A despeito dos inúmeros problemas causadas pela pandemia ocorreu, no dia 17
de janeiro de 2021, a primeira etapa do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Nessa primeira etapa, milhões de estudantes de todo o Brasil fizeram questões sobre as áreas de linguagens e ciências humanas, além da redação. Como em anos anteriores, as presenças e ausências de determinados conteúdos motivaram intensos debates nas redes. Por um lado, se afirma o caráter ideológico e esquerdista do exame, enquanto por outro, se cobra a presença de conteúdos que desapareceram da avaliação nos últimos anos. Diante dessas polêmicas, pretendemos aqui estabelecer um balanço do saber histórico nessa última edição do Enem. A rigor, não há a disciplina de História no Enem, uma vez que, buscando uma perspectiva interdisciplinar, o exame pensa a partir das áreas do conhecimento. Além disso, também não há conteúdos prévios a serem cobrados na prova, de modo que todas as questões são baseadas em trinta habilidades e seis competências próprias das áreas de ciências humanas. Contudo, esse modelo avaliativo interdisciplinar não elimina os conteúdos e os saberes característicos das disciplinas. Ao contrário, trata-se de mobilizar tais saberes no sentido do desenvolvimento das habilidades e competências. Portanto, qualquer análise acerca da distribuição de conteúdos e disciplinas no exame deve partir desse pressuposto. Dentro dessas habilidades, houve uma seleção de conteúdos diversa da habitual. Em detrimento dos temas de história do Brasil e história contemporânea, apareceram diversas questões relacionadas a Antiguidade. Qualquer seleção curricular ou de conteúdos parte de determinadas intencionalidades marcadas por horizontes políticos e ideológicos. Nesse sentido, essa distribuição de conteúdos, embora vinculada às habilidades, levanta preocupações acerca dos critérios de seleção para as próximas edições do exame. Por outro lado, o ensino de História é um campo abrangente e fecundo de possibilidades. Ensinar a Antiguidade não se configura necessariamente um exercício de erudição ou a demonstração de um temperamento conservador. Na medida em que a função do ensino de história se concentra na elaboração de ferramentas para a orientação temporal dos estudantes, o estudo dos diversos tempos históricos é fundamental. O processo de historicização do presente demanda a percepção da complexidade do tempo e de seus movimentos de continuidade e descontinuidade. Portanto, à guisa de um balanço, é possível apontar, exclusivamente de um ponto de vista do saber histórico, que, apesar da preocupante ausência de questões de História do Brasil, os saberes e habilidades mobilizados no exame possibilitaram importantes reflexões para os discentes de todo o país, a despeito do governo Bolsonaro e do reacionarismo de seus ministros.