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Bolsonaro Não Vai Dar Golpe No 7 de Setembro, Mas Atos São Preparação para Isso, Diz Marcos Nobre - 06 - 09 - 2021 - Poder - Folha
Bolsonaro Não Vai Dar Golpe No 7 de Setembro, Mas Atos São Preparação para Isso, Diz Marcos Nobre - 06 - 09 - 2021 - Poder - Folha
(HTTPS://WWW1.FOLHA.UOL.COM.BR/FOLHA-TOPICOS/AMEACA-AUTORITARIA)
6.set.2021 às 19h53
EDIÇÃO IMPRESSA
(https://www1.folha.uol.com.br/fsp/fac-simile/2021/09/07/)
Congresso dos EUA em 6 de janeiro deste ano sob o estímulo de Donald Trump,
presidente do país àquela altura.
Sua assinatura vale muito.
ENTENDA
De acordo com ele, o debate sobre o projeto autoritário do presidente precisa subir
alguns degraus, tornando-se mais complexo. “As discussões têm sido muito rasas.
Dizem: ‘Ele vai dar um golpe porque está desesperado’. Não é isso! Ou falam: ‘Lula
já ganhou’. Não é assim.”
muito.
Depende
ENTENDA
da expectativa. Se a expectativa é: vai ter um golpe em 7 de setembro?
Não, não vai. Se a expectativa é: é uma preparação para o golpe? É. Na verdade, é
um exercício de mobilização de tropas, dá um efeito importante, esperar um golpe
que não vem. Aí se faz um novo exercício e, mais uma vez, é um golpe que não vem.
Quando vem, você está despreparado pra ele.
Sim. É preciso deixar claro o seguinte: desde que se apresentou como candidato, o
objetivo de Bolsonaro é dar o golpe. Há três caminhos para isso: a via eleitoral pura,
um golpe antes da eleição e um golpe combinado com a eleição.
É claro que o golpe pela vitória eleitoral seria mais simples para ele, mas, não tendo
esse, há as outras duas opções, dependendo de como ele continuar. E ele continua
muito bem posicionado para realizar qualquer um desses três caminhos. Mesmo
depois de tudo o que ele fez e com o país na situação em que está, Bolsonaro tem o
apoio de um quarto do eleitorado (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/07/datafolha-rejeicao-a-bolsonaro-
sobe-a-51-novo-recorde-do-presidente.shtml).
Essa clareza sobre o verdadeiro projeto do Bolsonaro tem se espalhado, mas ainda
não é suficiente para unir o campo democrático. E a prova maior é que não houve
impeachment (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/entenda-caminho-do-impeachment-e-por-que-lira-sequer-
rejeita-os-pedidos-contra-bolsonaro.shtml).
É um sinal desse desequilíbrio: de um lado, uma
sociedade acostumada com regras democráticas e que, portanto, só pensa em
termos eleitorais; do outro, alguém disposto a destruir a democracia.
; , g p
candidato A ou B. Não quero dizer que cálculos eleitorais não sejam importantes.
São muito, precisamos continuar apostando que teremos eleições. Mas isso não
significa ignorar o outro lado, que não se restringe a isso.
Por isso, é hora de parar de falar em arroubos e bravatas. Não é nem uma coisa nem
outra, são etapas de um cronograma de um golpe. Vamos parar de usar palavras
inadequadas.
É preciso, então, levar Bolsonaro a sério quando ele diz ter três alternativas
para o futuro: “estar preso, ser morto ou a vitória”
(https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/nao-desejo-provocar-rupturas-mas-tudo-tem-limite-diz-bolsonaro-em-nova-
ameaca-golpista.shtml)?
Sim. A única saída para ele é o golpe, mas isso é desde sempre. O grande objetivo
dele não é ganhar eleição, é dar um golpe. A eleição é só um dos elementos táticos
envolvidos nesse objetivo. Enquanto isso não ficar claro para todos, o combate ao
Bolsonaro será cada vez mais complicado
Hoje, o cenário mais provável para ele é uma combinação de eleição com golpe, o
que significa chegar ao segundo turno —e Bolsonaro tem plenas condições de fazer
isso, principalmente se não houver uma candidatura de direita não bolsonarista. Se
ele sair derrotado por uma diferença de, vamos dizer, 60% a 40%, estão dadas as
condições para o golpe. E não é nem um pouco irrealista imaginar um cenário
assim.
É preciso ter um apoio muito grande contra o golpe para que ele não aconteça, o
que implica um pacto da esquerda e da direita não bolsonarista. Sem esse pacto, o
Bolsonaro sai na frente porque o objetivo dele não é eleitoral, a eleição é só mais
um dos elementos no cronograma do golpe. E o outro lado tá pensando só em
termos eleitorais.
Por quê?
Primeiro pela razão eleitoral, que já vimos. Um lado diz que não vai se aproximar
da esquerda para não beneficiar o Lula e rejeita o acordo. Para o grupo em torno da
candidatura Lula, o ideal é enfrentar o Bolsonaro do ponto de vista eleitoral.
Também não há interesse em se reunir com a direita não bolsonarista.
O fato de não conseguir sequer fazer uma discussão dentro do campo democrático
sobre o ato unificado é gravíssimo. Antes de organização, não há articulação, as
pessoas não sentam para conversar sobre a gravidade do momento. O
bolsonarismo está organizando estes protestos há mais de dois meses. O campo
democrático precisa se reunir e reconhecer isso.
O senhor falou que um dos caminhos do golpe seria via eleitoral pura. Como
seria?
A primeira etapa deu certo nos EUA, o que não deu certo foi a segunda, o golpe que
Trump estava tentando.
Com base em todas essas informações, diria que o golpe é o cenário mais
provável?
Sobre o primeiro ponto: depende de como o campo democrático vai reagir a essas
ameaças. Temos hoje a impressão de que essa consciência de que Bolsonaro tem
um projeto autoritário e não vai ser domado está se espalhando. Mas não significa
que ele tenha perdido a base de apoio, que é, em geral, antissistema e, em boa
parte, autoritária. Esse apoio que ele tem é impressionante.
Qual será a atitude dessa consciência de que o projeto de Bolsonaro é pra valer? Se
o campo democrático continuar fazendo cálculo meramente eleitoral, aumenta a
chance do golpe ser bem-sucedido. Se não ficar claro para esse campo,
especialmente para a esquerda, que a direita não bolsonarista precisa ter uma
candidatura competitiva, aumenta a probabilidade do golpe ser bem-sucedido. Se a
direita não-bolsonarista não for capaz de construir uma candidatura competitiva,
aumenta a probabilidade de sucesso de golpe. São todas essas coisas juntas.
É claro que Bolsonaro não vai, necessariamente, chamar ele mesmo o golpe. Pode
não ser o iniciador mas evidentemente se o golpe vem ele é o único beneficiário
não ser o iniciador, mas, evidentemente, se o golpe vem, ele é o único beneficiário
A mobilização dos policiais é hoje mais preocupante para uma eventual ruptura
do que uma insurgência das Forças Armadas?
Sobre as Forças Armadas, a gente não sabe. Sobre as polícias, a gente sabe muita
coisa e o que se sabe é preocupante. As polícias são estudadas por vários centros de
pesquisa competentes e, por isso, temos elementos para dizer que o bolsonarismo
nessas corporações é muito significativo e radicalizado.
No caso das Forças Armadas, temos muito impressionismo, as pessoas acham isso
ou aquilo. O que podemos dizer de objetivo em relação a elas é que não vão apoiar
um golpe se houver uma grande organização em defesa da democracia.
Se o Bolsonaro conseguir criar um clima de divisão do país, que é o que ele vai
tentar fazer até o ano que vem, radicalizando a população, aí, de fato, é muito difícil
imaginar o que as Forças Armadas poderão fazer.
Um grande teste?
Quando fala em uma grande maioria da população para deter o golpe, quer
dizer o quê? Segundo o último Datafolha
(https://datafolha.folha.uol.com.br/opiniaopublica/2021/07/1989332-recorde-reprovacao-a-bolsonaro-atinge-51.shtml), 51%
consideram o governo ruim ou péssimo, e 24%, regular. É suficiente?
Acho razoável supor que sim. Mas é impressionante que exista um quarto que o
apoia. Me choca quando dizem que Bolsonaro tá fraco, acabado, nas cordas… Fraco
em que termos? Eleitorais? Mas eleição para ele é só uma tática. Como está fraco se
o objetivo dele não é a eleição, e sim o golpe?
Para o que ele quer —o caminho preferencial é uma combinação de segundo turno
com golpe—, ele mantém perfeitamente a posição dele, contra todas as
probabilidades. A situação do país é deplorável, estamos numa situação falimentar,
de sofrimento social brutal, e um quarto apoia esse governo e tem disposição em
votar nele.
governo no Congresso?
O que afugenta o centrão são duas coisas: falta de recursos estatais e de votos. Não
faltam recursos para eles. No caso dos votos, há um problema regional, que é o
Nordeste. Bolsonaro vai ter que ignorar o fato de que vários que estão no governo,
que o apoiam agora, não vão apoia-lo na eleição no Nordeste porque seria suicídio
eleitoral.
É uma ilusão achar que o centrão tem pudores contra radicalismos, isso não faz o
menor sentido. Eles não têm nenhum problema com isso. O que importa é ter
acesso aos fundos públicos mais do que os outros.
Não vejo nenhuma viabilidade para o impeachment. Para que fosse viável, o campo
democrático deveria ter feito um investimento enorme pra reduzir essa base de
apoio fiel para menos de 20%, no mínimo, algo que não aconteceu. Bolsonaro tem a
presidência da Câmara, apoio de um quarto do eleitorado, uma máquina de
desinformação e propaganda, uma base nas Forças Armadas e nas forças policiais.
Tudo isso é muito bom como dispositivo, considerando o projeto que ele tem.
É bom lembrar também que essa próxima eleição presidencial será radicalmente
diferente da eleição passada porque, em 2018, não houve um candidato à reeleição,
como aconteceu em 1989 e 1994. Quando se tem um candidato à reeleição, e sendo
ele extremamente polarizador, não sobra lugar para outsiders, só para quem tem
recall.
Sim, mas existe uma possibilidade para a direita não bolsonarista, que é fazer um
acordo com Ciro Gomes, o único dos outros possíveis candidatos que têm recall.
Talvez esse acordo seja impossível de ser viabilizado.
O que estou dizendo é pura lógica, não tem juízo de valor. Outsiders não terão
chance. Além de Lula e Bolsonaro, qual candidato tem recall? Ciro. Se a direita não
bolsonarista quiser ter uma candidatura competitiva, terá que fazer um acordo
com o Ciro. Pode ser inviável, mas hoje é a única saída que eu vejo. Do contrário,
teremos uma disputa entre Lula e Bolsonaro já no primeiro turno.
Os 150 anos da Independência, em 1972, foi muito carregado no sentido mais brutal
que pode existir. Era o auge da ditadura militar, o auge dos assassinatos. Mas com
essa ideia de um golpe no horizonte, não. Não existem precedentes nesse sentido
de usar a data como prenúncio para um golpe, como exercício para um golpe.
MARCOS NOBRE, 56