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Escola Secundária José Gomes Ferreira

Departamento de Línguas
Disciplina: Português Ano: 11.º

Ficha de Avaliação Sumativa – 3.º período

Nome: _________________________________________________________ N.º: ____ Turma: _____

Leia com atenção o seguinte texto.


CONTRARIEDADES
Eu hoje estou cruel, frenético, exigente; Receiam que o assinante ingénuo os abandone,
Nem posso já tolerar os livros mais bizarros. Se forem publicar tais coisas, tais autores.
Incrível! Já fumei três maços de cigarros Arte? Não lhes convém, visto que os seus leitores
Consecutivamente. 40 Deliram por Zacone.

5 Dói-me a cabeça. Abafo uns desesperos mudos: Um prosador qualquer desfruta fama honrosa,
Tanta depravação nos usos, nos costumes! Obtém dinheiro, arranja a sua «coterie»;
Amo, insensatamente, os ácidos, os gumes E a mim, não há questão que mais me contrarie
E os ângulos agudos. Do que escrever em prosa.

Sentei-me à secretária. Ali defronte mora 45 A adulação repugna aos sentimentos finos;
10 Uma infeliz, sem peito, os dois pulmões doentes; Eu raramente falo aos nossos literatos,
Sofre de faltas de ar, morreram-lhe os parentes E apuro-me em lançar originais e exactos,
E engoma para fora. Os meus alexandrinos...

Pobre esqueleto branco entre as nevadas roupas! E a tísica? Fechada, e com ferro aceso!
Tão lívida! O doutor deixou-a. Mortifica. 50 Ignora que asfixia a combustão em brasas,
15 Lidando sempre! E deve conta à botica! Não foge do estendal que lhe humedece as casas,
Mal ganha para as sopas... E fina-se ao desprezo!

O obstáculo estimula, torna-nos perversos; Mantém-se a chá e pão! Antes entrar na cova.
Agora sinto-me eu cheio de raivas frias, Esvai-se; e todavia, à tarde, fracamente,
Por causa de um jornal me rejeitar, há dias, 55 Oiço-a cantarolar uma canção plangente
20 Um folhetim de versos. Duma opereta nova!

Que mau humor! Rasguei uma epopeia morta Perfeitamente. Vou findar sem azedume.
No fundo da gaveta. O que produz o estudo? Quem sabe se depois, eu rico e noutros climas,
Mais uma redação, das que elogiam tudo, Conseguirei reler essas antigas rimas,
Me tem fechado a porta. 60 Impressas em volume?

25 A crítica segundo o método de Taine Nas letras eu conheço um campo de manobras;


Ignoram-na. Juntei uma fogueira imensa Emprega-se a réclame, a intriga, o anúncio, a blague,
Muitíssimos papéis inéditos. A imprensa E esta poesia pede um editor que pague
Vale um desdém solene. Todas as minhas obras

Com raras excepções merece-me o epigrama. 65 E eu estou melhor; passou-me a cólera. E a vizinha?
30 Deu meia-noite; e em paz pela calçada abaixo, A pobre engomadeira ir-se-à deitar sem ceia?
Soluça um sol-e-dó. Chuvisca. O populacho Vejo-lhe luz no quarto. Inda trabalha. É feia...
Diverte-se na lama. Que mundo! Coitadinha!

Eu nunca dediquei poemas às fortunas,


Mas sim, por deferência, a amigos ou artistas.
35 Independente! Só por isso os jornalistas
Me negam as colunas.
Cesário Verde . O Livro de Cesário Verde. Assírio & Alvim.

Docente: Margarida Espiguinha -1- Ano Lectivo: 2010/2011


GRUPO I – 120 pt

Apresente, de forma bem estruturada, as suas respostas ao questionário.

1. Caracterize o estado psicológico do sujeito poético.


1.1. Explicite os motivos subjacentes a esse estado psicológico.

2. Delimite o texto em partes lógicas, explicitando o conteúdo de cada uma delas.

3. Verificamos que o poema apresenta, alternadamente, as situações do sujeito lírico e da


engomadeira. Complete o seguinte esquema abaixo:

SITUAÇÃO PSICOLÓGICA E SOCIAL


Sujeito Poético Engomadeira

4. Comente o efeito expressivo da imagem presente no verso «Pobre esqueleto branco entre as
nevadas roupas» (v.13)

5. Explique o paralelo que se pode estabelecer entre a actividade do sujeito poético e o cantar do
«populacho».

6. Refira os principais alvos da crítica social feita por parte do sujeito lírico.

NOTAS:
adulação (v.45): elogio interesseiro, graxista
blague (v.62): história inventada, piada, conversa.
botica (v.15): farmácia
coterie (v.42): grupo de pessoas unidas na defesa de interesses comuns.
deferência (v.34): delicadeza
epigrama (v.29): pequeno poema com tema festivo ou satírico
letras (v.61): universo literário
lidando (v.15): trabalhando
plangente (v.55): triste
tísica (v.49): tuberculosa
réclame (v.62): promoção
sol-e-dó (v.31): música de filarmónica de província, de baixa categoria
Taine (v.25): filósofo francês positivista.
Zacone (v.40): romancista francês popular, autor de novelas e folhetins.

Docente: Margarida Espiguinha -2- Ano Lectivo: 2010/2011


GRUPO II – 30 pt

Tendo em conta a leitura da obra Os Maias, de Eça de Queirós, verifique o grau de conhecimento que
possui sobre a obra.

1. Leia, atentamente, o texto a seguir transcrito.

Os Maias, um romance masculino


A presença masculina é avassaladora n'Os Maias. Ocupam os homens maior espaço, quantitativa e
qualitativamente. O foco narrativo, por exemplo, quase nunca se fixa na consciência de mulher alguma e sempre as
conhecemos através do seu discurso ou do seu agir, de outras personagens ou do olhar omnisciente do narrador que,
eventualmente, nelas se detém. É o ponto de vista masculino dominante. É possível conhecer-se intimamente o
5 interior de Carlos, de Ega, até Afonso ou de um outro frequentador do Ramalhete. Mas a Gouvarinho, a Raquel, e
mesmo a própria Maria Eduarda, nós somente as vemos de fora. […]
Mostrando o casamento português na burguesia e na nobreza, como resultado de arranjos económicos – é o caso
dos Gouvarihos, entre outros, no qual o marido contribui com o sangue nobre, o título histórico, e ela com a fortuna do
pai comerciante – Eça de Queirós critica o matrimónio burgês. Em muitos casos não passa de uma farsa, sendo o
10 casamento uma instituição minada e que se nega a si mesma, uma das causas e um dos frutos da decadência social
e moral do País, num círculo vicioso.
Como são outros casamentos presentes nos textos de Eça de Queirós e ainda não referidos? Eusebiozinho, no
fim d'Os Maias, surge-nos ainda mais fúnebre, ainda mais tísico, “dando o braço a uma senhora muito forte”. Continua
“descaído e molengo”, apenas agora caminha ao lado da avantesma da mulher que – ao que parece – o derreira à
15 pancada. É a conclusão da sua vida de solteiro despendida pelos lupanares.
O Dâmaso, ainda n'Os Maias, casa-se também. O seu dinheiro alcança obter uma das filhas dos condes de
Águeda, uma gente arruinada. Constituíra-se, o Dâmaso, em “verdadeira sorte grande para aquela distinta família”,
explica Ega a Carlos. E acrescenta: a mulher “faz aí a felicidade de um rapazote simpático, chamado Barroco”.
Assim, ou o casamento como um acordo comercial, em que se troca dinheiro por um título histórico, ou o
20 adultério.
Beatriz Berrini, Portugal de Eça de Queirós, INCM, 1984

1. Para cada um dos quatro itens que se seguem, indique a letra correspondente à alternativa correcta,
de acordo com o sentido do texto.

1.1. Ao afirmar, relativamente às personagens femininas d'Os Maias, que “somente as vemos de fora”
(l.6), a autora quer dizer:
A. que só conhecemos o seu aspecto físico.
B. que o seu ponto de vista nunca é transmitido.
C. que as observamos sempre a agir em sociedade.
D. que as olhamos sempre pelos olhos das outras personagens.

1.2. A expressão “círculo vicioso” (l.11), significa que o matrimónio burguês”:


A. se repete indefinidamente.
B. resulta de uma sociedade minada por vícios.
C. é, simultaneamente, causa e consequência da degradação social.
D. impede as ligações sentimentais.

Docente: Margarida Espiguinha -3- Ano Lectivo: 2010/2011


1.3. Na oração “sendo o casamento uma instituição minada”, (l.10) o constituinte sublinhado é
A. complemento directo..
B. o sujeito.
C. o nome predicativo do sujeito.
D. o complemento indirecto.

1.4. A expressão entre travessões “ – ao que parece – “ (l.14) transmite


A. uma probabilidade.
B. o ponto de vista da autora.
C. uma explicação.
D. uma comparação.

GRUPO III – 50 pt

1. Tenha em atenção a seguinte afirmação:


“A poesia de Cesário Verde revela a sua faceta de um observador atento da realidade da sua época.”

Partindo da afirmação acima transcrita e evocando leituras feitas nas aulas, elabore um texto
expositivo, entre oitenta a cento e trinta palavras, onde esclareça a faceta de Cesário Verde como o
poeta-repórter da cidade.

Docente: Margarida Espiguinha -4- Ano Lectivo: 2010/2011

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