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Departamento de Línguas
Disciplina: Português Ano: 11.º
5 Dói-me a cabeça. Abafo uns desesperos mudos: Um prosador qualquer desfruta fama honrosa,
Tanta depravação nos usos, nos costumes! Obtém dinheiro, arranja a sua «coterie»;
Amo, insensatamente, os ácidos, os gumes E a mim, não há questão que mais me contrarie
E os ângulos agudos. Do que escrever em prosa.
Sentei-me à secretária. Ali defronte mora 45 A adulação repugna aos sentimentos finos;
10 Uma infeliz, sem peito, os dois pulmões doentes; Eu raramente falo aos nossos literatos,
Sofre de faltas de ar, morreram-lhe os parentes E apuro-me em lançar originais e exactos,
E engoma para fora. Os meus alexandrinos...
Pobre esqueleto branco entre as nevadas roupas! E a tísica? Fechada, e com ferro aceso!
Tão lívida! O doutor deixou-a. Mortifica. 50 Ignora que asfixia a combustão em brasas,
15 Lidando sempre! E deve conta à botica! Não foge do estendal que lhe humedece as casas,
Mal ganha para as sopas... E fina-se ao desprezo!
O obstáculo estimula, torna-nos perversos; Mantém-se a chá e pão! Antes entrar na cova.
Agora sinto-me eu cheio de raivas frias, Esvai-se; e todavia, à tarde, fracamente,
Por causa de um jornal me rejeitar, há dias, 55 Oiço-a cantarolar uma canção plangente
20 Um folhetim de versos. Duma opereta nova!
Que mau humor! Rasguei uma epopeia morta Perfeitamente. Vou findar sem azedume.
No fundo da gaveta. O que produz o estudo? Quem sabe se depois, eu rico e noutros climas,
Mais uma redação, das que elogiam tudo, Conseguirei reler essas antigas rimas,
Me tem fechado a porta. 60 Impressas em volume?
Com raras excepções merece-me o epigrama. 65 E eu estou melhor; passou-me a cólera. E a vizinha?
30 Deu meia-noite; e em paz pela calçada abaixo, A pobre engomadeira ir-se-à deitar sem ceia?
Soluça um sol-e-dó. Chuvisca. O populacho Vejo-lhe luz no quarto. Inda trabalha. É feia...
Diverte-se na lama. Que mundo! Coitadinha!
4. Comente o efeito expressivo da imagem presente no verso «Pobre esqueleto branco entre as
nevadas roupas» (v.13)
5. Explique o paralelo que se pode estabelecer entre a actividade do sujeito poético e o cantar do
«populacho».
6. Refira os principais alvos da crítica social feita por parte do sujeito lírico.
NOTAS:
adulação (v.45): elogio interesseiro, graxista
blague (v.62): história inventada, piada, conversa.
botica (v.15): farmácia
coterie (v.42): grupo de pessoas unidas na defesa de interesses comuns.
deferência (v.34): delicadeza
epigrama (v.29): pequeno poema com tema festivo ou satírico
letras (v.61): universo literário
lidando (v.15): trabalhando
plangente (v.55): triste
tísica (v.49): tuberculosa
réclame (v.62): promoção
sol-e-dó (v.31): música de filarmónica de província, de baixa categoria
Taine (v.25): filósofo francês positivista.
Zacone (v.40): romancista francês popular, autor de novelas e folhetins.
Tendo em conta a leitura da obra Os Maias, de Eça de Queirós, verifique o grau de conhecimento que
possui sobre a obra.
1. Para cada um dos quatro itens que se seguem, indique a letra correspondente à alternativa correcta,
de acordo com o sentido do texto.
1.1. Ao afirmar, relativamente às personagens femininas d'Os Maias, que “somente as vemos de fora”
(l.6), a autora quer dizer:
A. que só conhecemos o seu aspecto físico.
B. que o seu ponto de vista nunca é transmitido.
C. que as observamos sempre a agir em sociedade.
D. que as olhamos sempre pelos olhos das outras personagens.
GRUPO III – 50 pt
Partindo da afirmação acima transcrita e evocando leituras feitas nas aulas, elabore um texto
expositivo, entre oitenta a cento e trinta palavras, onde esclareça a faceta de Cesário Verde como o
poeta-repórter da cidade.