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Exercício sobre o filme “A vida dos outros”

O filme se utiliza de diversas técnicas narrativas, tais como a utilização de


figurinos da época que pretende retratar, as locações utilizadas, os objetos, enfim, toda
a caracterização visual da República Democrática Alemã dos anos 80. Além disso, a
própria trilha sonora é utilizada para produzir determinados efeitos, com uma junção
entre os sons da trilha e os sons produzidos pelos personagens durante as cenas.
É apresentado um período que marcou a história alemã, com a divisão do país
em duas partes: a socialista (oriental) e a capitalista (ocidental). As tensões entre o
mundo capitalista e o mundo socialista são retratados de modo a possibilitar ao
espectador conhecer melhor a Alemanha oriental da época da divisão.
Neste sentido, podem ser traçados paralelos entre a situação da Alemanha
Oriental durante a época da divisão e o Brasil da época da ditadura. Ambos os países
viviam regimes ditatoriais nos quais se deu a supressão de muitos direitos e garantias
individuais, tais como o direito à intimidade e à privacidade. São regimes que
desrespeitam os limites entre o público e o privado e consideram que aqueles que
“subvertem” a ordem estabelecida pelo Estado merecem ser investigados, presos,
torturados e mesmo mortos. A diferença fundamental talvez seja que, no Brasil, a
ditadura era militar, e buscava “defender” o País do socialismo; na Alemanha Oriental,
pelo contrário, a ditadura era civil, levada a cabo pelo Partido Comunista, e tinha por
objetivo “defender” o país da ameaça capitalista.
A estrutura narrativa do filme é basicamente dividida entre abordagens da vida
do casal formado pelo escritor Georg Dreyman e pela atriz Christa-Maria Sieland, de
um lado, e o trabalho do investigador Gerd Wiesler, encarregado por seu superior,
Anton Grubitz, de procurar encontrar algo que incrimine Dreyman. O chefe de Grubitz,
Bruno Hempf, Ministro da Cultura, se interessa por Christa e busca, assim, prejudicar
seu marido, Dreyman.
Quando, durante a investigação, Wiesler aponta em seu relatório que um carro
trouxe Christa até em casa, Grubitz descobre que a placa do carro pertencia ao
ministro Hempf, e ordena que Wiesler não inclua mais tal informação em seus
relatórios, já que os poderosos do partido não podem ser investigados.
Wiesler, no decorrer da investigação, começa a desenvolver uma certa
obsessão pela vida do casal que investiga e chega mesmo a interferir na vida dos dois,
como na cena em que propositadamente junta dois fios para dar um curto-circuito no
sistema da campainha da casa de Dreyman, o que faz com que ele desça até a rua e
veja sua esposa, Christa, sair do carro do ministro Hempf, que estava chantageando-a
em troca de favores sexuais. Wiesler interfere também no próprio local da investigação,
ao pegar um livro de Bertold Brecht para ler, que pertencia a Dreyman, sendo que este
nota a ausência.
O filme mostra não apenas aquilo que se passa de maneira “oficial”, mas o que
está por trás dos atos oficiais: as paixões que movem os homens, os desejos, as
vontades, as regras que não estão escritas (como a de que não se pode investigar os
oficiais de alta patente).
Wiesler se envolve emocionalmente com o casal que investiga, o que se
evidencia quando chora ao escutar Dreyman tocar a “Sonata para um homem bom” ao
piano após saber do suicídio de seu amigo Albert Jerska. O investigador chega até a se
encontrar pessoalmente com Christa, num bar próximo à casa deles. A conversa que
eles têm durante o encontro faz com que ela desista de se encontrar com o ministro
Hempf e volte para casa, o que Wiesler descobre no dia seguinte, através da leitura do
relatório do funcionário da Stasi, a polícia política da RDA, que o substitui no
revezamento da investigação.
Após um dos amigos de Dreyman ter seu apartamento investigado e ser
impedido de ir à Alemanha Ocidental para dar uma palestra, Dreyman resolve “testar”
seu próprio apartamento para saber se está sendo investigado. Após uma farsa com o
tio de um amigo, ele acha que o apartamento está limpo, porém Wiesler escuta tudo e
planeja o que vai fazer em seguida.
O filme faz o espectador atentar para detalhes importantes, como, por exemplo,
o pano no assento da cadeira, mostrado no começo por Wiesler para uma turma de
alunos como fundamental na investigação, para o uso com cães farejadores. O mesmo
pano não é colocado quand Wiesler vai até Grubitz para ser interrogado.
É mostrado também como algumas pistas podem, de maneira não-escrita,
apontar para informações que se podem depreender delas, tais como a tinta vermelha
contida no documento da investigação que Dreyman tem acesso após a queda do
Muro de Berlim e a união das duas Alemanhas.
A narrativa estabelecida pelo filme poder ser útil ao historiador de diversas
maneiras no momento em que este pretende contar uma história. Existem, portanto,
algumas lições que se podem depreender da estrutura narrativa apresentada pelo
filme.
Uma delas é a caracterização e a reconstituição da época retratada. Embora o
filme apresente tal caracterização de maneira visual e o historiador, via de regra,
produza sua narrativa através da escrita, a caracterização da época retratada é de
grande importância para a narrativa, independentemente do tipo de mídia utilizado.
Outro caractere marcante no filme é a apresentação dos diferentes pontos de
vista dos personagens apresentados: o ponto de vista do Estado, nas figuras do
ministro Hempf e do Anton Grubitz, o ponto de vista dos cidadãos investigados, na
figura do casal Dreyman e, numa espécie de meio termo, o ponto de vista do
investigador Gerd Wiesler, que, embora seja um integrante do aparato de repressão
estatal, se envolve com os investigados durante seu trabalho.

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