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Do desenvolvimento desigual e combinado à dependência: perspectivas


revolucionárias no Brasil na crise do capitalismo agonizante
Este artigo é dedicado a Leon Trotsky, nos 80 anos de seu assassinato no México, pela polícia secreta da
burocracia stalinista.
MARCOS DILIGENTI E RICARDO SOUZA
19 AGO 2020, 17:46

Dois dos mais importantes revolucionários do século XX viveram em épocas históricas, continentes e
conjunturas diferenciadas, mas apresentaram similaridades nas suas práxis revolucionárias, com
expressivas contribuições políticas para os períodos de sua militância e necessárias ressignificações
para a atualidade.

Para além de estarem na linha de frente dos processos de transformação de seu tempo, ambos
mantiveram a coerência e firmeza nas suas elaborações teóricas  em defesa do socialismo
internacionalista. Por esta razão, o seu legado foi , muitas vezes,  distorcido ou apagado dos registros
históricos por alguns setores dogmáticos e burocráticos da esquerda internacional. No entanto, as suas
ideias seguem vivas e imprescindíveis para enfrentar os desafios presentes na crise estrutural do capital
no século XXI.

Leon Trotsky foi um dos principais líderes da Revolução Russa de 1917, fundador da IV


internacional, combateu até o fim de seus dias a burocratização do Estado Soviético. A tese da
“Revolução Permanente”, o ‘Desenvolvimento Desigual e Combinado”(DDC), o “Programa de
Transição” e a “ A Revolução Política” contra o “Estado Operário Burocratizado”, são as suas
contribuições mais marcantes ao marxismo revolucionário e permanecem, na agenda atual, como
instrumentos indispensáveis para a interpretação e transformação da realidade, no movimento
emancipatório da classe trabalhadora .

Ruy Mauro Marini, militante brasileiro, fundou a escola da “Teoria Marxista da Dependência”


(TMD) junto com demais expoentes como Vânia Bambirra, Theotônio dos Santos e Gunder Frank. Foi
integrante da POLOP (Política Operária) no Brasil e em seu período de exílio no Chile da Unidade
Popular (1970/1973), foi membro do comitê central do MIR (Movimento de Izquierda
Revolucionária). Tal Escola interpreta o desenvolvimento capitalista nas economias dependentes, “ex-
colônias” exportadoras de matérias primas e  suas leis econômicas tendenciais próprias, tais como, a
“Transferência de Valor”, a “Superexploração da força de trabalho” e o “Subimperialismo”.

Ambas propostas teóricas têm importantes pontos de convergência e diálogo  nas suas contribuições,
que merecem ser retomadas, em especial o Desenvolvimento Desigual e Combinado e a Dependência.
Deve-se destacar que, tanto Trotsky como Marini, enfrentaram o “expurgo”  como sujeitos políticos,
em consequência  suas ideias.

Pode-se afirmar que  esses militantes  cumpriram papéis fundamentais em momentos decisivos da
história e ambos viveram  situações contrarevolucionárias agudas no século XX, a saber : a ascensão
do Nazifascismo (Trotsky) e os golpes militares no Cone Sul , a partir da década de 60 (Marini), nas
quais assumiram  importantes posicionamentos políticos.

Este artigo objetiva retomar algumas  bases teóricas e políticas destas duas vertentes, simbolizadas por
estes dois autores e suas  obras, que contribuem para a compreensão e o enfrentamento de classe da
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realidade social Brasileira na atualidade.

 Da Totalidade Dialética à Revolução  Permanente

Dentro os inúmeros quadros do pensamento marxista do  século XX que enfrentaram diferentes
conjunturas históricas, poucos compreenderam a lógica dialética como  Leon Trotsky. Ainda  jovem, 
liderou o maior organismo de poder dos trabalhadores russos, o Soviet de Petrogrado e passou a
compor,  junto  com Vladimir Lênin, o núcleo dirigente bolchevique que arquitetou a tomada do poder,
na Revolução de outubro de 1917.

A experiência das “três revoluções russas”: o Ensaio Geral de 1905 (reprimido fortemente pelo
exército tzarista) , a Revolução democrática de Fevereiro de 1917 (que  derrubou o tzarismo e colocou
o governo provisório liderado por Kerensky no poder) e, finalmente, a Revolução Socialista de
Outubro  de 1917 (que por meio de um processo revolucionário insurreicional inaugurou um estado
genuinamente gerido pela classe traballhadora),  permitiram a Trotsky maturar a sua concepção 
teórica. Esta, já havia sido desenvolvida  anos antes em sua obra “Balanços e Perspectivas” (1906) e
teve a sua sistematização consolidada com os conceitos apresentados, tanto no livro “Revolução
Permante”(1929), quanto em sua em sua célebre obra, escrita já em seu exílio: “A História da
Revolução Russa” (1-A derrubada do tzarismo; 2-A tentativa de Contra-Revolução; 3-O Triunfo dos
soviets).

Deve-se observar que havia, na transição  do século XIX para o XX, a  ideia de que as revoluções
primeiro chegariam às grandes potências  industriais ocidentais, em  virtude do  desenvolvimento das
forças produtivas nestes países, para depois atingirem os demais regiões. É nesse contexto que  o
aporte de Trotsky na lei do DDC adquire uma importância ímpar na interpretação e transformação das
táticas revolucionárias.

A contribuição teórica do “Desenvolvimento Desigual e Combinado”, consiste no princípio da não-


linearidade do  desenvolvimento  histórico e socioeconômico, que pelo  contrário, ocorre aos ‘saltos’,
como  prevê a lógica dialética, com o acúmulo de contradições,  em que determinadas quantidades
resultam em uma mudança qualitativa. Dito de outra forma, na igualmente célebre frase de Trostsky:
“A revolução é impossível, enquanto não for inevitável”.  Novack (1968) afirma como a lei científica
mais abragente do processo histórico, com caráter dual, as suas distintas proporções no crescimento da
vida social, bem como, a correlação concreta destes fatores desigualmente desenvolvidos no processo
histórico.

Esta Lei  dual permite aferir que o  chamado “progresso  humano” ao  dominar as forças  produtivas
naturais não é um processo  linear , delimitado em etapas,  já que diferentes padrões de
desenvolvimento coexistem e  se determinam mutuamente. Trotsky detalha em “A História da
Revolução Russa”(1977 p. 30):

“A desigualdade do ritmo, que é a lei mais geral do processo histórico, manifesta-se com o máximo de
vigor e de complexidade nos destinos dos países atrasados. Sob o açoite de necessidades exteriores, a
vida retardatária é constrangida a avançar por saltos. Desta lei universal da desigualdade dos ritmos
decorre uma outra lei que, na falta de uma denominação mais apropriada, chamaremos lei do
desenvolvimento combinado, no sentido da reaproximação de diversas etapas, da combinação de fases
distintas, do amálgama de formas arcaicas com as mais modernas”

 Segundo Lowy (1998), esta perspectiva revoluciona a concepção de civilização  no pensamento 


marxista, por instituir uma correta apreensão da totalidade dialética. Consiste ainda em uma

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perspectiva genuína, ao romper com o  paradigma evolucionista e eurocêntrico da história, herdado do 
positivismo, então impregnado no próprio  movimento operário.

Justamente devido ao  atraso  econômico e político na Rússia, criou-se contradições que abriram
espaço para um processo  revolucionário. Coexistia o mais moderno maquinário  industrial com o mais
os mais primitivos modos de vida ao longo do seu território.  Coexistia uma estrutura de poder
monárquica e feudal e, simultaneamente, uma moderna relação de assalariamento capitalista. 

Desta coexistência do  arcaico e do moderno, Trotsky concluiu que a  revolução  teria de combinar as
“tarefas democráticas” (derrubar do tzar, partilha da terras, etc) e as medidas socialistas (expropriação
da burguesia), em um processo de revolução permanente. Segundo Lowy (1998) esta concepção 
permite teorizar a movimentação revolucionária para todos países periféricos. Pois nestes países não 
houve revoluções democrático-burguesas, e a  burguesia já não  atenderia as mínimas bandeiras
liberais consolidadas nos países centrais, cabendo aos trabalhadores transitarem da revolução
democrática para a revolução socialista.

Portanto, segundo  Júnior e Lopes (2016), a estratégia pautada na Lei do Desenvolvimento Desigual e
Combinado, enxergando o funcionamento global do capital de modo dialético, colocou no centro da
ação dos trabalhadores a possibilidade e a necessidade de realizar de imediato, nos países dependentes,
um processo de ruptura com o capitalismo, e o prosseguimento  da construção  do  socialismo
internacionalista, para assim,  dinamitar  a cadeia imperialista do  capital. Ou ainda: a cadeia do capital
se romperia em seu elo mais frágil.

Importa saber, no desenrolar deste processo histórico,   que mesmo  após a  vitória da Revolução
Russa, um país periférico no mercado mundial, a III Internacional,  então já degenerada pelo
stalinismo , orientava os partidos comunistas da América Latina e do resto do mundo,  e desde a
primeira metade do século XX buscava realizar alianças com setores da burguesia nacional, visando
desenvolver as forças produtivas locais (Júnior e Lopes, 2016).

Do DDC na União Soviética à  Dependência na América Latina

Pode-se inferir que também na história pregressa, o Desenvolvimento  Desigual e Combinado,


exemplifica concretamente o processo de invasão das Américas:

“Encontraram-se ali duas rotas de evolução social completamente separadas, produtos de dez a vinte
mil anos de desenvolvimento independente nos dois hemisférios. Ambas se viram obrigadas a
comparar suas proporções de crescimento e a medir seus respectivos resultados globais. Esta foi uma
das mais marcantes confrontações de diferentes culturas em toda a história. A caça e a guerra, o arco e
a flecha tiveram que competir com o mosquete e o canhão; na agricultura, a enxada e o bastão, com o
arado e os animais de tração; no transporte aquático, a canoa com o navio; na locomoção terrestre, as
pernas humanas com o cavalo e os pés descalços com a roda. Na organização social, o coletivismo
tribal contra as instituições e costumes feudal-burgueses; a produção para o consumo imediato da
comunidade contra uma economia monetária e o comércio internacional” (NOVACK, 1968 p: 8)

Evidenciou-se neste processo de invasão, pilhagem e escravização dos povos americanos (assim como
os africanos e asiáticos), a esmagadora desigualdade das forças produtivas e, portanto, destrutivas, que
contribuíram para acumulação primitiva de capital. O ouro e as pratas da Latino América financiaram
a  industrialização capitalista, tal como  conhecemos hoje.

Em  uma  conjuntura pós-segunda guerra mundial e de  crescimento dos  projetos nacional-
desenvolvimentistas na América Latina surgiu a “Escola da Dependência”, desenvolvida por autores

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brasileiros e latino americanos ao longo das décadas de 60 e 70 do século passado, em  oposição aos
pressupostos desenvolvimentistas defendidos pela CEPAL.

Esta teoria procurou superar uma visão marxista dogmática, portanto não-dialética e etapista, que
classificava países como o Brasil, que vivia um processo de industrialização, em um patamar de país
“semi-feudal”, perspectiva esta  corroborada pelo  stalinismo  e reproduzida à época pelo PCB.

Estes fatores embasam uma corrente interpretativa desenvolvida a partir da década de 60, por Ruy
Mauro Marini, Vânia Bambirra, Theotônio Santos, Gunder Frank, Jaime Osório, entre outros
intelectuais/militantes latino-americanos que , a nosso ver se relacionam diretamente com a lei do
DDC de Trotsky : a Teoria Marxista da Dependência.

Esta teoria, segundo Luce (2018), é um desdobramento da Teoria do Valor em Marx e da teoria do
Imperialismo em Lênin para a compreensão da formação econômico-social dos países dependentes na
dinâmica internacional do capital.

Em “A Dialética da Dependência” (1973), Marini, retomou os fundamentos da crítica da economia


política marxista e, a partir destes, elaborou leis tendenciais próprias das economias dependentes,
desafiando pretensos dogmas daquele período.

No caso Latino Americano e Brasileiro , uma vez emancipado do caráter formal de colônia, dado o 
caráter agro-exportador de suas economias e sua inserção na divisão internacional do  trabalho, 
converteram-se em “países dependentes” no mercado mundial .

Para Gunder Frank (1973), o subdesenvolvimento dos países da América Latina se dava, justamente
determinado pelo desenvolvimento do capitalismo mundial, e não pela falta ou por uma deformação
deste nos países dependentes, posto que, o subdesenvolvimento e a dependência são funcionais à
própria dinâmica central do capital.

Assim que se constituiu mercado  mundial, as grandes potências financeiro- industriais assumiram
papel imperialista sobre os países dependentes, delegando a estes países a tarefa de exportar matérias-
primas, agropecuárias e minerais, e importar  os  produtos manufaturados das potências centrais. Este
processo gerou uma  balança comercial   intrinsecamente desigual, com o estabelecimento de uma
significativa transferência de valor (Marini, 2005).

As mercadorias produzidas pelas economias dependentes às potências  imperialistas podem nesta


relação desigual ser identificadas como a transferência de valor, da economia dependente para a
economia central. Com o advento do  capitalismo monopolista e da fusão do  capital industrial e
bancário, as potências imperialistas exportam além de manufaturados, capitais na forma de
investimentos  e recolhem juros e dívidas  nas economias dependentes.

Esta tendência, em especial,  confirma a hipótese de Trotsky, da coexistência  entre as formas de


produção e reprodução social arcaicas e modernas, que se reproduzem sob novas dinâmicas entre
economias dependentes e imperialistas.

Para contrarrestar o caráter desigual no mercado externo e o atraso na produção, a acumulação


capitalista dependente lança mão do expediente da superexploração da força de trabalho,  que pode
ser definida como o  desgaste   mais acentuado da força de trabalho para além da exploração 
capitalista convencional( LUCE,2018).

Desta maneira, a superexploração combina o prolongamento da jornada e da intensidade do desgaste


físico e mental do trabalho, bem  como  com a menor remuneração da força de trabalho, para além dos
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mecanismos de mais-valia absoluta e relativa presentes no capitalismo de forma geral:

é o valor da força de trabalho que se remunera abaixo de seu valor, o que não ocorre em relação a
outras mercadorias. Isso está relacionado à particularidade dessa mercadoria, que não apenas cria
valor, que gera valorização, mas também permite, por meio de prolongamentos da jornada de trabalho,
da intensificação do trabalho ou por salários abaixo do valor da força de trabalho, elevar a taxa e a
massa de mais-valia, sem alterar a composição orgânica do capital, e tudo isso sem pressionar para
baixo a taxa de lucro. (OSÓRIO, 2018, p. 495).

Enquanto a elevação da produtividade e da composição orgânica acionam a tendência à queda da taxa


de lucro, via de regra, só resta ao capital dependente remunerar a força de trabalho abaixo do valor,
característica fundamental desta forma particular de capitalismo integrada ao mercado mundial.
Portanto, não é um fenômeno conjuntural, nem uma anomalia fruto de um suposto “atraso
civilizatório”  é antes de mais nada, um mecanismo de proteção da taxa de lucro capitalista no cenário
internacional.

Essa perspectiva é corroborada no momento em que  a mais-valia relativa, nestes parâmetros assume a
preponderância na acumulação capitalista nas economias centrais, a medida que se eleva a oferta
mundial de alimentos produzidos nas economias periféricas, reduzindo o valor médio da força de
trabalho nas economias centrais (MARINI, 2005).

Neste sentido, às economias dependentes, em especial as latino-americanas, é atribuído pela divisão


internacional do trabalho o papel de abastecer as economias centrais com produtos alimentícios ,
produzidos e barateados pelas economias dependentes, que levam à desvalorização real da força de
trabalho nos países centrais, portanto deslocam o eixo de acumulação da mais-valia absoluta para a de
mais-valia relativa (MARINI, 2005).

      Neste sentido a TMD esclarece o papel nefasto que a dependência assume, não só para a classe
trabalhadora dos países periféricos, mas também para os trabalhadores das economias centrais. Nesta
perspectiva é importante destacar que a superexploração das classes trabalhadoras nos países
periféricos contribui decisivamente para a exploração destas classes nos países centrais.

Daí infere-se que o enfrentamento de classes, na perspectiva de emancipação proletária, necessita


inexoravelmente de uma perspectiva internacionalista de superação do modo de produção e
reprodução capitalista, portanto, não  há possibilidade de um desenvolvimento capitalista
“independente”, assim como não há a possibilidade de “socialismo em um só país”.

A garantia de democracia, direitos sociais e soberania nacional em paíeses dependentes só ´pode ser
atingida por meio da luta contra o capital e o imperialismo, em acordo com as teses da Revolução
Permanente, de modo à transitar das bandeiras democráticas para as bandeiras revolucionárias
socialistas.

Convergências e divergências: a materialidade da totalidade dialética

Dadas as similaridades  destas perspectivas  teóricas é de  se imaginar  pontos de  convergência e
divergência,  bem  como influências entre estas escolas do  pensamento marxista. Destaca-se:

a)   o  rigor  no método dialético  na busca da totalidade concreta e de suas contradições;

b) o estudo acurado da acumulação  de capital nos marcos do imperialismo;

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c) o  compromisso  militante de  construção de processos de libertação nacional e de solidariedade


internacionalista ativa,

Por fim,cabe ainda destacar o histórico de combate às expressões contra- revolucionárias de cada
período histórico, seja o no ascenso do nazifascismo na Europa ou nas ditaduras no Cone Sul ao ser
constatados  os erros políticos e a proposição de  frentes  unitárias, em certos casos sem preservar a 
sua independência política,

 Como coloca Trotsky em “Revolução e Contrarevolução na Alemanha” (1934), em que explicita a 


falha  da III Internacional Comunista ao  negar a unidade com a social-democracia contra o Nazismo. 
Por outro lado, Marini, então  liderança do MIR no Chile, em “Reformismo e
Contrarrevolução”(1973)  aponta  o equívoco do Partido Comunista e da Unidade Popular em insistir
na conciliação com a burguesia, que trouxe o enfraquecimento de uma possível radicalização de um
processo revolucionário autêntico.

No  entanto, destaca Luce (2018) que estas duas vertentes operam em diferentes “níveis de abstração”,
e que não é possível relacioná-las. Sendo  o DDC   um nível de abstração mais amplo, sobre a
desigualdade do  ritmo dos processos  históricos , enquanto a TMD operaria nos desdobramentos da lei
do  valor no  processo de formação  do  mercado mundial e na integração  dos processos produtivos,

 Partindo  desta perspectiva, cientes que ambas as teorias tem diferenças de  objetos em exame e
contribuições originais ao marxismo, pode-se opor a este argumento com a visão de Osório (2012): “os
níveis de análise, por mais que  haja diferentes escopos de abstração e  concretude, bem como
categorias  próprias, se inter-relacionam no  corpus teórico que constituem”.

Sobre as aproximações e diferenças entre ao DDC e a TMD, autores como Mantega (1982), Chilcote
(2012), Guimarães Júnior e Lopes (2016) e Lignani (2019) sinalizam para a relação entre estas duas
escolas .

Guido Mantega (1982), é o primeiro  que sugere a  similaridade da teoria do desenvolvimento desigual
e combinado de Trotsky, em relação à obra de Marini e Theotônio. Marini afirmou ser evidente a
influência trotskista, ainda que minoritária, na Polop, organização  que  fez parte, principalmente  pela 
influência de militantes argentinos, como Silvio Frondizi (Chilcote, 2012).

Neste período, Silvio dirigia (década de 1960) a Práxis, uma organização trotskista argentina da qual 
fez parte Nahuel Moreno, que seria uma das grandes lideranças da IV internacional na América Latina.

Guimarães Júnior e Lopes(2016)  apontam que independente da influência trotskista , se o


desenvolvimento desigual e combinado  vem sendo  retomado por outros termos, em outros contextos
históricos, por outros marxistas,  comprova-se a veracidade e contemporaneidade material desta teoria,
aliada à necessidade  de seguir a análise e a intervenção na realidade nestes marcos.

Por fim, Lignani (2019) reconhece elementos de convergência e diferenças nestas duas escolas, e cada
qual  com importantes contribuições. Destaca a preocupação de ambas com o  estudo acurado da
realidade do capitalismo periférico e o não-monopólio dos aparelhos comunistas “oficiais”,
principalmente na crítica ao etapismo e ao pensamento dualista. 

O autor resgata a contribuição  dos trotskistas brasileiros Mário Pedrosa e Lívio Xavier, ainda nas
décadas de 1930 e 1940  por meio de seu jornal “Orientação Socialista” , no  qual  antecipam análises
e posições políticas que seriam defendidas por Marini, décadas depois como a crítica ao  nacional-
desenvolvimentismo. A saber, a ação  do  imperialismo que impediria um desenvolvimento capitalista

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independente  com  apoio da burguesia nacional e, portanto a necessária ação  independente da classe
trabalhadora  para conquistar a democracia e a soberania nacional e lutar pelo sociaismo.

5. Considerações finais

A retomada destas duas importantes vertententes do  pensamento  marxista é fundamental para  uma
elaboração crítica da contingência  histórico-concreta que  vivemos no  Brasil.  Independente dos
muitos acordos e talvez alguns desacordos na obra de Trotsky e Marini, podemos concluir a
concretude objetiva e complementar da Dependência e do Desenvolvimento Desigual e Combinado,
podendo ser diferentes expressões de um fenômeno real ao qual estas teorias  podem dialogar com
uma perspectiva revolucionária para o Brasil.

Atualmente , o Brasil  vive  sob um  capitalismo  dependente e  rentista, com  um governo  autoritário
e genocida, diante da maior crise social  econômica e sanitária, em que se aprofunda a superexploração
da força de  trabalho em todos os ramos. Uma análise classista desta conjuntura requer um balanço 
crítico das experiências reformistas e desenvolvimentistas, pois nem nas economias centrais foi
possível preservar o “Bem-Estar Social” e a superação do capitalismo dependente.  A conjuntura de
pandemia  dificulta grandes aglomerações mas, vem trazendo a tona importantes lutas pontuais:
feministas,  antirracistas, dos trabalhadores de aplicativos, profissionais da saúde , do  transporte
público, entre outras. A  luta imediata tem o intuíto de frear a agenda neoliberal e a pauperização da
vida dos trabalhadores, com políticas de renda básica e garantia dos empregos no Brasil.

 Deve-se observar que classe dominante está unificada na agenda neoliberal, mas dividida no apoio às
ameaças  às liberdades democráticas  e às instituições republicanas empreendidas pelo Governo
Bolsonaro.

Evidentemente  unidades pontuais em defesa das liberdades democráticas serão bem-vindas, mas os
problemas da classe trabalhadora, que por óbvio, não se limitam aos arroubos autoritários do ex-
capitão ou da necessidade de um “gestor competente” não serão solucionados sem uma ruptura radical
diante da crise: em prol “  de los de abajo”. Por isso a perspectiva da revolução  permanente é
fundamental, ao unir as lutas dos trabalhadores do  campo e da cidade, dos precarizados e
desempregados, dos movimentos feministas, ambiantalistas, LGBTs , antirracistas e antifascistas que
ganham destaque na atualidade.

Para unir as lutas democráticas, identitárias com um programa classista de transição  para o socialismo,
é necessário lutar pela derrota de Bolsonaro e seu  governo neoliberal, Medidas como a auditoria da
dívida pública,  taxação das grandes fortunas e dividendos, revogação da Pec do Teto e das
contrarreformas Trabalhista e da Previdência, garantia do emprego e da renda básica para toda à
população, com maciços investimentos na saúde e nas universidades públicas são urgentes.

Para sanar a pandemia e criar um  novo paradigma em que a prioridade seja a Vida e não o lucro. O
paradigma da emancipação socialista.

Referências

CHILCOTE, Ronald H. (2012). Trotsky e a teoria latino-americana do desenvolvimento. Revista


Crítica Marxista no 34, São Paulo. Brasil

GUIMARÃES JR.,M. e LOPES,T (2016). O Desenvolvimento Desigual e Combinado: paralelos entre


as obras “História da Revolução Russa” de Trotsky e “Dialética da Dependência” de Ruy Mauro
Marini. Revista Rebela, Vol 6 Nr. 2 Florianópolis.Brasil

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GUNDERFRANK, A(1973) A . América Latina: subdesarrollo o revolución.  Ediciones Er.México

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númeero 12,São Paulo. Brasil

LÖWY, Michael.(1998) A teoria do desenvolvimento desigual e combinado. Revista Outubro, nº 1, p.


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LUCE, Mathias Seibel(2019). Teoria Marxista da Dependência: problemas e categorias – uma visão
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__________(2019)O Reformismo e  A contrarrevolução Estudos sobre o Chile. Expressão Popular.


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______(2018). Sobre superexploração e capitalismo dependente. Caderno CRH,  v. 31, n.84, set./dez.


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_____.(2007) A revolução permanente. Expressão Popular,São Paulo.Brasil

_____.(2010) Balanços e perspectivas. Editora Instituto José Luís e Rosa Sundermann, São


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_________(2011) Revolução e Contrarrevolução na Alemanha.  Editora Instituto José Luís e Rosa


Sundermann. São Paulo.Bras

Marcos Diligenti é professor de Arquitetura e Urbanismo na PUC-RS.

Ricardo Souza é doutorando em Serviço Social, técnico-administrativo da UFRGS, coordenador jurídico da ASSUFRGS
- Sindicato, militante do MES/TLS e do PSOL-RS.

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