintes do concelho, o Bacharel Júlio Mário da Cunha e Sá (res.
Pêro Viegas), seu irmão Roberto Evaristo e seu cunhado José Pais de Vasconcelos
Abranches, casado com Joana Isabel da Cunha e Sá, todos ocuparam posições
importantes na elite fundiária do concelho.

Enquanto se assiste à chegada em força destas novas famílias, como os Cunha e


Sá, as quais dominam grande parte da propriedade do concelho nos finais do século
XIX, outras famílias vão saindo da cena local, como foi o caso dos Mexia Galvão, dos
Soeiro de Brito, dos Lemos (de António de Lemos da Gama Lobo Pimentel e de João
Maria de Lemos, os quais se mudaram para o concelho de Sousel, onde deixaram
descendência: uma senhora Teles Varela casou com um Dr. Cardoso de Lemos de
Sousel e teve filhos e netos) e dos Melos (Jerónimo José de Melo, médico).
A data precisa em que os referidos lavradores/rendeiros se tornaram
proprietários plenos variou bastante nos vários casos: algumas famílias da elite local
nunca deixaram de ser rendeiros; outras, mesmo comprando as terras continuaram a
pagar foros alguns até à abolição da enfiteuse em 1976. Por exemplo, Francisco d'Abreu
Calado tinha várias terras das quais recebia foros e que vendeu em 1876;
simultaneamente pagava foros sobre outras herdades, os quais foram comprados
(remidos) pelo seu filho José Godinho d'Abreu antes de 1946.

Dentro da mesma família, alguns conseguiram chegar à posição de grandes


proprietários, como foi o caso de António Pais da Silva Marques, o 5º MC de 1890, neto
de José Pais Teles e filho do rendeiro da Herdade da Torre. Outros da mesma família
nunca passaram de pequenos proprietários ou nunca chegaram mesmo a sê-lo, ocupando
profissões de destaque na administração da câmara e no funcionalismo.

Quanto ao dinheiro para a compra das herdades, este provinha maioritariamente


da própria lavoura, mas com uma significativa componente da função de prestamista
que alguns destes lavradores desenvolviam. Fontes orais referem o facto de algumas
destas famílias emprestarem dinheiro a juros e terem ficado com bastantes terras na
execução de hipotecas, mas de nada disto obtive provas.

O aumento do poder económico destas famílias e a possibilidade de juntar novas


propriedades ao património familiar resultou em grande parte da estratégia matrimonial
aplicada: nota-se a tendência para os casamentos entre pessoas com níveis de riqueza
semelhantes ou, de preferência, superior. Não se verifica qualquer distinção entre os
homens e as mulheres neste aspecto: todos os filhos herdavam partes iguais, o que
tornava as herdeiras ricas particularmente apetecíveis. A família Godinho, da elite
fundiária das Galveias, concelho de Ponte de Sor (nos finais do Antigo Regime havia
vários Godinhos em Avis, os quais terão mudado a sua residência principal para o
concelho vizinho, mantendo no entanto as terras neste concelho), forneceu pelo menos 3
senhoras (com o respectivo património fundiário) para casar em Avis com senhores das
famílias Abreu Callado, Carvalho e Braga. Tal como Francisco Abreu Callado
enriqueceu sobretudo com o casamento com D. Maria Madalena Godinho, também
Manuel Joaquim da Costa Braga (m. 27/5/1895), ao casar com D. Arcângela Angélica
Godinho, conseguiu uma ascensão económica e social tal que se tornou um dos maiores
proprietários do concelho da Ponte de Sor. O pai destas duas senhoras era um certo
Capitão-Mor José Godinho de Campos, lavrador/rendeiro da Herdade da Torre, a qual
pertencia e continua na posse do Marquês de Fronteira e Conde da Torre; casou em
primeiras núpcias com D. Maria Joaquina Pais Telles, irmã do Capitão José Pais Teles e
em 2ª com D. Arcângela Angélica Leitão Feio, mãe das referidas senhoras.

Além de administrar as herdades da mulher, Manuel J. C. Braga comprou várias


outras propriedades ao longo da vida. As suas origens encontravam-se no comércio do
peixe, portanto não era lavrador e, apesar de pertencer às elites de um concelho vizinho,
é aqui considerado porque vários dos seus descendentes casaram com senhoras da elite
fundiária de Avis (famílias Pais e Varela), o que lhes conferiu uma posição social de
relevo também neste concelho.

No fundo todas estas famílias estão de um modo ou de outro relacionadas por


laços matrimoniais, como é o caso destes Godinho, dos Carvalho, dos Camões e das
famílias dos concelhos limítrofes, como os Godinho Marques Ratão, cujo património,
tal como o da família Abreu Callado, é actualmente administrado por uma fundação.
Nas sociomatrizes do anexo 4 estão expostos alguns destes casamentos que são
analisados no ponto 3.3.

A participação destas famílias na vida social e política local manifesta uma


distinção muito curiosa: enquanto as famílias mais antigas no concelho continuaram, na
sua maioria, ao longo do século XX a conviver socialmente entre si e a ocupar cargos
políticos locais, os descendentes destes recém-chegados Cunha e Sá e Carvalho nunca
adquiriram ou construíram casas na vila de Avis, mantendo-se nos montes separados
das restantes famílias de lavradores. Revelaram e acentuaram uma clara distinção social
pelo facto de terem origens num escalão superior da sociedade do Antigo Regime, não
se misturando em geral com os lavradores. Estas famílias, com origens na nobreza (se
bem que não titulada, até onde pude apurar), não frequentavam os espaços de
sociabilidade das elites de Avis, nem as casas dos outros ricos locais, pois
consideravam-se acima deles. O mesmo sucede com as famílias Vaz de Camões e Vaz
Couceiro, ainda hoje residente nos montes, mas sem qualquer ligação às vilas do
concelho.

3.2.1.2 - A elite fundiária e a posse da terra como factor


fundamental

Numa região onde o sector agrícola é o principal (e dominante) gerador de


riqueza e emprego, os proprietários dos meios de produção detêm naturalmente um
grande poder sobre a população e as instituições políticas. É isto mesmo que se pretende
verificar com este trabalho: se "tudo os homens vão buscar à terra", quem é dono da
terra, é dono dos homens...?

A elite económica de Avis era composta indubitavelmente pelos detentores de


grandes propriedades. Assim, pode afirmar-se que a posse da terra foi durante o fim do
século XIX e a primeira metade do século XX em Avis um factor fundamental para o
exercício do poder político e para a inclusão no grupo da elite social local.

3.2.1.3 - As propriedades urbanas e a transferência dos


montes para as vilas. No final do século XIX praticamente todos os lavradores de Avis
e seu termo viviam nos respectivos montes, sedes das suas lavouras e com todas as
actividades inerentes aos mesmos, brilhantemente descritas por José da Silva Picão. Os
inventários por morte destes lavradores, como José Valentim Varela ou Joaquim Teles
Varela, apresentam na descrição das herdades praticamente todas as infraestruturas que
este autor refere.

Da 1ª geração apresentada na sociomatriz do anexo 4, todos moravam nos


montes, com as excepções de António Pais da Silva Marques, residente da vila do
Ervedal e a família Abreu Callado, residente em Benavila, uma freguesia que já fora
vila nos finais do Antigo Regime, mas cuja importância e dimensões a igualavam no
início do século XX a um monte. Praticamente todas as infraestruturas inerentes a um
centro urbano foram construídas por esta família e seus empregados.

Em meados do século XIX, entre as famílias da elite fundiária, apenas a família


Castro residia na vila de Avis. Entretanto, ao mesmo tempo que compraram as
herdades, os novos lavradores interessaram-se também na compra de propriedades
urbanas, as quais utilizavam como casa de pousada nas vindas à vila, tanto para as feiras
e dias de festa, como para a missa dominical ou a participação activa na política local,
aproveitando para aí pernoitar. Era nos montes que os lavradores viviam com suas
mulheres e empregados, e criavam os seus filhos. Para estes estudarem, os pais
contratavam professores que com eles ficavam a viver, participando na vida familiar.

Quando pretendiam prosseguir os seus estudos, os filhos destas famílias tinham


de ir estudar para fora: Portalegre, Évora ou Lisboa. Nem todos o desejavam, alguns
ficaram na lavoura, como foi o caso de José Lopes Coelho (n. 1873), que aos 16 anos já
era o chefe da casa agrícola da família, pois o pai tinha morrido e os irmãos estavam
fora a estudar. Alguns destes filhos de lavradores seguiram uma trajectória universitária
e profissional fora da esfera fundiária, a qual se manifestou em percursos políticos
distintos dos seus parentes, na maior parte dos casos. Contudo, nesta geração não se
nota ainda o abandono completo da lavoura ou mesmo do concelho: no final dos cursos,
praticamente todos voltaram a Avis e aí residiram até ao final da vida.

Talvez por terem tido contacto com cidades grandes, ou por alguma
prosperidade nova resultante das Campanhas do Trigo, o facto é que a geração do final
do século XIX operou uma mudança drástica dos montes para a sede do concelho.
Praticamente todos os casamentos realizados pela 2ª geração das famílias da freguesia
de Avis foram residir para a vila, onde construíram grandes casas apalaçadas. Por
exemplo José Lopes Coelho Sénior, o presidente da câmara em 1886, residia no monte
da Machadinha com a família, mas já nessa época tinha uma das maiores casas da vila,
para onde a sua mulher se mudou quando ele morreu. O mesmo se passou com outras
famílias: quando os pais atingiram a velhice, deixaram os montes e foram morar para
casa dos filhos na vila. Estes lavradores e seus filhos, não deixaram, porém, de se
dedicar à lavoura e à exploração directa das suas herdades, mantendo um feitor ou
encarregado geral, mas realizando visitas às propriedades e mantendo um controlo
rígido de todas as actividades.

A presença do patrão era uma constante. Os montes é que perderam a sua


função de sede da unidade familiar e passaram a ter apenas funções agrícolas: residência
dos caseiros e outro pessoal da lavoura, local de guarda do gado, etc. Apesar da casa
principal se manter para os proprietários passarem algumas temporadas, até estas se
tornaram pouco frequentes, quando se começou a introduzir a moda de passar férias na
praia e temporadas nas termas. Com esta mudança, os montes perderam o seu carácter
de unidades de produção completas, onde se realizavam todas as tarefas relacionadas
com a lavoura e a transformação dos produtos agrícolas: a maioria destas actividades
transformadoras passou a ser realizada nas vilas. Por exemplo, os cereais passaram a ser
vendidos ao Sindicato Agrícola de Avis e mais tarde ao Grémio da Lavoura que os
encaminhavam para as fábricas de moagens, em vez de, como até então, serem moídos
nos moinhos dos próprios montes. Também houve, por consequência, uma maior
dispersão e diversificação de funções: já não eram os proprietários que apresentavam o
produto acabado (a farinha, o azeite, os chouriços), mas vendiam a matéria-prima que
outros iam transformar.
No caso das famílias com herdades mais distantes da sede do concelho, como os
Telles de Carvalho ou as famílias Camões e Vaz Couceiro (Manuel Vaz Couceiro era o
2º MC de 1900, res. Herdade da Guiana, freguesia de Valongo), estas desenvolveram
laços mais fortes com as vilas que lhes estavam mais próximas: Fronteira, Galveias e
Alter do Chão, onde construíram as suas casas. Estas famílias nunca abandonaram,
porém, os montes como primeira residência, daí os gráficos do anexo 3 apresentarem
ainda uma tão elevada percentagem de grandes proprietários residentes nos montes.
Segundo informações orais, as casas da vila, nestes casos, eram mantidas apenas para
que os filhos pudessem estudar na escola, ficando o resto da família no monte. Aqui
incluídos também estão os Lopes do Serrado e João Teles Varela (rendeiro de Camões e
grande proprietário de outras herdades), cujas sedes da lavoura, na freguesia do
Maranhão, eram mais distantes da vila de Avis. Estas famílias moraram nos montes
grande parte da vida e construíram segundas residências em Avis.

Pelo contrário, os vários irmãos Cunha e Sá, nunca se mudaram para as vilas: as
suas ligações a Lisboa e às Caldas da Rainha eram mais fortes que a Avis. Quando o
patriarca António Manuel da Cunha e Sá morreu em 1895 e os seus filhos herdaram,
estes voltaram para o concelho de Avis e instalaram-se nos respectivos montes, nos
quais passaram a viver com todos os confortos: Joana Isabel vivia na já referida herdade
da Torre, cujo monte, actualmente em ruínas, está a ser reconstruído; seu irmão Júlio
Mário construiu uma casa nova no monte de Pêro Viegas em 1899, com todas as
características de uma casa de cidade e completamente diferente do tradicional monte
alentejano.

Em 1941, além do número dos grandes proprietários residentes no concelho ter


baixado para metade, o que não significa necessariamente concentração de propriedade,
mas antes um nível de absentismo mais elevado, os lavradores residentes nos montes já
são a minoria e a tendência até ao final do século foi para o seu total abandono como
local de primeira residência. Apesar da saída de Avis de alguns membros destas famílias
que passam a depender de rendimentos fora da esfera fundiária, mais relacionados com
as suas habilitações profissionais, estes casos representaram entre as famílias de elite
uma percentagem baixa, havendo sempre pelo menos um representante local a
administrar as propriedades da família e a pagar rendas aos respectivos parentes.

Se durante 2 séculos a estrutura da propriedade em Avis e as respectivas elites


sociais sofreram muito poucas alterações, o final do século XX veio transformar
radicalmente o panorama do concelho e da região em geral: as ocupações das terras e
das casas de habitação das elites de Avis no âmbito da Reforma Agrária de 1975
levaram à saída do concelho da maior parte destas famílias, cujos descendentes se viram
assim forçados a seguir percursos profissionais alternativos, na maior parte dos casos
com algumas dificuldades de adaptação. Nos anos 80, as devoluções das terras com as
respectivas infra-estruturas completamente destruídas e o gado dizimado, foram
seguidas pelos efeitos devastadores do Mercado Comum Europeu na agricultura da
região, o que provocou a derrocada final numa economia que já há muito revelava
fragilidades várias. Sobretudo, acabou de vez com a posição de relevo social e
económico ocupada por estas famílias. A partir de 1974, o poder local é controlado sem
interrupções pelo Partido Comunista Português. Grande parte das terras das elites
tradicionais do concelho acabaram por ser vendidas e as que se mantêm na posse das
famílias mais antigas são utilizadas principalmente como quintas de recreio e terrenos
de caça, assistindo-se actualmente à reconstrução de alguns montes para Turismo de
Habitação ou apenas para uso em períodos de férias. As elites locais actuais são
constituídas sobretudo por antigos trabalhadores rurais ou seus descendentes que se
habilitaram com cursos técnicos ou profissionais; também se destacam vários
profissionais de fora do concelho, como médicos, professores, etc., lá colocados
administrativamente.

3.2.2 - As elites urbanas. As famílias de funcionários, profissões liberais


e comerciantes constituem um grupo muito reduzido com alguma expressão nas
instituições do poder político local. A estas categorias profissionais não é a propriedade
fundiária ou o capital económico que directamente lhes confere o estatuto de elite,
apesar de, na maior parte dos casos, haver pelo menos uma relação de parentesco com
elementos da grande propriedade. Como já foi referido, o seu estatuto na sociedade era
alcançado pelo capital simbólico mediatizado pelo capital escolar que possuíam
(utilizando os conceitos de Pierre Bourdieu) e os serviços prestados à comunidade, os
quais resultavam no tratamento respeitoso que os outros grupos sociais lhes dedicavam.
A sua relação com a elite fundiária local era por vezes muito próxima: alguns lavradores
exerceram também profissões liberais; outros tiveram filhas que casaram com médicos e
com comerciantes. Estas situações, apesar de excepcionais e não inteiramente aceites de
bom grado, levaram a uma certa aproximação física e social entre estas elites. Além da
criação de laços familiares, as elites fundiárias conviviam e participavam dos mesmos
locais de sociabilidade que alguns membros destacados destas profissões, pois o critério
de amizades pessoais estava bastante condicionado pelo interesse nos serviços que estes
lhes pudessem prestar. Era conveniente ser amigo do médico ou do farmacêutico, assim
como um advogado ou um comerciante também podiam ser úteis. Também o professor
era um elemento importante na vida familiar: desde os professores que viviam nas casas
das famílias para ensinar as crianças, até ao professor da escola que dava explicações
depois das aulas. O mesmo se passava necessariamente com o Padre, embora no
Alentejo o nível de religiosidade ser dos mais baixos (Rezola, 1992: 222-255) e os
padres do concelho de Avis não serem, na sua maioria, grandes modelos de virtudes
cristãs.

Nas questões políticas, notam-se algumas divergências entre estas elites


"urbanas", mesmo nas pessoas mais ligadas à lavoura: alguns filhos de lavradores que
estudaram fora voltaram com ideias políticas mais avançadas, enquanto os seus pais e
irmãos permaneciam nos partidos mais tradicionais e conservadores. Foi o caso do Dr.
Manuel Lopes Varela.

3.2.2.1 - Os Bacharéis em Direito. No grupo dos advogados só


encontrei informações seguras até 1917; os anuários seguintes já não especificam esta
categoria profissional. A lista apresentada no anexo 6 é bastante clara quanto às origens
dos bacharéis do concelho de Avis: tanto Cosme dos Campos Callado, como José Pais
Teles e Júlio Mário da Cunha e Sá eram grandes proprietários, filhos dos maiores MC.
Estudaram fora e estabeleceram-se em Avis, mas as estadias em Coimbra, Porto e
Lisboa fizeram com que os seus percursos políticos e comportamentais fossem
diferentes dos dos seus parentes que permaneceram em Avis:

- o 1º, Dr. Cosme dos Campos Callado (1871 - 1928), tinha um irmão que
tratava da lavoura, dedicando-se ele à actividade política: foi várias vezes presidente da
câmara; mantendo-se fiel aos princípios familiares conservadores; foi eleito em 1908
pelo mesmo partido que seu pai, Francisco d'Abreu Callado e nos anos da Segunda
Guerra Mundial manifestou algumas tendências pró-germânicas.

- o Dr. Júlio Mário da Cunha e Sá (1863 - 1919), enquanto não herdou, viveu
nas Caldas da Rainha, onde foi notário e sub-delegado no julgado de Óbidos; ao vir
morar para a sua herdade de Pêro Viegas, exerceu ainda as funções de notário e também
participou na política local. Este, no entanto, não pertencia ao grupo dos lavradores
locais, pelo contrário: destacava-se por ser republicano e muito provavelmente pertencer
à maçonaria, tal como outros que foram nomeados administrativamente para a Câmara
Municipal em 1910, enquanto os restantes lavradores se mantiveram monárquicos
muitos anos após a República. Em 1917 já não vem referido no Anuário Comercial,
pois entretanto tinha-se mudado com a família para Lisboa e deixado as terras
arrendadas a Francisco Pina, filho do já referido Manuel Prates Pina. O interesse desta
família pela lavoura foi muito mais reduzido nesta geração, ficando a casa do monte
apenas como segunda residência.

- O Dr. José Pais Teles (1870 - 1942), cunhado do anterior, dedicou-se mais
activamente à lavoura, vindo sempre referido nos Anuários Comerciais nas listas de
advogados, lavradores, proprietários, donos de lagares de azeite, viticultores e
vinicultores. A sua participação na política foi mais reduzida. Era o 5º filho do MC
António Pais da Silva Marques.

Nos anos que se seguiram a 1917, tanto o Dr. Cosme Calado como o Dr. José
Pais Teles continuaram no concelho, exercendo esporadicamente funções de advocacia.
Com escritórios abertos e exercendo funções de notário, etc., vieram pessoas de fora do
concelho; o mesmo se passou com os Juízes, nomeados pelo poder central. Para
trabalhos específicos, como foi o caso da elaboração dos estatutos da Fundação Abreu
Callado, veio de Lisboa o Dr. Mário de Castro, descendente da família Castro, portanto
com ligações ao concelho, apesar de nessa época esta família já lá não residir.

3.2.2.2 - Os Médicos e Farmacêuticos. Continuando a análise do


anexo 6, salienta-se aqui também a ligação com as famílias da elite fundiária de 2 dos
mais destacados médicos de Avis:

- o Dr. Manuel Lopes Varela (1870 - 1921), lavrador, filho do 4º MC de 1900 e


genro do 10º; pertencia à geração dos advogados atrás referidos. Estudou em Coimbra,
onde foi colega de curso de António José d'Almeida e terá participado, ou pelo menos
assistido, ao movimento estudantil de 1890 (Ramos, 1994: 299-302). Voltou para Avis
no fim do curso, casou com uma prima, herdeira de tantas propriedades como as que ele
veio a herdar e começou a sua carreira de médico municipal em meados da década de
90: exercia clínica por todo o concelho, visitava os doentes em casa e era muitas vezes
pago em géneros. Os laços de amizade desenvolvidos durante o curso mantiveram-se
pelo resto da vida, assim como os laços políticos: veio de Coimbra republicano
acérrimo, ao contrário do resto da família; participou na política local, mas como
Administrador do Concelho, nomeado em 1901, ao mesmo tempo que o seu cunhado e
primo Jerónimo Lopes Coelho era Presidente da Câmara. Em 1919 foi eleito presidente
da câmara pelo Partido Evolucionista. O seu mandato na CMA coincidiu com o de
António José d'Almeida na Presidência da República (1919 - 1923).

- Dr. Jaime Joaquim Pimenta Prezado (1898 - 1969), originário de uma família
de pequenos proprietários e rendeiros da Ponte de Sor, foi colocado em Avis logo que
se formou. Casou com uma das filhas do lavrador mais rico da vila nos anos 20, José
Lopes Coelho e tornou-se rendeiro de algumas das suas terras. Porém, fortes
divergências pessoais e inimizades políticas com o sogro e o cunhado Luís Mendes
Vieira Lopes afastaram-no desta família. Em 1935 José Lopes Coelho fez um
testamento que quase deserdou a filha Maria Teresa, casada com este médico, no qual
constava a seguinte cláusula: se uma das filhas não tivesse filhos, os bens que esta
herdasse ficavam por sua morte para os filhos da outra. Como este casal de facto não
tinha tido filhos até essa data, nem veio a ter, o marido ficou absolutamente excluído
dos bens do sogro, apesar de os ter administrado quando a mulher herdou. Mesmo que
ele tivesse morrido antes da mulher, nunca seria seu herdeiro. Assim, este médico,
apesar de casado com uma das maiores proprietárias do concelho, afirmou a sua posição
no grupo das elites não pela posse de propriedade fundiária, mas pelo exercício da sua
profissão de delegado de saúde e pela participação na política local, sobretudo no
Estado Novo, quando foi o presidente da delegação concelhia da União Nacional. Mais
tarde foi também deputado. O seu poder político no concelho estendia-se não só à
Misericórdia, como à Câmara Municipal (não chegou a ser presidente da CMA, mas
tinha grande influência sobre José Francisco de Moura, 1935 - 1941), aos organismos
corporativos (foi o presidente do celeiro da FNPT) e até ao exercício da medicina:
conseguiu que o seu colega Dr. Carlos Clímaco Baptista fosse alvo de um processo
disciplinar e acabasse por ser despedido do cargo de médico municipal, por motivos
obscuros, ligados a uma pretensa actividade como comunista.

Os restantes médicos referidos não tinham qualquer ligação com as elites


fundiárias, tendo sido colocados em Avis pelo respectivo ministério para exercer a sua
profissão. Estes residiam normalmente na sede do concelho, fazendo clínica pelas
diferentes freguesias em dias diferentes; no entanto também podia acontecer serem
colocados em aldeias distantes: "O pobre clínico, atormentado pelo sol da canícula, não
podendo quási suportar os reflexos da caliça branca das paredes, levava uma vida
soturna, de exílio, sem convivência, isolado, só, lá no fundo duma província, longe da
sede do concelho, longe do caminho-de-ferro, bloqueado no inverno, quando as ribeiras
transbordavam, às vezes semanas inteiras" (Teles, 1942: 71).

Mesmo com estes médicos oficiais até bastante empenhados na sua profissão,
segundo vários testemunhos, a assistência médica não chegava a todo o concelho,
devido aos maus caminhos e inexistência de ligações por estrada até pelo menos aos
anos 40 deste século, sobretudo no inverno. Este tema é aprofundado no ponto 4.6.6.1.

Ao contrário dos médicos, que exerciam a sua profissão como funcionários do


Ministério da Saúde, os farmacêuticos eram independentes do poder central, excepto no
momento de lhes ser concedida a autorização para abrir a farmácia, a qual dependia da
população servida pela mesma. No conjunto do concelho o máximo que houve foram 3
farmácias, devido à baixa densidade populacional; a vila de Avis teve 2 farmácias num
período limitado, mas mesmo estas acabaram por ser compradas e transformadas numa
só. A ligação dos farmacêuticos do concelho com as elites fundiárias resumia-se a
Joaquim Mendes Lopes Coelho (n. c. 1870), filho do José Lopes Coelho (1841 - 1889)
que foi presidente da câmara e MC. Ele próprio foi o 21º MC de 1900, nunca chegando
a ser tão rico como os irmãos, pois casou com uma senhora com menos terras. Apesar
de ter estudado e ter uma farmácia aberta ao público durante alguns anos, nunca gostou
da sua profissão: mandava os clientes à farmácia do colega e a sua acabou por falir. Esta
família de lavradores tinha um ascendente cirurgião no início do século XIX, Luís
Mendes Fortio.

Os outros farmacêuticos do concelho constituíam um grupo da já falada elite


urbana, cujas ligações com a grande propriedade eram fracas, mas que exerciam um
estilo de vida comparável à da elite económica: possuíam casas de grandes dimensões,
frequentavam os mesmos locais de sociabilidade, e eram tratados respeitosamente pelos
outros grupos sociais. As famílias Figueiredo e Risques destacam-se do conjunto da
elite por terem mandado as filhas (além dos filhos) estudar para fora, algo
verdadeiramente arrojado para os finais do século XIX e princípios do século XX. Nota-
se grande ligação entre estas famílias e as dos funcionários: a filha de Joaquim de
Figueiredo estudou interna num colégio em Lisboa e os seus dois irmãos estudaram em
colégios internos em Estremoz (foram casos excepcionais por ambos os pais terem
morrido e a escolha dos colégios recaiu nos tutores); tanto Cecília de Figueiredo como
seu irmão Joaquim casaram com filhos do Secretário da Administração do Concelho
Alfredo Barreto da Guerra Pais; o filho de Joaquim Augusto Risques não se licenciou e
foi também funcionário público.

3.2.2.3 - Os Comerciantes. Esta categoria profissional é bastante


recente, como já foi explicado no capítulo 2. Começaram por ser designados como
lojistas se tinham um estabelecimento fixo ou almocreves e caixeiros no caso de
exercerem um comércio itinerante. No anexo 6 podem ver-se as listas de nomes dos
comerciantes e negociantes referidos nos Anuários Comerciais e nos livros do
recenseamento eleitoral, das quais destaco:

- João Marques Serrão (n. c. 1858, m. 22/2/1939), MC, casado com uma senhora
da família Lopes, grande proprietária. A sua participação na política local limitou-se a
ser uma vez vereador suplente. Era também agente bancário e de companhias de
seguros. Possuía uma das maiores casas da vila no largo principal.

- João d'Abreu Callado (n. c. 1844), irmão de Francisco d'Abreu Callado, grande
proprietário. Não tinha tantas terras como o irmão pois não casou com uma senhora rica.
Salienta-se que esta família domina praticamente todas as actividades da freguesia de
Benavila no período considerado.

- José Valentim Varela (n. 1840, m. 1914) era grande proprietário, MC e tinha
uma considerável actividade industrial no seu monte da Quinta do Pinheiro. Surge nesta
lista na categoria de negociante; não tinha loja aberta ao público, mas vendia o azeite,
vinho e farinha que produzia.

- António Vidigal Simas tinha na família vários funcionários públicos e uma


professora. Foi vereador em 1909. Era também agente bancário e de seguros.

Como pode ver-se no anexo 1, a participação dos comerciantes (aos quais se


juntam os industriais a partir da República) na política local tinha uma expressão muito
reduzida: nenhum ocupou o lugar de presidente da câmara entre 1886 e 1941. No
período da Monarquia apenas 2 foram eleitos vereadores; na República, a Comissão
Administrativa nomeada entre 16/10/1910 e 30/11/1913 teve uma participação mais
significativa desta profissão, mas este foi um período de excepção devido à mudança de
regime. Logo que voltou a haver eleições em 1913 a percentagem de comerciantes e
industriais baixou novamente para 3 elementos eleitos apenas 5 vezes em quase 13
anos. No Estado Novo não houve eleições administrativas e o número de comerciantes /
industriais nomeados até 1941 subiu para a segunda posição, o que revela um aumento
do seu prestígio social e muito provavelmente também económico neste período.

3.2.2.4 - Os Funcionários Públicos. Os funcionários públicos


(todos, desde o cantoneiro da câmara até ao médico/delegado de saúde) foram
englobados no conjunto das profissões liberais, padres e professores, os quais
representavam 12% dos eleitores da freguesia de Avis em 1900 e 11% em 1941. Isto
por Avis ser a sede do concelho, pois no conjunto dos eleitores este grupo representava
apenas 5% em 1900 e 4% em 1941.

Os funcionários públicos separavam-se em funcionários da câmara municipal,


dependentes do poder local e os funcionários da administração do concelho, os quais
estavam ligados ao poder central ou pelo menos ao distrital. A expressão destas
profissões na política local foi nula devido à inelegibilidade de grande parte dos
funcionários superiores.

Durante todo o período considerado salienta-se a presença nestes cargos das


famílias Pais, de origem em lavradores/rendeiros e com várias gerações de funcionários
administrativos; Figueiredo, farmacêuticos filhos de farmacêutico que também
desempenharam funções na administração do concelho; Risques, também filho de
farmacêutico e Joaquim do Nascimento Lobato, pai e filho. Tal como os comerciantes,
também alguns funcionários exerciam simultaneamente funções de solicitadores e
agentes bancários e de seguros. No Estado Novo surge um padre a desempenhar as
funções de Chefe de Secretaria da câmara Municipal, o cónego Francisco Ferreira
Pimenta.

Na lista dos funcionários dos correios destaca-se a presença desde pelo menos
1908 de senhoras de famílias de pequenos proprietários. Esta era uma das poucas
profissões que as senhoras podiam exercer sem obterem um estatuto mal visto
socialmente. Para este trabalho era necessário um curso técnico profissionalizante, o que
logo de início era algo arrojado, pois implicava a saída de casa para estudar em
Portalegre ou na capital. A possibilidade que as jovens tinham de realizar estes cursos
manifestava uma diferença social importante em relação aos grupos mais pobres que
não tinham possibilidade de mandar os filhos estudar, e em relação aos mais ricos, que
consideravam impróprio e desnecessário para uma filha dum lavrador tirar um curso e
realizar qualquer espécie de trabalho (ver cap. 4).
3.2.2.5 - Os Professores. O concelho de Avis teve apenas escolas
primárias durante a primeira metade deste século e mesmo estas eram em número muito
reduzido: em 1890 havia escolas em Avis, no Ervedal e Benavila; em 1900 passou a
haver também na freguesia da Figueira e Barros e só nos anos vinte foram inauguradas
as do Alcórrego, Aldeia Velha e Valongo. Quem desejasse continuar os seus estudos
tinha de o fazer na capital do distrito, Portalegre, ou ir para Évora ou Lisboa. Isso
implicava grande despesa em alojamento, transportes, nos colégios se os alunos ficavam
internos. A possibilidade de uma instrução secundária ou superior tornava-se de facto
algo que apenas um número muito limitado de famílias podia proporcionar aos seus
filhos e essa escolha é analisada no ponto seguinte.

Quanto ao ensino primário, considerando que a população rural representava


muito mais de 1/3 dos eleitores do concelho em 1890 (não esquecer que o universo
considerado inclui apenas os eleitores e a população rural era exactamente a que menos
acesso tinha a esse estatuto) podemos concluir que nos finais do século XIX chegava a
uma porção muito reduzida da população do concelho. No que diz respeito às elites, o
problema da instrução dos filhos dos lavradores residentes nos montes era resolvido na
maior parte dos casos com a já referida contratação de professores particulares que com
eles residiam durante o ano. Todas as fontes orais e algumas fotografias dão prova da
permanência destes mestres e mestras no círculo familiar, os quais por vezes eram
partilhados por duas ou mais famílias, juntando-se todos os filhos em casa de uns ou de
outros. No final dos períodos escolares mais significativos, estas crianças deslocavam-
se à vila para realizarem os exames na escola pública e assim obterem os seus diplomas.

Neste final de século as crianças que faziam o exame da 4ª classe em Avis


resumiam-se às do sexo masculino (desta geração nascida antes de 1900, a única menina
de Avis que estudou foi Cecília de Figueiredo, a qual, por morte dos pais, foi internada
num colégio em Lisboa); as meninas limitavam-se a ter uma mestra para lhes ensinar
música, lavoures e línguas, apesar de algumas terem aproveitado para aprender ao
menos a ler com os professores dos irmãos (caso dos filhos e filhas de José Varela
Teles). Geralmente aprendiam também todas as tarefas domésticas com as respectivas
mães e empregadas. Nas vilas o panorama desta diferenciação sexual a nível das elites
era muito semelhante, apesar de a geração que se instalou em Avis no início do século
XX ter já mandado as filhas para a escola pública, onde fizeram a 4ª classe (nalguns
casos). Não dispensavam, no entanto, as mestras para lhes ensinarem as restantes
prendas femininas.

Tanto estes professores particulares como os professores da escola pública


gozavam de uma posição de grande prestígio social, exactamente porque o acesso à
instrução era restrito. O professor era uma pessoa respeitada pela maior parte da
população e esta distinção manteve-se forte sobretudo nos meios rurais durante grande
parte deste século. "A imagem do professor como sacerdote da religião educativa é
muito forte durante a I República. O Estado Novo (re)contextualiza-a no quadro das
novas realidades políticas, desvalorizando as bases técnicas e científicas do
professorado e insistindo na sua dimensão missionária" (Nóvoa, 1992: 496).

Entre os professores saliento:

- Joaquim d'Abreu Calado (n. c. 1879), professor em Benavila, pertence à


mesma família que nesta freguesia é dona da maior parte das terras e também domina o
comércio local, a Junta de Freguesia, etc..

- D. Clara de Sousa Namorado, que ensinou várias gerações de Avisenses, sendo


por todos lembrada como muito rigorosa e uma excelente professora de todas as
matérias. Obrigava todas as crianças que queriam seguir para o liceu a repetir a 4ª classe
para terem as melhores notas nos exames de admissão. Esta senhora, como outros
professores também o faziam, dava explicações depois do horário das aulas a algumas
crianças de famílias da elite fundiária.

- José Francisco de Moura (n. c. 1893), professor na Figueira e Barros em 1928,


depois no Ervedal, membro da União Nacional, foi Presidente da Comissão
Administrativa da CMA (nomeado por alvará do Governador Civil do Distrito de
Portalegre) entre 1935 e 1941. A sua carreira profissional incluiu o cargo de Inspector
do Ministério da Educação e era conhecido na região como o Sr. Inspector. Mais tarde
chegou a Director-Geral do Ensino Primário e foi viver para Lisboa. Também exerceu
cargos na Junta de Freguesia.

3.2.2.6 - Os Padres. A participação dos padres no poder político


local foi uma constante durante a Monarquia e a República. No anexo 1 encontramos
repetidas vezes o Cónego José Ricardo Freire d'Andrade (3 vezes na Monarquia e 4 na
República) como vereador da câmara municipal e até como presidente entre 1906 e
1908, substituindo o anterior que tinha sido eleito deputado. Também o padre Joaquim
Mathias Simões foi vereador substituto em 1909 e o pároco do Ervedal, João d'Almeida
Canejo foi 5 vezes vereador no período da República. Depois de 1926 não houve padres
na câmara municipal.

Igualmente na Administração do Concelho pode ver-se no anexo 6 o Padre José


da Silva Nunes que foi nomeado pelo Governador Civil do Distrito para exercer essas
funções tanto na Monarquia como na República, o que não deixa de ser um facto
curioso. A Santa Casa da Misericórdia (anexo 5) também tem como provedor durante
vários anos o Cónego Freire d'Andrade, além de outros padres, como o cónego
Francisco Ferreira Pimenta, provedor em 1925. Tal como na câmara, também nesta
instituição deixou de haver padres nos cargos superiores depois de 1926. Em 1928 o
cónego Francisco Ferreira Pimenta era chefe de secretaria da administração da câmara,
portanto funcionário do poder central, mas não exercia funções de pároco, nem foi
nomeado para a câmara.

Até morrer em 1918 o já referido Cónego Freire d'Andrade teve uma actuação
forte na política local, chegando mesmo a deslocar-se a Lisboa várias vezes como
representante político, como foi o caso em 1904 numa comissão que, "em nome das
camaras d'este distrito beneficiadas pela linha de Estremoz a Portalegre e ramal d'Aviz,
vae a Lisboa sollicitar do sr, ministro das obras publicas que com a possivel brevidade
se comecem os trabalhos d'aquella linha..." (Jornal Distrito de Portalegre, 24/8/1904).
A comissão não adiantou grande coisa, nunca o Caminho-de-Ferro passou por Avis,
mas o Cónego foi o delegado de Avis nesta importante comissão. Este pároco, além da
sua participação em todos os organismos do poder local e nas festividades do concelho,
tem também a característica (que até nem era muito fora do comum na época) de ter
vivido maritalmente com uma senhora de quem teve um filho. Esta situação era
perfeitamente clara e conhecida, sendo a senhora aceite na sociedade local como a
"mulher do Padre". Ao morrer em 17/10/1918 com "influenza pneumónica", uma gripe
que assolou o país nesse ano, também o seu filho morreu, acabando a senhora por ser a
herdeira de todos os seus bens. Também o Padre Joaquim Matias Simões, que o
substituiu como pároco não residente (vivia noutro concelho e deslocava-se às
freguesias de Avis para realizar as missas) tinha um comportamento moral não
totalmente recomendável para o seu estado de eclesiástico, o qual era do conhecimento
público.
A partir dos anos 20 deixou de haver pároco na sede do concelho, passando os
padres a vir de fora para oficiar a missa dominical.

3.3 - Factores de aproximação e de separação entre estes grupos: alguns


aspectos do comportamento económico das elites

"Os grupos dominantes não são constituídos em primeiro lugar através de


características sociais semelhantes dos seus membros, e sim através do entrelaçamento
social desses membros, porque através desse entrelaçamento é possibilitada, melhorada
e canalizada a interacção. ‘Constituir’ quer dizer tanto ‘recrutar’ como também
‘integrar’. Ou seja, formulado inversamente: uma oligarquia não necessita de nenhum
grupo social como substrato, basta-lhe o entrelaçamento dos seus membros". Estas
palavras de Reinhard, citadas por Pedro de Brito (1993: 231), resumem a constituição
das elites de Avis no período entre 1886 e 1941. Como já vimos, vários membros de
outras elites foram recrutados e integrados nas elites sociais de Avis, quer pelo
casamento, quer por motivos profissionais, pela proximidade geográfica ou por
necessidade política. Isto levou a uma relativa aproximação entre os grupos inicialmente
distintos das elites fundiárias e das elites mais "urbanas" dos serviços. Porém, apesar do
"entrelaçamento dos seus membros" e duma aparência exterior algo semelhante, os
factores de separação entre os grandes proprietários fundiários e as elites que se
dedicavam às restantes actividades atrás descritas, continuaram a ser consideráveis. A
diferença encontrava-se sobretudo na posse da terra e na escolha do tipo de
investimento.

Um lavrador típico do final do século XIX movimentava apenas o dinheiro


suficiente para pagar uma parte dos salários (a maior era em comedorias), para comprar
e vender o gado nas feiras e a parte do cereal que não moía para consumo, para comprar
um mínimo necessário nas feiras e pouco mais; todo o restante era acumulado com o
objectivo de comprar sempre mais um bocado de terra ou realizar melhorias nas
herdades que já possuía, mesmo que isso implicasse pedidos de empréstimos.

As elites urbanas desligadas da propriedade fundiária, pelo contrário, tinham


gastos muito maiores no consumo doméstico diário. Não tinham todos os bens
alimentares que lhes vinham da lavoura; por outro lado tinham ordenados que lhes
permitiam pagar as despesas normais e alguns extras a que alguns lavradores não se
permitiam, nem permitiam as famílias, por uma questão de mentalidade e tradição
familiar.
Assim, mesmo havendo fortes laços de parentesco e outros entre estas famílias,
as diferenças de comportamento, sobretudo a nível económico e político revelaram-se
por vezes enormes.

3.3.1 - A transmissão da propriedade. As elites fundiárias de Avis no


final do século XIX apresentam 3 formas de acesso à propriedade: herança, compra e
casamento. No período estudado a herança ocupa uma posição muito superior à compra,
aliada à estratégia matrimonial que desenvolvo de seguida. Mesmo no caso de pequenos
proprietários ou comerciantes que ascenderam à categoria de MC, em todos podemos
constatar que essa evolução na escala social se operou pelo casamento com filhas de
grandes proprietários. Foi o caso do lojista João Marques Serrão, por exemplo. Já referi
que as partilhas se efectuavam de modo igualitário entre os filhos e as filhas: encontrei
referência a muito poucos testamentos nos processos de inventários estudados e a
distribuição dos bens apresentava valores muito semelhantes entre os vários herdeiros.
Os poucos testamentos encontrados pertenciam a lavradores sem filhos que assim
deixavam os seus bens aos afilhados ou aos sobrinhos favoritos; no caso do testamento
de José Lopes Coelho (m. 1952), este grande proprietário deixou às duas filhas um
património igual; porém, destacando que no caso de uma não ter filhos (como de facto
aconteceu), os bens herdados reverteriam a favor dos filhos da outra, pois era
importante que os bens patrimoniais não saíssem da posse da família e sobretudo não
fossem parar às mãos de estranhos, como era o caso dos herdeiros do genro, com quem
ainda por cima tinha más relações.

Nota-se a tendência para que algumas herdades fossem destinadas a um ou outro


filho em detrimento dos restantes (as que vinham dum avô com o mesmo nome, por
exemplo). Estas escolhas recaíam geralmente sobre o filho que se dedicava mais à
lavoura, não necessariamente o mais velho, recebendo os irmãos as chamadas "tornas",
ou bens de valor comparável para compensar a diferença. Essa tendência, contudo, não
vinha expressa em qualquer documento: detecta-se pela análise mais detalhada dos
inventários por morte ou é relatada pelas fontes orais.

A componente da compra de propriedades surge sempre como um factor de


complementaridade ao património fundiário herdado ou adquirido pelo casamento. Não
encontrei casos de ascensão social desligada destes factores. Mesmo na referida família
de seareiros e mais tarde rendeiros Prates Pina, nenhum dos seus membros chegou a ser
grande proprietário à excepção dum médico que se casou com uma grande proprietária.
Todos os MC de Avis no período estudado eram de facto herdeiros de lavradores
grandes proprietários ou rendeiros que já ocupavam posições destacadas entre as elites
locais desde há pelo menos um século.

Sánchez Marroyo classifica a compra de propriedades como uma forma de


gestão concreta que requer um comportamento activo, o qual se distingue do
comportamento passivo das transmissões de propriedade por herança e que "requiere un
previo processo de acumulación de capital para intervenir en el mercado de bienes..."
(Marroyo, 1991: 24). É este comportamento activo que analiso de seguida.

3.3.2 - A conservação e aumento do património familiar: tipos de


investimento, dinheiro, depósitos e dívidas. Uma vez que o acesso à contabilidade das
casas agrícolas foi muito dificultado pelas razões já apresentadas, não foi possível
apurar o tipo de gestão aplicada às propriedades fundiárias ou classificar o
comportamento económico e empresarial dos grupos da elite social de Avis. Podem, no
entanto, sistematizar-se o tipo de investimentos feitos por cada um destes grupos a partir
dos inventários por morte de alguns dos seus membros.

Como já foi referido, os lavradores movimentavam muito pouco dinheiro,


sobretudo nos casos dos residentes nas sedes das suas lavouras. São sempre pitorescas
as pequenas histórias dos lavradores que traziam as suas bolsas de couro com moedas
penduradas à cintura e, de facto, mesmo entrando pelo século XX, as contas dos
lavradores pareciam continuar a ser realizadas "em cima do joelho" (já referi os
pequenos papéis soltos e livros sem referências de datas ou quaisquer outras indicações
que encontrei nos arquivos da Fundação Abreu Callado). Dos inventários estudados, o
1º a referir uma quantia depositada num banco é apenas de 1921. Até então nenhum
inventário tinha feito referência a dinheiro ou depósitos. É claro que estes inventariados
teriam sempre algum dinheiro em casa, quanto mais não fosse em cofres ou mesmo no
colchão, só que não foram declarados. Os depósitos começaram a ser feitos timidamente
em agências bancárias que alguns comerciantes ou funcionários de Avis já tinham desde
pelo menos 1908, data da primeira referência a esta actividade nos Anuários
Comerciais; isto não significa necessariamente que antes não houvesse. As entidades
bancárias referidas nos inventários incluem a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e
Previdência, delegação de Avis (já nos anos 40), bancos de Lisboa, e delegações em
Mora, Estremoz, Ponte de Sor e Évora.
A geração dos lavradores que morreram nos anos 40 e 50, pelo contrário, já
apresenta enormes quantias de dinheiro depositado em vários bancos, como foi o caso
do Dr. Cosme dos Campos Callado e de José Lopes Coelho. Enquanto no final do
século XIX os proprietários de Avis investiam todo o seu capital na compra de mais
terra, em meados do século XX o dinheiro começou a ser aplicado em bancos, além de
ser investido na actividade agrícola.

Estas acções respondem ao objectivo sempre presente na mentalidade do


lavrador alentejano (pelo que me foi várias vezes descrito pelas fontes orais e
confirmado pela tese do Prof. Hélder Fonseca) de conservar e se possível aumentar o
património familiar. Igualmente incluídas neste objectivo estão as acções destes grandes
proprietários no sentido de nunca gastar dinheiro noutro tipo de actividades ou
diversões: a frase "não posso tocar no património dos meus filhos" é ainda
frequentemente ouvida aos descendentes destas famílias, pois diz respeito a algo que foi
herdado e que não deve ser alienado. A teoria subjacente é que o património fundiário
deve ser transmitido aos herdeiros de forma igual ou aumentada.

No período da Primeira República, "A escassez de capitais era um dos magnos


problemas da agricultura. (...) Calculava-se que mais de metade do capital empregado
pelo agricultor provinha de empréstimos. (...) Não gastar constituía, por assim dizer, a
preocupação constante do lavrador" (Marques, 1978: 126). Segundo fonte orais, os
irmãos Abreu Callado toda a vida lamentaram o dinheiro que a mãe dera por um serviço
de chá em prata que se encontrava exposto na sala de jantar: com o valor gasto
poderiam ter comprado mais uma herdade!

Para a compra de novas propriedades eram comuns os pedidos de empréstimos;


primeiro dentro da própria família e depois a amigos abastados que lhes davam maior
crédito que os bancos. Grande parte dos empréstimos era realizada entre particulares,
sobretudo desde que a Misericórdia deixara de realizar essas funções: informações orais
referem lavradores do concelho de Avis e concelhos vizinhos, como José Marques
Ratão das Galveias ou os Vaz Monteiro da Ponte de Sor, os quais emprestavam dinheiro
e assim lucravam mais que com a própria lavoura, pois cobravam juros altos; por vezes
ficavam mesmo com as terras e outros bens dos devedores. Sánchez Marroyo dedica um
capítulo inteiro a este tema do crédito no mundo rural e afirma que a actividade destes
"prestamistas" era uma fonte de rendas para vários membros da "oligarquia agrária" e
um "importante factor de acumulación de capital". Este autor considera que "la
trascendencia del tema para la economía campesina exige que se le dedique una
atención acorde con su importancia." Tal como parece ter sido o caso em Avis "el
grueso de las grandes operaciones crediticias en el ámbito extremeño (este autor estudou
a Extremadura espanhola) lo llevaban a cabo individuos particulares. Además, las más
antiguas casas comerciales habían venido tradicionalmente cubriendo también este
sector" (Marroyo, 1991: 135-138).

Entre as elites de Avis, temos o exemplo de Francisco Abreu Callado, lavrador


da freguesia de Benavila, e seus dois filhos Cosme dos Campos Callado e José Godinho
de Abreu, os quais se dedicavam a essa actividade de banqueiros informais. Porém, os
registos das transacções encontram-se nos já referidos papéis soltos nos quais se vêm
por vezes listas com nomes e datas de pagamento de letras, etc., cuja organização e
verificação de fiabilidade se torna impossível. Uma fonte mais segura encontra-se nos já
referidos inventários por morte: entre os credores referidos destacam-se os nomes destas
famílias de Benavila e das Galveias, assim como os de José Lopes Coelho, José
Olegário Pais (avô de José Diogo Pais), o lavrador Simão Teles Varela, o comerciante
António Vidigal Simas e outros de concelhos vizinhos. Esta lista de nomes confirma a
afirmação de Marroyo que "los que recurrían al crédito coincidían sociológicamente con
los prestamistas" (Marroyo, 1991: 146).

Os lavradores de Avis também pediam empréstimos a bancos, mesmo não


fazendo grandes depósitos: no inventário do lavrador da Quinta do Pinheiro, José
Valentim Varela, que morreu em 1914, vêm descritas duas dívidas a bancos de Lisboa e
Évora, uma delas datando de 1889. Também Jerónimo Lopes Coelho, lavrador e
político, tinha uma dívida ao Crédito Predial Português quando morreu em 1918. Isto
mostra que estes lavradores tinham suficientes bens patrimoniais para lhes serem
concedidos empréstimos pelos bancos, não necessitando assim de pedir a particulares a
quem necessariamente pagariam juros mais altos.

Quanto aos bens descritos nos inventários, os grandes proprietários (MC,


possuidores de pelo menos 1 herdade) apresentam naturalmente uma grande incidência
de bens imóveis rústicos e urbanos. Os imóveis rústicos são descritos como tendo
geralmente terras de semeadura, olivais, montados de azinho e sobro, lagares, moinhos,
etc. Os imóveis urbanos são sempre mais que um: "uma morada de casas com altos e
baixos" com mais de 10 divisões (a dos Godinhos de Abreu em Benavila tinha 41
divisões, por exemplo), a qual desempenhava as funções de residência da família (os
inventários são quase todos da época em que estes lavradores já se tinham mudado para
as vilas) e outras moradas de casas mais pequenas, celeiros e casões que arrendavam.

Aproveitando os incentivos das leis de protecção cerealífera dos finais do século


XIX, os lavradores de Avis realizaram alguns trabalhos de aumento da terra arável;
como já foi referido, estes arroteamentos da charneca alentejana contaram com a
participação dos seareiros, por isso pode calcular-se que a despesa dos proprietários não
tenha sido muito significativa, apesar de certos lavradores terem investido na plantação
de oliveiras, sobreiros, etc. Também já foi descrito no capítulo 2 o interesse de alguns
nas indústrias relacionadas com a sua actividade agrícola. Não podemos esquecer que
mesmo que o investimento inicial nestas indústrias representasse uma grande quantia
em dinheiro para a compra dos equipamentos, etc., o seu funcionamento posterior era
praticamente de graça, pois tanto o combustível (carvão), como a mão-de-obra e a
matéria-prima eram originários da própria lavoura.

Os investimentos na lavoura propriamente dita também não os obrigavam a


grandes gastos: apenas um grande proprietário de Avis comprou uma debulhadora já
nos anos 20 deste século, a qual era alugada a outros lavradores. Mais tarde, nos anos 40
o Grémio da Lavoura também comprou debulhadoras que os sócios podiam utilizar.
Nos anos 50 e 60 verificaram-se fortes investimentos em máquinas agrícolas e tractores.

A grande preocupação dos lavradores de Avis incidia sobre o gado, sobretudo as


ovelhas e os porcos, nos quais os investimentos eram regulares com o objectivo de
apurar as raças e produzir a melhor lã e carne respectivamente. Os seus inventários
por morte apresentam descrições pormenorizadas dos semoventes. Estes
investimentos eram especialmente lucrativos sobretudo nos porcos: segundo várias
fontes, grande parte da produção de suínos consistia na compra de leitões para serem
engordados nos montados de azinho e sobro e posteriormente vendidos, o que
implicava apenas a despesa da parte do salário do porqueiro que não estava incluída
nas comedorias.

Quadro 7:
Por exemplo, na Casa Abreu Callado encontrei um papel com as contas do gado
em 1914 – 15; não foi possível identificar se isto correspondeu ao total das vendas
desses anos ou apenas a uma transacção, mas é significativo dos altos rendimentos que
se obtinham com este gado.

Alguns lavradores tiveram coudelarias, como José Godinho d'Abreu, os Teles de


Carvalho e os Camões; porém nos inventários a que tive acesso estes semoventes não
vinham mencionados.

Outros investimentos que algumas famílias realizaram estiveram relacionados


com a melhoria das condições de vida dos seus empregados e das populações das
freguesias onde residiam. Os montes tinham quase sempre grandes edifícios para
alojamento do pessoal permanente da lavoura, cujo aspecto exterior se mantinha limpo e
bem apresentado (seguindo o hábito alentejano das caianças anuais). Os respectivos
acessos eram mantidos por conta do lavrador. Algumas escolas e instituições de saúde
tinham o patrocínio de benfeitores particulares. O caso mais evidente no concelho foi o
da família Abreu Callado, de Benavila. Este conjunto de irmãos sem filhos beneficiou
grandemente a sua freguesia de residência, não só com a Fundação que deixou em
testamento aos seus empregados, mas ainda em vida: em 1943 instituiu um asilo para os
reformados da lavoura com o nome da sua mãe e já antes disso tinha comprado uma
pequena central (que valia 30.000$00 em 1946, data do inventário de José Godinho de
Abreu), com a qual fornecia energia eléctrica à freguesia de Benavila.

No inventário de José Godinho de Abreu vem descrito o seguinte item: "Pela


transmissão da industria constituída pelo fornecimento da força motriz para accionar o
dinamo que gera a energia electrica para a iluminação pública da freguesia de Benavila,
recebe anualmente a quantia de 7.000$00." (sic). A Fundação Abreu Callado foi
instituída pelo testamento que o Dr. Cosme dos Campos Callado (irmão do anterior)
escreveu em 16/7/1947, deixando-lhe todos os seus bens com os seguintes fins:
"perpetuação da Casa Agrícola (...); manutenção dos seus criados assoldadado até á sua
morte; assistência na sua invalidez, doença e velhice (...) criação e educação dos filhos
dos criados assoldados e de outros rurais da freguesia e do concelho... ".

Os investimentos das elites urbanas são muito menos contabilizáveis. Por um


lado, os que se encontravam completamente desligados da propriedade fundiária eram
muito poucos, por isso a maioria apresenta nos inventários algum pedaço de terra, uma
horta ou uma courela, por mais pequena que fosse. Não parece, no entanto, ser a posse
da terra o seu objectivo principal, como sucedia com as elites fundiárias. Os
investimentos deste grupo em propriedades urbanas ultrapassam as propriedades
fundiárias em valor e em número. Por outro lado, os gastos correntes deixavam
certamente muito menos dinheiro para investimentos. A comparação dos respectivos
inventários deixa uma ideia clara de quem tinha mais dinheiro e bens na data da morte:
os grandes proprietários que nunca tiveram outra profissão. Os membros das profissões
liberais, etc., mesmo sendo simultaneamente grandes proprietários, tinham um estilo de
vida que os obrigava a muito maiores gastos e nos respectivos inventários tinham muito
menos dinheiro e muito mais dívidas. O exemplo mais flagrante encontra-se nos dois
casais formados por filhos dos lavradores José Lopes Coelho Sénior e de José Valentim
Varela Sénior (ver anexo 4): José Lopes Coelho Jr. casou com D. Rosa Lopes Varela,
irmã do Dr. Manuel Lopes Varela que por sua vez casou com D. Luísa Mendes Lopes,
irmã do primeiro. Em princípio, as partilhas das heranças deixaram estes dois casais
com fortunas exactamente iguais; no entanto, à data da morte, José Lopes Coelho era o
lavrador mais rico do concelho, enquanto o seu primo e cunhado tem no seu inventário
por morte um valor considerável em dívidas monetárias e um menor número de
herdades. As razões para esta disparidade são conhecidas por todas as fontes orais
entrevistadas: o primeiro nunca gastava dinheiro, poupava tudo o que podia, era
considerado um bom lavrador, investia tudo na lavoura e na compra de mais terra; o
segundo era médico, pouco ligava à lavoura, dava consultas quase de graça ou "iam lá
levar-lhe galinhas a casa"; passava grandes férias com toda a família, filhos, criadas,
etc., em Lisboa, instalando-se em bons hotéis, e nas praias da moda, onde frequentava
casinos e perdia bastante.

O exemplo destes dois irmãos é representativo do choque de mentalidades entre


o típico lavrador alentejano que vive exclusivamente da terra e da lavoura e um membro
de uma profissão liberal, que contactou com outros estilos de vida, aprecia outros
confortos e diversões, gosta de proporcionar aos filhos uma educação mais refinada, etc.
Outro exemplo flagrante é a relação entre este mesmo Dr. Manuel Lopes Varela e o seu
irmão José Valentim Varela Jr. Enquanto o primeiro gastava o dinheiro que podia da
forma já descrita, o segundo não permitiu sequer que a filha estudasse e toda a vida teve
más relações com o filho, veterinário municipal, pois nunca lhe permitiu qualquer tipo
de despesa além da necessária para a sobrevivência. Sempre acumulou dinheiro, sendo a
sua única estravagância um automóvel já no fim da vida. Acumulou também
propriedades (ao morrer tinha muito mais que o irmão, apesar de ter casado com
senhora menos rica) e o seu inventário não tem um único item de passivo. Este lavrador
comprou várias terras, além das que herdara. Para tal não deixou de recorrer a
empréstimos, com o objectivo de aumentar o património fundiário. Num dos casos,
passado nos anos 20 e contado oralmente por várias fontes no concelho, comprou a
herdade da Amendonça ao lado da sua herdade do Ramalho, com dinheiro que lhe foi
emprestado pela irmã Rosa Varela e pelo cunhado José Lopes Coelho. Reuniu então
todos os seus empregados e disse-lhes que tinha feito uma grande despesa, tinha
comprado a terra ao lado e a partir daquele dia ia baixar-lhes os salários a todos, para
que o ajudassem a pagar o investimento...

3.3.3 - As alianças matrimoniais

“Una política matrimonial adecuada era el complemento básico, que permitía


acrecentar el caudal heredable y además limitaba los naturales efectos disgregadores de
las leyes de la herencia” (Marroyo, 1991: 22). Os casamentos realizados no seio das
famílias de Avis respondiam aos mesmos objectivos de conservação e aumento do
património fundiário. Daí a tendência para os filhos de lavradores casarem dentro do seu
grupo, pois "falar de um espaço social, é dizer que se não pode juntar uma pessoa
qualquer com outra pessoa qualquer, descurando as diferenças fundamentais, sobretudo
económicas e culturais" (Bourdieu, 1989: 138). Em Avis não encontrei casos de
casamentos realizados entre pessoas da elite e da classe dos trabalhadores rurais ou
artesãos. Isto era absolutamente impensável. A única referência que tive foi sobre uma
menina da família Abreu Callado, de Benavila, que se apaixonou por um empregado da
casa agrícola nos finais do século XIX. Esta pequena história chegou aos nossos dias
contada por fontes orais que divergem nas suas várias versões, pois este assunto foi tabu
na família. Aparentemente a menina, D. Beatriz Angélica Godinho de Abreu (n.
11/9/1873, m. 16/4/1900), foi fechada no seu quarto para não fugir com o referido
senhor, teve um grande desgosto e acabou por morrer com 26 anos.

No anexo 4 estão descritos 55 casamentos realizados entre as famílias da elite


social do concelho. A observação das sociomatrizes permite verificar que praticamente
todas estas famílias acabaram por ter laços de parentesco, o que confirma a teoria do
"entrelaçamento" dos membros da oligarquia. Logo na primeira geração considerada, a
incidência de casamentos de pessoas da família Lopes entre si e com a família Varela é
significativa. Isto levou à união de propriedade fundiária que originou uma considerável
subida de alguns membros destas famílias da lista dos Maiores Contribuintes. Também
o casamento de Manuel de Carvalho com D. Maria Luísa Telles originou a família Teles
de Carvalho, proprietária de várias herdades no concelho de Avis e outros. Já foram
também referidas as senhoras da família Godinho do concelho vizinho que originaram,
pelo casamento com pessoas de Avis, importante ascensão social e económica aos
respectivos cônjuges. Nesta geração é possível concluir que os casamentos no seio do
mesmo grupo social e das mesmas famílias estavam relacionados também com questões
geográficas: era mais natural que o filho dum lavrador acabasse por casar com a filha do
lavrador da herdade vizinha, pois os seus universos estavam limitados aos próprios
limites das herdades, algumas idas às feiras e pouco mais. As dificuldades dos meios de
comunicação eram um facto tangível e que muito influenciou estes casamentos. Por
outro lado, as famílias com ligações à capital e cujos filhos estudaram fora, etc.,
trouxeram outro tipo de cônjuges para Avis, como sucedeu com Joana Isabel da Cunha
e Sá, cujo pai tinha uma quinta em Óbidos, onde a família passava férias e viveu mesmo
alguns anos. Os irmãos estudaram em Lisboa e esta senhora acabou por casar com José
Pais de Vasconcelos Abranches, de Lisboa, licenciado em Direito, filho de um Juiz e
sem qualquer vínculo com a propriedade fundiária. Foi pelo casamento que ele se
tornou lavrador e grande proprietário, estatuto que impulsionou a sua carreira política.

Nas 2ª e 3ª gerações continua a verificar-se grande incidência de casamentos


entre membros das famílias Varela Lopes, nesta altura já todos parentes muito
próximos. O mesmo se passa com as famílias Braga e Pais. Porém, enquanto na geração
que casou entre 1891 e 1910 a maioria dos casamentos foram realizados dentro das
famílias da elite social local (mesmo os poucos senhores e senhoras vindos de fora do
concelho eram dum nível social semelhante), depois de 1920 já se verifica uma grande
afluência de pessoas (sobretudo senhoras) de outras famílias, muitas das quais de fora
do concelho.

Não estão inscritos na 2ª sociomatriz os casamentos realizados pelos numerosos


filhos dos vários irmãos Telles Varella, pois apesar de cada um destes 4 irmãos terem
sido MC, os respectivos filhos e netos já não ficaram inscritos nesta categoria devido à
grande divisão das propriedades. Isto só demonstra uma estratégia matrimonial diferente
nesta família, aliada ao facto de terem tido muitos filhos, um comportamento também
diferente do praticado pela maioria das famílias da elite fundiária do concelho. Este
fenómeno do número de filhos pode ser observado nas genealogias apresentadas no
mesmo anexo 4: as famílias da elite fundiária têm no máximo 4 filhos. A excepção
encontra-se no casal José Lopes Coelho e Maria Teresa Lopes Fortio, cujos 8 filhos
tiveram o cuidado de casar com pessoas com níveis de fortuna fundiária semelhantes.
Apenas uma filha casou com um comerciante, João Marques Serrão, cuja ascensão
económica e social depois do casamento foi impressionante.

Outro factor que ajudou à concentração fundiária nestas famílias foi o facto de
alguns filhos não terem sequer casado, ou, mesmo casando, não terem tido
descendência: "o celibato - e o não reconhecimento de ilegítimos - também serviu para
manter indivisa a propriedade..." (Sobral, 1993: 14). Tal sucedeu nas famílias Lopes (o
casal composto por José Lopes Coelho Jr. e D. Rosa Viterbo Lopes Varela Lopes teve
duas filhas, das quais apenas uma teve filhos, revertendo todos os bens da 2ª filha para
os filhos da 1ª, processo já descrito); nas famílias Braga e Varela (descendentes de José
Valentim Varela). Estas últimas apresentaram alguma incidência de casais sem
descendência e com filhos classificados como "dementes" nos inventários. A família
Abreu Callado, de Benavila, foi um exemplo deste fenómeno levado às últimas
consequências: nenhum dos 4 filhos de Francisco Abreu Callado casou, apesar da
existência de alguns romances que mais pareciam saídos da pena de Camilo...

Os casamentos realizados no final do século XIX revelam que não havia grande
discriminação social entre as famílias dos grandes proprietários e as dos lavadores /
rendeiros abastados: Júlio Mário da Cunha e Sá casou com a filha de António Pais da
Silva Marques, também MC e filho de Luís Pais Teles, o rendeiro da herdade da Torre
que pertencera ao pai do primeiro. Na geração seguinte já se verifica alguma
discriminação: duas primas Lopes Varela casaram com filhos de rendeiros / pequenos
proprietários, o que só foi aceite (mas nunca completamente) pelas famílias pelo facto
de ambos estes maridos serem médicos, logo membros da elite que possuía o tal "capital
simbólico" que os tornava socialmente semelhantes (Maria Teresa Lopes que casou com
Dr. Jaime Prezado e Idalina Varela, casada com Dr. Artur Pina, da família Prates Pina,
atrás descrita como tendo origens em seareiros).

Nas restantes famílias das elites mais "urbanas" dos serviços, verifica-se que
realizaram casamentos entre elas; as possibilidades de casamentos com membros da
elite fundiária mostraram-se baixas. A excepção foi o já referido casamento do
comerciante João Marques Serrão com a filha de José Lopes Coelho Sr. Mais tarde,
quando alguns descendentes das famílias Varela se tornaram pequenos proprietários,
casaram com pessoas de famílias de comerciantes, funcionários e também de pequenos
proprietários; portanto, não houve a possibilidade de nova ascensão social pelo
casamento. Assim, pode concluir-se que entre as famílias da elite fundiária eram
"aceitáveis" os casamentos com profissões liberais, sobretudo médicos, mas verifica-se
uma baixa incidência de laços matrimoniais com membros de outros grupos sociais.

Dentro ainda desta estratégia de concentração fundiária pelo casamento, ou pelo


menos de não dispersão das propriedades, parte dos casamentos realizavam-se no
regime de separação de bens, o que assegurava a manutenção dos bens na família de
origem no caso de os casais não terem filhos. Esta tendência é evidente sobretudo nas
família Varela (do Monte Outeiro de Cima) e Lopes, cujos casamentos foram realizados
maioritariamente neste regime, enquanto as restantes famílias do concelho casavam
geralmente no regime de comunhão de bens. Foi possível chegar a esta conclusão a
partir dos inventários por morte, nos quais analisei os regimes de 24 casamentos no
grupo das elites sociais de Avis: 12 com Comunhão Absoluta de Bens e 12 com
Separação de Bens (dos quais 2 são com comunhão de adquiridos: António Lopes
Coelho e Ernestina Augusta Lopes e Simão Teles Varela com Maria Lúcia Dordio da
Silva Rebocho, de família de pequenos proprietários e encarregada da estação dos
correios, a qual nem chegou a ser sua herdeira, mas apenas usufrutuária dos seus bens
até morrer; os herdeiros foram os afilhados do marido, pois este casal não teve filhos).

"Quando herdam bens, mesmo que tenha sido lavrada uma escritura pré-nupcial,
são ainda os maridos que administram os seus bens" (Cutileiro, 1977: 141). Esta
constatação de José Cutileiro aplicava-se às elites de Avis. Os regimes de casamento
serviam apenas para as heranças, pois de facto a actuação das mulheres sobre as suas
lavouras e o próprio controlo sobre as suas propriedades era delegado no marido.
Quando estes morriam antes, a lavoura passavam para os filhos, e o papel da lavradora,
apesar de muitas serem até maiores proprietárias que os maridos, ficava completamente
apagado no meio em que estavam inseridas, sobrepondo-se sempre o papel da esposa e
mãe. Até as senhoras que não casavam tinham os seus bens administrados pelos irmãos,
como foi o caso da D. Rosa Madalena Godinho d'Abreu, irmã de José Godinho d'Abreu
e de Cosme dos Campos Callado; também sucedeu o mesmo com D. Alzira Varela,
filha do Dr. Manuel Lopes Varela, que recebia uma renda dos irmãos pelas suas
propriedades. Estas senhoras não deixavam, no entanto, de ser mencionadas nos
Anuários Comerciais como produtoras de cortiça, cereais, etc.
A idade no casamento variou bastante segundo diferentes critérios. Numa
mesma família havia irmãos que casavam mais cedo outros mais tarde, consoante os
estudos e o sexo: nas famílias dos lavradores de Avis, os filhos que tiraram cursos
superiores casavam perto dos 30 anos, enquanto os seus irmãos que se dedicaram à
lavoura desde cedo casaram antes dos 20, como foi o caso dos dois José Lopes Coelho
Sénior e Júnior. As filhas dos lavradores tinham uma certa tendência para casar mais
perto dos 30 anos. As razões que várias fontes orais me apresentaram sugerem o facto
de ter sido muito difícil para algumas destas senhoras encontrarem pretendentes ao
gosto dos pais, num meio pequeno e, principalmente, que não estivessem interessados
apenas na respectiva herança. Sobre as primeiras gerações que ainda viviam nos montes,
ouvi vários relatos de lavradores que expulsavam os pretendentes das filhas, de alguns
namoros escondidos à janela do monte e de outros romances pitorescos.

Também contava para estes casamentos tardios o facto das respectivas mães
morrerem cedo e as filhas mais velhas ajudarem nas tarefas domésticas e na criação dos
irmãos, como aconteceu à filha de José Varela Teles que ao casar ainda levou para sua
casa os dois irmãos mais novos. A geração seguinte que vivia nas vilas já casou mais
cedo, mas os casamentos perto dos 20 anos eram excepções.

Neste grupo nota-se o predomínio das famílias nucleares: "com o casamento, o


homem torna-se cabeça-de-casal, eleitor para a Junta e dono e/ou curador do património
da família" (Cutileiro, 1977: 132). Além do marido se tornar o administrador dos bens
que a mulher já tivesse por ventura herdado, ele tinha de prover o sustento da sua nova
famílias; não encontrei casos de jovens casais a viverem em casa dos pais: o casamento
implicava autonomia a todos os níveis, sobretudo financeiro. Isto obrigava à compra ou
arrendamento de uma casa nova e à posse de meios de subsistência; para tal o
procedimento corrente entre os lavradores era permitirem aos filhos administrarem
algumas das terras, mediante o pagamento de uma renda que nunca seria muito alta.
Mas geralmente as ajudas ao jovem casal ficavam por aí. A norma era que "Os deveres
primordiais de um homem casado são para com a mulher e os filhos, e não para com a
sua família de origem" (Cutileiro, 1977: 154), ao mesmo tempo que os deveres dos pais
para com os filhos terminavam quando estes se casavam. Assim, a verdadeira ascensão
económica só se verificava no momento em que algum dos cônjuges herdava, o que
geralmente também não acontecia muito tarde, pois havia sempre algum dos pais que
morria cedo (procedendo-se logo a partilhas) ou uma tia solteira que se encarregava de
deixar alguns bens (pelo menos a casa e/ou algumas terras) aos afilhados. Por exemplo,
o Dr. Manuel Lopes Varela já era MC quando casou e muito antes de o pai ter morrido:
como os pais tinham casado com separação de bens, quando a mãe morreu ele herdou
imediatamente grande parte das suas terras que eram tantas como as que o pai tinha (em
1900 José Valentim Varela era o 4º MC do concelho e este seu filho era o 16º). Na
família Lopes houve a excepção do casal de primos direitos Ana Varela Lopes e Luís
Mendes Vieira Lopes, cujos pais lhes compraram uma casa (dum tio que morrera pouco
antes) e depois estes fizeram o mesmo aos respectivos filhos.

Ao mesmo tempo verifica-se que alguns filhos de lavradores que tinham


profissões, ao herdarem deixaram de trabalhar nelas e passaram a dedicar-se
exclusivamente à lavoura: caso de Júlio Mário da Cunha e Sá, advogado, Joaquim
Mendes Lopes Coelho, farmacêutico, ou até de Arnaldo Lopes Varela que estava na
faculdade de Medicina do Porto quando o pai morreu e abandonou os estudos.

3.4 - Algumas considerações sobre o grupo das elites de Avis

Após a análise do património económico, político, social e simbólico das elites


sociais locais de Avis, podemos concluir que este grupo tem uma certa hegemonia que o
separa dos restantes componentes da sociedade local. Essa hegemonia é-lhe conferida
pela posse da terra, pelo exercício de cargos públicos ou pelos serviços prestados à
comunidade, os quais lhes são permitidos pela posse de um título académico ou pelo
estado de eclesiástico, etc. Nota-se grande homogeneidade entre este grupo, apesar de
algumas excepções, como os (poucos) membros da elite dos serviços que não têm
relações de parentesco próximas com a elite fundiária. Assim, pode afirmar-se a
existência de uma classe social perfeitamente destacada das restantes e cujas
manifestações mais visíveis da diferença desenvolvo no capítulo seguinte.
Capítulo 4 - As manifestações da diferença: vivências quotidianas e
práticas de sociabilidade.

Depois da definição das elites locais e respectiva composição e comportamentos


económicos, passo à análise das vivências quotidianas e práticas de sociabilidade deste
grupo, sobretudo nos seus aspectos exteriores de diferenciação social que distinguem
estas famílias dos restantes grupos da sociedade avisense. Esta análise tem o objectivo
de definir a imagem social das elites e a forma como ela é imediatamente reconhecida,
pela manifestação do seu poder simbólico, o qual tem representações perfeitamente
visíveis na sociedade local: o lugar ocupado pelas elites na sua esfera de acção
respondia a uma encenação própria manifestada em aspectos materiais, mas também em
atitudes, como as descritas por um membro da elite da freguesia beirã retratada por José
Manuel Sobral. "Entram na (classe) dos ricos os que vivem como tais (...) com uma
ostentação discreta mas perceptível, uma superioridade afável, regularidade nas práticas
religiosas e nos deveres de cortesia interpares; e o escrupuloso cumprimento das
convenções de caridade (outra regra fundamental)" (Sobral, 1993: 154).

Pretendo aqui descrever uma realidade social característica do meio rural


alentejano na primeira metade do século XX, da qual Avis é parte integrante e que se
manifesta num estilo de vida: aliás, vários estilos de vida dentro dum mesmo grupo que
se caracteriza pela diversidade dos seus membros. Já foram referidas as diferentes
origens e actuações sócio-económicas e profissionais das elites sociais de Avis: as elites
rurais e as elites mais "urbanas". Dentro de cada uma destas sub-divisões, encontrei
várias ligações e muitos outros factores de separação. Além disso, verificou-se uma
evolução destes grupos no tempo, marcada por grandes mudanças e simultaneamente
por fortes permanências.

Uma das grandes permanências está relacionada com o facto do grupo das elites
ser constituído maioritariamente pelas mesmas famílias desde pelo menos os finais do
século XVIII, como já foi desenvolvido no capítulo anterior; até a passagem de alguns
membros do grupo de lavradores/rendeiros à categoria de grandes proprietários não veio
alterar-lhes grandemente o estilo de vida, pois os objectivos continuaram a ser os
mesmos de aumentar a renda da lavoura e o património fundiário. A grande mudança
ocorreu quando se começou a verificar o abandono dos montes e grande parte das
famílias dos lavradores passou a ter a sua primeira residência na sede do concelho ou
noutros centros urbanos, o que introduziu alterações significativas nos comportamentos
sociais, nas vivências e nas sociabilidades das elites avisenses.

De qualquer modo, até meados do século XX a vida das elites locais nunca
deixou de estar ligada à agricultura e à pecuária, aqui designada como lavoura,
actividade principal da região e da qual dependem todas as outras. Mesmo com a subida
relativa dos níveis de absentismo, praticamente todas as famílias continuaram a ter pelo
menos um representante a tomar conta das suas propriedades e das dos parentes
ausentes. Toda a população do concelho, até os que não tinham a agricultura como
actividade principal, como os comerciantes, por exemplo (devido à sua actividade de
credores dos trabalhadores rurais em tempos de desemprego), vivia condicionada pelo
ritmo dos trabalhos que se realizavam nas diferentes estações do ano: as épocas de
colheitas, da apanha da azeitona, das ceifas, mondas, feiras... As elites sociais locais
participavam intensamente neste ciclo que faz parte duma vivência rural que as
populações das cidades em geral desconhecem ou ignoram, pois não são afectadas
directamente pelo facto de estar a chover ou não, de estar frio ou estar calor. Qualquer
destes factores era determinante para a subsistência das populações rurais e contribuía
directamente para o seu bem-estar.

4.1 - Vivência Rural

Uma das características mais notáveis da província transtagana são os


montes, isto é, as casas de residência nas herdades, que simultaneamente e
por via de regra se aplicam também a sedes das lavouras que se exploram
nas mesmas herdades (...) Erguidos no alto de qualquer colina ou na vertente
de uma encosta, dominam vastos horizontes, cujo panorama (...) agrada pela
fertilidade do solo extensíssimo e pelo avultado número de gados diversos
que o povoam e animam. (...) De feição essencialmente criadora, sintetiza(m)
em si toda a vida agrícola alentejana (Picão, 1983: 25-27).

Nunca é demais repetir que as descrições de José da Silva Picão nos apresentam
o retrato mais completo e vivo da realidade rural alentejana. Este autor dividiu os
montes em cinco classes: “1º Os de aparência acastelada, solarengos, com torres e
ameias, de dois andares, cercados por alto muro, que deixa de permeio o pátio de
entrada. 2º Aqueles que, não tendo a vetusta imponência dos primeiros, possuem
contudo os requisitos necessários à sede de uma grande lavoura e à habitação
confortável do lavrador e sua família. (...) denotam no seu todo uma feição mais alegre e
moderna. Compõem-se geralmente de casas altas e baixas, com janelas e portados
rectangulares, sem (...) muro. As portas exteriores dão para terreiros sem vedação, que
se prolongam indefinidamente pela herdade. 3º Os de menos acomodações que os
precedentes (...) possuem em geral alojo para uma lavoura mediana. 4º Os de poucas
casas ao rés-do-chão, em número restrito (para) uma lavoura relativamente pequena. Se
possuem compartimentos para a residência do lavrador, são tão exíguos e diminutos que
raríssimas vezes se destinam a tal uso. 5º Os de três a seis casitas baixas (...) estes
montarecos habitam-nos os guardas, pastores, caseiros, etc.” (Picão, 1983: 25-27).

No concelho de Avis existem montes que correspondem a qualquer destas


classificações. Apesar de alguns estarem actualmente em muito mau estado, permitem a
reconstituição de parte da sua vida passada. Com alguma imaginação podemos até
visualizar os diferentes tipos do pessoal da lavoura a exercer as suas actividades nas
ruas dos montes, o patrão a passar com o seu cavalo ou de charrete, e outras situações
pitorescas.

Apenas um dos montes de Avis pode ser incluído na primeira categoria: o da


Herdade da Torre, comprado por António José da Cunha e Sá nos anos 30 do século
XIX. A maioria enquadra-se na descrição da segunda e terceira "classes", encontrando-
se também perto destes alguns dos tais montarecos para habitação do pessoal.

Grande parte dos grandes proprietários de Avis nos finais do século XIX eram
lavradores que residiam nas sedes das suas lavouras com a sua unidade familiar
alargada, constituída pela família nuclear e todo um conjunto de criados (no sentido
tradicional e literal do termo) e empregados da casa que participavam na vida
doméstica. Estes incluíam os mestres das crianças, os serviçais, alguns afilhados, etc.
Além da casa principal, os montes tinham quase sempre um conjunto de imóveis como
as casas dos empregados da lavoura e respectivas famílias, os celeiros, armazéns,
moinhos, lagares, pocilgas e estábulos.

Era aqui que o lavrador assumia a sua posição de comando. Mesmo tendo um
feitor (que servia como uma espécie de encarregado geral), a presença do Patrão era
uma constante e nenhuma actividade se desenrolava sem a sua ordem e posterior
verificação nas suas saídas diárias a cavalo ou de charrete pelas propriedades. A
referida localização do monte num sítio alto respondia não apenas a uma necessidade
estética, mas também possibilitava um maior controlo sobre os trabalhos agrícolas e a
evolução das culturas.
Para estudar o modo de vida destas elites rurais, as fontes são muito reduzidas:
enquanto vários autores até agora têm procurado definir os seus comportamentos
económicos, políticos, etc., no que diz respeito aos seus hábitos diários e mentalidades,
muito ainda está por fazer. Alguns inventários por morte forneceram-me elementos
importantes sobre os bens de uso diário destes lavradores, dos quais saliento o de
Manuel Joaquim da Costa Braga, cujo mobiliário e objectos descritos como
pertencentes à casa do monte apresentam as mesmas características de conforto e luxo
dos da casa da vila. Enquanto estas fontes nos apresentam objectos, as fontes orais
permitem-nos conhecer vivências, constituindo uma fonte riquíssima, ainda que
pertencentes a uma espécie em vias de extinção. Em Avis, entrevistei uma neta de dois
dos mais significativos lavradores de Avis no final do século XIX, José Valentim
Varela Sénior e José Lopes Coelho Sénior. Esta senhora forneceu-me informações
preciosas sobre as famílias de Avis e morreu poucos meses depois (já tinha mais de 90
anos), perdendo-se para sempre muitas das pequenas histórias locais. A partir desta
entrevista foi possível reconstruir uma parte significativa das vivências destas famílias,
não esquecendo naturalmente a subjectividade da fonte. Desde o início deste trabalho
que ficou claro que certos lavradores gozavam de um maior apreço que os outros entre a
população em geral e mesmo entre os respectivos descendentes.

A referida senhora D. Alzira Varela manifestou imediatamente a sua preferência


pela parte Varela da sua família, pois os Lopes, "como a maioria dos ricos de Avis, só
pensavam em aforralhar o dinheiro nos cofres". O seu avô Varela, pelo contrário, foi
qualificado como uma pessoa generosa, justa para os empregados e "muito culta apesar
de ter estudado apenas a Instrução Primária", cuja cabeça era uma "universidade dos
preceitos da agricultura"! Tinha um irmão Bacharel em Direito, mas dizia que "a cultura
não era para os lavradores", pois a opinião corrente era que a lavoura necessitava apenas
dos conhecimentos práticos aprendidos com os pais. Aliás, essa parecia ser a regra nesta
geração dos filhos de lavradores de Avis que nasceram em meados do século XIX e se
dedicaram exclusivamente à lavoura. O seu primo, vizinho e grande companheiro de
bebedeiras José Varela Telles, por exemplo, nem sabia escrever, apesar de ter tido em
casa mestres para ensinar os filhos.

Enquanto o lavrador saía todos os dias para o campo, a cavalo ou de charrete,


por vezes acompanhado dos filhos quando estes não estavam a estudar, a mulher a as
filhas ficavam no monte, onde comandavam e participavam em todas as actividades não
só domésticas, mas também as relacionadas com a transformação dos produtos da
lavoura: dos relatos sobre as senhoras desta primeira geração salienta-se uma
participação activa nos vários trabalhos sazonalmente efectuados, desde a matança do
porco e respectivo tratamento, salga, confecção de enchidos, etc., ao fabrico dos queijos
e à distribuição das rações e comedorias aos empregados. A vida das lavradoras nunca
tinha momentos ociosos: mesmo tendo sempre criadas e as mulheres do pessoal da
lavoura para os trabalhos mais pesados, estas senhoras estavam sempre ocupadas com
os filhos (algumas tiveram mais de 10); com a cozinha, onde se esmeravam na
confecção diária não só das refeições da família como de doces e bolos; com as roupas e
os enxovais das filhas, por elas bordadas e costuradas e ainda participavam
regularmente nos trabalhos da apanha da azeitona.

Com todas estas actividades, tanto a mulher de José Valentim Varela como a de
José Varela Teles morreram cedo "de infecções", muito naturalmente relacionadas com
as múltiplas gravidezes, enquanto nas gerações seguintes o número de viúvas nestas
famílias aumentou consideravelmente.

Os filhos participavam em todas estas actividades desde cedo, residindo nos


montes com os pais até que algum escolhesse avançar nos estudos e fosse estudar para
fora. Entretanto competia às meninas aprender as tarefas domésticas com as mães ou
com alguma empregada mais antiga.

Os montes eram unidades praticamente auto-suficientes: a lavoura fornecia toda


a alimentação diária, incluindo frutas e legumes das hortas habitualmente localizadas
perto da casa principal; nos montes as infra-estruturas fundamentais incluíam os poços
ou as nascentes com noras que alimentavam fontes e cisternas para o ano inteiro; na
Quinta do Pinheiro, por exemplo, José Valentim Varela construiu em 1901 uma fonte
bastante decorativa e na Herdade da Marrã, de Joaquim Telles Varella, é conhecida a
Fonte de S. João. Também os combustíveis provinham da lavoura: a lenha e o carvão
para o aquecimento e cozinha e o azeite para a iluminação.

Assim, as saídas dos limites das herdades ocorriam apenas em ocasiões muito
específicas: a ida à missa, às feiras no concelho e em concelhos vizinhos e algumas
viagens muito raras. Alguns montes tinham capelas, mas eram poucos e a sua utilização
resumia-se a local de oração familiar, pois as vezes que um padre lá se deslocava para
oficiar a missa limitavam-se a ocasiões muito excepcionais, como baptizados,
casamentos ou funerais. O mais frequente era o passeio semanal à vila mais próxima,
onde a família tinha casa de pousada, para participar na missa dominical e estabelecer
importantes contactos sociais, políticos e comerciais: é famosa a descrição da chegada a
Avis, todos os domingos de manhã, de José Varela Teles do Monte Outeiro de Baixo,
numa charrete toda lustrosa, onde se instalavam a sua mulher e os filhos mais
pequenos, enquanto os mais velhos, pelo menos 6 ou 7, seguiam atrás a cavalo.

Para o período estudado foi impossível determinar o número de empregados


fixos e sazonais de cada lavoura, pois como já foi referido, os arquivos familiares não
estavam suficientemente acessíveis para tal. Apenas no caso da lavoura da família Teles
de Carvalho existem livros de pessoal desde os finais dos anos 30, os quais analisarei
para um trabalho posterior.

4.2 - Vivência Urbana

No capítulo 3 já enunciei algumas razões para a mudança dos montes para as


vilas e mesmo para a saída do concelho de alguns filhos de lavradores. Mesmo as
famílias que permaneceram nos montes depois de 1900 reforçaram os laços com algum
aglomerado urbano próximo, como foi o caso da família Carvalho em relação à vila de
Fronteira devido aos estudos dos filhos, ou com a capital, onde passaram a ter segundas
residências, como os Cunha e Sá.

Neste ponto dedico-me exclusivamente ao estilo de vida desenvolvido pelas


famílias que se mudaram ou já viviam nas vilas de Avis ou do Ervedal, a maior parte
com laços que já vinham dos finais do século XVIII. Não se verificaram mudanças para
as aldeias, pois estas ainda no início do século XX não passavam praticamente de um
conjunto de montes com uma vivência muito mais rural que urbana, como era o caso de
Benavila, que não passava das casas da família Abreu Calado e de um pequeno conjunto
de ruas de habitação popular, onde moravam os empregados das propriedade destes
lavradores, donos de praticamente todas as terras que rodeavam a povoação.

A mudança dos lavradores para as vilas ocorreu progressivamente a partir dos


últimos anos do século XIX, ao mesmo tempo que se assiste à construção ou à
reconstrução de grandes casas sobretudo em Avis. Incluiu tanto os filhos de lavradores
que se dedicaram a profissões liberais e exerceram cargos políticos, como os que se
dedicaram à lavoura em exclusividade. Para estes a mudança de estilo de vida não foi
tão grande como para as respectivas mulheres. Enquanto os lavradores continuaram a
sair diariamente para as suas propriedades, as senhoras passaram a ter actividades mais
"urbanas", delegando as antigas funções de lavradoras para as caseiras e outros
empregados que ficaram nos montes. Para estas senhoras, a ida ao monte passou a
realizar-se apenas como passeio ou actividade de excepção, como férias ou festas.

Assiste-se sobretudo a um emburguesamento deste grupo, isto é, à adopção de


comportamentos que obedeciam aos modelos mais urbanos descritos nos manuais de
etiqueta da época e imitavam as modas das cidades de referência, sobretudo Évora,
Coimbra e Lisboa, as quais por sua vez imitavam Paris. Assim, há todo um conjunto de
rituais diários e de sociabilidade que começaram a ser praticados por estas famílias,
sobretudo entre os membros que tiveram algum contacto com essas cidades nos anos
que passaram fora a estudar. Os comportamentos descritos e aconselhados nos manuais
de civilidade do século XIX têm bastante a ver com os que eram praticados pela
sociedade Avisense nos finais deste século e grande parte do século XX, naturalmente
adaptados à realidade rural e de um meio pequeno que não comportava o mesmo tipo de
sociabilidades que a capital (Santos, 1983).

A relação das elites com o campo continuou forte no sentido em que a terra era a
maior fonte de rendimento e a base da actividade económica do concelho. Mesmo
quando os grandes proprietários desempenhavam outra actividade paralela, nunca
deixaram de se interessar directamente pela lavoura ou pelo menos tinham um parente
próximo a trabalhar na administração das terras: caso do bacharel Cosme dos Campos
Callado, cujo irmão José Godinho d'Abreu era o lavrador da família, enquanto ele se
dedicou à política.

4.2.1 - Dimensão, localização e mobiliário das casas de habitação. A


vila de Avis teve um crescimento considerável a partir do final do século XIX.
Originalmente, as casas eram de dimensões reduzidas, sendo o palácio do Prior-Mor o
maior edifício a seguir ao convento e às igrejas. A vila não ultrapassava as respectivas
muralhas a não ser nos arrabaldes e grande parte ainda era ocupada por quintais e outras
dependências das habitações. A mudança destas elites originou grandes transformações
no aspecto exterior das casas e na sua localização. Não só algumas pequenas casas de
pousada foram ampliadas e transformadas em residências de 2 e 3 andares (moradas de
casas com altos e baixos), como muitas casas novas foram construídas de raíz, em ruas
e largos abertos para instalar as novas elites urbanas. Por exemplo, quase todos os
irmãos Varela e Lopes construíram novas e grandes casas no Largo Ségio de Castro;
também na antiga Rua do Convento, rebaptizada como Rua Dr. Manuel de Arriaga,
várias novas casas foram construídas sobre outras mais antigas pelas mesmas famílias
Lopes e Varela e pelo farmacêutico Joaquim de Figueiredo.

O Guia Artístico de Avis descreve Benavila como tendo "Várias casas de dois
pisos, na sua maioria com cunhais decorados com capitéis em alvenaria, à maneira dos
finais do século XVIII, explorando o contraste cromático e da relação luz/sombra,
devido ao relevo das peças. Algumas destas casas conservam janelas de arco abatido,
denunciando uma fundação talvez ainda seiscentista, e terão pertencido a dignatários da
Ordem de Avis ou à pequena nobreza local, transitando em seguida para as mãos de
abastados terratenentes e, sucessivamente, para outros proprietários menos abastados.
São comuns as janelas de sacada no piso nobre" (Rodrigues, 1993: 43). Esta descrição
aplica-se igualmente às casas das elites das restantes vilas do concelho.

As casas mais pequenas, localizadas em ruas mais estreitas e menos centrais


(situadas também nos arrabaldes) eram usadas sobretudo para residência dos pequenos
proprietários, dos artistas e dos trabalhadores rurais. Estas casas de habitação popular
tradicionais que abundam em Avis e nas restantes vilas e aldeias do concelho foram
descritas pela mesma fonte do seguinte modo: "Geralmente de um só piso, só com uma
janela na fachada e outra na porta - ou só mesmo a da porta - derivam da tradição
medieval e são constituídas por uma repartição de espaços frente/traseira, com uma
divisão de entrada que é cozinha e sala, seguida da (ou das) alcova(s) e/ou outra divisão
utilitária, muitas vezes, sem iluminação própria; sob o telhado fica o forro, de madeira,
onde se guardavam os produtos agrícolas. O grande destaque exterior vai para as
grandes chaminés - fogão e lareira, onde literalmente se vive dentro, no rigoroso
inverno alentejano - muitas vezes avançadas e de grandes dimensões, com remate de
excelente efeito plástico" (Rodrigues, 1993: 43-44).

Esta distinção espacial na localização e dimensão das casas constituiu um factor


muito forte de identificação e separação das elites em relação aos restantes componentes
da sociedade local. As casas das elites terratenentes, no entanto, não se distinguiam nem
em dimensão nem em localização das casas de alguns membros da elite atrás descrita
como "mais urbana": a já referida casa do farmacêutico Joaquim de Figueiredo, herdada
pela sua filha Cecília de Figueiredo que casou com um membro do grupo dos
funcionários administrativos, além de estar localizada numa das ruas principais da vila,
tem dimensões e dependências semelhantes às das residências dos maiores proprietários
rurais.
Igualmente a casa do comerciante João Marques Serrão está localizada no largo
central da vila, mas esta respondia a uma necessidade de localização relacionada com a
sua actividade profissional: a entrada principal da casa é por uma rua lateral, com acesso
aos "altos", isto é, a residência da família encontrava-se no primeiro andar, enquanto a
loja aberta ao público se situava na parte "baixa" da casa, com portas para o largo.

Uma segunda fase de crescimento da vila, a partir sobretudo dos anos 20 deste
século, consistiu no seu alargamento para fora das muralhas, na abertura de grandes ruas
que descem a colina e na construção de novas casas, as quais começaram a obedecer a
diferentes conceitos estéticos: por exemplo a casa de Simão Teles Varela incluiu
algumas características decorativas da arquitectura da Arte Nova.

Todas estas casas, com as suas inúmeras dependências, levaram para a vila uma
certa continuação da vida nos montes: os quintais, pátios com poços, fontes e até
pequenos pomares, celeiros, cavalariças, pombais, casa da lenha, casa da cal (as casas
alentejanas eram caiadas todos os anos), dependências dos criados, etc. Isto reproduzia
uma parte da vida rural que não foi completamente abandonada.

A organização do espaço destas casas obedecia na maior parte dos casos a uma
representação (não necessariamente intencional) da ascensão social do seu proprietário,
manifestada na escadaria que imediatamente após a porta principal levava a família e
seus convidados ao andar superior, enquanto o andar inferior ficava reservado ao
pessoal doméstico (na parte das traseiras) ou a funções profissionais do chefe de família,
como por exemplo o escritório (nos inventário há algumas, se bem que poucas,
referência a cofres, livros e escrivaninhas) onde o lavrador tinha a sua contabilidade ou
o médico tinha o seu consultório, ou o comerciante tinha a sua loja. No caso dos
farmacêuticos, a respectiva farmácia era sempre separada da casa da família, pois
continha produtos considerados perigosos.

O interior das residências estava claramente dividido em três espaços distintos


(Santos, 1983: 37-38), cujas características principais vêm descritas em alguns dos
inventários por morte mais pormenorizados (a nomeação dos espaços não obedece a
qualquer tentativa de hierarquização, nem em relação à área ocupada por cada um deles,
a qual varia bastante consoante os casos e as dimensões das famílias consideradas):

 o espaço familiar, com o maior quarto da casa para os pais, geralmente com
janela de sacada para a rua e as melhores mobílias, camas, guarda-roupas, cómodas das
melhores madeiras, etc.; e vários quartos mais pequenos para os filhos, estes com camas
de ferro ou madeiras menos nobres; incluía também pequenas salas-de-estar, onde a
família tomava as refeições diárias e passava os serões. Estas divisões eram geralmente
aquecidas com braseiras sob as mesas cobertas, as camilhas, junto às quais as senhoras
custuravam e passavam a maior parte do tempo. Algumas pequenas dependências junto
aos quartos foram (já nos anos 20 ou 30 do século XX) transformadas em casas-de-
banho, pois até então a higiene realizava-se nos respectivos quartos, nos quais se
encontrava sempre um lavatório, jarros com água, espelhos, bacios nas mesas de
cabeceira, etc. Para complementar estas actividades existia sempre uma pequena casa no
quintal… Pode dizer-se que estes espaços da casa constituíam um universo feminino,
recheados de rendas e bordados, crianças e comida, no qual a participação masculina era
muito reduzida. Por este motivo, e porque grande parte das actividades das senhoras
incluía a confecção de bolos e doces, também se pode incluir no espaço familiar da
residência alentejana, mesmo entre as famílias da elite, a cozinha. Esta divisão era
muitas vezes a maior da casa, com uma lareira que ocupava uma parede inteira e na qual
se reuniam as crianças e muitas vezes os adultos nos frios serões de inverno, à volta do
lume de chão, depois que as criadas se retiravam para os seus aposentos.

 o espaço dos serviços incluía várias dependências de habitação do pessoal


doméstico, geralmente no andar inferior ou mesmo em anexos separados pelo quintal ou
pátio exterior. No “contexto da família burguesa do século XIX (…) novas regras
impõem o afastamento físico - divisões especiais da casa para os criados” (Santos,
1983: 31). Incluía também alguns cómodos junto da cozinha, como as enormes
dispensas onde se armazenavam os alimentos para todo o ano: arcas com farinha, bilhas
com azeite, recipientes para a salga das diferentes partes dos porcos, etc. Vários destes
utensílios vêm descriminados nos inventários. Dentro das casas a água para beber
guardava-se em bilhas de barro sob os poiais das cozinhas, onde se mantinha fresca. As
casas tinham também cisternas de pedra, nas quais se acumulava a água da chuva para
outros usos. Até 1935 toda a iluminação era feita com candeeiros de petróleo e os
alimentos eram conservados naturalmente, sem recurso ao frio: carnes salgadas ou
fumadas (nas chaminés), frutos em conservas com bastante açúcar, etc. A partir da
instalação do gerador, a vida não mudou tanto assim, uma vez que este apenas acendia a
luz ao sol posto e a apagava à meia-noite. Algumas famílias chegaram a ter por esta
época frigoríficos a petróleo. A electricidade propriamente dita só chegou em 1958 com
a "barragem nova", mas já em 1954 o inventário de José Valentim Varela Júnior
enumera, além dum frigorífico, uma máquina de lavar louça!

 o espaço de sociabilidade e contacto com o exterior. Para além do já


referido escritório do chefe de família (que não era regra, existia apenas em casos
pontuais), as residências das elites possuíam sempre, geralmente no andar superior, uma
sala-de-estar e uma sala-de-jantar, na qual se recebiam as visitas e se desenvolviam as
“actividades de natureza artística (…) nos serões toca-se piano, recita-se poesia, canta-
se” (Santos, 1983: 37) e se expunham os objectos mais valiosos do património familiar,
originárias na maior parte dos casos do enxoval das senhoras: as louças, as pratas, os
cristais, as mobílias com as melhores madeiras, descriminadas com grande pormenor
nos inventários por morte, a máquina de costura, o piano e todos os objectos adquiridos,
mas sobretudo herdados e que demonstravam a riqueza dos antepassados e a opulência
que se pretendia disfarçar de outros modos. Com o mesmo objectivo, estas divisões
tinham as paredes e os móveis cobertos de fotografias dos antepassados, em molduras
mais ou menos decorativas. “É curiosa a referência às fotografias nesta enumeração de
objectos indispensáveis para criar uma pequena zona de representação que se pretende
minimamente convincente - a fotografia surgia nesta época como um novo signo
distintivo, simultaneamente como um objecto decorativo em moda e enquanto imagem
de uma rede de parentesco (os retratos de família) que corresponde, porventura, a um
sentimento sucedâneo daquele que se ligava ao culto de linhagem da nobreza” (Santos,
1983: 38-39). Não encontrei qualquer referência a quadros ou outras obras de arte nos
inventários estudados: o acesso e o gosto por este tipo de peça era algo muito distante
das elites rurais; no máximo as famílias de Avis decoravam as suas paredes com
gravuras compradas em Lisboa ou com trabalhos de pintura ou bordados realizados
pelas meninas da família, que assim exibiam os seus dotes. Enquanto nas salinhas mais
aconchegadas imperava o universo feminino, nestas salas de maiores dimensões a figura
masculina ocupava uma posição de maior destaque, sobretudo à mesa de refeições, na
qual o pai de família ocupava sempre uma das cabeceiras e era o primeiro a ser servido
pela esposa dedicada.

4.3 - Representação Social

No exterior das suas habitações, as elites também se distinguiam dos restantes


grupos por várias manifestações de diferença. A começar pelos espaços públicos, nos
quais os seus membros se distinguiam por uma frequência muito reduzida, sobretudo no
que diz respeito às senhoras. Este comportamento fazia parte da ética vigente: “A
habitação familiar é um reduto, ‘lar que embala os que tiverem sido magoados e
contristados’, lugar donde se sai apenas ‘quando o dever o ordenar’” (Santos, 1983: 25).
De facto, os membros da elite, sobretudo os lavradores mais abastados, não se
deslocavam frequentemente a pé pela rua, ao contrário dos outros que não possuíam
outro meio de locomoção. Enquanto jovens, ainda passeavam com os amigos,
circulando sobretudo sob as janelas das casas das meninas que lhes interessavam;
depois de adultos, não só frequentavam locais de sociabilidade perfeitamente separados,
como andavam a cavalo ou em carros de tracção animal (Ramos, 1994: 229) e todos os
homens de condição social inferior tiravam o chapéu à sua passagem (Sobral, 1993:
449). Aliás, essa era uma forma de afirmação social que alguns almejaram
ardentemente, como foi o caso do já várias vezes mencionado Dr. Presado, médico com
origens familiares na pequena propriedade, casado com uma das maiores herdeiras de
Avis: quando passava por algum trabalhador que não lhe tirava o chapéu, ele próprio
violentamente lho tirava com o chicote do cavalo.

4.3.1 - Formas de Tratamento. Na mesma ordem de ideias, os trabalhadores


rurais raramente falavam ou olhavam directamente o Patrão, denominação utilizada
correntemente para designar o lavrador: mantinham geralmente a cabeça baixa numa
atitude reverencial. O único a quem se permitia um maior diálogo era o feitor, o qual
nunca esquecia porém a sua posição de empregado, mesmo com os filhos do patrão,
sempre chamados “meninos” ou “patrõezinhos”.

Assim como o modo de tratamento utilizado pelas classes mais baixas em


relação às elites representavam uma clara distinção social, também o modo como estas
denominavam os trabalhadores rurais, e mesmo alguns artistas e comerciantes, os
colocava imediatamente numa posição de inferioridade: a maioria não tinha direito ao
seu nome próprio, nem sequer ao apelido. Eram tratados geralmente por alcunhas,
muitas vezes até depreciativas. Não quer dizer que entre as elites não circulassem
alcunhas familiares, na tradição alentejana de assim ironizar com alguns defeitos das
pessoas ou com os nomes próprios. Porém, nunca um empregado se dirigiria ao patrão
pela sua alcunha, enquanto no caso do trabalhador isto era quase regra: "A sociedade
não os conhece - nem eles próprios se designam - pelos seus apelidos, mas sim por
alcunhas, que, na maioria dos casos, são especificamente individuais (e constituem) a
expressão de uma sanção social específica" (Cutileiro, 1977: 177-180). Os romances e
contos de Noel Telles estão recheados de exemplos desta realidade: há um cabreiro no
Terra Campa com a alcunha de "Mãos de Aranha", o feitor era o "Patarró", etc. As
alcunhas das elites eram conhecidas do restante da população pela proximidade física no
interior da própria casa com as restantes classes sociais. Não havia, no entanto, qualquer
possibilidade de estas alcunhas serem usadas fora do círculo das elites, o que seria
considerado um desrespeito.

A denominação mais corrente entre as famílias de Avis era (e continua


teimosamente a ser) a de Primo ou Compadre. Como pudemos ver nas sociomatrizes do
anexo 4, havia realmente relações de parentesco até muito próximas entre a maioria das
famílias estudadas. Muitas, porém, datavam de 3 ou 4 gerações e por vezes nem se sabia
a origem do parentesco. Curiosamente, no trabalho de reconstituição de famílias
realizado para esta tese, e face à consulta das fontes referidas, consegui apurar alguns
dos antepassados comuns às famílias Varela, desconhecidos dos seus múltiplos
descendentes e afinal não tão próximos como se pensava. Quanto às famílias Godinho,
Braga, Camões e Cunha e Sá, servi-me da obra do genealojista dessa família (Manuel
Rosado Marques de Camões e Vasconcelos) e descobri que neste caso os
entrelaçamentos matrimoniais são muito fortes, o que revela uma forte endogamia
nestas famílias.

De qualquer modo a permanência desta denominação constituía um factor de


identificação e de afirmação social: ter a possibilidade de chamar primo ou compadre a
um grande proprietário ou a um médico criava uma proximidade e uma integração no
grupo que algumas vezes já nem existia de facto, por algumas famílias terem descido no
escalão social em consequência de partilhas, por exemplo.

Igualmente o “parentesco espiritual” criava laços indissolúveis entre famílias: os


padrinhos de baptismo e de casamento tornavam-se responsáveis pelos afilhados. Entre
pessoas do mesmo nível social, a escolha dos padrinhos para os filhos incidia na maior
parte das vezes sobre os parentes mais chegados, principalmente tios e tias solteiros,
cujas probabilidades de deixar os bens aos afilhados eram grandes. O modo de
tratamento usado por estes continuava a ser de Tio ou Primo. Também eram frequentes
as escolhas de pessoas com quem se tinha afinidades políticas ou de amizade e nestes
casos os afilhados chamavam-lhes Madrinha ou Padrinho. No entanto estas
denominações tinham um uso muito mais frequente pelas pessoas de condição social
inferior, geralmente os empregados da casa ou da lavoura que sempre que possível
convidavam os Patrões para padrinhos de casamento (no caso das criadas que saíam de
casa dos senhores para casar, depois de lá terem passado a infância e a adolescência) e
depois para padrinhos dos filhos. Noel Teles escreveu sobre os montes e as herdades no
seu romance Terra Campa: "Ali nasciam, casavam, e morriam dentro das extremas da
herdade e os que não eram compadres, eram pela certa afilhados da casa" (Teles, 1947:
71). Todas as famílias da elite de Avis tinham um batalhão de afilhados, alguns criados
como filhos e que chegaram mesmo à situação de herdeiros no caso de lavradores sem
descendentes. Tal sucedeu, entre outros, com Simão Teles Varela e seus dois irmãos:
nenhum teve filhos e foram os afilhados que acabaram por herdar. O maior beneficiado
neste caso foi o Dr. Marcelino das Neves, cujo padrinho era rendeiro da herdade de
Camões e um autêntico cacique local; pagou-lhe os estudos em Coimbra e até
convidava os seus professores para caçadas nas suas propriedades, pois segundo as más
línguas, ele era um aluno muito fraco e assim o padrinho esperava conseguir que ele
passasse de ano.

4.3.2 – Caridade. A relação das elites com as classes mais desfavorecidas


passava igualmente pela caridade, encarada como uma obrigação social, mas
desempenhada com objectivos condicentes com a tradição religiosa que regia a
mentalidade da época. José Cutileiro resume este tema do seguinte modo “A esmola
constituía parte do sistema de relações sociais (…) tinha sobretudo um carácter local e
privado: constituía um empréstimo a Deus e servia de reparação por pecados cometidos
neste mundo; além disso, contribuía simultaneamente para afastar o perigo da agitação
social. Era ainda um meio de assegurar prestígio social e status” (Cutileiro, 1977: 92-
93). No capítulo 2 já falei sobre a colocação de trabalhadores nas herdades em períodos
de desemprego, forçada pelo Estado Novo através dos seus organismos corporativos
locais, a qual não foi bem recebida pelos lavradores. Isto condiz perfeitamente com o tal
“carácter local e privado” da esmola, a qual obrigava a sentimentos de gratidão por
parte dos recipientes e deixava os benfeitores com algum crédito no outro mundo,
enquanto o pagamento de salários por imposição de outrem era visto antes como uma
ingerência nas suas actividades económicas e profissionais.

A já referida descendente de José Valentim Varela (sénior), também fez questão


de salientar a generosidade deste seu avô que "saía diariamente a cavalo para visitar as
propriedades. Levava no bolso um saco de couro com as libras, geralmente dinheiro da
venda de uns porcos na feira, e ia dando esmolas", em contraste com o seu outro avô,
José Lopes Coelho, considerado muito sovina. Já foi referida a tendência desta família
Lopes para, nas palavras da mesma senhora, “aforralhar dinheiro nos cofres”. Conta-se
até uma história, por uns dita como reveladora de grande sentido de humor; por outros
como crítica dos sentimentos mesquinhos que tinham algumas das pessoas mais ricas de
Avis: passeavam-se um dia em Lisboa, na Av. da Liberdade, o casal José Lopes Coelho
e sua mulher, D. Rosa de Viterbo Lopes Varela, vestidos à lavradores, portanto de
forma rústica, pois não gastavam dinheiro em roupas mais “urbanas”, quando passou
por eles uma mendiga que lhes pediu esmola. Responderam os dois muito sérios que
não podiam, pois andavam ao mesmo! Esta história pelos vistos não os envergonhou,
pois o senhor contou-a no Clube como se de uma grande piada se tratasse e por toda a
vila ela ficou conhecida. De qualquer modo, mesmo se em Lisboa não dessem esmolas,
em Avis lá teriam os “seus pobres”…

De qualquer modo esta actividade era vista como um atributo e uma função mais
feminina; juntamente com a dedicação à família, o cuidado com os pobrezinhos era “o
papel mais nobre e mais sacrossanto que uma mulher pode desempenhar”. A revista
Álbum Alentejano, de 1933, ao falar duma senhora da família Abreu Callado, descreve
todos os atributos e qualidades que a moral da época considerava exemplares e a serem
seguidas por todas as senhoras: "Senhora D. Rosa Madalena. autêntico simbolo da
mulher alentejana. Ela vive para aninhar os seus irmãos; ela vive tambem para poder
enxugar as lagrimas da miseria. Ninguém bate ao ferrolho da sua porta que não seja
atendido. É o autentico tipo da mulher portuguesa, trabalhadora e carinhosa, pensando
mais nas outras pessoas que em si propria. (...) O papel que vimos desempenhar por esta
santa mulher, é o papel mais nobre mais sacrossanto que uma mulher pode
desempenhar. Deus lhe dê ainda muitos anos de vida para poder continuar a ser o anjo
protector não só do lar Abreu Caládo mas de toda a gente, de todos os pobresinhos
residentes na sorridente aldeia alentejana".

A caridade era algo em que as senhoras se esmeravam também como afirmação


social; aliás, era uma das únicas actividades aceitáveis para uma senhora e das poucas
que lhe permitiam sair de casa. Em Avis, as elites femininas eram de facto muito activas
a este respeito, sobretudo a geração que casou nos anos 20 deste século: foram já
educadas nas vilas, portanto estavam perfeitamente integradas na vivência urbana que já
não as obrigava às funções de mulheres de lavradores. Praticamente todas as senhoras
da elite de Avis participavam activamente em obras de caridade, lideradas pela D.
Cecília de Figueiredo, a mais velha e mais activa do grupo, fundadora da Liga de
Beneficência no final dos anos 20, em nome da qual se organizaram durante muitos
anos as obras sociais do concelho. Estas incluíam a organização de festas, quermesses
(onde se vendiam os bordados e outros trabalhos de lavoures femininos que ocupavam
estas senhoras durante meses), peditórios e peças de teatro, nas quais elas próprias
participavam como atrizes. Esta Liga não era uma obra religiosa; a própria fundadora
estava desligada da Igreja Católica, mas respondeu a necessidades sociais urgentes, por
sua própria iniciativa e em colaboração com a instituição tradicionalmente vocacionada
para tal: a Misericórdia.

Cecília de Figueiredo não era católica praticante e nem teve um funeral católico.
Isto não impediu, no entanto, que recebesse homenagens públicas significativas. Notícia
da morte de Cecília de Figueiredo, publicada no jornal Brados do Alentejo, Estremoz,
28/5/1950, pp. 5 - 6: “Avis. Falecimento - No passado dia 19, faleceu nesta vila a srª D
Cecília de Figueiredo Pais, filha do saudoso e grande amigo de Avis sr. Joaquim
Coutinho de Figueiredo. De seu pai, herdou as qualidades de carácter, dinamismo,
iniciativa e perseverança e bem assim acendrado amor à sua Terra que sempre traduziu
em ideias e críticas construtivas para a vila. Preocupada sempre com a sorte dos
desvalidos, organizou, com outras Senhoras desta terra, a Liga de Beneficência de Avis,
da qual foi a primeira presidente”. Apesar de não haver registos escritos sobre as
actividades desta Liga, foi possível encontrar informações em fontes secundárias, como
na revista Expansão Portuguesa de 1935. Entre as actividades da Liga, as fontes orais
salientam a encenação e representação de várias peças humorísticas no teatro de Avis.
Até então o teatro era considerado imoral e a profissão de atriz indigna para uma
senhora. A moral rural vigente chamava, por princípio, prostitutas às actrizes. As
senhoras de Avis, a pretexto das obras de caridade da Liga de Beneficência, reabilitaram
o teatro na vila. As peças representadas eram baseadas em revistas da moda, incluindo
"O Solar dos Barrigas". Os anos 30 constituíram assim uma época áurea para estas
senhoras, durante a qual puderam apresentar em público todos os seus dotes aprendidos
com as mestras: canto, piano, poesia, etc. A assistência incluía sempre os respectivos
pais, maridos e outros parentes que assim controlavam a situação que nunca foi do seu
inteiro agrado: a exposição pública das suas mulheres perturbava-os. Ficou famosa a
história local de uma das senhoras, vestida de amarelo canário, a cantar na primeira
parte duma peça; o marido, sentado na plateia ouviu um comentário dum vendedor
ambulante (portanto uma pessoa de fora, que não conhecia a sociedade local) sobre a
beleza da senhora, as suas qualidades físicas e como cantora; após o intervalo a senhora
já não subiu ao palco e foi proibida de participar em qualquer outra peça teatral.

Exactamente na época da fundação da Liga de Beneficência deixou de haver


padres em todo o concelho de Avis, assumindo as senhoras da elite responsabilidades
normalmente associadas às paróquias e à Igreja. Também este tipo de caridade não se
incluía no carácter privado descrito por Cutileiro. Neste caso era mais um “meio de
assegurar prestígio social e status” por parte do sector feminino das elites, o qual estava
muito mais limitado nas suas possibilidades de manifestações da diferença. Assim, não
só podiam realizar um tipo de trabalho que as mantinha ocupadas, pois, segundo a
moral burguesa, a ociosidade era a “mãe de todos os vícios” e algo a evitar fortemente
(Santos, 1983: 28), como desenvolviam a sociabilidade possível para a sua condição.

4.3.3 - Homenagens públicas aos membros da elite. Ainda


actualmente, por todo o concelho, mesmo depois de várias mudanças de regime e outras
tantas revoluções (talvez por esquecimento das elites actuais), abundam as referências
às personalidades que mais se destacaram no contexto social e político dos finais do
século XIX e primeiras décadas do século XX. Como forma de agradecimento pelas
suas boas obras, as autoridades promoveram vários tipos de homenagens públicas, cuja
maior expressão se encontra nos nomes das ruas. Praticamente todas as famílias da elite
têm uma rua com o nome de um dos seus membros. É claro que as escolhas eram feitas
pelos respectivos pares, por isso esta forma de homenagem pública era promovida
dentro das próprias elites.

O mesmo se passava, por exemplo, com a atribuição do nome do Dr. Manuel


Lopes Varela ao asilo da Santa Casa da Misericórdia, cuja direcção era composta pelas
mesmas elites sociais, económicas e políticas, que assim promoviam a imagem de um
dos seus membros mais destacados.

Tal como os membros da nobreza e do clero que deixavam bens em testamento


às igrejas para que em seu nome fossem rezadas missas por vários anos, também as
elites de Avis agiam de forma a perpetuar o seu bom nome para a posteridade. Não
encontrei referência a casos de doações à igreja nos testamentos ou inventários por
morte. Mas uma placa na Igreja Matriz de Avis refere a oferta do respectivo relógio para
perpetuar o nome do filho dum lavrador falecido jovem.
A obra social dos irmãos Abreu Callado na freguesia de Benavila pode também
ser enquadrada neste tipo de vontade de perpetuar a presença no espaço social e no
imaginário local das elites depois da morte. Em 1943 constituíram um asilo em nome da
mãe, D. Maria Magdalena Godinho d’Abreu. Uma vez que nenhum dos 4 irmãos casou
ou teve filhos, todas as suas terras e bens foram deixados em testamento aos
trabalhadores da sua casa agrícola sob a forma de uma Fundação. Como forma de
agradecimento, após a sua morte o Estado concedeu-lhes comendas e a população da
freguesia colocou bustos dos seus benfeitores nas ruas da vila.

O procedimento desta família sem herdeiros está também ligado à vontade,


sempre presente entre os lavradores da região, de não alienarem o património fundiário
que tanto lhes tinha custado, e aos seus antepassados, a acumular. Enquanto as famílias
com herdeiros faziam questão de deixar as melhores terras aos filhos que mais aptidão
revelavam para a lavoura (ficando os restantes com as chamadas tornas sob a forma de
outros bens), estas famílias sem herdeiros (e houve vários outros casos semelhantes em
concelhos vizinhos, como por exemplo a família Marques Ratão em Galveias, Ponte de
Sor) temiam que os parentes afastados que viessem a herdar o património rapidamente o
dividissem e vendessem.

4.3.4 - A cidade dos mortos. Os cemitérios são o espelho da cidade dos vivos e
como tal representam na morte o mesmo tipo de diferenças sociais que as elites
manifestavam em vida. De facto, a maioria das famílias da elite do concelho de Avis
destaca-se nos cemitérios das respectivas freguesias tanto pela localização das campas,
como pela posse de jazigos mais ou menos ostensivos, consoante a mentalidade e
relação com o dinheiro manifestada em vida (ver fotografias nº 3 e 4). O comerciante
João Marques Serrão, por exemplo, tem um dos jazigos maiores do cemitério de Avis,
na “avenida” principal e ao lado dos das famílias mais importantes, espelho da sua
afirmação social, enquanto o seu sogro, José Lopes Coelho, um dos lavradores mais
ricos e presidente da câmara em 1887, tem uma campa rasa rodeada por uma corrente.
Tal como os Lopes, também os Abreu Callado tinham fama de muito “agarrados ao
dinheiro”: estão enterrados no cemitério de Benavila, em campas altas localizadas na
zona mais destacada, isto é, logo à entrada em frente da capela, mas não construíram
jazigo.

Ao entrar nos vários cemitérios do concelho, mesmo o visitante menos ligado à


realidade social local fica imediatamente a saber quais as famílias que dominavam o
poder económico, pelo menos até meados deste século. Nos anos mais recentes parece
não ter havido uma preocupação tão grande em construir jazigos e deixar marcas duma
presença forte a nível local. Isto está relacionado com a saída de algumas famílias e a
criação de laços mais fortes com centros urbanos exteriores ao concelho, cujos
cemitérios passaram a utilizar. O facto de algumas famílias continuarem a deixar as suas
marcas e a enterrar os seus mortos em Avis, mesmo residindo fora, acentua vínculos
com as suas raízes familiares e permite-lhes ocupar o espaço local com a mesma
representatividade que os seus antepassados ocupavam em vida.

4.3.5 – Religiosidade. Entre as elites de Avis os níveis de religiosidade eram


como os do resto da população do concelho: muito baixos. Aliás, isto condiz com a
região em que se integra: “A fraca implantação da Igreja na região sul despertou, desde
cedo, a atenção da hierarquia (…) O peso da Igreja deverá ‘medir-se’ pelas práticas
efectivas dos seus crentes”. Ora estas eram desde os finais do século XIX muito
reduzidas. Maria Inácia Rezola estudou os graus de irreligiosidade em Portugal no
Estado Novo: em 1940, cerca de 5% dos portugueses declararam não ter religião. O
concelho de Avis, num cartograma dos “Declarados sem religião” nesse mesmo ano
tinha entre 10 a 20%. O distrito de Portalegre, no qual Avis se inclui, tinha 10,4%, o
dobro da média nacional e a quarta a seguir a Setúbal, Beja e Évora. Sobre a
religiosidade dos portugueses em geral, a autora afirma: “este tipo de prática estava
condicionada por outros factores, como, por exemplo, nesta época (1932 a 1953) o
temor de represálias a nível de emprego, a aceitação social, a tradição, etc., e não um
alto grau de religiosidade das populações”. Em Avis estes problemas não se punham,
uma vez que as elites, que era quem fornecia os empregos, também não eram muito
religiosas. Ainda sobre as práticas religiosas, em 1932-33 a média nacional de
casamentos não católicos em relação ao total dos casamentos celebrados legalmente era
de 27,3%. Em 1942-43 era de 15,7%. A percentagem de casamentos civis em Avis em
1954 estava no grupo dos 10 aos 24,5%, portanto dentro da média nacional, o que só
mostra que a nível de casamento religioso se mantinham as práticas tradicionais, talvez
por uma questão de estética cerimonial e folclore. Sobre a prática dominical em 1956,
esta autora apresenta um cartograma com quatro níveis: “unânime”, “forte maioria”,
“fraca” e “muito fraca”. Avis está no escalão de “muito fraca” (Rezola, 1992: 224-252).

A “irreligiosidade” aumentou consideravelmente depois da implantação da


República, isto é: manifestou-se de forma muito mais acentuada. No período da
Monarquia os párocos ainda eram pessoas influentes a nível local :"Muita da vida social
local passa pela sua intervenção, nomeadamente em todos os aspectos fulcrais do ciclo
da vida de cada um: nascimento (através do baptismo), o casamento, a morte" (Sobral,
1993: 391). No entanto, a religiosidade mede-se por outras coordenadas, como a prática
dominical, a frequência da catequese e o grau de cultura religiosa. No concelho de Avis
isto foi muito difícil de medir por falta de fontes, como os registos paroquiais; contudo
as fontes orais foram unânimes em afirmar o afastamento (sobretudo dos homens) da
igreja no início do século XX (se é que alguma vez tinham estado muito ligados às
práticas religiosas), passando a religião a ser considerada “coisa de mulheres”.
"Ninguém se definia mais como um ‘cristão’, a não ser as personagens populares dos
romances e comédias. Deixara de se esperar que as crianças mantivessem a fé. Maria
Amália (Vaz de Carvalho) recomendava que fossem levadas à igreja apenas para que se
habituassem a estar quietas, de modo que quando perdessem a fé não perdessem ao
mesmo tempo o ‘respeito’. (...) O afastamento da religião não correspondia a um mundo
laico, mas a uma espécie de divisão do trabalho espiritual (...) ‘As mulheres precisam
tanto da religião como nós da ciência’. A religião era pouca coisa na vida do cavalheiro
da classe média. Pertencia às criadas de servir e às mulheres em geral (...) Constituía um
sentimento feminino e servil" (Ramos, 1994: 312).

Enquanto as famílias dos lavradores viviam nos montes e se deslocavam às vilas


para participar na missa dominical, a igreja ainda servia como local de representação
social e pretexto para reuniões políticas. A mudança de residência acarretou também a
mudança dos hábitos de sociabilidade: os senhores passaram a reunir-se no clube e,
mesmo que frequentassem as práticas religiosas em ocasiões especiais, como festas,
faziam-no sempre separados das respectivas mulheres. A diferenciação sexual passava
pela religião de modo muito acentuado e ainda hoje é visível o facto das senhoras se
instalarem nos bancos da frente, participando activamente nos actos litúrgicos, enquanto
os poucos senhores que vão ficarem atrás, muito perto da porta da igreja. Também nas
procissões esta diferença se fazia sentir: a mais importante manifestação religiosa do
concelho era (e continua a ser) a Procissão do Senhor dos Passos, realizada pelas ruas
da vila de Avis no domingo antes da Páscoa. Esta era o cenário perfeito para a
representação do lugar de cada grupo na sociedade local: cada espaço ocupado
correspondia à respectiva posição social e também aqui existia uma clara distinção
sexual, com as senhoras nos lugares de maior destaque logo atrás do padre e os senhores
na cauda da procissão. Verificou-se, assim, sobretudo a partir da República, uma
acentuada feminização da religião. Por uma questão de idade ou por motivos de doença,
algumas senhoras assistiam à procissão da janela de casa, onde expunham as melhores
colchas do enxoval, e assim coloriam a vila com os seus bordados e rendas.

Quanto aos referidos rituais de passagem realizados na igreja, nos quais o padre
tinha uma intervenção forte, por uma questão de tradição e de imposição feminina na
maioria das famílias, as crianças continuaram a ser baptizadas e grande parte dos
casamentos continuaram a ser católicos. Aliás, isto fazia parte da apresentação formal
da criança e do novo casal à sociedade e servia como representação social. As famílias
com capelas nos respectivos montes faziam questão de encenar uma festa condicente
com o seu estatuto social, como foi o caso do lavrador José Pais Teles que no início do
século XIX baptizou alguns dos seus 22 filhos na sua Quinta de Sant’Ana. Era nos
funerais que os menos religiosos se manifestavam: vários membros da elite de Avis
foram enterrados com funerais não religiosos, alguns até com a presença de padres seus
amigos que acompanharam o cortejo na cauda.

Foi o caso dos funerais de Eurico Barreto de Figueiredo Pais e de sua mãe
Cecília de Figueiredo. Com a República instalou-se também um certo anti-clericalismo.
O testamento de Simão Teles Varela (escrito em 2/9/1940, m. 1942) é um claro
exemplo disso: "Quanto ao espiritual, confesso-me religioso, crente em Deus, na
Virgem Santissima e nos Santos, mas, porque da classe eclesiastica só tenho recebido
dissabores e grandes desgostos, por parte de quem tinha o dever de imitar Nosso Senhor
Jesus Cristo, mas isto não fazem, antes usam indignamente as sagrádas véstes,
pecaminosamente ocupando os elevados lugares de pastores de álmas, quero que o meu
enterro seja cívil e o meu corpo seja depositado no meu jazigo de familia, onde tambem
desejo que durma o sôno eterno a minha mulhér. Á parte o acto relegioso, que já disse
dispensár, desejo que o meu funeral revista a imponencia devida ás pessoas da minha
condição e bens." (sic). Temos aqui um exemplo de irreligiosidade e outro de anti-
clericalismo. A importância destes dois factores por si só merecia um desenvolvimento
que não foi possível no âmbito das fontes existentes.

O afastamento da Igreja esteve também directamente relacionado com motivos


políticos: por exemplo, grande parte das famílias Lopes e Varela mantiveram-se
monárquicos e com uma religiosidade forte, enquanto as famílias Pais e Cunha e Sá
eram republicanas e viveram sempre mais afastadas da Igreja.
A ajudar a esta situação, durante muitos anos, sobretudo desde a morte do
Cónego José Ricardo Freire d’Andrade em 1918, não houve pároco em Avis, nem nas
restante freguesias: eram padres de fora que lá se deslocavam para oficiar a missa
dominical e outras cerimónias. Assim, esta figura perdeu a sua importância social e
política local que até então tinha sido considerável.

4.3.6 - Vestuário e aspecto exterior. Em todas as formas de


representação social atrás referidas, a aparência exterior das personagens em causa era
fundamental. Tal como escreveu Bourdieu, o vestuário, as habitações e as formas de
tratamento respeitoso são símbolos do poder da classe dominante, tal como o ceptro
para os reis, e o modo como as elites se apresentavam em público e mesmo na
intimidade constituía um “capital simbólico objectivado” (Bourdieu, 1989: 12-15) que
marcava claramente o seu lugar na sociedade e as distinguia dos restantes grupos com
uma certeza comparável aos tempos em que ainda existiam leis que regulavam o
vestuário das diferentes classes sociais. Nos finais do século XIX e grande parte do
século XX, exceptuando algumas profissões (ou estado, no caso dos eclesiásticos que
usaram batina ou as freiras o hábito em alguns casos até aos nossos dias), já não se
encontra legislação sobre o vestuário que cada indivíduo tinha o direito de usar. Mas o
poder económico e o ambiente sócio-cultural pesavam fortemente sobre o tipo de roupa
e acessório que cada grupo exibia.

Entre as elites de Avis, a escolha do vestuário estava ligada sobretudo à


profissão e às origens dos protagonistas: enquanto as senhoras se esforçavam por seguir
a moda, de preferência importada das capitais europeias (principalmente as que residiam
nos centros urbanos), os senhores usavam roupas que os distinguiam uns dos outros
consoante a actividade exercida. Os médicos e bacharéis, comerciantes e farmacêuticos
exibiam um vestuário que seguia, melhor ou pior, as tendências do vestuário urbano
masculino, com a respectiva sobriedade então desejada (ver fotografia nº 6).

Enquanto isso, os seus parentes lavradores vestiam-se de forma muito rústica:


não só as idas diárias ao campo os obrigava a um vestuário muito mais funcional, que
incluía o necessário aquecimento para os invernos frios e chuvosos e nada melhor que o
capote ou a samarra, os safões, as botas, etc., como no verão usavam a jaqueta, o chapéu
e vários outros acessórios tradicionais dos lavradores alentejanos. Esta escolha não
estava apenas ligada a necessidades práticas: correspondia a uma afirmação do seu
estatuto social, do seu lugar de patrão da lavoura, uma forma de ser facilmente
reconhecido e identificado por todos os trabalhadores rurais e outros grupos sociais.
Alguns lavradores de Avis vestiram-se assim ainda durante grande parte do século XX,
o que também era revelador das suas tendências políticas conservadoras e da sua
mentalidade tradicionalista. Chegaram até a vestir-se deste modo nas viagens à capital,
o que não deixava de criar situações caricatas. É claro que no dia de “tirar o retrato”, o
lavrador se apresentava com as melhores roupas (fotografia nº 5).

O vestuário era uma clara distinção social, cuja maior evidência se revelava no
facto de grande parte das crianças que frequentavam a escola primária de Avis ainda em
1941 andarem descalças o ano inteiro, incluindo no inverno, enquanto naturalmente os
filhos da elite tinham botas e sapatos. Esta situação foi salientada por diversas fontes
orais e é perfeitamente visível na fotografia nº 7 da turma da 3ª classe (masculina) nos
finais dos anos 30.

Também o grau de exposição ao sol acentuava a diferença social: até meados do


século XX as senhoras protegiam o mais possível a pele do sol, utilizando chapéus e
sombrinhas, luvas e espessas camadas de pó-de-arroz que tornavam a pele mais clara e
disfarçavam quaisquer manchas ou sardas. Enquanto isso, as mulheres que trabalhavam
no campo durante todo o verão, apresentavam a pele da cara e das mãos bastante
crestada do sol, com altos níveis de envelhecimento precoce.

Nas ocasiões especiais, cerimónias religiosas, feiras ou festas, as elites


esmeravam-se no vestuário e respectivos adornos, desde jóias a chapéus, xailes, lenços,
plumas e peles. O sector feminino competia com os vestidos mais vistosos, os tecidos
mais caros, os bordados mais elaborados. Enquanto para as roupas do dia-a-dia usavam
os serviços das costureiras, chapeleiras e alfaiatas (para fazer os casacos) locais, assim
como os senhores usavam os serviços dos alfaiates, os vestidos de cerimónia das
senhoras das famílias mais ricas eram feitos por modistas de Lisboa, Porto ou Évora.
Estas modistas tinham sempre revistas (os chamados figurinos) com as últimas modas
de Paris, e nos seus ateliers conservavam bustos de cada uma das suas clientes, evitando
assim a repetição das provas. Praticamente toda a roupa interior era feita pelas próprias
senhoras ou pelas costureiras locais. Os enxovais das meninas incluíam roupas não só
para vestir, como todas as roupas de casa. A sua confecção e decoração, com bordados,
pintura e rendas, ocupava grande parte da sua infância e adolescência. Tinha depois a
obrigação de durar o resto da vida e ainda as peças mais significativas eram transmitidas
às filhas. Quanto maior e mais rico era este património, mais alta a posição da menina
na hierarquia económica e social local. Porém, depois do casamento, só muito
raramente as senhoras de Avis comprava adornos novos: mesmo entre as mais ricas,
geralmente só possuíam as jóias que herdavam ou lhes tinham sido oferecidas pelos
pais, pois os maridos/lavradores consideravam todos esses gastos supérfluos e não lhes
permitiam tais extravagâncias.

4.4 - Educação e Instrução

A possibilidade de acesso à instrução nos meios rurais esteve desde sempre


ligada à viabilidade económica de, primeiro dispensar os filhos do trabalho, depois de
os enviar para as escolas que eram escassas e geralmente afastadas dos locais de
residência. Este fenómeno era geral por todo o pais e, mesmo com os esforços dos
sucessivos regimes para expandir o sistema do ensino primário, sobretudo a partir da
República e com algum impulso nos primeiros anos do Estado Novo, só nos anos 80
deste século é que se assistiu à implantação de escolas de ensino preparatório e
secundário por quase todo o país, chegando-se actualmente ao cúmulo de haver escolas
com meia dúzia de alunos e outras que fecham por falta deles.

Nos finais do século XIX, o concelho de Avis só tinha escolas nas vilas
principais e durante alguns anos nem houve professor em Avis, como podemos ver no
anexo 6. Considerando que a maioria da população vivia em espaço rural, as
possibilidades que as crianças tinham de frequentar a escola eram muito limitadas. Esta
situação afectava também as elites residentes nos montes, as quais, como já referi no
capítulo anterior, contratavam professores para ensinarem os filhos em casa, mesmo nos
casos em que os próprios lavradores nem sabiam ler ou escrever. Para prosseguirem os
estudos, tinham de ir frequentar os liceus de Portalegre, Évora ou Lisboa, não sendo
muito comum irem para colégios internos, antes para residências de estudantes,
enquanto os pais ficavam nos montes ou vilas.

"Até 1895, o ensino secundário tal como o conhecemos hoje não existiu em
Portugal. O que havia era um sistema de exames públicos sobre certas matérias, dos
quais dependia o acesso às escolas superiores.(...) A maioria aprendia em casa ou em
colégios particulares. A frequência das lições nos liceus do Estado reduzia-se àqueles
que não tinham posses para as saberem de outra maneira" (Ramos, 1994: 309). Sobre o
ensino em casa, era frequente a contratação de mestres para ensinarem os filhos e os
prepararem para os exames liceais; no caso do Dr. Manuel Lopes Varela, porém, a sua
filha salientou que foi ele que fez questão de ensinar as lições aos seus filhos e
sobrinhos em casa. Isto porque tinha estudado e sabia algumas matérias, também porque
não gostava muito da lavoura e tinha muito tempo livre. Estas práticas também
cumpriam as regras morais vigentes na época e ensinadas pelos materiais de civilidade:
“A educação dos filhos aparece como o grande dever e o grande direito dos pais,
embora com maior destaque para o pai – ‘Depois dos primeiros anos da criação que
compete às mães, os pais devem não só dar aos filhos o alimento físico mas o moral,
que é a educação; porque um pai deve ser para a sua família uma segunda
Providência’”. Os manuais de civilidade não se preocupavam muito com a instrução,
apenas davam as regras do ensino doméstico: “recomenda-se aos alunos o maior
respeito pelo professor; aos pais compete ‘«reprimir toda a veleidade de revolta contra a
autoridade do professor’” (Santos, 1983: 26-27).

A família Carvalho, por exemplo, arrendou uma casa em Coimbra para os filhos
poderem estudar, enviando para lá uma tia solteira que tomava conta dos vários
sobrinhos. Já nos anos 50 deste século algumas famílias inteiras mudaram a sua
residência e actividade profissional para Lisboa com essa intenção. De qualquer modo
isto constituía um considerável investimento que de facto só as elites podiam pagar, o
que conferia à educação um “cariz classicizante e pouco utilitário" (Santos, 1983: 27).

Esta visão da instrução provocava alguma ambiguidade de sentimentos entre as


elites de Avis. Quase todas as famílias em estudo tiveram membros que tiraram cursos
superiores. Fontes orais relataram-me os comentários dos lavradores de Avis sobre o
facto de os filhos pretenderem avançar com os estudos: “vamos ter um doutor na
família!” e isto era motivo de grande orgulho e afirmação duma posição social de
relevo. Por outro lado, incentivavam a participação dos mesmos nos trabalhos da
lavoura, para a qual se considerava não serem necessários estudos, apenas muito
trabalho e seguir os exemplos dos pais. Em todos os casos houve sempre um filho que
nunca estudou e se dedicou por completo à lavoura, para grande satisfação dos pais que
assim viam garantida a continuidade da família nas propriedades, enquanto os que
saíam de casa corriam sempre o risco de não regressar. Além disso, o sentimento
comum entre alguns dos lavradores mais apegados às tradições e à ruralidade era que só
iam estudar para fora os que revelavam muito pouca aptidão para a lavoura.

A já referida Sra. D. Alzira Varela contou uma pequena história sobre o seu avô
José Valentim Varela e seu pai, o Dr. Manuel Lopes Varela: este último foi mandado
estudar para o liceu de Évora porque, em vez de fazer os trabalhos do campo, como
competia a toda a família, “andava a ler e a escrever debaixo das árvores e não tinha
grande queda para a lavoura”. Nos estudos também não se revelou grande aluno,
chegando mesmo a perder um ano; nessas férias de verão, passadas no monte da Quinta
do Pinheiro, onde a família vivia, o pai castigou-o, pondo-o a trabalhar no campo ao
lado dos empregados. Ele não gostou e empenhou-se a fundo nos estudos, acabando
rapidamente o liceu e depois a Faculdade de Medicina, pois achou que era o melhor
remédio para não ter de se dedicar à lavoura, na qual o seu irmão mais novo se revelou
exímio.

Nas primeiras gerações estudadas, as trajectórias universitárias dos filhos dos


lavradores de Avis tiveram de facto um carácter pouco utilitário, pois praticamente
todos voltaram às freguesias de origem, nas quais poucos exerceram (ou exerceram com
pouco empenho, pois tinham sempre os recursos da lavoura para se sustentarem) o seu
novo estatuto profissional, como já referi os casos do farmacêutico Joaquim Mendes
Lopes Coelho e do bacharel Cosme dos Campos Callado. Este último tinha o irmão a
administrar as propriedades da família, ocupando-se ele da parte financeira e
principalmente dedicando-se à política.

Entretanto, os mestres em casa, os estudos fora, os cursos universitários, tudo


isto era um exclusivo dos meninos. Sobretudo na vida dos montes, se alguma menina
tinha acesso à aprendizagem da leitura e da escrita era porque acompanhava os irmãos
nas lições com o professor (nos finais do século XIX encontrei algumas senhoras que
sabiam ler e escrever, mas também vi casos que não sabiam assinar o nome). A
mudança das famílias dos lavradores para as vilas e cidades veio alterar um pouco esta
situação: as filhas das melhores famílias passaram a frequentar a escola pública, onde
algumas conseguiram tirar a 4ª classe! Ao mesmo tempo continuavam a ter mestras em
casa, para lhes ensinar piano, francês, lavores (como já foi referido no capítulo 3) e
todos os atributos femininos que passaram a ser considerados indispensáveis no novo
estilo de vida burguês adoptado.

Tal como para os seus irmãos, também as meninas teriam de sair de casa e da
vila de residência se desejassem prosseguir os seus estudos. Isto era absolutamente
inaceitável, por maior confiança que se tivesse na instituição que as recebia. Além disso,
seria um esforço vão… Para quê um tal investimento? De qualquer modo nunca
precisariam de trabalhar…
Duas famílias apenas mandaram as suas filhas na segunda década deste século
para o liceu de Portalegre, a fim de prosseguirem estudos secundários, devidamente
alojadas na casa dum padre cujas irmãs se responsabilizavam pela saúde e pela moral
das meninas a seu cargo: a família Risques, descendentes dum farmacêutico e nessa
época com vários funcionários públicos, e uma senhora da família Varela que tinha
casado com um pequeno proprietário. Em ambos os casos se verificou o interesse em
que as filhas tivessem uma profissão que lhes permitisse sustentarem-se, uma vez que
não possuíam rendimentos da lavoura suficientes para se manterem ao nível das elites às
quais os seus antepassados tinham pertencido. Também uma senhora da família Pais, da
mesma idade das anteriores, tirou o curso de professora primária.

Aliás, este era uma das únicas profissões aceitáveis para uma menina naquela
época; como alternativa, um curso técnico que lhe permitisse exercer uma profissão
respeitável, como funcionária dos correios ou da administração pública e pouco mais.
Esta possibilidade estava vedada a todas as outras classes sociais. Dentro do sector
feminino das elites rurais, à luz da mentalidade actual, pode dizer-se que o grupo menos
favorecido economicamente era o mais privilegiado no acesso à cultura e à instrução.

A geração seguinte, já em meados do século, manteve a mesma atitude em


relação às senhoras. Entre as famílias de Avis, apenas uma menina tirou um curso
superior, enquanto todas as outras não passaram do ensino primário. No sector
masculino verificaram-se algumas mudanças significativas: os cursos perderam o
carácter pouco utilitário quando os filhos dos lavradores começaram a interessar-se por
cursos técnicos ligados à agricultura e pecuária, como o curso de Veterinária ou de
Regentes Agrícolas, tirado por vários membros das famílias da elite de Avis a partir dos
anos 40 - 50.

4.5 - Comportamentos sexualmente diferenciados

A partir do que foi demonstrado até aqui, é possível afirmar que os factores de
diferenciação social entre as elites e os restantes grupos eram tão significativos como as
diferenças de carácter sexual que regiam todos os comportamentos e atitudes públicas e
privadas dentro do próprio grupo das elites. E este ponto também distingue este grupo
do resto da população: as diferenças de comportamento das identidades sexuais eram
muito mais acentuadas nas elites que nos restantes grupos. Por exemplo, entre os
trabalhadores rurais (e alguns artesãos e até comerciantes), as mulheres trabalhavam
quase tanto como os homens, contribuindo para o orçamento doméstico por vezes mais
até que os maridos em épocas de desemprego, pois podiam mais facilmente fazer
serviços domésticos temporários. Isto permitia às trabalhadoras, se bem que nunca
completamente, um maior controlo sobre o próprio rendimento, ao qual a maioria das
senhoras estava vedada, pois, como já referi no capítulo anterior, o património familiar
das elites era indiscutivelmente administrado pelos maridos, mesmo que o da senhora
fosse maior.

Também no que diz respeito aos direitos perante o estado: se às mulheres estava
vedado o direito ao voto e à elegibilidade, também uma parte dos homens das classes
mais baixas não tinha rendimentos ou não sabia ler e escrever, o que os incapacitou para
votar até bastante tarde já neste século. A partir do Estado Novo, quando se verificou
uma “extensão parcial do voto aos analfabetos e às mulheres”, mesmo assim as senhoras
da elite continuaram em desvantagem em relação a muitas “domésticas”,
“estalajadeiras”, “comerciantes”, “professoras” e “Chefes da Estação dos Correios” (as
profissões referidas nos livros do recenseamento eleitoral desses anos), que tinham
direito a voto por terem o curso especial do ensino secundário ou um curso superior.
Entre as eleitoras encontradas, nem uma pertencia às famílias da elite fundiária.

Também no aspecto da condução de veículos a discriminação sexual era visível:


nunca uma senhora conduziria uma charrete para se deslocar da vila para outro lugar;
também nenhuma tirou a carta de condução de automóveis ou motos até pelo menos aos
anos 50. Quando nos anos 40 uma menina das melhores famílias de Avis começou a
andar de bicicleta com o irmão e de moto com o pai, foi um escândalo local…

Assim se pode ver que vários factores colocavam as senhoras das elites,
sobretudo das elites fundiárias e económicas (pois as das elites mais “urbanas” e dos
serviços tinham na maior parte dos casos acesso a outras vantagens como a instrução),
numa posição de maior inferioridade em relação aos homens que as dos outros grupos.

Depois de ter referido as diferenças entre os sexos no grupo das elites no ponto
de vista económico, profissional, educacional e no que diz respeito aos direitos perante
o estado, neste ponto pretendo analisar as diferenças manifestadas no âmbito da
sociabilidade e às atitudes perante a família e o lazer.

Já aflorei neste capítulo a separação dos espaços no interior das casas. Mas não
só na intimidade familiar as funções dos sexos estavam perfeitamente discriminadas; era
sobretudo em público que os homens e as mulheres tinham lugares determinados e
espaços reservados, dos quais a possibilidade de afastamento constituía uma excepção
nunca completamente aceite pela sociedade.

Como nota de pormenor, deixo aqui um apontamento sobre a mortalidade:


também nisto há e sempre houve grande distinção sexual e com causas muito
específicas. Já referi o facto de algumas esposas de lavradores morrerem cedo em
resultado de várias gravidezes e partos; em alguns casos os viúvos voltavam a casar,
tinham mais filhos e acabavam por deixar viúvas consideravelmente mais jovens que
eles. No entanto, a globalidade dos dados recolhidos nos inventários por morte
acentuam uma maior quantidade de viúvas em relação aos viúvos, independentemente
da época em causa. Assim, as elites estavam em consonância com a média geral da
população do concelho e do país (Machado, 1957). Na revista Expansão Portuguesa de
1935 pode ler-se que dentro da população total do concelho (7.880) há 122 viúvos e 260
viúvas, o que significa mais do dobro. Entre as elites de Avis, e tomando como base os
inventários por morte, analisei 47 casais, incluindo o cónego José Ricardo Freire
d’Andrade que vivia maritalmente com uma senhora de quem tinha um filho e que ficou
“viúva”. Neste universo considerado, os resultados da pesquisa foram os seguintes:
viúvos 13 (28%), viúvas 32 (68%), viúvos que casaram 2ª vez e deixaram viúvas 2
(4%). Esta fonte permitiu também verificar a incidência da mortalidade ao longo do
ano: só em Dezembro e Janeiro morreram 16 dos 48 inventariados, o que corresponde a
33,3% e aos meses de maior frio e chuva. Também morreram 9 (19%) nos meses mais
quentes de Julho e Agosto. De salientar a febre pneumónica que assolou o país em
1918, na qual morreram o referido Cónego e o lavrador e político Jerómino Lopes
Coelho, ambos em Outubro.

4.5.1 - As Senhoras e a casa. Tenho sempre falado em Senhoras quando


me refiro aos elementos femininos das elites; também Cutileiro salienta este facto na
sua obra: "As esposas ricas não são mulheres, mas sim senhoras" (Cutileiro, 1977: 142).
Se todos os elementos de distinção social não bastassem, esta designação colocava
imediatamente uma barreira entre os grupos. O mesmo acontecia com as formas de
tratamento: enquanto as senhoras da elite eram tratadas por Senhora Dona Fulana,
todas as mulheres casadas eram apenas Senhora Fulana. No entanto, a proximidade
física e emocional era por vezes grande, principalmente entre as senhoras e as suas
criadas, como já se viu na questão dos padrinhos e afilhados. Além de uma ou duas
criadas internas, as casas das elites de Avis tinham sempre várias criadas externas, como
a lavadeira, a cozinheira, uma mais nova "para os recados", que incluíam ir às compras,
e que podia também chamar-se a "criada de fora", etc. Geralmente ainda havia um
criado para serviços vários, como tratar dos animais e dos carros, e outros que
trabalhavam sazonalmente, como por exemplo na altura das caianças.

Uma vez que raramente uma senhora saía à rua, as criadas desempenhavam uma
função muito importante de ligação com o mundo exterior: “Prestam-lhe informações
pormenorizadas a respeito (de outras) criadas (…), mantêm-nas ao corrente dos
mexericos da aldeia…” (Cutileiro, 1977: 139). De facto, nas vilas a frequência dos
espaços públicos estava limitada a ocasiões muito específicas, como a ida à missa ou a
festas e feiras, às quais se deslocavam sempre acompanhadas e devidamente cobertas
com casaco (mesmo no verão), chapéu, luvas e vários outros acessórios indispensáveis.
A sociabilidade restringia-se geralmente à família mais próxima e a mais duas ou três
famílias dum círculo muito restrito, resultante aliás do facto do número das famílias da
elite ser também muito reduzido.

O santo reduto do lar ocupava às senhoras a maior parte do seu tempo. O pouco
que sobrava era passado em visitas. “As visitas, tidas como ‘a pedra de toque da gente
da boa sociedade’, são regulamentadas por um cerimonial rigoroso, no qual, em última
análise, estão implicados imperativos sociais determinantes de comportamentos que
vemos funcionar como signos de distinção, para lá dos aspectos propriamente lúdicos
que lhe possam estar ligados” (Santos, 1983: 43). Tal como vimos, a caridade servia
também de pretexto para a sociabilidade das senhoras de Avis.

4.5.2 - Os Senhores e o clube. Enquanto as senhoras ficavam em casa,


os senhores saíam diariamente para as suas actividades profissionais e políticas. Isto não
significava, porém, que andassem pela rua como o resto da população: a segregação
social era visível nos espaços públicos e nunca um membro da elite frequentava um café
ou taberna “misturado” com as outras classes.

Como já vimos, as elites participavam activamente em todos os órgãos do poder


local, nos quais encontramos sempre pelo menos um membro de cada família (ver
anexos); tal como as senhoras com a caridade, também os homens frequentavam
reuniões políticas preocupados não apenas com as questões do poder, mas também
como locais de sociabilidade.
Os locais da sociabilidade formal eram exclusivamente masculinos e vêm
descritos em fontes como os Anuários Comerciais (resumo):

1901: Rúbrica Theatro e sociedades de recreio:

Teatro: presidente Luís António da Silva e Castro

Gremio Avizense: presidente Jeronymo Lopes Coelho; secretário Manoel


Maximiano d'Oliveira

Philarmonica 1º de Dezembro: presidente Dr. Manuel Lopes Varela; suplente


Luís António da Silva e Castro; secretário Jeronymo Lopes Coelho; tesoureiro J. N.
Lobato Júnior (que também é tesoureiro da CMA); regente José Joaquim Pereira de
Carvalho

1908: apenas mencionam as Sociedades de Recreio existentes, mas já sem


nomearem os órgãos directivos: Grémio Avizense, Teatro e Sociedade dos Artistas
Avizense

1917: - Avis: Grémio Avizense, Teatro, Sociedade dos Artistas Avizense

- Ervedal: Philarmonica Independente Ervadalense, Sociedade Recreativa

1937: Club Avisense, o chamado “Clube dos Ricos”, com sede na Rua Serpa
Pinto; Sociedade Artística Avisense, com sede na Rua da Misericórdia, para os artistas e
artesãos (todos os que tivessem uma profissão manual espacializada, o que não incluía
os trabalhadores rurais).

Em 1944 fundou-se o Clube de Futebol os Avizenses, frequentado por todas as


classes, principalmente os jovens que queriam fazer desporto.

Como podemos ver logo em 1901, as três sociedades de recreio referidas tinham
como presidentes membros das elites fundiárias e políticas; aliás, em quase todos os
organismos locais os nomes dos presidentes são sempre os mesmos… A Philarmonica
revela o interesse das elites desta época pelas actividades musicais, estimuladas pelo seu
presidente, um médico, e com a participação activa de vários membros da família Pais,
alguns dos quais com o Curso do Conservatório de Lisboa.

Pelo secretismo próprio da organização, não encontrei nas fontes qualquer


referência a alguma loja maçónica. Contudo várias fontes secundárias e algumas orais
permitiram-me suspeitar que os membros das elites mais “urbanas” dos finais do século
XIX pertenciam a esta associação. Os senhores em questão tinham fortes ligações ao
Partido Republicano e os seus representantes mais significativos foram nomeados em
1910 para a Comissão Administrativa da Câmara Municipal que substituíu a câmara
eleita anteriormente (Marques, 1978: 583-584). Eram sobretudo pessoas com maiores
ligações à capital e a outros centros urbanos, trabalhavam nos serviços e sempre se
mantiveram afastados da religião oficial (exemplo da família Pais). As elites fundiárias
eram mais conservadoras, monárquicas e católicas, e não participavam nesta
organização.

A partir do Estado Novo, os espaços de sociabilidade passaram a corresponder


exactamente aos modelos também apresentados por José Manuel Sobral para uma
freguesia da Beira e por José Cutileiro para uma freguesia alentejana (Sobral, 1993:
171-175; Cutileiro, 1977: 258). Dos três clubes apresentados para os três grupos sociais
mais significativos (incluindo o clube desportivo criado mais tarde), as elites reuniam-se
no “Clube dos Ricos”, onde geralmente passavam o serão em conversas, jogos de cartas
ou bilhar, e onde tinham a companhia e eram servidos por uma senhora que exercia
funções diversas…

Esta questão era também um factor de diferenciação social fortíssimo na


sociedade portuguesa e que naturalmente tinha uma forte expressão na sociedade
avisense: os homens tinham uma permissão implícita para frequentarem prostitutas;
casados ou solteiros, era algo que não era exactamente censurado, apesar de se fazer
discretamente. Vários casos houve de senhores que “montaram casa” às amantes,
enquanto trair o marido era algo que as mulheres nem tinham o direito de pensar (logo
após a República uma senhora teve “um caso” com um médico; não foi perdoada pelo
marido e saiu do concelho, onde nunca mais voltou). Por outro lado, as elites de Avis
estabeleceram uma certa tradição de nunca reconhecer os filhos ilegítimos que
porventura tivessem (apenas num caso foi estabelecida uma paternidade em tribunal,
depois do senhor ter morrido e a criança já ser adulta, e com forte resistência de toda a
família envolvida). Esta atitude estava ligada ao já referido objectivo de manter o
património familiar intacto, mas também ao alto valor que as elites atribuíam à família:
a esposa era sagrada (daí a discrição nessas actividades) e os filhos legítimos eram os
únicos com direito ao nome e ao património.

4.6 - Sociabilidades
Tal como já foi salientado, e apesar da existência de alguns locais e formas de
sociabilidade exteriores, a Família, “núcleo primeiro de toda a sociedade civil, é um
espaço de reprodução social onde coexistem gerações, se inculcam valores e modelam
comportamentos” (Fonseca, 1996). Assim, como base de toda a sociedade, a família
também era o centro da maioria das actividades sociais e lúdicas a que as elites de Avis
se dedicavam. Aqui estava incluído o conceito de família alargada e, como já vimos,
grande parte das figuras mais destacadas das elites tinha de facto relações de parentesco,
algumas mais próximas que outras. Para se partilhar dos espaços de sociabiliade das
elites era necessário pertencer às famílias em questão ou pelo menos ter afinidades
políticas ou económicas que mais tarde ou mais cedo se consolidavam em novas
relações de parentesco, nem que fosse apenas o espiritual.

Na medida do possível, as elites de Avis tentavam copiar as modas que lhes


vinham dos grandes centros através das revistas e de outros parcos meios de
comunicação existentes na época em causa. “A vida social das elites eborenses de
oitocentos desdobrava-se numa multiplicidade de espaços e práticas de sociabilidade,
originando estilos de vida bastante similares aos de outras elites europeias da época. As
soirées em casas particulares, as reuniões e bailes no club, as festas de carnaval, os
piqueniques e as caçadas, mas também as digressões às praias e termas mais famosas do
país, assim como as viagens ao estrangeiro, constituíam eventos que marcavam o
calendário mundano das famílias” (Fonseca, 1996). Em Avis estas práticas chegaram
com algum atraso às elites, as quais começaram a utilizá-las só nos finais do século XIX
quando passaram a ter um estilo de vida mais urbano. As famílias residentes nos montes
e que nunca se mudaram para as vilas do concelho, tinham maiores ligações à capital ou
a outros centros urbanos; não participavam na maior parte da vida social de Avis e
desempenhavam estas actividades fora do concelho, como por exemplo os Cunha e Sá,
os Camões, etc.

No entanto, as principais formas de sociabilidade das elites continuaram durante


grande parte do século XX a ser as que tradicionalmente eram praticadas nos espaços
rurais e que constituíam o ponto alto da vida social do concelho: as festas religiosas e as
feiras.

4.6.1 – Alimentação. O principal espaço de sociabilidade das famílias da


elite era a mesa das refeições, onde todos os elementos obrigatoriamente se reuniam às
horas marcadas. A sala-de-jantar ou mesmo a salinha mais pequena onde algumas
famílias comiam no dia-a-dia, era o local por excelência onde se representava a
hierarquia familiar e se punham em prática, por conversas e atitudes, os tais valores e
comportamentos a inculcar e a modelar pelas famílias.

Pela sua importância na vida familiar, o planeamento e confecção das refeições


ocupavam a maior parte das actividades diárias das senhoras; mas também eram algo a
que os chefes de família atribuíam grande valor simbólico, sendo raras as vezes que as
tomavam fora de casa. Mesmo os lavradores que iam para o campo, por mais tarde que
chegassem, eram esperados pelo resto da família, pois a sua presença era indispensável
para o início da refeição.

Já referi que algumas das famílias da elite de Avis se caracterizavam pela sua
dificuldade em gastar dinheiro e pela frugalidade em vários aspectos da sua vida diária,
vestuário, etc. Na questão da alimentação, pelo contrário, estas mesmas famílias
caracterizavam-se pela enorme abundância e riqueza dos pratos.

A base da alimentação dos alentejanos, como é sabido e permanece até aos


nossos dias, é o pão. Cada casa tinha enormes arcas para armazenar a farinha,
proveniente de cereais da própria lavoura, a qual era amassada pelas criadas. Nos
montes, o pão era cozido nos próprios fornos; nas vilas era levado aos fornos dos
forneiros para ser cozido cerca de uma vez por semana. Esta situação durou até meados
do século XX: nos anos 40 ainda não havia padeiros em Avis.

O pão estava integrado em todas as refeições e em quase todos os pratos


servidos: era o que o acompanhava que distinguia o nível social. Enquanto os
trabalhadores rurais comiam muitas vezes pão com azeitonas a meio do dia e uma
açorda simples na refeição da noite (José da Silva Picão descreve as rações dos
trabalhadores dos monte alentejanos com bastante pormenor; a açorda alentejana
consiste num caldo de água a ferver com azeite, sal, alhos e coentros despejado sobre
fatias de pão duro), os grupos com um poder económico superior tinham a possibilidade
de variar substancialmente o tipo e o recheio dos caldos que deitavam sobre as sopas de
pão (as fatias de pão duro): na matança do porco fazia-se a cachola com o respectivo
sangue e fressuras (os órgãos internos); também o borrego era todo aproveitado,
utilizando-se a parte junto aos ossos para o ensopado; várias ervas dos campo eram
também usadas do mesmo modo para fazer, por exemplo, sopa de beldroegas. O peixe
também estava presente na mesa dos alentejanos, vindo regularmente de Sesimbra, de
onde os peixeiros o traziam fresco. Consumiam-se sardinhas assadas a acompanhar a
açorda, ou a famosa sopa de cação, sempre muito apreciada pelas pessoas de fora. A
carne de vaca ainda actualmente é pouco consumida no concelho de Avis: já foi referido
que os bovinos eram utilizados apenas como animais de tracção e o seu número era
muito reduzido; mesmo que alguma família da elite comesse ocasionalmente bifes, era
algo raro e trazido de fora.

A alimentação diária incluía ainda grande quantidade e variedade de aves,


enchidos (com carne de porco), queijos de ovelha e cabra, azeite, banha de porco, frutas
e, sobretudo, muitos doces e bolos, nos quais as senhoras se esmeravam em mimos aos
filhos e ao marido. A maioria dos ingredientes provinham das respectivas lavouras e os
temperos eram sobretudo os da região: coentros, salsa, louro, pimentão da carne e
azeite. Este era também usado nos bolos e doces, os quais incluíam também muitos
ovos, açúcar e algumas especiarias, como a canela, o que também não era acessível a
todos os grupos sociais. A alimentação das elites de Avis era um nunca acabar de bolos,
fatias douradas e torradas com manteiga de vaca (também um artigo a que as classes
mais baixas tinham um acesso limitado) e muitos doces, compotas e marmelada.

A quantidade de calorias ingeridas diariamente pelas elites de Avis (sobretudo


considerando que o gasto de energia era muito reduzido por levarem uma vida
extremamente sedentária) contribuía para o seu aspecto físico. Considerando que os
ideais de beleza eram diferentes dos actuais, como se pode ver nas várias fotografias
apresentadas neste trabalho, quanto mais as elites cresciam em idade e em posição
económica, mais redondas iam ficando as suas formas físicas. Ao contrário do nosso
tempo, em que uma pessoa magra revela maior cuidado com a saúde e a boa forma
física é quase um estatuto social, até aos anos 60 deste século os meninos queriam-se
gordinhos e os senhores anafados. O mesmo se passava aliás nos restantes grupos
sociais, pois em Avis no período estudado nunca chegou propriamente a haver fome: até
nos períodos de desemprego e nalguns anos de crise, não era a alimentação o maior
problema dos trabalhadores rurais, pois era comum todos terem um quintal com uma
pequena horta onde cultivavam legumes e tinham algumas frutas, uma capoeira e um
porco; também no rebanho do patrão estavam incluídas ovelhas dos pastores. As
dificuldades económicas faziam-se sentir mais fortemente na questão do vestuário e
calçado (já referi que entre as crianças de Avis a maioria andava descalça todo o ano) e
nas rendas das casas que habitavam; as dívidas nas lojas podiam geralmente ser pagas
em épocas mais favoráveis.
Estas considerações permitem concluir que a alimentação era um factor de
distinção social, se não inteiramente pela quantidade de alimentos ingeridos, certamente
pela sua qualidade.

4.6.2 - Festas familiares. Em ocasiões festivas, tudo isto era exacerbado,


pois a arte de receber os convidados tinha como ponto principal a riqueza e a quantidade
das iguarias servidas: como já foi referido, enquanto viviam nos montes as senhoras da
elite ocupavam-se pessoalmente da confecção dos pratos, queijos, etc., e do tempero das
carnes, molhos e enchidos. Ao tomarem um estilo de vida mais “urbano”, algumas
perderam esse hábito, delegando essas funções nas criadas mais antigas e experientes,
geralmente herdadas com a mobília e o enxoval. No entanto, a maioria continuou a
dedicar-se pessoalmente a essas actividades, sobretudo no que diz respeito às artes da
doçaria, pois grande parte do seu prestígio como mulher e boa dona-de-casa era aí
adquirido. Os doces e bolos eram confeccionados diariamente para consumo familiar ou
para serem servidos com os chás às visitas.

Em datas específicas do calendário religioso, serviam-se doces especiais, como


por exemplo no Natal o arroz doce com muita canela, as filhozes e as belhozes (fritos de
abóbora) e na Páscoa coziam-se costas nos fornos do pão. Nestas ocasiões reunia-se
toda a família alargada, geralmente em casa do patriarca, depois da cerimónia religiosa
correspondente (Missa do Galo ou Missa do domingo de Páscoa) para uma longa
refeição apropriadamente pesada. Os menus eram preparados com vários dias de
antecedência e mobilizavam todo o sector feminino do grupo. Incluíam: canjas, açordas
e ensopados vários; patos e perús assados (numa época em que o perú ainda não estava
tão banalizado como agora), pernas de borrego, lombos de porco temperados com
pimentão da carne (uma massa encarnada feita de pimentos), leitões assados, muitos
pastéis-de-massa-tenra, rissóis e outros folhados vários, iguarias regionais como cabeça
de achá ou de xara (feito com as cartilagens e partes gelatinosas da cabeça do porco) e
todo o tipo de presuntos e enchidos, tudo acompanhado com muito pão, arroz e batatas;
as sobremesas tinham muitos bolos secos, doces de ovos, etc.

As festas relacionadas com os baptizados e casamentos, ou com celebrações de


bodas de prata ou de aniversário dum patriarca mais idoso, eram realizadas geralmente
nos montes (depois da cerimónia religiosa na vila) e incluíam também elementos
exteriores à família; a maior ou menor lista de convidados revelava sobretudo o estatuto
social que se pretendia afirmar localmente. Nessas celebrações era comum tirarem-se as
fotografias mais importantes dos álbuns familiares, tanto usando os serviços dum
fotógrafo profissional, como “em circunstâncias de maior informalidade podiam ser os
próprios participantes que fixavam esses instantes (...) a fotografia consolidava
sentimentos de pertença entre os elementos do grupo, estreitava solidariedades e
prolongava a memória…” (Fonseca, 1996).

Na fotografia (nº 8) da família Varela do Monte Outeiro de Baixo à volta do


patriarca José Varela Teles cerca de 1912 podemos observar perfeitamente a hierarquia
familiar, com o patriarca no centro rodeado pela sua prole, filhos e genros atrás em pé,
filhas e noras sentadas ao seu lado, todos com crianças ao colo, os elementos que darão
continuidade ao seu nome e património. Já na fotografia é visível a divisão sexual nos
locais de sociabilidade: cada grupo ocupava um espaço próprio, tanto em festas
familiares como em lugares públicos. Apesar de aqui se verem pelo menos 5 casais (o
patriarca já era viúvo e tinha duas filhas e três filhos casados), as mulheres não ocupam
a posição ao lado do marido, mas sim à sua frente, separadas pelo facto de estarem
sentadas e os homens em pé (sentados no chão estão os solteiros); no resto da festa, os
homens decerto se reuniram a fumar e a dizer graças impróprias para senhoras,
enquanto estas ocuparam outra divisão ou passaram o tempo atarefadas com a
alimentação das respectivas crianças, a organização e disposição dos pratos na mesa e a
direcção do serviço das criadas.

Os criados da casa eram todos mobilizados para essas ocasiões, tendo


geralmente a sua própria “festa” nos dias seguintes, pois recebiam nos montes as
enormes quantidades de comida que sobravam da festa dos patrões.

Também a política deu azo a grandes festas, como por exemplo a da vitória de
José Pais de Vasconcelos Abranches nas eleições de 1904, quando foi eleito Presidente
da Câmara pelo Partido Progressista e à qual assistiram os mais importantes membros
da elite local. Manifestações de alegria pela vitória de Paes Abranches do Partido
Progressista no Ervedal, "grande numero d'amigos foram alli felicitar o novo vereador
Paes Abranches: acompanhando-o á sua herdade da Torre em vistosa marcha aux
flambeaux, queimando-se muito fogo e erguendo-se vibrantes vivas ao partido
progressista, conselheiros José Luciano, Pereira de Miranda, José d'Alpoim, deputado
Lourenço Cayolla, Dr. Varella, Francisco Abreu, Paes Abranches, António Vasco,
familias Lopes Coelho, Telles Varella, Valentim Varella, Abreu Callado, Mauricio José
Gomes, José Diogo Paes, conego Cardoso, conego Freire d'Andrade, aos eleitores do
circulo, etc., etc. O sr. Paes Abranches offereceu a todos os amigos um abundante
jantar, trocando-se enthusiasticos brindes. Quando o cortejo seguia da villa para a casa
d'aquelle nosso amigo foram levantados alguns vivas ao partido regenerador por
individuos que se encontravam nas ruas e um bando de garotos menores seguio o
cortejo até á ribeira soltando os mesmos vivas. Á prudencia dos nossos amigos deveu-se
não haver algum conflito natural ante taes provocações." (sic). Notícia publicada no
Jornal Distrito de Portalegre de 9/11/1904, que era do Partido Progressista.

4.6.3 - Festas sazonais, cerimónias religiosas e feiras. Os pontos altos


da sociabilidade rural ocorriam nas festas sazonais relacionadas com os ritmos
agrícolas, nas quais as cerimónias religiosas se integraram posteriormente. Nestas
verificava-se a participação de toda a população, com as devidas distâncias e separações
entre os grupos. As elites destacavam-se pela posição que ocupavam, pelo vestuário e
pela forma reverencial com que eram tratados pelas outras classes. Eram ocasiões para
as quais se faziam preparativos durante o resto do ano e, para as senhoras, significavam
quase a única ocasião em que se podiam passear pelas ruas, ver e ser vistas por outras
pessoas, mostrar roupas novas e, sobretudo para os jovens, conhecer e contactar
(minimamente) com pessoas de outro sexo fora do âmbito familiar.

Estas ocasiões surgiam nas feiras do concelho ou de concelhos vizinhos (ver


capítulo 2), em alguns piqueniques, mas sobretudo na Festa da Senhora Mãe dos
Homens, tradicionalmente organizada pela respectiva confraria e realizada no último
domingo de Agosto. Era a grande festa do concelho, que misturava tradições pagãs
relacionadas com o final das colheitas e a romaria cristã à capela da Senhora Mãe dos
Homens que se encontra no centro do termo de Avis, num ponto alto até há pouco
rodeado de grandes sobreiros e azinheiras. As famílias inteiras deslocavam-se ainda de
madrugada em carros puxados por mulas ou mesmo a pé com farnel para o dia todo.
Após a procissão e missa, instalavam-se à sombra das grandes árvores, perto duma
fonte, e aí passavam a tarde e o serão (alguns acabavam por lá dormir sob as estrelas),
assistindo e participando nas várias animações organizadas: quermesse com comidas e
rifas, bailes junto ao coreto, com a música das bandas locais ou de atrações de fora,
touradas (ou pelo menos novilhadas), manifestações desportivas, provas de tiro aos
pratos e outras.

“Relativamente ao hábito dos piqueniques, os (Manuais de Civilidade)


consideram-no extremamente perigoso, trata-se de excursões que só são recomendáveis
para as senhoras quando ‘entre família’; de qualquer modo, compete-lhes ‘evitar dar
lugar a alguma interpretação duvidosa nesses passeios onde reina uma certa liberdade;
devem mostrar-se reservadas e não se isolarem’” (Santos, 1983: 42).

A Confraria de Nossa Senhora Mãe dos Homens existiu desde 1855, juntamente
com outras confrarias no concelho: Nossa Senhora da Orada, 1713 – 1866; das Almas,
1867 – 1868; de Albergaria, Benavila, 1847 – 1855; de Nossa Senhora do Rosário,
Benavila, 1784; do Santíssimo Sacramento, Benavila, 1784; do Senhor dos Passos,
1855 – 1860; da Santa Casa da Misericórdia de Avis, a mais importante e com maior
património, serviços de saúde e assistência, expostos, serviços hospitalares, educação,
etc. Há livros no arquivo desde 1821 até 1958, mas continua até agora.

Esta festa mereceu notícias em vários jornais regionais e nacionais: Jornal


Distrito de Portalegre de 24/8/1904 dá a notícia da festa que se realizou no domingo
seguinte, 28/8/1904. "É esperado em Aviz no proximo sabbado o sr. deputado André de
Freitas com a sua esposa. Veem assistir aos festejos annuaes á Senhora Mãe dos
homens. Bem vindos sejam." Notícia do correspondente do jornal em Avis, no mesmo
nº: "Aviz. Festejos a Nossa Senhora Mãe dos homens. A confraria emprega todos os
esforços para que no corrente anno os festejos sejam deslumbrantes. Como de costume
antiquissimo teem logar no ultimo domingo d'este mez, dia 28. Alem da festividade
religiosa em que é orador o revdº. conego Freired'Andrade, ha arraial, illuminações á
veneziana e á moda do Minho, queimando-se um bello fogo prezo do acreditado
pyrotechnico da Certã, David Nunes e Silva que ainda ha pouco forneceu fogo para
alguns festejos da capital. Pelas 4 horas da tarde havera uma esplendida corrida de 8
bravos novilhos pertencentes ao sympathico lavrador de Benavilla, sr. José Godinho
d'Abreu, que os cedeu generosamente para abrilhantar os festejos. O torneio é dirigido
pelo bem conhecido amador tauromachico sr. Manuel Augusto d'Azevedo, sendo
desempenhado por artistas portuguezes e hespanhoes. Ouvimos que na segunda feira
continuarão os festejos havendo missa por todos os romeiros que com as suas dadivas e
esmolas concorreram para esta solemnidades e durante a missa terá logar a execução
pela banda das melhores peças musicaes. Ás 3 da tarde tourada por amadores e curiosos,
fechando com este espectaculo, tão querido dos alemtejanos, os festejos d'este anno. A
parte musical é desempenhada por um grupo d'amadores d'aqui habilmente regidos pelo
sr. José Barreto da Guerra Paes. Foi requisitada força militar de cavallaria e infanteria
para policiar o arraial e a tourada. Tudo nos leva a crer que as festas no corrente anno
serão imponentes e ferteis d'attractivos." (sic).

No jornal O Evolucionista, nº 41 de 4ª f. dia 5/8/1914 vem a seguinte notícia: A


confraria da Senhora Mãe dos Homens resolveu não realizar no corrente ano os festejos
costumados, mas não explica porquê; para a substituir na organização da festa
"constituiu-se uma comissão d'empregados no comercio e estudantes para no próprio
dia, ultimo domingo d'este mez, promover os mesmos festejos fóra da capela, constando
de concertos por um boa banda de musica, bazar, fogo d'artificio, corridas de foot-ball e
outros jogos sportivos. Brevemente será publicado o programa dos festejos que atrae
sempre áquele aprazivel lugar enorme concorrencia. Na capela haverá alguns actos
religiosos revestidos da maior simplicidade." (sic) Assina "C.". O dia da festa foi o
domingo, dia 30/8/1914.

Jornal O Evolucionista, nº 44 de 26/8/1914 diz, numa secção chamada Notícias


de Aviz: "Reina grande entusiasmo nos promotores das festas que no proximo domingo
30, teem logar no pitoresco local da Senhora Mãe dos Homens, a 5 quilometros desta
vila. Além dos numeros já anunciados uma équipe de rapazes de Evora disputa com um
grupo de Avis diversos sports atleticos, como saltos em altura, de balanço, de vara, etc.,
resultando uma tarde animadissima. Em logar duma teremos duas musicas e o fogo do
ar será o melhor que ali se tem queimado. Varios grupos de raparigas espalhados pelo
arraial exibirão danças e cantos regionais." (sic).

Jornal O Evolucionista de 17/8/1916: notícia com honras de 1ª página "Festas


em Aviz. Está constituida uma comissão para realizar varios festejos por ocasião da
romaria anual á Senhora Mãe dos Homens, no domingo, 27 de agosto; empregando-se
esforços para que do programa faça parte uma corrida de novilhos, á antiga portugueza.
Alem dos costumados concertos por uma boa banda de musica, iluminações, bazar, fogo
d'artificio e os populares bailes e descantes alemtejanos, faz-se distribuição de enxovais
a crianças pobres. Um grupo de meninas realisa ensaios para tomar parte na execução
dos actos religiosos. A feira franca que no mesmo dia tem lugar no local da romaria
atrahe grande concorrencia de povo não só do concelho d'Aviz mas dos concelhos
visinhos, tanto mais que alem de fartas sombras a agua corre abundantemente numa
fonte que ha no recinto dos festejos." (sic).

Verificou-se que a República não veio alterar o carácter religioso e popular da


festa.
Também o Carnaval mobilizava toda a população do concelho, sobretudo as
elites que se esmeravam (tanto os adultos como as crianças) nas máscaras com que
desfilavam nos corsos, nas festas que organizavam ou nos assaltos que promoviam.

4.6.4 - Os bailes e os rituais do namoro. As famílias da elite da vila de


Avis também organizavam bailes nas respectivas casas ou nos salões da Câmara,
geralmente com objectivos beneficentes. Sobretudo no verão, algumas das casas
recebiam familiares e amigos para lanches nas suas varandas, acompanhados de saraus e
récitas que as senhoras organizavam para os filhos enquanto elas bordavam reunidas
com as amigas e os maridos iam para o clube. Estas reuniões mais informais
prolongavam-se normalmente pela noite dentro e evoluíam para bailaricos, animados
por alguns dos jovens com talento musical ou, mais tarde, as grafonolas que tocavam os
discos com os últimos sucessos do momento.

Depois dos primeiros contactos (que nunca eram muito além de olhares, pois os
homens ficavam separados das mulheres mesmo nas festas e as meninas estavam
sempre sob a vigilância das mães, madrinhas ou criadas) nos locais de sociabilidade
descritos, os jovens empenhavam-se em repetidas passagens sob a janela da menina
escolhida, fosse do monte ou da vila. A sua reacção levava o pretendente a desistir face
ao desinteresse feminino ou a ganhar coragem para falar com o pai dela. Não tomei
conhecimento de casos de casamentos combinados pelos pais ou de jovens forçados a
casamentos contra a sua vontade, pelo menos de forma explícita; porém, os vários
condicionalismos sociológicos (e até geográficos) já descritos eram determinantes na
escolha do cônjuge entre as elites. Seguia-se um longo noivado que raras vezes saía da
sala-de-visitas, por vezes durante vários anos, durante o qual a presença dos paus-de-
cabeleira eram uma constante. A desempenhar esse papel havia sempre uma irmã mais
nova (uma das fontes orais disse que coseu inúmeras meias e bordou dezenas de
guardanapos enquanto passava as tardes com a irmã e o respectivo noivo), alguma tia ou
mesmo uma criada.

4.6.5 – Caçadas. Uma das mais importantes formas de sociabilidade


masculina no Alentejo eram as caçadas. Nos finais do século XIX as famílias do
concelho de Avis não tinham ainda essa tradição: apenas alguns lavradores caçavam
quando queriam, sem quaisquer restrições, mas também sem grande interesse
(informações fornecidas pelas fontes orais). Porém, a partir da República parece
aumentar o interesse por esta actividade: o Livro de Registo de Licenças de Uso e Porte
de Armas de Fogo foi aberto em 20/4/1915 e contem os nomes de praticamente todos os
membros das elites locais, incluindo (apenas) uma senhora, D. Olga Deolinda Pais da
Cunha e Sá, filha do Dr. Júlio Mário da Cunha e Sá. O Livro de Registo das Licenças
para Caçar desde 1921 até 1934 também revela os nomes de quase todos os membros
das elites locais, misturados com membros de outras classes.

Estes elementos revelam vários aspectos importantes da caça nos primeiros anos
do nosso século: não era tão elitista como actualmente se faz supôr, pois havia os
caçadores profissionais, os que caçavam para vender, mediante autorização do dono das
propriedades; a grande diferença é que estes geralmente não tinham espingardas
(caçavam com armadilhas ou paus) ou se as tinham eram de muito menor qualidade;
também a participação das senhoras nessas actividades era quase nula, pois a única
senhora referida (em 1915) era duma família com maiores ligações à capital e com
hábitos de sociabilidade diferentes dos das elites locais; em 1921 não surge nenhuma
com licença para caçar e isto era mesmo mal visto localmente.

De facto, a partir do momento em que as elites rurais de Avis se “urbanizaram” e


começaram a adquirir hábitos mais “burgueses”, começou a surgir o interesse pela
organização de batidas e caçadas nas respectivas propriedades, para as quais
convidavam os amigos e aliados políticos como forma de “pagamento de serviços”
implícita ou de criação de clientelas; Simão Teles Varela, o rendeiro da herdade de
Camões (dos Duques de Cadaval) chegava a ter os convidados da capital instalados no
monte durante um mês para caçadas diárias e grandes jantaradas com as peças caçadas.
Nestas ocasiões os empregados das lavouras eram mobilizados para “bater o terreno” e
“levantar a caça”. As mulheres ficavam excluídas de todas estas diversões. A caça
tornou-se assim um meio de afirmação e prestígio social; os convites para caçadas eram
irrecusáveis e motivo de agradecimento para o resto da vida. A competição também era
forte nessas ocasiões e cada caçador se esforçava por abater o maior número de peças e
demonstrar a superioridade do seu cão (perdigueiros, pointers, podengos) face aos dos
outros.

Os pratos preparados a partir das peças de caça eram geralmente servidos logo
nos dias seguintes às caçadas, devido à quase total inexistência de métodos de
conservação dos alimentos (conservavam-se perdizes em banha durante meses, o que
não impedia a ocorrência de algumas doenças intestinais graves após o seu consumo).
Incluíam perdizes, faisões, codornizes, etc. assados, ensopado de lebre, coelhos à
caçador, de molho de vinho ou de molho de vilão, arroz de pato, javali assado e ainda
veado. Entre as elites, as famílias de caçadores destacavam-se por ter este tipo de
alimentação com grande regularidade, pois a quantidade de caça existente no concelho
de Avis era muito superior aos níveis actuais. Em média um bom caçador não chegava a
casa com menos de 30 ou 40 peças, as quais tinham de ser consumidas rapidamente,
eram distribuídas por parentes, compadres e amigos ou oferecidas à Misericórdia.

4.6.6 - As viagens. A possibilidade de viajar foi indiscutivelmente um


privilégio das elites durante todo o período estudado. Isto porque as principais vias de
comunicação e meios de transporte eram na sua maioria e na maior parte do tempo
inacessíveis.

4.6.6.1 - Deslocações e meios de transporte. Dificuldades. “Ao


começar o século XX, o caminho-de-ferro imperava em todo o mundo e constituía o
elemento-base da rede de transportes e comunicações” (Marques, 1978: 253). Ora o
caminho-de-ferro não chegava nem alguma vez chegou ao concelho de Avis. Essa foi
aliás uma preocupação constante do poder político local: vários esforços foram
empreendidos nesse sentido, porém sem resultado.

No princípio do século XX repetiram-se os pedidos para levar uma linha de


comboio até Avis: o jornal O Distrito de Portalegre de 3/5/1903 tem a seguinte notícia:
"Reuniu-se na segunda-feira (27/4/1903) no Hotel Francfort em Lisboa, a comissão
composta por cavalheiros comissionados dos concelhos de Coruche, Mora e Aviz para
resolver a melhor forma de fazer chegar ao Ministro da Obras Públicas o pedido de
construção da linha férrea. Estava com eles o deputado desse círculo, Sr. Lourenço
Cayolla." Dias depois encontraram o ministro e ele prometeu a linha férrea. A comissão
veio de lá toda animada, mas nunca comboio algum chegou a Avis. Em 24/8/1904 vem
a seguinte notícia no mesmo jornal: "A Câmara Municipal de Avis na sua ultima sessão
nomeou o vereador cónego José Ricardo Freire d'Andrade para a representar na
commissão, que, em nome das camaras d'este distrito beneficiadas pela linha de
Estremoz a Portalegre e ramal d'Aviz, vae a Lisboa sollicitar do sr. ministro das obras
publicas que com a possivel brevidade se comecem os trabalhos d'aquella linha..." (sic).
O resultado foi o mesmo.

No mapa de estradas de 1906, a seguir reproduzido, pode ver-se que a linha do


caminho-de-ferro passava pela Ponte de Sor e de Avis para lá existia apenas uma
“estrada carroçável”, assim como para os restantes centros urbanos da região. Entre as
freguesias do concelho havia apenas caminhos, os quais eram por vezes transitáveis
apenas no verão. Este panorama não se alterou muito até 1941: as ligações para Avis (e
no mapa nem estão representadas as restantes freguesias, por causa da inexistência de
estradas circuláveis por automóveis) continuavam a ser feitas por estradas “regulares” e
de “2ª classe”.

Quadro 8 Mapa:
Quadro 9 Mapa:

Assim, a circulação de mercadorias, como já foi referido, era feita em alguns


casos pelos pés das próprias (no caso dos porcos e das ovelhas que eram levados pelos
porqueiros e pastores até às feiras ou à estação da Ponte de Sor) ou em carroças (só mais
tarde em tractores). Quanto às pessoas, as deslocações implicavam logo de início
disponibilidade de tempo; depois a posse de vários trens para transporte de toda a
família, criadas e bagagens (baús, arcas, cestas de comida…), e os respectivos cocheiros
que os levavam à estação do comboio e na data da chegada os iam buscar. E,
principalmente, dinheiro para o alojamento, refeições e outros gastos no local de
destino.

Os primeiros automóveis do concelho de Avis foram comprados por membros


da família Teles de Carvalho: em 1912 António Teles de Carvalho já tinha um
automóvel da marca Brezier, de tracção por correntes e sector de mudanças e travões
fora do carro, no estribo do lado esquerdo. Seu irmão mais velho, Joaquim Manuel
Teles de Carvalho, também já possuía uma automóvel antes da Guerra.
Na vila de Avis, os irmãos Braga, Asdrúbal e José, uns dos maiores proprietários
do concelho e genros respectivamente dos presidentes da câmara Dr. Manuel Lopes
Varela e José Diogo Pais, também compraram automóveis. Ficaram famosas as viagens
de José Braga por toda a Península Ibérica no seu Ford Modelo T (várias fontes orais se
referiram a uma fotografia sua com este carro no Montjuic em Barcelona, mas não
consegui acesso a ela) no final dos anos 20. Isto, contudo, eram excepções, pois mesmo
os membros da elite que acabaram por comprar carros nos anos 30 continuavam a “ir ao
campo” de trem ou carroça, enquanto os automóveis ficavam guardados para não se
estragarem nos maus caminhos. Mais tarde começaram a ter dois ou mais carros: um de
cerimónia, para usar em ocasiões especiais, outro de serviço, como se pode ver nos
inventários de Cosme dos Campos Callado (m. 1948 e tinha 1 Mercedes de 1938,
descapotável e encarnado, e 1 camionete Ford de 1946) e de José Valentim Varela
Júnior (m. 1954 e tinha também um Mercedes e um jeep Willis). Estes carros eram
conduzidos pelos próprios (com alguma dificuldade, segundo as anedotas locais) ou por
motoristas fardados, com botas altas e boné. Enquanto os lavradores de Avis eram
conhecidos por raramente saírem nos seus automóveis, os referidos irmãos Braga
realizavam anualmente viagens por toda a Europa, sobretudo após a 2ª Guerra Mundial,
para visitarem as crianças austríacas que tinham sido colocadas em suas casas durante o
período da guerra.

Desde 1914, pelo menos, várias licenças foram passadas para conduzir
Velocípedes, Bicicletas e Motociclos, mas estes veículos eram conduzidos
maioritariamente pelos mais jovens e arrojados entre as elites ou então por membros de
famílias de pequenos proprietários.

Só nos anos 30 surgiram as primeiras carreiras regulares de transportes públicos


rodoviários.

Mário Sá escreveu sobre comunicações e transportes em Avis: "No século


XVIII, em plena ditadura de Pombal, edificavam-se as duas admiráveis pontes, que
punham Avis em comunicação com as terras ao norte e a oeste. (nesta época) de Avis
para Lisboa ia-se por terra até ao Tejo, em Santarém, - a cavalo, em carretas ou em
andas, - e daqui se tomava embarcação.(...) Mas enfim, o automóvel exigiu que se
pudesse chegar a Avis em estrada-nova, e ela aí está para se inaugurar em 1935! Já se
inaugurou a primeira carreira de camionettes. Avis nunca tivera diligência, êsse tão
grande melhoramento noutras idades, mas apenas a carroça do correio de cada vez mais
triste à medida que se aproxima do seu fim! (…) Avis - êsse rico rincão alentejano, que
fica algo distante do Caminho-de-Ferro, possue hoje meios de comunicação suficientes
e com horários certos, visto que as camionetes da Empreza Murta, ou Portalegre, fazem
diàriamente carreiras entre as estações do Caminho-de-Ferro de Ponte do Sor e
Avis"(sic), revista Expansão Portuguesa, 1935.

4.6.6.2 - A ida à capital; praias, termas e touradas. Face à


situação descrita, apenas um número muito reduzido de famílias tinha disponibilidade
económica para sair de Avis. E mesmo assim com muito pouca regularidade e
condicionados por vários factores, como por exemplo a chuva que impossibilitava os
caminhos, etc. De qualquer modo, a adopção de comportamentos “burgueses” também
chegou a estas elites rurais que já nos finais do século XIX marcavam o seu calendário
mundano com a frequência das praias e termas da moda, além das viagens regionais
para frequentar feiras e assistir a touradas nas cidades mais próximas, como Estremoz,
Évora, Montemor-o-Novo ou mesmo Badajoz e Sevilha (Fonseca, 1996: 218-220).
Como forma de tratamento, sobretudo para as gerações mais velhas, as elites
frequentavam as termas mais próximas, como Cabeço-de-Vide, Marvão ou Castelo-de-
Vide, mas sobretudo as de Monfortinho, Caldas da Rainha e o Luso, pois sempre
mudavam de ambiente e aproveitavam alguns dos locais de sociabilidade mais
conceituados da época.

Tanto as famílias Cunha e Sá como os Carvalho tinham casas em praias: a


Quinta do Bom Sucesso, na Lagoa de Óbidos e uma casa em Espinho, respectivamente.
As restantes famílias arrendavam casas à epoca na Figueira da Foz, Nazaré, S. Martinho
do Porto, pois "os alentejanos preferiam ir passar o verão a sítio frescos", segundo as
palavras dum descendente. As famílias inteiras, ou pelo menos a mãe ou alguma tia com
as crianças (grande parte dos lavradores eram de sequeiro e preferiam ficar nas herdades
a ir para a praia) saíam de Avis geralmente durante todo o mês de Agosto ou Setembro e
instalavam-se nestas praias com criadas, malas e baús, depois de extenuantes viagens
que duravam um dia inteiro, com frequente mudanças de meio de transporte. Uma das
famílias chegava a passar os três meses de verão em Espinho, para onde levavam carros
com parelhas de mulas carregados com a comida para toda a temporada! À falta de
hotéis era frequente ficarem em casas de pescadores que durante essas temporadas se
mudavam para alojar estes “turistas”.
Nas praias era raro as senhoras alentejanas tomarem banhos de mar ou até
vestirem algo que se assemelhasse a um fato de banho. Saíam do seu ambiente e até
assumiam comportamentos bastante diferentes do habituais, como passear nas avenidas
ou frequentar casas de chá. Mas chegar ao ponto de expôr parte do corpo já eram
hábitos urbanos demasiado avançados para estas senhoras de província, por maiores que
fossem os fatos-de-banho da época: como se pode ver na fotografia nº 10, ainda nos
anos 30 as senhoras estão na praia de casaco, apenas a criada está de manga curta e as
crianças, essas sim, usavam fatos-de-banho, pois tinham a receita médica de apanhar sol
e banhos de mar. Face a essas recomendações, eram levadas pelos banheiros que as
mergulhavam nas ondas e as despachavam para a família com o banho tomado e o
serviço completo. Algumas famílias incluíam na viagem “a banhos” a estadia de alguns
dias na capital. Aí instalavam-se e tomavam a maioria das refeições no Hotel Universo,
na Rua do Carmo, ou na Pensão Morais, os quais, segundo as fontes orais eram os
redutos dos avisenses em Lisboa; aproveitavam para ir aos médicos especializados, ao
teatro, cinemas, modistas, e tudo o que não tinham oportunidade de fazer na vila ou
aldeia de residência. Sobretudo, frequentavam espaços públicos, chás dançantes e
outros, uma atitude típica do turista que age de modo diferente quando está fora do seu
ambiente e sem os condicionalismos duma sociedade fechada como a que as elites
frequentavam durante o resto do ano. Alguns senhores frequentavam casinos e os
cabarets da moda, ficando as esposas nos hotéis, mas principalmente quando viajavam
a Lisboa sem a família (Barros, 1990).

As deslocações dos lavradores alentejanos a Lisboa em trabalho ou diversão


eram muito raras. As excepções existiram apenas nas famílias cujos filhos estudaram
fora. Por exemplo Júlio Mário da Cunha e Sá estudou Direito e exerceu a sua profissão
nas Caldas da Rainha antes de se instalar em Avis como lavrador. Esta família
deslocava-se com muito maior frequência à capital que a maioria dos lavradores de
Avis. Um caso também excepcional foi o do lavrador Joaquim Manuel Teles de
Carvalho (m. 1937), filho de Manuel de Carvalho, que já nos anos 20 resolveu entregar
aos filhos a lavoura e comprar a Quinta da Flamenga, às portas de Lisboa (onde
actualmente é a Rotunda do Aeroporto), na qual instalou uma vacaria com 70 vacas para
abastecer a cidade de leite (informações fornecidas pelo sobrinho, Dr. José Godinho de
Carvalho). Passou então a viajar todos os meses entre o seu monte (na freguesia de
Valongo) e Lisboa, fazendo o percurso de trem puxado a cavalos fora das estradas
principais, indo quase a direito pelo meio dos sobreiros. A meio do caminho arrendou
outra herdade (“Charneca do Marmeleiro”) para servir de “pousada”, na qual
descansava durante uns dias em cada deslocação.

De qualquer modo desde os finais do século XIX até meados deste, o meio de
transporte mais usado era o comboio; António Pais da Silva Marques, filho do lavrador
com o mesmo nome que foi o 5º MC de 1890, foi deputado pelo círculo de Elvas entre
1923 e 1925 e tinha um passe dos caminhos-de-ferro para as suas deslocações. Também
os estudantes que passavam as férias em Avis com as famílias usavam este transporte.
Apenas alguns mais arrojados tinham a audácia de fazer o percurso de automóvel, o que
se tornava uma autêntica epopeia, sobretudo no inverno, por causa do mau estado das
estradas. O percurso era feito pela Ponte de Sor, Abrantes (onde havia a única ponte
para atravessar o Tejo com uma portagem de 2 tostões nos anos 40), e depois Santarém
e Lisboa. Eram 240 Km (actualmente por Pavia e Mora são 150) que nos anos 30 e 40
se faziam numa média de 6 horas, as quais se podiam prolongar consoante a quantidade
de furos que tivessem de ser remendados pelo caminho. Nos anos da 2º Guerra Mundial,
as restrições de combustíveis e de pneus fizeram com que as viagens fossem ainda mais
limitadas, aventurando-se alguns de moto, como era o caso de Eurico Pais, gerente do
Grémio da Lavoura que se deslocava frequentemente a Lisboa para resolver assuntos
burocráticos e ver os filhos que lá estudavam (fotografia nº 11).
Capítulo 5 - Elites sociais locais e mudança política

Toda la evidencia empírica tiende a señalar el hecho de que las


minorías terratenientes que controlam la mayor parte de la tierra
tiendem a convertirse en oligarquías locales que monopolizan la
administración y demas instituciones locales teniendo así en sus
manos la vida y los destinos de la comunidad… (Sevilla-Guzmán,
1980: 37)

Pelo menos desde os finais do Antigo Regime que os lavradores de Avis e do


seu termo participavam nas pautas de elegíveis para a câmara e eram frequentemente
eleitos. Já vimos nos capítulos anteriores a continuidade da maioria das famílias na
posse ou administração da grande propriedade fundiária e, consequentemente, do poder
económico e do prestígio social ou “poder simbólico”. Neste pretendo descrever a sua
participação no exercício do poder político local no intervalo de 1886 - 1941 e os
comportamentos adoptados face às mudanças de regime que nele ocorreram. Tento
estabelecer até que ponto as elites até agora definidas constituem ou não uma oligarquia,
conceito muito usado pelos historiadores da História Agrária em Espanha para definir
os grupos que controlam, com carácter hegemónico, instituições ou organizações
económicas, sociais e políticas, enfim, o poder político local.

5.1 - Participação das elites sociais locais no poder político

Tal como na Extremadura espanhola, em Avis "fueron los grandes propietarios


locales que mayor participación lograron en el control de la vida política regional, en el
triple plano de la representación nacional, provincial o municipal. (…) En el ámbito
local hay una continuidad en el reclutamiento del personal administrativo y político
entre el Antiguo Régimen y la Monarquia Liberal" (Marroyo, 1991: 206). Isto é bastante
claro se observarmos as listas do pessoal político apresentadas no anexo 1 e já
analisadas nos capítulos 1 e 3. Aí verifiquei a participação dos vários grupos
profissionais no poder político como critério para se pertencer às elites sociais. Os
nomes das famílias eleitas ou nomeadas para os cargos administrativos locais repetem-
se desde pelo menos 1799, sobretudo no caso das famílias Teles, Varela e Lopes.
Detecta-se, assim, uma grande permanência, intervalada por algumas rupturas
circunstanciais e curtas.
Verifica-se que na maioria dos casos não era o chefe da família, o grande
proprietário fundiário que exercia o cargo de Presidente da Câmara Municipal ou
mesmo de vereador, mas sim o seu filho, irmão ou sobrinho, detentor de algum capital
cultural. Porquê o Dr. Cosme dos Campos Callado, o José Pais de Vasconcelos
Abranches e o Dr. Manuel Lopes Varela terem passado tantos anos na presidência da
câmara e não os respectivos irmãos lavradores? Tal como a ideia geral em relação à
instrução, o mesmo se aplicava à política: só se dedicava a ela quem não tinha jeito para
a lavoura, mas sobretudo porque "o habitus do político supõe uma preparação especial.
É, em primeiro lugar, toda a aprendizagem necessária para adquirir o corpus de saberes
específicos (...) das capacidades mais gerais tais como o domínio de uma certa
linguagem e de uma certa retórica política, a do tribuno, indispensável nas relações com
os profanos, ou a do debater, necessária nas relações entre os profissionais" (Bourdieu,
1989: 169).

Bourdieu acentua ainda esta ideia: "pelo menos fora dos períodos de crise, a
produção de formas de percepção e de expressão politicamente actuantes e legítimas é
monopólio dos profissionais (...) monopólio da produção entregue a um corpo de
profissionais, quer dizer, a um pequeno número de unidades de produção, controladas
elas mesmas pelos profissionais; constrangimentos que pesam nas opções dos
consumidores, que estão tanto mais condenados à fidelidade indiscutida às marcas
conhecidas e à delegação incondicional nos seus representantes quanto mais
desprovidos estão de competência social para a política e de instrumentos próprios de
produção de discursos ou de actos políticos: o mercado da política é, sem dúvida, um
dos menos livres que existem" (Bourdieu, 1989: 166). José Cutileiro verifica o mesmo
na freguesia alentejana que estudou: "o cargo de presidente da câmara foi ocupado por
lavradores importantes ou membros das profissões liberais, ligados por laços de
parentesco a famílias de latifundiários" (Cutileiro, 1977: 222).

A ida destes elementos para a política não veio, porém, introduzir grandes
inovações no exercício do poder local; pelo contrário: as fortes ligações que
continuavam ter com a grande propriedade fundiária contribuíram para a permanência
dos objectivos e acções políticas durante as sucessivas gerações. Bourdieu fala da
"acção de normalização contínua que os membros mais antigos do grupo lhes impõem
com a sua própria cumplicidade, em particular quando, recém-eleitos, têm acesso a uma
instância política para onde poderiam levar um falar franco e uma liberdade de maneiras
atentatórias das regras do jogo" (Bourdieu, 1989: 170). Isto é: mesmo que eles
quisessem ser muito inovadores, o que não era muito provável face à sua herança
cultural e aos interesses económicos que pretendia defender, o facto de terem por trás o
sogro, o tio, o primo, etc., impedia-os.

Além da câmara municipal, as elites também participaram nas Juntas de


Freguesia: entre uma grande maioria de artistas e pequenos proprietários, encontramos
alguns padres e os grandes proprietários António Godinho de Campos e José Godinho
d’Abreu. A composição das juntas de freguesia apresenta grande coincidência de nomes
com as Casas do Povo, instituídas a partir do final dos anos 30. Enquanto isso, os
organismos corporativos relacionados com a produção agrícola descritos no anexo 16
contaram sempre com a direcção dos maiores proprietários. A Santa Casa da
Misericórdia, por outro lado, tinha um "recrutamento interclassista", o que não lhe
impedia o seu estatuto de "instrumento de poder (...) pelo poder simbólico que conferia
a quem a controlava (...) fonte de favores, de patrocinato" (Sobral, 1993: 398).

Os cargos de Administrador do Concelho e de Juiz de Paz refletem a mesma


realidade de quase total coincidência dos seus titulares com as principais figuras da elite
fundiária. O cargo de administrador do concelho constituía uma verdadeira interferência
do poder distrital no poder local: era nomeado pelo governador civil do distrito
independentemente das eleições locais. O facto de em Avis as pessoas nomeadas terem
na maior parte das vezes relações familiares muito próximas com os eleitos para a
câmara revela pelo menos as boas relações do governador civil do distrito com as
famílias da elite de Avis. Estas boas relações continuaram apesar das mudanças de
regime.

Entre as elites de Avis verificou-se sobretudo um forte interesse em ocupar os


cargos do poder local com o objectivo de defender a sua posição económica e social. Os
membros das principais famílias locais nunca almejaram carreiras políticas mais
arrojadas, pois as suas principais preocupações continuaram a ser a lavoura e o aumento
das respectivas casas agrícolas. Nota-se, contudo, um interesse em manter boas relações
com as autoridades distritais e em participar nas eleições nacionais com a respectiva
clientela, no sentido de verem os seus candidatos eleitos e assim defenderem as suas
posições políticas e económicas. Já nos finais do século XIX encontramos testemunhos
do peso das elites de Avis no processo das eleições nacionais e mesmo na tomada de
decisões por parte dos deputados cuja eleição foi apoiada por estes grupos. O deputado
Lourenço Cayolla, no seu livro de memórias, descreve de forma pitoresca um destes
episódios (Cayolla, 1928).

Apesar desta posição das elites tradicionais do concelho, até 1941 encontramos
dois membros da elite fundiária local eleitos deputados para a Assembleia Nacional:

* José Pais de Vasconcelos Abranches (n. c.1863, m. 1941), bacharel em


Direito, presidente da câmara municipal em 1904 (P. Progressista), eleito deputado pelo
círculo de Portalegre em 1906; em 1908 também concorreu para deputado pelo P.
Regenerador, mas não foi eleito. Foi eleito deputado em 1910, (P. Regenerador) mas
com a República não chegou a assumir o cargo. Voltou ainda a ser presidente da câmara
em 1914, senador entre 1915 e 1918; deputado pelo P. Republicano Liberal em 1921
(legislatura só durou 6 meses) e Governador Civil do Distrito de Portalegre.

* António Pais da Silva Marques (n. 1876, m. 1950), várias vezes


administrador do concelho e deputado pelo círculo de Elvas em 1923 - 1925; pertenceu
sempre ao P. Democrático.

Em ambos os casos, a ligação entre a participação na política local e a ascensão


a cargos políticos a nível nacional foi ditada por objectivos exteriores aos interesses
mais comuns das elites locais: José Pais de Vasconcelos Abranches era um bacharel de
Lisboa, casado com uma senhora da elite fundiária de Avis, mas também residente em
Lisboa, pois pertencia a uma família de proprietários absentistas. A sua mudança para
Avis esteve relacionada desde o princípio a aspirações políticas que de facto se
concretizaram, mas que muito pouco tinham a ver com os interesses das elites dos
lavradores locais. No caso de António Pais da Silva Marques, pelo contrário, verifica-se
uma vontade de ascender a cargos políticos significativos por pertencer a uma família
cujo processo de partilhas de terras por heranças levara a uma diminuição do seu poder
económico a nível local.

Na segunda metade do século, também o já referido director do Grémio da


Lavoura, o Dr. Jaime Joaquim Pimenta Prezado, foi eleito deputado. Este caso, tal como
o anterior, representa uma necessidade de afirmação social a nível local: este médico,
casado como uma grande proprietária, tinha origens em lavradores rendeiros e pequenos
proprietários e nunca foi bem aceite pela família da mulher. As rivalidades políticas
com o sogro e restantes famílias da elite tradicional levaram-no a seguir um percurso
político divergente e a ascender pela política a uma posição social mais elevada.
Verificam-se assim três casos significativos em que a política local serviu como
trampolim para mais altos cargos.

5.2 - Eleições e mudanças de regime; os períodos de transição.

Quadro 10:

Face à grande instabilidade política e sobretudo às mudanças de regime


ocorridas durante o período entre 1886 - 1941, o poder político em Avis revelou uma
enorme estabilidade, ligada à já referida permanência das famílias da elite fundiária nos
cargos políticos electivos e de nomeação administrativa (ver anexo 1). A nível nacional,
o final da Monarquia caracterizou-se pelo rotativismo político, enquanto a Câmara
Municipal de Avis manteve o mesmo partido no poder pelo menos nos últimos 23 anos.
Não me vou alongar com a abordagem deste período a nível nacional e a descrição dos
programas dos partidos; apenas saliento que o Partido Progressista, ao qual as elites
fundiárias de Avis pertenciam, era o que tradicionalmente defendia os interesses
agrários. Isto revelou-se sobretudo com as leis do proteccionismo cerealífero dos finais
do século XIX (Reis, 1980: 133).

Na falta de imprensa local (o primeiro jornal de Avis data de 1966) foi


necessária uma exaustiva pesquisa dos resultados das eleições locais nos jornais
distritais e nacionais: as actas das eleições forneceram apenas os nomes dos candidatos
eleitos, faltando apurar os respectivos partidos. Este quadro é o resultado desse trabalho
e nele podemos ver que, enquanto nos últimos anos da monarquia a política nacional foi
marcada pelo rotativismo político e frequentes períodos de crise, as eleições para a
Câmara Municipal de Avis são ganhas nos últimos 13 anos pelo P. Progressista.

Com a implantação da República, a acta da sessão extraordinária da câmara,


com data de 10/10/1910, presidida pelo vice-presidente, o Cónego José Ricardo Freire
d'Andrade, rejubila com a mudança de regime: "Considerando que a noticia official da
proclamação da Republica no nosso paiz foi reconhecida pela maioria dos habitantes
d'este Concelho com evidentes e ruidosas manifestações de aplauso e de jubilo em que
tomaram parte todas as classes sociais; considerando que tal aplauso e jubilo tem
origem não só na sêde anciosa d'uma regeneração política, social e economica que
libertasse o paiz da aviltante degradação a que foi arrastado pelos governos monarchicos
há longus annos, roubando-lhe a independencia a Credito e o prestigio seculares, mas
tem origem ainda na Convicção que avassalou o espirito de todos os portugueses de que
o regime monarchico já não devia restituir-nos aquellas nobres qualidades que
conquistaram em eras distantes para este bello paíz o respeito e a admiração de todos os
povos. (...) Por todos estes motivos proponho:1º Que a Camara municipal d'este
Concelho affirme a sua adhesão e fidelidade ao regime republicano; 2º Que se
Congratule com os habitantes do seu Concelho e com o paiz por tão desejado
acontecimento, fasendo votos para que se inicie na nossa patria uma epoca de
regeneração e de progresso politico e social.; 3º Que se dê immediatamente
conhecimento d'estas resoluções aos Exmos Ministro do Interior e Governador Civil
d'este districto; 4º Que em signal de regosijo se encerre a sessão. Aviz, 10 d'outubro de
1910. servindo de Presidente da Camara (o) Conego Jose Ricardo Freire d'Andrade.
Depois de discutida foi aprovada por unanimidade. Do que para constar se lavrou a
presenta acta. Eu Manuel Maximiano d'Oliveira, secretario da camara. (assinam)
Cónego José Ricardo Freire d'Andrade, José Valentim Varella Junior, Joaquim Telles
Varella Junior, Manuel Maximiano d'Oliveira".

No entanto, a última câmara da monarquia, eleita em 1/11/1908, foi deposta e


substituída por outra cujos membros foram nomeados administrativamente por alvará
do Governador Civil do Distrito de Portalegre. Estes elementos pertenciam a um grupo
inteiramente diferente do grupo que pelo menos desde 1887 ocupava o poder: o Dr.
Júlio Mário da Cunha e Sá era um grande proprietário, aliás um dos maiores do
concelho, mas era também bacharel em Direito e tinha grandes relações com a capital e
outros centros urbanos, tendo exercido as profissões de notário e de advogado do
Minstério Público em Óbidos, onde viveu vários anos. Os restantes lugares foram
ocupados por comerciante e outros membros das elites urbanas: como podemos ver no
anexo 1, o pessoal político nomeado nestes anos inclui apenas mais um proprietário,
Francisco António Pais, escrivão de Direito e irmão do advogado José Pais Teles
(ambos eram cunhados do Dr. Júlio Mário da Cunha e Sá) o qual foi convidado para
desempenhar o cargo de Administrador do Concelho, mas não aceitou (ver no anexo 4 o
5º filho de António Pais da Silva Marques). Como foi referido no capítulo anterior,
algumas fontes orais sugeriram a ligação da família Pais (tanto estes elementos como
Alfredo Barreto da Guerra Pais, o secretário da administração do concelho e alguns dos
seus filhos) à Maçonaria, organização à qual pertenciam os mais importantes
republicanos. Pelo secretismo próprio da organização, esta ligação é difícil de provar.

Apesar de continuarem monárquicos por várias gerações (ainda actualmente


alguns descendentes das elites de Avis defendem vigorosamente este regime), as elites
políticas tradicionais rapidamente se integraram no novo regime, ocupando os mais
altos cargos da Câmara Municipal. Durante a maior parte da República o poder político
em Avis esteve nas mãos do Partido Evolucionista, o qual evoluiu em 1921 para o
Partido Republicano Liberal e em 1923 para o Partido Republicano Nacionalista.

Logo nas primeiras eleições locais da República, realizadas em Avis em


30/11/1913, foi eleito José Pais de Vasconcelos Abranches, um verdadeiro cacique
monárquico local (por sinal também cunhado do Dr. Júlio Mário da Cunha e Sá), com o
apoio de todos os grandes proprietários que tradicionalmente ocupavam o poder.
Praticamente todas as famílias da elite tinham festejado a sua vitória em 1904. Este
político foi alvo de muitos comentários tanto na imprensa distrital como nacional
devido ao seu percurso político bastante variado: foi eleito Presidente da Câmara
Municipal de Avis em 1904 pelo Partido Progressista. Em 1906 foi eleito deputado pelo
círculo de Portalegre pelo mesmo partido. Já em 1908 concorreu nas eleições nacionais
pelo Partido Regenerador, mas não foi eleito. Quando foi implantada a República, foi
candidato a deputado pelo Partido Republicano no círculo de Elvas para as eleições de
Maio de 1911, mas desistiu. Por essa ocasião o jornal republicano Intransigente
publicou o seguinte comentário: "fez discursos, pediu votos, botou manifestos e depois
desistiu! (...) Foi proposto pela primeira vez e perde a eleição. Era então se bem nos
parece progressista puro, entusiásta, sincerissimo, com o pacto da Granja na cabeça e no
coração. Mais tarde é eleito em pleno explendôr teixeirista (...) tam entusiasta
rejenèradôr quanto fôra sincero, ardente e entusiasta progressista e franquista (...) tam
dedicado, tam entusiásta republicano como antes fôra progressista-franquista-
rejenèradôr..." (30/5/1911).

Os vereadores e membros da comissão executiva da câmara voltaram a ser os


mesmos do tempo da Monarquia, incluindo o Cónego Freire d’Andrade. Isto foi um
exemplo perfeito do que se chamava na época o adesivismo, com a variante, no entanto,
de serem do partido de oposição ao Partido Democrático, o qual ocupou o poder durante
praticamente toda a República. Esta foi aliás a tendência das elites políticas de Avis
durante praticamente todo o período estudado, cuja actuação política se caracterizou
pela divergência em relação ao poder central.

"Uma característica geral da vida política portuguesa desde 1910 encontramo-la


sem dúvida na instabilidade: parlamentar, presidencial e governamental" (Marques,
1981: 285). Em Avis, no entanto, a estabilidade parece ter sido a regra, apenas
perturbada pela morte do Dr. Manuel Lopes Varela, o que implicou a subida do vice-
presidente ao cargo de presidente. Mesmo o conturbado período do sidonismo não
provocou alterações a nível local. José Pais de Vasconcelos Abranches era senador em
1918 e não se recandidatou nessas eleições nacionais por o seu partido ter ficado fora
das mesmas. O Partido Evolucionista não participou nas eleições de 28/4/1918 de
Sidónio Pais e advogou em todos os jornais a "abstenção eleitoral" (jornal Republica de
20/4/1918, por ex.). No mesmo jornal em 23/4/1918 há um artigo de José P. V.
Abranches: "Ervedal, 22 - É destituido de fundamento o telegrama publicado no Diario
de Notícias de 19 e transmitido de Elvas, dando como assente a minha candidatura
como senador governamental pelo mesmo circulo. Como republicano evolucionista e
disciplinado só aceito a candidatura autorizada pelo meu Partido, considerando-me
ainda pera todos os efeitos senador eleito pelo circulo de Portalegre, enquanto não
terminar a minha legislatura. - a) Pais Abranches" (sic).

Em 1923 subiu ao poder local o Dr. Cosme dos Campos Callado, grande
proprietário e bacharel (embora nunca tenha exercido), o qual continuou a assegurar a
estabilidade política face às grandes convulsões a nível nacional provocadas pela
Ditadura Militar em 1926 e o início do Estado Novo. Estes acontecimentos revelaram-se
em Avis muito pouco significativos: o poder local continuou nas mãos do mesmo Dr.
Cosme dos Campos Callado até 1935, sendo presidente da câmara o grande proprietário
José Diogo Pais desde 1930, com a diferença de que antes eram eleitos e depois
passaram a ser nomeados administrativamente por alvará do governador civil do
distrito. Todo este processo revela uma clara oposição das elites de Avis aos partidos
tradicionais da República e à situação de instabilidade que a caracterizou e um
acolhimento muito favorável ao regime que se seguiu.

Este acolhimento deixou de ser tão favorável quando a União Nacional,


representada localmente pelo Dr. Jaime Joaquim Pimenta Presado (genro do maior
proprietário de Avis, José Lopes Coelho, mas de relações cortadas com toda a família da
mulher; aliás, fontes orais afirmam que os cunhados Luís Mendes Vieira Lopes e Dr.
Presado chegaram a lutar no meio da rua), começou a tentar aumentar a sua
interferência a nível dos órgãos do poder local.

A resistência das elites fundiárias locais à subida do poder do grupo do Dr.


Presado manifestou-se com a demissão em bloco dos elementos que compunham a
comissão administrativa da câmara municipal em 1935 e a subida ao poder do professor
primário José Francisco de Moura. Este amigo político do Dr. Presado foi nomeado
presidente da câmara entre 1935 e 1941, mas nunca foi inteiramente aceite pelas elites
fundiárias, não só por ser um elemento exterior ao grupo, mas também por ser do
Ervedal, e, segundo fontes orais da sede do concelho, beneficiar a sua freguesia em
detrimento de Avis. Estas divergências políticas, que tinham muito a ver com
divergências a nível pessoal, mais que propriamente ideológicas, culminaram no
incidente político não completamente esclarecido pelas fontes, mas que se resumem aos
seguintes acontecimentos: boicote das eleições de 1938 em algumas freguesias por parte
do grupo dos mais importantes membros da elite fundiária do concelho, desde José
Lopes Coelho, José Diogo Pais, José Valentim Varela e José Pais de Vasconcelos
Abranches (segundo fontes orais, Simão Teles Varela sentou-se à porta da assembleia
eleitoral do Maranhão com um pau, ameaçando bater em quem quisesse exercer o seu
direito de voto), repreensão dos organizadores do boicote por parte das autoridades
distritais, defesa por parte dos acusados e posterior afastamento de José Francisco de
Moura do poder.

O que é um facto é que em 1941 foi nomeado presidente da câmara o outro


genro de José Lopes Coelho, o qual também era seu sobrinho, pois, segundo um
descendente, Luís Mendes Vieira Lopes “tinha amigos mais fortes que o outro em
Portalegre”. A questão das amizades com o Governador Civil de Portalegre era algo
perfeitamente aceitável e até publicitado no Estado Novo. Por exemplo, na revista
Álbum Alentejano, 1933, elogia-se o Capitão Ricardo Vaz Monteiro, membro da família
de maiores proprietários da Ponte de Sor e governador desde 1930: "o sr. Cap. Vaz
Monteiro e a sua patriotica obra como Governador Civil do distrito de Portalegre (…) O
sr. capitão Ricardo Vaz Monteiro, faz do cargo que desempenha com tanta dedicação
um autêntico sacerdócio. (...) o sr. Governador tudo faz, tudo resolve (...) O sr. capitão
Vaz Monteiro é um homem digno de estudo. Ele não é como os outros governadores
civis! Tem um critério completamente contrário ao trivial em todos os governadores!
Ele nomeou as Câmaras, e Administradores de Concelho, por gente de sua absoluta
confiança. Depois o sr. Governador deixou de mandar para obedecer. Sempre no seu
posto ele é o árbitro de todos os assuntos entre o Estado e as Corporações
Administrativas (...) dá autoridade às Corporações dos seus Concelhos, limitando-se
apenas a servir de porta-voz perante os poderes constituídos, das aspirações locais. É
um Governador Civil Moderno (...) Todos os políticos bem intencionados, encontram
no sr. Capitão Vaz Monteiro um amigo, e sendo preciso um grande protector"(sic).

Em Avis todos os membros da elite acabaram por se filiar na União Nacional e


reassumir o controlo do poder local (Luís Mendes V. Lopes foi presidente da câmara
durante 14 anos), voltando as elites tradicionais ao poder que já ocupavam pelo menos
há dois séculos. E assim se resolvia a política a nível local…

Também no que diz respeito aos organismos corporativos, a sua introdução no


concelho de Avis foi relativamente tardia: o Grémio da Lavoura foi instalado apenas em
1940 e as Casas do Povo em 1941 (só a de Figueira e Barros é que foi mais cedo em
1937; ver anexo 5). No entanto o Grémio foi apenas a integração dos organismos já
existentes, o Celeiro da FNPT e o Sindicato Agrícola, e a resistência teve a ver com os
mesmos motivos pessoais: foi o Dr. Presado que assumiu a primeira presidência e os
outros lavradores continuavam a não gostar dele. Esta divisão de poderes, a câmara
municipal controlada pelo representante dos maiores proprietários e o grémio pelo seu
inimigo, parece estar relacionada com o facto dos cargos administrativos serem de
nomeação distrital enquanto os grémios dependiam directamente do Ministério e do
poder central, ao qual o Dr. Presado estava mais ligado por ser o representante local da
União Nacional.

5.3 - Padrão de continuidade ou renovação das elites políticas

Uma frase resume a política local em Avis durante estes 55 anos de grandes
mudanças em Portugal: plus ça change, plus c'est la méme chose. De facto, revelou-se
neste período uma forte hegemonia das elites económicas no poder político. As
alterações pontuais estiveram relacionadas com nomeações administrativas resultado da
interferência do poder central ou distrital na câmara municipal. Todos os actos eleitorais
resultaram na vitória dos caciques locais que controlavam o processo do recenseamento
e da eleição (as respectivas actas estão assinadas pelas mesmas pessoas que compõem a
câmara e que vencem as eleições). Assim, a única renovação das elites políticas que
ocorreu neste período esteve relacionada com a sucessão de gerações das mesmas
famílias no poder. Se em 1887 o presidente da câmara era José Lopes Coelho, em 1941
o presidente que ficou foi o seu neto Luís Mendes Vieira Lopes.
Capítulo 6 - Resumo das permanências e mudanças

Avis insere-se num distrito de grandes dimensões e numa das maiores regiões do
país, a qual é ao mesmo tempo a menos povoada. Um estudo local como este não pode
ter pretensões de apresentar conclusões generalizantes, apesar de serem muito prováveis
grandes semelhanças entre as elites deste concelho e as dos concelhos vizinhos. Assim,
neste capítulo pretendo apenas resumir algumas constatações abordadas neste trabalho a
partir das fontes apresentadas.

1. O grupo estudado constituiu de facto uma elite económica, política e social, que se
identifica como tal e é visto pelos outros como diferente. A homogeneidade deste
grupo era apenas exterior, pois entre os seus elementos verificavam-se, e eram
acentuadas pelos próprios, grandes diferenças. Esta homogeneidade e continuidade
da maior parte das famílias nos grupos de elite social e política já se manifestava
desde os finais do Antigo Regime, tendo sido abalada definitivamente apenas com o
25 de Abril de 1974 e posteriormente com a PAC a partir da adesão de Portugal à
CEE, actual UE.

2. Verificou-se a permanência destas elites no exercício do poder político, nos seus


vários organismos e instituições locais e a continuidade de algumas famílias da elite
fundiária nas mesmas.

3. Entre as mudanças salienta-se a alteração do estilo de vida dos lavradores que se


mudaram dos montes para as vilas, sobretudo no que diz respeito ao sector
feminino.

4. A saída de alguns membros das famílias estudadas para os grandes centros urbanos,
sobretudo para Lisboa, sempre existiu e continuou durante o período estudado; no
entanto, nenhuma destas famílias abandonou por completo a actividade agrícola ou
se tornou absentista, havendo sempre um ou mais membros lavradores e residentes
no concelho pelo menos até ao período das ocupações de terras no âmbito da
Reforma Agrária de 1975, a qual alterou de vez o panorama social e a posse da terra
nesta região e implicou percursos profissionais alternativos à lavoura e a mudança
de residência para fora do concelho da maior parte das gerações mais novas dos
lavradores de Avis.
5. Face às sucessivas alterações de regime que ocorreram neste período de 55 anos, o
poder local apresentou grande divergência em relação ao poder central e uma maior
estabilidade partidária.

Com este trabalho procuro, no fundo, estabelecer a ideia de uma continuidade do


grupo da elite no poder durante um período no qual as permanências se revelam mais
fortes que as mudanças, sobretudo a nível político, apesar de algumas alterações
significativas no estilo de vida das elites, influenciadas pelos variadíssimos factores
descritos.
Anexo 1: Profissões na Política Local

Lista dos Presidentes da Câmara de Avis:

... - 1886 - Joaquim de Figueiredo, Partido Regenerador, MC, farmacêutico, não era
proprietário rural.

1887 - 1889 - José Lopes Coelho, Partido Progressista, grande proprietário/lavrador.

1890 - 1892 - Francisco d'Abreu Callado, P. Progressista, grande proprietário / lavrador,


MC.

1892 - 1898 - João d'Abreu Callado, P. Progressista, MC.

1898 - 1904 - Jeronymo Lopes Coelho, grande proprietário / lavrador.

1904 - 1906 - José Pais de Vasconcelos Abranches, P. Progressista, grande proprietário


/ lavrador (em 1906 foi eleito deputado e foi para Lisboa).

1906 - 1908 - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade, padre, era vice-presidente e
substituiu o anterior.

1908 - 1910 - Dr. Cosme dos Campos Callado, P. Progressista, bacharel em Direito,
grande proprietário.

1910 - 1913 - Dr. Júlio Mário da Cunha e Sá, bacharel em Direito, nomeado por alvará
na República, grande proprietário.

1914 - 1918 - José Pais de Vasconcelos Abranches, o mesmo de 1904, P. Evolucionista.

1919 - 1921 - Dr. Manuel Lopes Varela, médico, grande proprietário / lavrador, P.
Evolucionista.

1921 - 1923 - Manuel Paes Monteiro, era vice-presidente e substituiu o anterior quando
ele morreu; pequeno proprietário, negociante e dono de lagar de azeite.

1923 - 1930 - Dr. Cosme dos Campos Calado, o mesmo de 1908, eleito pelo P.
Nacionalista e depois de 1926 nomeado por alvará do governador civil do distrito.

1930 - 1935 - José Diogo Pais, nomeado por alvará no Estado Novo, grande
proprietário.

1935 - 1941 - José Francisco de Moura, professor primário, membro da União Nacional.

1941 - ... - Luís Mendes Vieira Lopes, grande proprietário.


Poder Municipal, Concelho de Avis, Presidentes da Câmara e Vereadores:

1886:
Presidente da Câmara: - Joaquim de Figueiredo, farmacêutico.
Vogais: - José Sebastião Godinho de Campos, proprietário
- José da Motta Casqueiro Júnior, carpinteiro
- João Augusto de Mattos
20/3/1887:
Presidente da Câmara: - José Lopes Coelho, proprietário

1890-1892:
Presidente da Câmara: - Francisco d'Abreu Callado, proprietário
Vereadores efectivos: - João Telles Varella, proprietário
- Francisco de Paula Varella de Brito, pequeno proprietário
- Manuel de Carvalho, proprietário

1893 - 1895:
Presidente da Câmara: - João d'Abreu Callado, proprietário e negociante
Vereadores efectivos: - Caetano Varella Telles, proprietário
- Joaquim Augusto Risques, farmacêutico
- Luís Sérgio Lopes de Castro, pequeno proprietário
- João Telles Varella, proprietário
- Francisco d'Abreu Callado, proprietário
- José Sebastião Godinho de Campos, proprietário
Vereadores suplentes: - António Lopes Coelho, proprietário
- José Valentim Varella, proprietário
- João Marques Serrão, comerciante
- José Sebastião Lobato, ferreiro
- José Diogo Paes, proprietário
- Ernesto de Carvalho, proprietário
1896 - 1898:
Presidente da Câmara: - João d'Abreu Callado, proprietário e negociante
Vereadores efectivos: - José Lopes Coelho, proprietário
- José Diogo Paes, proprietário
- Manuel João Caldeira de Carvalho, proprietário
- Simão Telles Varella, agricultor
- José Filippe Gomes, agricultor
- António Vasco Paez, proprietário

1899 - 1902:
Presidente da Câmara: - José Diogo Paes, proprietário
Vereadores efectivos: - Jeronymo José Lopes, proprietário
- António Vasco Paes, proprietário
- Simão Telles Varella, proprietário/rendeiro
- José Francisco da Costa, pequeno proprietário
Vereadores substitutos: - José Lopes Coelho, proprietário
- António Joaquim Rangel
- Maurício José Gomes, proprietário
- José Paula Varela de Brito, pequeno proprietário
- José d'Abreu Callado, proprietário

1902 - 1904:
Presidente da Câmara: - Jeronymo Lopes Coelho, proprietário
Vereadores: - José Godinho d'Abreu (vice-presidente), proprietário
- Cónego José Ricardo Freire d'Andrade, pároco
- Francisco Telles Varella, proprietário
- António Vasco Paes, peq. proprietário
- Jeronymo Lopes Coelho, proprietário
Substitutos: - José Lopes Coelho, proprietário
- José da Motta Casqueiro, carpinteiro
- Maurício José Gomes, pequeno proprietário
- António Ildefonso, pequeno proprietário
- Joaquim Monteiro, proprietário

1905 - 1908:
Presidente da Câmara:- José Pais de Vasconcelos Abranches, proprietário, até
29/4/1906, quando foi eleito deputado e foi para Lisboa.
Vereadores: - Dr. Cosme dos Campos Callado (vice-presidente), bacharel em
Direito / proprietário, presidente a partir de 1906.
- Cónego José Ricardo Freire d'Andrade, vice-presidente
- José Joaquim de Carvalho, proprietário
- José Diogo Paes, proprietário
Vogais Substitutos: - Roberto Evaristo da Cunha e Sá, proprietário
- Simão Telles Varella, proprietário
- Joaquim d'Abreu Callado, proprietário
- João da Costa, peq. proprietário
- Joaquim Manuel Telles de Carvalho, proprietário.

1909 - 1910:
Presidente: - Dr. Cosme dos Campos Callado, Bacharel
Vereadores: - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade, pároco, vice-presidente
- João Marianno Telles, proprietário
- Simão Telles Varella, proprietário
- António Vidigal Simas, comerciante
Substitutos: - Joaquim Manuel Telles de Carvalho, proprietário
- Padre Joaquim Mathias Simões, pároco
- José Valentim Varella Junior, proprietário, filho de MC
- Joaquim Telles Varella Junior, proprietário, filho de MC
- José Lopes Coelho, proprietário

16/10/1910 foram nomeados para a comissão administrativa da CMA:


Presidente - Dr. Júlio Mário da Cunha e Sá, bacharel em Direito, proprietário
Vogais - João Pais Rodrigues de Canavilhas
- Alexandre Domingos da Costa, comerciante
- Manuel Augusto de Azevedo
Livro de actas da sessão de 28/5/1911:
Presidente: - Dr. Júlio Mário da Cunha e Sá, proprietário e bacharel em Direito
- Benjamim Victorino Ruivo, comerciante
- João Paes Rodrigues Canavilhas
- Alexandre Domingos da Costa, comerciante

1911 - 1913:
Presidente da Câmara: - Dr. Júlio Mário da Cunha e Sá, proprietário e bacharel
Vereadores: - Henrique Bernardo Pisa, comerciante
- António José Caias, seareiro
- Francisco António Paes, proprietário, escrivão de direito
- João António d'Abreu e Castro, fiscal aposentado
- José António Marques, carpinteiro

1914 - 1916:
Presidente: - José Paes de Vasconcellos Abranches, proprietário.
Vice-Presidente: - Joaquim Manoel Teles de Carvalho, proprietário
Secretário: - José Valentim Varela Junior, proprietário
Vice-Secretário: - Manoel Paes Monteiro, proprietário
Comissão Executiva da Câmara:
Presidente: - José Ricardo Freire d'Andrade, pároco
Secretário: - Simão Telles Varella, proprietário
Vogais efectivos: - Manuel Augusto d'Azevedo, proprietário
- Francisco Barreto d'Abreu, proprietário
- Luís Lúcio Rebocho, sapateiro
Suplentes: - José Varela de Brito Paes, proprietário
- Carlos Abelha de Carvalho, carpinteiro
- João d'Almeida Canejo, pároco
- Francisco Custódio Sombreireiro, sapateiro
- Francisco António da Costa, agricultor
Houve ainda 8 vereadores eleitos nas eleições de 30/11/1913, mas que não participaram
nesta sessão da Câmara nem chegaram a assumir cargo nenhum: José Diogo Paes,
propr.; João Nobre, barbeiro; Francisco António Paes, propr.; João Gonçalvez,
industrial; Benjamim Victorino Ruivo, comerciante; Manuel Dordio Paes, peq. propr.;
José Filipe Gomes, peq. propr.; Joaquim Augusto Risques, Farmacêutico

1916 - 1917:
Presidente da CMA: - José Pais de Vasconcellos Abranches, proprietário, Ervedal
Vereadores: - Francisco Manuel Velez, ferreiro
- Joaquim Manuel Telles de Carvalho, proprietário
- Francisco Barreto d'Abreu, Benavilla, proprietário
- Manuel Augusto d'Azevedo, Avis, proprietário
- José Filipe Gomes, Avis, proprietário
- Joaquim Monteiro dos Ramos, carpinteiro
- Carlos Abelha de Carvalho, carpinteiro
- Luíz Lúcio Rebocho, Ervedal, sapateiro
- Francisco Custódio Sombreireiro, Avis, sapateiro
- João Nobre, Avis, barbeiro
- José Ricardo Freire d'Andrade, Avis, Pároco
- Simão Teles Varela, Maranhão, proprietário
- João d'Almeida Canejo, Ervedal, Pároco

1917 - 1918:
Presidente da CMA: - José Pais de Vasconcelos Abranches, proprietário
Vice-Presidente: - Simão Teles Varela, proprietário
1º Secretário: - Manuel Pais Monteiro, pequeno proprietário e industrial
2º Secretário: - Pedro Pólvora d'Almeida Gazzo, alfaiate
Vereadores: - Francisco Barreto d'Abreu, proprietário
- Francisco Custódio Sombreireiro, sapateiro
Comissão Executiva:
Presidente: - José Ricardo Freire d'Andrade, pároco
Vogais: - Manuel Augusto d'Azevedo, proprietário
- Luís Lúcio Rebocho, sapateiro
- Carlos Abelha de Carvalho, carpinteiro
Suplentes: - João d'Almeida Canejo, pároco
- Francisco Manuel Velez, ferreiro

1918:
Presidente: - José Pais de Vasconcelos Abranches, proprietário
Vice-Presidente: - Simão Teles Varela, proprietário
Secretários: - João d'Almeida Canejo, padre
- Manuel Pais Monteiro, pequeno proprietário e industrial
Comissão Executiva ou administrativa:
Presidente: - José Ricardo Freire d'Andrade, pároco
Vice-Presidente: - Manuel Augusto d'Azevedo, proprietário
Vogais: - Luís Lúcio Rebocho, sapateiro
- Francisco Manuel Velez, ferreiro
- Joaquim Monteiro dos Ramos, carpinteiro
- Francisco Custodio Sombreireiro, sapateiro
- Carlos Abelha de Carvalho, carpinteiro
- José Boto, ferreiro e comerciante
- José Lopes Coelho, proprietário
- José Godinho d'Abreu, proprietário
- Adriano Freire de Carvalho
Mas esta administração durou pouco, pois em 11/7/1918 o presidente da Comissão
administrativa era: Jeronymo Lopes Coelho, propr.; e em 27/11/1918 já era José Diogo
Paes, propr.; até que em 27/3/1919 passou a ser: Simão Teles Varela, propr. Entretanto,
Jeronymo Lopes Coelho e o cónego José Ricardo Freire d'Andrade morreram com a
febre pneumónica que assolou o país nesses anos.
28/1/1919 - 1921:
Presidente da CMA: - Dr. Manuel Lopes Varela, médico/proprietário que morreu em
22/11/1921 e foi substituído pelo vice-presidente.
Vice-Presidente: - Manuel Paez Monteiro, pequeno proprietário e industrial
5 Vogais efectivos: - Simão Teles Varela, proprietário
- Manuel Augusto d'Azevedo, proprietário
- Luís Lúcio Rebocho, sapateiro
- Francisco Barreto d'Abreu, proprietário
- José Ruivo Feijão, peq. proprietário
Vogais substitutos: - Joaquim Monteiro dos Ramos, carpinteiro
- José Joaquim de Carvalho, proprietário
- Padre João d'Almeida Canejo, pároco
- José Joaquim de Nascimento, pequeno proprietário
- Francisco dos Santos Correia, caixeiro
- Francisco Velez Grilo, dono de hospedaria e de lagar de azeite

1922 - 1923:
Presidente: - Manuel Paes Monteiro, peq. proprietário
Vice-Presidente: - Francisco dos Santos Correia, caixeiro
5 Vogais para a Comissão Executiva: - Simão Teles Varela, proprietário
- Luís Lúcio Rebocho, sapateiro
- Francisco Manoel Velez, ferreiro
- Francisco Barreto d'Abreu, proprietário
- José Ruivo Feijão, peq. proprietário
Substitutos: - Joaquim Monteiro dos Ramos, carpinteiro
- José Joaquim do Nascimento, peq. proprietário
- Mário Coutinho de Figueiredo, farmacêurtico
- Francisco Velez Grilo, industrial

1923 - 1925:
Presidente: - Dr. Cosme dos Campos Callado, bacharel em Direito e propr.
Vice-Presidente: - José Filipe Gomes, peq. proprietário
Secretários: - Francisco dos Santos Correia, caixeiro
- Abílio Maria Pinto, peq. proprietário
3 Vogais efectivos para a Comissão Executiva:- Dr. José Paes Teles, bacharel, propr.
- Simão Teles Varela, proprietário
- Luís Mendes Vieira Lopes, proprietário
Suplentes: - Francisco Manuel Velez, ferreiro
- José Diogo Paez, proprietário
- João Gonçalvez, guarda-fios
2/1/1926: acto de posse da nova Câmara para o triénio 1926-28
Presidente: - Dr. Cosme dos Campos Callado, bacharel, proprietário
Vice-Presidente: - José Valentim Varella, proprietário
Secretários: - José Ruivo Feijão, peq. proprietário
- José Varela da Silva Paes, peq. proprietário
3 Vogais efectivos: - Luís Mendes Vieira Lopes, proprietário
- José Diogo Paez, proprietário
- Francisco Velez Grilo, industrial
Vogais Substitutos: - Francisco Paes Varela de Brito, peq. proprietário, telegrafista
- José Joaquim de Carvalho, proprietário
- José Velez de Vargas, peq. proprietário
Revolução de 28/5/1926
Acta de Instalação e Posse da nova Câmara em 28/6/1926.
Com a presença do cidadão Jayme de Castro, "administrador do concelho...". Os
cidadão que ocuparam os cargos foram "nomeados por alvará do Exmo. Governador
Civil, vogaes da comissão administrativa d'este municipio, para interinamente gerirem
os negocios do mesmo municipio...". Já de vez sem eleições municipais, os nomeados
passam a ter o cargo de vogais da comissão administrativa:
- Dr. Cosme dos Campos Callado, bacharel em Direito, proprietário
- José Diogo Paes, proprietário
- Francisco Velez Grilo, industrial
5/6/1930: Acta de posse da nova Comissão administrativa nomeada por alvará:
Presidente: - José Diogo Paes, proprietário
vogais: - Francisco Barreto d'Abreu (vice-presidente), proprietário
- José Varela da Silva Paez (secretário), proprietário
Em 1/10/1930, tomaram posse por alvará, os vogais
- José Lopes Coelho, proprietário
- Francisco Velez Grilo, industrial
(o presidente continua a ser o José Diogo Paes)
7/10/1933: Tomou posse novos membros da Comissão Administrativa, sendo o
Presidente da CMA José Diogo Paes, proprietário:
Presidente: - Dr. Cosme dos Campos Callado, bacharel, proprietário
Vogais: - José Lopes Coelho, proprietário
- Francisco Velez Grilo, industrial
- Arnaldo Raul da Rosa Mendes, ajudante e proprietário de Farmácia
26/12/1934:
Nesta data ocupavam os cargos municipais:
Presidente: José Diogo Paes, proprietário
Comissão Administrativa da CMA:
- Cosme dos Campos Callado, bacharel, proprietário
- José Lopes Coelho, proprietário
- Francisco Velez Grilo, industrial
27/5/1935:
Tomada de posse da nova Comissão Administrativa nomeada pelo Governador Civil:
Presidente. - José Francisco de Moura, professor
vogais: - José Valentim Varela, proprietário
- Francisco António da Costa, peq. proprietário
17/1/1938:
Presidente: - José Francisco de Moura, professor
Vogais: - Manuel Varela Teles, peq. proprietário
- António Joaquim Estalagem, comerciante
Substitutos: - Francisco Marques Serrão, comerciante
- João do Nascimento Ferreira de Morais, comerciante
- Francisco Paes Dordio, peq. proprietário
25/10/1941: Presidente: - Luís Mendes Vieira Lopes, proprietário

Os Juízes de Paz (cargo electivo):


Lista a partir dos Anuários Comerciais:

1901:
Avis - António Lopes Coelho, lavrador de Avis e irmão do presidente da
Câmara eleito este ano, Jeronymo Lopes Coelho.
Benavila - João d'Abreu Callado, comerciante, família dos maiores proprietários
desta freguesia.
Ervedal - Francisco António Pais, grande proprietário e filho do 4º MC deste ano.
Nas restantes freguesias não havia.

1908:
Avis - António Lopes Coelho, lavrador de Avis, irmão do Administrador do
concelho, Jeronymo Lopes Coelho.
Benavila - João d'Abreu Callado
Ervedal - Joaquim Paula Varela de Brito, família de pequenos proprietários.
1917:
Avis - António Lopes Coelho, grande proprietário
Benavila - Manoel Prates Pina, família de lavradores e rendeiros
Ervedal - Joaquim Paula Varela de Brito, pequeno proprietário

1928:
Avis - "O official do Registo Civil", nesta altura este cargo deixou de ser
electivo e passou a ter menos importância.
Anexo 2: Profissões dos eleitores do concelho de Avis
Anexo 3: Moradas dos eleitores no concelho de Avis
Anexo 4: Famílias de Avis
1 - Varelas
2 - Lopes
3 - Braga
4 - Cunha e Sá
5 - Teles de Carvalho
6 - Pais
7 - Figueiredo
8 - Godinho d'Abreu Callado

1 - Família Varela
Esta família de lavradores existia no concelho de Avis pelo menos desde os finais do
século XVIII, surgindo nas pautas de elegíveis de 1799 (ANTT, Desembargo do Paço.
Alentejo e Algave. Pautas. Maços 750, 763 e 764, caixas 844, 857 e 858) um Gonçallo
Varella Leão, natural do termo da vila, com 64 anos (n. c. 1735). Casou com uma irmã
do Capitão João Vaz Teles e teve 2 filhos:
1 - Domingos Joaquim Varella, n. c. 1766, lavrador e almotacé, casado com uma irmã
de José da Costa:
1.1 - Simão Varella, lavrador e morador na Herdade da Amendonça, n. c. 1806,
casou e ficou viúvo muito cedo.

1.2 - Manuel João Varela, n. c. 1812.

2 - Gonçalo Varela, pai de:

2.1 - Simão Varela, capitão d'ordenanças, solteiro em 1832.

Também em 1799 vem referido o Capitão João Vaz Telles, natural de Avis e com 38
anos. A junção destas duas famílias deu origem aos Telles Varella ou Varella Telles.
Eram lavradores rendeiros que compraram várias terras desde Avis até ao Alcórrego,
Ervedal, Casa Branca e Sousel em meados do século XIX.

Entre os seus descendentes destacam-se em Avis:

- Francisco Telles Varella, casado com Marcelina Rosa e pai dos 5 Varelas do Monte
Outeiro de Baixo

- um seu irmão cujo nome não apurei, pai de

- José Valentim Varela, da Quinta do Pinheiro e do Monte Outeiro de Cima.

- Joaquim Valentim Varela, que morava na Casa Branca e era antepassado de


Maria Teresa Pais e Silva que casou com o Dr. Joaquim Mendes Vieira Lopes Coelho.

- Luís Valentim Varela, estudou em Coímbra e foi advogado em Évora


Os dois Josés Varela, cerca de 1900: José Varela Telles, do Monte Outeiro de Baixo e
José Valentim Varela do Monte Outeiro de Cima eram primos direitos e grandes
amigos. Moravam em montes próximos e ambos ficaram viúvos cedo. Curiosamente,
nenhum dos filhos de um casou com os filhos do outro, talvez porque os do Monte
Outeiro de Baixo eram muitos e ficaram mais pobres.

Família Varela do Monte Outeiro de Baixo:

Francisco Teles Varela, nat. Freg. de São Pedro do Alcórrego, casado com Marcelina
Rosa. São tios direitos de José Valentim Varela e pais dos que se seguem:

1 - João Telles Varela, n. c. 1832, m. ?, Lavrador do Maranhão, rendeiro de Camões; foi


vereador desde 1890 a 1895. Casado com Arcângela de Jesus dos Ramos, pais de:

1.1 - Simão Teles Varela, n. c. 1869, m. 8/5/1942, casado com D. Maria Luísa
Dordio da Silva Rebocho; não tiveram filhos.

1.2 - Francisco Telles Varela, casado com Ana Mendes Lopes, filha de José
Lopes Coelho; não tiveram filhos.

1.3 - Maria Telles Varela, nunca casou.

2 - José Varela Teles, res. Monte Outeiro de Baixo, natural da freg. de Santo António do
Alcórrego, casado com Margarida Ignácia (não tinha mais nomes), filha de Luís Martins
e de Maria de Conceição, nat. freg. Santo António do Alcórrego, conc. Avis, profissão:
"do governo da casa", m. c. 1897.
Res. Monte Outeiro, Avis, proprietário, n. 19/4/1844, m. 27/8/1929, com 85 anos. Em
7/8/1920 fez escritura de doação de bens em vida aos filhos e respectivos cônjuges: "fês
doação de todos os seus bens com o encargo de pensão, aos seguintes filhos:"(sic).
2.1- Francisco Teles Varela, n. 1868, casado com Rosaria de Jesus Nobre, res.
Avis, com 7 filhos.
2.2 - Luís Teles Varela, n. 1871, res. Monte Outeiro, não teve filhos
2.3 - Marcelina Rosa Varela Gomes, n. 8/4/1873, m. 1944, casada com José
Filipe Gomes, n. 1869, m. 28/10/1947, proprietário, res. Avis. As duas filhas deste casal
(2.3.1 e 2.3.2) fizeram a 4ª classe na escola oficial de Avis, com a Professora Clara
Namorado e depois estudaram em Portalegre. Ficaram em casa de um padre que recebia
meninas e frequentavam o liceu. Depois do 5º ano em Portalegre (actual 9º), a mais
velha frequentou a Escola de Telecomunicações e Telégrafos, habilitando-se
profissionalmente para exercer as funções de chefe da estação de correio de Avis. A
mais nova foi para Lisboa completar o ensino secundário no Liceu do Carmo, voltando
sempre a Avis nas férias. Chegou a frequentar a Faculdade de Farmácia de Lisboa, c.
1931, não completando o curso. Foi a primeira menina de Avis a frequentar a faculdade
e a sua filha Maria Manuela Gomes de Figueiredo Pais foi a primeira a completar um
curso superior.
2.3.1 - Margarida Varela Gomes Botas, n. 24/4/1904, m. 1983,
funcionária dos correios, casada com Manuel António Botas, dono de
lagar, sem filhos.
2.3.2 - Catarina Varela Gomes de Figueiredo Pais, n. 21/4/1907,
casada em 1928 com Eurico Barreto de Figueiredo Pais, n. 12/1906, m.
23/3/1951, solicitador, funcionário da FNPT e do Grémio da Lavoura.
Provedor da Santa Casa da Misericórdia. Com 2 filhos farmacêuticos.
2.4 - João Teles Varela, n. 1875, viúvo, proprietário, res. Monte Outeiro, não
teve filhos
2.5 - Joaquim Teles Varela, n. 1878, casado com Maria Victória Paez,
proprietário, res. Cano, concelho de Sousel, com 1 filho
2.6 - Tomás Teles Varela, n. 1881, casado com Mariana Pais Rovisco Varela,
proprietário, res. freg. Casa Branca, conc. Sousel, com 7 filhos.
2.7 - Maria da Conceição Varela Pais Dordio, n. 1883, casada com José Pais
Dordio, proprietário, res. Ervedal, com 5 filhos
2.8 - Simão Varela Teles, n. 1886, casado com Emília Rosa Correia, propr., res.
Herdade do Montinho da Dourada, em Avis, com 6 filhos
2.9 - Caetano Teles Varela, n. 1888, propr., res. Monte Outeiro, com 4 filhos
2.10 - Manuel Varela Teles, n. 1891, proprietário, res. Monte Outeiro, com 3
filhos
2.11 - António Teles Varela, n. 1894, casado, propr., freg. Avis, com 8 filhos
Inventário dos bens de José Varela Telles em 1920, data da escritura de doação:
Bens imóveis: Herdade "Monte Outeiro de Baixo", "Torrinha" ou "Torrinha do
Alcórrego", "Montinho do Leão" ou "Courela dos Leõezinhos"; uma morada de casas
em construção em Avis
Todos os interessados ficaram obrigados a pagar anualmente ao doador a pensão de 60
l. de trigo e 100$00 em dinheiro e para os efeitos legais se avalia o encargo de cada uma
das pensões em 112$00.

3 - Caetano Teles Varela: vereador em 1892, MC, elegível, proprietário, res. Avis, n. c.
1845, m. ? Res. Figueiras, Casou com senhora da família Lopes, teve 4 filhos.
4 - Joaquim Teles Varela, "da Cortesia", morou na Marrã, com casa em Avis na R.
Joaquim de Figueiredo, n. c. 1847, m. 21/1/1926. Casado com D. Felisberta Mendes
Varela, com 8 filhos. Uma das filhas casou com Francisco Marques Serrão,
comerciante, sobrinho de João Marques Serrão.

O seu inventário orfanológico é rigoroso, muito completo e bastante extenso, com 91


itens!
Imóveis: predomina a terra de semeadura, as azinheiras e as oliveiras. Herdades "Monte
da Estrada", "Marrã", "Cortesia e Galgarrão"; 1 lagar para azeite com quintal anexo
nos subúrbios da vila de Avis e respectivos aparelhos; 1 celeiro no Convento de Avis e
várias casas em Avis.

5 - D. Joana Maria Adélia Teles Varela, casada com um Dr. Cardoso de Lemos,
descendente do lavrador João Maira de Lemos, moradores na Freg. da Casa Branca,
conc. Sousel.

6 - Simão Teles Varela, morreu novo.

Família Varela do Monte Outeiro de Cima:


José Valentim Varela, casado com D. Ana de Jesus Lopes Varela
N. c. 1840, m. 17/12/1914.

Bens do inventário por morte:

- mobiliários: vários móveis e semoventes (sobretudo ovelhas, porcos e bois)

- imobiliários: Herdades "Quinta do Pinheiro", "Monte Outeiro de Cima",


"Ramalho", "Caniceira"; domínio directo e foro anual de 37$000 na herdade de
"Cagarráz"; alguns dos bens situados no concelho de Sousel: um grupo de courelas
seguidas; 2 herdades "Olival" e "Mourata"; 1 herdade "Louvada"; um domínio directo
de que recebe foro annual.

Filhos:

1 - Dr. Manuel Lopes Varela (n. c. 1870, m. 22/11/1921), casado com Luísa Mendes
Lopes Varela, filha de José Lopes Coelho Sr.

1.1 - Alda Lopes Varela, casada com Asdrúbal Braga, sem filhos.

1.2 - Artur Lopes Varela, prof. de liceu, área de letras, casado com D. Etelvina,
com 2 filhos 1.3 - Alzira Lopes Varela, nunca casou, m. 26/4/1996.

1.4 - Arnaldo Lopes Varela, não casou; teve filha ilegítima: Rosa Varela

2 - D. Maria do Carmo Lopes Varela, solteira, demente

3 - D. Rosa de Viterbo Lopes Varela, casada com José Lopes Coelho Jr, filho de José
Lopes Coelho Sr.

3.1 - Ana Varela Lopes (n. 13/3/1896, em Avis, m. 18/6/1976), casada com Luís
Mendes Vieira Lopes (n. c. 1895, m. 16/8/1974)

3.1.1 - José Vieira Lopes Coelho (n.1/9/1924, m. 23/8/1994), casado com


Leonor Lopes Fernandes Vieira Lopes, filha de João Fernandes de Évora, 3 filhos
3.1.2- Joaquim Mendes Vieira Lopes Coelho, n. 4/3/1927, veterinário.
Casou com Maria Teresa Pais e Silva Vieira Lopes em 21/6/1959.

3.2 - Maria Teresa Varela Lopes Presado, n. c. 1906, m. c. 1980, casada com Dr.
Jayme Joaquim Pimenta Presado.

4 - José Valentim Varela Júnior (n. c. 1881 e m. 10/3/1954), casado com D. Ida
Magalhães, da Ponte de Sôr

4.1 - Dr. Álvaro Magalhães Varela, solteiro, veterinário, res. Avis.

4.2 - Idalina Machado Magalhães Varela Pina, casada com Dr. Artur Pina,
oftalmologista, residente em Lisboa, com 3 filhos

2 - Família Lopes:

Esta família de Avis tem a mesma origem da família de José Lopes Coelho do monte do
Serrado, freg. do Maranhão. Já nos livros das décimas de 1828 surge um José Lopes que
paga este imposto sobre esta mesma herdade. São parentes próximos dos Lopes Aleixo
de Cabeção e dos Pereira Lopes de Pavia, concelho de Mora.

Nas pautas dos elegíveis para os cargos de vereadores do concelho em 1799 surge um
"Manoel Lopes Pereira Conde natural do termo desta Villa", com 54 anos (n. c. 1745).
Em 1829 já vêm referidos os seguintes: João Lopes Seborro, lavrador, e "Luís Mendes
Fortio, Cirurgião nesta Villa, onde tem sido almotacé".

Em 1832 aparece um António Lopes, casado, filho de José Lopes, morador no termo
desta vila (monte do Serrado); e um Pedro Coelho, lavrador. Infelizmente não vêm
mencionadas as idades. Pedro Coelho era compadre do Capitão José Pais Teles, pois foi
padrinho do seu 20º filho. Casou com Arcângela Lopes, filha de Vasco José da Silva e
de uma irmã de António Lopes, filha de José Lopes (os apelidos podiam ser os do pai
ou da mãe). Pedro Coelho e Arcângela Lopes foram pais de:

José Lopes Coelho, n. 30/12/1841, m. 31/5/1889, casado com Maria Teresa Lopes
Fortio, filha de Luís Mendes Fortio, um cirurgião casado com uma senhora da família
Lopes. Daí os filhos deste casal terem nomes que variam entre todos estes apelidos:
Mendes, Lopes e Coelho. Curiosamente, nenhum dos filhos se chamou Fortio.

Este casal morava no monte da Machadinha e o senhor morreu com 47 anos. Nessa
altura a mulher veio do monte para a vila e instalou-se na casa da Rua do Convento, que
depois ficou para o filho José Lopes Coelho.

Foi Presidente da Câmara em 1887.

José Lopes Coelho, casado com Maria Teresa Lopes Fortio


n. 30/12/1841, m. 31/5/1889. Este casal morava no monte da Machadinha e o senhor
morreu com 47 anos. Nessa altura a mulher veio do monte para a vila e instalou-se na
casa da Rua do Convento, que depois ficou para o filho José Lopes Coelho.

Foi Presidente da Câmara em 1887.

Filhos:

1 - Luís Mendes Lopes Coelho, n.c.1860, m. 1887. Administrador do concelho em


1887. Morreu tuberculoso em 1887, com 27 anos.
2 - Maria Luísa Lopes Mendes, casada com João Marques Serrão, comerciante.
Herdade: Collos

2.1 - Maria Luísa Serrão, não casou

3 - Ana Mendes Lopes, casada com Francisco Telles Varella (filho de João Telles
Varella), sem filhos.

4 - Luísa Mendes Lopes Varela, casada com Dr. Manuel Lopes Varela, filho de José
Valentim Varela

4.1 - Alda Lopes Varela, casada com Asdrúbal Braga, sem filhos.

4.2 - Artur Lopes Varela, prof. de liceu, área de letras, casado com D. Etelvina,
com 2 filhos 4.3 - Alzira Lopes Varela, , n. c. 1903, m. 1996, nunca casou

4.4 - Arnaldo Lopes Varela, não casou

5 - António Lopes Coelho (n. c. 1867, m. 1927), casado com Ernestina Augusta Lopes

Bens Imóveis:

- Herdade "Torrinha", freg. Avis, com c. 230 ha

- vários domínios directos em enfiteuse

- casas em Avis

5.1 - José Lopes Coelho Júnior, n. c. 1892, m. 1910

6 - Joaquim Mendes Lopes Coelho, n. c. 1870, m. ?, farmacêutico, casado com Joana


Margarida d'Almeida Viera Lopes

6.1 - Luís Mendes Vieira Lopes (n. c. 1895, m. 16/8/1974), casado com Ana
Varela Lopes (7.1): 6.1.1 = 7.1.1, etc.

6.2 - José Homem Vieira Lopes, res. Évora, casado com Maria Teresa Carvalho,
com 1 filha

7 - José Lopes Coelho (n. 1873, m. 6/7/1952), casado com D. Rosa Viterbo Lopes
Varela, filha de José Valentim Varela.
Fez testamento em 11/9/1935, no qual introduziu a cláusula que diz que se uma das
filhas não tiver filhos, os bens que esta herdar vão para os filhos da outra.

Inventário instituído em 1/8/1952: Lista das Herdades: Rocha e Anexos, no Alcórrego,


Cagarráz (esta era do José Valentim Varela Sénior, que decerto a deixou à filha Rosa
Viterbo Lopes Varela, logo aparece no inventário do marido), freg. Alcórrego; Samarra
(parte), Alcórrego, Monte Outeiro de Cima (outra herdade que era da mulher),
Machadinha (esta herdou-a da mãe), Avis, Sobral, Ervedal, Cavalos, Figueira e
Barros, Lameira, Ervedal

7.1 - Ana Varela Lopes (n. 13/3/1896, em Avis, m. 18/6/1976), casada com Luís
Mendes Vieira Lopes (6.1)

7.1.1 - Luís Diogo Vieira Lopes, n. 1921, m. 1923.

7.1.2 - José Vieira Lopes Coelho (n.1/9/1924, m. 23/8/1994), casado com


Leonor Lopes Fernandes Vieira Lopes, filha de João Fernandes de Évora, com 3 filhos

7.1.3 - Joaquim Mendes Vieira Lopes Coelho, n. 4/3/1927, veterinário,


casou com Maria Teresa Pais e Silva Vieira Lopes em 21/6/1959.

7.2 - Maria Teresa Varela Lopes Presado, n. 28/1/1906, m. 1978, casada com Dr.
Jayme Joaquim Pimenta Presado.

8 - Jerónimo Lopes Coelho, n. c. 1876, m. 31/10/1918, em Mora, com a febre


pneumónica; casado com D. Rosa Amélia d'Almeida Vieira Lopes

Cargos que exerceu em Avis:

- Presidente da Câmara em 1901

- Administrador do Concelho em 1906

- Presidente da Comissão Administrativa da CMA de 11/7/1918 até morrer

Herdades: A Covada, que ficou para o filho Joaquim, sit. em Avis e com c. 700
hectares, Boeicaros de Baixo, em Pavia, concelho de Mora.

8.1 - Arminda d'Almeida Vieira Lopes, casada Dr. José Brotero Santa Bárbara,
médico e militar, res. em Lisboa, com 1 filho também médico e oficial da marinha

8.2 - Joaquim Mendes Vieira Lopes, médico, casado com Maria de Lurdes
Silvério

8.2.1 - Jerónimo Vieira Lopes, n. c. 1935, casado e com 3 filhos

8.2.2 - Hortense Vieira Lopes casada com o Dr. Luís Costa Marçal de
Évora, com 2 filhos e uma filha casada com o 7.1.2.3
8.3 - Maria Amélia d'Almeida Vieira Lopes, casada com Joaquim Mexia
d'Almeida, c/ 1 filho

3 - Família Braga:

Manuel Joaquim da Costa Braga, m. 27/5/1895.

De origens humildes (era "industrial de peixe"!), casou com D. Arcângela Angélica


Godinho, da família Marques Godinho, das Galveias. O casal era residente na Herdade
da Torre de Sepúlveda, nas Galveias, mas os filhos casaram com senhoras de Avis e
alguns ficaram a residir no concelho. Tinham casas na vila e nos montes.

Filhos:
1 - Cosme Godinho da Costa Braga, casado com Maria Ana Garcia Marques Godinho
Braga

1.1 - Aníbal Godinho Braga, n. 1891, sem filhos

1.2 - Vergílio Godinho Braga, n. 1893, engenheiro militar

1.3 - D. Lobélia Godinho Braga, n. 1895, casada em 1919 com Dr. Manuel Teles
Barradas de Carvalho, bacharel em Direito, escritor

1.3.1 - Joaquim Manuel Godinho Braga Barradas de Carvalho, n. 1920,


professor na Sorbonne, em Paris, casado com uma senhora Aarons
1.3.1.1 - Um filho chamado Aarons de Carvalho
1.3.2 - D. Maria Ana Godinho Braga Barradas de Carvalho, n. 1921

1.4 - Asdrúbal Braga, n. 1899 (ainda é vivo), casado com Alda Varela, filha do
Dr. Manuel Lopes Varela, sem filhos

1.5 - José Garcia Godinho Braga, n. 1900, casado com Adília Braga Pais (2.3),
filha de José Diogo Pais, grande proprietário e Presidente da Câmara. Sem filhos

1.7 - Cosme Braga, n. 1907, sem filhos

2 - D. Belmira Augusta da Costa Braga Pais + José Diogo Pais, neto de MC, presidente
da CMA

2.1 - Manuel Braga Pais, demente, n. c. 1895

2.2 - João Pedro Pais, casado, sem filhos

2.3 - Adília Braga Pais + José Garcia Godinho Braga (1.4), primos direitos, sem
filhos.

3 - Belarmino Joaquim da Costa Braga


3.1 - Manuel, eng., professor da escola industrial, teve 2 filhos e 2 filhas.

4 - Avelino Cosme Godinho Braga (em 1915 é o provedor da Misericórdia de Galveias),


casado com D. Maria Augusta Marques Couceiro, com 4 filhos.

Não está na lista dos MC do concelho de Avis, pois pertencia ao concelho de Galveias.

O neto Asdrúbal Braga foi rendeiro das terras dos irmãos, que eram proprietários
absentistas, viviam em Lisboa com as rendas que recebiam.

Inventário Orfanológico de Manuel Joaquim da Costa Braga em 1895:

Relação dos Bens no concelho de Avis:

Imóveis (predomina o montado de azinho e o olival, além das terras de semeadura):


Herdades "Fonte-Ferreira", "Tassalho", "Giralda", "Paínho", "Ferradeira", "Vale de
Paú e anexas" (32.400$000), "Vaz Varella" ou "Braz Varela", "Toucinho",
"Nogueira", "Vargem Larga", "Barrocas", "Mont'Alegre", "Vale do Poço"; várias
courelas, hortas e ferragiais, incluindo a "Vinha da Fonte Ferreira".

4 - Família Cunha e Sá:

António José da Cunha e Sá (baptizado em Évora, 13/6/1789), um médico que foi


Presidente da Câmara de Évora. Família de grandes proprietários: os Cunhas de
Coruche e os Sá de Évora. Teve 2 filhos que mandou estudar para Paris. A filha herdou
as suas propriedades do Évora e casou com um Cordovil, família da elite dessa cidade.
O filho António Manuel da Cunha e Sá (n. c. 1816, m. 1895) ficou a viver em Paris,
tornou-se armador de barcos e ganhou muito dinheiro. Lá casou com Mademoiselle
Constance de Ramperti, filha de Monsieur de Ramperti e de uma senhora nobre
holandesa, D. Maria Luísa Van Gockinga, descendente dos condes de Nobel. Deste
casamento nasceu um filho:
1 - Roberto Evaristo da Cunha e Sá, n. c. 1845, m. c. 1908, ficou com as
herdades de "Montes Juntos" e "Faia". Casado com D. Ana Luísa Caldeira de
Figueiredo. Lavrador, 1º MC de 1900.

1.1 - Ismael Caldeira da Cunha e Sá, casado com D. Arcângela Garcia


Marques Godinho, família muito rica das Galveias.

Quando herdou as propriedades que o pai comprara em Avis em 1837, as herdades da


"Torre" e dos "Covões", na freguesia do Ervedal, António Manuel da Cunha e Sá
passou a vir regularmente a Portugal, instalando-se no monte da "Torre". Conta-se que
este senhor tinha lá um canhão que mandava disparar sempre que chegava ao monte. Ao
ficar viúvo, deixou Paris e casou pela segunda vez com D. Maria José Andrade, dona da
Herdade de Pero Viegas e descendente do Capitão João de Andrade e Sousa. Dedicou-
se à lavoura, foi o 1º MC de Avis em 1890 e foi presidente da câmara antes de 1886.
Comprou outras herdades e realizou várias melhorias nas que já tinha.
Filhos deste casamento:

2 - António Manuel Cunha e Sá, morava na Herdade da Torre e era lavrador.

3 - Júlio Mário da Cunha e Sá, n. c. 1862, m. 19/10/1919, bacharel em Direito,


lavrador e presidente da CMA em 1910. Ficou com a Herdade de Pero Viegas que
herdou da mãe. Casou com a 4ª filha de António Pais da Silva Marques, D. Maria
Leonor da Silva Paes Teles (n. 31/8/1869). Tiveram 6 filhos, todos proprietários
absentistas residentes em Lisboa. O filho Mário Sá voltou a viver no monte de Pêro
Viegas e no Ervedal no fim da vida. Escreveu vários livros e a genealogia da família
Pais.

4 - Joana Isabel da Cunha e Sá Abranches, n. 1869, m. 19/3/1925, casada com


José Pais de Vasconcelos Abranches (sem relação com a família Pais de Avis), n.
2/1/1863, m. 1941, bacharel em Direito pela Universidade de Coímbra. Ficou com a
herdade da Torre do Ervedal. Tiveram 2 filhas.

Lista das herdades de António Manuel da Cunha e Sá: Covões (Ervedal), comprada em
hasta pública em 21/10/1837; ficou para o filho Júlio Mário; Torre das Areias, no
Ervedal, herdada pela filha Joana Isabel da Cunha e Sá Abranches, que casou com o
José Pais de Vasconcelos Abranches; Arieiro, freg. da Figueira e Barros, ficou para a
filha Joana Isabel; Montes Juntos e Faia, herdadas pelo filho Roberto; Pero Viegas:
ficou para o filho Júlio Mário. Tinha prazo foreiro de 27$50 anuais ao "senhor directo"
Dr. José Osório Cabral de Alarcão. + 5 prédios rústicos que ficaram para o neto Mário
Sá.

5 - Família Telles de Carvalho:


Manuel (ou Manoel) de Carvalho, n. c. 1843, m. 1/1901, com 58 anos, morador na
herdade Padrão, freg. Figueira e Barros, casado com D. Maria Luísa Telles de Carvalho.
Filhos:
1 - Mariana Emília Teles de Carvalho, casada com Francisco António Pais, filho de
António Pais da Silva Marques
1.1 - Almerinda Rosa de Carvalho Paes, casada com Francisco Paes Varela de
Brito

1.1.1 - Joaquim, morreu cedo

1.1.2 - D. Mariana de Carvalho Paes Varela de Brito, casada com Dr.


António Vasco de Faria Pais, médico

2 - Joaquim Manuel Teles de Carvalho, n. c. 1873, casado com D. Perpétua da Costa


Barradas
2.1- Dr. Manuel Teles Barradas de Carvalho, casado em 1919 com Lobélia
Godinho Braga, advogado e escritor, morava na herdade da "Coutada" e em Galveias;
assinava os livros sob o pseudónimo de Noel Teles
2.1.1 – Maria Ana Braga Boudry de Carvalho
2.1.2 – Joaquim Braga Barradas de Carvalho, exilado político no Estado
Novo, professor de Ciências Políticas na Sorbonne em Paris e na Universidade de S.
Paulo, no Brasil. Casado com uma senhora da Família Aarons de Carvalho, como 2
filhos.
2.2 - António Teles Barradas de Carvalho, herdade de "Valbarqueiros", e em
Valongo. Casado com D. Perpétua Garcia Godinho, de Galveias, com 2 filhos
2.3 - Artur Teles Barradas de Carvalho (que ficou com o "Monte Branco" e
morava lá), casado com D. Maria Rosa Rosado de Camões, de Alter do Chão (irmã de
Manuel Rosado de Camões e Vasconcelos), com 1 filha
2.2.1 - Joaquim Manuel Godinho Braga Barradas de Carvalho, n. 1920,
professor na Sorbonne, em Paris, e em S. Paulo, no Brasil
2.2.2 - D. Maria Ana Godinho Braga Barradas de Carvalho, n. 1921
2.4 - Maria Teles Barradas de Carvalho, morreu nova
3 - António Teles de Carvalho, n. 1877, m 1941; casado com Joaquina Garcia Marques
Godinho Teles de Carvalho, das Galveias, da família dos Marques Ratão e dos Abreu
Callado de Benavila. Este casal morava no Monte Padrão. Teve 7 filhos, mas morreram
todos à nascença e só ficou 1:
3.1 - António Teles Godinho de Carvalho, n. 16/2/1913, m. 1984, casado com
Maria Ema Bernardo Trancas de Golegã, pais de
3.1.1 - António Trancas Godinho de Carvalho, Engenheiro Agrónomo,
com 3 filhos
3.1.2 - José Trancas Godinho de Carvalho, Veterinário, com 5 filhas
Informações do Inventário Orfanológico de Manuel de Carvalho em 1901:
Imóveis: Herdades: "Padrão", "Defunta", "Faias", "Valle da Lousa", "Cardoso",
"Monte Branco do Macedo"; morada de casas com altos e baixos e quintal na Figueira +
14 prédios rústicos + 1 casa térrea em Avis. Era ainda enfiteuta em muitas outras
herdades, tinha também domínios directos, muitos semoventes, onde predominavam os
porcos e as ovelhas, 16 bois de trabalho e várias parelhas de mulas.

6 - Família Pais:
Esta família é bastante numerosa no concelho de Avis, sobretudo na vila do Ervedal.
Alguns dos seus membros destacaram-se na elite económica, social e política do
concelho:
- Alfredo Barreto da Guerra Pais, família de funcionários públicos, republicano activo
- José Diogo Pais, grande proprietário e político, casado com grande proprietária.
- António Pais da Silva Marques, 4º MC de 1890, pai de um deputado, de um advogado
e de outros lavradores de grande poder económico na freguesia do Ervedal.
O patronímico desta família vem dum "João Paes que em meados do séc. XVI vivia na
área rural da freguesia da Igrejinha, concelho e antigo termo de Arraiolos, terra do
Ducado de Bragança" (p. 1 da genealogia de Mario Sá, obra manuscrita policopiada).
Um seu bisneto chamado Felipe Paes (n. 1642) casou com Catarina Freixa, de Pavia,
filha de Sebastião Telles, formando-se a família Pais Teles. Tiveram 5 filhos, mas foi a
partir da 2ª filha que seguiu a família Pais Teles: Mariana Teles nasceu nos coutos de
Évora em 1674 e casou com José Pires Falcão, no concelho de Alter do Chão. Tiveram
3 filhos que foram educados pelo tio materno Frei Luís Paes Teles, após a morte da
mãe:
1 - Maria Pais Teles, m. 1727, solteira
2 - António Pais Teles, n. 1705 (ou 6), m. 1781.
3 - Catarina Maria Pais, solteira

António Pais Teles casou com Joaquina Nunes nas Galveias e teve 6 filhos:
1 - Maria Joaquina Paes Teles
2 - Joana
3 - José Paes Teles
4 - Joana Maria Paes
5 - Eufrázia Maria Paes
6 - Luísa Paes

José Paes Teles, o 3º filho, n. 1764, m. 1853. Foi "lavrador e Capitão de Milícias do
Regimento de Portalegre. Fez as guerras que terminaram em 1834, na convenção de
Évora Monte" (idem, p. 18). Casou 2 vezes: 1º com D. Maria Victória do Nascimento
Marques em 1790, 2º com D. Joana Benedicta da Guerra Barata em 1802. Mudou-se
das Galveias para a Quinta de Sant'Ana em Avis, c. 1810. Teve "22 filhos, ou talvez
mais" (idem, p. 37). O seu 22º filho, Francisco Paes da Guerra, deu origem aos Pais de
Avis. N. 1824 (foi baptizado em 3/6/1824) e casou com Angélica Rita da Costa Rebelo,
filha de Pedro António Gomes Rebelo, natural de Almada, e de Ana Rita Barreto, de
Alter do Chão. Esta senhora Barreto devia ser parente do Doutor Domingos António
Barreto, boticário em Avis em 1829. Este casal teve 2 filhos:
1 - José Barreto da Guerra Paes, músico da corte, muito viajado pela Índia e Brasil,
usava o nome artístico de José Barreto de Avis. Teve 2 filhos:
1.1 - Rogério Barreto Avis
1.2 - Eduardo Barreto Avis
2 - Alfredo Barreto da Guerra Paes, n. 1857, m. 12/1/1926, secretário da administração
da Câmara Municipal de Avis, casado com Maria da Graça Marques Paes, com 11
filhos, dois dos quais casados com os filhos de Joaquim de Figueiredo, o farmacêutico
que foi presidente da câmara em 1886. Todos estudaram música, as filhas estudaram na
escola, uma foi professora primária, outra foi funcionária da Câmara.

José Diogo Pais, grande proprietário, presidente da câmara, casado com D. Belmira da
Costa Braga Pais em regime de comunhão geral de bens. N. 1868, m. 1941.

Pertence à mesma família Pais e descende do 18º filho do Capitão José Paes Teles, que
se chamava José Olegário Paes (n. 1819, era o 30º MC de 1890), casado com Antónia
Condeça Pires, teve apenas um filho, chamado João Pedro Paes, que casou com Maria
das Neves Carrilho. Este casal teve 2 filhos:

1 - José Diogo Paes, n. 1868, m. 1940 ou 41, casado c. 1900 com Belmira da
Costa Braga.

1.1 - Manuel Braga Paes, demente

1.2 - João Pedro Paes, n. c. 1903, m. c. 1945, sem filhos

1.3 - Adília Braga Paes, casada com José Garcia Braga, primo direito,
sem filhos.

2- Antónia Luísa Paes, n. 1871, casada com o Juiz Dr. Augusto José Feliciano de
Mesquita e tiveram 3 filhos.

Inventário de 1941:

Bens imóveis: Herdades "Quinta de Sant'Ana" (freg. Avis), "Mastiços", "Granel",


"Bráz Varela e Anexos"; um ferragial em Avis; uma morada de casas com 11 divisões
e quintal, na Rua da Porta de Évora, em Avis, uma morada de casas na Praça Serpa
Pinto, em Avis, com 20 compartimentos e quintal

António Pais da Silva Marques, Ervedal, n. c. 1836, m. 26/12/1902; 4º MC de 1890.


Inventário nº 24, inclui a herdade Covões (foreira ao Dr. Júlio Mário da Cunha e Sá, seu
genro) e várias courelas, ferregiais e casas no Ervedal. Tem jazigo no cemitério.
Era também descendente do Capitão José Paes Teles: o 3º filho deste (da 1ª mulher,
Maria Victória do Nascimento Marques) era Luís Paes Teles, n. 1793, casado com
Maria do Carmo Leonor e Silva (com 13 anos na data do casamento), n. 1800, m. 1848.
"Tomaram de renda a Herdade da Torre do Ervedal" (Genealogia de Mario Saa, p. 42).
Tiveram 8 filhos, sendo este o 4º.
Casou 2 vezes:
1º com D. Rosa Benedita de Paula Varela de Brito, em 1841, m. 1866.
2º com D. Margarida de Jesus Vilela Paes, n. 1841, casada em 1868, m. 1906. Esta era
filha de José Pais Telles, o 6º filho do Capitão José Pais Teles, portanto prima direita do
marido.
Filhos:
1 - Francisco António Paes, n. 1862, m. 3/9/1934, casado em 1891 com D.
Mariana de Carvalho; 9º MC em 1908, lavrador. Republicano, nomeado vogal da
comissão administrativa da CMA em 1911.

1.1 - Almerinda Rosa de Carvalho Paes, casada com Francisco Paes


Varela de Brito

1.1.1 - Joaquim, morreu cedo

1.1.2 - D. Mariana de Carvalho Paes Varela de Brito, casada com


Dr. António Vasco de Faria Pais, médico

2 - Maria, n. 1864, m. cedo

3 - João, n. 1866, m. cedo

4 - D. Maria Leonor da Silva Paes Teles, n. 31/8/1869, m. 1942, casada com


Júlio Mário da Cunha e Sá em 1891.

4.1 - Condorcet Paes da Cunha e Sá, militar, n. 1891 nas Caldas da


Rainha.

4.2 - Mário Pais da Cunha e Sá, n. 1894 (Caldas da Rainha); m. 1971.

4.2.1 - Gonçalo Paes da Cunha e Sá, engenheiro, casado com Sra.


Ivens Ferraz.
4.2.1.1 - Diogo da Cunha e Sá

4.2.1.2 - Vera da Cunha e Sá

4.2.1.3 - Gonçalo da Cunha e Sá

4.3 - António Paes da Cunha e Sá, militar, n. nas Caldas da Rainha

4.4 - Olga Paes da Cunha e Sá

4.4.1 - Júlio Mário da Cunha e Sá Calvet de Magalhães Cardoso

4.5 - Fausta Paes da Cunha e Sá, n. Caldas da Rainha, casada com Hugo
de Melo Lopes da Silva

4.5.1 - Dr. José Filipe da Cunha e Sá Lopes da Silva, advogado


4.5.1 - Gonçalo Paes da Cunha e Sá Lopes da Silva

4.6 - Margarida Paes da Cunha e Sá, n. Pero Viegas, casada, com 2 filhos

5 - Dr. José Paes Teles, n. 1870, m. 1942, advogado, republicano; casado com D.
Mariana do Amaral Queiroga. Nos anuários comerciais surge como advogado, lavrador,
proprietário, dono de lagar de azeite, viticultor e vinicultor. Em 16/10/1910 foi nomeado
Administrador do Concelho, ao mesmo tempo que o Júlio Mário da Cunha e Sá, seu
cunhado, foi nomeado Presidente da CMA, mas "depois de tomar posse veio a esta
cidade (Portalegre) pedir a sua exoneração ao Sr. Governador Civil porque residindo no
Ervedal e tendo ali a sua lavoura não podia desempenhar-se das funçõis daquele cargo
com a assiduidade e zelo que desejaria. Em vista disso foi sua exª substituído pelo sr. dr.
Alberto Sabino Ferreira", bacharel. Notícia publicada no jornal Intransigente de
16/10/1910.
6 - António Paes da Silva Marques, n. 23/12/1876, m. c. 1950. Casado em 1900
com D. Ana Lopes de Castro, filha do 7º MC de 1890. Administrador do concelho em
1901, 1904, 1906 e 1917; deputado pelo círculo de Elvas em 1923 - 25. Dono de lagar.

7 - Família Figueiredo:

Joaquim Coutinho de Figueiredo, farmacêutico, Presidente da Câmara de Avis em 1886


e Delegado efectivo eleito em 20/3/1887 para as eleições de Portalegre. N. c. 1854, m.
22/1/1890. Foi também Chefe da Estação Telegrapho Postal, com o ordenado de
250$000 e era MC da contribuição industrial.

Inventário Orfanológico no Tribunal de Fronteira, 1890, nº 28, maço nº 3.

Casou com Gertrudes Rosa Mourato de Figueiredo, m. 1895. Esta senhora sabia assinar
o nome, era instruída e filha ilegítima dum senhor da nobreza.
Origem de Joaquim de Figueiredo: era de uma família abastada de Lamego, fez a
faculdade de Farmácia em Coimbra. Quando os pais morreram ele vendeu as terras
todas e os bens que herdara e foi para Avis abrir uma farmácia.

Filhos:

1 - Mário Coutinho de Figueiredo, casado com Maria da Alegria Quina, farmacêutico,


era em 1925 o oficial do registo civil do concelho de Avis. Frequentou o Colégio de
Santa Maria em Extremoz.

1.1 - José de Figueiredo, Prof. Primário

1.2 - Joaquim de Figueiredo, bancário

1.3 - Mário de Figueiredo, ajudante de farmácia

1.3.1 - Mário Canelas de Figueiredo, farmacêutico e analista


1.4 - Gertrudes de Figueiredo, casada com o pintor Renato Torres, com 3 filhos

2 - Cecília Rosa Coutinho de Figueiredo, n. 1884, m. 19/5/1950; frequentou colégio em


Lisboa: Asile St. Vincent de Paul, no qual aprendeu Música, "Methode de Musique",
Desenho, Francês. Casada com José Barreto da Guerra Pais, funcionário público e filho
de Alfredo Barreto da Guerra Pais.

2.1 - Eurico Barreto de Figueiredo Pais, n. 6/12/1906, m. 23/3/1951, casado em


1928 com Catarina Varela Gomes de Figueiredo Pais, n. 21/4/1907, funcionário da
FNPT e do Grémio. Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Avis. 2 filhos
farmacêuticos.

3 - Joaquim Coutinho de Figueiredo, farmacêutico; participou na Guerra de 1914-18,


como oficial-farmacêutico. Casado com Joana Marques Pais, filha de Alfredo Barreto
da Guerra Pais.

3.1 - Cecília Pais de Figueiredo, morreu cedo.

3.2 - Joaquim Pais de Figueiredo, médico, casado, teve 1 filha farmacêutica

8 - Família Godinho d'Abreu Callado

Francisco d'Abreu Callado, natural de Benavila, concelho de Avis, n. 1835, m.


30/12/1913. Filho de José d'Abreu, de Benavila, e de Rosa Monteira, de Alter do Chão.
Foi tutor dos filhos de Joaquim de Figueiredo quando este morreu em 1890. 3º MC em
1890. Grande proprietário e lavrador.

Casado com D. Maria Madalena Godinho d'Abreu, natural de Galveias, concelho de


Ponte de Sôr, n. 22/7/1840, m. 25/8/1889. Esta senhora era duma família Godinho de
Campos, aparentada com os Teles de Carvalho de Avis, com os Lopes Aleixo de
Cabeção e Évora, e com os Marques Ratão das Galveias.

Filhos:

1 - D. Rosa Madalena Godinho d'Abreu, n. 24/11/1869, m. 12/6/1941. Solteira.

2 - Cosme dos Campos Callado, n. 6/7/1871, m. 30/6/1948, Bacharel em Direito,


presidente da CMA, solteiro.

3 - D. Beatriz Angélica Godinho de Abreu, n. 11/9//1873, m. 16/4/1900, solteira

4 - José Godinho de Abreu, n. 22/7/1879, m. 30/4/1946, solteiro, lavrador.

Esta família não teve descendentes, mas o Dr. Cosme Callado, último herdeiro foi
benemérito na freguesia de Benavila, na qual constituiu em 1943 um asilo para
reformados da lavoura em nome da mãe. No seu testamento, feito em 16/7/1947, deixou
todos os seus bens para a constituição de uma Fundação com os seguintes fins:
"perpetuação da Casa Agrícola (...); manutenção dos seus criados assoldadado até á sua
morte; assistência na sua invalidez, doença e velhice (...) criação e educação dos filhos
dos criados assoldados e de outros rurais da freguesia e do concelho... ". É a fundação
Abreu Callado que se tornou proprietária de todos os bens desta família.

Imóveis (na freguesia de Benavila, concelho de Avis)

- 1 morada de casas em Benavila com 41 divisões, que serve de habitação, celeiro,


armazém de azeite, arrumações, cozinha, garagem, casa do encarregado, cavalariça,
depósito para farinha, instalação de lagar de azeite (valendo os maquinismos respectivos
60.000$00), pequena central eléctrica (30.000$00), instalação do moinho de cereais,
forja do ferreiro, casa para o carpinteiro, pátio, jardim, varanda, palheiro, chiqueiro,
retrete = 200.000$00.

- 1 morada de casas com 6 divisões, quintal, cavalariça e palheiro, em Benavila =


15.000$00.

- 14 casas de habitação em Benavila, com valores entre os 4.000$00 e os 8.000$00.

- metade da Herdade "Cumeada" (c. 800 hectares): terra de semeadura, montado de


azinho, casa de habitação com 10 divisões, cavalariça e outras dependências. A metade
dele vale = 961.639$20

- 1 Herdade "Cabeça da Murta", com terras de semeadura, montado de azinho, olival,


vinha e duas oficinas agrícolas: um casão para recolha de instrumentos agrícolas e uma
arribana para recolha de gados. Cerca de 800 hectares. Valor = 860.400$00.

- 1 Herdade "Concelhios e Gradezas", com terras de semeadura, montado de azinho,


oliveiras e uma oficina de lavoura. Cerca de 750 hectares. Valor = 715.000$00

- 1 Courela "Canavoulas" = 93.000$00.

- uma courela "Ratão", valor matricial por baixo = 20.000$00

- 1 Tapada (significa uma pequena propriedade murada onde ele tinha os animais
doentes ou a engordar e que fica junto à vila, atrás do sítio onde é hoje o asilo)
"Pelomes", com terras de semeadura, olival e pastagens, cerca de 6 hectares =
60.000$00.

- 1 Ferregial (é uma terra pequena junto dos montes, neste caso dentro mesmo da actual
povoação, que se semeia todos os anos pois é adubado com estrumes e lixo das
limpezas) "Formiga", com terras de semeadura e olival = 6.000$00.

- 1 Ferregial "Portado Branco", com terras de semeadura e oliveiras = 20.000$00

- 1 Courela "Almas", com terras de semeadura = 10.000$00

- 1 Ferregial "S. Pedro, com terras de semeadura = 7.000$00


- 1 Courela "Pedreira" = 17.000$00

- metade da Herdade "Cordeira e Anexos", na Freguesia de Avis = 24.376$00

- Bens no concelho de Fronteira = 15.120$00

- Bens no concelho de Alter do Chão = 489.000$00

- Bens no concelho de Arraiolos (são herdades, courelas e uma tapada com corças,
chamada "Batigelas", com c. 900 hectares, onde se faziam caçadas) = 1.019.000$00

- Indústria: "pela transmissão da indústria constituída pelo fornecimento da força


motriz para accionar o dinamo que gera a energia electrica para a iluminação pública da
freguesia de Benavilla, recebe anualmente a quantia de 7.000$00."

- 9 domínios directos sem laudémio.

SOCIOMATRIZES:

Fontes bibliográficas:

- MATTOSO, José - Identificação de um País, Editorial Estampa, Lisboa, 1985, vol II,
pp. 248 - 249.

- BRITO, Pedro de - "-«Verflechtung»- Um Método para a Pesquisa, Exposição e


Análise de Grupos Dominantes", in HESPANHA, António M. (dir) - Penélope, nº 9/10,
Edições Cosmos, Lisboa, 1993.

Estão aqui considerados 55 casamentos, divididos por 3 grupos:

1ª geração: 11 casamentos entre 1840 e 1868, dos quais 5 com "outras famílias", mas
são todas dentro do concelho de Avis.

2ª geração: 17 casamentos, todos ficaram a residir dentro do concelho; 5 senhoras de


fora casaram com senhores de Avis; todos os restantes têm ambos os conjuges naturais
do concelho.

3ª e 4ª gerações: estão aqui descritos 27 casamentos depois de 1920. Verifica-se grande


dispersão geográfica e familiar: a grande maioria é já com pessoas de outras famílias.
Nesta fase há muitos indivíduos que já pertencem a duas ou mais famílias: nos quadros
estão incluídos na família dos respectivos pais. Por exemplo há os Varela Lopes e os
Lopes Varela; há um Figueiredo Pais e um Pais de Figueiredo.
CASAMENTOS:

1ª geração:

1840 - António Manuel da Cunha e Sá casou com D. Maria José Andrade, grande
proprietária do concelho de Avis

1850 - Manuel Joaquim da Costa Braga casou com D. Arcângela Angélica Godinho, das
Galveias, concelho da Ponte de Sôr

1858 - José Lopes Coelho casou com Maria Teresa Lopes Fortio, do monte da
Machadinha

1860 - Francisco d'Abreu Callado, de Benavila, casou com D. Maria Madalena


Godinho, das Galveias, Ponte de Sôr.

1860 - João Teles Varela, rendeiro de Camões casou com Arcângela de Jesus Ramos.

1865 - José Valentim Varela, da Quinta do Pinheiro, casou com Ana Lopes, do Monte
das Figueiras

1865 - Manuel de Carvalho, do Monte Padrão, casou com D. Maria Luísa Teles, grande
proprietária do concelho de Avis, da mesma família de José Varela Teles.

c. 1866 - José Varela Teles, do Monte Outeiro de Baixo, casou com Margarida Inácia,
do Alcórrego.

1868 - António Pais da Silva Marques, do Ervedal, casou com D. Margarida de Jesus
Vilela Pais, prima direita.

c. 1868 - Caetano Teles Varela casou com senhora Lopes do Monte das Figueiras.
Deram origem aos Lopes Teles Varela do Alcórrego

c. 1868 - Joaquim Telles Varela, da Cortesia, casou com D. Felisberta Mendes

2ª geração:

1890 - Joana Isabel Cunha e Sá, da herdade da Torre casou com José P. Vasconcelos
Abranches, de Lisboa

1890 - José Diogo Pais, da Quinta de Sant'Ana, casou com Belmira Braga, filha de
Manuel J. C. Braga

1890 - Joaquim Mendes Lopes casou com senhora de Mora

1891 - Júlio Mário da Cunha e Sá, de Pêro Viegas, casou com Maria Leonor da Silva
Pais Teles, filha de António Pais da Silva Marques, do Ervedal
1891 - Francisco António Pais, filho de António Pais da Silva Marques, do Ervedal,
casou com Mariana Teles de Carvalho, filha de Manuel de Carvalho

1895 - José Lopes Coelho Jr. casou com Rosa Viterbo Lopes Varela, filha de José
Valentim Varela

1900 - Dr. José Pais Teles, filho de António Pais da Silva Marques, casou com senhora
de fora.

1900 - António Pais da Silva Marques Jr. casou com Ana Lopes de Castro, de Avis

1900 - António Teles de Carvalho, filho de Manuel de Carvalho, do Monte Padrão,


casou com senhora Godinho, das Galveias.

1900 - Joaquim Manuel Teles de Carvalho, filho de Manuel de Carvalho, casou com
senhora de fora.

1900 - Jerónimo Lopes casou com senhora de Mora

1900 - Francisco Teles Varela, filho de João Teles Varela casou com Ana Mendes
Lopes, filha de José Lopes Coelho

1900 - Dr. Manuel Lopes Varela, filho de José Valentim Varela casou com Luísa
Mendes Lopes, filha de José Lopes Coelho

1900 - Maria Luísa Lopes, filha de José Lopes Coelho, casou com João Marques Serrão,
comerciante

1905 - Cecília de Figueiredo, filha de Joaquim de Figueiredo, casou com José B. G.


Pais, filho de Alfredo Barreto da Guerra Pais

1910 - Joaquim de Figueiredo jr. casou com Joana Pais, filha de Alfredo B. Pais

1910 - José Valentim Varela Jr. casou com senhora da Ponte de Sôr

3ª geração:

Anos 20 - 6 filhos de Júlio Mário da Cunha e Sá casaram com pessoas de Lisboa

1920 - Ana Varela Lopes, neta de José Lopes Coelho e de José Valentim Varela, casou
com Luís Mendes Vieira Lopes, neto também de José Lopes Coelho

1920 - Marcelina Rosa Teles Varela, filha de Joaquim Teles Varela, casou com

Francisco Marques Serrão, comerciante

1920 - Asdrúbal Godinho Braga, neto de Manuel Joaquim da Costa Braga, casou com
Alda Varela, neta de José Valentim Varela e de José Lopes Coelho
1925 - José G. Godinho Braga, neto de Manuel J. C. Braga, casou com Adília Braga
Pais, neta do mesmo e filha de José Diogo Pais.

1926 - Lubélia Godinho Braga, neta de Manuel Joaquim C. Braga, casou com o Dr.
Manuel Teles Barradas de Carvalho

1927 - Maria Teresa Lopes, neta de José Lopes Coelho e de José Valentim Varela,
casou com Dr. Jaime Joaquim Pimenta Prezado, médico e de família de rendeiros

1928 - Catarina Varela Gomes, neta de José Varela Teles, casou com Eurico de
Figueiredo Pais, neto de Joaquim de Figueiredo e de Alfrego B. Pais

Anos 30 e 40 - 5 netos de Manuel de Carvalho casaram com pessoas de fora

Anos 40 - 5 netos de Joaquim de Figueiredo casaram com pessoas de fora

1940 - Idalina Varela, neta de José Valentim Varela, casou com Dr. Pina, médico e de
família de rendeiros

1940 - Margarida Varela Gomes, neta de José Varela Teles, casou com Manuel António
Botas, dono de lagar

1950 - José Lopes Coelho, filho de Ana Lopes e Luís Mendes V. Lopes, casou com
Leonor Lopes Fernandes, filha de João Fernandes de Évora

1959 - Joaquim Mendes V. Lopes, irmão do anterior, casou com Maria Teresa Pais e
Silva, do Cano.
Anexo 5: Outras instituições do poder político local: a Santa Casa da
Misericórdia e os organismos corporativos

A Santa Casa da Misericórdia de Avis: Cargos directivos

Acta de 28/10/1890:

Provedor - Manuel Maximiano d'Oliveira, do P. Regenerador, enquanto na CMA


estava Francisco d'Abreu Callado, do P. Progressista, mas eram amigos.

Vogais - António Joaquim Rangel; Joaquim Mesquita; Ernesto José de Carvalho;


Manoel de Jesus
Acta da eleição de 5/7/1891:
Provedor - Padre António Pires de Carvalho
Secretário - Jeronymo da Costa
Vogais - António Vidigal Simas, comerciante; Joaquim Dias Biscalho; José

Francisco da Costa; Manuel de Jesus; Joaquim Mesquita; Manuel Maximiano d'Oliveira

1895:
Provedor - Sr. Dr. Augusto José Feliciano de Mesquita
Secretário - Francisco Maria Gazzo
Tesoureiro - Joaquim do Nascimento Lobato Júnior
Vogais - António Vidigal Simas, comerciante; Luís Sérgio Lopes de Castro;
Manuel Maximiano d'Oliveira; António Joaquim Rangel
27/7/1896:
Provedor - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade, pároco de várias freguesias do
concelho, membro do P. Progressista, o mesmo que estava no poder na CMA. Foi várias
vezes eleito para o poder municipal, sendo vários anos o presidente da Comissão
Administrativa da CMA.
Secretário - Francisco Maria Gazzo
Tesoureiro - Joaquim do Nascimento Lobato Júnior
Vogal - Luís Sérgio Lopes de Castro
1/8/1897:
Provedor - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade
Vogais - Joaquim do N. Lobato Jr.; António Joaquim Rangel; Joaquim José
Fontes; Manuel Maximiano d'Oliveira; João Marques Serrão, comerciante e casado com
grande proprietária; MC; Joaquim António Pólvora; Joaquim Mesquita; Ernesto José de
Carvalho; Francisco Maria Gazzo
1901:
Provedor - Luís António da Silva e Castro
Secretário - Manoel Maximiano d'Oliveira
Tesoureiro - Joaquim do Nascimento Lobato Júnior (também era o tesoureiro da
CMA)
Vogais - Joaquim António Pólvora; Manoel de Jesus; Joaquim Mesquita; Ernesto
José de Carvalho
17/7/1904:
Provedor - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade do mesmo partido que estava no
poder municipal: Progressista.
Secretário - Manuel Maximiano d'Oliveira
Tesoureiro - António Lopes Coelho, irmão do Presidente da Câmara nesta data,
Jerónimo Lopes Coelho do P. Progressista.
Vogais - Luís Casqueiro d'Oliveira; João Alexandre Gazzo; Damazo António

Capella; Manuel Duarte Ildefonso

1906: tudo igual, com a entrada do novo vogal José Valentim Varela jr., filho dum dos
maiores MC do concelho. Era do P. Progressista. Em 1908 o Secretário era Cypriano
José Marques.
25/4/1909:
Provedor - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade
Secretário - Cypriano José Marques
Vogais - António Lopes Coelho; João Ildefonso; Francisco Custódio
Sombreireiro, sapateiro com grande actividade política na câmara e na junta de
freguesia; José Valentim Varela jr., grande propr.; Luís Casqueiro d'Oliveira

República:
6/11/1910: foi nomeada uma Comissão Administrativa que substituiu todos os cargos
anteriores. Não mencionam o provedor. O "irmão" António Lopes Coelho (família de
grandes proprietários monárquicos que também abandonaram a CMA) pediu a sua
demissão em 24/10/1910.
Presidente - Benjamim Vitorino Ruivo
Secretário - Francisco Mendes
Tesoureiro - Alfredo Barreto da Guerra Paes, secretário da administração da CMA,
republicano e também nomeado para a comissão administrativa da câmara.
Vogais - João Gonçalves; Francisco Ângelo da Costa
18/5/1911: agora chama-se conselho administrativo
Presidente - Benjamim Vitorino Ruivo
Secretários - Francisco Mendes e João Gonçalves
Tesoureiro ("Réguo") - Alfredo Barreto da Guerra Paes
Vogal - Francisco Ângelo da Costa
15/10/1911: acta de posse da mesa administrativa para a gerência até 30/6/1912, mas
que fica igual até 1915. Voltam os antigos depois de um ano de administração
revolucionária republicana.
Provedor - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade
Tesoureiro - José Valenteim Varela jr.
Secretário - Cypriano José Marques
Vogais - Francisco Custódio Sombreireiro; Luís Casqueiro d'Oliveira; Pedro
Pólvora d'Almeida Gazzo
4/7/1915: os cargos ficam iguais até 1918, quando morre o Cónego.
Provedor - José Ricardo Freire d'Andrade
Tesoureiro - Francisco Custódio Sombreireiro, sapateiro
Secretário - José António da Fonseca
Vogais - Cypriano José Marques; Francisco Manuel Velez; Pedro Pólvora
d'Almeida Gazzo, alfaiate; Luís Casqueiro d'Oliveira
Novos "irmãos" - Simão Telles Varella, grande proprietário e rendeiro; na altura é
o secretário da comissão executiva da CMA, do P. Evolucionista; Joaquim Leal;
Anacleto Lopes Neto; Gracia Maria (a 1º mulher a aparecer, mas não é de nenhuma das
famílias de elite)
9/11/1918: Com a morte do cónego, este é substituído no cargo de Provedor por José
António da Fonseca.
11/3/1919: acta de posse da nova Comissão Administrativa, agora sem eleições, mas
por alvará do Governador Civil do Distrito de Portalegre de 26/2/1919.
Provedor - Dr. Manuel Lopes Varela, médico municipal, grande proprietário e
presidente da CMA nesta data, do P. Evolucionista.
Tesoureiro - Francisco Custódio Sombreireiro
Secretário - José António da Fonseca
Vogais - Francisco Manuel Velez; Pedro Pólvora d'Almeida Gazzo
23/3/1922: sessão extraordinária para substituição do provedor, que morreu, pelo vogal
Francisco Manuel Velez.
9/7/1922: acta de posse para o triénio 1922-25.
Provedor - Francisco Manuel Velez, também é vogal na CMA
Vogais - José Lopes Coelho, propr.; António Vidigal Simas, comerciante; João
Marques Serrão, comerciante; Simão Teles Varela, proprietário e rendeiro, também é
vogal da CMA; Francisco Ferreira Pimenta; José Francisco da Costa; José António da
Fonseca
5/7/1925: acta de posse para o triénio 1925-28, mas cujo mandato foi interrompido com
a revolução de 28/5/1926.
Provedor - Francisco Ferreira Pimenta
Tesoureiro - João Marques Serrão, comerciante e proprietário
Secretário - José António da Fonseca
Vogais - José d'Oliveira Cativo; José Ruivo Feijão, pequeno proprietário;
Joaquim Monteiro dos Ramos; Francisco dos Santos Correia; Joaquim Augusto Risques
jr., funcionário da CMA, filho dum farmacêutico; Joaquim Paulino; João de Matos
Junça; Jayme Joaquim Pimenta Prezado, médico municipal desde 1923, casado com a
filha de José Lopes Coelho, um dos maiores proprietários do concelho.
Esta mesa foi dissolvida e em 8/2/1927 constituiu-se nova mesa nomeada por alvará de
26/1/1927:
Provedor - Francisco dos Santos Correia, foi vice-presidente da CMA entre 1922 e
1923 e vereador até 1926.
Vogais - Joaquim Duarte Paulino; José Ruivo Feijão; Artur Lopes Varela, grande
proprietário, prof. de liceu, filho do Dr. Manuel Lopes Varela; em 1928 passou a ser o
Provedor; Miguel Martim Barrocas
Irmãos: - António Vidigal Simas; Francisco Ferreira Pimenta, padre, membro da
União Nacional nos anos 30; Manuel Pais Monteiro, comerciante e pequeno
proprietário, foi presidente da CMA entre 1922 e 1923; Dr. Jaime Prezado, médico e
genro de José Lopes Coelho; Luís Mendes Vieira Lopes, proprietário, genro e sobrinho
de José Lopes Coelho.
31/7/1929: nova mesa por alvará de 24/7/1929.
Provedor - Luís Mendes Viera Lopes, até, 1935.
Tesoureiro - Francisco dos Santos Correia
Secretário - Joaquim Augusto Risques jr.
Vogais - João Pedro Paes, filho de José Diogo Pais, o presidente da CMA;
Joaquim Lopes de Sousa
3/11/1929: reunião da Ass. Geral, sob esta administração. Entre muitos "irmãos",
participaram: Alfredo Marques Pais, Secretário da Administração da câmara; João
Marques Serrão; Luís Mendes Vieira Lopes; João Pedro Pais, grande proprietário;
Abílio Sombreireiro, Caetano Manuel, Cizaldino Nunes Aço (carpinteiro), Custódio
Crespo, Francisco Ferreira Pimenta, Francisco Custódio Sombreireiro, Francisco
Manuel Velez, Frederico José, Joaquim Lopes de Sousa, João António da Siva e Castro,
João Feijão, Joaquim Ferraz, Joaquim Caetano, Joaquim José Farelo, Joaquim Paulino,
José Birea, Júlio do Nascimento Simões, Luís Nunes Pinto, Patrício Nunes Pereira,
Francisco dos Santos Correia.
26/4/1935: posse da nova mesa, por alvará de 6/4/1935
Provedor - Manuel Pais Monteiro, comerciante e pequeno proprietário
Tesoureiro - Francisco Marques Serrão, sobrinho do comerciante João Marques
Serrão.
Secretário - José Ruivo Feijão, pequeno proprietário
Vogais - António Teles Varela, pequeno proprietário; Luís Ferreira Ruivo
14/7/1937:
Provedor - Dr. Álvaro Magalhães Varela, veterinário municipal, grande
proprietário, sobrinho do Dr. Manuel Lopes Varela, o provedor em 1919 e filho de José
Valentim Varela, vogal da Comissão Administrativa da CMA nesta data.
Tesoureiro - Francisco Marques Serrão, comerciante e industrial
Secretário - João Pedro Paes, filho do presidente da CMA.
Vogais - Ambrósio Lobato; José Ruivo Feijão, pequeno proprietário
20/1/1939:
Provedor - Dr. António Marques de Figueiredo (sem relação com a família de J.
Figueiredo)
Tesoureiro - Francisco Marques Serrão
Secretário - José Lopes Simas, comerciante
Vogal - Eurico Barreto de Figueiredo Pais, funcionário da CMA, neto de
Joaquim de Figueiredo (farmacêutico e presidente da CMA em 1886) e também de
Alfredo Barreto da Guerra Pais, funcionário da CMA
4/4/1941:
Provedor - Alfredo Marques Pais, filho do já referido Alfredo Barreto da G. Pais
Tesoureiro - Francisco Marques Serrão
Secretário - José Lopes Simas
Vogais - Dr. Jaime Prezado; Felipe Maurício Gomes
12/6/1946:
Provedor - Eurico Barreto de Figueiredo Pais
Secretário - José de Matos Junça jr.

Organismos corporativos:

1 - Sindicato Agrícola de Avis

2 - Celeiro da Federação Nacional dos Produtores de Trigo

3 - Grémio da Lavoura

4 - Casas do Povo

1 - O Anuário Comercial de 1917 refere a existência de um "Sindicato Agrícola de


Avis" com os seguintes órgãos directivos:

Presidente: - Dr. Cosme de Campos Callado

Secretário: - Jeronymo Lopes Coelho

Tesoureiro: - José Diogo Pais

Esta instituição era uma associação de lavradores, cuja existência não está documentada
nos arquivos estudados.

Em 1931 foi criado um novo Sindicato Agrícola de Avis, com escritura de constituição
de 26/2/1931 e alvará com aprovação dos respectivos estatutos em 28/3/1931. Era uma
instituição de apoio à actividade agrícola em geral e que publicou o seguinte anúncio no
Álbum Alentejano em 1933 (o que nos elucida quanto à sua finalidade): "SINDICATO
AGRICOLA DE AVIS. ALFAIAS AGRICOLAS E ADUBOS. TRANSACÇÕES DE
CEREAIS. LÃS E TUDO O QUE DIZ RESPEITO Á LAVOURA"(sic). Foi esta
instituição que criou e instalou a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, que funcionou
desde fevereiro de 1935.

A 1ª direcção em 1931:

- Dr. António Marques de Figueiredo, exterior ao concelho

- Arnaldo Raul da Rosa Mendes, dono da farmácia, porém não era farmacêutico

- João Pedro Pais, filho do presidente da Câmara Municipal, José Diogo Pais

- Artur Lopes Varela, grande proprietário

- Joaquim Augusto Risques Júnior, funcionário da câmara

No ano de 1934 a direcção era constituída por:


Presidente: - José Diogo Pais, grande proprietário e Presidente da Câmara Municipal

- José Lopes Coelho, grande proprietário

- Arnaldo Raul da Rosa Mendes, dono da farmácia e membro da União


Nacional

- Dr. António Marques de Figueiredo

- José Ruivo Feijão, pequeno proprietário

Nº de associados = 175. Fonte: Revista Expansão Portuguesa, p. 251.

2 - Celeiro da Federação Nacional dos Produtores de Trigo. A FNPT foi criada pelo
Decreto-Lei nº 22.871 de 24/7/1933, com a lei orgânica publicada no Dec.-Lei nº
24.949 de 10/1/1935 (Boletim do INTP, ano II, nº 4 - Lisboa, 15/1/1935). Esta federação
tinha acordo com a CP para transportar o trigo que era moído fora do concelho. Os
grémios concelhios da FNPT: os critérios para a composição das direcções vêm
publicados no Boletim do INTP, ano II, nº 4 - Lisboa, 15/1/1935, no qual se reproduz o
Dec.-Lei nº 24.949 de 10/1/1935.

"Direcção, art. 18º A direcção de cada grémio é constituída por dois vogais efectivos e
dois substitutos eleitos pelos vinte maiores produtores inscritos, e por um terceiro vogal
efectivo e outro substituto nomeado pela F.N.P.T. de entre os produtores da área do
grémio.", p. 99.

Celeiro da FNPT em Avis (delegação concelhia desta federação), em 1935:

Presidente: - Dr. Jaime Joaquim Pimenta Prezado, médico, casado com


grande proprietária e presidente da delegação concelhia da União Nacional

Colaboradores: - José Filipe Gomes (peq. proprietário)

- Asdrúbal Garcia Godinho Braga (grande proprietário)

Fiel do armazém: - Eurico Barreto de Figueiredo Pais (genro de José Filipe Gomes)

Segundo entrevista com o director desta delegação concelhia em 1935, Dr. Jaime
Pimenta Prezado, publicada na revista Expansão Portuguesa, esta instituição "tem
agradado à quási totalidade dos produtores de trigo e muito especialmente aos pequenos
e médios produtores. No passado ano, comprou a 309 pequenos produtores, 600.000
quilos de trigo e a grandes produtores 1.250.000 quilos do mesmo cereal.", p. 248. Este
organismo teve uma importante função na colocação do trigo no mercado: "a produção
de 1934 foi grande - suponho mesmo ser a maior colheita de trigo no nosso País - e a
Lavoura não está, nem estará por falta de espírito de classe, em condições de defesa
suficiente para afrontar um excesso de produção, ser recorrer ao auxílio valioso do
Estado", pp. 248 - 249. É claro que este Dr. Prezado estava a fazer propaganda dos
organismos corporativos do Estado Novo porque era o presidente da representação
concelhia da União Nacional. Estes elementos sobre o ano agrícola de 1934 condizem
com o que diz CUTILEIRO, op. cit., p. 38: 1934 - "maior colheita de que há memória",
como resultado da campanha do trigo em 1929.

3 - Os grémios da Lavoura foram criados a partir da lei nº 1.957, a qual estabeleceu as


"Bases para a organização corporativa da agricultura" e foi publicada no Boletim do
INTP, Ano IV, nº 13 de 31/5/1937, pp. 350 - 352. A Base III esclarece quanto aos fins
para que estas instituições foram criadas: "funções políticas conferidas pela
Constituição aos organismos corporativos; desenvolver o espírito de cooperação e
solidariedade de todos os elementos da produção - capital, técnica e trabalho; contribuir,
pelos meios ao seu alcance, para o desenvolvimento económico e para o
aperfeiçoamento técnico da produção agrícola (...) auxiliar os agremiados na colocação
e venda dos seus produtos ou promover a venda dos mesmos (...) facultar a aquisição
colectiva de matérias e artefactos necessários ao trabalho agrícola com destino aos seus
agremiados; possuir armazéns, celeiros, adegas, máquinas, alfaias, utensílios agrícolas e
animais, bem como montar instalações ou serviços de interêsse comum dos
agremiados...". Foi esta lei de bases que deu origem ao Decreto-lei nº 29.494, publicado
no Boletim do INTP, ano VI, nº 6 de 31/3/1939, pp. 168 - 173.

Boletim do INTP, ano IV, nº 8, 15/3/1937, artigo "Organização corporativa da


agricultura", pretende-se a "substituição da mentalidade corporativa, de base cristã, à
mentalidade burguesa e à mentalidade proletária, ambas anticristãs.", p. 203. No
mesmo artigo, define-se a área de influência dos grémios: "os Grémios exercem a sua
acção na área do respectivo concelho...", p. 207, logo são órgão de poder municipal,
enquanto as casas do povo estão ligadas às juntas de freguesia.

Definição dos sócios e dos directores: "Dos sócios dos Grémios da Lavoura: quem o
pode ser (...) podem agremiar-se todos os produtores agrícolas, todos os agricultores",
ibidem, 208. "Direcção dos Grémios da Lavoura e das respectivas secções: (...) Cada
secção «terá um director, assistido por dois agremiados, nela inscritos», p. 213.

No modelo de estatutos publicado no Boletim do INTP, ano VIII, nº 4 de 28/2/1941, pp.


101 a 107, diz as várias categorias dos sócios: art. 6º, p. 101. Requisitos para se ser da
direcção: art. 104º, p. 106. O Grémio da Lavoura de Avis teve os seus estatutos
aprovados por alvará de 18/3/1940, para efeitos do artigo 10º do decreto-lei nº 29.494,
publicado no Boletim do INTP, ano VII, nº 7 e 8 de 15 e 30/4/1940, p. 166.

1ª Direcção, sancionada por despacho do Secretário de Estado das Corporações em


13/4/1940:

Efectivos: - Dr. Jaime Joaquim Pimenta Prezado (médico e representante da União


Nacional)
- João Pedro Pais (filho do José Diogo Pais, grande propr. e antigo
presidente da CMA)

- Manuel António Botas (industrial de azeite: dono de lagar e pequeno


proprietário)

Substitutos: - Francisco Marques Serrão (comerciante)

- António Feijão Cardoso (pequeno proprietário)

- Asdrúbal Garcia Godinho Braga (grande proprietário)

A assembleia-geral do grémio funcionava com 40 elementos: os 20 maiores lavradores


do concelho + 20 lavradores eleitos entre os pequenos.

Tanto o Sindicato Agrícola como o celeiro da FNPT foram integrados no Grémio da


Lavoura; sua integração no Grémio da Lavoura foi determinada pela lei nº 1.957,
publicada no Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, ano IV, nº 13,
Lisboa, 31/5/1937: "Base XI - Os Sindicatos Agrícolas actualmente existentes devem
integrar-se na organização corporativa da produção agrícola...", p. 351. No dia 5/9/1939,
o Sindicato Agrícola de Avis teve o despacho ministerial para se integrar na
Organização Corporativa da Lavoura, de harmonia com o disposto no nº 2 do artigo 2º e
artigo 47º do decreto nº 29.494 de 22/3/1939, Boletim do INTP, ano VII, nº 13 e 14 de
15 e 31/7/1940, p. 248. Em 1972 a FNPT foi integrada no Instituto dos Cereais e depois
de 1974 todos estes organismos foram incorporados na actual EPAC. Nos arquivos da
EPAC existem os jornais da FNPT, mas apenas a partir da década de 50, infelizmente,
pois têm informações importantes sobre os produtores de trigo. Por exemplo, nos anos
50 e 60 foram lá publicados quadros de honra dos maiores produtores de trigo do
concelho inscritos no Grémio da Lavoura de Avis.

4 - As Casas do Povo regem-se pelo decreto-lei nº 23.051 de 23/9/1933. Comparando


com as listas das Juntas de Freguesia apresentadas no anexo 3 pode verificar-se a
coincidência dos nomes e das profissões. No concelho de Avis, a 1ª foi:

Figueira e Barros (estatutos aprovados pela Previdência Social em 29/12/1936 e


publicados no Boletim do INTP, ano IV, nº 3, 31/12/1936, p. 59. Os seus corpos
directivos foram publicados na p. 159, no dia 15/2/1937):

Assembleia Geral: Presidente: - Maurício José Pólvora

1º Vogal: - Vicente Martins

2º Vogal: - Francisco Ventura

Direcção: Presidente: - Francisco das Neves Mendes

Secretário: - Francisco Pereira Mendes


Tesoureiro: - António Mendes Barreto

No nº 3 de 15/2/1939, p. 60, por despacho de 8/2/1939, foram sancionados os seguintes


corpos directivos para a mesma casa do povo:
Assembleia Geral: Presidente: - Dr. João Augusto Marchante

Direcção: Secretário: - Álvaro Martins

Todos os outros cargos se mantiveram.

Ervedal (despacho de 19/2/1940, publicado no Boletim do INTP, ano VII, nº 4 de


29/2/1940, p. 83):

Assembleia Geral: Presidente: - José Varela da Silva Pais


1º Vogal: - José Francisco de Moura
2º Vogal: - Cláudio Marques Leal
Direcção: Presidente: - Francisco Mariano Freire
Secretário: - António Varela da Silva Pais
Tesoureiro: - Francisco Antunes Varela Prates
Avis (Alvará autorizando a constituição e funcionamento das Casas do Povo de Avis e
Benavila, por despacho de 20/8/1941, publicado no Boletim do INTP, ano VIII, nº 16 de
30/8/1941, p. 410. Nomeações sancionadas para o triénio de 1941 a 1943):
Assembleia Geral: Presidente: - José Filipe Gomes
1º Vogal: - Alberto Lopes de Carvalho
2º Vogal: - José da Silva Matono
Direcção: Presidente: - Edmundo da Silva Marques
Secretário: - Joaquim José Mesquita Ferraz
Tesoureiro: - José Lopes Godinho
Benavila:

Assembleia Geral: Presidente: - Dr. Cosme dos Campos Calado


1º Vogal: - Joaquim Antunes Correia
2º Vogal: - João Barradas Correia
Direcção: Presidente: - José Calado Correia
Secretário: - Marcelino Francisco Rodrigues
Tesoureiro: - António Canha
Anexo 6: Resumo dos Anuários Comerciais e Livros do Recenseamento
Eleitoral.
Profissões liberais:

Lista dos Advogados:

1901: - Augusto José Feliciano Mesquita: também é o delegado judicial do concelho;


grande proprietário e MC em 1900.
- Cosme de Campos Callado, em Avis e em Benavila.
Juiz: - Abel Franco
1908: - Cosme dos Campos Callado, proprietário de Benavila, presidente da CMA.
- José Pais Telles, proprietário do Ervedal, MC e filho de António Pais da Silva
Marques, 4º MC de 1890.
- Júlio Mario de Cunha e Sá, grande proprietário e MC
Juiz: - Augusto José Feliciano de Mesquita; delegado: Daniel Rodrigues.
1917: - Cosme dos Campos Callado, Benavila.
- José Pais Telles, Ervedal.
Juiz: - Dr. Francisco Carlos Soares; delegado: Dr. António Francisco Pereira;
subdelegado: Manoel Paes Monteiro, pequeno proprietário, dono de lagar e vereador da
câmara.
1941: No recenseamento eleitoral deste ano vem referido um Dr. Mário Manuel
Fernandes Nogueira, casado, 32 anos, Conservador do Registo Predial.

Notários:

1908: - António José da Costa.


1917: - António José de Carvalho Júnior, filho dum solicitador.
1828: - Francisco Ferreira Pimenta
Ajudante: - Joaquim Augusto Risques Júnior, filho de farmacêutico.
1941: - Dr. Euclides Moreira Dias, solteiro, 31 anos

Solicitadores:

1901: - Manoel Maximiliano d'Oliveira, funcionário da câmara e secretário da


Misericórdia
1908: - Alfredo Barreto da Guerra Pais, secretário da administração do concelho
- Manoel Maximiliano d'Oliveira, secretário da câmara.
1917: - António José de Carvalho
1941: - Armando Lopes Simas, casado, 40 anos, família de comerciantes.

Lista de médicos:

1898: - Dr. António Alberto de Jesus Bethencourt, 52 anos, solteiro, ordenado =


350$000.

1898: - Dr. Pedro d'Almeida d'Eça, 36 anos, casado, médico, Avis, ordenado =
650$000

1901: - Dr. Manuel Lopes Varela, grande proprietário.

- Dr. Pedro d'Almeida d'Eça, exerce na Misericórdia, em Benavila e em Figueira


e Barros.

1908: - Dr. Manuel Lopes Varela.

- Dr. Pedro d'Almeida d'Eça, é também o sub-delegado de saúde pública.

1917: - Dr. Manoel Lopes Varella

- Dr. Alberto Sabino Ferreira, subdelegado de saúde pública.

1923: Dr. Jaime Joaquim Pimenta Prezado inicia a sua carreira de médico municipal.

1928: - Dr. Carlos Clímaco Baptista, exerce também na Aldeia Velha, Benavila e
Valongo.

- Dr. Jaime Joaquim Pimenta Presado, Sub-Inspector de Saúde Pública do


concelho. Exerce também no Alcórrego, Ervedal "Ás quartas-feiras e sabbados"(sic),
Figueira e Barros "ás quartas-feiras" e Maranhão "ás quintas-feiras".

1941: - Dr. Carlos Clímaco Baptista, casado, 47 anos, Avis.

- Dr. Jaime Joaquim Pimenta Presado, 41 anos, casado, Avis

- Dr. António Fialho Sequeira Bugalho, solteiro, 32 anos, Ervedal

Lista dos Farmacêuticos e das farmácias abertas ao público a partir dos anuários
comerciais:

1886: - Joaquim de Figueiredo, com farmácia aberta ao público; era também


Chefe da Estação dos Correios (com ordenado de 250$000) e Presidente da CMA nesta
data.
1901: - Joaquim Mendes Lopes Coelho, proprietário

- Joaquim Augusto Risques

1908:

Avis - Joaquim Mendes Lopes Coelho

- Mário Coutinho de Figueiredo, filho de Joaquim de Figueiredo

Ervedal - João Vellez Trindade, também era o regedor desta freguesia.

1911:

Avis - Joaquim Augusto Risques

- Joaquim de Figueiredo, irmão de Mário de Figueiredo, é também


amanuense da administração do concelho.

Ervedal - João Vellez Trindade.

1917:

Avis - Joaquim Augusto Risques

- Mário Coutinho de Figueiredo.

Ervedal - João Vellez Trindade.

1828:

Avis - Arnaldo Raul da Rosa Mendes & Cª.

Ervedal - João Velez Trindade

1935:

Avis: - Arnaldo Raúl da Rosa Mendes: não era farmacêutico, era apenas
ajudante de farmácia, comprou as 2 que havia e fechou uma.

1941: neste ano há apenas um nos recenseamentos: Ervedal, João Velez Trindade,
casado, 66 anos.

Os Funcionários, os Professores e os Padres


Lista dos secretários da administração do concelho (dependentes do poder central,
não do municipal):

1898 a 1926: - Alfredo Barreto da Guerra Pais, ordenado = 240$000


1926: - Joaquim de Figueiredo, farmacêutico, filho de Joaquim de Figueiredo
que foi presidente da CMA em 1886; substituiu neste cargo o sogro Alfredo Barreto da
Guerra Pais, que morreu exactamente em Janeiro deste ano.

1928: - idem, com o amanuense Alfredo Marques Pais, seu cunhado.

Lista dos Chefes da Estação dos Correios e Telégrafos (em Avis havia o chefe da
estação e nas outras freguesias havia encarregados do correio):

1886:

Avis: - Joaquim de Figueiredo, farmacêutico e presidente da CMA; ordenado =


250$000.

1901:

Avis: - Manoel Diogo Gomes

Benavila: - Acácio d'Abreu e Castro

Ervedal: - António Vasco Pais, proprietário e MC.

Figueira e Barros:- Christovam Vieira Telles, 12º MC desse ano, proprietário.

1908:

Avis: - Maria Lúcia da Silva Dordio Rebocho, 1º senhora, família de pequenos


propr. do Ervedal.

Benavila: - António Carrilho Júnior

Ervedal: - Maria Esther Figueiredo de Oliveira

Figueira e Barros:- João Marianno Telles.

1917:

Avis: - Maria Lucia da Silva Dordio Rebocho.

Benavila: - António Carrilho Júnior

Ervedal: - Etelvina Gracinda da Paixão Costa

Figueira e Barros:- Felizardo António da Silva (também é vogal da junta de freg.).

1928: - idem
Lista dos Funcionários da Administração da Câmara (dependentes do poder
municipal):

1898: - Jeronymo da Costa, ordenado = 100$000

1901: - Secretário: Manuel Maximiano d'Oliveira

- Tesoureiro: Joaquim do Nascimento Lobato Júnior, também é o tesoureiro da


filarmónica e é o filho do amanuense da administração do concelho.

- Amanuense: Jeronymo da Costa, continua em 1908.

1913: - secretário: Joaquim Augusto Risques, filho dum farmacêutico

1928: - Chefe de Secretaria: Francisco Ferreira Pimenta

1934: - Chefe de Secretaria: Joaquim Augusto Risques

Lista de Regedores:

1901: Avis: - António Ildefonso

Aldeia Velha: - António Nunes Duarte

Benavila: - Manoel Prates Pina, família de rendeiros.

Ervedal: - Francisco Mariares

Figueira e Barros: - José Thiago

Alcórrego, Maranhão e Valongo não têm regedor.

1908: Avis - João Ildefonso, ferreiro

Alcórrego: - Augusto José de Castro Carvalho

Aldeia Velha: - Paulo Carreiras

Benavila: - António José Bragança

Ervedal: - João Vellez Trindade, era o farmacêutico da mesma freguesia.

Figueira e Barros: - Carlos Abelha de Carvalho, carpinteiro.

Maranhão e Valongo não têm regedor.

Assistência Judiciária:

- Daniel Rodrigues

- Jeronymo Lopes Coelho, o administrador do concelho, grande proprietário / lavrador


- José Francisco da Costa, lavrador, comerciante e pequeno proprietário.

1917: Avis: - João Gonçalves

Alcórrego: - Augusto José de Castro Carvalho

Aldeia Velha: - Paulo Carreiras

Benavila: - António Prates Pina, família de lavradores/rendeiros

Ervedal: - Manuel João Fouto

Figueira e Barros: - José Nunes Thiago

Maranhão e Valongo não têm regedor.

1928: Avis: -Abílio Custódio Sombreireiro, família do sapateiro que foi


vereador

Alcórrego: - Joaquim Mattono

Aldeia Velha: - João Martins Varella

Benavila: - José Vellez de Vargas

Ervedal: - Joaquim Augusto dos Reis

Figueira: - José Joaquim de Carvalho

Lista dos Professores Primários:

1890: Avis: - nenhum no recenseamento eleitoral

Ervedal: - Theodoro Simões de Faria, 43 anos, ordenado = 150$000

- Francisco de Carvalho, 24 anos, 120$00

Benavila: - António Maria Bragança, 39 anos, 150$000

1898: Avis: - José Maria Canhoto, ordenado = 120$000

1900: Avis: - nenhum no recenseamento eleitoral

Figueira: - José Themudo Caldeira Paulino, 32 anos, solteiro

Ervedal: - Manuel Joaquim da Veiga, 60 anos, solteiro

- Teodoro Simões de Faria, 53 anos, solteiro

Benavila: - Joaquim d'Abreu Callado, 21 anos


1901: Avis: - João Correia do Inso

- Maria Filippina Vidigal Simas, família de comerc. e


funcionários

Benavila: - Joaquim d'Abreu Callado, família de grandes proprietários

Ervedal: - Theodoro Simões de Faria

- Leopoldina A. S. Cunha

Figueira e Barros: - José T. C. Paulino

1908: Avis: - Clara de Sousa Namorado

- Francisco Ignácio Gomes

Benavila: - Herminio Luiz Pereira

Ervedal: - Etelvina Augusta Castanho Magrinho

- Theodoro Simões de Faria

Figueira e Barros: - Maria da Ascensão Caio

1911: Avis: - Clara de Sousa Namorado

- Francisco Ignácio Gomes

Benavila: - Herminio Luiz Pereira

- Ignez Margarida de Carvalho

Ervedal: - Etelvina Augusta Castanho Magrinho

- Theodoro Simões de Faria

Figueira e Barros: - Maria da Ascensão Caio

- Maria da Assumpção Cassóla

Neste ano ainda só havia escolas nestas 4 freguesias.

1917: Avis: - Clara de Sousa Namorado

- Olympia Rosa Lemos

Benavila: - Herminio Luiz Pereira

- Maria Henriqueta Trindade Rijo

Ervedal: - Etelvina Augusta Castanho Magrinho (sexo feminino)


- Maria Ventura Viegas (sexo masculino)

Figueira e Barros: - Augusto Risques

- Antónia Correia Gonçalves

Alcórrego, Maranhão e Valongo não tinham escola. Aldeia Velha já tinha escola mista,
mas o lugar de professor ainda estava vago.

1928: Avis: - Clara de Sousa Namorado

- José d'Oliveira Cativo

Alcórrego (escola mista) - Mariana Mendes Costa

Aldeia Velha (idem) - Alexandrina Augusta do Couto Ferreira

Benavila: - Maria Henriqueta Trindade Rijo

Ervedal: - Etelvina Augusta Castanho Magrinho

- Maria Ventura Viegas

Figueira e Barros: - Arminda da Conceição Martins

- José Francisco de Moura

Valongo: - Maria da Assumpção Quesada

1930: Avis: - José Nunes Gonçalves, 25 anos

1941: Avis: - Camilo Dias, casado, 41 anos

Ervedal: - José Francisco de Moura, casado, 48 anos, presidente da


câmara.

- Maria Augusta Vieira de Abreu, viúva, 41 anos.

- Maria Ventura Viegas, casada, 50 anos.

Figueira e Barros: - Adriano Salgueiro Alves, casado, 28 anos

- Maria de Jesus Piçarra Fernandes, solteira, 32 anos.

Benavila: - Maria Henriqueta Trindade Rijo, solteira, 50 anos.

Lista dos párocos:

1890: Avis: - António Pires de Carvalho

Ervedal: - Simão Lopes de Sousa, ordenado = 294$000


1901: Avis e Alcórrego: - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade

Aldeia Velha: - Albino José Frotas

Benavila e Valongo: - José Francisco da Conceição

Ervedal e Figueira e Barros: - João da Costa Lobato

Maranhão: - José Marques Serrão, parente do comerc. João M. Serrão.

1908: Avis e Alcórrego: - José Ricardo Freire d'Andrade

Aldeia Velha: - Albino José Frotas

Benavila e Valongo: - Joaquim Mathias Simões

Ervedal e Figueira e Barros: - João d'Almeida Canejo

Maranhão: - Joaquim Nunes Romão

1911: Avis e Alcórrego: - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade

Aldeia Velha: - José da Silva Neves, o único que mudou.

Benavila e Valongo: - Joaquim Mathias Simões

Ervedal e Figueira e Barros: - João d'Almeida Canejo

Maranhão: - Joaquim Nunes Romão

1917: Avis e Alcórrego: - Cónego José Ricardo Freire d'Andrade

Aldeia Velha: - não tem.

Benavila e Valongo: - Joaquim Mathias Simões

Ervedal e Figueira e Barros: - João d'Almeida Canejo

Maranhão: - Joaquim Nunes Romão

1928 (neste ano não havia padres no concelho, vinham de fora oficiar a missa):

Avis, Alcórrego, Aldeia Velha, Benavila, Ervedal e Valongo:

- Joaquim Matias Simões, do Cano, concelho de Sousel

Figueira e Barros: - Manuel Alves, do Cano

Maranhão: - Joaquim Nunes Romão, de Cabeção, concelho de Mora

1941: Benavila: Joaquim Matias Simões, 61 anos, único padre do concelho nesse ano,
ia a Avis oficiar a missa.
Lista dos "comerciantes e negociantes":

1901:

Avis: - João Marques Serrão, 18º MC de 1900

- Costa & Ruivo

- José da Costa Lobato

- Anna da Costa

- Henrique Bernardo Piza

- Simão Prates (esta família também é de rendeiros)

Benavila: - João Maria da Gama

Ervedal: - João Dordio Pais

- João Ferreira de Morais

1908:

Avis: - António Vidigal Simas, vereador

- Benjamim Victorino da Costa

- Henrique Bernardo Piza

- João Marques Serrão, 16º MC, casado com grande proprietária, vem
também referido no anuário como tendo uma "Agencia bancaria".

- José Barradas

- José Francisco da Costa, também é produtor de cereais e criador de


gado.

Benavila: - João d'Abreu Callado, lavrador de Benavila, família de grandes


proprietários.

- João Maria da Gama

Ervedal: - Francisco Ferreira de Morais

- João Ferreira de Morais

- Joaquim Paula Varela de Brito

Neste ano há ainda a categoria distinta de "negociantes de cereais":


- Benjamim Victorino da Costa

- Henrique Bernardo Piza, foi nomeado para a Câmara em 1910

- José Valentim Varela, grande proprietário, 5º MC, freg. Avis.

1917:

Avis: - António Vidigal Simas, também é agente de seguros.

- Benjamim Victorino Ruivo

- Benjamim Victorino da Costa, negociante de cereais.

- Francisco Mendes, é também negociante de cereais.

- Henrique Bernardo Piza, é também negociante de cereais.

- João Marques Serrão, é também agente bancário.

- José Valentim Varela Jr., grande proprietário, negociante de cereais.

- Moraes e Gazzo.

Benavila: - Viúva e Filhos de João Abreu Callado, proprietários.

- Luiz Varella de Brito Pais.

Ervedal: - Francisco Ferreira de Morais, pequeno proprietário.

- Francisco Moura.

- Joaquim Paula Varella de Brito, proprietário.

- José Botto.

- José Paulino Correia.

1928:Avis: - António Augusto Teixeira

- António Carlos das Neves

- António Sidigal Simas

- Benjamim Victorino Ruivo, também é negociante de cereais.

- Francisco Moura

- João Marques Serrão

- Joaquim Carlos Nunes

- Joaquim dos Ramos


- Moraes e Gazzo

Benavila: - Francisco Barata Godinho Fortes

- Manoel Carrilho

- Manoel Rodrigues Vellez

- Mário Bonito da Fonseca

Ervedal: - João António Correia

- Maria Rosa Claudino

- Ritta Cordeiro

Figueira e Barros: - António Joaquim Estalagem

- Felizardo António da Silva

- José Nunes Thiago

1941 (dados do recenseamento eleitoral):

Avis: - António Miguel Pais

- Francisco Marques Serrão, casado, 43 anos, sobrinho do João Marques


Serrão, herdou dele a loja e a casa.

- Francisco dos Santos Correia, 48 anos, casado

- João Machadinha, casado, 36 anos

- Joaquim Lopes de Sousa, casado, 53 anos

- Joaquim Monteiro dos Ramos, solteiro, 50 anos

- José Sombreireiro, casado, 32 anos, família do sapateiro que foi várias


vezes vereador.

Ervedal: - João do Nascimento Ferreira de Morais, família antiga no concelho,


pequenos proprietários.

Agentes bancários e de seguros:

1908:

- João Marques Serrão, comerciante, tem agência bancária.

- Alfredo Barreto da Guerra Pais, secretário da administração do concelho, é funcionário


público, tem agência de seguros e também é solicitador.
- Joaquim do Nascimento Lobato Júnior, família de funcionários públicos, neste ano
também tem agência de seguros e montou fábrica de tijolos.

1917:

- João Marques Serrão, comerciante, tem agência bancária.

- Alfredo Barreto da Guerra Pais, secretário da admin. do concelho, agente de seguros.

- António Vidigal Simas, comerciante e negociante, agente de seguros.

- José António da Fonseca, agente de seguros.

1928:

- António Vidigal Simas, comerciante, agência do BNU, agência das Companhias de


Seguros Mundial, Internacional e Previdente.

- Joaquim Carlos Nunes, comerciante, agência do Banco de Portugal e das Companhias


de Seguros Aviz e Commercio e Indústria

Lista dos Administradores do Concelho de Avis (as fontes não permitiram determinar
com precisão as datas de início e fim dos respectivos mandatos):

1885 Francisco Maria Gazzo, eleito para a Junta de Freguesia

1887 Luiz Mendes Lopes Coelho, filho do Presidente da CMA

1901 Dr. Cosme dos Campos Callado;

substituto: João de Abreu Callado, seu tio.

1901 António Paes da Silva Marques Júnior, filho de MC.

10/11/1901 Dr. Manuel Lopes Varela, médico, MC e cunhado do


presidente da CMA

6/11/1904 António Pais da Silva Marques Júnior

13/11/1904 Dr. Manuel Lopes Varela

6/5/1906 António Paes da Silva Marques

1906 até 27/10/1908 Jeronymo Lopes Coelho,

substituto: António Vidigal Simas, comerciante.

1/11/1908 até à República Padre José da Silva Nunes

16/10/1910 Dr. José Pais Telles foi nomeado, mas não aceitou o cargo
10/1910 Dr. Alberto Sabino Ferreira, bacharel.

1911 Padre José da Silva Nunes

26/8/1914 Matias Mendes Silvério

1917 António Pais da Silva Marques,

substituto: Condorcet Pais da Cunha e Sá, seu sobrinho

1922 Álvaro de Lemos

28/6/1926 Jayme de Castro (parente de António P. da Silva Marques)

1927/28 ?

31/7/1929 José Diogo Pais

5/6/1930 José Diogo Pais, ao mesmo tempo que é presidente da


comissão administrativa da CMA

28/5/1934 Arnaldo da Rosa Mendes: dono da farmácia de Avis, não


era farmacêutico; membro da União Nacional.

23/10/1934 a 4/5/1935 Capitão José Joaquim Lourenço

20/1/1939 José Francisco de Moura, ao mesmo tempo que é


Presidente da Comissão Administrativa da CMA.
Anexo 7: Iconografia
Fotografia nº 3:

Cemitério de Santo António de Alcórrego: campa de José Varela Teles, grande


proprietário.

Fotografia nº 4:

Jazigo de José Marques Serrão, comerciante casado com Maria Luísa Lopes, grande
proprietária, ao lado do jazigo de seu cunhado António Lopes Coelho, grande
proprietário.
Fotografia nº 5:

António Teles de Carvalho, grande proprietário, filho do 2º MC de 1890, no dia do seu


casamento nos primeiros anos de 1900.
Fotografia nº 6:

Alguns membros das elites urbanas c. 1880.


Fotografia nº 7:

Os meninos da escola primária nos finais dos anos 1930.


Fotografia nº 9:

Uma caçada nos anos 40.

Fotografia nº 10:

Família da Avis na Nazaré em 26/8/1936: a avó, a tia, os meninos, a criada e a filha dos
pescadores em casa de quem estavam alojados.
Fotografia nº 12:

A Rua Dr. Manuel d’Arriaga, vulgo Rua do Convento, em Avis, com as casas de
algumas das principais famílias da elite. Salientam-se os aguadeiros, com os respectivos
burros carregados de vasilhas, para o abastecimento de água ao domicílio. Fonte:
Arquivo de Cecília de Figueiredo.
Fotografias nº 13 e 14:

Fundação Abreu Callado: a casa-de-jantar e a sala-de-estar


Fotografia nº 15:

Família de Marcelina Varela e José Filipe Gomes, com as duas filhas e a mestra das
meninas, c. 1912.
Fotografia nº 16:

As meninas de Avis no Lar Residencial do Cónego Cardoso e irmã em Portalegre, c.


1918.

Fotografia nº 17:
Janela da Quinta do Pinheiro.
Fotografia nº 18:

Fotografia exposta em casa da Família Teles de Carvalho, no Monte Padrão.

Fotografia nº 19:

Casas dos caseiros e outros empregados na Herdade de Camões.


Fotografia nº 20:

Fonte da Quinta do Pinheiro (1901).

Fotografia nº 21:

Casas de habitação popular em Avis, na rua onde se diz ter sido a residência da mãe do
D. João, Mestre de Avis.
Fotografia nº 22:

Lavatório num dos quartos da casa Abreu Callado, em Benavila.

Fotografia nº 23:
Carro de parelha da Fundação Abreu Callado.
Fotografia nº 24:

Piquenique nas Fragas do Maranhão, c. 1910.


Fotografia nº 25:

Piquenique nas Fragas do Maranhão, c. 1930.


Fotografia 26:

Mascarados no Carnaval.
Fotografia nº 27:

José Barreto da Guerra Pais, c. 1907.


Fotografia nº 28:

Joaquim Coutinho de Figueiredo, oficial farmacêutico na 1ª Guerra Mundial.


Fotografia nº 29

D. Rosa d’Abreu Godinho Lopes Aleixo, c. 1850.


Fotografia nº 30:

Padre António Pires de Carvalho, Avis, 30/05/1878.


Fotografia nº 31:

Padre J. A. da Silva, Ervedal, 1878.

Fotografia nº 32:

Câmara Municipal de Avis, fotografia de Cecília de Figueiredo.


Fotografia nº 33:

As meninas da escola primária nos finais dos anos 1930.

Fotografia nº 34:

Porqueiros.
Fotografia nº 35:

Prova de ciclismo.
Fontes e Bibliografia:
I - FONTES:
1 - Fontes manuscritas:

1.1 - Inventários por morte ou por doação em vida recolhidos na Secção de Finanças da
Câmara Municipal de Avis e Inventários Orfanológicos da Comarca de Avis, no
Tribunal de Fronteira.

1.2 - Arquivo da Câmara Municipal de Avis:

- Actas das Eleições para a Câmara Municipal, para Juiz de Paz e seus substitutos, para
deputados pelo círculo de Portalegre e depois de Elvas e para as Juntas de Freguesia.

- Livros do Recenseamento Eleitoral dos anos 1886 a 1941.

- Livros de actas das sessões da Câmara Municipal de Avis entre 1886 e 1941.

- Livros de Lançamento das Décimas da Vila de Avis e do seu termo, da Vila de


Benavila, do lugar do Ervedal e da Vila da Figueira nos anos de 1764 a 1836.

- Livro de Inventários de Foros do concelho de Avis do ano de 1876.

- Livro do Recenseamento de Jurados do ano de 1915.

- Livro de Registo de Testamentos do ano de 1931.

- Livro de Registo dos consumidores de energia eléctrica na rede de Avis.

- Livros de Registo de Licenças de Uso e Porte d'Armas de fogo, aberto em 20/4/1915.

- Livros de Registo das Licenças para caçar a partir do ano de 1921.

- Livro de Registo das Licenças de Velocípedes, Bicicletas e Motociclos passadas pelo


Governo Civil do Distrito de Portalegre a partir do edital de 14/7/1914.

- Mapas do concelho e da vila de Avis.

1.3 - Arquivo do Grémio da Lavoura de Avis

1.4 - Arquivo Fundação Abreu Calado (Benavila).

1.5 - Arquivo Nacional da Torre do Tombo:

- Desembargo do Paço. Alentejo e Algarve. Pautas. Maços 750, 763 e 764, c. 844, 857,
858.

- Ministério do Interior, Direcção Geral d'Administração Política e Civil: livro nº2,


Processos Disciplinares e Inquéritos; Direcção-Geral da Administração Política e Civil,
1ª Repartição: Administração Política, maço 170, caixa 37 (1930) a maço 212, c. 79
(1934);
- Ministério do Interior, Gabinete do Ministro, correspondência recebida, Maços: 451,
caixa 4; 452; 454, c. 7; 455, c. 8; 476; 477, c. 30; 478, c. 31; 479, c. 32; 481, c. 34; 489,
c. 44; 491, c. 46; 492, c. 47; 493, c. 48; 494, c. 49; 501, c. 58; 504, c. 62; 509, c. 67;
513, c. 71; 516, c. 74; 518, c. 76; 520, c. 78; 522, c. 80; 523, c. 81.

1.6 - Arquivo do Ministério das Corporações, actualmente integrado no Ministério do


Emprego e Segurança Social

1.7 - Arquivo da Santa Casa da Misericórdia de Avis: actas das sessões real. 1850-1958.

1.8 - Arquivo Pais Telles, Ervedal, concelho de Avis:

- SÁ, Mario Pais da Cunha e - Genealogia da Família Pais. Estudo Genealógico do


Patronímico Pais no concelho de Avis, manuscrito policopiado.

- Escrituras e vários livros e manuscritos da lavoura da herdade de Pêro Viegas.

1.9 - Arquivo da Família Lopes Aleixo Cravidão: anuários comerciais, resumo


manuscrito da História da Família Lopes na região e relação das herdades ocupadas em
1975, com a respectiva área, localização e o nome dos proprietários.

2 - Fontes Impressas:

2.1 - Publicações periódicas regionais:

- Álbum Alentejano, dir. Pedro Muralha, Edição da Imprensa Beleza, Lisboa, Tomo III -
Distrito de Portalegre, 1933 - 1937.

- "Avis: As nossas impressões sobre o seu valor histórico e agrícola", revista Expansão
Portuguesa, 1935, pp. 237 - 256.

- Brados dos Alentejo, Semanário Regionalista, Estremoz, publ. desde 1931.

- Calatrava - Avis, revista trimestral, dir. Sá Lopes da Silva, publ. d. 12/1990.

- "Casa Abreu Calado", in revista Expansão Portuguesa, 1935, pp. 166 - 168.

- "Casa da Torre", in revista Expansão Portuguesa, 1935, pp. 164-166.

- Expansão Portuguesa, 1935.

- Ilustração Alentejana, Edição do Semanário Eborense Terra Alentejana, publicado


entre Maio 1925 e 1928.

- O Alentejano, "Semanário regionalista", Évora, 10/10/1928 a 29/5/1929.

- O Eborense, "Semanário Independente, Literário e Noticioso", publicado a partir de


3/11/1896.

- O Pescador, "Número especial dedicado á memoria de Francisco d'Abreu Calado"


(sic), Ano 1º, número 3, Benavila, 1/1/1914.
- O Século - Almanaque Ilustrado, 1932.

2.2 - Publicações Periódicas Gerais:

- Annuario Commercial ou Annuario official de Portugal, Ilhas e Ultramar da


Industria, Magistratura e Administração, Empresa Nacional de Publicidade, vol. II,
Lisboa. Anos: 1901, pp.1041 - 1042; 1908, pp. 1371 - 1372; 1911, pp. 1793 - 1794;
1917, pp. 1912 - 1915; 1920 (vol. III), pp. 2266 - 2268; 1928, pp. 2247 - 2250; 1964,
vol. II, pp. 405 - 410.

- Boletim do Intituto Nacional do Trabalho e Previdência, Sub-Secretariado de Estado


das Corporações e Previdência Social, volumes encadernados dos anos II (1934 - 35) a
VIII (1941); Arquivo do Ministério das Corporações, incorporado actualmente no
Ministério do Emprego e da Segurança Social.

2.3 - Imprensa Distrital (Portalegre):

- A Plebe, "Jornal Independente" entre 1/1/1897 e 28/5/1926, quando passa a ter o sub-
título "Orgão do Partido Republicano Português no Círculo de Portalegre". Último
número em 20/9/1931.

- A Cidade, "Semanário defensor dos interesses locais e do Distrito", publicado entre


30/3/1913 e 20/9/1914; director e editor: João Diogo Casaca. Nova edição em 1925,
director: Armando Neves.

- A Rabeca, semanário humorístico, publicado em 1897 e entre 10/4/1912 e 8/5/1912.

- Democracia do Sul, Évora, 1917.

- Democracia do Sul, Montemor-o-Novo, 3/11/1914.

- Intransigente, semanário republicano, publicado entre 8/3/1908 e 31/1/1913.

- Jornal da Situação, "Orgão das Comissões da União Nacional do Distrito de


Portalegre", publicado entre 4/2/1934 e 14/9/1935.

- O Alemtejano, "Publicação quinzenal illustrada", Portalegre, série 1, anno 1, nº1,


20/1/1893.

- O Alemtejano, "Folha Ligitimista, Litteraria e Noticiosa", Montemor-o-Novo, anno 1,


nº 1, 31/1/1897.

- O Democratico, "Semanário Republicano Português", Évora, ano 1, nº1, 28/1/1915.

- O Distrito de Portalegre, publicado a partir de 27/4/1884.

- O Evolucionista, "Jornal Republicano"; redacção e administração do Centro


Evolucionista de Portalegre, director: A. Vasconcelos e Sá; publicado entre 2/11/1913 e
13/6/1915.
2.4 - Imprensa Nacional: Diário de Notícias; O Mundo; O Seculo; Republica

2.5 – Legislação:

- CUNHA, Joaquim d'Almeida da - Código do Processo Eleitoral contendo todas as


disposições legaes em vigor sobre eleições de Deputados, Juntas Geraes, Camaras
Municipaes, Juntas de Parochia e Juízes de Paz. Coordenadas e Anotadas. Imprensa da
Universidade, Coimbra, 1878.

- Legislação Corporativa e do Trabalho - Edição do Ministério das Corporações e da


Previdência Social, Lisboa, 1952.

- MAGALHÃES, J. M. Barbosa de - Codigo Eleitoral Português. Compilação


systematica e annotada de todas as disposições legaes em vigor, reguladoras do direito
e processos eleitoraes, 5ª edição, Livraria Portugueza e Estrangeiras, Coimbra, 1896.

- MOURO, Joaquim Barros e MOURO, Manuel Barros - Reforma Agrária. Legislação.


Notas. Comentários., 2ª edição, Centro Gráfico, Vila Nova de Famalicão, 1976.

- RODRIGUES, António Luiz da Costa - Código Eleitoral Actualizado, Coimbra


Editora, Lda, Coimbra, 1921.

2.6 - Outras publicações:

- BARONESA X - Saber Viver. Regras de Etiqueta. Opiniões e conselhos., 5ª ed.,


Editorial Século, Lisboa, 1944.

- Cartas militares, nos: 369, 381, 382, 383, 396, 397.

- Carta itinerária de Portugal, editada pela Vacuum Oil Company, 1918.

- Mapas de Estradas do Automóvel Clube de Portugal, editados a partir de 1932.

- Mappa de Portugal para o Automobilismo, publicado pela Colonial Oil Company,


1906.

- X Recenseamento Geral da População no Continente e Ilhas Adjacentes (às 0 horas


de 15 de Dezembro de 1960), Tomo I, volume 1º: "População - Dados Retrospectivos
(Distritos, Concelhos e Freguesias)"; Instituto Nacional de Estatística; Lisboa.

- REGO, D. Francisco Xavier do - "Descrição Geográfica, cronologica, Histórica e


crítica da vila e real ordem de Avis", Madrid, 1730, in Avis, cadernos de divulgação
cultural, Edição da Câmara Municipal de Avis, ano 1, nº1, Avis, Nov. 1985.

- VASCONCELOS, Manuel Rosado Marques de Camões e - Um Velho Nobiliário do


Alto Alentejo, Lisboa, 1935.

- IDEM - O Beato João de Brito e a família Freme. Algumas linhas continuadas até ao
presente, Lisboa, 1941.
3 - Fontes Iconográficas:

Fotografias de época e actuais: as pessoas, os locais, o vestuário, os tempos de lazer, as


casas, os nomes das ruas, os jazigos e campas nos cemitérios.

3.1 - Arquivos particulares: Cecília de Figueiredo e descendentes; Fundação Abreu


Callado.

3.2 - Revistas e jornais atrás citados.

3.2 - FONSECA, Helder Adegar (coordenador) - Exposição Retratos de família. As


elites eborenses no século XIX, Galeria São Miguel - Évora, 28/6 a 20/7/1996.

4 - Fontes Orais:

- Entrevistas no Concelho:

- D. Alzira Varela, n. 1904, m 1996.

- Dr. António Trancas Godinho de Carvalho

- D. Catarina Varela Gomes de Figueiredo Pais, n. 1907.

- Dr. Eurico José Gomes de Figueiredo Pais, n. 1931.

- D. Fernanda Pais Monteiro, n. 1929.

- Eng. Gonçalo Pais da Cunha e Sá, m. 1996.

- D. Idalina Machado Magalhães Varela Pina, n. 1921.

- Sr. João Lopes Aleixo Cravidão.

- Sr. João Varela Namorado.

- Dr. Joaquim Mendes Vieira Lopes Coelho, n. 1927.

- Dra. Maria Manuela Gomes de Figueiredo Pais, n. 1929.

- D. Maria da Conceição Castelo Branco Rosado de Vasconcelos

- funcionários vários da Fundação Abreu Callado, com a colaboração do Sr.


Director, Dr. Rui Vicente, actual Presidente da Fundação Abreu Callado e dos Srs. José
Ramiro e Alzira Bonito. Entrevistas também a reformados que frequentam o centro de
dia do Asilo D. Maria Madalena Godinho d'Abreu, em Benavila, especialmente o Sr.
Francisco Aldeias, antigo jornaleiro na Casa Abreu Callado.

5 - Fontes Literárias:

- SARAMAGO, José - Levantado do Chão, Editorial Caminho, 9ª ed., Lisboa, 1991.

- PIRES, José Cardoso - O Delfim, Moraes Editores, Lisboa, 1968.


- TELES, Noel (Dr. Manuel Teles de Carvalho) - Cartas do Ermo, Livraria Portugália,
Lisboa, 1940.

- IDEM - Lua Santa (novelas), Tipografia Silvas, Lisboa, 1942.

- IDEM - Terra Campa, Empresa Nacional de Publicidade, Lisboa, 1947.

- VERÍSSMO, Erico – O Tempo e o Vento, 4 volumes, Edição Livros do Brasil, Lisboa.

II - BIBLIOGRAFIA:
- ALMEIDA, Pedro Tavares - Eleições e Caciquismo no Portugal Oitocentista (1868 -
1890), Lisboa, 1987.
- ALVES, M. - "Portalegre", in Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, 15º Volume,
Editorial Verbo, Lisboa, 1973, pp. 581-583.
- BAPTISTA, Fernando Oliveira - "Economia do latifúndio - o caso português", in
BARROS, Afonso (coordenador) - A Agricultura Latifundiária na Península Ibérica,
Seminário realizado em Dezembro de 1979, Fundação Calouste Gulbenkian, Centro de
Estudos de Economia Agrária, Oeiras, 1980, pp. 341-371.
- BARROS, Afonso (coordenador) - A Agricultura Latifundiária na Península Ibérica,
Seminário realizado em Dezembro de 1979, Fundação Calouste Gulbenkian, Centro de
Estudos de Economia Agrária, Oeiras, 1980.
- BARROS, Henrique de - "O Latifúndio: tentativa de caracterização económica", in
BARROS, Afonso (coordenador) - A Agricultura Latifundiária na Península Ibérica,
Seminário realizado em Dezembro de 1979, Fundação Calouste Gulbenkian, Centro de
Estudos de Economia Agrária, Oeiras, 1980, pp. 15-27.
- BARROS, Júlia Leitão de - Os «Night Clubs» de Lisboa nos Anos 20, Lucifer Edições,
Lisboa, 1990.
- BOURDIEU, Pierre - O Poder Simbólico, Difel, Lisboa, 1989.
- BRITO, Pedro de - "«Verflechtung» - Um Método para a Pesquisa, Exposição e
Análise de Grupos Dominantes", in HESPANHA, António M. (dir) - Penélope, nº 9/10,
Edições Cosmos, Lisboa, 1993.
- CABRAL, Manuel Villaverde de (dir.) - Materiais para a História da Questão
Agrária em Portugal, sécs. XIX e XX, Editorial Inova, Porto, 1974.
- CAETANO, Marcelo - A codificação administrativa em Portugal (Um século de
experiência: 1836 - 1935), Separata da Revista da Faculdade de Direito, Tipografia da
Emp. Nacional de Publicidade, Lisboa, 1935.
- CAMPOS, Agostinho de - Educação e Ensino, 2ª edição, Livrarias Aillaud e Bertrand,
Paris, Lisboa, 1922.
- IDEM - Educar, na família, na escola e na vida, Livraria Aillaud e Bertrand, Lisboa,
1918.
- CAYOLLA, Lourenço Caldeira da Gama Lobo – Revivendo o Passado, Imprensa
Limitada, Lisboa, 1928.
- CERDEIRA, Maria da Conceição e PADILHA, Maria Edite - As Estruturas Sindicais
Portuguesas - Uma Análise Evolutiva de Setembro de 1933 a 30 de Dezembro de 1984,
2 volumes, Ministério do Emprego e Segurança Social, Lisboa, 1988.
- COSTA, Júlio Gaspar Ferreira da - Atlas de Portugal e Colónias descriptivo e
ilustrado, 1906.
- COSTA, Alexandre de Carvalho - Avis, suas freguesias rurais, Edição da Câmara
Municipal de Avis, 1982.
- CUTILEIRO, José - Ricos e Pobres no Alentejo (Uma Sociedade Rural Portuguesa),
1ª edição portuguesa, Livraria Sá da Costa Editora, Lisboa, 1977.
- DRAIN, Michel - "Latifundium et transformation des structures sociales agraires", in
BARROS, Afonso (coordenador) - A Agricultura Latifundiária na Península Ibérica,
Seminário realizado em Dezembro de 1979, Fundação Calouste Gulbenkian, Centro de
Estudos de Economia Agrária, Oeiras, 1980, pp. 237-243.
- ECO, Umberto - Como se faz uma tese em Ciências Humanas, 3ª edição, Editorial
Presença, Lisboa, 1984.
- FONSECA, Hélder Adegar – O Alentejo no Século XIX. Economia e Atitudes
Económicas, Imprensa Nacional Casa da Moeda, Lisboa, 1996.
- GIRÃO, Aristides de Amorim - Divisão regional, divisão agrícola e divisão
administrativa, Coimbra Editora, Lda, Coimbra, 1932.
- IDEM - Esboço de uma carta regional de Portugal, Coimbra Editora, Lda, Coimbra,
1930.
- IDEM - Geografia de Portugal, edição ilustrada, Portucalense Editora SARL, Porto,
1941.
- IDEM - "Impossibilidade de fixar no sul do país o excesso demográfico do Noroeste
Português", in Congresso do Mundo Português, vol. XVIII, 1940, pp. 672-681.
- IDEM em colaboração com VELHO, Fernanda de Oliveira Lopes - Estudos da
População Portuguesa I: Evolução Demográfica e Ocupação do Solo Continental
(1890 - 1940), Coimbra Editora, Lda, Coimbra, 1944.
- IDEM - Estudos da População Portuguesa III: Migrações Internas (1890 - 1940),
Coimbra Editora, Lda, Coimbra, 1948.
- GONÇALVES, Arthur - Guia Eleitoral, Ferreira & Oliveira Lda. Editores, Lisboa,
1906.
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