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Tribunal de Justiça de Mato Grosso

PJe - Processo Judicial Eletrônico

11/01/2022

Número: 1000090-42.2022.8.11.0000
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Órgão julgador colegiado: Segunda Câmara Criminal
Órgão julgador: GABINETE DO DES. PEDRO SAKAMOTO
Última distribuição : 07/01/2022
Valor da causa: R$ 1.000,00
Processo referência: 0000090-68.1990.8.11.0004
Assuntos: Homicídio Qualificado, Ausência de Fundamentação
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Partes Procurador/Terceiro vinculado
SEBASTIAO VICENTE DOS SANTOS (PACIENTE) JOAO RODRIGUES DE SOUZA (ADVOGADO)
JOAO RODRIGUES DE SOUZA (IMPETRANTE)
JUÍZO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARRA
DO GARÇAS (IMPETRADO)
MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO
(TERCEIRO INTERESSADO)
ADÃO PEREIRA NERES (VÍTIMA)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
11419 07/01/2022 16:50 HC - SEBASTIÃO VICENTE - FINAL Petição inicial em pdf
3476
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO.

Autos originários – 0000090-68.1990.8.11.0004

Autor – Ministério Publico

Paciente - Sebastião Vicente dos Santos

Impetrante – Joao Rodrigues de Souza

Impetrado – Juiz da 1ª Vara Criminal da Comarca de Barra do Garças – MT.

Colenda 2ª Câmara Criminal (por prevenção)

Eméritos Desembargadores:

Ínclito Relator

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JOAO RODRIGUES DE SOUZA , advogado, casado,
inscrito na OAB/MT sob o n.º 5.876, com escritório profissional na Rua Goiás,
n.º 1068, Centro, Barra do Garças – MT, e-mail : j.rodriguess@hotmail.com ,
WhatsApp ( 066) 9.9233-3353g, onde recebe intimações, vem
respeitosamente perante esse Egrégio Tribunal, com fulcro no art. 5º, inciso
LXVIII, da Constituição Federal de 1988 e artigos 647 e 648, ambos do Código
de Processo Penal, impetrar o presente

ORDEM DE HABEAS CORPUS com Pedido de Liminar

Em favor de Sebastião Vicente dos Santos, brasileiro,


convivente, vaqueiro, inscrito no CPF 329.359.511-15, residente e domiciliado
na cidade de Mineiros- GO, na Rua Egídio Alves, Quadra 07, lote 03, Setor
Betel.

Apontando como coator o Juiz da 1ª Vara Criminal de Barra


do Garças – MT.

Pelos fatos e fundamentos doravante narrados,


pleiteando, ao final, seja redimensionada a pena aos parâmetros da Lei e
Jurisprudência e determinado ainda o início da reprimenda no regime
prisional semiaberto, compatível com a pena e as condições pessoais do
apenado.

DOS FATOS

O PACIENTE foi acusado pelo Ministério Público de


haver praticado homicídio qualificado pela surpresa (art. 121, § 2º, inciso IV
do CP).

Recebida a denúncia, seguiu-se a instrução, sendo o


Paciente pronunciado nos termos da inicial acusatória.
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Contra a pronúncia manejou recurso em sentido
estrito, que desprovido, manteve a decisão do Juízo singular em seus termos.

Em março de 2016, foi levado a julgamento perante a


Corte Popular. O Réu não fora localizado, razão pela qual o julgamento se deu
sem sua presença.

Naquela oportunidade, o julgamento pelo Júri, o


Dominus Litis sustentou que estavam comprovadas materialidade e autoria
do delito. Não, porém, a qualificadora; posto que os fatos comprovadamente
se deram no cenário de uma briga generalizada da qual participaram autor e
vítima. Ademais, inexistiu arguição de agravantes ou causas especiais de
aumento de pena.

Com a tese, concordou o Ilustre Defensor Público, que


também a arguiu.

Os jurados então, julgando os fatos, motivos e


circunstâncias, acolheram a tese.

Em consequência, restou o réu condenado por


homicídio simples.

Dosando a pena, o Juiz Presidente impôs como


reprimenda 8 (oito) anos e 6 (seis) meses, com início de cumprimento em
regime fechado.

Da sentença não houve recurso.

Transitada em julgado a decisão.

O Paciente foi preso em 23.12.2021.

São os fatos de relevância.

DO DIREITO.

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Trata-se de Ordem de Hábeas Corpus impetrado com
a finalidade de readequar a dosimetria da pena e consequentemente o regime
inicial de cumprimento.

A hipótese não é estranha aos Tribunais, sendo


possível o conhecimento da impetração, ressalvando que a adequação se
torna possível quando na dosimetria há equívoco e extrema severidade,
traduzindo uma desprorcionalidade que afronta a garantia constitucional de
individualização da pena, exatamente como ocorre nos autos aqui tratados.

Nesse sentido, o STF:

STF – HC 144341 AGR / CE


( ... )

Na esteira da orientação jurisprudencial desta Corte,


por se tratar de questão afeta a certa discricionariedade do Magistrado, a
dosimetria da pena e passível de revisão em habeas corpus apenas em
hipóteses excepcionais, quando ficar evidenciada flagrante ilegalidade,
constatada de plano, sem a necessidade de maior aprofundamento no acervo
fatico-probatorio.

( ... )

O Superior Tribunal de Justiça concedeu em parte a


ordem no HC 388.097/CE, para fixar a pena de 06 (seis)
anos e 03 (três) meses de reclusão para o delito de
tráfico de drogas. Confira-
(...).

Na análise do remédio constitucional impetrado pela


defesa, a Corte de origem afastou a consideração
desfavorável dos antecedentes, os moldes do
enunciado 444 da Sumula desta Casa, mantendo
somente a consideração negativa relativa a
quantidade e qualidade dos materiais tóxicos
apreendidos. Sendo assim, afastada pelo colegiado

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local uma circunstância judicial negativa reconhecida
no edito condenatório, imperiosa seria a redução
proporcional da reprimenda básica. Não obstante,
vimos, o Tribunal de Justiça manteve o mesmo
patamar de aumento.

Pois bem.

Conforme afirmado alhures, o Conselho de Sentença


refutou a tese sustentada na denúncia e acolhida na pronúncia de que o
Réu/Paciente cometera homicídio qualificado pela surpresa.

Dizemos refutou, porquanto, embora o próprio MP


tenha se pronunciado pela exclusão quando do julgamento, não estava a
Corte Popular sujeita à compreensão do Parquet, podendo reconhecer a
ocorrência fática e condenar, o que não raro, acontece.

Entretanto, os Juízes dos fatos negaram a ocorrência,


refutando a qualificadora, aquilo que no dizer da abalizada doutrina” "(...) são
verdadeiras elementares adicionais que vão se juntar ao tipo-base, para
formar um novo tipo derivado, influindo, portanto, na tipificação do fato."
(MARINHO, Alexandre Araripe; FREITAS, André Guilherme Tavares de. Manual
de Direito Penal: Parte Geral. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p.
516).

Reconhecida materialidade e autoria, e sem o


acolhimento de tese absolutória, portanto, condenado o Paciente/Réu,
passou-se à dosimetria da pena. Ante a ausência da agravantes, atenuantes
ou causas especiais de aumento de pena, a fundamentação do quantum
limitou-se às circunstancias judiciais do artigo 59 do CP.

Exatamente aqui a ilegalidade, conforme se


demostrará.

Eis o trecho da decisão:

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Sentença – autos AÇÃO PENAL: 90-68/1990
(CÓDIGO: 9448).

ACUSADO(S): SEBASTIÃO VICENTE DOS SANTOS


VITIMA(S): ADÃO PEREIRA NERES.

(…)

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DO ERRO NA FIXAÇÃO DA PENA E CONSEQUENTE
IMPOSIÇÃO DE REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO MAIS GRAVOSO QUE A
HIPOTESE LEGAL.

A necessidade de que as decisões judiciais sejam


fundamentadas é inerente ao Estado Democrático de Direito, pois se
apresenta como uma garantia contra o arbítrio, e ao devido princípio do
devido processo legal, pois o processo justo não se compatibiliza com a
discricionariedade jurisdicional.

De qualquer sorte, o dever de fundamentação das


decisões judiciais está expressamente previsto no inciso IX do art. 93 da
Constituição Federal brasileira (“todos os julgamentos dos órgãos do Poder
Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de
nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias
partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a
preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o
interesse público à informação”).

Se, por um lado, a Constituição exige dos juízes que


fundamentem as suas decisões, por outro lado a Constituição confere aos
jurisdicionados um direito à fundamentação. Não se trata de um direito a uma
fundamentação qualquer, mas de um direito fundamental a uma
fundamentação adequada ou legítima.

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No caso em tela, à toda evidência, não se trata de
sentença não fundamentada, mas de inidônea fundamentação, posto que Juiz
Presidente, para exasperar a pena base além do mínimo legal invocou como
critério de medição dados ou circunstâncias que já fazem parte do próprio
tipo penal, bem como considerou informações não submetidas ao crivo do
contraditório e ainda circunstância fática expressamente negada pelos
jurados, incidindo assim em erro quanto a aplicação da pena.

Sigamos. Dosando a pena, o juiz Presidente valorou


negativamente 05 (cinco) circunstancias, quais sejam: culpabilidade, conduta
social, motivos, circunstancias e consequências do crime.

O número de circunstâncias judiciais é capaz de


impressionar, se desatento o olhar . Entretanto, conforme se demostrará, a
valoração se alicerça em fundamentos inidôneos, vagos e equivocados, e por
isso incapazes de sustentar-se quando confrontados à luz da Lei e da
Jurisprudência, resultando em erro na aplicação da pena , passível de ser
sanada via do presente remédio constitucional.

Vejamos, individualmente, cada uma das


circunstancias judiciais e sua fundamentação, para se constatar o erro na
aplicação da pena.

( ... )

Culpabilidade: O juízo de reprovabilidade da conduta.


A culpabilidade deve ser valor da negativamente, na
medida que o réu desferiu golpe na vítima que o
abordou tentando acalmar os ânimos, ou seja, o
ofendido interveio para separar a briga e foi “recebido
com uma bofetada no rosto” “sic “denúncia fls. 03,
além disso, o fato foi praticado em meio a diversas

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pessoas e em via pública aumentando a
reprovabilidade da conduta.

Nota-se que o Magistrado valorou negativamente a


culpabilidade calçado exclusivamente na denúncia e não em qualquer outro
elemento de prova submetido ao crivo do contraditório.

A narrativa apresentada na inicial acusatória, não


corroborada por outros elementos de prova ao longo da instrução criminal,
evidentemente não se presta, por si, para fundamentar a valoração negativa
de circunstancia judicial, sendo inidônea a motivação nela exclusivamente
firmada.

Entretanto, apenas para não deixar dúvida quanto à


tese, convém melhor explicitá-la.

De início, é Impossível exasperação da pena base


firmado exclusivamente na denúncia, notadamente se os fatos não se
comprovam ante o crivo do contraditório, conforme ocorreu no presente
feito.

Ademais ainda que restasse provado que o fato ocorreu


tal qual narrado na denúncia, o que não se comprovou, nem assim teria o
condão de justificar a valorização negativa da culpabilidade.

É que na ocasião do delito, Réu e vítima interviram em


uma contenda que não fora iniciada por nenhum deles, mas por terceiros.
Um, que tentava a contra gosto de uma dama com ela dançar; outro, o marido
da dama, que se opunha.

Não se sabe ao certo se apenas pela intervenção dos


dois primeiros, fato é que dali para a frente o entrevero inicial descambou
para uma briga generalizada, com apedrejamento mútuos como narra a
própria denúncia e depois repete o Sentenciante ao fundamentar os motivos
do crime.

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Nesse contexto ocorreu a facada que ceifou a vida da
vítima.

Lastimável, porém insuficiente para justificar a


valoração negativa da culpabilidade enquanto circunstancia judicial.

É que nesta acepção a culpabilidade diz respeito a maior


ou menor grau da reprovabilidade da conduta do agente.

No caso em tela, portanto, à míngua de elementos que


autorizassem a valoração negativa da culpabilidade, o Sentenciante o fez
arrimado exclusivamente na denúncia, e quando foi além desta, asseverou
fundamentos inidôneos, sendo de justiça o decotamento da valoração
negativa.

( ... )

Conduta social: Deve ser valorada negativamente. Com


efeito, a testemunha de defesa Antônio Alves Machado
declarou que o réu Sebastião Vicente dos Santos
“gostava de trocar tapas” (fls. 130).

Também em relação à valoração da conduta social o


fundamento é inidôneo até não mais poder.

O Sentenciante valorizou a conduta social do Paciente


em uma única informação vinda exclusivamente de testemunha, que afirmou
que o Paciente “gostava de trocar “tapas”.

Note-se que nem um outro elemento do processo


fornece informação que autorize a valoração negativa da conduta social do
Réu.

As certidões criminais informam a inexistência de


antecedentes. Nenhum estudo fora realizado.

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Então, seria suficiente para analisar e valorar a
conduta social uma única fala de testemunha de que o “gostava de trocar
tapas”?

À toda evidencia, esta informação sozinha se mostra


insuficiente para valorar o comportamento do agente no meio familiar, no
ambiente de trabalho e no relacionamento com outros indivíduos, requisitos
a serem perquiridos quanto se trata de conduta social.

Quando a testemunha o vira trocar tapas? Em que


contexto que ocorrera? Teria sido enquanto menor de idade?

O fato é que não há nos autos nenhum elemento que


indiquem conduta social

Sem elementos informativos, a valoração negativa só


pode estribar-se em presunção. Entretanto, bem sabemos, esta é vedada na
seara penal.

Portanto, sem lastro probatório que autorize a


valoração negativa da circunstância e não indicando o Magistrado elementos
válidos que a autorizem, impõe-se seu afastamento.

(...)

Motivos do crime: Os motivos devem ser valorados


negativamente. De fato, descreve a denúncia que
“vendo a confusão iniciada e por ter prazer à
contenda, nela entrou o denunciado, esclarecendo
que “era daquele tipo que ele gosta” (sic fls. 03) Ou
seja, o acusado deliberadamente interveio em uma
contenda, o que fez com que a mesma ganhasse
contorno de briga generalizada, e, posteriormente,
acabou desferindo um golpe na vítima, cheirando-lhe
a vida.

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Por óbvio, em homenagem à lógica, a valoração dos
motivos do crime há que iniciar-se pela identificação de tais motivos, para, ao
depois, valora-los.

Sim, porquanto, não há como valorar o que não está


identificado.

No caso das circunstâncias judiciais, há ainda que


atentar-se que a identificação deve exsurgir de elementos dos autos,
notadamente aqueles que tenham sido submetidos ao contraditório, vedada
a consubstanciação em elementos alienígenas àqueles do processo, bem
como à meras citações de conceitos e textos legais.

Conquanto não se negue a existência de certa dose de


discricionariedade ao julgador, é ela vinculada, posto que embora permitida
certa elasticidade do raciocínio, não se permite a extensão além das balizas
da lei e da jurisprudência.

Pois bem.

No caso em tela, observando o percurso do raciocínio,


se percebe claramente que o Juiz Presidente enveredou por caminhos que
conduziram a decisão em total divórcio das diretrizes admitidas.

Ora, os motivos do crime repousam na órbita


subjetiva. Na lição doutrinária, “ É o fator íntimo que desencadeia a ação criminosa (honra,
moral, inveja, cobiça, futilidade, torpeza, amor, luxúria, malvadez, gratidão, prepotência
etc)." (SCHMITT, Ricardo Augusto. Sentença Penal Condenatória – Teoria e Prática. 8. ed. Salvador:
Juspodvim, 2013. p. 133)

Contudo, para fundamentar a valoração negativa, O


Sentenciante limitou-se a repetir as falas contidas na peça inaugural
acusatória, que no particular da circunstancia ora debatida, não se
reproduziram no contraditório, posto que, uma vez deflagrada a ação penal,
nenhum elemento foi carreado aos autos que firmassem a pretendida
narrativa do Parquet.

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Saliente-se, não se esta a falar da autoria, reconhecida
pelos jurados, mas das circunstancias.

Ora, pretender valorar negativamente circunstancia


judicial consubstanciado tão só na narrativa da denúncia, só atesta que não
há elementos seguros nos autos que possam indicar os motivos do crime, e,
em assim sendo, impossível a valoração negativa, salvo se admitida a
presunção, o que, sabemos todos, é descabida na seara penal.

Destarte, descabida a valoração negativa, impondo-se


seu afastamento.

( ... )

Circunstancia do crime. Consoante se infere da


denúncia, um irmão da vítima a retirou do local,
segura pelo braço, quando foi seguida pelo
denunciado, que, de inopino, fez uso de uma faca e
desferiu o golpe. Conquanto o Conselho de Sentença
tenha afastado a qualificado da surpresa, essa
circunstância do crime deve ser valorada
negativamente, pois o fato foi praticado de forma que
diminuiu a defesa da vítima.

Por mais uma vez, equivocada a valoração negativa.

A leitura do enunciado nos fundamentos não deixa


dúvida: a valoração negativa se arrimou no reconhecimento de que o
Réu/Paciente se valeu de meio que, (sic) “ o fato foi praticado de forma que
diminuiu a defesa da vítima”, vale dizer, em circunstancia caracterizadora da
surpresa.

Ora, não se desconhece o raciocínio que permite que


qualificadoras possam ser utilizadas como circunstancia judicial.

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O paradigma, encontra-se, verba gratia, no seguinte
julgado:

"No caso de incidência de duas qualificadoras,


integrantes do tipo homicídio qualificado, não pode
uma delas ser tomada como circunstância agravante,
ainda que coincidente com uma das hipóteses
descritas no art. 61 do Código Penal. A qualificadora
deve ser considerada como circunstância judicial (art.
59 do Código Penal) na fixação da pena-base, porque
o caput do art. 61 deste diploma é excludente da
incidência da agravante genérica, quando diz 'são
circunstâncias que sempre agravam a pena, quando
não constituem ou qualificam o crime'." (RHC
7.176/MS, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES,
SEXTA TURMA, DJ 06/04/1998).

Entretanto, uma diferença abissal da hipótese no


julgado se opõe à realidade aqui tratada.

É que para o reconhecimento, a circunstância fática há


que ter sido reconhecida pelos Jurados.

Não é o caso dos autos.

Como já dito alhures, a circunstância foi submetida ao


Conselho de Sentença, que a recusou.

Desimporta se o Ministério Público não sustentou a


qualificadora nos debates, posto que foi ela submetida aos Jurados, que não
estavam adstritos à compreensão do Órgão Acusador, e, conhecendo-a,
negaram-lhe como fato.

Nesse trilhar, impossível ao Julgador de Toga fazer


incidir como justificação para a exasperação da pena, valorando

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negativamente circunstância fática rejeitada pelos jurados, posto que à
decisão da Corte Popular se encontra sujeitado.

Portanto, incabível a valoração negativa, impondo-se


seu afastamento.

( ... )

Consequência do crime: a morte da vítima é


elementar do crime de homicídio, não podendo,
portanto, ser valorada negativamente. No entanto,
entendo que deva ser valorada negativamente a
circunstância da vítima ter apenas 18 anos de idade,
pois teve ceifada a vida no início de sua fase adulta,
Vê-se que a própria lei penal valora negativamente,
alçando à condição de causa de aumento de pena, o
homicídio contra menor de 14 anos. Dessa forma,
mostra-se idôneo o reconhecimento, como
circunstancia judicial negativa, a prática de homicídio
doloso contra indivíduo que recém alcançou a
maioridade.

Por fim, e não menos equivocada, se encontra a


valoração negativa das consequências do crime.

Deveras, o Magistrado valorou negativamente pelo


fato de que a vítima tinha 18 (dezoito)anos, tendo recém alcançado a
maioridade.

As razões do equívoco se depreendem da própria


fundamentação.

É que socorreu-se o Douto Julgador de piso na


assertiva de que a própria lei, em determinadas hipóteses, valora
negativamente a faixa etária das vítimas, impondo pena mais severa.

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Bem verdade, assim, o faz a Lei. E não apenas na
hipótese aventada na decisão, mas também no caso de senilidade e naquelas
de presunção nos crimes sexuais.

Todavia, as hipóteses que a faixa etária devem ser


consideradas para agravar a pena são aquelas em que a Lei o faz.

É de se recitar como mantra o axioma “Nullum


crimen, Nulla poena sine praevia lege " inscrito em nosso Códex: “Não pode
haver crime nem pena sem lei anterior que os defina” – Código Penal artigo
1º.

Não se pode tratar com menoscabo os preceitos


garantidores de nossa civilidade na aplicação da sanção penal, pois eles se
impõe como farol em qualquer das três fases das quais se compõe a
dosimetria.

Portanto, não é dado ao Juiz fazer-se de legislador no


momento da individualização da pena, criando no caso concreto, através de
raciocínios equivocados, soluções que conduzam a pena a severidade não
autorizada pela Lei e pelos princípios informadores do direito.

Assim, impõe-se por mais uma vez a rejeição e


afastamento da valoração negativa também da circunstancia judicial das
consequências do crime.

Ante o até aqui exposto, sem necessidade de


revolvimento das provas, verifica-se que a pena foi estabelecida de forma
equivocada, sendo de justiça sua readequação.

Noutro giro, a exacerbação equivocada da pena


elevou-a à patamar que teve por consequência a imposição do regime
fechado para início de cumprimento da pena, uma vez estabelecida em 8
(oito) anos e 6 (seis) meses.

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Entretanto, o acolhimento da Ordem de Hábeas
Corpus para a readequação da pena ou ainda a concessão de ofício, como
permitido no Regimento Interno deste Egrégio Tribunal, levará
necessariamente à mudança no regime inicial de cumprimento, salientando
para tanto a primariedade e inexistência de quaisquer eventos
desabonadores na vida pregressa do Paciente antes e depois dos fatos.

Em peroração, eméritos julgadores, uma última fala.

Ainda no século XVIII, o Marques de Biccaria, do alto


de seus 26 anos, bradava com a autoridade de quem conhecera o cárcere
contra a desproporção entre o delito e a pena.

Eram as luzes do Iluminismo que projetavam as bases


de diversas revoluções, todas revestidas de ideias de liberdade e de igualdade
entre os homens.

Na esteira daqueles dias e seus fatos históricos,


construímos as bases de nossa sociedade, e não deixamos mais de perseguir,
ao menos como utopia, a igualdade e a Justiça.

Dentre as muitas conquistas trazidas pelos ventos da


modernidade está a imposição da pena livre de qualquer outro objetivo que
não a justa reprimenda, e na exata extensão que cabível segundo preceitos
pré estabelecidos, sem espaços para vinganças ou sentimentos outros que
não os permitidos nas leis.

Por todo o exposto requer:

a) o conhecimento da impetração, com a concessão da


liminar, para sustar os efeitos da condenação até o
julgamento de mérito da presente ordem,
determinando a expedição de alvará de soltura em
favor do Paciente, até o julgamento final do presente
Writ;

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b) que sejam, afastadas as valorações negativas das
circunstâncias judicias reconhecidas na sentença,
readequando a pena para o mínimo legal ante a
primariedade e inexistência de antecedentes
desabonadores do Paciente à época do fatos, como
reconhecido na própria sentença (e também, apenas
para registro, nos mais de trinta anos que se seguiram
ao fato);

c) ante a pena readequada, associada aos predicados


pessoais do acusado, que seja imposto o regime
semiaberto para início do cumprimento da
reprimenda.

Nos termos expostos, pede deferimento,

Barra do Garças – MT, 03 de janeiro de 2022.

Joao Rodrigues de Souza

OABMT 5876

Observação :

Documentos que instruem o Hábeas Corpus :

1 – cópia integral dos autos

2 - certidões criminais do paciente

3 - procuração ad judicia

4 – cópia da sentença

5 – CTPS do Paciente

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Assinado eletronicamente por: JOAO RODRIGUES DE SOUZA - 07/01/2022 16:50:07 Num. 114193476 - Pág. 18
https://clickjudapp.tjmt.jus.br/codigo/PJEDBPCSSRKND
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Assinado eletronicamente por: JOAO RODRIGUES DE SOUZA - 07/01/2022 16:50:07 Num. 114193476 - Pág. 19
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