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AULA 5

PROCESSO ELETRÔNICO

Prof. Wishilen Thierry Rayzel Alvarenga


INTRODUÇÃO

Apesar de abordarmos um único processo eletrônico, decorrente da


mesma legislação, é certo que as diferentes esferas de atuação do judiciário
apresentam particularidades específicas de cada área.
Tais particularidades devem ser observadas quando da instrumentalização
dos sistemas de peticionamento de cada tribunal, isso porque nem todos os
elementos necessários para o prosseguimento de um processo trabalhista serão
necessários para a realização de um processo criminal; o mesmo pode ser dito
para um processo falimentar ou de família.
Observar essas diferenças permite que o acesso à justiça seja equânime,
pois ocorre de acordo com as necessidades de cada área de atuação, e não de
forma geral e genérica para todos.

TEMA 1 – PROCESSO ELETRÔNICO CIVIL

Importante destacar novamente que a Lei n. 11.419/2006 proporciona uma


proximidade, antes não tão presente, entre o jurisdicionado e a própria justiça,
permitindo ainda que tudo que fora produzido nos autos seja devidamente
armazenado, a fim de fomentar o processamento eletrônico do processo digital.
O impacto do processo civil é inegável, dada a sua magnitude e
abrangência, havendo, portanto, necessidade de muitos cuidados quando da sua
implementação na forma eletrônica, com ajustes aos comandos legais proferidos.
Assim, entende-se que o órgão regulador, no caso o CNJ, deve observar
as particularidades tecnológicas de cada região de abrangência, justamente para
não estabelecer um padrão unificado e impossível de ser atingido em
determinadas regiões do país.
É inegável que algumas regiões apresentam realidade tecnológica muito à
frente de outras, o que certamente não pode ser ignorado quando da
implementação das plataformas que serão utilizadas em caráter nacional. Isso
significa que não basta presumir o mesmo tipo de acesso às tecnologias
existentes, pois isso deve ocorrer de forma efetiva.
É certo dizer que o país se encontra em um alto nível de exigência e
sofisticação, razão pela qual o processo, em sua execução, deve seguir esses
padrões.

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Dentre os aspectos de melhoria contínua do processo civil, que estão em
cristalina conformidade com a legislação que instituiu o processo eletrônico,
podemos citar: maior oralidade, existência de súmulas vinculantes, diminuição dos
tipos de recursos processuais e, por fim, realização dos atos processuais de forma
eletrônica.
Após a distribuição da ação, o primeiro passo é a digitalização de
documentos que porventura não sejam digitais, com posterior emissão de recibo
eletrônico, tudo em praticamente um único ato, fazendo com que o processo seja
mais econômico, com custo-benefício mais interessante e permeado de
transparência.
O processo eletrônico que tramita na esfera civil apresenta aspectos e
formas já traduzidos em procedimentos; ou seja, com o advento do processo
eletrônico, tais rotinas passam a ser realizadas diretamente nos autos digitais.
Recebida e processada a petição de ingresso, salvo a citação inicial que
será pessoal, as demais intimações, citações e notificações devem estar no
formato eletrônica. Quando da apresentação da contestação, também haverá
certificação nos autos, com posterior notificação da parte autora quando da
ocorrência do ato.
Assim, o início da contagem de prazos se dará no dia útil subsequente ao
dia da publicação; ou seja, se o ato processual foi publicado em uma quarta-feira,
o início da contagem do prazo fatal será na quinta-feira.
Veja que esse procedimento afasta frontalmente a necessidade de se
certificar, nos autos, o início e fim da contagem dos prazos, posto que ocorrem de
forma automática, diretamente no sistema de peticionamento eletrônico.
Importante destacar a necessidade de que os cartórios mantenham
equipamentos hábeis a realizar a digitalização das petições e dos documentos, a
fim de que sejam transformados para formato adequado e compatível com o
processo eletrônico.
Quando a matéria decorrente do litígio envolve direito de família, guarda de
filhos, pensão, e quando for necessário que o processo tramite em sigilo, o
sistema gerará uma chave de acesso, com a qual será possível acessar a
integralidade dos autos.
Desenvolvido o processo eletrônico de forma válida e regular, não sendo
hipótese meramente de prova documental, comportando a instrução regular
probatória, haverá designação de audiência oitiva das partes e das testemunhas,

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permitindo assim a produção da prova oral necessária para o deslinde do feito,
sendo certo que todos os incidentes porventura ocorridos, serão devidamente
certificados nos autos digitais.
Nesse sentido, o entendimento de Abrão (2017, p. 56):

Não se pode ainda descartar a possibilidade do uso do meio eletrônico


para os depoimentos e demais oitivas das testemunhas arroladas, caso
de expressem de acordo as partes em litigio. Assim,
exemplificativamente, se o representante legal residir em outra comarca
ou não tiver oportunidade de se deslocar previamente, será marcada a
sua oitiva pela via eletrônica, com todos os aparatos necessários,
registrando-se o termo referidas circunstâncias, inclusive com a
possibilidade de reperguntas.

Outro aspecto, que além de ficar registrado no processo eletrônico, será


resolvido neste mesmo incidente processual, diz respeito à arguição de contradita
das testemunhas, sendo certo que a instrução desse apontamento será realizada
nos próprios autos, bem como seu acolhimento e afastamento, restando
registrada na ata de audiência, para todos os fins.
A modernidade do processo sem papel impacta fortemente a cadeia
produtiva do conflito, desde sua interposição até a resolução final. Tal visão tem
papel importante e fundamental, posto que muitas vezes as partes apresentam
inúmeros e desnecessários documentos anexos às petições, que muitas das
vezes sequer apresentam relação com a matéria em discussão no litígio.
Dessa forma, poderia uma das partes apresentar diversos documentos
físicos e requerer ao juízo a digitalização? Primeiramente, importante destacar
que compete ao juiz proferir decisão acerca do tema, determinando (ou não) que
seja realizada a digitalização dos documentos porventura solicitados pelas partes,
desde que julgados necessários, sendo certo que o entendimento do magistrado
poderá ser revisto a qualquer tempo, dependendo da necessidade.
Até mesmo as decisões de urgência, chamadas de tutela de urgência,
serão requeridas e decididas por meio do processo eletrônico, inexistindo
necessidade para realização de qualquer ato fora do processo eletrônico.
Essa grande transformação do processo eletrônico traz repercussões
incomensuráveis no procedimento cível, eliminando volumes, reduzindo gastos
desnecessários, evitando deslocamentos, perda de volumes de processo, tudo
em função da utilização dos autos digitais.

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TEMA 2 – PROCESSO ELETRÔNICO NO JUIZADO ESPECIAL

Os Juizados Especiais foram criados a partir da Lei n. 9.099/1995, quando


se percebeu que um dos principais motivos do assolamento do judiciário decorria
de ações calcadas em pequenos pleitos, contratuais, comerciais, consumeristas,
entre outros.
Com essa constatação, nascem os Juizados Especiais, como ferramentas
para auxiliar no desentrave do sistema judiciário cível. Essa legislação especial
apresenta certos critérios quanto à competência dos Juizados para condução dos
processos, conforme previstos no art. 3º da citada lei (Brasil, 1995):

Art. 3º O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação,


processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, assim
consideradas:
I - as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo;
II - as enumeradas no art. 275, inciso II, do Código de Processo Civil;
III - a ação de despejo para uso próprio;
IV - as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente
ao fixado no inciso I deste artigo.

Todavia, o que se pensava ser a solução para a diminuição dos conflitos,


tomou outro rumo, criando uma nova, assoberbada e concorrida área do judiciário.
Quanto ao processo apresentado no Juizado Especial, ele geralmente tem
menor complexidade, não exigindo profunda dilação probatória, mormente que o
próprio requerente, muitas vezes sem auxílio de advogado, apresenta o
requerimento.
Esse requerimento pode ser realizado diretamente nos cartórios de Juizado
Especial. O pedido pode ser apresentado de forma oral ou escrita, conforme
previsto no art. 14 da lei em comento (Brasil, 1995):

Art. 14. O processo instaurar-se-á com a apresentação do pedido, escrito


ou oral, à Secretaria do Juizado.
§ 1º Do pedido constarão, de forma simples e em linguagem acessível:
I - o nome, a qualificação e o endereço das partes;
II - os fatos e os fundamentos, de forma sucinta;
III - o objeto e seu valor.
§ 2º É lícito formular pedido genérico quando não for possível
determinar, desde logo, a extensão da obrigação.
§ 3º O pedido oral será reduzido a escrito pela Secretaria do Juizado,
podendo ser utilizado o sistema de fichas ou formulários impressos.

Veja-se que a própria lei trata de especificar que, no caso de um pedido


realizado oralmente, caberá à secretaria traduzi-lo a termo, ou seja, transcrevê-lo,
nos termos do parágrafo 3º supracitado.

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Independentemente do formato escolhido pela parte, seja oral ou escrito,
após a apresentação do pedido, ele será devidamente transposto para o sistema
de peticionamento eletrônico, inclusive no que diz respeito aos documentos
porventura integrantes do pleito, como notas fiscais, correspondências, contratos
ou quaisquer outros documentos necessários.
Uma vez distribuído, o processo será objeto de expedição de citação para
a parte requerida, para comparecer em audiência conciliatória e, caso queira,
apresentar sua defesa, salvo se realizada conciliação, conforme sabidamente
acrescenta Abrão (2017, p. 71):

Apresentada a inicial, oralmente, ela será consolidada e fará parte do


sistema que conterá os dados, documentos digitalizados, a fim de que
possa a secretaria encaminhá-lo ao juízo. A parte requerida será citada,
com exigência do comparecimento pessoal do autor sob pena do
arquivamento de sua pretensão. Na primeira sessão de audiência se
tentará o acordo, concentrando-se os atos praticados, e, sendo inviável,
será apresentada defesa, que deverá ser entregue também na forma
digital, incorporando-se ao processo aberto.

Sendo a matéria discutida essencialmente jurídica, já será possível que o


juiz profira decisão, não sendo necessária a realização da fase instrutória. Por
outro lado, sendo esta última necessária, será designada audiência de instrução
para oitiva das testemunhas e depoimento das partes, para que então os autos
sejam conclusos para proferir sentença.
Sem dúvida, o processo eletrônico apresenta grandes vantagens para a
condução de processos decorrente do Juizado Especial; apesar do grande volume
de casos, passa-se a ter uma tramitação mais ágil e eficiente com os autos
digitais.
A grande questão está em torno da estrutura judiciária, que possa dar cabo
ao acúmulo de processos, posto que toda fase inicial e instrutória pode ocorrer
em poucos meses, enquanto a elaboração de sentença e julgamento de recursos
pode demorar anos.
Constata-se que todos os atos decorrentes do processo que tramita no
Juizado Especial se mostram concentrados e unificados, principalmente com o
advento do processo eletrônico, o que não se pode afirmar como suficiente, dada
da demora para ocorrerem os julgamentos, sejam eles em primeira ou segunda
instância.

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TEMA 3 – PROCESSO ELETRÔNICO TRABALHISTA

O processo eletrônico espalha seus efeitos para todos os procedimentos


judiciais, inclusive os de âmbito trabalhista. É certo que, nesta esfera, tanto o
ajuizamento de um processo, quanto a sua resolução, vão ocorrer de forma
eletrônica.
Evidentemente, que o Código de Processo Civil tem aplicação subsidiária
ao processo trabalhista; portanto, diante da omissão acerca de determinadas
questões processuais, a Lei Processual é que deve ser aplicada.
É sabido que o processo do trabalho se rege pelo princípio da oralidade e
simplicidade; logo, à primeira vista poderíamos imaginar que há algum tipo de
conflito entre a norma que rege o processo eletrônico e as regras de processo do
trabalho.
Todavia, o processo eletrônico também nasce para promover mais
simplicidade em relação à sua execução, sendo certo que a questão da oralidade
fica facilmente ultrapassada quando se percebe que os procedimentos
decorrentes dos autos digitais não apresentam qualquer complexidade – pelo
contrário, pois também são regidos, mesmo que indiretamente, pela simplicidade
dos atos processuais.
Desde a inicial, passando pelo recebimento e, posteriormente, pela citação
da reclamada, bem como pelas demais intimações que se fizerem necessárias,
tudo se dará de forma eletrônica.
Por certo, o processo trabalhista também contém suas particularidades.
Porém, na medida em que todo o processo passará a tramitar de forma eletrônica,
as dificuldades em sua realização tornam-se cada vez mais insignificantes.
Durante a instrução, qualquer incidente será resolvido no termo, constando
certidão específica, com vantagem de redução do tempo de espera na regular
instrução do conflito.
Novamente, segundo Abrão (2017, p. 63):

Observado tal desenvolvimento do processo trabalhista eletrônico, o


sistema conterá a sentença e também todos os predicados a ela
inerentes, cujo recurso apresentado de forma eletrônica poderá exigir
transcrição de depoimentos. Estando em termos o processo trabalhista
eletrônico, será remetido para o TRT com o escopo de seu reexame,
com a distribuição eletrônica e designação de relator, exigindo as vezes
manifestação do Ministério Público do Trabalho.

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Verifica-se assim que a interposição de recurso, a distribuição nas Turmas
do Tribunal Regional, bem como a divulgação dos votos componentes do acórdão,
todos passam a ser realizados eletronicamente, através da plataforma de
peticionamento eletrônico.
Tem-se, ainda, que o processo eletrônico também incorporará regras,
princípios e pressupostos que atenderão aos conflitos de interesse,
principalmente quando houver interesse coletivo na demanda, possibilitando a
sistematização do acesso igualitários a todos os integrantes da disputa judicial.
Novamente, vejamos os ensinamentos de Abrão (2017, p. 64), no que
tange à ocorrência de processo de falência, ao qual o processo trabalhista
encontra-se vinculado:

A preservação de branco de dados reduzirá em muito os incidentes e


demais conflitos, fazendo com que se participe a definição a respeito de
cada credor, valores, sem a renovação de outro incidente, mas apenas
a concordância do administrados judicial e do próprio Ministério Público
em torno do valor constante da Justiça Especializada do Trabalho. A
eliminação de papéis, todavia, será gradual e visará acima de tudo, a um
maior ajuste entre as observações de cada reclamante a situação
específica para efeito de recebimento do crédito, isso porque quando o
exigir a sentença liquidação, também o procedimento futuro seguirá o
caminho eletrônico.

Traduzindo todo o aspecto do processo trabalhista eletrônico, a sua


percepção administrará menos recursos e incidentes, evitando-se a pluralidade
de ações dos mesmos reclamantes, além de possibilitar o gerenciamento das
demandas, de forma a identificar, por exemplo, litispendência.
Notadamente, o processo eletrônico trabalhista teve um avanço muito
maior em sua implementação, em comparação a demais áreas de atuação, o que
talvez se deve ao fato de que o processo trabalhista é mais simplificado em sua
estrutura, o que certamente o faz bom exemplo de como é possível implementar,
com sucesso, o uso efetivo do processo eletrônico.

TEMA 4 – PROCESSO ELETRÔNICO CRIMINAL

Nas últimas décadas, foi possível observar algumas mudanças na


legislação criminal, por conta do aumento das taxas de criminalidade no país.
Assim, pode-se dizer que o processo criminal está estritamente ligado à sua forma
de consecução, para se obter sucesso. Isso porque muitos dos procedimentos
criminais precisam, ou pelo menos deveriam ser, céleres e imediatos, não
havendo muito espaço para a morosidade.

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Apesar dessa necessidade, é sabido que nem sempre identificamos esse
tipo de atuação pelo judiciário criminal, posto que inúmeros acusados ficam anos
aguardando a decretação de sua pena, e mais tempo ainda aguardando um
julgamento, quiçá a apreciação de um pedido de liberdade.
Outro aspecto interessante é justamente a dificuldade para introduzir
modificações na estrutura do processo criminal, talvez por ele estar tão
cristalizado em nossa sociedade da forma como construído.
Por outro lado, podemos identificar avanços nessas questões, como por
exemplo a possibilidade da videoconferência para a realização de interrogatório
do acusado, bem como das vítimas, conforme preconizado no art. 185, parágrafo
2º do Código de Processo Penal brasileiro (Brasil, 1941, grifo nosso):

Art. 185. O acusado que comparecer perante a autoridade judiciária, no


curso do processo penal, será qualificado e interrogado na presença de
seu defensor, constituído ou nomeado. [...]
§ 2º Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a
requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu
preso por sistema de videoconferência ou outro recurso
tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real,
desde que a medida seja necessária para atender a uma das
seguintes finalidades:
I - prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita
de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão,
possa fugir durante o deslocamento;
II - viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando
haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por
enfermidade ou outra circunstância pessoal;
III - impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima,
desde que não seja possível colher o depoimento destas por
videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código;
IV - responder à gravíssima questão de ordem pública.
§ 3º Da decisão que determinar a realização de interrogatório por
videoconferência, as partes serão intimadas com 10 (dez) dias de
antecedência.
§ 4º Antes do interrogatório por videoconferência, o preso poderá
acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico, a realização de todos os
atos da audiência única de instrução e julgamento de que tratam os arts.
400, 411 e 531 deste Código.

Apesar de esse instrumento necessitar de decisão fundamentada pelo juiz


que preside o feito, indicando uma das finalidades prescritas nos incisos I à IV, e
do fato de a maioria das finalidades decorrerem de questões de segurança,
podemos encontrar no inciso II uma questão um pouco mais abrangente, não
necessariamente decorrente de perigo à execução do processo ou à segurança
pública.
Portanto, constamos que a tecnologia vem sendo utilizada no processo
penal desde 2009, quando da entrada em vigência da Lei n. 11.900/2009, que
promoveu alterações no campo processual criminal.
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Como dito, o processo criminal tem uma relação muito mais estreita com a
realidade fática do caso em apreço, conforme relembra Abrão (2017, p. 67):

“É certo, no entanto, que o processo criminal eletrônico se adapta à


necessidade da verdade real: recebida a denúncia, marcado o
interrogatório, pode ser utilizada a videoconferência”.

Com a modernização do judiciário, principalmente na esfera criminal,


percebemos que até a atuação do Ministério Público, nos casos em que figura
como titular a ação penal pública incondicionada, ocorre por meio do processo
eletrônico. A denúncia é realizada digitalmente, passando a seguir neste meio até
o seu encerramento. Tramita pelo despacho de recebimento, pelo agendamento
de interrogatórios, bem como por demais cautelas necessárias para a decisão
acerca de eventuais custódias cautelares e preventivas com relação ao réu.
O mesmo se pode afirmar da ação penal privada, a partir da queixa-crime,
na qual o querelante apresenta sua peça escrita digitalizada, sendo
posteriormente distribuída, com posterior citação do querelado para resposta,
igualmente de forma eletrônica.
Importante destacar que, no processo penal, a citação, ferramenta através
da qual o réu é chamado a juízo, tendo ciência do ajuizamento da ação que lhe
imputa a execução de ato criminoso/infração penal, facultando-lhe a apresentação
de defesa, deve ocorrer exclusivamente de forma pessoal, através de oficial de
justiça devidamente habilitado, nos termos do art. 351 do Código de Processo
Penal (Brasil, 1941): “Art. 351. A citação inicial far-se-á por mandado, quando o
réu estiver no território sujeito à jurisdição do juiz que a houver ordenado”.
O mesmo ocorre para a citação de réu preso, que deve ocorrer nos mesmos
moldes, conforme preconizado no art. 360 do Código de Processo Penal (Brasil,
1941): “Art. 360. Se o réu estiver preso, será pessoalmente citado”.
Por outro lado, notificações e intimações poderão ser feitas no formato
eletrônico, direcionadas aos representantes das partes, legalmente constituídos.
Uma vez que o processo penal se encontra vinculado à realidade fática,
muito mais do que aquela formal, é certo que todos os documentos relacionados
à causa devem ser devidamente digitalizados e armazenados para consulta das
partes, Defensoria Pública, juízes e Ministério Público, por todo o tempo que durar
a ação, não sendo viável a manutenção de documentos físicos afetos ao processo
penal.

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Assim, é possível afirmar que não basta apenas a existência do processo
penal, posto que aquilo que realmente importa é a sua eficiência no cumprimento
das penalidades aplicadas aos réus, haja vista tratar-se de medida punitiva das
mais importantes, dada a sua natureza.
Constata-se dessa forma que o processo penal eletrônico é sem dúvidas
uma importante ferramenta na busca por efetividade, instrumentalidade e
celeridade processual, de todas as partes atuantes no procedimento penal.
Nas palavras de Abrão (2017, p. 66), outro aspecto importante diz respeito
ao princípio da inocência. Vejamos:

Revestido o processo penal de inescapável formalismo, particularizado


pelo aspecto da inocência enraizada na presunção de estilizada da
Constituição Federal, é fundamental maior cautela para que se evitem
as nulidades do processo penal. Envolvendo regra de proteção à
sociedade e também à dignidade do réu, o processo penal eletrônico
participa do sistema de conhecimento intrínseco e extrínseco da
realidade probatória: desde a fase do inquérito policial, que desaguará
na denúncia, tudo será transparente e o acesso permitido.

De tais considerações, percebe-se que deve haver preocupação do


operador do direito, para que a ânsia de modernização do judiciário,
especificamente na esfera penal, não se sobreponha a princípios constitucionais,
como o princípio da inocência, no qual o réu é considerado inocente até que haja
trânsito em julgado da decisão, nos termos do art. 5º, inciso LVII da Constituição
Federal (Brasil, 1988): “LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória”.
Não menos importante, temos a questão do sigilo relacionado aos
processos criminais. Certo que, com o processo físico, apesar de tramitar em
segredo de justiça, outro nome utilizado para o sigilo processual, inúmeras
pessoas tinham acesso ao conteúdo do processo, como estagiários, servidores,
cartórios, dentre outros.
Agora, com o advento do processo eletrônico, uma vez decretado o sigilo
dos autos, somente as partes integrantes do litígio têm acesso a ele, sendo certo
que compete exclusivamente ao juiz do caso o levantamento do dito sigilo – ou
seja, trata-se de uma maneira muito mais eficaz do que o feito anteriormente.
Neste particular, destaca-se que outro aspecto interessante diz respeito à
possibilidade de que o processo investigatório tramite em sigilo, ou seja, sem que
a parte requerida tenha conhecimento, até que o processo se encontre na fase de
citação para defesa. Isso porque, sabidamente, em muitos casos a investigação

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pode sofrer drásticos impactos no caso de sua existência chegar ao conhecimento
do réu.
Portanto, é possível, com o processo eletrônico, que toda a fase
investigatória seja realizada nos autos digitais, em segredo de justiça, até a fase
em que necessariamente haja necessidade de participação e atuação da parte
requerida, sem interferência no processo investigatório, possibilitando dessa
forma a concentração de todos os atos decorrentes do processo em um único
ambiente.
Constata-se assim que a própria investigação criminal, realizada no formato
eletrônico, deve assegurar meios para que o Ministério Público tenha elementos
suficientes quando do oferecimento da denúncia.
A questão de se ter elementos suficientes para o oferecimento da denúncia
até parece lógica quando tratamos de um único réu; porém, se imaginamos um
caso de lavagem de dinheiro, existem dezenas de investigados, com outras
dezenas de possíveis cúmplices, milhares de documentos, planilhas, extratos
bancários, declarações, correspondências.
Veja que o Ministério Público, para oferecer a denúncia, deverá ter acesso
a todos esses elementos, sobre os quais a guarda de forma eletrônica se traduz
de forma muito mais eficiente do que no antigo formato físico. Nesse sentido,
Abrão destaca:

“Evidencia-se maior descrição dos fatos e menor conteúdo do jurídico na


prova criminal. No entanto, os documentos trazidos ao bojo da ação
penal deverão marcar a fase digital”. (Abrão, 2017, p. 67)

Naturalmente, durante a fase instrutória, consonante ao princípio da


oralidade, norteador do processo como um todo, desde a inquirição das
testemunhas, talvez em alguns casos ouvidas por carta precatória, até a
realização de quaisquer requerimentos realizados pelos Membros do Ministério
Público ou partes intervenientes, nos termos do art. 402 do Código de Processo
Penal, devendo ser registrados, nos autos digitais, inclusive no que diz respeito
ao oferecimento das razões finais orais, conforme previsto no art. 403 do Código
de Processo Penal, que ficarão registradas no processo eletrônico através dos
instrumentos tecnológicos de gravação de voz ou vídeo.

Art. 402. Produzidas as provas, ao final da audiência, o Ministério


Público, o querelante e o assistente e, a seguir, o acusado poderão
requerer diligências cuja necessidade se origine de circunstâncias ou
fatos apurados na instrução.

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Art. 403. Não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido,
serão oferecidas alegações finais orais por 20 (vinte) minutos,
respectivamente, pela acusação e pela defesa, prorrogáveis por mais 10
(dez), proferindo o juiz, a seguir, sentença. (Brasil, 1941)

A ideia central do processo eletrônico em meio digital é que, após a


prolação da sentença, eventuais recursos também devem ser interpostos no
mesmo formato, sendo posteriormente remetidos à instância superior para
julgamento, de forma eletrônica, o que supostamente também deve ocorrer na
fase em que o processo estiver no tribunal, considerando distribuição para o
relator e revisor, abertura de prazo do Ministério Público para manifestação,
designação de julgamento e demais atos processuais inerentes e compatíveis
com a fase.
Após transitada em julgado a decisão, até que ela seja efetivamente
cumprida, todos os atos anteriores poderão ser realizados em formato digital,
inclusive no que diz respeito a mandados, alvarás, eventuais decisões de habeas
corpus, entre outros, sendo certo que o seu reconhecimento independe de serem
impressas.
Uma vez que o processo penal tramita de forma eletrônica, até mesmo a
emissão de certidão de antecedentes criminais poderá ser obtida mais facilmente,
sendo certo que basta o cartório realizar a comunicação de tal ato para os órgãos
competentes.
Assim, tem-se que a unificação das informações penais permitirá consulta
em âmbito nacional acerca das condenações, possibilitando que todos os
mandados sejam cumpridos, inexistindo a argumentação de que estariam faltando
informações necessárias para o cumprimento, quando era preciso recorrer a outra
comarca, por exemplo.
Por fim, vejamos o que sintetiza Abrão (2017, p. 69) acerca do tema:

Existirá uma integração maior na investigação, seu curso, na ação penal,


na fase condenatória, haja vista que os dados serão preservados, a
digitalização ordenada, sem falar na destruição daquele documento,
principalmente porque ele serve para orientar a prova. Assim, o processo
eletrônico penal trará peculiaridade ímpar, na medida em que refletirá,
em todo o procedimento, os aspectos do crime praticado, da condenação
imposta, do regime prisional e, mais de perto, as etapas do cumprimento
da pena, o que se demonstra relevante, evitando-se a falta de
acompanhamento, fiscalização, mudança de regime e, de conseguinte,
a extinção de punibilidade, visando ao registro e também a eventual
reinserção social.

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TEMA 5 – PENHORA ON-LINE E BACEN-JUD

Sem dúvidas, os recursos tecnológicos são ferramentas já inseridas na


realidade processual do sistema judiciário brasileiro, até mesmo porque são
inúmeras as possibilidades, conforme previsões contidas no Código de Processo
Civil. Um exemplo disso é a chamada penhora on-line, que surge no cenário
jurídico a partir da Lei Complementar n. 118/2005, que por sua vez incluiu o art.
185-A ao Código Tributário, que assim prevê (Brasil, 2015):

“Art. 828. O exequente poderá obter certidão de que a execução foi


admitida pelo juiz, com identificação das partes e do valor da causa, para
fins de averbação no registro de imóveis, de veículos ou de outros bens
sujeitos a penhora, arresto ou indisponibilidade”.

Art. 185-A. Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não


pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem
encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade
de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente
por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem
registros de transferência de bens, especialmente ao registro público
de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do
mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam
cumprir a ordem judicial. (Brasil, 1966, grifos do original)

Com essa ferramenta, caso a parte requerida não cumpra com a


determinação judicial exarada, poderá o juiz determinar a constrição de bens, a
fim de adimplir o valor devido, conforme decisão prolatada nos autos.
A penhora é realizada mediante ordem eletrônica para bloqueio de bens;
ou seja, através de um comando on-line, por meio dos convênios firmados entre
o judiciário e órgãos como Detran e Registros de Imóveis, ocorre o bloqueio do
bem.
Outra situação decorre da determinação de bloqueio de valores, quando se
utiliza a ferramenta denominada Bacen-Jud.
O Bacen-Jud nada mais é do que uma ferramenta on-line que permite ao
magistrado que determine o bloqueio de valores diretamente nas contas correntes
do executado, até o limite do valor da dívida. Esse comando é realizado
atualmente, preferencialmente, através de sistema eletrônico, conforme previsto
no art. 854 do Código de Processo Civil.

Art. 854. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou em


aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, sem dar
ciência prévia do ato ao executado, determinará às instituições
financeiras, por meio de sistema eletrônico gerido pela autoridade
supervisora do sistema financeiro nacional, que torne indisponíveis
ativos financeiros existentes em nome do executado, limitando-se a
indisponibilidade ao valor indicado na execução. (Brasil, 2015)

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Independentemente da forma utilizada, concomitantemente à realização do
bloqueio, de valores ou bens, ocorre a inclusão no devedor no Cadastro de
Devedores.
Outra ferramenta utilizada para assegurar o cumprimento da execução é a
certidão de indisponibilidade, na qual fica registrada, por exemplo, na matrícula
de um imóvel, que ele se encontra indisponível para qualquer ato jurídico,
conforme decisão proferida em determinados autos processuais, conforme
previsto no art. 828 do Código de Processo Civil.
Importante destacar que todos esses comandos são realizados
exclusivamente na via digital, não sendo necessária a realização desses atos
pessoal ou fisicamente, o que por si só é suficiente para demonstrar a agilidade e
eficiência que as ferramentas decorrentes da modernização do judiciário e do
processo eletrônico promovem para garantir meios para a execução de débitos.

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REFERÊNCIAS

ABRÃO, C. H. Processo eletrônico: processo digital. 5. ed. São Paulo: Atlas,


2017.

BRASIL. Constituição (1988). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 out. 1988.

BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689 de 3 de outubro de 1941. Diário Oficial da União,


Rio de Janeiro, 13 out. 1941.

BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Diário Oficial da União, Poder


Legislativo, Brasília, DF, 17 mar. 2015.

BRASIL. Lei n. 5.172 de 25 de outubro de 1966. Diário Oficial da União, Poder


Legislativo, Brasília, DF, 26 out. 1966.

BRASIL. Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995. Diário Oficial da União, Poder


Legislativo, Brasília, DF, 27 set. 1995.

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