1. Expropriação de mais de 70 mil pessoas habitantes da região.
2. População deslocada para Serra do Ramalho para colonização. 3. Proletarização dos camponeses: transformação nas relações de trabalho, acesso à terra. 4. População originalmente organizada em vilarejos, agricultura de subsistência e venda de pequeno "excedente" para compra de artigos de primeira necessidade, de comerciantes que faziam as vezes de "ricos" nesse arranjo social. 5. O rearranjo hídrico produzido pela barragem alteraria toda a lógica da produção agropecuária e pesqueira da população, um verdadeiro cataclisma pra economia de subsistência da população da região. 6. O projeto tratava-se de uma abertura para o capital industrial com a expulsão dos camponeses para regiões de terras improdutivas. É possível traçar paralelos tardios com os processos de cercamentos da acumulação primitiva nos países de capitalismo clássico, com a distinção de se tratar de uma economia dependente e subdesenvolvida a serviço do capital estrangeiro. 7. O problema das indenizações: endividamento do erário público para benefício do capital privado. 8. O problema da propriedade fundiária: como indenizar as famílias pelas terras expropriadas sem um regime juridicamente consistente de propriedade? As terras eram exploradas de diversas formas, como terras públicas dominadas por coronéis da política às margens do rio, como terras privadas nos sequeiros, terras devolutas em regime de condomínio sem regularização de títulos e, por fim, antigas sesmarias exploradas por posseiros sem regularização. 9. Nesse regime irregular de terras, a maioria esmagadora da população não foi indenizada, pois o seu direito a terra era consuetudinário, sem validade jurídica para o Estado, que indenizou apenas os grandes proprietários pelo valor da "terra nua" que, geralmente, era avaliada muito abaixo do valor, sem levar em conta os preços inflacionados acumulados ao longo dos anos. 10. Pela distância entre os agentes responsáveis do Estado e do capital industrial privado interessado e os atingidos, as contradições de classe desse processo eram nublados e levavam os camponeses a direcionar sua revolta contra os trabalhadores imediatos que faziam os serviços de execução das obras. 11. Quem pagou pelas soluções dadas pelo Estado aos expropriados foi toda a população brasileira, via impostos, sem contrapartidas do setor privado.
Reassentamentos
1. Para a questão dos reassentados, o autor apresenta as três possibilidades diante
destes: a) se reinstalar na borda do lago; b) tomar parte do projeto de colonização do INCRA ou c) se deslocar para outras regiões do país. Desta última, a maioria se deslocou para regiões próximas, enquanto uma minoria se deslocava para o centro- sul, como São Paulo. A parte dos que não se encaixavam nessas soluções eram os dados como "falecidos" ou de "destino desconhecido". 2. O ideal para aqueles desterrados seria não aceitar a expropriação, mas essa opção estava fora do horizonte de possibilidades. 3. As áreas prioritárias para reassentamento dos expropriados seria as cidades margeando o rio São Francisco, mas o INCRA posteriormente deu como inviável o projeto de colonização da região da margem do lago a despeito da avaliação de viabilidade apontada pela própria população da região, que não eram considerada por considerar uma região de interesse da agroindústria para projetos futuros, privilegiadas na disposição de recursos técnicos e crédito para o seu desenvolvimento produtivo. 4. Aqueles que ainda insistiam em optar pela primeira opção, o reassentamento na borda do lago. Para esses, a CHESF ficou responsável pelas obras de reconstrução de infraestrutura, repartição de terras, apoio financeiro das famílias e transporte de materiais, além do programa de extensão rural para capacitar os colonos. 5. A CHESF não podia, legalmente, transferir os títulos de terras para os colonos, por serem públicas. Para contornar isso, um convênio foi feito com a INTERBRA, mas por interferência política das oligarquias, esses títulos nunca foram entregues. 6. As terras desapropriadas pela CHESF por "utilidade pública", mas por questões de propriedade privada, as cessões nunca foram feitas por receio de que os antigos proprietários reclamassem a posse das terra. 7. Pela sobrecarga de famílias interessadas em ocupar as terras na borda do lago, o INCRA, através dos módulos regionais, não poderia atender a todos os pedidos de reassentamento realizados. 8. Os únicos títulos efetivados se deram por conta das prefeituras. Apenas o município de Casa Nova realizou plenamente os assentamentos. A maioria esmagadora das terras na borda do reservatório são ocupadas por posseiros vulneráveis à desapropriação por grileiros. 9. Por uma série de razões, como a distribuição de terras sem uma consequente distribuição de capital, o arrendamento das melhores terras pelas oligarquias, que valorizavam suas terras com seus melhores recursos e, com isso, contratavam trabalhadores, reproduzia-se, na prática, ainda que em tese os camponeses fossem proprietários das terras, as antigas relações de dependência, pois se reproduzira a concentração de capital, sem uma organização dos pequenos produtores que lhe pudesse fazer frente. 10. Esses pequenos proprietários, fazendo as vezes de posseiros enquanto as terras não eram regularizadas, viviam apreensivos com a grilagem, e a dependência da usura dos comerciantes.
Colonização do INCRA
1. O projeto de colonização mais bem sucedido do INCRA tratava-se da colonização da
serra do Ramalho, que transferiu compulsoriamente 4 mil famílias. 2. O reservatório de Sobradinho foi criado em caráter de urgência por razão da crise do petróleo nos anos 70. 3. Foram as necessidades energéticas do capital industrial que viabilizaram as "soluções" do INCRA. 4. As populações da área a ser desapropriada, de mais de 60 mil pessoas, tinham tradições populares de banditismo, messianismo, etc... precisavam de coerção. 5. Algumas medidas "especiais" foram tomadas para conformar a população: a ocupação integral de produtores incapacitados por idade ou doença; tentativa de reprodução da organização espacial das família de suas antigas vizinhanças; organização da transferência pela comunidade e, por fim, a autonomia dos produtores pra escolher seus itens de cultivo. Apenas uma parte da terra era de cultivo orientado e de uso facultativo.
Conclusões
1. O projeto da barragem foi repleto de atos autoritários e sem qualquer tipo de
diálogo com a população, que se desgastava com os agentes de execução, mais ocupados em fiscalizar o projeto do que em incentivar a produção. 2. Para muitos dos proprietários, esse regime de reassentamento era um "cativeiro". 3. A transferência de terras era custosa para o pequeno produtor, que tinha de gastar com anuidades da operação. 4. O grande beneficiário desse projeto, mesmo, foi o capital industrial e os verdadeiros indenizados foram as oligarquias latifundiárias. 5. As populações trabalhadoras, pagadoras de impostos, foram os credores dessa aventura, sem contrapartida dos beneficiários do grande capital. 6. Mesmo com tantas indignidades, os pequenos produtores provaram ser excelentes benfeitores das terras que tiveram direito, produzindo grandes safras. 7. Na prática, os colonos não tinham a propriedade de suas terras e eram, na verdade, trabalhadores a domicílio subservientes a uma "tecnocracia esterilizadora". Muito mais proveitoso, avalia a autora, seria desburocratizar os regulamentos e dar apoio financeiro e técnico aos colonos. 8. A obra da barragem foi mais uma forma do capital industrial subordinar a produção agrícola aos seus interesses com o auxílio do Estado. 9. A barragem foi um "bem público" para benefício do setor privado. Socialização dos custos e privatização dos lucros. 10. As relações de dominação de classe eram mascaradas, de forma que as verdadeiras autoridades e agentes beneficiários da obra ficavam protegidos da revolta popular que era direcionada aos trabalhadores diretos. 11. O discurso do "desenvolvimento" foi justificador de sacrifícios impostos à população para benefício do capital industrial, aliado de uma legislação capciosa, encobriam as vantagens das quais esse capital se beneficiava. 12. Por fim, a redistribuição das terras beneficiou largamente as oligarquias e a agroindústria, demonstrou que reformas parciais apenas reeditam no médio e longo prazo as antigas relações de posse e produção que se julgava superar.