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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL

LEDÍLSON DOS SANTOS GUTIERRE

RESENHAS CONSTITUCIONAIS

PARTE I – RESENHA DA OBRA MARTINS, Leonardo; DIMOULIS, Dimitri. Teoria


geral dos direitos fundamentais. 5ª. ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Atlas,
2014: Capítulos 1; 4-5; e 7-10.6 (p. 3-9; 49-89; e 95-218);

PARTE II - RESENHA DA OBRA: MARTINS, Leonardo. Liberdade e Estado


constitucional: leitura jurídico-dogmática de uma complexa relação a partir da teoria
liberal dos direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2012: Capítulos 4 e 6-10 (p. 89-119
e 157-308);

ANÁLISE DE CASO CONCRETO: RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 603.583:


INCONSTITUCIONALIDADE OU NÃO DO EXAME DE ORDEM DOS
ADVOGADOS DO BRASIL.

PARTE I - RESENHA DA OBRA: MARTINS, Leonardo; DIMOULIS, Dimitri. Teoria


geral dos direitos fundamentais. 4ª. ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Atlas,
2012: Capítulos 1; 4-5; e 7-10.6 (p. 3-9; 49-89; e 95-218

CAPÍTULO 1 – DIREITOS FUNDAMENTAIS: POLITICIDADE, JURIDICIDADE E


ANÁLISE METODOLÓGICA RIGOROSA

O capítulo inicial da obra acima referida, intitulado de “Direito fundamentais:


politicidade, juridicidade e análise metodologicamente rigorosa”, traz em seu texto a
proximidade existente entre Direito e Política, principalmente, devido as discussões dos
problemas sociais relacionados com os direitos fundamentais cristalizados na nossa Carta
Magna de 1988.
Por tratar-se de temas de origem e repercussão politica, a solução dos casos
envolvendo os direitos fundamentais decorrem puramente de “interpretação correta de
1

determinadas normas constitucionais”1 e, ainda segundo os autores, muitas vezes havendo


controvérsia se quem teria legitimidade para decidir de maneira definitiva sobre tal
interpretação: o judiciário ou o legislativo.
Apesar do cunho retórico e do caráter programático (em um sentido de manifesto
político) existentes, os direitos fundamentais tem caráter normativo. A ausência de estudos
científicos nessa área, observam os autores, pode ser o responsável pela inércia (boa vontade
política) do legislador em estabelecer, juridicamente, as condições de exercício e limitações
dos direitos fundamentais, chamadas de garantia dos direitos fundamentais.
Mostra-se de fundamental importância estabelecer esse critério jurídico, vez que em
diversas ocasiões os cidadãos, e até mesmo os operadores do direito, não conseguem
entender, aplicar e reivindicar os direitos fundamentais, devido sua abstração ampla, sendo
necessário disciplinar a relação entre eles e o Estado.
Para os autores da obra resenhada, é de responsabilidade da jurisprudência e pesquisa
jurídica construir a dogmática jurídica capaz de solucionar questões jurídicas práticas
envolvendo os direitos fundamentais. Deve-se valer das técnicas de interpretação jurídicas e
fontes doutrinárias que apontam problemas, resolvem casos difíceis e apresentam de forma
sistemática e crítica as possíveis soluções jurídicas práticas.
O estudo dos direitos fundamentais se divide em três partes, segundo os autores: 1)
Teoria Geral; 2) Dogmática Especial, e; 3)Visão Jusfilosófica. A obra resenhada trata da
primeira parte.

CAPÍTULO 4 – CATEGORIAS E FUNÇÕES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Inicia-se o capítulo 4 (quatro) da presente obra resenhada informando que para


entendermos a função dos direitos fundamentais é necessário visualizarmos a relação
existente o Estado e cada indivíduo e, a partir dela, poderemos distinguir 3 (três) categorias
ou espécies de direitos fundamentais.
A primeira delas é a pretensão de resistência à intervenção estatal (Direitos de Status
Negativus) onde é protegida a liberdade do individuo contra uma possível atuação do Estado,
limitando seu poder, ao gerar uma obrigação negativa, de deixar de fazer algo.

1
MARTINS, Leonardo; DIMOULIS, Dimitri. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais. 4ª. ed. revista,
atualizada e ampliada. São Paulo: Atlas, 2012, p. 4.
2

Trata-se do Direito de defesa ou de resistência onde se possibilita ao titular repelir ou


impedir com todos os meios disponíveis de uma intervenção injustiçada do Estado.
Ressaltam os autores que, se restar justificada a intervenção estatal, não poderá opor o
individuo suscitando ofensa ao direito fundamental.
Os Direitos de Status Positivus (ou sociais ou a prestações), inseridos na segunda
categoria, permitem aos indivíduos que buscam melhorar suas condições de vida exigir uma
atuação por parte do Estado no intuito de garantir os pressupostos materiais necessários para
o exercício da liberdade.
De acordo com a obra, podem as prestações estatais podem ser pelo oferecimento de
bens e serviços a pessoas que não podem adquiri-lo no mercado, bem como oferecimento
universal de serviços monopolizados pelo Estado, além das prestações normativas que
consistem na criação de normas jurídicas que tutelam interesses individuais.
A terceira categoria colocada pelos autores são os Direitos de Status Activus (ou
Políticos ou de Participação). Aqui há a possibilidade de participação ativa dos indivíduos
nas decisões políticas do Estado, exemplificando com o sufrágio, referendo, participação em
partidos político etc.
Apesar das críticas recebidas pela proposta classificatória trialista de Jellinek, a
mesma jamais perdeu sua pertinência e continua na atualidade. No entanto, observam os
autores ainda neste quarto capítulo, que tal proposta não abrange todas as formas de direitos
fundamentais encontradas nas Constituições modernas, sendo necessário observar
determinados casos particulares.
Um caso citado é o dos Direitos Coletivos, de natureza predominantemente coletiva,
também denominados Direitos Difusos, pois seus titulares continuam sendo indivíduos, mas
o exercício não é sempre individual. O problema apontado encontra-se no conteúdo. Em
outras palavras, encontra-se a problemática na impossibilidade de determinar o que cada um
dos titulares do direito pode fazer ou exigir em determinadas circunstâncias concretas,
diferentemente do que ocorrem com os demais direitos fundamentais.
Citam os autores as Garantias de Organização (de Carl Schmitt) cuja finalidade é
criar e manter instituições que sustentem o exercício dos direitos fundamentais, uma vez que
não seria possível ao indivíduo exercer seus direitos fundamentais caso não houvesse uma
rede de instituições estatais que permitisse, e que tem custos, inclusive, para garantir os
direito fundamentais de status negativus.
Há um grande desequilíbrio na bibliografia dos direitos fundamentais em relação aos
deveres fundamentais dentro da Constituição. Apontam várias categorias de deveres
3

constitucionais insertos na constituição de 1988 endereçados tanto para o Estado quanto para
os indivíduos e entidades abstratas.
Verificam que a regulamentação dos deveres tem dupla função: 1) orienta o
legislador na criação da norma concretizadora, operacionalizando os deveres e 2) serve de
fundamento para examinar a constitucionalidade dessa norma criada.
Com isso, definem a os deveres fundamentais como “deveres de ação ou omissão,
proclamados pela Constituição (fundamentalidade formal), cujos sujeitos ativos e passivos
são indicados em cada norma ou podem ser deduzidos mediante interpretação”.2
Finalizando o capítulo 4, os autores lecionam que as garantias fundamentais, as quais
não enunciam direitos, mas objetivam prevenir ou corrigir violação a tais direitos, são
preventivas e repressivas. As primeiras são as que limitam o poder estatal e as segundas são
as que impedem violações (remédios constitucionais).

CAPÍTULO 5 – TITULARES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

A Constituição Federal de 1988, do ponto de vista dogmática jurídica, não garante os


direitos fundamentais a todos, excluindo implicitamente algumas categorias de pessoas num
patamar constitucional, ou até mesmo não especificando ao certo a quem se destina,
conforme afirmam os autores no 5º (quinto) capítulo da obra resenhada.
O Caput do artigo 5º traz, num primeiro momento, o direito a igualdade garantido a
“todos”, ou seja, qualquer pessoa. Posteriormente, o mesmo artigo, diz que “brasileiros e
estrangeiros residentes no Brasil” gozam de outros direitos fundamentais, tais como, a vida,
liberdade, propriedade, etc.
A grande questão colocada pelos autores é em relação ao estrangeiro não residente no
Brasil (turista, por exemplo). Entretanto, a partir do momento que a Carta Magna de 1988
não faz referência a estrangeiros legalmente estabelecidos, isso significa que a tutela dos
direitos fundamentais não depende da situação e das condições de permanência, mas do
simples fato empírico de vincular-se com o país de forma mais duradoura. Mas a questão não
se mostra simples.
Conforme exemplificam no texto, no caso de ser criada uma lei autorizando a prática
de tortura em interrogatórios para casos extremos, claro estaria a inconstitucionalidade de tal

2
MARTINS, Leonardo; DIMOULIS, Dimitri. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais. 4ª. ed. revista,
atualizada e ampliada. São Paulo: Atlas, 2012, p. 66.
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em relação aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Brasil. Poderíamos, dessa forma,
concluir que aos estrangeiros não residentes não caberia o exercício do direito de resistência
contra o Estado. Porém, não é o ocorre, pois não significa que eles estejam a mercê dos
aparelhos estatais.
Para evitar a discriminação absoluta e politicamente reprovável como esta, a doutrina
constitucional brasileira trouxe, de acordo com os autores, algumas teorias.
Uma delas é o Argumento da Obviedade, que propõe interpretar o artigo 5º como se
fosse direito de todos aqueles que estão submetidos ao ordenamento jurídico brasileiro,
encontrando o problema no momento em que se ignora a vontade do constituinte; outro
Argumento é o dos Direitos Naturais, o qual não teria o constituinte alcance para restringir
esses direitos, o que não se pode admitir num Estado Constitucional que tem o poder
constituinte originário ilimitado; o Argumento da Dignidade da Pessoa Humana propõe
ampliar o a titularidade dos direitos do art. 5º, sem, no entanto, desrespeitar a vontade do
constituinte. Tem-se mostrado como o argumento mais adequado, porém, ainda insatisfatório
devido ser muito abstrato o conceito da dignidade da pessoa humana.
Conclui os autores nos capítulo 5 que os estrangeiros não residentes no Brasil são
“titulares de direitos de segunda categoria”, ainda que tais direitos sejam idênticos no
conteúdo com os direitos fundamentais, pois são de nível infraconstitucional, podendo o
legislador restringi-los ou revoga-los.
Em relação aos direitos sociais, de acordo com os autores, não há muita dificuldade,
pois os termos utilizados indicam seus titulares, tais como “desamparados”, “maternidade”,
“infância”, “trabalhadores urbanos e rurais”, bastando saber a demarcação do limite
econômico-social em cada caso, a qual deve ser estabelecida pelo legislador comum, já que o
constituinte não estabeleceu, por exemplo, idade no que se refere a “infância” ou valor
econômico no caso dos “desamparados”.
Para ser exercer os Direitos Políticos praticamente basta ser brasileiro, pois a
titularidade varia em função de cada direito, como a idade, por exemplo, para elegibilidade
em determinados cargos.
Os estrangeiros residentes também podem ser titulares de direitos políticos, porém
com maior restrição. Podem filiar-se em partidos políticos e, aos portugueses que residam no
Brasil permanentemente, podem exercer todos os direitos reconhecidos aos brasileiros, desde
que haja reciprocidade com Portugal.
A titularidade dos direitos coletivos, de natureza predominantemente coletiva,
também denominados Direitos Difusos, tais como, direitos do consumidor, direito ao meio
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ambiente e direitos à solidariedade, não é determinada pela constituição e, por isso,


dependerá da legislação infraconstitucional, sendo, desse modo, a questão da titularidade
sempre dependente do tipo do direito.
De acordo com os autores, se interpretarmos gramaticalmente o artigo 5º da
Constituição Federal de 1988, as pessoas jurídicas não terão direito de resistência se o poder
estatal intervier contra ela. No entanto, há uma regra geral que equiparam as pessoas
jurídicas às pessoas físicas no que tangem aos direito fundamentais cujo status seja negativus
no que couber e for compatível com as pessoas jurídica por meio de uma interpretação
constitucional extensiva.
Entretanto, concluem os autores, deverá se repetir o mesmo raciocínio dos
estrangeiros não residentes no país, ou seja, as pessoas jurídicas são titulares de direitos de
“segunda categoria”, ainda que tais direitos sejam idênticos no conteúdo com os direitos
fundamentais, são de nível infraconstitucional, podendo o legislador restringi-los ou revoga-
los.

CAPÍTULO 7 – EFEITOS VINCULANTES E EFEITO HORIZONTAL DOS DIREITO


FUNDAMENTAIS

O capítulo 7 (sete) aborda inicialmente o efeito vinculante imediato dos direitos e


garantias fundamentais insculpido no artigo 5º,§ 1º da Constituição Federal. Traduz-se em
efeito imediato os direitos e garantias fundamentais vinculando a todos, inclusive o Poder
Legislativo.
Entretanto, tal vinculação imediata não ocorre com os Direitos Sociais nem Direitos
Difusos. O mencionado §1º refere-se as normas definidoras de direitos, o que ocorre somente
com os direitos e garantias fundamentais, havendo maior dificuldade em relação aos outros
por ter uma baixa densidade normativa, necessitando de norma reguladora
infraconstitucional.
Ressaltam os autores, no entanto, que isso não significa que tais direitos não sejam de
aplicabilidade plena, imediata e irrestrita, pois assim são.
No que se refere a aplicabilidade dos direitos fundamentais, parte da doutrina
invocam a construção da dogmática reserva do possível, o que não pode ser utilizada no
ordenamentos jurídico brasileiro como critério para limitar a aplicabilidade imediata dos
direitos prestacionais, de acordo com os autores.
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A principal finalidade dos direitos fundamentais foi limitar o Poder estatal, sendo,
portanto, o Estado, seu principal destinatário, devendo abster-se de intervir na liberdade;
prestar no intuito de garantir os pressupostos materiais necessários para o exercício da
liberdade.
Ocorre que os particulares também são destinatários ou sujeitos passivos das normas
de direito fundamental. Ainda que de forma indireta, os particulares devem respeitar tais
direitos em relação a outros particulares, numa relação horizontal, pois os direitos
fundamentais, nesse aspecto, ganham eficácia erga omnes.

CAPÍTULO 8 – AS DIMENSÕES SUBJETIVA E OBJETIVA DOS DIREITOS


FUNDAMENTAIS

Trata o 8º (oitavo) capítulo dimensões dos direitos fundamentais, tanto subjetiva


quanto a objetiva.
Em relação a dimensão subjetiva, os autores afirmam que está ligada ao liberdade
individual (status negativus) do titular do direito, mas, da mesma forma, relaciona-se com a
liberdade positiva (status positivus), pois deve o estado também prestar ação (proibição de
omissão).
A dimensão objetiva definida na obra trata como a dimensão dos direitos
fundamentais cuja percepção independe de seus titulares, apresentando 04 (quatro) aspectos:
1) normas de competência negativa; 2) critério de interpretação e configuração do direito
infraconstitucional; 3) limitação dos direitos fundamentais no interesse de seus titulares, e; 4)
dever estatal de tutela dos direitos fundamentais.
Este quarto e último critério trata-se do dever do Estado de proteger ativamente das
ameaças que o direito fundamental venha sofrer, inclusive de particulares, aproximando da
dogmática do efeito horizontal, norteado sempre pela observância e proteção a dignidade da
pessoa humana.
Observam os doutrinadores que essa dogmática foi desenvolvida pela jurisprudência
do Tribunal Constitucional Federal alemão, mas que ate hoje há dificuldade de
sistematização, pois o seu desenvolvimento se deu em circunstâncias diversas.
A título de exemplo, uma primeira circunstância foi proibir e criminalizar o aborto,
desenvolvendo o Estado seu dever de tutela da vida de forma preventiva, e se preciso,
repressiva-retributiva, proibindo uma conduta de particulares.
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Uma outra circunstância foi o desenvolvimento tecnológico que cria perigos a uma
serie de direitos fundamentais, tais como saúde e equilíbrio ambiental. Os autores
exemplificam com o desenvolvimento da bomba atômica e a poluição ambiental, bem como
desenvolvimento da informática que pode violar a privacidade. Aqui, o dever de tutela
corresponde ao dever de garantia da segurança e o dever geral de prevenção de riscos.
O terceiro contexto trazido na obra resenhada diz respeito na necessária intervenção
direta do Estado nos conflitos entre particulares quando uma das parte se mostra
hipossuficiente, sendo necessário a criação de normas gerais que amenizem das
desequilíbrio na relação existente.
Apesar das evoluções dos direitos fundamentais trazidas pelo direito alemão nos
casos supramencionados, não logrou-se, sob o aspecto jurídico-objetivo, a chegar num
parâmetro que atenda um standard de racionalidade estritamente jurídica.

CAPÍTULO 9 – LIMITES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS E COLISÕES ENTRE


ELES

O 9º (nono) capítulo aborda os limites e colisões dos direitos fundamentais que, a


princípio, não tem relevância prática, do ponto de visto jurídico-dogmático, a não ser que
haja uma intervenção no seu exercício, limitando-os. Esse é a primeira condição para os
direitos fundamentais adquirem relevância pratica: a intervenção. A segunda condição é que
a mencionada intervenção estatal decorra de uma norma infraconstitucional.
Conforme os autores, para resolver problemas decorrentes do exercício de direitos
fundamentais, o operador do direito deve conhecer a problemática dos limites de sua
proteção e dos métodos de solução de colisões entre direitos fundamentais.
Para tanto, os doutrinadores da obra resenhada trazem conceitos básicos retirados da
dogmática alemã e recepcionados pelo ordenamento jurídico brasileiro, que serão de suma
importância para delimitação dos direitos fundamentais no momento da resolução de
conflitos decorrentes das colisões entre eles.
O primeiro deles é a área de regulamentação, a qual tem por objetivo regulamentar
uma situação fática que acontece por razões físicas ou sociais, onde se busca uma decisão,
ainda que genérica, do constituinte a respeito dessa situação real que indica o que deve
acontecer em relação a ela.
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A área de proteção está numa seara menor do que a área de regulamentação, uma vez
que o constituinte retira daquele recorte da realidade social sobre qual incide a norma (área
de de regulamentação) um comportamento ou situação não contemplados pela norma. Tal
diferenciação é de fundamental importância para o operador do direito no momento da
resolução do conflito.
Para verificar se uma conduta estatal violou direitos fundamentais é preciso que tenha
havido, no mínimo, a tentativa de exercício do direito supostamente transgredido. No
entanto, de acordo com os autores, não é obrigatório que o titular do direito realize a conduta
positivamente descrita, basicamente, por três razoes: 1) se trata de direitos e não obrigações;
2) pode-se ter direito violado mesmo sem o exercer; 3) pode-se configurar violação quando o
seu titular se abstiver ou for obrigado a se abster de seu exercício, o que não deixa de ser
uma forma de exercer o direito (a abstenção; conduta negativa como forma de exercer o
direito).
Outra forma de introduzir limitações, restringindo a área de proteção do direito, é a
reserva legal que o permite ao legislador comum realizar tal limitação, podendo ser simples
(limitação plena) ou qualificada (limitação relativa); tácita ou indireta, que traz grandes
dificuldades devido seu caráter indeterminado, valendo de técnicas de interpretação para
solucionar os conflitos e delimitar a limitação dos direitos fundamentais.
Quando não houver reservas legais que autorizem a limitação pelo legislador de um
direito fundamental, poderá o mesmo ser limitado pelo direito constitucional de colisão ou
colidente, inexistindo, dessa forma, direito fundamental ilimitado. Ressaltam, os autores que
apenas se utilizará dessa limitação quando realmente não houver reservas legais
estabelecidas pelo constituinte.
Há, ainda, a legalidade excepcional estabelecida pela Constituição, que será utilizada
em caso de graves conflitos ou ameaças a estabilidade da ordem política social, alterando,
inclusive, as competências das autoridades estatais e reforçando os poderes de ação do
Executivos. Tais situações excepcionais são: Estado de defesa; Estado de Sítio, dentre
outros. Tais limites seriam considerados inconstitucionais se fossem impostos quando há
plena normalidade. Daí sua excepcionalidade.

CAPÍTULO 10 - O CRITÉRIO DA PROPORCIONALIDADE COMO MÉTODO PARA A


JUSTIFICAÇÃO DE INTERVENÇÕES EM DIREITOS FUNDAMENTAIS E PARA
SOLUÇÃO DE SUAS COLISÕES.
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Os autores da obra resenhada iniciam o décimo capítulo afirmando que o pensamento


jurídico-constitucional contemporâneo já tem uma noção do que é proporcionalidade, a qual
foi desenvolvida originalmente pela jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal
alemão. Nos últimos tempos foi exportada para várias partes do mundo, inclusive para o
Brasil.
Naquele país, o Poder Judiciário foi obrigado a encontrar um critério para avaliar
intervenções estatais que dificultavam o exercício dos direitos fundamentais, pois as
intervenções somente eram aceitas quando respeitado o mandamento da proporcionalidade.
Os direitos fundamentais ao garantir a liberdade individual, representavam obstáculos à
atuação do Estado frente aos interesses coletivos.
Para os autores, a proporcionalidade tem natureza de regra e não de princípio, pois
trata-se de um mandamento constitucional que visa examinar a constitucionalidade de
intervenções estatais a um direito fundamental. Já para alguns doutrinadores brasileiros,
ainda de acordo com os autores, a proporcionalidade deriva do princípio do Estado de
direito, pois garante somente a legalidade dos atos da Administração e a necessidade formal
de reserva legal para intervenções na esfera individual, sendo insuficiente para descrever o
efeito e fundamentar a proporcionalidade.
O Brasil teve influência da doutrina de Portugal para a recepção da
proporcionalidade, cujo conceito é misto por reunir elementos distintos no que se refere à
teoria das fontes do direito. Desse modo, surge o conceito a partir do princípio do Estado de
direito como também de sua qualidade enquanto regra da razoabilidade.
A recepção da proporcionalidade no Brasil reduziu-se a um simples exame de
razoabilidade, pois tratam os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade como
sinônimos.
No entanto, o principio da proporcionalidade é elemento disciplinador do limite à
competência constitucional, atribuída aos órgãos de restringir a área de proteção de direitos
fundamentais. O autor considera que a aplicabilidade da proporcionalidade no Brasil se
justifica por dois argumentos. Primeiro, pelo vínculo direto do legislador aos direitos
fundamentais. E segundo, o reconhecimento de garantias de direitos fundamentais que não se
encontram expressamente previstos na Constituição, mas decorrentes de seus princípios. O
fundamento constitucional da proporcionalidade é o controle da discricionariedade
legislativa aberta pelo limite constitucional, quando aplicado de forma correta evita
decisionismo e efetiva o princípio da separação de poderes.
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De acordo com os autores da obra resenhada, a proporcionalidade deve fiscalizar o


poder estatal de forma racional, aplicando-a de forma lato sensu e em quatro passos
sucessivos: 1) a busca da licitude do propósito perseguido. Deve-se interpretar e definir o
real propósito da autoridade estatal e verificar se se trata de um propósito lícito; 2) a licitude
do meio utilizado. É a avaliação da idoneidade isolada do meio empregado em relação à sua
licitude; 3) a adequação do meio utilizado. Avalia a relação entre o meio e o propósito por
ele perseguido; 4) a necessidade do meio utilizado. É um passo decisivo, que realiza o
controle mais profundo, decidindo-se o meio é, em última instância proporcional ao
propósito perseguido.

PARTE II - RESENHA DA OBRA: MARTINS, Leonardo. Liberdade e Estado


constitucional: leitura jurídico-dogmática de uma complexa relação a partir da teoria
liberal dos direitos fundamentais. São Paulo: Atlas, 2012: Capítulos 4 e 6-10 (p. 89-119
e 157-308)

CAPÍTULO 4 - DO VÍNCULO DO PODER JUDICIÁRIO AOS DIREITOS


FUNDAMENTAIS

O quarto capítulo, intitulado “Do vínculo do Poder Judiciário aos Direitos Fundamentais”, da
obra resenhada se propõe a buscar uma substancialidade jurídico-científica para auxiliar a
jurisprudência constitucional brasileira a dar força normativa aos direitos fundamentais por
meio do estudo do modo do vínculo do judiciário a tais direitos.
De acordo com os autores, a dogmática do vínculo do Poder Judiciário surge com a
interpretação de normas infraconstitucionais (eficácia horizontal indireta dos direitos
fundamentais). Tal eficácia, que envolve “indivíduo-Estado-indivíduo”, somente é
desenvolvida junto aos direitos fundamentais clássicos (status negativus), enquanto que os
direitos fundamentais sociais tem status positivus.
Os direitos fundamentais como “reservas de lei proporcional” exprime-se no sentido
que trata-se do produto legislativo, pois tem a função constitucional de disciplinar o
exercício dos direitos, sendo controlado seu conteúdo normativo. Assim, a lei passa a ser
considerada intervenção estatal no exercício dos direitos e não simples conformação do
direito.
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O vínculo do Poder Judiciário aos direitos fundamentais é direto e imediato,


conforme afirmam os autores, pois controlam o respeito aos dispositivos constitucionais
pelos órgãos da Administração ou a constitucionalidade abstrata da lei formal, podendo
também negar aplicabilidade com base em inconstitucionalidade.
Por meio dos vínculos formal e material do Judiciário que diz que este pode violar
direitos fundamentais por sua atividade específica, a interpretação e aplicação de normas
jurídicas, independente da constitucionalidade. Ou seja, o Judiciário ao realizar a subsunção
da norma infraconstitucional pode violar dispositivo constitucional durante o processo de
interpretação.
Trata-se da regra da “interpretação conforme os direitos fundamentais”, que é vínculo
específico do Judiciário. Ordena uma interpretação de regras e cláusulas gerais conforme seu
teor, não se distanciando do âmbito protegido da liberdade individual, buscando ser o mais
favorável à realização dos comportamentos individuais tutelados pelas normas
constitucionais jusfundamentais.
O vínculo específico do Judiciário dispensa totalmente a distinção qualitativa entre
princípio e regra. É de tamanha importância que o juiz conheça o alcance de cada tutela
constitucional. Como também conhecer dos comportamentos individuais ou coletivos de
acordo com os direitos públicos subjetivos, a abrangência do dispositivo constitucional e sua
obrigação estatal derivada da norma, como todo o direito constitucional positivo.
O vínculo do Judiciário aos direitos fundamentais é respaldo para a eficácia
horizontal indireta dos direitos fundamentais. Essa eficácia foi recepcionada pela doutrina
brasileira da dogmática alemã, e trouxe junto a si a discussão da constitucionalização do
direito privado. Como por exemplo a “função social do contrato”, conceito aberto na lei
civil. Para o Autor, no Brasil só se observa o lado positivo da constitucionalização do direito
privado. E esquecem de seus lados negativos, quais possam ser, o comprometimento da
autonomia do direito privado e a ineficácia material das normas do direito privado e
constitucional, incitado pela confusão entre parâmetro e objeto do controle normativo
constitucional.
O efeito horizontal de uma eventual liberdade que contrarie o direito fundamental da
personalidade pode se manifestar como novamente relevante, implicando o problema de
difícil solução da colisão de direitos fundamentais.
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CAPÍTULO 6 - SIGNIFICADO MACROECONÔMICO DOS DIREITOS


FUNDAMENTAIS

O capítulo 6 (seis) da obra diz que os direitos fundamentais são normas dotadas de
supremacia dentro do Estado Constitucional e democrático de direito. Estas normas dão
respostas a questões macropolíticas e macroeconômicas. A maioria dos direitos
fundamentais são macropolítica, já os macroeconômicos são dois, quais sejam, o direito de
propriedade e a liberdade profissional.
Inicia pelo estudo da área de regulamentação ou o âmbito da realidade social que
incide a norma. A liberdade profissional estar tipificada no art. 5°, XIII, da CF. Tem como
atividades tuteladas o “trabalho, ofício ou profissão”. O termo de regulamentação estar no
artigo quando fala sobre a realização de “qualquer” atividade, contribuindo para a
subsistência econômica de quem o pratica.
Posteriormente a definição da área de regulamentação, se busca o alcance da
proteção. Busca saber que atividades, comportamentos individuais ou coletivos ou situações
jurídicas estão contidas no art. 5°, XIII, da CF. Inicialmente é preciso definir o significado
do termo “qualquer” neste artigo, que não exclui trabalhos, ofícios ou profissões ilícitas e/ou
não regulamentadas. Oficio e profissão referem a uma porção de atividades coordenadas que
só no seu conjunto podem levar ao exercício profissional, assim comportamentos fora desse
feixe e que contrariem o ordenamento jurídico não estão dentro da área de proteção.
Referente ao alcance específico da verificada área de proteção, escolhe-se primeiro a
profissão, oficio ou trabalho que é tutelada. Depois tutela-se a escolha do local do exercício
profissional.
Quanto a pessoa jurídica ser titular do direito fundamental a liberdade profissional-
empresarial, já que o art. 5°, XIII, da CF não faz menção a essa titularidade. Parte da
doutrina brasileira não ver empecilho para estender a titularidade a pessoa jurídica, já o autor
não concorda. E ver como solução a criação de uma Emenda Constitucional que acabe com a
restrição.
Conforme o §2° do art. 5° da CF os doutrinadores brasileiros consideram uma
abertura que estende a tutela. De acordo com a natureza do direito fundamental envolvido, se
este for de acordo com o caráter artificial da pessoa jurídica, esta deverá ser considerada
titular do direito fundamental.
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Do exercício da liberdade pode surgir problemas a bem jurídico coletivo ou de


terceiros. No mesmo momento da outorga de um direito fundamental, há também um limite
do mesmo.
O limite é feito por intervenções, há intervenção na escolha do ofício ou profissão
que pode se dar por limites objetivos ou subjetivos ao ingresso do titular do direito. Há
também as intervenções no exercício profissional, que ocorrem por regulamentações. Dar-se
quando o titular do direito já ingressou no oficio ou profissão escolhida. E a intervenção no
exercício de qualquer trabalho, quando a atividade que intervém não corresponde a nenhum
oficio ou profissão tradicional.
O art. 5°, XIII, da CF, contém uma reserva legal ao dizer “qualificações profissionais
que a lei estabelecer”. Há critérios para o controle de leis e medidas configuradoras da
reserva legal. O principal critério utilizado para a aferição da constitucionalidade de
imposição de um limite constitucional a um direito fundamental é o critério da
proporcionalidade. O fundamento está no vínculo do legislador aos direitos fundamentais.
A lei que definirá quais as qualificações profissionais passarão no crivo do exame de
proporcionalidade. Ela só será proporcional se for útil a um propósito legítimo e em relação
a ele, adequada e necessária. O critério da proporcionalidade é empírico e deve ser
interpretado conforme as mudanças sociais.
A reserva legal contida no artigo que estamos trabalhando, é classificada como
qualificada se entendermos que ela já fixa o propósito que deverá ser seguido pela lei
concretizadora. O propósito é garantir a sociedade que certos profissionais, inclusive os
liberais, possuem qualificação necessária para o exercício de suas atividades. A adequação
da intervenção há quanto tem uma relação de fomento entre a utilização e o propósito. O
critério da necessidade será afetado quando há meios alternativos igualmente adequados,
mas que poupem a liberdade atingida por onerá-la de maneira menos ou mais grave.
O critério da proporcionalidade significa a análise da adequação e necessidade da
intervenção estatal em face de um propósito lícito conforme a Constituição. A
constitucionalidade da intervenção estatal em face dos direitos fundamentais de status
negativus, como a liberdade profissional tem um valor heurístico.
A relevância macroeconômica dos direitos fundamentais é relevante, e mais ainda sua
repercussão política de decisões judiciais sobre violações de tais direitos. A separação de
direito e política na concretização dos direitos fundamentais é impossível, tem de haver
standards jurídico-dogmáticos para não confundir uma decisão judicial correta de uma
incorreta e arbitrária.
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CAPÍTULO 7 - PROPRIEDADE E SUA FUNÇÃO SOCIAL

O autor começa o sétimo capítulo afirmando que o direito constitucional mantém


uma relação muito próxima com a política. Na Alemanha é aceitável que muitas decisões
judiciais constitucionais tenham efeitos políticos inevitáveis, porém não quer dizer que não
sejam corretas da forma jurídico-dogmática.
O direito fundamental que aqui será tratado, utiliza de parâmetro de um controle
normativo abstrato que pode trazer consequências políticas marcantes. Uma decisão judicial
pode influenciar de forma decisiva no futuro processo legislativo.
O direito à propriedade tem caráter sui generis. O mesmo não tem definição na
Constituição, o artigo 5° só dar garantia a este direito. Para efetivar esta garantia o Estado
criou um aparato institucional e o devido processo legal para imposição de terceiros quando
necessário. O direito à propriedade é de resignação exclusiva normativa, sua definição se dar
no âmbito do direito civil.
Assim, tanto o legislador ordinário define como limita o direito fundamental à
propriedade. Disto resulta uma dúvida, como o legislador pode ser vinculado ao direito
fundamental à propriedade se ele mesmo tem autonomia para defini-lo.
A área de proteção ao direito fundamental à propriedade é a propriedade particular, já
que a propriedade pública é matéria constitucional, mas não disciplinada nos direitos
fundamentais. O conceito de propriedade se dar pela lei civil, lei infraconstitucional e é
mutável. Ao mesmo tempo ela dar conteúdo e limites necessários ao direito de propriedade
para que sejam garantidos os interesses e bem jurídicos com ela conflitantes.
O alcance da proteção ao direito de propriedade é limitado à existência presente de
propriedade, não passa do direito adquirido. O direito fundamental à propriedade protege
apenas o resultado da ocupação econômica ou investimento patrimoniais, não o processo de
aquisição em si. O titular deste direito tem a faculdade do usar, gozar, dispor e reaver da
coisa. Tanto tem o direito de exercer as faculdades, como a seu livre-arbítrio não as exercer
no todo ou em parte. A garantia da propriedade abrange coisas móveis e imóveis, fungíveis e
infungíveis, e até mesmo coisas se nenhum valor econômico.
A pequena propriedade particular rural tem dois limites constitucionais, quais sejam,
ser pequena a propriedade rural e trabalhada pela família. Diante disso, decorre que todo
contratante que fechar contrato com o pequeno proprietário rural se submete a esse vínculo,
não podendo interferir no direito de propriedade mediante penhora em processo de execução.
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Quanto a pessoa jurídica como titular do direito à propriedade, a natureza deste


direito permite na medida em que ele é um direito exclusivamente normativo. Não se exige
um comportamento típico humano, a pessoa jurídica pode ser titular da garantia
constitucional à propriedade.
A intervenção estatal na área de proteção do direito fundamental à propriedade se dar
pela desapropriação, que limita de forma brutal a propriedade do particular. Outra
intervenção é o uso público, que se caracteriza pela subtração do estado da faculdade do uso
do imóvel de seu titular. E outras intervenções possíveis são as decorrentes dos três poderes
que sejam efetivadas sem um ato jurídico ou indiretas.
As diversas formas de intervenções têm em comum o propósito do cumprimento da
função social. Formalmente a função social é uma limitação qualificada por um propósito
ordenado, prevista para o direito fundamental à propriedade. Materialmente é a
harmonização do exercício do direito de propriedade, imposto pela interventora legítima,
com diversos interesses gerais, coletivos ou sociais.
A função social tem duas modalidades de propriedade imóvel: a urbana e a rural. A
propriedade urbana cumpri sua função social quando cumpre as exigências fundamentais de
ordenação da cidade no plano diretor. A propriedade rural cumpri sua função social quando
obedece aos requisitos do art. 186 da CF e os critérios e graus de exigência estabelecidos por
lei. Essa intensidade do grau de exigência deve sempre respeitar a proporcionalidade.
As intervenções estatais só serão justificadas quando forem necessárias em razão do
vínculo social da propriedade. Sendo a proporcionalidade o exame da adequação e
necessidade da limitação. A necessidade é caracterizada pela busca do meio menos gravoso
para a liberdade do titular do direito intervindo. Um fator importante é verificar o significado
do bem para o seu titular. E isso pode resultar que a não imposição de limite mais adequado
ao cumprimento da função social, já que a mesma também deve corresponder à garantia de
liberdade para o desenvolvimento da personalidade individual. Intervenções muito
energéticas na propriedade advinda do trabalho e produção individual, podem descumprir o
papel da função social concretamente atingido pela imposição do limite constitucional.
Em relação à desapropriação e a proporcionalidade, perante o propósito do
cumprimento da função social existindo vários meios adequados ao alcance desse propósito,
aplica-se o critério da necessidade.
A limitação alternativa sendo adequada ao propósito especifico é constitucional e não
a desapropriação. Também deve ser proporcional a indenização, tendo de cobrir o valor do
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bem desapropriado. Tendo de ser justa, a Administração deve fazer a ponderação entre o
interesse econômico do proprietário e o interesse público da coletividade.
Por fim, uma reflexão sobre a imutabilidade da propriedade particular enquanto
limite dos limites. A Constituição brasileira de 1988 mostra que deve transformar o Estado
brasileiro num Estado social e democrático de direito. Entre seus princípios encontra o da
propriedade privada, no ar. 5° sabemos que dispõe que a propriedade é inviolável. Tudo isso
sugere que a propriedade particular deve ser mantida intocada, impedindo sua transformação
substancial.
Contudo, o art. 5° garante só o instituto da propriedade e não fixa como e qual
propriedade será garantida. O art. 170 da CF sobre a propriedade privada e não particular. A
propriedade privada é mantida mesmo que a titularidade seja estendida a toda sociedade,
significando uma transformação substancial do instituto. Convertendo seus moldes liberais
clássicos para coletivos.
A Constituição veda só a estatização geral da propriedade. Esse processo de
socialização não há no Brasil, mas caso fosse teria convergência entre dois propósitos que
norteiam as relações econômicas, quais sejam, a liberdade individual necessária à autonomia
e ao desenvolvimento pessoal, e sua função social.

CAPÍTULO 8 - LIBERDADE DE EXPRESSÃO E RACISMO

Inicia o oitavo capítulo da obra fazendo uma síntese de um caso concreto, onde um
editor gaúcho havia publicado obras trazendo alegações no sentido de que a haveria dúvidas
quanto aos fatos apresentados do holocausto. Afirmando que a perseguição seria em face ao
chamado sionismo e não ao povo judeu. Tese que foi contestada que culminou em uma ação
civil pública promovida em 14 de dezembro de 1991 pelo Ministério Público Estadual do
Rio Grande do Sul, a qual no final houve a condenação pelo crime de racismo e, mesmo com
os recursos, o habeas corpus foi negado.
A solução do caso foi dada da seguinte forma: defendia que o Habeas corpus deveria
ter sido conhecido o pedido, pelos seus aspectos formais de admissibilidade, legalidade,
constitucionais. Destaca ainda que se houvesse verificado a existência de qualquer
inconstitucionalidade no que tange a violação de direitos fundamentais poderia ser analisado
esse aspecto, mas não houve qualquer apreciação apenas o seu não acolhimento.
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Dois tipos de violação de direitos fundamentais foram destacados, sendo de


concorrência aparente e ideal. Trazendo a distinção entre elas. Sendo a segunda quando
direitos fundamentais concorrem para a violação de direitos fundamentais de outrem e não
houve relação de generalidade entre os dois. Quanto ao primeiro, esse deve ser analisado
para ver se não colide com outro direito fundamental supostamente atingido ou violado. A
liberdade de pensamento seria violada se a denegação do habeas corpus tivesse ocorrido por
meio de uma intervenção não justificada.
O alcance da proteção do direito fundamental pela intervenção estatal possui duas
correntes na doutrina: 1) a teoria liberal e; 2) a teoria funcional (democrática). O autor
observa que a Constituição brasileira não explicou nenhuma forma específica de expressa de
pensamento, fazendo crer que a forma que a expressão é livre, somente cabendo ao titular a
forma em que será apresentada ao interlocutor.
Em relação ao caso em comento, em uma análise geral poderia ser classificado como
antissemita, porém para o autor nos aspectos de afronta aos direitos fundamentais e por
consequência que ameaça a democracia, não devem ser levados em consideração haja vista
que a legislação brasileira não adotou esse critério de análise de obras.
Denota-se, dessa forma, que a pena privativa de liberdade por autoridade estatal, em
sendo negado o pedido de liberdade se manteve a ordem judicial (estatal). Seria justificada a
medida se houve limites ou definições do que seria liberdade de expressão, e quais os seus
critérios fossem definidos pela legislação.
O direito a liberdade de expressão assim como os demais diretos não foi outorgado
sem limites. A natureza jurídica do direito fundamental é classificada como: 1) reserva legal
simples - originaria do poder discricionário da autoridade legislativa competente; 2)
qualificada - cerceada por meio da intervenção estatal; 3) legislativa imperativa. Sendo a
simples.
A lei nº 7.716/89, a qual define os crimes resultantes de preconceitos de raça ou de
cor em diversa áreas sociais, questiona a ausência dos efeitos da imprescritibilidade no caso
de discriminação ou preconceito de raça. No entanto, observa que tal ausência é sanada pela
alusão ao artigo 5º da Constituição.
O termo “crime de racismo” dificulta e torna complexo a sua definição. Para o autor
da obra existem duas teses: 1) não há como se aplicar uma sanção penal, em um crime
impossível. Em seu posicionamento não se pode falar em raça humana ou subdivisões da
raça humana, e; 2) a que de fato o legislador não se ateu a esse aspecto antropológico. Não
há o que se negar quanto a existências de etnias distintas. A criação da Lei se deu para fins
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de proteção da população brasileira de origem negra africana contra qualquer discriminação


que impedisse a sua ascensão social. Por fim, destaca que mesmo não sendo o povo judeu
uma raça, deve ser aplicada a todos que cometerem crimes por ser judeus, deve ser aplicada
a lei antirracismo.
Aqui, o autor apenas apresenta a limitação do Legislador e da intervenção judicial.
Destaca pontos de proporcionalidade nos atos, no afã de trazer eficácia lei e as suas
consequências. Não traz qualquer óbice quanto a sua constitucionalidade. Afirma que o STF
deveria ter concedido o habeas corpus porque a sua denegação pelo STJ violou os direitos
fundamentais de liberdade de expressão do pensamento.
Também presente no artigo 5º da constituição esta previsto o direito a comunicação
social. Traz como conceito a comunicação pública que se se da entre uma pessoa, sendo
física ou jurídica a diversas pessoas. A liberdade de comunicação tem o caráter duplo
objetivo e subjetivo, sendo destacadas os funcionalismo e liberalismo.
Nesse ponto o autor destaca que o termo “imprensa livre” está dentro do direito
fundamental da liberdade de imprensa. A liberdade de imprensa tem grande valor para a
democracia no país. E esse aspecto é bastante relevante. Não há uma instituição judicia
chamada imprensa e sim fenômeno social que recebe esse nome, por isso não há um alcance
para a intervenção estatal mais efetiva o que garante a “liberdade”.
Em contraponto, o conceito é clássico baseado no que corresponde o art. 5, IX. c.c
art. 220, caput, §§1º e 2º. Se estende a todo o processo de composição de um produto de
imprensa, partindo da noticia até a publicação. Os produtos de imprensa vão desde um cartaz
até a notícia publicada nos jornais de grande circulação.
Proteger a liberdade de imprensa é garantir os seguintes aspectos: 1) sigilo da fonte
jornalista; 2) a autonomia dos jornais e revistas; 3) a independência de autonomia de todas as
atividades dependentes da notícia; 4) a dependência dos jornalistas e assistentes da notícia;
5) o livre acesso de jornalistas; e 6) captação de recursos financeiros e viabilização
econômica.
Conforme o autor, no caso em analise, se chegou a conclusão que a denegação do
pedido de habeas corpus foi classificado como intervenção estatal a liberdade de imprensa,
uma vez que o jornalista foi preso e teve sua liberdade negada por ter escrito algo sobre o
povo judeu.
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CAPÍTULO 9 - LEI DE IMPRENSA ENTRE LIMITES E CONFIGURAÇÕES DA


ORDEM CONSTITUCIONAL DA COMUNICAÇÃO SOCIAL

A chamada Lei da Imprensa que não foi recepcionada pela CF, por entender
incompatível com a carta Magna.
Inicia o capítulo dizendo quanto as incongruências quanto ao pedido de revogação da
lei, uma vez que somente o poder legislativo pode revogar lei, e o pedido portanto seria
impossível pelo poder executivo. Além de apontar os casos em que devem ser observados o
“modulação de efeitos da coisa julgada”, que trata-se de situações em que há interpretação
distintas da mesma lei que recai suspeita de inconstitucionalidade, o que deve ser aplicada os
anseios de resolução que mais se aproximar do caso concreto. O STF decidiu pela não
recepção da ordem constitucional vigente a lei 5.250/67. A alegação é que afronta a
liberdade de imprensa e a liberdade de manifestação de pensamento.
Apresenta a distinção da definição entre a Constituição Alemã e a Americana quanto
da regulamentação e definição quanto ao tema. Destaca que no Brasil se baseia em três
termos: pensamento, expressão e livre.
Não há uma definição do que legislador quis alegar quanto ao termo “pensamento”, o
que se faz é uma interpretação do termo nos moldes do que descreve a constituição Alemã,
que está expresso o termo “Opinião”. Também o ordenamento jurídico não deixou expresso
o que seria essa expressão. O que é interpretado como sendo a escrita ou a imagem.
Sendo difícil a classificação pela nossa constituição segunda a qual seria livre a
manifestação de pensamento desde que não anônima. O art. 220 da CF, §§3º e 4º da CF
estabelece uma seria de reservas legais as liberdade de comunicação social. O art. 221 da CF
também pode set considerado como um limite, onde estabelece princípios para a produção
de programas de televisão e rádio. O art. 223 da CF fala da competência para a outorga de
concessão para os serviços de radio difusão.
O autor aponta na constituição pontos que falem sobre a liberdade de expressão,
opinião, pensamento, e suas limitações, intervenções pelo estado, em uma espécie de
contradição uma vez que a própria constituição garante a liberdade, também estabelece
critérios que podem ser considerados como censura.

CAPÍTULO 10 - CONSTITUCIONALIDADE DA EXIGIBILIDADE DE DIPLOMA


PARA JORNALISTAS
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Nesse capítulo, o autor aponta da necessidade do STF se ater a sua função de


controlador do cumprimento do disposto na constituição e não levar em conta a opinião leiga
do povo. Determina para que seja declarado jornalista deve atender aos critérios: 1)
nacionalidade brasileira; 2) folha corrida; 3) carteira profissional; 4) declaração de
cumprimento de estágio em empresa jornalística.
Destaca, ainda, pressupostos que deveriam ter sido apontadas pelos referidos
ministros, que seria encontrar parâmetros, normas de direito fundamental pertinente violada.
Realizar exame do objeto, que buscava observar o tipo, verificar a intervenção legislativa, e
avaliar a justificação constitucional da imposição dos limites.
O autor finaliza com uma conclusão que a imposição da necessidade de diploma para
os jornalistas, que são atividades típicas de liberdade de comunicação social representa uma
intervenção estatal não justificada e desproporcional.

ANÁLISE DE CASO CONCRETO: RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 603.583:


INCONSTITUCIONALIDADE OU NÃO DO EXAME DE ORDEM DOS
ADVOGADOS DO BRASIL

1 DA EXPOSIÇÃO DO CASO

Trata-se do questionamento sobre a constitucionalidade ou não do Exame de Ordem


dos Advogados do Brasil para que o bacharel em Direito possa exercer advocacia. A
discussão foi levantada por um graduado em Direito no Estado do Rio Grande do Sul, o qual
argumentou que, após a obtenção do diploma emitido por instituição de ensino superior
credenciada pelo poder público (faculdades e/ou universidades), deve ser considerado
presumivelmente apto a exercer a advocacia até prova em contrário, ou seja, a entidade de
classe teria condições de avaliar se o profissional é capaz, ou não, durante o exercício
profissional, vez que as sanções disciplinares para o advogado estão elencadas na Lei nº
8.906/94.
Aduziu que o supracitado Exame viola os diversos princípios constitucionais,
principalmente, o da liberdade de escolha e ao exercício da profissão e, por isso, entende ser
o Exame de Ordem inconstitucional.
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Argumentou, ainda, que cabe ao poder público autorizar e avaliar o ensino, e não à
Ordem dos Advogados do Brasil, a qual não integra a Administração Pública. Afirmou
também que a reserva legal constitucional é de natureza qualificada, sendo proibido ao
legislador ordinário impor restrição ao exercício da profissão.
Desse modo, conclui o autor que o bacharel em direito, o qual foi examinado e
avaliado pela instituição de ensino credenciada pelo poder público, teria o direito de exercer
a profissão de advogado, vez que sustenta a posição de que é descabido sobrepor o exame da
ordem às avaliações realizadas pela própria instituição de ensino superior, sem qualquer
prova de que estas foram corrompidas, ineficazes ou que seriam inferiores.
Aludiu, ainda, a necessidade de lei para criação do exame da ordem, o qual, segundo
asseverou, foi previsto apenas em regulamento. Disse da insuficiência da previsão contida no
art. 8º da Lei nº 8.906/94, que delegou à entidade de classe o poder de editar provimento para
disciplinar referido exame, genericamente estabelecido na lei.
Assim, entende também que o exame padeceria do vício de inconstitucionalidade
formal.

2 DA DELIMITAÇÃO DO ASSUNTO

O caso apresentado traz a baile a questão sobre a inconstitucionalidade ou não do art.


8º, inciso IV e parágrafo 1º e art. 44, inciso II, da Lei nº 8.906/94, que dispõe sobre o
Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB.
Tais dispositivos infraconstitucionais condicionam a inscrição nos quadros da Ordem
dos Advogados do Brasil à aprovação em exame de conhecimento jurídicos e delegam à
referida autarquia a atribuição de regulamentá-lo e promover, com exclusividade, a seleção
dos advogados em todo território nacional, conforme abaixo transcritos:

Art. 8º Para inscrição como advogado é necessário:


(...)
IV – aprovação em exame de ordem;
(...)
O Exame da ordem é regulamentado em provimento do
Conselho Federal da OAB.

Art. 44 A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço


público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa,
tem por finalidade:
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(...)
II – promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a
seleção e a disciplina dos advogados em toda a República
Federativa do Brasil.

Assim, delimitado o objeto do caso em tela, passaremos a análise da


inconstitucionalidade ou não dos referidos artigos.

3 DA ÁREA DE PROTEÇÃO DO ART. 5º, XIII DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

O art. 5º, inciso XIII, da Constituição Federal de 1988, assim dispõe:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de


qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos
estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:
(...)
XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou
profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei
estabelecer;
(...)

A liberdade de exercício de profissão é um direito fundamental de suma importância


constitucional. Assim, a tutela do art. 5°, inciso XIII da Constituição Federal recai sobre
qualquer trabalho, ofício ou profissão, sendo estes entendidos como uma atividade à qual o
indivíduo se dedica de forma duradoura para a consecução dos meios de sua subsistência
econômica. Em outras palavras, trata-se de atividades coordenadas que só no seu conjunto
têm o condão de representar o exercício de uma profissão ou ofício.
A priori, a escolha e exercício da profissão estão livres de intervenção estatal. Da
escolha profissional fazem parte todos os seus pressupostos como cursos profissionalizantes,
faculdades, estágios, possibilidade jurídica de estabelecer-se empresarialmente etc. A partir
daí tutela-se a livre escolha do local do trabalho, a faculdade da escolha, o exercício
profissional ou do trabalho.
A escolha de determinada profissão revela a opção por certo modo de vida, que se
converterá em esteio econômico do indivíduo.
23

No presente caso, as atividades privativas da advocacia de que versam a Lei nº


8.906/94 trata-se de atividade profissional responsável pela subsistência econômica daqueles
que a realizam, cumprindo a priori todos os pressupostos de sua proteção pelo artigo
constitucional supracitado.

3.1 Da Conclusão Intermediária

Portanto, a atividade profissional da advocacia faz parte da área de proteção do


direito fundamental com fulcro no art. 5º, inciso XIII da Constituição federal de 1988.

4 DA INTERVENÇÃO ESTATAL NA ÁREA DE PROTEÇÃO DO DIREITO


FUNDAMENTAL À LIBERDADE PROFISSIONAL

A intervenção estatal em um direito de liberdade ocorrerá sempre que o Estado


impedir ou cominar a conduta ou situação abrangida pela área de proteção do direito com
uma conseqüência jurídica negativa, a ponta restringir o livre exercício do direito. Em outras
palavras, toda espécie de manifestação de poder estatal que coíba o comportamento ou
situação protegida representa uma intervenção, não importando no que tange à verificação da
presença da intervenção, se se trata de ato normativo de autoria do Legislativo ou da
Administração ou ato administrativo executivo ou mesmo de decisão judicial, englobando,
neste último caso, as atividades da interpretação e aplicação normativas.
Seria impossível cogitar a liberdade em plenitude quando se é compelido ao exercício
de determinada profissão ou são completamente vedadas as condições de acesso. Se o ofício
é lícito, o Estado é obrigado a não opor embaraços irrazoáveis ou desproporcionais. Pelo
contrário, com o intuito de assegurar a liberdade de ofício, ao Estado se impõe o dever de
colocar à disposição dos indivíduos, em condições equitativas de acesso, os meios para que
aquela seja alcançada.
No caso colocado em tela, o art. 8º, inciso IV da Lei 8.906/94, restringe o exercício
daqueles que pretendem ter como profissão a atividade da advocacia, vez que torna
obrigatório a aprovação no Exame da Ordem para que se possa exercer o ofício.
24

Trata-se, desse modo, de intervenção estatal (por meio do Poder Legislativo) que
restringe uma liberdade constitucional.

4.1 Da Conclusão Intermediária

Portanto, o art. 8º, inciso IV da Lei nº 8.906/94, interveio na área de proteção da


liberdade profissional de todos que pretendem exercer a advocacia.

5 DA JUSTIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL DA INTERVENÇÃO ESTATAL

A imposição do limite constitucional da reserva legal constitui-se de duas fases: 1) a


análise da própria reserva legal, partindo do teor do dispositivo ou parte do dispositivo para a
definição de seu tipo e; 2) a análise de sua concretização infraconstitucional pelo legislador
ordinário.
O art. 5°, inciso XIII CF não tutelou a liberdade profissional de maneira ilimitada.
Ele o condicionou a uma chamada reserva legal, que representa a autorização dada pelo
constituinte ao legislador ordinário para que este condicione o exercício da liberdade,
impondo-lhe limites.
Uma reserva legal pode ser simples ou qualificada. Ela será simples quando não
qualificada pela determinação do propósito ou meio de intervenção feita pelo próprio
constituinte. Em havendo uma reserva legal qualificada, o constituinte restringe já a priori a
discricionariedade legislativa. Tal discricionariedade será definitivamente limitada, após a
verificação dos presentes limites formais, pelo critério da proporcionalidade.
No caso do art. 5° XIII da CF, tem-se a previsão de uma reserva legal simples, uma
vez que o termo qualificações contido na ressalva constitucional (reserva legal) na expressão
“atendidas as qualificações que a lei estabelecer” não deve ser entendido, pelo menos
exclusivamente, como qualificações de aptidão profissional em sentido estrito, o que
significaria a pré-determinação de um propósito que a lei deveria perseguir e que se trataria
de uma reserva legal qualificada.
25

Ao contrário, as qualificações podem ser também entendidas em seu sentido objetivo


como condições objetivas para o alcance de finalidades ou propósitos diversos. Neste caso,
qualificações aparecem como meios de intervenção incertos ou não determinados pelo
constituinte.
Não se de acreditar que o constituinte pretendeu restringir a liberdade profissional
somente em razão do propósito de aumentar a aptidão e com isso a imagem pública das
diversas profissões, ofícios e trabalhos. Mais plausível é partir do pressuposto de que quis
defender outros bens jurídicos que poderiam ser afetados (saúde pública, boa administração
da justiça, segurança das edificações etc. dependendo da profissão regulamentada) pela
ausência das qualificações. Logo, trata-se de uma reserva legal simples.

6 DA CONCRETIZAÇÃO LEGISLATIVA NA LEI 8.906/94

A concretização legislativa de uma reserva legal prevista constitucionalmente deve


atender aos pressupostos formais de sua promulgação. Têm que estar presentes a autoridade
competente e a observância do procedimento prescrito constitucionalmente.
A Lei nº 8.906/94 é lei federal. A distribuição das competências entre as esferas
federativas foi feita pelos art. 21 a 24 da CF, sendo que as competências exclusiva e
privativa da União foram definidas respectivamente pelos art. 21 e 22 da CF. Problemática é
normalmente só a competência dos Estados e municípios, pois o constituinte brasileiro
valeu-se da técnica da reserva de competência para a União, deixando aos Estados-membros
e municípios uma competência meramente subsidiária.
Problemas formais decorrentes do não atendimento ao procedimento legislativo
prescritos pelos art. 59 ss. da CF não podem ser depreendidos no caso em análise. Portanto, o
art.8º, IV e § 1° da Lei 8.906/94 encontram-se formalmente legitimados pelo art. 5°, inciso
XIII da CF, representando uma concretização do ponto de vista formal compatível.
Não cabe interpretar os artigos supracitados de forma solitária. O conteúdo da prova
não pode discrepar daquelas matérias que se enquadram nas diretrizes curriculares do curso
de graduação em Direito, assim definidos pelo Ministério da Educação (Resolução
CNE/CES nº 9 de 1994), bem como também poderão constar do teste as regras pertinentes
ao exercício profissional da advocacia, tal como o Código de Ética e a própria Lei nº
8.906/94.
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Estando explicitados na leis regedoras da matéria, tanto o requisito para a inscrição –


aprovação em exame de conhecimentos – quanto o respectivo conteúdo – diretrizes
curriculares mínimas do curso de bacharelado em Direito e matérias correlatas ao exercício
da advocacia -, não haveria nada de anormal em transferir à Ordem a prerrogativa de editar
as regras necessárias à operacionalização do teste. Assim, o provimento da entidade não será
capaz de criar obrigação nova, mas simplesmente de dar concretude àquela já prevista em
caráter absoluto.
Portanto, os art.s supracitados encontram-se formalmente legitimados, representando
uma concretização formal compatível com a constituição, vez que não houve delegação
legislativa à Ordem dos Advogados do Brasil, mas tão somente a operacionalização do
exame.

7 PROPORCIONALIDADE DA INTERVENÇÃO LEGISLATIVA

O critério da proporcionalidade impõe um limite material à competência do


legislador ordinário para a limitação do exercício de uma liberdade decorrente de direito
fundamental.
Caso contrário, o vínculo do legislador aos direitos fundamentais perderia seu sentido
normativo. Uma intervenção legislativa, no entanto, só restará justificada quando o
legislador observar esse que é um limite constitucional à sua competência constitucional de
limitar a área de proteção de um direito fundamental.
Uma intervenção legislativa seria proporcional, se ela enquanto meio lícito para o
alcance de um propósito igualmente lícito fosse em face deste adequada e necessária.
Adequado é um meio de intervenção quando entre o estado de coisas por ele
provocado e o estado de coisas existente quando o propósito puder ser considerado cumprido
houver uma conexão ligada por hipóteses confirmadas sobre a realidade. O meio de
intervenção deve ao menos fomentar em geral o propósito perseguido. Trata-se da realização
de um prognóstico sobre um evento futuro pautado na experiência empírica passada.
Como pode haver muita insegurança sobre o prognóstico correto, ou seja, aquele com
maiores chances de se confirmar, faz parte do poder discricionário do legislador a
prerrogativa de fixar o primeiro prognóstico (prerrogativa da escolha por um prognóstico)
que poderá ser impugnado pelos demais operadores jurídicos quando com base empírica
(dados empíricos não refutados) revelar-se errado.
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In casu, o Exame não pode ser considerado, só por si, como uma qualificação
profissional, mas como avaliação da qualificação previamente obtida, pois serve ao
propósito de avaliar se estão presentes as condições mínimas para o exercício da advocacia.
Trata-se de um meio razoável para se atingir um objetivo.
Os meios devem ser razoavelmente equivalentes em eficácia, sob pena de
inviabilizar-se, forçando-se pelos meios menos gravosos.
O exame da proporcionalidade requer o sopesamento entre a importância de
realização do fim objetivado pela medida e a intensidade da restrição ao direito fundamental.
No presente caso, a questão se traduz entre o perigo de dano decorrente da prática da
advocacia sem o exame de conhecimentos e a restrição ao direito fundamental e geral à
liberdade do exercício de profissão.
Nesse sentido, a possibilidade de perigo gerada pela atividade profissional deverá
justificar, ou não, a atividade interventiva estatal limitando o acesso à profissão ou o
respectivo exercício. Quanto mais ensejadora de risco, maior será o espaço de conformação
deferido ao poder público. No entanto, se não houve nenhum risco, será inadmissível
qualquer restrição.
Assim, as qualificações profissionais de que trata o art. 5º, inciso XIII, da CF,
somente podem ser exigidas, pela lei, daquelas profissões que, de alguma maneira, podem
trazer perigo de dano para a coletividade ou prejuízos diretos para terceiros.
O profissional de advocacia exerce papel central e fundamental na manutenção do
Estado Democrático de Direito. A ele cabe a missão de deflagrar o controle de legalidade e
constitucionalidade efetuado pelos juízos e tribunais do país.
Assim, deveras fácil concluir que o exercício da advocacia por um profissional que
não tenha se submetido ao Exame de conhecimentos poderá trazer enorme perigo de dano
para toda a coletividade, vez que não se saberá o seu grau de conhecimento técnico.

8 CONCLUSÃO

Portanto, a partir dessa linha de raciocínio, os arts. 8º, IV, § 1º e 44, II, da Lei nº
8.906/94 são constitucionais, vez que não violam o art. 5º, XIII da Constituição Federal.

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