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“ Protótipo de canudo biodegradável


à base de amido e gel de Aloe vera:
caracterização e análise da integridade

Leonardo de Araújo Silva


UFBA

Talisson Dias Souza


UFBA

Clara Mariana Gonçalves Lima


UFLA

Luiza Zazini Benedito


UFLA

Renata Ferreira Santana


UESB

Wilson Rodrigues Pinto Júnior


UFBA

10.37885/210203344
RESUMO

O interesse em produtos biodegradáveis tais como os canudos vem aumentando porque


o uso de materiais e recursos renováveis contribui para a preservação ambiental. Entre
todos os biopolímeros, o amido está sendo pesquisado como um polímero com grande
potencial para desenvolvimento de produtos biodegradáveis. O objetivo deste estudo
foi desenvolver um protótipo de biocanudo à base de amido, glicerol e gel de Aloe vera
e avaliação da sua integridade frente bebidas comumente consumidas. O bioplástico
formulado na proporção de 10% de amido, 10% de gel Aloe vera e 5% de glicerol apre-
sentou aspecto homogêneo, com ausência de bolhas na superfície e boa flexibilidade
o que facilitou o molde do produto. O biocanudo desenvolvido a partir do bioplástico
apresentou total solubilidade em ácido clorídrico 1N, solubilidade em água de 36% e
umidade de 31%. A análise de biodegradabilidade indicou uma perda de massa de 61%
em 60 dias. No ensaio da integridade do biocanudo quando em contato com bebidas
comumente consumidas (achocolatado, água de Coco, Coca-Cola, suco de Laranja) e
solução salivar artificial apresentou-se consistente, maleável e íntegro. Os estudos pre-
liminares sugerem o biocanudo à base de amido e gel de Aloe vera como alternativa à
utilização dos canudos plásticos.

Palavras-chave: Produto, Biodegradável, Sustentável.

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INTRODUÇÃO

A poluição plástica dos oceanos pode chegar a 300 milhões de toneladas métricas até
2030 considerando as atuais projeções de crescimento populacional, projeções de PIB per
capita e a atual geração de resíduos plásticos per capita (MACHADO et al., 2018). Dentro
desse “mar de plástico” estão descartáveis, quais sejam copos, sacolas, canudos, garrafas
e microplásticos (pequenas partículas), incluindo microesferas usadas em produtos cosmé-
ticos (ONU, 2017).
Os canudos de plástico, que não costumam ser biodegradáveis e têm apenas alguns
minutos de vida útil para os seres humanos, correspondem a 4% de todo o resíduo plástico
consumido no planeta (DAVID; SANTOS; OLIVEIRA, 2018). A utilização desenfreada gera
enormes problemas de contaminação ambiental, uma vez que os resíduos gerados pela
decomposição permanecem por centenas de anos no meio ambiente (MOCARZEL et al.,
2019). Representam uma parcela pequena entre os resíduos descartados pela população,
entretanto, eles representam uma significante parcela do lixo marinho e costeiro, estando
entre os 10 objetos mais coletados em mutirões de limpeza (NETO, 2019).
Algumas cidades dos Estados Unidos da América, como São Francisco, no estado da
Califórnia, desde 2016, proíbem a distribuição de canudos de plástico nos estabelecimentos
(BRINKLOW, 2018). Na Inglaterra, a proibição dos canudos entrou em vigor em abril de
2018 (Department for Environment, Food & Rural Affairs). Já a União Europeia anunciou a
proibição até 2021 (RIES, 2017). No Brasil, a cidade do Rio de Janeiro foi a capital pioneira
na proibição e, desde setembro de 2018, está multando em vista à norma (Lei Municipal nº
6.458 de 8 de janeiro de 2019). Após a iniciativa, outras cidades das regiões Centro-oeste,
Nordeste e Sul do país também aderiram à causa e proibiram a comercialização e distribui-
ção dos canudos (NETO, 2019).
Preocupados com o meio ambiente e com os impactos negativos do lixo plástico, alguns
empresários já lançaram alternativas ao canudo de plástico. O canudo de papel está cada
vez mais presente no comércio e no dia a dia, já que é uma opção biodegradável, entretan-
to também acaba sendo uma fonte de poluição até sua completa biodegradação, já que o
modelo foi pensado como um descartável (GUTIERREZ et al., 2019).
Diante dessa problemática, desenvolver canudos biodegradáveis (biocanudos) com
funcionalidade semelhante à dos canudos de plásticos tem ganhado espaço no merca-
do industrial e comercial. Dentre as alternativas de matérias-primas para a produção de
biopolímeros, que constituem a base para a confecção do biocanudo, está o amido: um
polissacarídeo abundante, não tóxico, biodegradável, de baixo custo de comercialização e
disponível em todo o mundo (LUCHESE et al., 2019). Atrelados a isso e às características

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físicas e químicas desse polissacarídeo, trabalhos na produção de biopolímeros à base de
amido têm tido resultados positivos (AZEVEDO et al., 2018; ROCHA et al., 2020).
No entanto, a utilização do amido requer a inclusão de algum plastificante, pois quando
o biopolímero é produzido sem este, apresenta-se bastante quebradiço e sem flexibilidade,
o que acaba influenciando nas características mecânicas do filme. Os plastificantes mais
empregados na produção de biopolímeros são os polióis, como o glicerol e o sorbitol. O gli-
cerol é empregado como plastificante agregador da matriz, expandindo o espaço livre entre
as cadeias poliméricas, o que faz ocorrer a diminuição das forças intermoleculares ao longo
da matriz, aumentando, assim, a flexibilidade no manuseio dos filmes, o que contribui para
a diminuição de possíveis descontinuidades e zonas quebradiças (COSTA et al., 2017).
É sabida a relevância do glicerol na confecção dos filmes, no entanto a sua utilização
deve ser bem avaliada diante do custo imposto pela matéria, uma vez que o glicerol é o
principal coproduto gerado na produção de biodiesel, sendo que aproximadamente 10% do
volume total de biodiesel produzido correspondem ao glicerol (PEITER et al., 2016). Nesse
sentido, estudos que identifiquem substâncias naturais que promovam aos biofilmes firmeza
e elasticidade têm sido intensificados. A Aloe vera, popularmente conhecida no Brasil como
babosa, acrescenta melhorias nas propriedades físicas e químicas da produção de bioplás-
ticos pois o gel de Aloe vera contém em sua composição um líquido viscoso, composto por
95,4% de água e 4,6% de sólidos totais, dos quais 60% são polissacarídeos mucilogênicos,
responsáveis por propriedades funcionais, como coesão, capacidade de retenção e gelifi-
cação (CRIOLLO, 2019)
Dessa forma, o objetivo desse trabalho foi desenvolver um protótipo de canudo biode-
gradável (biocanudo) de amido de milho e glicerol, com adição do gel de Aloe Vera, visando
avaliar as características físicas e químicas do protótipo, de modo a estudar sua parte estru-
tural, assim como o monitoramento de sua integridade em contato com bebidas, simulando
as diferentes condições de uso por consumidores.

MATERIAL E MÉTODOS

Extração de Aloe vera

As folhas frescas de Aloe vera foram obtidas de produtores rurais das cidades de
Brumado e Rio do Antônio, no estado da Bahia. Para a extração do gel de Aloe vera, as
folhas foram submetidas a um processo de lavagem com água corrente, seguido de sa-
nitização com uma solução de hipoclorito de sódio a 2%, por 5 minutos. Logo após, as
folhas foram lavadas com água destilada para remoção da substância química sanitizante
(CRIOLLO, 2019). Posteriormente, foi realizado, um corte transversal da base até o ápice da

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folha para dar acesso ao conteúdo interno. O gel de Aloe vera foi, então, separado da casca
por raspagem com auxílio de uma espátula e, por fim, o produto obtido foi homogeneizado
em um liquidificador (Phillips Walita®, modelo RI2101/30), filtrado (separando os grumos e
impurezas do material viscoso de interesse) e armazenado em frasco Boeco de 250 mL, a
uma temperatura de -4 °C, segundo Godinho (2014), com adaptações.

Produção do bioplástico para confecção do biocanudo

Inicialmente foram elaborados biofilmes em diferentes concentrações de amido de milho


(Mayzena Duryea®), glicerol (Vetec), gel da Aloe vera e água destilada (Tabela 01). A meto-
dologia aplicada foi a técnica de casting, baseada no trabalho de Mali et al., (2002). O amido
de milho e o glicerol foram dissolvidos em uma solução de 100 mL de água destilada e Aloe
vera. As soluções foram aquecidas em banho-maria a 95 °C, por 5 minutos, até formarem
uma solução filmogênica, seguindo, assim, para banho ultrassônico de 40 KhZ (Unique
ulta cleaner, 1400), a uma temperatura de 50 °C, por 20 minutos, para remoção das bolhas
formadas durante o processo. A solução foi vertida em placas de Petri (10 cm de diâmetro),
cada uma com peso padronizado de 20 gramas da solução, e o material foi seco em estufa
com circulação de ar (ACB LABOR) a 30 °C, por 24 horas. Após esse período, o biocanudo
foi produzido manualmente, de modo a enrolar o biofilme para se obter um canudo.
Tabela 01. Diferentes proporções dos componentes para produção do bioplástico.

Tratamento Amido (%) Glicerik (%) Aloe vera (%) Água (mL)

A1 10 5 10 100
A2 5 3 10 100
A3 8 1 13 100
Os tratamentos foram preparados em três repetições em triplicata.

Aspectos visuais do bioplástico

Análises tácteis e visuais foram realizadas nos três filmes para comparar parâmetros
como: homogeneidade (distribuição uniforme sem partículas insolúveis ou regiões sem
recobrimento); flexibilidade (manuseio fácil, sem rachaduras e áreas frágeis); ausência de
defeitos aparentes como bolhas de ar na superfície; desprendimento do revestimento; e
olho de peixe (massa globular pequena que não se misturou completamente ao material do
bioplástico), seguindo a metodologia de Cruz (2018), com modificações.

Umidade e solubilidade em água do biocanudo

Inicialmente, a massa seca das amostras do biocanudo, de 02 cm de comprimento,


foi determinada em função de sua umidade em uma estufa de secagem (Limatec), mantida

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a 105 ºC, por 24 horas. Em seguida, as amostras foram submergidas em 50 mL de água
destilada por 24 horas. Após esse período, as amostras foram removidas da água e secas
em estufa (Limatec) a 105 °C, por 24 horas. A porcentagem de solubilidade e umidade foi
calculada segundo Gontard et al. (1992). As análises foram realizadas em triplicata.

Solubilidade em ácido do biocanudo

A solubilidade em ácido foi determinada segundo o método proposto por Gontard


et al (1992). A massa seca inicial, 02 cm de comprimento do biocanudo, foi obtida após
secagem, por um período de 24 horas, a 105 °C em estufa (Limatec). Após a obtenção da
massa seca, as amostras foram submersas em um recipiente contendo solução de ácido
clorídrico 1N, por 24 horas, sob agitação de 200 RPM. Após esse período, foram secas a 50
°C, por 24 horas, e pesadas para a obtenção da massa final. As análises foram realizadas
em triplicata (FAKHOURI et al, 2015).

Biodegradabilidade do biocanudo

O estudo da biodegradabilidade foi estimado pela perda de massa do biocanudo no


solo. Para isso, as amostras de 02 cm de comprimento foram pesadas para determinação
da massa inicial e misturadas com o solo não padronizado. Após a mistura com o solo, as
amostras foram acondicionadas em recipiente circulares com 14 cm de diâmetro. Em segui-
da, estes foram enterrados a 20 cm de profundidade do solo. Os recipientes foram retirados
do solo em diferentes períodos de tempo: 30, 60, 90, 120, 150 e 180 dias, após serem en-
terrados. As amostras foram lavadas em solução NaOH 12% para retirada das frações de
argila aderidas na superfície do biocanudo e, em seguida, foram colocadas em estufa de
secagem (Limatec) a 50 ºC, por 24 horas. Posteriormente, as amostras foram retiradas e
pesadas para comparar o percentual de perda de massas. As análises foram realizadas em
triplicata (Souza et al., 2016).

Ensaio de integridade do biocanudo

Os ensaios para integridade do biocanudo, frente às bebidas comumente consumidas


(Achocolatado, Água de Coco, Coca-Cola, Suco de Laranja) e solução salivar artificial,
foram realizados com base na metodologia utilizada pela Farmacopéia Brasileira (2010),
com adaptações, pois não há trabalhos oficiais para o ensaio de integridade de biocanudo
subordinado a essas condições. As análises foram realizadas em triplicata.

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Integridade do Biocanudo frente às bebidas comerciais comumente consumidas

Bebidas que são comumente consumidas têm o pH em variação de 2,5 a 7. Foram


submetidos ao teste: refrigerante Coca-Cola (pH = 2); suco de laranja industrializado (pH =
4,3); água de coco (pH = 5) e achocolatado (pH = 7). Tais bebidas foram adquiridas de forma
comercial em estabelecimentos locais, na cidade de Vitória da Conquista-Bahia. Amostras
de 02 cm de comprimento do protótipo foram inseridas em 50 mL dos diferentes líquidos
consumíveis. A integridade do biocanudo foi analisada nas temperaturas de 7 °C e 25 °C, em
diferentes períodos de tempos (05, 10 e 15 minutos). Ao final de cada tempo, os biocanudos
foram recolhidos e sua integridade foi analisada visualmente.

Integridade do Biocanudo frente à saliva artificial

Amostras de 02 cm de comprimento foram inseridas em 50vmL de solução salivar


artificial (Carboximetilcelulose, 2,5g; KCl 0,036g; NaCl 24mg; MgCl2 1,56mg; Sorbitol lí-
quido 0,9g; NaH2PO4 85,5mg; Cloreto de Cálcio Dihidratado 36,5mg; água purificada 200
mL) (Formulize, BA,BRA), para serem analisadas quanto à integridade do biocanudo em
diferentes período de tempo (5, 10 e 15 minutos), simulando a temperatura bucal (36v C) e
refrigerada (7v ºC). A integridade do biocanudo foi determinada visualmente.

RESULTADO E DISCUSSÃO

De maneira geral, a síntese do protótipo do biocanudo foi relativamente simples, pois


não utilizou solvente e pode ser conduzido na temperatura de 95 °C. De acordo com Santos
et at. (2019), a amilose presente no amido em solução é responsável pela capacidade de
formação de biofilme, base a qual foi utilizada na formulação do protótipo do biocanudo.
Esse processo de formação envolve duas etapas: a primeira é a gelatinização (inchaço,
ruptura e lixiviação de componentes solúveis do amido-amilose) e a segunda compreende
a retrogradação (redução da solubilidade do amido dissolvido).
A flexibilidade do biofilme, fator contribuinte para modelagem do canudo, foi resultante
da adição do glicerol e do gel de Aloe vera. A utilização de glicerol como agente plastificante
à solução filmogênica reduz a fragilidade do filme e aumenta a flexibilidade e a extensibili-
dade deste (REIS et al., 2015). Queiroz (2006) avaliou que o cálcio e potássio presentes no
gel de Aloe vera promovem a formação de uma rede de fibras, o que propicia uma melhoria
nas características mecânicas, como resistência e tração, de biofilmes à base de amido e
quitosana (KHOSHGOZARAN-ABRAS et al., 2012).

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O biofilme A1 (Figura 01) mostrou-se visualmente homogêneo, sem aspecto de olho
de peixe, com ausência de bolhas na superfície e boa flexibilidade (facilidade de manuseio
e ausência de rupturas e zonas quebradiças). O biofilme foi desprendido da placa Petri na
temperatura ambiente (25 ºC), com facilidade após secagem de 24 horas a 30 ºC, e não
apresentou aspecto pegajoso, o que facilitou sua modulação para confecção do protótipo do
biocanudo. A pegajosidade, segundo Raquez et al. (2008), pode ser adquirida por excesso
de componentes plastificantes na formulação. Para produção do protótipo, o biofilme foi
desprendido do molde, cortado em forma retangular e enrolado manualmente até obter o
formato do canudo (Figura 02).

Figura 01: Filmes formulados com diferentes concentrações de amido, glicerol e gel de Aloe vera. A1 - 10% de amido,
5% de glicerol e 10% de gel de Aloe vera; A2 - 5 % de amido, 3% de glicerol e 13% de gel de Aloe vera; A3 - 8% de amido,
1% de glicerol e 13% de gel de Aloe vera.

Figura 02. Biocanudo formulado com 10% amido, 5 % de glicerol e 10 % de gel de Alo vera.

O protótipo de biocanudo (Figura 02) teve sua solubilidade final de 36%, após 24
horas imersas em água. Costa et al. (2018) considera como baixa uma solubilidade de
14%, avaliando filmes biodegradáveis à base de amido de feijão macáçar-glicerol-quitosa-
na. Os protótipos desenvolvidos mostraram-se mais solúveis, no entanto o resultado não
teve influência no teste de integridade após o contato com bebidas comumente consumidas
(Figura 05). Características mais solúveis de compostos biodegradáveis em água tendem
a ser mais interessantes quando se leva em consideração que o atual canudo plástico é o
sétimo item mais coletado nos oceanos. Kocakulak et al. (2019), detectou solubilidade em

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filmes biodegradáveis elaborados com amido de grão de bico e glicerol variando entre 40 e
46%. Os autores observaram que, quanto maior a concentração do glicerol, maior a solubi-
lidade dos filmes, pois o glicerol aumenta o espaço livre ao interagir com a matriz do filme
facilitando a entrada de água, consequentemente aumentando a solubilidade.
O biocanudo (Figura 02) apresentou uma umidade de 31%. Segundo Jones et al.
(2013), a umidade interfere nas propriedades físicas de barreira do biocanudo. A umidade
deve estar menor que 40% para uma resistência mecânica satisfatória e não afetar o módulo
de elasticidade. Senhorinho (2015) encontrou valores de umidade de 29,57% em filmes à
base de amido de araruta plastificados com glicerol. Esses valores de umidade podem ser
atribuídos à concentração de glicerol, pois este interage com a matriz polimérica aumentan-
do o espaço livre entre as cadeias, promovendo assim uma maior absorção de umidade do
ar, contribuindo para o aumento do teor de umidade do biocanudo (SANTOS et al., 2016).
A solubilidade em ácido do biocanudo (Figura 02) foi de 100%. Segundo Fakhouri et al.
(2009), essa característica é importante em casos nos quais o canudo é consumido junta-
mente com o produto final, indicando sua solubilização no pH ácido do organismo humano
durante a digestão. O autor ao produzir bioplásticos à base de amido e gelatina detectou
uma solubilidade total em ácido.
Na análise de biodegradabilidade em solo não padronizado, verificou-se perda de massa
do biocanudo de 51%, 61% e 83% durante os períodos de 30, 60 e 90 dias, respectivamente.
Foi observada a presença de pontos escuros no biocanudo durante os estágios de biodegra-
dabilidade (Figura 03), provavelmente decorrentes da decomposição da matéria orgânica pela
ação de microrganismos. Esse comportamento também foi detectado por Santana (2013),
durante avaliação da biodegradabilidade de bioplásticos de amido da semente de jaca plas-
tificados com glicerol ou sorbitol, por um período de 90 dias. O processo de biodegradação
de biopolímeros depende da composição do polímero, das condições que esta exposto
(calor, umidade, radiação e nutrientes) e dos microrganismos que estão presente no solo
(MEDINA-JARAMILLO, 2017). Normatizações internacionais (ASTM D6400, ASTM D6868),
determinam que a decomposição de compostos biodegradáveis no solo deve ser comprovada
em um nível de biodegradabilidade superior a 90% em menos de 180 dias. Dessa forma,
pode-se afirmar que o biocanudo teve uma alta taxa de degradabilidade em solo.

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Figura 03. Protótipo degradado com 30 dias. A presença de pontos escuros decorrente da formação de colônias de
bactérias e fungos.

Visando simular a integridade do biocanudo, buscou-se avaliar o teste de integridade


frente ao consumo de bebidas não alcoólicas por categorias consumidas no Brasil, o qual
está atrelado à grande utilização de canudos de plástico (DIAS et al., 2015; PEREIRA, 2019).
Foram submetidas ao teste as bebidas: achocolatado, água de coco, Coca-Cola e suco de
laranja (Figura 04) A integridade do biocanudo também foi avaliada simulando o seu contato
com a saliva durante o consumo de bebidas e, para isso, os protótipos ficaram imersos em
saliva artificial (Formulize®).
O protótipo produzido apresentou-se consistente, maleável e íntegro até o tempo má-
ximo de 15 minutos estabelecido no ensaio quando inserido nos diferentes líquidos, nas
temperaturas ambiente (25 ºC), refrigerado (7 ºC) e bucal (36 ºC). O efeito foi reportado
em fotografias das amostras após a imersão nos meios para comparação (Figuras 05 e
06). O tempo médio de vida útil do canudo plástico é de 4 minutos, tempo inferior ao esta-
belecido para a simulação de utilização do biocanudo pelo consumidor (5,10 e 15 minutos).
Ensaios de integridade em condições de uso permitem avaliar o estado do biocanudo de
forma que nenhum fragmento de seu revestimento ou matriz se rompa ou se desintegre,
prejudicando sua funcionalidade (SILVA, 2011), em face ao exposto, os resultados obtidos
foram satisfatórios.

Figura 04. Biocanudo de 6 cm de comprimento em diferentes bebidas comumente consumidas; D- Água de Coco; E- Suco
de Laranja; F- Achocolatado; G- Coca-Cola.

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Figura 05. Análise da integridade do protótipo frente a bebidas comumente consumidas em temperatura ambiente (25
º C) e refrigerada (7 ºC).

Figura 06. Análise da integridade do protótipo frente à solução salivar artificial em temperatura bucal (36 ºC) e refrigerada
(7 ºC).

CONCLUSÃO

O amido mostrou ser uma matéria-prima promissora para produção de canudos biode-
gradáveis, podendo ter uso industrial pela vasta disponibilidade e baixo custo. A utilização
de glicerol com gel de Aloe vera pode auxiliar no aumento da flexibilidade e estrutura do
biocanudo. A solubilidade em ácido foi um fator positivo, pois comprovou a degradação do
biocanudo em ácido, simulando as condições do sistema digestório humano. A biodegradação
foi comprovada pela alta taxa de decomposição do biocanudo no período de 60 dias. O re-
sultado da solubilidade em água foi satisfatório visto que, na atualidade, grande parte do lixo
nos mares e oceanos são canudos plásticos. A umidade de 31% foi um fator positivo visando
a resistência mecânica e elasticidade do protótipo. Para o teste da integridade do biocanudo
em condições de uso em bebidas comumente consumidas (Achocolatado, Água de Coco,
Coca-Cola, Suco de Laranja) e em solução salivar artifical, o protótipo apresentou-se con-
sistente, maleável e íntegro até o tempo máximo de 15 minutos de imersão, uma vez que a
média de vida útil do canudo plástico é de 4 minutos. Dessa forma, esse trabalho comprova
que é possível o desenvolvimento de canudo biodegradável com base em biopolímeros, a
fim de reduzir os danos negativos causados à natureza e ao meio ambiente. Os estudos
preliminares apontam o biocanudo à base de amido e gel de Aloe Vera como alternativa

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a substituição da utilização dos canudos plásticos. Estudos sensoriais e de sucção seriam
novas sugestões para futuras pesquisas.

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