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O estudo da Independência do Brasil, assim entendido o

episódio que levou D. Pedro, em 7 de setembro de 1822, a declarar o


Brasil separado de Portugal, é por demais penoso para quem quiser
compreender a razão da participação de portugueses de Portugal e de
portugueses do Brasil no movimento em prol de tal desligamento.
Há que se analisar os sentimentos de liberdade que
reinavam no mundo, no século XVIII, que levaram ao término do

Absolutismo, bem como temos de nos transportar ao passado anterior, à


Idade Média mesmo, e de lá voltaremos até aquele importante episódio.
Com isso não seria possível, evidentemente, num trabalho
sintético, vamos cuidar apenas de alguns fatores que influíram para
aquele resultado, procurando evitar conceitos e definições polêmicos, que
ensejariam discussões intermináveis.
Não obstante isso, temos de conceituar colônia e colonos
como expressões sem a carga pejorativa que têm agora, bem como
precisamos ter em conta que as adjetivações da época não são as
mesmas de hoje.
Assim, vamos iniciar dizendo que todos os movimentos em
favor da separação do Brasil de Portugal, conhecidos com os nomes mais
variados, desde a Inconfidência Mineira, em 1789, até a Revolução
Pernambucana de 1817, sem nenhuma exceção, tiveram à frente Maçons,
quer iniciados em Lojas Maçônicas da Europa quer iniciados nos grêmios
de caráter maçônicos que começaram a ser criados no Brasil.
Precisamos lembrar, também, que havia no mundo, no início
do século passado, e desde fins do século XVIII, duas correntes
maçônicas, que se convencionou a denominação de vermelhos, de
influência acentuada na França, e de azuis, de influência inglesa. É claro
que a palavra vermelha aqui não tem a mesma conotação que passou a
ter, atualmente, para se indicar os comunistas, diga-se “en passant”.
A idéia geral da maçonaria era combater o Absolutismo e a
nobreza. Nomes como Benjamim Franklin, Mirabeau e seu agente, La
Fayette, aparecem na primeira linha do movimento.
Lojas maçônicas com nomes - títulos distintivos - curiosos,
surgiam aqui e ali. As intenções de tais Lojas também era curiosas. Uma
Loja foi fundada com o título de “Loja das Nove Irmãs” e uma “Sociedade
dos Amigos Negros” também foi criada, em Paris, pelos ingleses e tinham
o propósito de evangelizar a França.
Em Portugal, as duas correntes maçônicas se degladiavam,
pois os azuis defendiam a monarquia inglesa e pregavam um governo
monárquico-constitucional, enquanto os vermelhos eram revolucionários,
adversários das monarquias européias e adeptos do Liberalismo amplo e
da forma republicana de governo. Vem daí a cognominação de
“derrubadores de reis”, dada pelo povo aos Maçons das época.
Tomás Wilson fundara, em 1794, a Ordem dos Homens de
Orange”, em homenagem a Guilherme de Orange, conquistador holandês.

Tal ordem cumpria rituais maçônicos e espalhou a moda dos “pedreiros


livres” pelo mundo. No começo do século XIX era costume ser maçam:
três filhos do rei Jorge IV, da Inglaterra, um após outro, foram Grão
Mestres - O Príncipe de Galles e os Duques de Kent e Sussex. Dois outros
filhos daquele Rei também pertenceram a Lojas maçônicas da Maçonaria
Azul.
A Ordem dos Homens de Orange combatia as monarquias da
França, de Portugal e da Espanha. Só aceitava protestantes puros. Seu
lema era a Inglaterra, acima de tudo e de todos. Os ingleses criaram lojas
azuis, na França, para atender aos seus propósitos e também o fizeram
em Portugal.
Aí começa a história da Independência do Brasil.
A primeira Loja portuguesa fora fundada em 1727; 1733
funda-se a Segunda, como um prolongamento da Grande Loja de
Londres.
Em 1738, um Papa infeliz, Clemente XII, proíbe aos católicos
exercerem atividades em lojas maçônicas e, ao mesmo tempo el-Rei D.
João V ameaça punir com graves penas os Maçons.
Nada adiantaram, porém, tais perseguições.
O Marquês de Pombal, de todos conhecido, que se iniciara
em 1744, em Londres, pelas mãos do Príncipe Frederico de Galles, dá
ampla liberdade às lojas maçônicas portuguesas, lutando principalmente
as lojas vermelhas contra a política comercial inglesa, contra os Jesuítas,
contra o Clero e defendendo seus princípios de destruição de toda
autoridade que não fosse fundada na vontade livre do indivíduo e não
estivesse ao arbítrio de cada um. Em matéria religiosa, defendiam o
princípio deista; em política, os direitos humanos na concepção dos
enciclopedistas franceses; a ordem social tendo por base o Contrato
Social de Jean Jacque Rosseau e as idéias liberais de Locke, Montesquieu
e Herder.
No Brasil, também os homens livres e de bons costumes
iniciaram a luta.
Embora não se afirme com exatidão quando a Maçonaria
começou sua atividade em nosso país, sabe-se que, em meados do século
XVIII, já funcionavam lojas maçônicas na Bahia, que viria fazer sua
Inconfidência em 1799. Também os conjurados da Inconfidência Mineira
foram maçons; sem embargo de haver quem negue tal qualidade a
Tiradentes, que foi o mais famoso, não se nega que praticamente todos
os inconfidentes tinham tido participação em organizações maçônicas. Se
Tiradentes não tiver sido maçom, agiu como se o fosse.
Para nossa tristeza, também eram maçons Joaquim Silvério
dos Reis, Coronel de cavalaria, que traiu seus companheiros, e outros 2
traidores menos famosos, Basilio Brito Malheiros do Lago, 2o Tenente e
Inácio Corrêa Pamplona, Mestre do Campo.
Adiantando-se a história, chegaremos à invasão de Portugal,
por Napoleão, à transferência da Capital da Monarquia Portuguesa para
o Rio de Janeiro, à criação do Reino do Brasil Unido ao Reino de
Portugal.
D. João VI deixa as monarquias inglesa e francesa se
destruindo e vem para o Brasil.
Aí aparece José Bonifácio de Andrada e Silva, que fora
catedrático de Minerologia na Universidade de Coimbra, em cuja loja
maçônica “Clube de Coimbra” se iniciara. Depois de ter comandado
tropas portuguesas, como major e tenente-coronel, José Bonifácio,
português do Brasil, pois filho de Santos, portador de uma imensa
bagagem cultural, proveniente dos seus estudos com mestres
importantes, como Kohler, Klotzsch, Freislenben e Lampadius, era da
maçonaria azul e não aceitava, portanto, as idéias republicanas dos seus
irmãos vermelhos. Os choques foram inevitáveis.
Em 1817 - lembremos da Revolução Pernambucana de Seis
de Março - o ideal republicano era defendido com veemência.
Em Portugal, também os azuis e os vermelhos se
enfrentavam. Portugal, livre dos franceses, procurava mudar e, em
fevereiro de 1821 D. João VI é obrigado a aceitar uma constituição liberal
e a voltar a Portugal.
Por Decreto de 22 de abril de 1821 D. João VI encarrega o
Príncipe Regente, D. Pedro, do Governo Geral e manda proceder à
devassa (inquérito) contra os que haviam se amotinado na Praça do
Comércio, no Rio, em luta pela adoção de uma constituição democrática
(queriam a Constituição Espanhola, até que se fizesse uma própria).
Em 26 de abril, D. João VI deixa o Brasil, aqui ficando 3
correntes políticas:
aj Os absoiutistas;
b) Os monarquistas constitucionais parlamentares,
representados pela baixa nobreza, pela burguesia e defendidos pela
Maçonaria Azul;
c) Os republicanos democráticos, sustentados pela
Maçonaria Vermelha.
Com a partida de D. João VI, a Maçonaria passou a
comandar a política em nosso país. Só seus filiados faziam carreira
política. Os vermelhos iniciaram, abertamente, a propaganda da
separação de Portugal, isto é, separação do Reino do Brasil do de
Portugal. Visavam, abertamente, a República, como forma de governo.
A eles se antepunha o Príncipe Regente e Lugar Tenente de
el-Rei, D. Pedro, que era prestigiado pelos absolutistas e pela burguesia,
esta com os azuis à frente, embora estes estivessem, como dizemos hoje,
meio adormecidos.
Diga-se, recordando-se, que desde 1815 o Brasil era um
remo independente, soberano, embora sob a égide da Monarquia
Portuguesa, pelo que a independência que se pretendia era a
desvinculação de Portugal. Como não havia uma Dinastia Brasileira, tal
separação levaria, fatalmente à República.
Também é preciso se acentuar que não havia uma revolta
dos nativos, assim entendidos os que aqui nasceram, contra os
colonizadores. O que havia era um desentendimento entre os naturais do
Brasil e ue Portugal, mas muitos portugueses do Brasil, como eram
chamados os aqui nascidos, como muitos de Portugal, tinham idéias
contrárias, isto é, brasileiros eram contrários à separação e portugueses
eram a ela favoráveis.
De um modo geral, todos eram homens cultos, com
formação europeia e suas divergências, como se viu, eram meramente
políticas e ideológicas; a maioria era de Irmãos, por força da Maçonaria,
embora azuis ou vermelhos, e graças a essa Irmandade, não houve
derramamento de sangue, a não ser episodicamente, quando da
separação.
Em 27 de abril de 1821, D. Pedro assume a Regência. São
tomadas inúmeras medidas inusitadas para a época: extinção do
Tribunal da Inconfidência em Lisboa, que julgava os crimes de lesa-
majestade; liberação da entrada de livro no Brasil (salvo os imorais); um
sistema de desapropriação de terras; garantia das liberdades individuais,
etc.
Nos primeiros dias de junho chegam ao Rio as Bases da
Constituição da Nação Portuguesa, aprovada pelas Cortes de Lisboa em
10/3/21 e impostas a D. João VI lã em Portugal e D. Pedro, que as
jurou, sob pressão, em 5/6/21. Por elas, D. Pedro não mais governava
sozinho; seu Conselho de Ministros, que fora nomeado por D. João VI
antes de voltar à Portugal, passaria a sofrer fiscalização de uma Junta
Provisória de 9 Deputados. Em 5 de junho, no Senado da Câmara uo Rio
de Janeiro, mais a tropa e o povo, como se dizia, impuseram tal
Constituição a D. Pedro. Ã frente de todo esse movimento, José Clemente
Pereira, da Maçonaria Azul, Presidente do Senado, que viera de Portugal
em 1816. Com ele estava Joaquim Gonçalves Ledo, Cônego Januário da
Cunha Barbosa e outros. Ledo e os demais eram da Maçonaria Vermelha,
que estava filiada ao Grande Oriente Lusitano, de quem recebiam total
influência. Recordo-me que, em 1820, em 24 de agosto, houvera a
Revolução Liberal, no Porto, em Portugal.
Em setembro de 1821, no dia 29, as Cortes Portuguesas
deliberaram sobre a organização administrativa do Brasil e, temerosos da
separação latente, ordenaram a volta de D. Pedro para lá.
Em 6 de outubro, D. Pedro faz uma proclamação aos
fluminenses, onde dizia: “Quereis ser perjuros ao Rei e à Constituição?”
Ao seu pai, D. Pedro escreve, constantemente, dando conta das
conspirações.
Enquanto no Rio de Janeiro os vermelhos agitavam, em S.
Paulo o mais importante dos azuis, José Bonifácio, pregava a
independência com Monarquia e não República. Juntamente com D.
Pedro, José Bonifácio era um óbice aos vermelhos, que os respeitavam.
Estes queriam, pois, a volta de D. Pedro a Portugal.
Joaquim Gonçalves Ledo estava à frente dos republicanos,
da Maçonaria Vermelha vale dizer.
Vem, então, um episódio que ficou conhecido como O FICO,
importante para a compreensão dos movimentos que culminaram com a
Independência.
Raia janeiro de 1822 e, no dia Io, de São Paulo, vem moção a
D. Pedro para que não parta. Em 9 de janeiro, D. Pedro recebe, em
audiência, o Senado da Câmara do Rio de Janeiro, que lhe entregou duas
representações: uma, do povo e outra dos negociantes. José Clemente
Pereira faz-lhe um discurso, que antes fora censurado pelos azuis.
Muitos outros discursos se seguiram, pedindo a D. Pedro que ficasse.
E D. Pedro, de improviso, respondeu a todos, dizendo:
“COMO É PARA O BEM DE TODOS E FELICIDADE GERAL DA NAÇÃO,
ESTOU PRONTO: DIGA AO POVO QUE FICO.”
Note-se que a palavra Nação, nessa frase, não significa,
como pensam alguns "nação brasileira”. É nação no sentido geral, pois
não existia nação brasileira naquela época. A expressão engloba Brasil e
Portugal.
Segue-se grande agitação à decisão de D. Pedro. No Rio de
Janeiro os vermelhos, que queriam a partida de D. Pedro, instigaram
motins, um deles envolvendo a Divisão Auxiliadora do General Jorge de
Avilez, logo sufocada.
Dia 12 de janeiro, D. Pedro faz proclamação dizendo que não
haveria separação política entre Brasil e Portugal e desejando que
tivéssemos União e Tranquilidade.
Mas, no dia 21, determina que as leis vindas da Corte
Portuguesa só poderiam ser cumpridas depois de ele as Ter examinado.
Faz profissão de fé anti-separatista mas em 26 de janeiro anuncia a sua
disposição de organizar o Reino do Brasil, quisessem ou não as Cortes
Portuguesas.
A Maçonaria Vermelha ficou desorganizada a esta altura. A
Loja Comércio e Artes que se havia instalado na Rua da Pedreira da
Glória (casa do Dr. Bahia) em 1815, reinstala-se em 24 de junho de 1821
em casa do Capitão de Mar e Guerra, José Domingues de Ataíde
Moncorvo, na Rua do Fogo esquina de Rua das Violas. Desdobra-se,
depois, em duas outras Lojas, a União e Tranquilidade, título da frase de
D. Pedro na sua proclamação e na Esperança de Niterói, fundado em 28
de maio de 1822, o GOB que se instalou em 17/6/1822.
Os vermelhos colocaram José Bonifácio, da Maçonaria Azul,
e que tinha fundado, inclusive, urna organização maçônica - O
Apostolado, como primeiro Grão Mestre do GOB. Mas, como primeiro
Grande Vigilante, ficou Gonçalves Ledo; segundo Vigilante, Mendes
Viana. O adjunto de Grão Mestre era o Ministro na Guerra do Príncipe,
Marechal Joaquim de Oliveira Álvares.
Assim, salvo José Bonifácio, azul, todos os demais dirigentes
do GOB eram vermelhos.
Diga-se, de passagem, os nomes dos Veneráveis primeiros
das três Lojas: Manoel dos Santos Portugal, Major, pela Comércio e Artes,
Albino dos Santos Pereira, pela União e Tranquilidade, e Pedro José da
Costa Barros, da Esperança de Niterói.
Mais tarde, o capitão mor José Joaquim da Rocha deixa a
Comércio e Arte e funda a ”Distintiva”, na Praia Grande, e logo depois o
Clube da Resistência, que viria a se transformar na Loja 9 de Janeiro
(não esquecer que foi o dia do FICO).
Por sugestão da Maçonaria, no dia 13 de maio de 1822, D.
Pedro aceita o título de Príncipe Regente Constitucional e Defensor
Perpétuo do Reino de Brasil, outorgado pelo Senado da Câmara do Rio de
Janeiro.
Nos dias 3 e 4 de julho, D. Pedro reforma o Ministério e, por
imposição do GOB, bota como Ministro da Guerra o Brigadeiro Luiz
Pereira da Nóbrega de Souza Coutinho, em substituição a Oliveira
Álvares, seu Grão Mestre Adjunto.
Em 14 de agosto, D. Pedro deixa a Princesa Real do Reino
Unido, D. Leopoldina, à frente do governo, e parte para S. Paulo. José
Bonifácio lê, para os Embaixadores estrangeiros, a proclamação de 6 de
agosto e lhes informa o propósito da separação de Portugal.
A ida de D. Pedro a S. Paulo era uma homenagem de D.
Pedro, pois de lá partira a idéia do FICO. Isso, aliás, ficara combinado
numa reunião havida no Apostolado, grêmio maçônico de José Bonifácio
e do qual D. Pedro era arconte-Rei, no dia 2 de junho. Os azuis
escolheram até a frase que D. Pedro deveria dizer, em S. Paulo, para
declarar a independência.
Quando as Cortes Portuguesas, em 17 de agosto, 3 dias
depois de iniciada a viagem de D. Pedro, determinaram a sua volta a
Portugal, nada mais fizeram do que dar o pretexto final para a declaração
programada.
Em 24 de agosto, D. Pedro chega a S. Paulo, sendo
vivamente aclamado. No GOB, houvera uma reunião, presidida por
Joaquim Gonçalves Ledo, onde ele faz enérgico discurso exigindo, de vez,

a declaração oficial da independência e que D. Pedro fosse aclamado Rei,


pois a Maçonaria já dava como proclamada a independência desde o
momento em que D. Pedro aceitara o título de Defensor Perpétuo do
Brasil, no dia 13 de maio.
No dia 7 de setembro, quando retorna de Santos, onde tinha
ido em viagem de cordialidade, às margens do Ipiranga, D. Pedro diz as
famosas palavras INDEPENDÊNCIA OU MORTE, tirando o Laço Nacional,
símbolo da Nação Portuguesa, criado por Decreto de 22 de agosto, de cor
azul e restabelece a cor verde, da Casa dos Braganças, como cor oficial (e
que havia sido proibida pela Corte de Portugal).
D. Pedro, que se havia iniciado na Maçonaria no dia 5 de
agosto, quando adotou o nome de GUATIMOZIM, costume da época, foi
eleito Grão Mestre do GOB em 22/09/1822, em substituição a José
Bonifácio . Empossou-se em 07/10/22.
Em 12 de outubro de 1822, D. Pedro foi aclamado Imperador
do Brasil, com o título de Pedro I, tendo sido sagrado em dezembro de
1822.
Mas as Maçonarias azul e vermelha continuaram em franca
atividade, em defesa de suas idéias.
O GOB foi fechado. Ledo perseguido, tendo de se refugiar
fora do Brasil. José Bonifácio, mais tarde, também sofre perseguições. o
O

Tais fatos se originaram do revezamento das influências que as 2 corrente


maçônicas exerciam sobre D. Pedro I.
O Reinado Brasileiro durou até 1889, quando a Maçonaria
Vermelha conseguiu, afinal, a proclamação da República.
Mas isso já ê outra história...
Sylvio Cláudio

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