7. A justificação ética do Direito e as tarefas da Filosofia Política.
7.1. Justiça, legitimidade e legitimação: 7.2. O conceito de pessoa, pedra-angular da Ética; 7.3. A justificação dos direitos legítimos No triângulo valor / norma / facto encontramos a exigência de ligar as normas a um fundamento de índole ética. Daí que a interpretação da lei obrigue a um vai-e-vem, já por nós referido, da norma para o valor, da norma para o facto, do facto para o valor e da norma para o facto. Nesta teia complexa, nós somos conduzidos à compreensão do valor ético como base da norma e do facto como evidência que permite apreender a distância entre o dever ser e a realidade concreta. Deste modo a legitimação corresponde ao processo que permite adequar a vida jurídica e social à lei e à justiça – lei geral e abstrata para todos e a justiça como valor moral. A legitimidade é a qualidade do poder que se legitimou, e que se encontra reconhecido, antes do mais por quantos constituem a base comunitária para a vida dessas pessoas. A filosofia política afirma que a sociedade humana para funcionar precisa de se encontrar legitimada, o que acontece de dois modos: legitimidade do voto e legitimidade do exercício. Numa palavra, para além do primado da lei e da salvaguarda da justiça, importa que haja um processo aceite de legitimação, de modo que haja uma mediação legítima e justa por parte das instituições. As pessoas e os cidadãos devem, assim, ser participantes e ter representação, para que a sociedade funcione com uma partilha de responsabilidades. O conceito de pessoa torna-se a pedra-angular da Ética. A palavra Pessoa provém do grego “prosopon” e do latim “personna” – que etimologicamente significam máscara do teatro. A máscara identifica a personagem e na Ética a pessoa é o sujeito por excelência dos direitos e deveres, da liberdade e da responsabilidade. Daí a importância de um contrato social baseado na singularidade e na dignidade da pessoa humana. Daí a importância de um contrato social baseado na singularidade e na dignidade da pessoa humana. Somos imperfeitos, mas perfectíveis. Esta a nossa base. Lição nº 17 – 12 de novembro de 2019.
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A justificação dos direitos legítimos leva-nos a pensar no respeito e na
salvaguarda dos direitos e deveres fundamentais. Aos lermos a Declaração Universal dos Direitos Humanos compreendemos que se “Todos os Seres Humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos” temos de ligar intimamente os direitos e os deveres. De facto, a relação entre direitos e deveres pode comparar-se ao direito e ao avesso de um belo tapete de Arraiolos. As linhas com que se tecem os dois lados são exatamente as mesmas, os pontos também. Acontece, porém, que tudo parece organizado no direito e desorganizado no avesso – contudo não há a beleza do desenho sem o complexo trabalho do artífice, que está expresso na complexidade do que fica por ver. É o mesmo aquilo que se passa com a relação entre direitos e deveres – a cada direito corresponde um dever, e a cada dever corresponde um direito; o direito e o avesso são incindíveis. Daí que a democracia seja baseada na liberdade igual e na igualdade livre (como afirmou Norberto Bobbio). Também a igualdade e a diferença são faces de uma mesma moeda. Todo o ser humano tem capacidade para gozar os direitos fundamentais. O direito à vida, à liberdade e à segurança individual têm de ser respeitados por todos e para todos. O direito à personalidade jurídica, à nacionalidade e a uma cidadania inclusiva, bem como a liberdade de consciência, a livre expressão do pensamento e o direito de associação têm de ser salvaguardados. A proibição da escravidão e da tortura, o direito a uma justiça independente, a presunção da inocência antes de condenação legal, a proteção da intimidade e da vida privada, o direito a não ser perseguido e a pedir asilo político, o direito à cobertura de riscos sociais, o direito ao trabalho e à livre escolha de emprego, o direito a uma remuneração justa, a proteção à maternidade e à infância, o direito à educação e à formação, o direito de participação política e social – tudo são determinações que poderão permitir o respeito pela dignidade humana. Falar do valor do respeito mútuo obriga, afinal, a considerar a vida humana como um valor inviolável – e fundamento ético essencial.