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O MUNDO PRECISA DE HERÓIS

Fogo. Fumaça. O homem se postou no vão do enorme buraco que


outrora fora uma janela e deliciou-se enquanto o sonho de outro homem
morria. Deliciava-se por ser seu assassino.
Não fora fácil. As defesas do lugar eram formidáveis, em termos de
homens e máquinas. Os germânicos sempre foram guerreiros
impressionantes, o vencedor sabia, e não podiam ser menosprezados. Ele
fechou os olhos e lembrou-se de antigas batalhas às margens do Bósforo.
Os gritos, a fumaça, o cheiro de sangue e cadáveres recentes. Tudo estava
em seu lugar. A única coisa anômala eram os tiros, mas nada que estragasse
o êxtase da vitória.
Lá embaixo, no pátio do que fora o Campo de Extermínio de Branas
(ou “A Porta do Inferno”, como se referiam aqueles que sabiam desta
instalação), um soldado, vergando o uniforme negro das SS, olhou para
cima e viu o líder inimigo parado na beira de um buraco onde ficava o
escritório do antigo Diretor Geral. Tolamente, ele ergueu seu fuzil,
preparando-se para um tiro certeiro. Obviamente, ele não estava preparado
quando sua própria sombra ergueu-se e o empalou. A atitude da sombra foi
delicada, mas cruel. O pobre homem ainda estava vivo quando uma massa
pontiaguda de trevas saiu por sua boca. Ele ainda estava vivo quando foi
devorado pela escuridão.
Sua Majestade Imperial, Vlad I do Brasil, nem mesmo desviou seu
olhar para sua vítima. Ele não demonstrou nenhuma emoção enquanto
devorava a vida, o corpo e a alma do Capitão Gerard Haüsch. Mas ele se
permitiu um pouco de contentamento ao ensinar àquele homenzinho
patético o porquê de ser chamado Príncipe das Trevas. E o capitão teria a
eternidade para lamentar, como os milhares de turcos, ingleses, americanos,
italianos e alemães antes dele.
Um uivo lamurioso cortou seu devaneio. Ele não precisava se virar.
Ele sabia o que estava acontecendo. Sobre a grande mesa retangular atrás
dele estava o corpo de uma de suas mais antigas e leais companheiras.
Dona Verona Drácula, Marquesa de Santos, Segunda Esposa de Drácula,
estava morta. Seu assassino havia escapado. Mas haveria vingança.
Drácula virou-se e observou a cena. Suas duas outras companheiras
lamentavam a morte daquela que durante séculos fora como uma irmã para
elas. Seus subordinados ao redor mantinham um silêncio respeitoso
enquanto vasculhavam o imenso escritório, reviravam as gavetas e
analisavam os livros nas estantes.
- Vocês devem se acalmar minhas queridas. Lágrimas não trarão
Verona de volta.
- Mas ela se foi, meu senhor! – disse Aleera, Marquesa da Gávea, a
Primeira Esposa.
- Ela se foi e o desgraçado que a matou ainda vive! – praticamente
urrou Marishka, Marquesa de Diamantina, e Terceira Esposa.
- Silêncio. Haverá vingança. Mas não hoje. Não agora.
Ergueu sua mão direita e suas subordinadas se afastaram rapidamente.
Ao estalar de dedos, chamas crepitaram e queimaram Dona Verona. Em um
instante havia apenas cinzas. E a lembrança.
- O que encontraram até agora, Major? – perguntou o Imperador a um
dos homens. Como os outros, este interrompera seu trabalho, bem no ato de
erguer uma pasta, apenas para assistir ao repentino crepitar e desaparecer
da Marquesa morta.
O Major Argo, também conhecido como O Pássaro, hesitou apenas
um instante antes de se pôr em sentido.
- Sim, Majestade! Até o momento não encontramos nada que explique
com maiores detalhes as experiências realizadas neste lugar, senhor! Há
apenas documentos administrativos e alguns livros de ficção, senhor!
- Bem, mas parece que o Doutor descobriu alguma coisa. – disse
Drácula. Passaram-se poucos segundos até uma voz idosa e excitada ser
ouvida pela porta aberta.
- Eu encontrei! Encontrei!
Um homem com mais de sessenta anos, usando o uniforme padrão,
mas longe de qualquer perfil militar, entrou repentinamente na sala,
pegando alguns soldados de surpresa. Ele olhou para o Major e para o
Imperador, nesta ordem, ignorando completamente as cinzas sobre a mesa,
o odor recente de carne queimada.
- Este livro é a chave para tudo que ocorreu aqui, senhores!
- Diga logo o seu conteúdo Doutor. Tenho certeza que o Major está
ansioso para ouvir.
- Ah, Majestade, trata-se de um livro muito, muito antigo. Está escrito
em grego clássico, uma cópia medieval retirada provavelmente de um
original alexandrino, pelo que li na introdução. E narra os eventos das Eras
Antigas. Sim. Sim. As eras clássicas da mitologia – a Era de Ouro, de Prata
e todas as outras.
- O que isso quer dizer, Doutor? – perguntou o Pássaro,
compreendendo muito pouco daquilo.
- Ele se refere aos períodos históricos descritos nas lendas helênicas,
Major. Houve várias raças na História, segunda a mitologia grega. Os
Homens de Ouro, de Prata, de Bronze e de Ferro, que somos nós. – disse
Drácula, sentando-se de costas para o buraco na parede. Lá fora, os sons da
batalha já haviam cessado e gritos de vitória já podiam ser ouvidos.
- De fato. De fato. O livro traz detalhes sobre estes períodos. E vai
além. É claro, eu preciso estudá-lo mais adequadamente, mas Gobineau –
que o miserável queime no Inferno – provavelmente já teve tempo o
bastante para descobrir várias coisas sobre ele. E deixou suas descobertas
escritas aqui, dentro do livro. – disse o velho, erguendo algumas folhas de
papel amassado. – Estão escritos em uma antiga forma de franco, mas isto
não é segredo para mim, he, he. O velho bruxo amante de alemães não teve
o tempo necessário para resgatá-lo, fugindo com seu “affaire”, herr
Damien.
- Vá longo ao ponto, Doutor. O que está no livro? E o que aquele
velho pederasta francês descobriu ao estudá-lo? – interrompeu Dona
Marishka.
- Sim, Marquesa. Claro. Basicamente, há muitas eras atrás – o livro
não especifica o tempo exato – houve uma raça antiga de seres que iam
além de nossa compreensão. Não se trata da Era de Ouro, mas uma
anterior. Foi o Primeiro Mundo, a Era das Trevas, em que os “Titãs” – este
é o termo usado – reinavam sobre o Cosmos. Foi um período confuso e
conturbado. Os Titãs eram seres poderosíssimos, acima de nossa
compreensão, e assim também era sua mente. Eles são descritos como
Eternos, na medida em que sua origem está associada à origem da própria
Criação. E eles podiam moldar a realidade como quisessem. Não havia
limites de nenhuma ordem.
O Dr. Everett Hobsbawm interrompeu a leitura neste ponto,
declamando:
- “O Horror! E eis que vejo! Bocas e presas. Olhos e tentáculos.
Pesadelos! Mil agulhas em meu cérebro!” – e continuou, em tom
professoral – Trata-se, como Sua Majestade já sabe, de uma descrição
contida no Livro dos Pesadelos, um texto apócrifo tido por autoria de
Whipple Lovecraft em meados do século passado. Os Titãs são seres cuja
aparência e mente são tão alienígenas para nós que simplesmente
vislumbrá-los por um instante levaria um homem – ou mulher (e fez uma
reverência às consortes reais) – à insanidade completa. Nosso cérebro, por
sua própria estrutura, não conseguiria interpretar, de forma adequada, as
imagens, sons e odores exalados por tais seres, dando-nos uma visão
absurda. Ao mesmo tempo o esforço seria tão grande que poderia levar a
seqüelas neurológicas permanentes. Agora, continuando:
“Houve problemas. Eles eram eternos, mas não apenas, eles eram
férteis. Se reproduziam. E cada filho era tão ou mais poderoso que o pai.
Aos poucos eles ameaçaram a estrutura do Universo, pois a vida precisa de
Ordem para existir, mas eles eram a encarnação do Caos. Crianças
brincando de Deus, essencialmente. E Deus precisava fazer alguma coisa,
claro.”
- Perdão? – Drácula soou como se não tivesse ouvido. A cor fugiu do
rosto do Major e as Esposas sibilaram. Apesar dos seis séculos de vida,
referências ao Divino, não importava o credo, ainda causavam celeuma ao
antigo Voivoda dos Cárpatos. Ele simplesmente não gostava da palavra, e
menos ainda da idéia. Habituara-se a ouvir sobre o divino. Por viver em um
país majoritariamente católico, forçado a tolerar tais costumes por um
senso de “noblesse obligue” – sua própria posição como príncipe-consorte
e depois monarca. Mas não precisava gostar.
- Desculpe-me, Majestade. A verdade é que o livro usa este termo. De
fato, Gobineau tinha dúvidas sobre o motivo e faz conjecturas. Talvez o
Universo – enquanto um grande organismo vivo – houvesse visto nos Titãs
uma ameaça para si, como um câncer – células se desenvolvendo sem
controle. Talvez fosse simplesmente obra do acaso. Não se sabe. O ponto é
que uma nova raça surgiu para combater os Titãs – os “Homens de Ouro”.
O livro fala que foi um ser supremo, criador de todas as coisas, mas ele foi
escrito em uma época religiosa. Gobineau acredita que alguns Titãs
nasceram diferentes de seus pais. Sofreram algum tipo de alteração e
adquiriram algo que os Titãs não tinham: sabedoria. Esclarecimento. De
fato, os Homens de Ouro eram tão poderosos quanto seus antecessores.
Eram imortais e indestrutíveis, como os Titãs. ‘Pura Luz e puro Fogo. Sóis
e Raios. Vento e Tempestade.’ – assim diz o livro. Aparentemente, como
sugere Gobineau, os Homens de Ouro eram feitos de pura energia. Mas é
claro que é cedo demais para afirmar algo deste tipo com base em uma
descrição tão vaga.
“De qualquer modo, os Homens de Ouro tinham outra vantagem, pelo
menos para o Universo – eles eram estéreis. Ou seja, não se reproduziam
desordenadamente, não tinham como preencher o Universo com outros
seres. E sua sabedoria permitia-lhes saber como manipular o Universo sem
destruí-lo, sem forçar demais.
“E eles atacaram os Titãs. Uma guerra brutal que abalou os
fundamentos da Criação. Até que os filhos do Primeiro Mundo foram
aprisionados em um ‘abismo profundo e escuro, onde podiam criar e
destruir eternamente. Lá eles permanecem. Blasfemam, rangem dentes e
juram vingança. Eles querem retornar. Talvez um dia eles consigam. E
estaremos mortos’.
“E este foi o fim do Primeiro Mundo. O primeiro Armagedom, se me
permitem dizer. E o início do Segundo Mundo, a Era de Ouro. Os Homens
de Ouro eram... “divindades”, de certa forma. Eram onipotentes e podiam
ser onipresentes. Abarcavam toda a realidade e experimentavam o
universo. E sabiam até onde podiam ir. Livres dos Titãs, eles estudaram a
Criação, gerando mundos e galáxias. E, para servi-los, criaram uma nova
raça. Segundo o livro, ‘tomando da carne dos Titãs e de seu próprio sangue,
forjaram os Homens de Prata a partir do – é uma palavra diferente,
traduzirei como Éter – e lhes deram nome e propósito. Tinham muitas
formas e cores: grandes como dois homens ou pequenos como uma criança.
Sua pele era como a cinza ou como a amendoeira em flor. Seus olhos eram
como de peixe, grandes e escuros, e sua cabeça era como uma grande
esfera, desproporcional ao corpo, este pequeno e frágil como um bambu.
Como os Titãs, os Homens de Prata eram criativos e ansiosos em inventar.
Como os Homens de Ouro, eles eram sábios e seguiam um rígido código de
conduta e comportamento. Diferente de ambos, eles não tinham os dons
divinos. Foram chamados Forjadores e Cocheiros das Estrelas, pois de suas
forjas nasciam maravilhas, e eles conduziam naus de luz pelo oceanos de
estrelas.’
“Observamos que o autor deste livro era dado à poesia. Bem, os
Homens de Prata pareciam se constituir numa civilização altamente
tecnológica, uma vez que não tinham habilidades naturais como os seus
criadores. Eles serviram aos Homens de Ouro durante inúmeras gerações.
Ajudaram-nos a criar galáxias, suavizaram sua solidão, participaram de
seus jogos.”
- Jogos, Doutor? – desta vez foi o Tenente Tiago, vulgo Mestre de
Armas, quem perguntara.
- Sim, Tenente. Jogos. Os Homens de Ouro eram imortais, poderosos
e podiam ter quase tudo que quisessem, dentro de certos limites. Criaram
para si uma utopia, uma existência perfeita. Devia ser bastante tedioso.
“E o que você faz quando está entediado? Encontra um passatempo, é
claro. Inventa brincadeiras, chama os amigos. Os Homens de Ouro deviam
se entediar muito. Então eles brincavam. Bem, nós provavelmente
chamaríamos estes ‘jogos’ de guerras, intrigas e outros nomes
desagradáveis. Mas para eles não havia malícia. Não havia maldade. Você
deve ter lido os clássicos. A Ilíada, a Odisséia, a Teogonia de Hesíodo.
Deuses lançando seus servos para lutarem entre si por ninharias. Uma
disputa de beleza, um jogo de palavras, um desafio. E, é claro, todo jogo
precisa de peças. Peões, cartas. Mesmo um simples par-ou-ímpar precisa de
dedos. E quem eram as peças dos Homens de Ouro, Tenente?
"Exatamente, os Homens de Prata.
“Agora, os Homens de Prata não eram indestrutíveis. Eles
encontraram um meio para se tornarem imortais, mas ainda podiam morrer.
E morriam nas batalhas. Mas o faziam sem temor. Serviam a seus criadores
sem restrição ou constrangimento. Imagino as histórias épicas que tais
eventos produziram. Os Homens de Prata, em volta de suas fogueiras,
contando como serviram ao seu Senhor desafiando o servo de outro Senhor
em uma batalha até a morte.”
- Uma ideia interessante. – comentou Drácula, divertido, enquanto
recolhia as cinzas de sua antiga companheira e guardava em uma pequena
caixa. – Algumas coisas nunca mudam, é claro. Continue, Everett.
- Sim, senhor. Bom, em algum momento de sua longa existência os
Homens de Ouro decidiram seguir adiante. Eles transcenderam,
abandonando esta Realidade para ir para... outro lugar. Sabe-se lá qual.
Deixaram apenas uma mensagem aos Homens de Prata: ‘Cuidem de tudo.
Quando estiverem prontos, juntem-se a nós.’ E se foram.
“No começo do Terceiro Mundo, a Era de Prata, os Homens de Prata
se viram sozinhos. E reagiram de forma diferente, é claro. Alguns se
revoltaram por terem sido abandonados, amaldiçoaram seus criadores e
seguiram seu caminho. Outros se mataram ou simplesmente
desapareceram. E outros atenderam as palavras dos Homens de Ouro.
Passaram a se preparar para se unir a seus mestres.
“Uma vez donos de seu destino, os Homens de Prata resolveram eles
mesmos criar servos para si. Afinal, eles tinham muita coisa para fazer e
não podiam perder tempo com coisinhas menores. Então criaram a Raça de
Bronze. Podemos chamá-los de Homens de Bronze, é claro, mas o termo
não parece muito apropriado. Eles são descritos com as mais diversas
formas. Alguns eram mecanismos autômatos. Outros eram organismos
vivos. Alguns eram inteligentes. Outros nem tanto. Possuíam formas de
animais, insetos ou até mesmo de “homens”. De Homens de Prata,
presumo. Os Homens de Prata os usavam para os mais variados fins.
Trabalho braçal. Cobaias. Companhia. E também nas guerras, lógico.
Agora os Homens de Prata não lutavam pelo capricho de seus senhores.
Não. Lutavam por si mesmos. E não por simples “diversão”, mas por
crenças, por território, enfim, pelas mesmas razões porque estamos lutando
esta guerra maldita. Os Homens de Prata eram mais próximos de nós que
seus antecessores. Pelo menos em alguns pontos.
“Mas aconteceu algo que os Homens de Prata não esperavam. Os
Homens de Bronze adquiriram livre arbítrio.
“Claro que não foi acidente. Pelo que entendi, os Homens de Prata
precisavam de servos com mais iniciativa, como eles próprios foram
criados desta forma. Imaginavam, os ingênuos, que podiam reproduzir a
experiência de seus mestres de forma bem sucedida. Assim, os Homens de
Prata ocupariam o lugar da Civilização de Ouro. E a Raça de Bronze
tomaria sua posição como sucessores do Povo de Prata. Simples.
“Não tão simples. Os Homens de Bronze não tinham alma – o
‘sangue’ da Tribo de Ouro. E nem mesmo a ‘carne’ – o corpo material –
criado a partir dos Titãs. Não tinham criatividade, apenas agiam conforme
seu propósito. Os guerreiros lutavam e matavam. Os operários
trabalhavam. Mas, agora que eram livres, decidiram que não queriam servir
aos caprichos de terceiros. Não queriam lutar somente quando determinado.
Não queriam trabalhar somente quando ordenados. E por isso se
revoltaram.
“O Quarto Mundo, a Era de Bronze, foi marcado por uma guerra
brutal, pelo que consta no livro – após destrinchar a linguagem floreada do
autor, e seguindo o resumo de Gobineau. Os Homens de Prata não estavam
preparados para isso e perderam muitos. De fato, havia mais Homens de
Bronze que eles. Estavam perdendo, e precisavam fazer alguma coisa.
“Alguns Homens de Prata perceberam, entretanto, uma Raça que
simplesmente não estava ali antes. Era uma espécie primitiva, levemente
parecida com eles próprios. Mas aqueles poucos sábios da Tribo de Prata
perceberam que estavam diante de semelhantes. Como irmãos mais jovens,
mais imaturos, mas com potencial. Eles os adotaram. Os criaram, e os
prepararam. Selecionaram os melhores entre eles e a partir destes
escolhidos criaram uma nova Raça. Com uma pequena parcela do poder
dos Titãs e Homens de Ouro, e a criatividade inerente à própria espécie,
estes seres combateram os monstros da Raça de Bronze. Lutaram por si,
pelos Homens de Prata e por sua própria espécie-mãe: os Homens de Ferro.
E foram chamados Heróis.
“Pouco depois os Homens de Prata partiram. Aparentemente, os
sobreviventes finalmente conseguiram descobrir como se unir aos Homens
de Ouro, e foram atrás deles. No processo, aniquilaram uma boa parte dos
Homens de Bronze sobreviventes. Alguns ficaram para trás para ajudar os
Heróis a entender seu lugar na ordem das coisas.
“Foi o início de um período confuso. Estas classificações históricas
tendem a ser arbitrárias, claro, e o livro não é preciso em definir. O fato é
que a Era de Bronze se estabeleceu firmemente nesta época. Os Homens de
Bronze remanescentes se espalharam pelo universo e faziam o que
queriam. Ou melhor, o que suas naturezas particulares determinavam.
Lutavam, brincavam ou até se amavam, de acordo com seus propósitos
singulares. Mas foi nesta época que os Heróis se espalharam pelo universo.
Muitos monstros foram destruídos. Heróis também tombaram. O livro diz
que a partida dos Homens de Prata também marcou o início da Era
Heróica. Uma era fantástica em que os Homens de Ferro partiram para as
estrelas e se espalharam pelos inúmeros mundos. Os Heróis iam a frente,
eliminando o Povo de Bronze onde os encontravam, para ceder os
territórios aos seus. Foi um período impressionante, que marcaria as almas
dos descendentes daqueles homens até os dias atuais.
“A Raça de Bronze foi aniquilada. Sobraram alguns, espertos o
suficiente para saberem se esconder quando a maré virou. Mas eram
poucos demais. Alguns foram cooptados – melhor se aliar ao vencedor que
morrer. Os Homens de Prata pararam de interferir com os Homens de
Ferro. Os Heróis escassearam. Eles tinham filhos, mas estes eram simples
homens e mulheres. Seres humanos comuns. E a civilização humana, sem
ter um inimigo comum, um propósito maior e líderes semidivinos para
guiá-los, colapsou. Os mundos entraram em guerra civil. Perderam contato
entre si. Tecnologias que o Povo de Ferro havia adquirido do Povo de Prata
falharam e os humanos não sabiam como reparar ou criar novas. Não é de
rir? Eles tinham naus, ou seja lá o que for, que singravam pelo espaço, mas
não sabiam consertá-las nem criar novas! Obviamente, eles não estavam
prontos para um passo tão grande. O fizeram por causa dos Homens de
Prata, mas foi demais para eles. E com isso a Humanidade esqueceu seu
passado glorioso. Suas batalhas heróicas. Tudo tornou-se lenda, mito ou
simplesmente foi esquecido.”
- E aqui estamos nós. – disse Dona Aleera.
- Sim. Mas algo me preocupa. Não no livro, mas o que Gobineau
escreveu no final de suas anotações.
- E o que seria, Doutor? – perguntou o Major.
- Ele fala em rituais e experimentos visando reproduzir os Homens de
Bronze. Desta vez sob o controle do Reich, e sem livre-arbítrio. Servos
poderosos e completamente leais. E que eles teriam realizado certos...
procedimentos heterodoxos... que teriam trazido alguns daqueles seres
originais. Para estudar. Mas algo parece ter saído de controle, eles
escaparam. E ninguém sabe o que estão fazendo agora.
Todos ficaram tensos na sala. A Tenente Margarida Santos, a Elo, que
com sua mente mantinha todas as tropas de invasão em contato e
sincronizadas, ousou fazer a pergunta:
- E o que isto significa exatamente?
- Simples, Tenente. – respondeu Drácula, se levantando calmamente.
– A Era de Bronze retornou. E o mundo precisa de Heróis.

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