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Fichamento do prefácio e do capítulo 2 do livro “Futuro passado”, de Reinhart Koselleck

KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos.


Rio de Janeiro: Contraponto, 2006.

Prefácio

O questionamento realizado pela historiografia acerca do que seja o tempo histórico


busca respostas na teoria da história, pois as fontes não fornecem pistas quanto a tal
pergunta, e sim quanto a fatos, ideias, planos e acontecimentos (p. 13).

É necessária, portanto, a utilização de uma base teórica, pois as fontes do passado se


mostram insuficientes quanto a tal questionamento (p. 13).

Embora não seja necessário realizar o questionamento quanto ao tempo histórico durante
uma investigação histórica, é imprescindível uma datação exata (p. 13).

A cronologia, enquanto ciência auxiliar da história, não leva em conta as diferenças entre
calendários e maneiras de contar o tempo de diferentes povos e culturas: homogeniza-as
de acordo com seus pressupostos de um tempo “natural”, regido pelo nosso sistema
planetário e determinado pela física e pela astronomia (p. 13).

Para vislumbrar o tempo histórico é necessário observar os vestígios e manifestações da


passagem do tempo: pessoas, construções, meios de transporte (p. 13/14).

Não existe apenas um tempo histórico, mas muitos, que se sobrepõem uns aos outros. O
tempo histórico está ligado aos homens e instituições que o compõem; tais homens e
instituições estão em constante mutação e o mesmo se dá com o tempo histórico (p. 14).

A divisão do tempo natural, levada a cabo através da mensuração dos fatos naturais que
definem a passagem do tempo, é necessária para se tematizar o tempo histórico (temas
como a duração da existência de pessoas e instituições, acontecimentos políticos etc.) (p.
14/15).

Não é possível, no entanto, interpretar os fatos históricos a partir apenas de medições


temporais físicas e astronômicas; a interpretação de tais fatos conduz a uma
determinação temporal do ponto de vista histórico (p. 15).

No presente texto, serão analisados documentos que abordam a relação entre um


determinado passado e um determinado futuro, de forma explícita ou implícita (p. 15).

Tais documentos são produzidos desde a Antiguidade. O autor busca, assim, investigar a
maneira como, num determinado tempo presente, o aspecto temporal do passado
estabelece uma relação de reciprocidade com o aspecto temporal do futuro (p. 15).

O autor ventila a hipótese de que o tempo histórico se constitui a partir do processo de


estabelecimento da diferenciação entre passado e futuro (p. 16).

O aumento da ansiedade com relação ao futuro se dá em decorrência da formatação


cada vez mais técnica e industrial do mundo, o que dá menos tempo ao homem para se
adaptar às mudanças, que ocorrem de maneira cada vez mais rápida e frequente (p. 16).
O autor pretende, também, contribuir para o esclarecimento das condições de longa
duração que se mantém desde o passado (p. 16).

A metodologia empregada pelo autor é composta por investigações quanto à semântica


de conceitos fundamentais que perpassam a história. O próprio conceito de história é
analisado (p. 16/17).

Alguns dos conceitos analisados são os de revolução, acaso, destino, progresso e


desenvolvimento, capazes de complementar o conceito de história (p. 17).

Serão analisados também os aspectos semânticos de conceitos contidos em


Constituições de Estado e a mudança de sentido pela qual tais conceitos passam com o
tempo. Por fim, se tratará das categorias de tempo determinadas pela ciência (p. 17).

O objetivo das análises semânticas levadas a cabo pelo autor é o de compreender a


formatação linguística das experiências temporais ali onde elas se manifestam (p. 17).

A obra, composta de vários ensaios, é dividida em três partes, nas quais o autor se ocupa
de contrastar diferentes recortes semânticos, analisar algumas interpretações da teoria da
história e da historiografia e, por fim, de conceitos linguísticos e antropológicos (p. 17/18).

Parte I – Sobre a relação entre passado e futuro na história moderna

Capítulo 2 – Historia Magistra Vitae – Sobre a dissolução do topos na história


moderna em movimento

Friedrich von Raumer relata uma situação na qual mentiu para um oficial que queria
aumentar a impressão de papel-moeda para pagar as dívidas da Prússia. Raumer afirma
que já Tucídides advertira para o mal que se seguira em Atenas após a adoção de
medida semelhante (p. 41).

Raumer sabia que os antigos jamais conheceram o papel-moeda, mas recorre a tal
mentira para dissuadir o oficial de seu intento, seguro de que o oficial estava apegado ao
topos da história como mestra da vida (p. 41).

Durante aproximadamente 2 mil anos a história foi vista como uma escola, na qual se
podia aprender com o passado a não cometer os erros já cometidos anteriormente (p. 42).

O episódio narrado por Raumer confirma essa visão que se tinha da história, como um
saber apto a fornecer lições e que não deveria ser contestado (p. 42).

O topos da história como mestra da vida perdurou durante muito tempo, porém começou
a se desfazer com o advento da modernidade (p. 42/43).

Tal fórmula remete a uma interpretação da história como uma continuidade de


acontecimentos, apta a conduzir a um aperfeiçoamento moral e intelectual (p. 43).

I.

A expressão historia magistra vitae foi cunhada por Cícero, com base em ideais do
helenismo. Tal ideia de história tem por base a prática, que se exerce através da oratória,
com o objetivo de instruir os ouvintes (p. 43/44).
A influência de Cícero perdurou até o advento da historiografia cristã. Mesmo assim, sua
obra foi mantida em muitos mosteiros e utilizadas por diversos sábios da Igreja, tais como
Isidoro de Sevilha e Beda (p. 44).

Outro pensador, Melanchton, se utilizou também de ambas as históricas bíblicas e pagãs


para fazer menção aos preceitos divinos. A concepção antiga da utilidade da historiografia
enquanto instrução para o futuro a partir do passado permaneceu com o cristianismo (p.
44).

O final da Idade Média e início do Renascimento trouxe consigo uma revitalização dos
clássicos, tal como a levada a cabo por Maquiavel, que afirmava que os antigos deveriam
ser admirados e imitados. O topos da história como mestra da vida é então amplamente
revisitado e reproduzido até o Iluminismo tardio (p. 44/45).

No período do Iluminismo, as expectativas pedagógicas de uma época esclarecida são


aliadas à tarefa tradicional da história (p. 45).

Foi importante o papel instrutivo da história no início da Idade Moderna. Tanto no plano
intelectual quanto político, a história cumpria um função de fornecer exemplos que
deveriam ser comparados com o presente para o aperfeiçoamento do futuro (p. 45/46).

Frederico o Grande chega a afirmar, em suas memórias, que as cenas da história


universal se repetem e que basta mudar os nomes de seus protagonistas (p. 46).

Sempre houve, no entanto, pensadores que discordaram da afirmação de que é possível


aprender com a história: dentre eles, Guicciardini e Aristóteles (p. 46/47).

Tais vozes dissonantes, no entanto, não foram capazes de, às suas épocas, enfraquecer
a ideia de história como mestra da vida ou, ao menos, como fonte de sabedoria para
aqueles que sobre ela se debruçavam (p. 47).

Com o passar do tempo, no entanto, o topos em análise passou por um enfraquecimento


e teve seu sentido esvaziado, sendo que outros tempos e períodos de experiência
passaram a protagonizar o papel de exemplos em detrimento do tempo passado (p. 47).

II.

O pensador Alex de Tocqueville, cuja obra é permeada pela atenção dispensada à ruptura
que o advento da modernidade provoca com a temporalidade anterior, afirma que o
espírito humano adentra as trevas quando o passado não ilumina o futuro (p. 47/48).

O processo de esvaziamento de sentido do topos que vem sendo tratado se deu através
da chamada história dos conceitos (p. 48).
A própria diferenciação que se estabelece, na língua alemã, entre os vocábulos Historie e
Geschichte concorre para o esvaziamento do topos da história como mestra da vida (p.
48).

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