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PROGRAMA DELNET
DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO LOCAL
UNIDADES
DIDÁTICAS
ADVERTÊNCIA
A utilização de uma linguagem que não discrimine nem marque diferenças entre homens e mulheres
é uma das preocupações da nossa Organização. Porém, tal uso do nosso idioma apresenta soluções
muito variadas sobre as quais os linguistas ainda não chegaram a um acordo. Neste sentido, e com o
intuito de evitar a sobrecarga gráfica que implicaria utilizar "o/a" para marcar a presença de ambos os
sexos, optamos por utilizar o clássico masculino genérico, considerando que todas as menções nesse
género representam sempre todos, homens e mulheres, abrangendo claramente ambos os sexos.
ÍNDICE
Introdução
4. Casos práticos
Caso 1: Gerir riscos e desastres: alguns elementos práticos e concretos para um
desenvolvimento sustentável. Experiência no Leste da Guatemala
5. Bibliografia geral
INTRODUÇÃO
A segunda Unidade Didática introduz de forma mais direta o tema do risco de desastres, as suas
causas, efeitos e relação com o desenvolvimento, o seu conhecimento e prevenção. Devemos estar
cientes, porém, de que as capacidades pessoais e institucionais em matéria de desenvolvimento local
e redução do risco de desastres no território não se adquirem exclusivamente através de um curso
de formação. Trata-se de um processo permanente de aprendizagem, baseado nas experiências, nas
tarefas quotidianas e na conceção e desenvolvimento de novos conhecimentos que importa
implementar, avaliar e aperfeiçoar, para informar processos futuros no sentido de melhorar a
qualidade de vida nos nossos territórios.
À luz destas reflexões, a presente Unidade Didática pretende fornecer aos utilizadores uma
ferramenta de trabalho, que sirva de ponto de partida para prosseguir o aprofundamento de
conhecimentos sobre os temas abordados ao longo dos capítulos e exemplos, numa perspetiva
global de redução do risco de desastres no território adotada no quadro do desenvolvimento local.
Por último, como em todas as Unidades Didáticas, apresentaremos casos práticos relacionados com
os temas e conceitos desenvolvidos. Uma vez concluída a leitura e consultada a literatura
recomendada, sugerimos a realização do exercício de avaliação que lhe permitirá aplicar a teoria e a
aprendizagem adquiridas ao longo do estudo e da interação com os tutores.
► Conhecer e compreender a razão por que se produzem os desastres, o que significa risco de
desastres e quais são os fatores que o geram.
► Gerir e compreender as implicações e interações existentes entre as ameaças e as
vulnerabilidades, bem como os fatores humanos que provocam o aumento ou a redução do
risco de desastres.
► Conhecer as tendências atuais sobre a evolução dos desastres, as ameaças, as vulnerabilidades e
a atitude das instituições em termos organizacionais, para poder analisar e planear com maior
rigor as formas de os enfrentar.
► Adquirir os conhecimentos básicos necessários à promoção do processo de análise e avaliação
do risco como fator fundamental para tomar decisões, elaborar o planeamento, conceber
estratégias e implementar ações no território.
1.1 Generalidades
Se passarmos revista aos acontecimentos dos últimos anos, verificaremos com surpresa quantos
desastres poderiam ter sido evitados se dezenas de milhares de pessoas possuíssem ou tivessem
recebido mais e melhores informações. O desastre provocado pelo tsunami no Oceano Índico, em
dezembro de 2004, que afetou vidas humanas, habitações, ecossistemas e meios de subsistência, é
um exemplo. Os cientistas da região dispunham de tecnologia para registar o violento maremoto
que assolou as costas de Sumatra, mas careciam dos meios necessários para dar informações sobre
as possíveis consequências e as medidas que deviam ser adotadas. Onde os alertas oficiais falharam,
iniciativas particulares deram resultado: em 26 de dezembro, de manhã cedo, Vijayakumar
Gunasekaran, residente em Singapura, ouviu na rádio a notícia do impacto devastador do tsunami.
Avisou por telefone os seus familiares de Nallavadu, na costa oriental da Índia, o que permitiu
evacuar essa localidade e colocar em segurança os seus 3630 habitantes 3.
1 Adaptado de EIRD, Vivir con el Riesgo: Informe mundial sobre iniciativas para la reducción de desastres, Genebra, Suíça,
2004.
2 Center for Risk Research, The Perception of Risk, Estocolmo, Suécia, 1994.
3 Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, Relatório Mundial sobre Desastres,
2005.
EXEMPLOS
Caso: A radiação em consequência de um acidente nuclear
Um exemplo de perceção de risco entre peritos e pessoas leigas 4
O acidente nuclear mais importante até à presente data ocorreu na central de Chernobil em 1986 e
teve um amplo impacto na perceção pública do risco. O acontecimento teve um potencial
catastrófico para as populações em risco, traduzido no número de vítimas mortais imediatas e nas
suas consequências a nível internacional. A população foi involuntariamente exposta a radiação e a
precipitação radioativa. As pessoas sentiram que tinham muito pouco controlo sobre o evento e as
suas consequências. A energia nuclear também é uma tecnologia bastante recente e quem não é
perito sabe seguramente pouco sobre o seu funcionamento. Os pormenores dos efeitos causados
pela radiação na saúde são desconhecidos do público e, até certo ponto, incertos para a ciência.
Antes do evento, as possibilidades e consequências de acidentes nucleares suscitavam muita
controvérsia. Existe uma crença firme na associação entre radiação ionizante e cancro, e o medo
de doenças cancerígenas está generalizado.
Tudo ocorreu sem advertência prévia e o impacto internacional foi inesperado. Os prejuízos
imediatos e a ameaça potencial a longo prazo tiveram um caráter de irreversibilidade mais
acentuado que os efeitos de curto prazo. Oito anos depois, o evento ainda não tinha alcançado o
seu ponto de inflexão, o momento em que a vida retoma a normalidade, ou seja, as condições
existentes antes do acidente nas áreas afetadas da Confederação de Estados Independentes.
Não houve benefícios, só enormes prejuízos. A confiança foi minada, em geral, pela morosidade
da informação sobre a ocorrência e o desenvolvimento do acidente. A comunicação social cobriu
extensamente o evento e, devido ao atraso na chegada de informações genuínas e fiáveis,
espalharam-se rumores prejudiciais que foram transmitidos ao público. Discutiram-se
excessivamente os efeitos sobre a saúde e as consequências para as crianças e foram difundidas
pungentes cenas emotivas de alegadas vítimas.
A Cruz Vermelha alerta para o facto de 2.54 mil milhões de habitantes urbanos a viver em países
de baixo e médio rendimento estão expostos a níveis de risco inaceitáveis. Pela primeira vez na
história da humanidade, mais pessoas vivem em ambientes urbanos do que em rurais e em apenas
20 anos, mais de 60% da população mundial irá viver em cidades e vilas. Uma minoria mais
afortunada irá viver em locais como Turim, Tóquio ou Toronto, onde se uma casa se incendiar ou
for inundada, pode-se chamar ajuda de emergência e esperar ser-se ressarcido pelo seguro. Todas
as pessoas da casa ou do apartamento têm provavelmente o seu próprio espaço e água potável na
torneira. Está-se ligado a um sistema de esgotos e o lixo é recolhido. Uma casa num bairro de lata
é uma onde todas estas coisas estão ausentes. Não há água nem saneamento. O espaço habitável
está lotado e os materiais de construção são de fraca qualidade. E os habitantes não têm segurança
de arrendamento.
4 Center for Risk Research, The Perception of Risk, Estocolmo, Suécia, 1994.
Como indicamos na UD1, Capítulo 3, o risco de desastre é a dimensão provável do dano para
as pessoas e para os seus bens num território ou ecossistema específico (ou em alguns dos
seus componentes) num determinado período ou momento, que está relacionado com a
presença de uma ou várias ameaças potenciais e com as condições de vulnerabilidade ou
com fragilidades que existem nesse meio envolvente. A força ou energia suscetível de ser
desencadeada é denominada "ameaça ou perigo" e a predisposição para sofrer o dano,
"vulnerabilidade".
► Uma ameaça diz respeito à possibilidade de a ocorrência ou concretização de um evento físico
(de origem natural ou humana), potencialmente destrutivo, causar algum tipo de dano em
pessoas, bens e ecossistemas de um território (furacão, sismo, incêndio, explosão, deslizamento,
poluição, etc.).
► A vulnerabilidade diz respeito a um conjunto de características da sociedade, das
infraestruturas, dos meios de subsistência e ecossistemas, que os predispõe para sofrer danos
resultantes do impacto de um evento físico e que dificultam a sua recuperação posterior
(localização inadequada dos aglomerados populacionais, pobreza e falta de emprego digno,
insegurança estrutural dos edifícios, fragilidades organizacionais e participativas, carência de
políticas e mecanismos de prevenção adequados, conhecimentos e recursos limitados, ambiente
e ecossistemas deteriorados ou frágeis, etc.).
Como se afirmou anteriormente, o risco de desastres decorre da função que relaciona diretamente
as ameaças e as vulnerabilidades de um lugar específico ou de um determinado grupo social.
Considera-se que está intimamente relacionado com a realidade de cada sociedade, porque o nível
de risco e os meios para o enfrentar dependem das suas condições, capacidades e recursos.
Diferentes grupos sociais, pessoas, instituições, autoridades e outras entidades podem percecionar
de forma muito diversa o risco de desastres e, por conseguinte, o modo como preparam as suas
capacidades, conhecimentos e competências para os enfrentar. A consciência da perceção do risco
de desastres por parte das comunidades é determinante para desencadear políticas e ações tendentes
à sua redução.
RISCO DE
Ameaça DESASTRES Vulnerabilidade
EXEMPLO
O risco de desastre por deslizamento
num território depende de dois fatores:
► A massa de terra suscetível de se
desprender (ameaça) em
consequência de chuvas torrenciais
que produzem saturação excessiva de
água no solo, em áreas com declive
acentuado e atividade sísmica, que
propiciam a deslocação da massa.
Deslizamento em Nova Friburgo, Brasil
► As características e suscetibilidades
do aglomerado populacional (vulnerabilidade) que pode ser afetado pelo fenómeno: população
concentrada e localizada em áreas inseguras por condições socioeconómicas criticas, ausência
de medidas de proteção, informação inadequada sobre as ameaças, inexistência de ações
preventivas como as que devem ser adotadas em caso de um evento desta natureza e as
possibilidades de recuperação posterior, entre outras.
A criação do risco
As condições de vulnerabilidade de um grupo humano podem originar novos riscos que, por sua
vez, geram novas vulnerabilidades e, consequentemente, novas possibilidades de desastre. Esta
relação de criação do risco de desastres manifesta-se claramente nas cidades africanas. Um
exemplo são as cidades capitais, onde as administrações centrais e municipais investiram na
redução do risco existente em aglomerados humanos situados em locais de multiameaças. O
problema radica precisamente na decisão de orientar as ações de redução sem as articular com as
condições de organização social, pobreza, saúde, serviços urbanos, poluição ambiental, legislação
municipal, relocalização e reordenamento do território afetado.
Um exemplo concreto é a relocalização dos aglomerados humanos situados em zonas de risco ou
após terem sido atingidos por um evento destrutivo. Em muitas ocasiões, a relocalização responde
a necessidades conjunturais originadas por pressões políticas e prima pela ausência de um
verdadeiro plano de ordenamento e planeamento urbano, com uma visão de sustentabilidade, que
estabeleça e respeite a reinserção da população numa nova envolvente em função das suas
atividades económicas, organização social e práticas culturais. Por outro lado, em regra os espaços
desocupados não são concebidos para utilização como áreas de proteção ou conservação,
predominando mecanismos de coordenação interinstitucional, controlos municipais e mecanismos
de prevenção ineficientes. Esta situação traduz-se na invasão ou ocupação desses espaços por
novos setores desfavorecidos, o que gera um novo ciclo de insustentabilidade e de criação
permanente do risco.
5Muitos autores consideram as capacidades dos territórios um elemento fundamental do risco, que influencia a forma e o
grau de resiliência de uma comunidade perante o mesmo. A Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e
do Crescente Vermelho (FICV) desenvolveu amplamente este conceito. Embora também entendamos neste contexto que a
capacidade faz parte da vulnerabilidade (ou resistência), importa insistir em que os recursos naturais são a base que
permitem a um determinado território enfrentar situações adversas. Referir-nos-emos de forma mais específica às
capacidades e aos recursos no Capítulo 3, Avaliação do Risco, desta UD.
O risco de desastres constrói-se socialmente através das atividades que os seres humanos realizam
para desenvolver e habitar o seu planeta em determinadas regiões ou territórios. A forma como
convivemos com o nosso ambiente natural e físico pode ter consequências negativas e gerar
desequilíbrios entre as relações humanas e os ecossistemas que suportam a nossa sobrevivência. Do
mesmo modo que são as nossas ações quem desencadeia situações que podem colocar em perigo a
nossa própria existência, também as nossas atividades podem reduzir, controlar e transformar os
riscos que criamos ou podemos criar.
Está em causa evitar que as atividades sociais se transformem em ameaças para a natureza
e que estas, através dos fenómenos naturais, se transformem em ameaças para as
comunidades.
As ameaças são um fator de risco que vários autores dividem em "riscos naturais" e "ameaças
tecnológicas". Uma classificação mais desagregada proposta por “la Red” 6 inclui uma tipologia que
considera três categorias básicas de ameaça:
• Ameaças naturais: são aquelas cuja fonte de perigo encontra-se na natureza. Principalmente
falamos da dinâmica geológica (sismos e vulcões); chuvas intensas, transbordamentos,
deslizamentos de terra e outros.
• Ameaças socionaturais: onde as ações humanas acrescentam o potencial perigo dos
fenómenos naturais e são mais determinantes na magnitude dos impactos. Fala-se então das
secas, a maioria dos deslizamentos de terra, os incêndios florestais e outros.
• Ameaças antropogénicas: podem ser sub-classificadas em antropogénicas-poluentes: Estas
ameaças estão relacionadas principalmente com processos de contaminação por derrames,
dispersão o emissão de substâncias químicas tóxicas no ar, terra e água, como o petróleo,
pesticidas, gases tóxicos do produto de combustão, os clorofluorcarbonos e poluição nuclear,
assim como processos de eliminação ou armazenagem de resíduos líquidos e sólidos, e em
antropogénicas tecnológicas: são produtos diretos das atividades humanas que incluem
elementos industriais (derrames, explosões), contaminantes e tecnológicas.
A maioria das ameaças naturais não se pode evitar. É possível, no entanto, conhecer e estudar o seu
comportamento histórico e territorial. A ciência, numa abordagem interdisciplinar, continua a
registar progressos e a contribuir com conhecimentos sobre a sua natureza e condições,
principalmente as de origem físico-natural. Os estudos têm procurado encontrar métodos e
ferramentas de análise quantitativa e qualitativa que permitam compreender e realizar projeções,
modelos e cenários sobre a sua incidência. Neste contexto, é importante salientar que, tal como a
EXEMPLO
Os custos humanitários das mudanças climáticas (disponível em inglês)
Este documento, publicado pelo Feinstein International Center, apresenta uma evolução das
ameaças e as suas consequências para as populações em resultado das mudanças climáticas.
A informação técnica e científica constitui, precisamente, o principal fator dinamizador para que os
atores envolvidos na problemática do risco e as autoridades competentes disponham de
conhecimentos válidos e atualizados.
7 Para definições mais completas, ver o glossário apresentado no Guia Quadro Teórico do Curso.
EXEMPLO
Núcleo de Vigilância dos Eventos Ambientais Adversos à Saúde – Estado do Rio Grande
do Sul - Brasil
O setor de vigilância ambiental nos eventos ambientais adversos à saúde tem por competência a
realização das ações de proteção da saúde humana quanto aos efeitos adversos decorrentes de
desastres naturais e acidentes com produtos perigosos. As ações são desenvolvidas nas fases de
prevenção, de preparação e de resposta aos eventos adversos, bem como de monitoramento de
efeitos residuais para a reabilitação da saúde pública.
Exemplos:
• Inundações e deslizamentos resultantes de fenómenos naturais, agravados ou influenciados na
sua intensidade por processos de desflorestação e degradação ou deterioração de bacias
hidrográficas;
• Erosão costeira, agravada pela ação humana, que se traduz na deterioração ou destruição de
zonas húmidas, mangais, dunas e florestas;
• Inundações urbanas provocadas pela localização dos aglomerados humanos, falta de sistemas
adequados de drenagem de águas pluviais ou pela impermeabilização do solo em resultado do
uso de asfalto e da concentração da construção, conduzindo ao aumento do escoamento
superficial para corpos de água (regatos, riachos e rios), o que, por sua vez, reduz e satura a
capacidade de escoamento natural e, por conseguinte, faz transbordar as águas.
O presente artigo tem por objetivo apresentar os principais conceitos associados aos desastres
naturais e destacar a importância da ciência hidrológica na prevenção e mitigação dos desastres
naturais ocasionados pela dinâmica do movimento da água sobre, na e sob a superfície da Terra.
A partir de uma breve revisão bibliográfica os fundamentos conceituais sobre desastres naturais
são definidos e o número de ocorrências oficiais evidenciados quantitativamente por tipo, gênese e
distribuição. Os desastres naturais ocorridos no Brasil são essencialmente de origem
hidrometeorológica, sendo assim analisa-se o papel da ciência hidrológica na prevenção e
mitigação dos mesmos.
São produzidas tanto pelas atividades coletivas como pelas atividades individuais, públicas ou
privadas, devido entre outros fatores à utilização ou falta de recursos e mecanismos apropriados
que garantam a elaboração e/ou aplicação de leis, regulamentações, normas, sistemas de controlo e
acompanhamento, bem como por interesses particulares (geralmente económicos), falta de
sensibilização do público e de conhecimento sobre os riscos eventualmente suscitados por
determinada ação e que podem colocar em perigo a sociedade, os seus bens e os ecossistemas.
EXEMPLOS
Proposta metodológica para caracterizar as áreas expostas a riscos tecnológicos mediante
um sistema de informação geográfico (SIG). Aplicação na comunidade de Madrid1
(disponível em espanhol)
O artigo analisa a definição e caracterização das áreas expostas e aplica um procedimento simples
para definir as zonas potencialmente vulneráveis a riscos tecnológicos no território. Utiliza para o
efeito as funções de cálculo de distâncias de um SIG, o que permite determinar três variáveis:
zonas expostas a algum risco, a intensidade da exposição a riscos em cada ponto e a "probabilidade
espacial" de ser afetado por algum perigo de tipo tecnológico na Comunidade de Madrid
(Espanha).
São condições determinadas por processos ambientais, sociais, culturais, económicos, produtivos,
políticos e institucionais, tanto individuais como coletivos, continuamente produzidos e alterados
pelos comportamentos, atitudes, capacidades, conhecimentos e ações das pessoas e comunidades
que gerem o desenvolvimento e prejudicam os ecossistemas.
Sabemos que a Terra é um planeta vivo, dinâmico e em mutação, sujeito a todo o tipo de
transformações, algumas com expressão repentina e violenta (sismos, maremotos, erupções
vulcânicas, etc.), outras graduais e por vezes impercetíveis na vida quotidiana (mudanças climáticas,
aumento ou diminuição da precipitação, degelo dos glaciares, etc.). Também sabemos que os seres
humanos são criaturas igualmente dinâmicas e em mutação e, por conseguinte, as relações de
interação entre a Terra e os seres humanos podem ser harmónicas e construtivas ou conflituosas e
destrutivas 9.
Quando as interações das práticas políticas, económicas, sociais ou ambientais dos seres humanos
com o nosso ambiente físico e natural apresentam desequilíbrios ou iniquidades, criam-se condições
que nos tornam suscetíveis e vulneráveis perante fenómenos da natureza que podem representar
um perigo para as sociedades. O risco de desastres radica nestes desequilíbrios que é necessário
prevenir, avaliar, gerir e minimizar de forma contínua, para poder construir sociedades mais seguras.
Nos últimos 30 anos, a humanidade evoluiu muito na compreensão de que os desastres não são
consequência exclusiva da ocorrência de um evento físico destrutivo e tomou consciência de que
fundamentalmente são o produto de um conjunto de aspetos relacionados com a falta de adequadas
políticas públicas, das condições socioeconómicas das populações, da precariedade, da construção
deficiente ou sem controlo das infraestruturas e, em geral, das fragilidades da gestão do
desenvolvimento.
Pouco a pouco, o reconhecimento de outros aspetos tão ou mais importantes da vulnerabilidade foi
evoluindo, tomando-se consciência de que existem outros fatores, para além dos físico-estruturais,
que dizem respeito a todas as dimensões do desenvolvimento. Podemos assim falar dos fatores
socioculturais, económico-produtivos, político-institucionais e ambientais da vulnerabilidade, temas
estes a que dedicaremos as páginas seguintes desta Unidade Didática.
SOCIAL
Condições de
vulnerabilidade
POLÍTICO ECONÓMICO
AMBIENTAL
Fig. II, Cap. 1 – A relação entre a vulnerabilidade e os setores económico, social, político e ambiental
Para fins didáticos, vamos analisar a vulnerabilidade nas várias áreas do desenvolvimento local,
advertindo que cada um destes fatores constitui um ângulo particular do seu espetro total, que esses
fatores estão intimamente inter-relacionados e que, no seu conjunto, refletem o panorama geral da
dimensão global da vulnerabilidade. Dificilmente poderíamos entender, por exemplo, os fatores
sociais, sem considerar a sua relação com os fatores económicos e políticos; ou estes últimos sem
tomar em consideração aspetos ambientais, sociais e, novamente, económicos. Nos estudos da
vulnerabilidade e, por conseguinte, da redução do risco de desastres, deve prevalecer uma
abordagem de conjunto, de compreensão integrada da realidade e das lacunas existentes nas
diferentes áreas de desenvolvimento.
Os fatores socioculturais estão relacionados com o grau de bem-estar e qualidade de vida das
pessoas e das comunidades num determinado meio. Incluem aspetos associados ao nível de literacia
e educação; às condições de paz e segurança; ao acesso aos direitos humanos e fundamentais, à
cultura e ao entretenimento; aos sistemas de boa governação, equidade e integração social; aos
valores tradicionais, costumes e convicções ideológicas e aos sistemas de organização coletiva em
geral.
UD2 | Curso de Redução do Risco de Desastres e Desenvolvimento Local Sustentável
Copyright 2011 © Centro Internacional de Formação da OIT 16
UNIDADES
DIDÁTICAS UD 2
Uma comunidade é socialmente vulnerável, se as relações que vinculam os seus membros entre si e
ao conjunto social não passarem de meras relações de vizinhança física e se não existirem
sentimentos partilhados de pertença e propósito, nem formas de organização da comunidade que
encarnem esses sentimentos e os traduzam em ações concretas.
As economias menos diversificadas e dependentes geralmente são mais vulneráveis, porque não
dispõem de mecanismos, reservas ou capacidades para resolver uma situação de crise. Esta situação
é o espelho do que sucede nos países monoprodutores ou nos Estados-ilhas que dependem, por
exemplo, do turismo, da produção de café, banana ou cana-de-açúcar. As pessoas também estão
expostas a um risco acrescido quando é inadequado o seu acesso às infraestruturas
socioeconómicas básicas, que incluem as redes de comunicação, serviços de utilidade pública e
abastecimentos, transporte, água destinada ao consumo humano, saneamento básico e serviços de
saúde.
A população pobre, um grupo demográfico constituído na maioria das regiões por uma proporção
excessiva de mulheres e idosos, geralmente é muito mais vulnerável que os segmentos mais
abastados da sociedade. O mesmo ocorre com a população indígena ou com os povos nativos que,
geralmente, foram desapossados dos seus territórios, recursos naturais e meios de subsistência e
forçados a enfrentar condições de forte vulnerabilidade. Analogamente, quando se produz um
desastre, o mais provável é que as suas perdas sejam proporcionalmente superiores às do resto da
população e que, ao mesmo tempo, a sua capacidade de recuperação seja mais limitada.
► A pobreza endémica.
► A especialização produtiva, a monoprodução e a falta de diversificação produtiva.
► Fragilidades ou carência de recursos e meios de subsistência dignos (produtivos, económicos,
técnicos, oportunidades de emprego, etc.).
► Distribuição e concentração inadequada da riqueza em pequenos segmentos da população ou
em agentes alheios ao território.
► Carência de mercados e de competitividade de produtos dos territórios em áreas geográficas
externas.
► Concentração da posse da propriedade e dos meios de produção em poucas mãos.
► Sistemas económico-produtivos baseados no lucro, que não preveem os seus efeitos futuros
nos danos sociais, económicos e ambientais das pessoas, das sociedades e dos ecossistemas e
no risco de desastres.
► Desenvolvimento de programas e projetos estratégicos nacionais e programas de ajustamento
ou impacto económico que não contemplam os fatores endógenos dos territórios, o seu
impacto negativo em setores específicos e a sua relação com a produção do risco.
► Sistemas de desenvolvimento que geram dependência económica e dívida externa.
► Divisão e localização da população por estratos socioeconómicos ou por profissões e emprego
(formal e informal).
A vulnerabilidade política está relacionada com fragilidades das estruturas democráticas e espaços
de participação e incidência social, por carência de normas, diretrizes ou das correspondentes
estruturas institucionais adequadas para a sua implementação e por ausência de políticas, projetos
ou planos estratégicos coletivos que permitam governar, administrar e regulamentar adequadamente
o território. Está ainda relacionada com deficiências de liderança das autoridades locais, com a falta
de acesso a recursos legais e administrativos, a concentração do poder e a falta de descentralização.
Estruturas institucionais pós-coloniais que ainda evidenciam debilidades técnicas sensíveis, políticas
públicas que não se adaptaram às circunstâncias da realidade atual, aliadas a sérios problemas de
governabilidade, à ausência de formação adequada dos quadros técnicos nas instituições, e a
carência de instituições ágeis, descentralizadas e democráticas, perpetuam os fatores de
vulnerabilidade que, para além de agravarem o risco de desastres, também prejudicam o
desenvolvimento integrado e sustentável dos territórios.
Uma sociedade é vulnerável em termos ambientais, quando a nossa relação com os ecossistemas
põe em perigo a nossa vida e os nossos bens, assim como as capacidades de resiliência desses
ecossistemas para subsistir em condições que possam manter um equilíbrio entre os diferentes
componentes que os constituem, e quando se provocam perturbações graves no seu ciclo normal
de funcionamento. Alguns destes aspetos podem ser a exploração inadequada dos recursos
renováveis e não renováveis; a perda da biodiversidade, a poluição da atmosfera, da água e da terra;
a desflorestação, a gestão incorreta das bacias hidrográficas, a gestão irresponsável dos resíduos,
entre outros.
Uma sociedade também é vulnerável em termos ambientais quando o ambiente físico construído se
transforma num perigo para as comunidades, como acontece, por exemplo, com a densidade
demográfica e a sobrepopulação urbana; o transporte e armazenamento de substâncias perigosas
em centros povoados; a localização dos aglomerados populacionais em lugares propensos a
ameaças, a má qualidade e resistência dos edifícios e deficiências nas linhas de funcionamento vitais
e nas infraestruturas básicas, etc.
A atenção insuficiente concedida à preservação e proteção dos recursos naturais que suportam a
vida e os impactos neles gerados põe em perigo a vida presente e futura, facto que afeta de forma
mais grave e imediata quem depende diretamente do meio envolvente para a sua sobrevivência
Quando diminui o acesso a ar puro, água destinada ao consumo humano e saneamento, quando as
formas de gestão dos resíduos são inadequadas, particularmente em meios densamente povoados e
urbanos, a vulnerabilidade tende a aumentar. O aumento sustentado da vulnerabilidade ambiental,
por exemplo, em condições de perda da biodiversidade, degradação do solo ou de crescente
escassez de água, pode facilmente pôr em perigo a segurança alimentar de pessoas cuja subsistência
depende dos produtos agrícolas, das florestas e pastagens e do meio marinho.
Viver num ambiente poluído implica expor a saúde a maiores riscos. À medida que aumenta a
escassez de recursos naturais, as alternativas à disposição das comunidades vão ficando limitadas, as
suas aptidões para desenvolver soluções que lhes permitam enfrentar situações de risco são
reduzidas, a resiliência local a ameaças ou a sua capacidade de recuperação de um desastre ficam
igualmente diminuídas. Com o tempo, os fatores ambientais podem agravar ainda mais a
vulnerabilidade, porque criam novos padrões de discórdia social indesejáveis e privações
económicas que, eventualmente, forçarão comunidades completas a migrar.
É necessário tomar consciência de que a vulnerabilidade ambiental não pode ser exclusivamente
responsabilidade de um governo ou sequer do Estado no seu conjunto. O problema da nossa
fragilidade perante a evolução da natureza e da história tem as suas raízes nas nossas estruturas
materiais e mentais e é, simultaneamente, uma vulnerabilidade económica, política e social.
10 Organização Pan-Americana da Saúde, ¿Fue el 2005, el año de los desastres naturales?, 2006.
Tradicionalmente, este conceito tem uma conotação material que provém das correntes de
pensamento da engenharia, da arquitetura e do urbanismo. Os aspetos físicos da vulnerabilidade,
embora o seu alcance aumente constantemente, estão principalmente relacionados com
considerações e suscetibilidades que se prendem com as fragilidades do ambiente construído
perante determinadas ameaças. Nesta perspetiva, a vulnerabilidade física pode ser descrita como
"exposição e fragilidade" ou "estar no lugar errado à hora errada". Pode ser determinada por
aspetos como a densidade populacional, a distância, a acessibilidade e a localização de um povoado,
centro urbano ou edifício; bem como por aspetos relativos à conceção, à tecnologia e aos materiais
utilizados para construir as infraestruturas vitais, as habitações, os edifícios e as cidades, bem como
a manutenção e cuidados que se lhes prestam.
Por exemplo, o projeto de gestão do risco na bacia do Rio Buzi em Moçambique, procurou a integração de diferentes
fatores de redução da vulnerabilidade. Uma medida de prevenção, com impacto sustentável foi a implementação de
regulamentos de construção à prova de ciclones durante a reconstrução da infraestrutura pública em vários distritos
moçambicanos. Escolas e edifícios administrativos que tinham sido construídos de acordo com estas instruções,
utilizando simples materiais locais como corda ou arame para proteger os telhados, provaram a sua eficiência.
Durante um ciclone em 2002, apenas os edifícios que haviam sido reconstruídas sem a utilização de técnicas à prova
de ciclone foram danificadas ou destruídas mais uma vez. As regulações de construção foram adotadas pela
administração provincial de Sofala como medida obrigatória para todos os projetos de construção no futuro.
Das condições e segurança com que criamos o nosso habitat físico depende, em grande parte, a
qualidade de vida e, também, a vulnerabilidade ambiental, posto que, por exemplo, um sismo pode
não se limitar a danificar habitações; o mesmo evento destrutivo pode rebentar barragens que, por
sua vez, causam inundações e a destruição de florestas, da flora, da fauna e dos meios de
subsistência. Também pode danificar ou destruir redes ou linhas de funcionamento vitais, romper
tubagens de gás, que provocam explosões, incêndios ou acidentes nas estradas, etc.
Dependendo da vulnerabilidade do nosso meio envolvente, uma única ameaça ou evento destrutivo
pode converter-se numa série de ameaças ou eventos em cadeia, de menor ou maior dimensão, que
provoquem perdas a nível do setor produtivo, serviços, transportes, habitação, saúde e ambiente,
entre outros.
FENÓMENO OU
EVENTO
DESTRUTIVO
AMEAÇAS
VULNERABILIDADES
► Diego Gonçalves, Carmen, Desastres naturais, vulnerabilidade, risco e resiliência, Centro de estudos
sociais da Universidade de Coimbra, 2010.
► TWIGG, J., Good Practices Review - Disaster Risk Reduction: Mitigation and Preparedness in Development
and Emergency Programming, Capítulos 1 e 2, HPN, 2004.
As sociedades são vítimas de desastres cada vez com maior frequência. Muitas vezes, os esforços de
desenvolvimento de uma comunidade são minados por estes eventos, porque as consequências
económicas, políticas, ambientais e sociais da crise podem prolongar-se por muitos anos.
Ainda que nenhum país do mundo seja totalmente seguro, a falta de capacidade para mitigar os
efeitos dos desastres e prevenir a criação de novos riscos e vulnerabilidades continua a constituir
uma carga bastante onerosa para os países em desenvolvimento, nos quais ocorrem mais de 95%
das mortes e se verifica o maior impacto económico dos desastres por referência ao Produto
Interno Bruto.
Na década de 1990, os desastres afetaram 188 milhões de pessoas em média, ou seja, seis vezes a
média de 31 milhões de pessoas afetadas por conflitos bélicos. Segundo Save The Children, no
relatório ¿Un futuro de catástrofes?: El impacto del cambio climático en la infancia – 2007, estima-se que este
número ascenda na atualidade a 250 milhões anuais e que aumentará para 300 milhões nos
próximos anos, 50% dos quais serão crianças. Só em 2007, o número de vítimas de danos pessoais
ou materiais ascendeu a 200 milhões de habitantes, dos quais 160 milhões devido a inundações.
Importa recordar também que, em regra, não se tomam em consideração os chamados pequenos
desastres, pelo que os seus efeitos não figuram nas estatísticas globais e o mais provável é que, no
cômputo geral, as consequências socioeconómicas, humanas e ambientais sejam muito mais
significativas do que as estatísticas nos dão a conhecer.
Em geral, pode afirmar-se que os desastres têm tido um comportamento com reflexos negativos
cada vez maiores nas economias, nos meios de subsistência e no sofrimento das pessoas. Cresce o
número de comunidades afetadas; o número de mortes também aumentou em 2004 e 2005, em
resultado de catástrofes de grandes dimensões como o tsunami no Oceano Índico, os sismos no
Paquistão, na Índia, na Indonésia, no Peru e na China, e os furacões nas Caraíbas e no Golfo do
México, como já vimos. O caso do terremoto de Haiti, com mas de 300.000 mortos num país de 8
EXEMPLOS
Mudança climática e saúde humana – Riscos e Despostas - Sumário revisado 2008
OMS/OPAS OMM-PNUMA
Livreto de consciência ambiental para crianças sobre as florestas e a sua fauna e flora. Esta
publicação visa sensibilizar as crianças para a importância das florestas e a necessidade de as
preservar, promovendo ainda o plantio de novas árvores. Togu e as Árvores da Vida faz parte da
série ambiental Tunza para crianças. Tunza significa tratar com afeto e carinho em suaíli.
Até há pouco tempo, os padrões de intensidade e frequência de ameaças naturais seguiam o ritmo
das variações naturais, das estações do ano, da temperatura mundial e da atividade tectónica.
Atualmente, apesar de a atividade sísmica e vulcânica manter este ritmo de variações a longo prazo,
as mudanças climáticas parecem estar a afetar a frequência e intensidade das ameaças
hidrometeorológicas.
Apesar de ser muito difícil provar cientificamente estas mudanças, as projeções para o futuro são
motivo de apreensão, como o demonstram as conclusões do Painel Intergovernamental sobre as
Mudanças Climáticas (sigla IPCC, do inglês). De certo modo, as sociedades são responsáveis não só
pela sua vulnerabilidade socioeconómica, mas também por criar sempre novas tendências em
matéria de ameaças. De acordo com as projeções, as mudanças climáticas nas próximas décadas,
que supostamente acompanharão o aquecimento global, modificarão com certeza a frequência e
intensidade das ameaças climáticas num grau suscetível de afetar adversamente algumas regiões.
Atualmente, a maioria dos cientistas aceita a existência de problemas relacionados com as mudanças
climáticas. As temperaturas estão a subir em todo o mundo, ainda que os aumentos não se
distribuam uniformemente pelo planeta. À medida que a atmosfera aquece, pode absorver mais
vapor de água, o que se traduz num aumento da humidade. A maior circulação de água no ciclo
hidrológico, daí decorrente, aumenta a precipitação por evento e a variabilidade, bem como a
frequência de extremos climáticos face ao clima atual.
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UNIDADES
DIDÁTICAS UD 2
As sociedades são cada vez mais afetadas pelas variações interanuais do clima, como as associadas
ao fenómeno El Niño/La Niña, que se refletem na precipitação e na temperatura em intervalos
plurianuais que só é possível prever até certo ponto. Estas variações climáticas regionais podem
provocar ameaças hidroclimáticas. A prevalência de secas e inundações que desencadeiam desastres
revela que muitos países são vulneráveis às variações naturais ou extremas do clima.
Muitos fenómenos naturais que, até há alguns anos, eram considerados variações normais do clima
e das estações do ano, converteram-se em ameaças devido a intervenções humanas. Estas
aumentaram a suscetibilidade face a determinados fenómenos naturais como, por exemplo, a
vulnerabilidade face às chuvas normais do ano, que provocam agora inundações frequentes em
extensas zonas urbanas do planeta, em resultado da carência de áreas verdes para absorver a água,
da falta de sistemas de drenagem apropriados e da cobertura do solo com asfalto.
O mesmo ocorre perante sismos de menor intensidade, ventos, deslizamentos e outros fenómenos
que, décadas atrás, não eram considerados perigosos para as comunidades humanas, mas que o são
agora devido aos padrões dos aglomerados populacionais, às práticas produtivas e às características
do meio físico construído.
EXEMPLO
População e mudança climática: Dimensões humanas das mudanças ambientais globais
A compreensão mais robusta da mudança climática, a partir de uma perspectiva populacional, demanda
conhecimentos oriundos do diálogo entre as dimensões climáticas, ambientais, sociais, políticas,
econômicas e demográficas que devem ser relacionadas a processos e políticas nos níveis locais,
regionais e internacional. O livro em questão traz uma importante contribuição à comunidade científica
interessada nas dimensões humanas das mudanças climáticas e oferece um cardápio cheio de
abordagens, conceitos e métodos, além de agendas de pesquisa a serem perseguidas pelos estudos em
ambiente e sociedade e população e ambiente.
Como afirmámos ao longo da primeira Unidade Didática, em muitos países e regiões do mundo, o
aumento da vulnerabilidade está relacionado com:
► A distribuição desigual da riqueza e da produção, que se caracteriza, entre outros aspetos,
pelo aumento da pobreza e da urbanização descontrolada, que leva a que os aglomerados
humanos e a atividade produtiva dos setores menos favorecidos se alargue a locais de risco
(zonas de inundação, encostas instáveis e com grande declive, zonas húmidas, de conservação e
controlo especial e com ecossistemas vulneráveis).
► O impacto negativo do desenvolvimento nos ecossistemas locais e regionais e nas
comunidades rurais e urbanas, através de práticas que minam as suas capacidades de
autoajustamento e sobrevivência para o futuro, como a gestão inadequada das bacias
hidrográficas, costas e margens dos rios, a desflorestação, a poluição, a gestão dos recursos não
renováveis, o aquecimento global, etc.
► Desajustamentos culturais e sociais nos territórios, através de fatores que aumentam as
vulnerabilidades da população e reduzem as suas capacidades para enfrentar o impacto dos
desastres. falta de informações oportunas e verdadeiras; perda da identidade e memória
histórica das comunidades; introdução de práticas culturais exógenas em detrimento das
tradicionais; falta de organização, violência e insegurança urbana; marginalização e exclusão
social, falta de acesso aos serviços básicos e adequados, etc.
► Fragilidades de governação, que se expressam na falta de participação dos cidadãos, na
concentração do poder em estruturas nacionais sem que se promovam processos de
descentralização, no mau funcionamento dos sistemas institucionais de prevenção e vigilância
de desastres, na ausência ou deficiente planeamento preventivo (análise do risco,
prevenção/mitigação de desastres), na inexistência de normas, mecanismos de
acompanhamento, estratégias e ferramentas metodológicas e tecnológicas, etc.
► A crise mundial, originada em países industrializados com repercussões graves nos países em
desenvolvimento, em especial nos setores mais vulneráveis, gerando desemprego, perda de
mercados, restrições económicas, concorrência desleal em resultado de subvenções a grandes
grupos económicos, endividamento, dependência e maior pobreza, que se traduz numa maior
vulnerabilidade das populações para enfrentar situações adversas, crises e a recuperação pós-
desastre.
EXEMPLO
Vulnerabilidades das megacidades brasileiras às mudanças climáticas: Região
Metropolitana de São Paulo
Este documento refere-se a projeções climáticas até 2100 para a região, além de dados e análises
que mostram os impactos e vulnerabilidades atuais e projeções para 2030, através da aplicação de
um modelo de projeção de mancha urbana associado ao modelo “Hand”. Esse estudo de paisagem
permitiu identificar as possíveis áreas que seriam ocupadas no futuro e o risco potencial, caso o
padrão de uso e ocupação do solo atual se perpetue sem nenhuma alteração e controlo.
► Ausência de planeamento do desenvolvimento, facto que constitui uma das causas mais
importantes do crescimento rápido e não regulamentado das zonas de aglomeração, que se
caracterizam, precisamente, por uma elevada vulnerabilidade face a fenómenos naturais
extremos. O crescimento urbano descontrolado e sem oportunidades levou a que as 100
cidades mais povoadas do planeta sejam as que estão mais expostas a desastres. Mais de três
quartas partes estão expostas a algum tipo de ameaça natural e em 70 delas há a possibilidade
de ocorrer um sismo de 50 em 50 anos. 12 Muitas cidades situadas em zonas de baixo risco
aumentam a sua vulnerabilidade à medida que os solos urbanos se vão esgotando, a
propriedade se concentra em setores especulativos, as novas urbanizações são implantadas em
locais inseguros, não se aplicam as regulamentações e normas adequadas ao seu
desenvolvimento, etc. É evidente que os desastres contribuem ainda mais para o aumento da
pobreza. De facto, em muitas regiões ameaçadas, os desastres provocaram um aumento
dramático do número de pessoas afetadas pela fome; foi esse o caso nas Honduras e na
Nicarágua, por exemplo, após a passagem do furacão Mitch em 1998, e em El Salvador e na
China, após os sismos de 2001 e 2008, respetivamente.
► Concentração das principais atividades económicas e produtivas nas capitais ou em seu
redor, coincidindo com a localização de grandes aglomerados populacionais. Quase metade da
população do planeta vive em zonas costeiras e treze das maiores cidades do mundo estão
implantadas na costa. A concentração das infraestruturas industriais e outras instalações
importantes contribui para piorar a situação. As redes de comunicação e de transportes e as
infraestruturas educativa e sanitária são cada vez mais vulneráveis aos efeitos das ameaças.
Os corredores comerciais também estão cada vez mais vulneráveis. Por exemplo, o furacão
Mitch, na América Central, interrompeu durante duas semanas o mercado intrarregional devido
aos danos rodoviários que provocou, e o fenómeno El Niño, em 1997-98, cortou centenas de
ramais da estrada que liga o Peru ao Equador. Importantes aspetos do desenvolvimento das
regiões, países ou territórios dependem da sua resiliência aos efeitos dos desastres.
► Os efeitos da globalização sobre os padrões de vulnerabilidade são fundamentais para
estabelecer a presença de novas tendências no risco de desastres. Regra geral, a aplicação de
medidas de ajustamento económico para fomentar o aumento da eficiência e a competitividade
global tem provocado uma contração do mercado laboral. A perda de rendimento pode
aumentar a vulnerabilidade das pessoas ao risco de desastres. Na África do Sul, por exemplo,
entre 1996 e 2000, perderam-se mais de 500 mil postos de trabalho do setor formal. Entre 1997
e 2000, mais de 140 mil pessoas perderam o emprego e 50 mil trabalhadores, na sua maioria
mulheres, tiveram de abandonar o trabalho no setor têxtil (EIRD, 2004).
► A atual crise financeira à escala mundial provocará a perda de milhares de postos de trabalho.
Em países industrializados como a Espanha, por exemplo, o desemprego atingiu os 20% e já
conheceu a sua maior contração em 40 anos 13. Os EUA registaram a maior quebra da
economia em 60 anos e outros países desenvolvidos sofreram consequências dramáticas nas
suas economias e nas suas estruturas sociais e produtivas (Alemanha, Japão, Inglaterra, França,
etc.), que terão um impacto negativo nos países mais frágeis com economias e mercados
dependentes, aumentando as vulnerabilidades e reduzindo as capacidades de resiliência face a
possíveis desastres.
► A especialização produtiva versus diversidade produtiva, a velocidade das alterações
tecnológicas e culturais, entre outros fatores, converteram-se numa ameaça para o saber
tradicional. À medida que os meios de subsistência locais vão sendo substituídos por sistemas
exógenos, melhor adaptados à procura externa que ao fortalecimento da economia local, é
muito provável que aumente a vulnerabilidade económica. O MST, o Movimento dos
Sem-Terra do Brasil, difundiu dados eloquentes que também se aplicam a outros países: a
EXEMPLOS
Riscos Emergentes no Século XXI
O Programa Internacional da OCDE para o Futuro acaba de publicar um relatório que analisa as
repercussões deste desenvolvimento sobre a economia e sociedade no século XXI, enfocando
particularmente a possibilidade de sistemas maiores se tornarem mais vulneráveis no futuro.
Serviços de saúde, transporte, energia, abastecimento alimentar e em água, informação e
telecomunicação, todos são exemplos de setores com sistemas vitais suscetíveis de ser seriamente
prejudicados por um único evento catastrófico ou por uma cadeia de eventos. Tais ameaças
podem ser oriundas de fontes muito diversas, mas o relatório enfoca cinco grupos de riscos
principais – catástrofes naturais, acidentes tecnológicos (ou industriais), doenças infeciosas,
segurança alimentícia e terrorismo.
Antes da década de noventa do século passado, a prática em torno da redução do risco de desastres
concentrava-se sobretudo no atendimento da emergência, na resposta aos desastres e, nalguns
casos, nas medidas de preparação. A prevenção e a mitigação, ainda que pudessem ser consideradas
ações e abordagens necessárias e prudentes, não foram objeto de atenção por parte dos governos
nem da sociedade no seu conjunto. Nos países mais avançados neste âmbito, tais ações
concentravam-se principalmente na mitigação de ameaças, com medidas de engenharia estrutural
(diques, muros de contenção, reforço de construções, etc.) e com ações esporádicas de relocalização
de comunidades situadas em zonas de risco.
As causas e os agentes sociais que geram o risco de desastres podem ter uma localização territorial
muito diferente e distante daquela em que se produzem as vulnerabilidades e se concretizam as
ameaças através de eventos que provocam desastres: a desflorestação e a urbanização nas zonas
altas das bacias hidrográficas causam inundações em zonas baixas; a descarga das barragens afeta
áreas distantes da sua origem; as decisões sobre políticas ambientais, económicas ou sociais de nível
global ou regional podem ter um impacto local e familiar, longe das instâncias onde foram tomadas
as decisões, como aquelas que provocaram a atual crise estrutural global.
Os agentes geradores do risco de desastres estão muitas vezes pouco conscientes (ou não querem
tomar consciência) dos efeitos que as suas decisões têm em territórios distantes, na vida das pessoas
e nas perturbações que provocam nos ecossistemas e no ambiente. Eis alguns exemplos: o efeito do
aquecimento global, produzido em grande parte por emissões de gases nos países industrializados, e
as suas consequências para as mudanças climáticas e para os países em desenvolvimento; a
execução de megaprojetos decididos em instâncias nacionais, como barragens, estradas, portos,
aeroportos, etc., que se refletem em transformações que tornam mais vulneráveis as atividades e as
condições dos territórios; a desflorestação da floresta tropical para a criação de gado, a produção de
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biocombustíveis ou a agricultura intensiva que diminui a biodiversidade com consequências
negativas nos ambientes envolventes globais e nas populações locais.
Os elementos que entram na criação do risco de desastres num território são diversos e foram
mencionados nos capítulos anteriores desta e de outras Unidades Didáticas. Para recordar que a
produção do risco de desastres deriva tanto de agentes endógenos como exógenos, mencionaremos
seguidamente alguns fatores macro dos processos de desenvolvimento que tiveram expressões
territoriais na produção do risco de desastres.
Em todo o mundo, o município constituiu-se como a expressão administrativa local por excelência,
mas não a única. Outras expressões territoriais se impuseram como, por exemplo, a região, a bacia
hidrográfica, as comunidades intermunicipais (nacionais e transfronteiriças), as grandes cidades e as
suas áreas metropolitanas, etc. Estes territórios partilham ameaças e vulnerabilidades que devem ser
abordadas numa perspetiva de conjunto para que a redução do risco de desastres seja eficaz.
A primeira premissa sobre a redução territorial do risco é que a prática não pode ser divorciada
dos quadros, processos, objetivos e planeamento do desenvolvimento nos níveis nacionais,
setoriais, regionais e locais; inclusivamente, dependendo de cada realidade, também não pode ser
encarada à margem de processos mais globais. A gestão das bacias de rios com grande diversidade
de territórios que fazem parte da geografia física de áreas extensas e de diversos ecossistemas ou de
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mais que um país, como é o caso, por exemplo, do Amazonas, do Nilo, do Zambeze e de outros
grandes rios, não pode ser encarada na perspetiva de um só país/território, devendo ser uma ação
concertada entre os países que partilham o território dessas bacias.
Com esta noção de redução do risco de desastres pretende-se um processo cujo impulso,
concretização e apropriação é territorial, se realiza através dos agentes locais, com as capacidades
locais e, na medida do possível, com os recursos locais. A comunidade local representa sujeitos
sociais que se relacionam, refletem ou identificam com o nível territorial no âmbito das suas tarefas
diárias, produtivas ou familiares e têm sentido de pertença a esses níveis.
Em suma, requer-se uma entidade de coordenação eficaz, encabeçada pelas autoridades locais, que
realize o seu trabalho fundamental através de organismos dotados de funções de desenvolvimento
local que integrem o setor público e a sociedade civil, possivelmente em colaboração com o setor
privado.
A redução do risco de desastres é um processo social complexo que tem por finalidade última
a redução ou a previsão e o controlo permanentes do risco na sociedade.
Os projetos sobre desastres a nível local costumam contemplar, quase sempre, a análise, a
cartografia ou a sistematização das informações sobre as ameaças e, por vezes, as vulnerabilidades.
Em muitos casos, porém, este tipo de análise assume características estáticas, sendo os fatores de
risco de desastres encarados como produtos ou circunstâncias existentes, já inscritos na localidade,
sem se analisar a história ou os processos que os explicam ou os atores sociais, com as suas
capacidades próprias, que os impulsionam, ou seja, são considerados à margem dos processos de
desenvolvimento.
Existe ainda a prática de promover uma análise separada das ameaças e vulnerabilidades sem
estabelecer com rigor a relação dinâmica entre elas e as formas como se reforçam e determinam
mutuamente (o Capítulo III desta UD analisará mais detalhadamente o tema). O risco objetivo e
subjetivo raramente é tratado e quase nunca se procura estabelecer os nexos causais entre ameaças,
vulnerabilidades e, por fim, o próprio risco, e os processos de transformação ou de
desenvolvimento previstos a que o território possa estar sujeito.
A visão de sustentabilidade nos processos de redução do risco de desastres a nível local radica
justamente na passagem de uma visão conjuntural ou de um projeto concreto para um processo
contínuo de desenvolvimento que integre o risco como eixo transversal das ações, processo esse
que deve ser impulsionado pelas autoridades locais e/ou pelos atores fundamentais através de
estruturas organizacionais e institucionais próprias, a quem compete angariar e coordenar o apoio
de múltiplas instâncias organizacionais, sejam elas locais, regionais, nacionais ou internacionais, em
função de uma visão de estratégia concertada a partir das necessidade, capacidades e recursos do
território.
A importância da redução do risco de desastres no âmbito territorial adquire cada vez maior
relevância, porque, em muitas sociedades vulneráveis, não é possível promover processos de
desenvolvimento sustentável sem se considerar o efeito negativo dos desastres.
FATORES DE
RISCO
AMEAÇAS
• NATURAIS
ANÁLISE DAS
• SOCIONATURAIS AMEAÇAS E CONSCIÊNCIA APLICAÇÃO
• ANTROPOGÉNICAS VULNERABILIDADE DE MEDIDAS
S DE REDUÇÃO
VULNERABILIDADES
CONHECIMENTO DO RISCO DE
• ECONÓMICAS
DESASTRES
• POLÍTICO-ADMINI ANÁLISE E
STRATIVAS IDENTIFICAÇÃO DO
COMPROMISSO
• AMBIENTAIS RISCO DE
• SOCIAIS DESASTRES
EVENTO
TERRITÓRIOS POTENCIALMENTE TERRITÓRIOS E
FRÁGEIS, DESTRUTIVO COMUNIDADES
VULNERÁVEIS E SISMO MAIS SEGURAS E
INSEGUROS FURACÃO RESISTENTES
INUNDAÇÃO
ACIDENTES
POLUIÇÃO
RIESGO
RISCO
DESASTRE ACEPTABL
GERÍVEL
E
► GUHA-SAPIR, D.; HARGITT, D. e HOYOIS, P., Thirty Years of Natural Disasters, 1974-2003.
The Numbers, Centre for Research on the Epidemiology of Disasters (CRED), UCL, Bélgica,
2004.
► Nobre, Carlos A.; Sampaio, Gilvan; Salazar, Luis, Cenários de mudança climática para a América do
Sul para o final do século 21, Parcerias Estratégicas, 2008.
► Existe um impacto crescente e alarmante dos desastres nos bens, economias, meios
de subsistência e ambiente do nosso planeta, mas também no sofrimento das
pessoas e na perda de vidas humanas.
► Prevalece nas instituições e nas políticas territoriais a tendência para agir perante os
efeitos dos desastres e não para atuar nas causas estruturais que produzem os
riscos.
O presente capítulo tem por finalidade introduzir o processo de avaliação do risco de desastres
como passo necessário e fundamento de qualquer estratégia que tenha por objetivo garantir a vida e
os bens de uma comunidade através da consolidação de territórios, programas, projetos e
estratégias resilientes perante situações adversas ou de crise. O conhecimento do risco de desastres
é a base operacional de uma cultura de prevenção.
O conteúdo deste capítulo não pretende ser exaustivo nem, de forma alguma, uma metodologia
modelo, antes procura fornecer elementos para compreender os principais passos a dar e os aspetos
a considerar num processo de avaliação do risco de desastres no quadro de contextos e estratégias
mais integrados de desenvolvimento.
A avaliação do risco deve cumprir um objetivo específico e pode estar orientada para atividades em
curso ou em fase de projeto, que exijam conhecer o grau de risco existente ou suscetível de existir
no seu desenvolvimento face a possíveis acontecimentos perigosos e fatores de vulnerabilidade,
com a finalidade de determinar e priorizar as medidas a adotar com vista a garantir a segurança de
vidas, bens e ecossistemas.
Antes de realizar a avaliação do risco de desastres, é ainda necessário rever as abordagens sobre o
risco de desastres que vêm sendo desenvolvidas e que devem estar presentes num processo
integrado numa perspetiva de sustentabilidade. Para esse efeito devemos tomar em consideração a
necessidade de:
► Controlar e corrigir os riscos e graus de exposição acumulados, através de medidas
destinadas a reduzir a vulnerabilidade e as fragilidades existentes nas diferentes dimensões do
desenvolvimento: social, económica, política e ambiental, como, por exemplo, limitando a exposição da
comunidade aos perigos físicos existentes por meio de medidas estruturais de proteção e fortalecimento do ambiente
construído (diques, terraços, muros de contenção, estabilização de encostas, reforço de habitações e edifícios, etc.);
reduzindo as vulnerabilidades e estimulando o aumento da resiliência e a diversificação dos sistemas produtivos
perante fenómenos naturais ou antropogénicos; fortalecendo a tomada de consciência e o papel das autoridades,
bem como a concertação dos atores locais, estabelecendo mecanismos administrativos, uma afetação de recursos e
uma regulamentação territorial efetivos para a gestão do território e dos recursos naturais; melhorando as
condições de vida, criando emprego digno e reduzindo a pobreza.
► Reduzir e prevenir a criação de novos riscos no futuro, controlando os processos de
desenvolvimento através da adoção de medidas de prevenção destinadas a impedir novas
vulnerabilidades, por exemplo, através da integração da abordagem de risco como eixo transversal do
desenvolvimento e da sustentabilidade dos planos estratégicos nos projetos de investimento (em execução ou em
fase de projeto), nas políticas públicas e nas tarefas quotidianas de um território e das pessoas. A tomada de
consciência, a vontade política, a criação de capacidades, a formação de pessoal e a afetação de recursos humanos
e materiais são vitais para poder promover medidas que evitem ou minimizem a criação de novos riscos.
► Preparar-se para enfrentar a resposta e a emergência, com o fim de garantir que a
organização, os sistemas, os procedimentos, os recursos e as capacidades necessárias estejam
disponíveis e funcionem adequadamente no momento da emergência, com vista a assegurar
uma assistência eficaz à população, o resgate de vidas humanas e a recuperação e reabilitação
dos serviços básicos pós-desastre. Planos de preparação, sistemas de alerta precoce, formação e
sensibilização das autoridades e das pessoas, simulações, concertação entre os atores territoriais, organização da
população, coordenação interinstitucional e intersetorial, mitigação de possíveis efeitos das ameaças e redução das
vulnerabilidades, etc. são algumas das tarefas que se podem realizar no âmbito da preparação para uma situação
de desastre.
► Integrar uma visão evolutiva e transformadora no desenvolvimento das nossas ações e
no período pós-desastre, mediante a promoção de abordagens destinadas a encontrar novas
formas de desenvolvimento e de redução do risco de desastres para implementação nas nossas
comunidades que permitam alcançar maiores níveis de sustentabilidade. Nos processos pós-desastre,
encontrar alternativas que permitam evoluir e transformar positivamente as ações de desenvolvimento no sentido
de impedir a recriação do risco. As ações implementadas para reduzir o risco de desastres devem ser direcionadas
para contribuir e fortalecer processos de desenvolvimento em curso no território e não para se centrarem apenas
A análise do risco de desastres é uma metodologia que identifica e avalia possíveis danos e perdas
(de vidas humanas, meios de subsistência e postos de trabalho, envolventes físicas e ambientais,
etc.) perante o impacto de um fenómeno perigoso, num dado período e espaço, que apresenta
determinadas condições de vulnerabilidade. Visa analisar e conhecer o território, as suas ameaças e
vulnerabilidades.
A avaliação ou análise do risco de desastres procura oferecer segurança à população, aos seus bens,
meios de subsistência e ecossistemas através do conhecimento dos fatores que o originam para, de
forma planeada e concertada, tomar e priorizar decisões e aplicar medidas destinadas a reduzir os
fatores de vulnerabilidade através de ações de prevenção, mitigação, preparação, reabilitação e
reconstrução pós-desastre.
Figura 1:
O conceito de análise
de risco segundo o
Manual da GTZ: A
análise de risco – Uma
base para a gestão do
risco de desastres
naturais.
Se bem que as autoridades locais ou nacionais sejam as principais responsáveis por garantir a
segurança das pessoas, dos bens e dos sistemas; por aplicar as medidas adequadas nesse sentido,
tomar iniciativas e promover processos de RRD, elas não podem ser as únicas instâncias
envolvidas. Sindicatos, investigadores, comunidades, funcionários públicos e privados, empresários,
ONG, entre outros, podem promover processos de redução dos perigos potenciais que ameaçam a
sociedade e promover iniciativas de avaliação do risco de desastres, uma vez que está em jogo a sua
segurança e o acervo das suas comunidades.
As informações obtidas através da análise técnica do risco de desastres permitem definir políticas
imparciais, determinar os recursos necessários e desenvolver ações pertinentes nesse sentido.
Quando se passa dos níveis estimados de risco de desastres para a definição de níveis "aceitáveis"
ou geríveis, importa ter em consideração um conjunto de raciocínios e de valores que subordine
essas ações a uma finalidade derradeira: a prioridade da vida humana e da proteção dos
ecossistemas que suportam a nossa existência.
O princípio da segurança humana deve prevalecer nas políticas e nas decisões que se
tomem e implementem nesse sentido.
► Elaboração de mapas simples com métodos manuais e tradicionais, bem como através da
utilização de ferramentas mais sofisticadas como os Sistemas de Informação Geográfica
(SIG), baseados em programas digitais, para a elaboração de mapas temáticos e a
microzonificação de ameaças e vulnerabilidades específicas.
Por exemplo: o uso inadequado de programas de SIG digitalizados pode ampliar a lacuna existente entre a
informação que se obtém mediante a avaliação técnica do risco e as formas como é percecionada pelas pessoas. Isso
significa que os níveis "aceitáveis de risco" podem variar consoante os pontos de vista sobre o risco objetivo
de desastres versus o risco percecionado. O bom uso de sistemas sofisticados de análise de informação dependerá
da clareza, dos níveis de participação, do acesso à informação, da formação, das capacidades técnicas locais e do
destino a dar a tal informação que os atores sociais e as autoridades locais tiverem decidido.
Se existir clareza e consciência, desde o início da avaliação do risco, sobre aquilo que se pretende alcançar com a
informação e se a sua recolha incluir mecanismos de capacitação/formação das pessoas envolvidas no processo, sem
dúvida que estas técnicas podem ser muito úteis. Até os métodos mais sofisticados, como os SIG, que utilizam
imagens de satélite e programas informáticos podem ser apropriados, se forem acessíveis e manuseados de acordo
com as necessidades locais.
É importante tomar em consideração no uso dos SIG que estes permitem não só cartografar as ameaças ou as
expressões geofísicas de um território, mas também as vulnerabilidades, bem como um conjunto de dados de
caráter social, económico, político, institucional, ambiental, etc. A cartografia das vulnerabilidades é essencial para
determinar que relações têm com as ameaças e para calcular o risco de desastres.
A avaliação do risco tem por objetivo central proporcionar informações objetivas e técnicas que
permitam projetar os níveis de risco de desastres num determinado território, perante um ou vários
eventos perigosos, com vista a identificar, planear e implementar as medidas adequadas destinadas à
construção de sociedades mais seguras e resilientes.
O presente relatório apresenta resultados referentes à avaliação institucional das capacidades de gestão
de risco de calamidade em Moçambique. É neste quadro e no âmbito do Netherlands Climate Change
Studies, Fase II do Programa de Assistência, que se insere o presente documento.
Desde a sua modesta origem, há apenas 30 anos, os Sistemas de Informação Geográficos (SIG)
converteram-se numa ferramenta poderosa de grande alcance na atual infraestrutura cibernética,
proporcionando um quadro que permite analisar e entender melhor o nosso mundo.
Esta hiperligação permite aceder a um conjunto de documentos desenvolvidos pela GTZ para a região
de Piura, no Peru, que introduzem a redução do risco de desastres numa perspetiva integrada.
Desenvolve um conjunto de ferramentas práticas, entre elas, uma ferramenta específica para a análise
do risco.
Mais do que um somatório de palavras, esta reflexão deve ser uma prioridade em qualquer
município ou território que realmente pretenda planear o desenvolvimento. Quem trabalha nesta
área sabe quão difícil é aceder a bases de dados, encontrar planos, mapas, fotografias, documentos,
estatísticas ou outras informações atualizadas que sirvam de referência, bem como também quão
maçadores podem ser os processos institucionais quando se trata de solicitar este tipo de
informação, independentemente de se tratar de organismos nacionais, regionais ou locais.
Esta informação é básica para podermos efetuar uma avaliação do risco e, sobretudo, projetar as
ações destinadas à sua redução numa base territorial. Não se pode partir exclusivamente da
perspetiva do risco quando falamos de desenvolvimento, pois este tem de estar integrado num
ambiente específico e em processos reais.
Cada território ou município deve possuir o seu próprio sistema de informação como base de
análise de todas as atividades do desenvolvimento, incluindo a redução do risco de desastres, o qual
deve estar em constante revisão, atualização e avaliação. No quadro seguinte apresenta-se um
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exemplo do Sistema de Informação do Território de Genebra, como modelo de uma boa prática a
seguir e a implementar, não só para a RRD, mas também para todas as atividades do
desenvolvimento.
EXEMPLO
O Sistema de Informação do Território de Genebra (SITG) (disponível em francês)
O SITG é uma associação formada inicialmente por iniciativa de três serviços da administração de
Genebra, Suíça: os serviços de agricultura, cadastro e gestão do território. Tinha por objetivo a
partilha, o intercâmbio e a divulgação dos dados georreferenciados, em formato digital, relativos ao
território do Cantão de Genebra (municípios).
Atualmente, o SITG reúne os principais atores públicos da gestão do território, entre outros: o
Governo de Genebra 15, as cidades e os municípios de Genebra, o serviço industrial, os transportes
públicos, a Fundação de terrenos industriais, os serviços Web e de dados segundo formatos
padronizados.
A análise das ameaças, por si só, já constitui um avanço no processo de planeamento e redução do risco. Permite
projetar melhores obras de engenharia, ordenar o território, potenciar o uso dos solos, evitar futuros desastres, etc.
Em zonas expostas a inundações, por exemplo, deveria limitar-se a implantação de aglomerados humanos. Deveria
realizar-se sempre uma análise das ameaças antes de construir sistemas de tratamento de águas residuais, habitações,
indústrias que utilizem materiais tóxicos ou perigosos, etc.
Existem diversas metodologias e ferramentas de avaliação das ameaças, que variam consoante o
objetivo da análise e as variáveis do trabalho.
15 A Suíça é uma confederação que reúne vinte e seis cantões ou estados com legislação própria. Genebra, Zurique, Berna, Neuchâtel e
Competirá a cada território definir o grau de dificuldade ou a metodologia que pretende utilizar na
avaliação das ameaças em função da dimensão do estudo, bem como das necessidades, capacidades
e recursos locais.
EXEMPLOS
Análise qualitativa de eventos de precipitação intensa na bacia do Gregório, São Carlos
Este artigo analisa o perfil da distribuição temporal de precipitações de média a alta intensidade na
área urbana do município de São Carlos de acordo com alguns parámetros inter-relacionados. É
abordada a caracterização de tais eventos para avaliar a relação dos mesmos com as enchentes
urbanas que causam graves consequências sociais,económicas e ambientais. O Brasil gasta
anualmente mais de U$ 1 bilhão (MCT/CGE,2001) com os impactos decorrentes de inundações
urbanas o que comprova a urgência da necessidade de tais estudos. A falta de um sistema de alerta
e prevenção de enchentes urbanas acessível à população é um dos principais fatores que
intensificam a magnitude de tais tragédias. Este trabalho tem por objetivo trazer a público uma
forma de classificação simples que caracteriza as chuvas que mais causam inundações na região. O
intuito é gerar uma espécie de senso comum na população e nos órgãos competentes com relação
a interdependência dos cenários em que é mais provável que tais catástrofes ocorram e como estas
se distribuem temporalmente.
As evidências apresentadas neste estudo mostram que as mudanças climáticas estão provocando
impactos cada vez mais acentuados em megacidades como a do Rio de Janeiro. Este estudo se
refere ao aumento do nível do mar associado a eventos de precipitação intensa. Segundo o IPCC
(2007), eventos extremos têm aumentado em frequência e severidade nos últimos anos. Tais
eventos têm gerado sérios problemas relativos a riscos de enchentes e inundações. Desse modo, o
Centro de Ciência do Sistema Terrestre (CST/INPE), o Núcleo de Estudos de População
(NEPO/UNICAMP) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) têm desenvolvido
metodologias para identificação das áreas vulneráveis na cidade do Rio de Janeiro, através do
Este documento pretende caracterizar as situações em que se deve avaliar os riscos profissionais,
classificar as metodologias de AR, apresentar o método de avaliação do risco de acidente por
Agentes químicos e apresentar o método integrado de avaliação de riscos.
A probabilidade de uma ameaça se converter num fenómeno destrutivo varia de um território para
outro em função das características da sua configuração e das vulnerabilidades existentes. A
utilização de ferramentas geográficas permitiu transpor os resultados das análises das ameaças para
representações gráficas sob a forma de mapas. A representação espacial tem a vantagem
fundamental de permitir aos responsáveis técnicos e políticos visualizar o comportamento do
objeto de estudo num local específico e em concordância com as condições do local ameaçado.
A clareza e a facilidade de compreensão por parte dos diferentes utilizadores são fundamentais para
a informação espacial expressa por meio de cartografia (digital ou impressa).
Cada conteúdo do mapa tem um significado. Por exemplo, num mapa podem representar-se vários
tipos de ameaça e visualizar o comportamento espacial. É necessário utilizar simbologias e
classificações simples (ameaça elevada, média ou baixa).
Exemplos:
• As zonas propensas a inundações classificam-se em geral por profundidade (elevada ou baixa),
tipo (águas tranquilas ou de alta velocidade) ou frequência.
• No caso das ameaças vulcânicas, pode definir-se o ordenamento territorial de cada zona direta
ou indiretamente ameaçada a partir da intensidade, do alcance e da frequência dos fenómenos
ou de uma combinação dos três fatores.
Para calcular a ameaça sísmica, a cidade de Cañas na Costa Rica oferece um exemplo concreto: o método de
análise foi determinado com base na definição de cenários específicos, baseados no conhecimento da sismicidade
histórica e no potencial de cada uma das falhas ou fontes selecionadas para produzir sismos. Aplicando o SIG,
os resultados obtidos proporcionam a relação entre escalas de intensidade e perceção do abalo sísmico, em valores
forte, muito forte, severamente e violentamente.
• Delimitação de áreas afetadas de forma desigual por eventos climáticos extremos como excesso
de precipitação e secas, designadamente os efeitos do ENOS (El Niño – Oscilação do Sul) na
Argentina: a análise permite projetar cenários de risco com base nas tendências de rendimento
das culturas.
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UNIDADES
DIDÁTICAS UD 2
Projeto Percepção de Risco - Secretaria Executiva da Justiça e
Cidadania do Estado de Santa Catarina - Brasil
O objetivo do Projeto Percepção de Risco, a Descoberta de mm Novo Olhar” é aumentar a percepção de
risco de adolescentes e adultos frente aos desastres ocasionados por fenômenos naturais e pela ação
humana. Trata-se de uma abrangente campanha educativa para cultura de prevenção de desastres,
em desenvolvimento nos anos de 2008 e 2009, alcançando todas as escolas públicas estaduais de
Santa Catarina, comunidades em situação de vulnerabilidade social em Florianópolis, e a sociedade
em geral. O projeto é inédito no país e está orientado para referendar a participação de Santa
Catarina e do Brasil na campanha mundial, lançada em 2006 pela Estratégia Internacional para
Redução de Desastres - EIRD/ONU.
A série de animações:
http://vimeo.com/7374784
Galeria de Foros:
http://www.percepcaoderisco.sc.gov.br/?ver=fotos
Kit educativo:
http://www.percepcaoderisco.sc.gov.br/?ver=kit-educativo
Rede:
http://www.percepcaoderisco.sc.gov.br/?ver=rede
Desastres:
http://www.percepcaoderisco.sc.gov.br/?ver=desastres
Fonte: http://www.percepcaoderisco.sc.gov.br/
A escala apropriada dos mapas depende do uso que se pretende dar-lhes e da informação
disponível. O conhecimento da distribuição espacial de algumas ameaças, como sismos,
deslizamentos de terras e inundações, alcançou um nível que permite traçar mapas de variações de
perigos dentro de uma comunidade pequena. Os chamados mapas microzonais desempenham um
papel importante para a utilização dos solos urbanos. Podem basear-se num único ou em múltiplos
eventos de uma mesma ameaça, ou combinar o impacto possível dos eventos de várias ameaças
diferentes (mapas de multiameaças).
Nalgumas regiões do mundo afetadas por fenómenos naturais, em que as suas fronteiras são
variáveis como, por exemplo, no caso de zonas sujeitas a secas, desertificação ou tempestades
tropicais, constroem-se mapas de áreas mais extensas. Estes mapas, apesar de não serem muito
pormenorizados, têm a importante função de alertar as entidades de planeamento sobre as
tendências de escalas maiores, cuja informação pode ser útil para vários territórios ou países.
Por exemplo, no caso dos fenómenos hidrometeorológicos, a dimensão da inundação apresenta uma relação estreita
entre a duração da chuva e a resposta da bacia hidrográfica. Dependendo das características de drenagem da bacia, a
intensidade das chuvas pode ser mais significativa que a sua duração (inundações súbitas). Noutros casos, no entanto,
a inundação é produzida pela persistência das chuvas durante um período prolongado (temporal). As inundações e as
subidas das águas são determinadas, por um lado, pelas características específicas da bacia e, por outro lado, pelos
fatores climáticos regionais. Estes fatores, se sofrerem mudanças, podem provocar alterações na vegetação e, por
conseguinte, na drenagem em direção aos rios e lagos, o que, por fim, determina a dimensão das inundações.
Podemos concluir que a análise das ameaças descreve e avalia a probabilidade de elas se
transformarem em fenómenos perigosos para um território, num período específico, com
uma determinada intensidade e duração. Descreve o grau de perigo para as pessoas, a flora, a
fauna, as instalações, os bens, a economia e o ambiente, tomando em consideração a utilização que
se dá à terra e aos ecossistemas.
EXEMPLO
Os mapas de risco na Suíça
Retirado do quadro 2.19, Viver com o Risco, 2004.
O cantão de Berna, na Suíça, vem utilizando desde 1998 um mecanismo de planeamento que
indica as zonas de risco possíveis. São preparados mapas utilizando modelos computorizados e em
SIG, a preços acessíveis, que permitem obter um panorama geral do cantão com base num
conjunto uniforme de critérios. As zonas de risco cobrem aproximadamente 44% do território,
ocupado, na sua maior parte, por zonas não residenciais. No entanto, aproximadamente 8% dos
habitantes vive em zonas de risco.
16 Adaptado do Manual: Análisis del riesgo – una base para la gestión del riesgo de desastres naturales, GTZ, 2004.
Uma das ameaças não incluídas no modelo, apesar de terem graves consequências sociais e
económicas, são as inundações, porque os seus efeitos dependem em grande medida da subida de
rios cuja importância é demasiado diminuta para ser incluída satisfatoriamente no modelo
Visa identificar os setores, bens, ecossistemas e comunidades expostos a uma ou várias ameaças, as
fragilidades que possuem e o grau de perigo que enfrentam, a dimensão possível dos danos e as
consequências que estes podem ter no desenvolvimento futuro.
A avaliação das vulnerabilidades pode fornecer o conhecimento necessário para calcular a perda ou
os danos de vidas humanas, meios de subsistência, ecossistemas e perturbações políticas e sociais
que possam resultar de um desastre. Também permite definir e concertar as ações e medidas que se
podem tomar antes, durante e após o impacto de um fenómeno físico.
A avaliação da vulnerabilidade é um complemento essencial para poder calcular o grau real de risco,
uma vez que cada tipo de ameaça atua de forma diferenciada perante diferentes elementos expostos
numa sociedade. Permite-nos, também, avaliar a possível interação de várias ameaças conjuntas face
a determinadas fragilidades e as lacunas dos processos de desenvolvimento implementados.
Ainda existem grandes lacunas de informação e de métodos adequados que permitam avaliações
integradas das vulnerabilidades relacionadas com as diferentes dimensões do desenvolvimento.
Aspetos como o género, por exemplo, merecem pouca consideração, apesar de os efeitos dos
desastres sobre os meios de subsistência (e também as soluções) poderem variar e ser
percecionados de forma muito diferente por homens e mulheres, devido ao facto de a divisão do
trabalho e o acesso ao poder os situar em níveis diferentes do processo produtivo. O mesmo ocorre
com a perceção, o conhecimento e a gestão do risco por parte das comunidades indígenas, que
implementaram sistemas de desenvolvimento em harmonia com o meio natural, os quais deveriam
ser integrados na análise do risco nas regiões em que habitam e considerados exemplos de boas
práticas para os sistemas de desenvolvimento atuais.
Existe, por outro lado, uma grande diferença a nível da perceção, do conhecimento e da aplicação
de estudos das vulnerabilidades entre as entidades académicas, científicas ou técnicas incumbidas de
realizar estas tarefas, bem como entre as autoridades locais e as comunidades.
EXEMPLO
Vulnerabilidade social de rios urbanos no Brasil: Estudo de caso
Os rios urbanos no Brasil são sinônimos de ambientes degradados, desvalorizados e negados pela
sociedade. Esses espaços se tornaram a alternativa de acesso à habitação para uma massa de
pobres que não podem adquirir um espaço seguro na cidade. A junção de pobreza, habitação
improvisada, pouca infraestrutura, com a ocupação de espaços expostos a perigos naturais, criou
territórios de riscos e vulnerabilidades, que frequentemente coincidem com os ambientes fluviais
urbanos. O principal objetivo do artigo é elaborar uma proposta de operacionalização do conceito
de vulnerabilidade no âmbito dos rios urbanos no Brasil. Para isso, propôs-se analisar as
vulnerabilidades sociais da bacia hidrográfica do rio Maranguapinho, localizado na Região
Metropolitana de Fortaleza, Ceará, a partir da elaboração de um Índice de Vulnerabilidade Social -
IVS. Para tal, utilizaram-se métodos estatísticos de análise multivariada (análise fatorial e de
agrupamento) para analisar os dados do Censo 2000 IBGE referente aos setores censitários da
área de estudo. A elaboração de um Índice de Vulnerabilidade Social pode ser uma importante
ferramenta para orientar a implementação de políticas públicas em áreas de forte carência de
infraestrutura, serviços públicos e pobreza.
A integração das variáveis sociais, culturais, institucionais, políticas e económicas nos modelos
espaciais representou um grande desafio, porque não é fácil quantificar alguns aspetos da
vulnerabilidade socioeconómica e político-institucional, quando ela é avaliada por "peritos"
externos desligados da realidade territorial, quando predomina uma visão fisicalista e não uma visão
de desenvolvimento e quando não se envolvem os atores fundamentais de um território.
Em muitos casos, e em particular nos países menos desenvolvidos, não se dispõe de informação
com a qualidade e o nível de pormenor exigidos por estes modelos, pelo que a informação e o
conhecimento das autoridades e da população local pode ser estratégica para determinar os fatores
que integram a vulnerabilidade. Por outro lado, é preciso não esquecer que existem métodos de
baixa tecnologia bem concebidos, que podem constituir uma boa alternativa para substituir técnicas
mais sofisticadas. Um bom sistema de informação e decisão não precisa de ser complicado nem
exige grandes investimentos. Trata-se principalmente de vontade e visão de desenvolvimento.
De acordo com o método para elaborar mapas de ameaças e avaliar o risco, o Projeto de gestão do
risco de sismos no vale de Katmandu colocou a ênfase na necessidade de utilizar informação
geológica e sismológica disponível em vez de investir recursos em investigações especiais para obter
novos dados ou informações.
O único caso prévio adequado em que um país em desenvolvimento tinha simulado um cenário de
sismo foi o de Quito, no Equador. O Projeto em apreço baseou-se nessa metodologia e adaptou-o
às condições vigentes no Nepal.
Graças à utilização exclusiva de técnicas simples, o projeto foi eficiente em termos de custos e
compreensível para os não especialistas que nele participaram. Chegou-se à conclusão, por
exemplo, que os mapas simples, plastificados, que indicavam a localização dos possíveis danos das
infraestruturas, com o nome das localidades e dos rios, eram os mais adequados para persuadir os
administradores sobre as perdas que poderiam afetar as instalações críticas.
Durante o processo de avaliação das ameaças ou do risco de sismo, o grupo de investigadores
manteve contato estreito com os responsáveis pela administração dos serviços municipais
fundamentais e com os organismos de emergência. Desta forma, as diferentes instituições aceitaram
de bom grado e sem grandes reservas o cenário de sismo e a estimativa de perdas. Participaram no
processo cerca de 30 instituições e a simulação dos danos provocados por um sismo converteu-se
num excelente mecanismo para aumentar a sensibilização para o fenómeno.
Fonte: Mani Dixit e outros, Hazard Mapping and Risk assessment from the Katmandú Valley Earthquake
Risk Management Project, em Regional Workshop on Best Practices in Disaster Mitigation: Lessons Learned from
the Asian Urban Disaster. Mitigation Program and other Initiatives, Bali, Indonésia, 2002.
Existem diferentes metodologias para a análise das vulnerabilidades: algumas podem ser centradas
em aspetos mais técnico-científicos, outras em vulnerabilidades específicas face a determinadas
ameaças, algumas mais participativas e inclusivas, outras de caráter local ou nacional, etc. Para cada
caso em particular, deverá selecionar-se o método que mais se ajuste às necessidades, realidades,
possibilidades e aos recursos dos territórios.
EXEMPLO
Análise da vulnerabilidade: A experiência em povoações do Vulcão San Miguel, El
Salvador (Geólogos do Mundo) (disponível em espanhol)
Optou-se por quatro níveis para definir a vulnerabilidade: baixo, médio, moderadamente elevado e
extremamente elevado. Foram atribuídos valores numéricos de vulnerabilidade a cada um destes
níveis: entre 0 e 1: vulnerabilidade baixa; entre 1,01 e 2: vulnerabilidade média; entre 2,01 e 2,5:
vulnerabilidade moderadamente elevada; e, entre 2,51 e 3: vulnerabilidade muito elevada.
Relativamente à definição de parâmetros-critérios de vulnerabilidade, foram adotados os seguintes
indicadores quantitativos, objetivamente verificáveis:
Parâmetros físico-técnicos
• Materiais das paredes das habitações: 70% ou mais com paredes de sistemas misto e/ou adobe
melhorado; 1 ponto; entre 40% e 69%: 2 pontos; e menos de 40%: 3 pontos.
• Presença de serviços básicos como água destinada ao consumo humano, saneamento básico,
telefone e energia elétrica. Com quatro dos elementos mencionados: 1 ponto; com três ou
dois: 2 pontos; com um ou nenhum: 3 pontos
• Presença de tecnologia agrícola, maquinaria, sistemas de irrigação e drenagem. Com quatro
Parâmetros económicos
• Níveis de pobreza extrema: 45% ou mais das famílias: 3 pontos; entre 20% e 44%: 2 pontos,
menos de 20% das famílias: 1 ponto.
• Propriedade da terra. Mais de 70% são proprietários das suas terras: 1 ponto; entre 40 e 69%:
2 pontos; menos de 40%: 3 pontos.
Parâmetros ambientais
• Combustível para cozinhar: Usam lenha 60% ou mais: 3 pontos; entre 25% e 59%: 2 pontos;
menos de 25%: 1 ponto
• Utilização dos solos: Mais de 70% de área agrícola para culturas sazonais: 3 pontos; entre 40%
e 69%: 2 pontos; menos de 40%: 1 ponto.
Parâmetros sociais
• Educação. Menos de 40% com escolaridade primária: 3 pontos; entre 40% e 69%: 2 pontos;
70% ou mais: 1 ponto.
• Organizacionais: Sem organização: 3 pontos; com ADESCO ou outra organização
desenvolvimento: 2 pontos; com Comités de Risco/Desastre: 1 ponto.
• Ideológico-culturais. 50% ou mais crê em castigo de Deus ou do fenómeno natural: 3 pontos;
entre 20% e 49%: 2 pontos; menos de 20%: 1 ponto.
• Políticos. Ausência de propostas de desenvolvimento: 3 pontos; antecedentes de
mobilizações/ações de gestão entre autoridades locais/nacionais: 2 pontos; presença de
propostas de desenvolvimento: 1 ponto.
• Institucionais oficiais. Ausência de planos municipais de gestão de riscos/emergências: 3
pontos; planos municipais de desenvolvimento: 2 pontos; planos municipais de
desenvolvimento com prevenção de riscos: 1 ponto.
• Institucionais da sociedade civil. Presença de 3 ou mais instituições de desenvolvimento: 1
ponto; presença de 1 ou 2 instituições: 2 pontos; ausência de instituições: 3 pontos.
A análise do risco toma em consideração os possíveis danos, perdas e consequências num ou vários
cenários de desastres e procura determinar a probabilidade de ocorrência e a dimensão dos danos
provocados por fenómenos naturais ou humanos extremos. Trata-se de um processo dinâmico e
contínuo que tem de se adaptar permanentemente a vulnerabilidades, ameaças e riscos diferentes e
EXEMPLOS
Contribuição avaliação do risco sísmico
O manual tem por objetivo fornecer ferramentas concetuais e metodológicas que habilitem os
diversos atores das comunidades de base a gerir os riscos nos seus respetivos âmbitos territoriais.
Coloca a ênfase na gestão urbana e nas cidades.
Em síntese, como se viu neste capítulo, a análise de risco processa-se a partir de quatro fases
fundamentais.
► Passo 1: Análise e conhecimento do território
► Passo 2: Análise da ameaça
► Passo 3: Análise da vulnerabilidade
► Passo 4: Avaliação do risco
Com base na análise das ameaças e da vulnerabilidade, aprofunda-se o processo e avança-se para a
determinação da probabilidade de ocorrência e a estimativa de danos a nível de pessoas, ambiente e
infraestruturas num dado território.
Para a elaboração de mapas de risco, utiliza-se tanto informações gráficas, o que pode ser realizado em várias
camadas sobrepostas (como, por exemplo, mapas sobre diferentes tipos de ameaças e de vulnerabilidades), bem
como informações escritas, sobretudo no que se refere a vulnerabilidades e capacidades. Existem diferentes
métodos de elaboração e deve procurar-se os mais adequados para cada situação, em função do alcance do estudo,
dos recursos disponíveis e das zonas destinatárias. A análise espacial do risco através dos mapas é um
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instrumento estratégico do planeamento e definição de prioridades. Trata-se ainda de uma ferramenta simples de
visualização gráfica, de extrema utilidade para os responsáveis técnicos e políticos.
► Quantificação dos danos esperados e das possíveis consequências dos desastres para a
população, a economia local, os ecossistemas e a comunidade no seu conjunto.
► Definição do risco "aceitável" ou gerível e das possíveis consequências sociais, económicas,
ambientais e políticas a que o território pode resistir ou que pode suportar em caso de desastre
sem comprometer a vida das pessoas e sofrer perdas irrecuperáveis ou significativas dos meios
de subsistência, instalações ou ecossistemas.
Quem define os critérios ou que critérios se utilizam para definir o risco aceitável? É um tema bastante delicado,
porque entram em jogo valores e perceções que podem ser muito desfavoráveis consoante os interesses de quem
realizar o processo. Por isso, o nível local e a participação dos atores fundamentais do território e dos diferentes
grupos sociais no processo são fundamentais para uma apreciação e estimativa adequada do risco de desastres em
consonância com a realidade do território. Muitas vezes as estimativas de peritos técnicos ou as realizadas a nível
nacional são elaboradas a partir de perceções ou interesses muito diferentes dos que são requeridos pelas
comunidades, não passando de estimativas de caráter meramente técnico e, geralmente, económico, que ignoram
outros aspetos estratégicos do desenvolvimento local.
► Avaliação das capacidades, dos pontos fortes e dos recursos disponíveis no território em
função da redução do risco de desastres para encontrar soluções e avaliar os recursos e as
capacidades que devem ser geridos e reforçados para conseguir implementar as soluções
adotadas 17.
► Procura de soluções realistas e alternativas, adaptadas à situação de cada território, em
consonância com as capacidades, os recursos, as ameaças e as vulnerabilidades existentes.
Análise de custo e benefício das ações de investimento, por exemplo, tomando em consideração e priorizando, em
primeiro lugar, a segurança das pessoas, os meios de subsistência, os ecossistemas, as infraestruturas básicas, as
linhas de funcionamento vitais, o património público, por oposição aos custos económicos e de investimento social
que possam ter.
► Definição de prioridades e de áreas de intervenção (planos, programas e projetos):
delimitar e identificar a população, os meios de subsistência, os edifícios e os pontos ou locais
mais ameaçados e vulneráveis, para definir prioridades consoante o grau de risco e a sua
importância para o desenvolvimento do território.
► Elaboração de propostas, estratégias e ações destinadas a reduzir o risco de desastres:
medidas de prevenção e mitigação, estratégias para a gestão e obtenção de recursos e reforço de
capacidades, metodologias para a incorporação da RRD nos planos e políticas de
desenvolvimento, entre outras.
Projetar, analisar e encontrar forma deste produto servir como base de futuras atividades, bem
como a sua integração nas práticas de desenvolvimento, visando sempre a sustentabilidade, são os
aspetos fundamentais da avaliação do risco. O processo deve guiar-se por uma abordagem de
conjunto e de desenvolvimento local integrado.
EXEMPLO
A análise de vulnerabilidade e capacidade
Um elevado número de métodos de avaliação do risco recorre com frequência cada vez maior a
avaliações conjuntas da vulnerabilidade e da capacidade, apesar de muitos autores considerarem
que a análise das capacidades não é uma parte integrante da avaliação das vulnerabilidades.
Este documento avalia pontos de vulnerabilidade ocasionados pela ação solar numa icrobacia
hidrográfica no semi-árido da Paraíba, durante uma translação, de outubro de 2003 a setembro de
2004 na Estação Experimental Bacia Escola – CCA/UFPB, em São João do Cariri-PB. Definiram-
se cinco pontos de determinação em uma toposequência em que foram analisados: variáveis
meteorológicas; evapotranspiração potencial e dendrometria.
As capacidades e a boa utilização dos recursos endógenos do território fazem parte dos
fundamentos de um processo de avaliação territorial e das estratégias de redução do risco de
desastres e de desenvolvimento local. Devem ser reforçados e complementados de acordo com as
necessidades, possibilidades e ações identificadas ao longo do processo como medidas de
prevenção e de mitigação.
Para realizar este tipo de avaliação, devem identificar-se indicadores que permitam medir o grau de
capacidades em diferentes níveis e escalas geográficas. Estes indicadores podem começar pelo nível
familiar, comunitário, de bairro, municipal e territorial e, inclusivamente, estender-se a outros
âmbitos como o regional, ou nacional, consoante o caso em apreço.
18 Fonte: FICV
EXEMPLO
Redução do Risco África (RRA) (disponível em inglês)
Importa destacar ainda que os resultados da análise de risco podem ter múltiplas utilizações e
ultrapassar em muito o âmbito do tema dos desastres.
Conhecer o risco de desastres permite tomar consciência das causas estruturais, das raízes e da
origem das vulnerabilidades. Permite identificar as lacunas existentes em áreas do conhecimento, o
que, por sua vez, cria um leque de possibilidades de melhorar a informação, a educação, a
capacitação e a investigação científica. Paralelamente, pode contribuir para reforçar o compromisso
político noutras áreas do desenvolvimento e pode fornecer uma base de sensibilização para um
conjunto de medidas relacionadas com a gestão ambiental, a economia e os aspetos sociais, a
redução da pobreza, a criação de postos de trabalho e o estabelecimento de redes e alianças entre
diferentes setores da política territorial em prol da sustentabilidade.
► African Union; NEPAD, Programme of Action for the Implementation of the Africa Strategy for Disaster
Risk Reduction (2005 - 2010), 2004.
► Duarte Neves, Arlinda, Relatório do Perfil Temático na área das Mudanças Climáticas em Cabo Verde -
Auto - avaliação das capacidades nacionais, NCSA/DGA/PNUD/ Projeto CVI, 2006.
► Duran, Luís Rolando Kulipossa, Fidelx Pius, Relatório final do diagnóstico rápido do processo de
descentralização de gestão de risco de catástrofes em Moçambique, 2009.
► GTZ, El análisis de riesgo - Una base para la gestión de riesgo de desastres naturales, Eschborn, 2004.
► Z. G.; Delica-Willison, Community-Based Disaster Risk Management: Local Level Solutions to Disaster
Risks, FICV, 2005.
► Existem diferentes métodos e ferramentas para avaliar o risco. Estes podem variar
desde os conhecimentos empíricos e a memória histórica local até à utilização de
imagens por satélite e de complicados sistemas de informação geográfica (SIG)
computorizados. Todos eles podem ser usados de forma complementar e a sua
utilização dependerá do pormenor e da qualidade da informação, da utilização que se
lhe queira dar e dos recursos e capacidades instaladas no território.
► A avaliação do risco tem por objetivo permitir antecipar os possíveis efeitos negativos
de um fenómeno nos vários âmbitos do desenvolvimento local, quer a nível social,
económico e político, quer a nível ambiental.
4 CASOS PRÁTICOS
Não é, porém, a única ameaça a que a zona está exposta: furacões, chuvas torrenciais, sismos e
ventos fortes que, por sua vez, desencadeiam outros fenómenos, como inundações e deslizamentos.
Neste contexto, a exposição a uma ameaça, por pequena que seja, provoca danos e prejuízos nestas
populações que rapidamente as coloca num cenário de desastre.
Neste contexto, as estratégias de redução da vulnerabilidade não podem ser sustentáveis se não
integrarem a gestão dos riscos e dos desastres. A Ação Contra a Fome, com fundos do DIPECHO
(Programa de preparação para desastres da Direção-Geral da Ajuda Humanitária da Comissão
Europeia - ECHO), realizou um segundo projeto de gestão de riscos e desastres com as populações
dos municípios de Camotán, San Juan Ermita e Jocotán, do concelho de Chiquimula, na
Guatemala.
Aos tradicionais estudos das ameaças e vulnerabilidades das comunidades, que utilizaram uma
metodologia de cálculo quantitativo dos riscos, aos processos de sensibilização, capacitação e
organização comunitária e municipal, somaram-se atuações específicas de mitigação e preparação de
desastres, de acordo com as necessidades definidas pelas avaliações prévias: reflorestação em redor
de nascentes de água, introdução de técnicas de gestão agroflorestal, obras de drenagem, barreiras
de materiais inertes, pontes suspensas, sistemas de radiocomunicação, centros de gestão de riscos,
brigadas de proteção contra incêndios, etc.
Este artigo tem por objetivo mostrar o que se aprendeu com o projeto e poder melhorar as ações
de gestão de riscos e desastres.
Avaliar os riscos, significa estudar em conjunto as ameaças e as vulnerabilidades que afetam todos
os componentes de uma zona (pessoas, infraestruturas, serviços, etc.). Para conhecer melhor o
cenário de risco da nossa área de trabalho e, em consequência, empreender as ações necessárias
para a sua redução, foram realizados um autodiagnóstico comunitário e um estudo científico
baseado numa metodologia de cálculo quantitativo de riscos associados a diversas ameaças, que se
resume seguidamente.
Uma vez definidas as vulnerabilidades das famílias existentes na zona de estudo, foram analisadas
em pormenor as particularidades das ameaças a que essa região se encontrava exposta. Isso
permitiu criar mapas de ameaça, nos quais foram sobrepostos os mapas de vulnerabilidade
anteriormente elaborados. A soma de ambos gerou os correspondentes mapas de risco. Segue-se a
apresentação dos respetivos mapas de vulnerabilidade, ameaça e risco face à ameaça de sismos nos
municípios de Camotán e San Juan Ermita.
Desenvolvimento
Esta atividade contribui para sensibilizar a comunidade sobre as suas condições de risco. Estes
mapas comunitários são um instrumento que as comunidades compreendem e podem utilizar para
efetuar propostas de medidas de prevenção e mitigação para implementação pelas próprias ou em
colaboração com a sua administração local. Os mapas também ajudam a identificar mecanismos de
autogestão comunitária para enfrentar os riscos a que estão expostos.
Com base neste autodiagnóstico, e como demonstração prática, foram realizadas numerosas obras
de mitigação propostas pela comunidade, como ações comunitárias que podem reduzir a
vulnerabilidade da população: obras de infraestruturas (obras de drenagem, pontes suspensas,
muros de contenção) e outras no setor agrícola (reflorestação em redor de nascentes de água,
introdução de técnicas de gestão agroflorestal, barreiras de materiais inertes). Estas últimas
sensibilizaram a população para o seu papel como atores na criação do risco.
Para além de estabelecer uma cooperação ativa entre o máximo número de instituições, o projeto
teve como premissa envolver as populações locais, melhorar o seu conhecimento sobre a
problemática dos desastres e a forma de os enfrentar, e ajudá-las a organizarem-se. Um total de
13 500 pessoas assistiram aos 350 eventos de capacitação de vária natureza e/ou reuniões
desenvolvidas no quadro do projeto. Em colaboração com as principais organizações que
trabalharam na Guatemala na gestão local de desastres nos últimos anos, foi elaborado um guia de
capacitação mais simples e eficaz para a transmissão de conhecimentos e boas práticas de
prevenção e resposta, em conformidade com as limitações enfrentadas pelas comunidades rurais,
onde vivem mais de 60% da população do país.
Foram emitidos programas radiofónicos com um público estimado de 28 898 ouvintes, graças ao
apoio da rádio mais sintonizada na região Chorito, a FM Tierra. Entre os programas emitidos
destaca-se a radionovela "Tempo de furacões", uma produção interagências (OPS-EIRD-OIM-
CEPREDENAC), a radionovela infantil "Ameaças num planeta próximo" e uma série de
reportagens de divulgação sobre desastres, ambas produzidas pela Radio Nederland e pela
UNESCO. Foram ainda transmitidas mensagens sobre a proteção contra a erosão dos solos, a
promoção de técnicas de gestão agroflorestal, a proteção das florestas, o combate a incêndios, bem
como sobre a prevenção e resposta perante inundações, sismos e deslizamentos. Com o apoio de
outras instituições como a FAO-PESA, CONRED, Corpo de Paz, Cruz Vermelha Espanhola,
Comunicadores sem Fronteiras e UNICEF, foram selecionadas ilustrações e mensagens sobre a
gestão de riscos e a correta gestão ambiental sob a forma de anúncios e folhetos. O processo de
validação do material junto dessas comunidades produziu múltiplos reajustamentos que permitiram
garantir que as mensagens seriam entendidas.
Este espaço funciona como referente visual concreto, sobretudo com populações de baixo nível
educativo e isoladas, no tempo e no espaço, das instituições e serviços.
O sistema de comunicação tem um impacto claro na capacitação comunitária, baseada na gestão da
informação, porque reduz o isolamento geográfico e dota as comunidades de capacidade de atuação
em caso de emergências quotidianas, como os problemas de saúde (partos, acidentes). É nestes três
pontos, mas sobretudo no último, que as rádios exercem maior impacto, assegurando a sua
sustentabilidade.
Conclusões e recomendações
Apesar de a gestão de risco ser da responsabilidade de todos os atores de uma zona, os esforços
devem centrar-se a nível local, com base na comunidade. Do ponto de vista institucional, é
imprescindível que os municípios assumam o maior compromisso possível com a gestão de riscos,
dado que as suas decisões têm a máxima repercussão na criação ou redução de riscos. Por causa do
seu papel fundamental na coordenação e liderança a nível local, os projetos integrados de gestão de
risco, como o que se apresentou neste artigo, devem esforçar-se por envolver e trabalhar de forma
coordenada com os municípios, sensibilizando autoridades e técnicos municipais em áreas tão
cruciais como o planeamento urbanístico e de infraestruturas, a prevenção de riscos, a
sensibilização da população, os sistemas de alerta, etc.
Deve evitar-se trabalhar em áreas excessivamente extensas, onde as ameaças não sejam sentidas
como tal, porque o interesse e disponibilidade das comunidades e das autoridades para se
envolverem nestes temas serão muito reduzidos.
A iniciativa do Quadro estratégico surge na sequência dos graves danos provocados pelo furacão
Jeanne em solo dominicano em setembro de 2004. De facto, a poucos dias da passagem do furacão
pelo país, foi solicitado ao PNUD e à Comissão Económica para a América Latina e as Caraíbas,
CEPAL, a realização de uma avaliação dos impactos socioeconómicos; imediatamente depois, o
PNUD, com o apoio de uma equipa técnica, celebrou com o Governo dominicano um acordo com
vista a analisar as causas que provocaram as perdas sofridas com a passagem do furacão e a
desenvolver compromissos de trabalho tendentes a superar as fragilidades institucionais observadas.
A reação, que se centrava inicialmente na reconstrução, foi canalizada para a redução de riscos, num
processo destinado a levar o país a aprender a lição.
A República Dominicana tem uma justificação sólida para trabalhar intensamente na redução de
riscos, como se depreende das conclusões das avaliações que a CEPAL formulou a propósito da
passagem do furacão George (1998), das inundações da região de CIBAO (2004) e do furacão
Jeanne (2004). Recentemente, o país também foi assolado por uma grandes tragédia na região de
Jimaní, na fronteira com o Haiti, e por um sismo em 2004.
A República Dominicana assistiu nos últimos anos a um aumento considerável das suas
vulnerabilidades sociais e ambientais, associadas sobretudo a processos migratórios não controlados
e de marginalidade económica. A produção de riscos na República Dominicana oferece o contraste
de uma região oriental muito dinâmica, com um desenvolvimento turístico deficientemente
planeado em termos integrados e suscetível a desastres, com o outro extremo do país, que revela
processos de deterioração ambiental, pobreza e desastres na zona fronteiriça com o Haiti.
As possibilidades atuais do QERVPD são animadoras por várias razões. Foi criado um Comité
coordenador de alto nível, formado pela Secretaria técnica da presidência, pelo Gabinete nacional
de planeamento (ONAPLAN), pelo Gabinete do coordenador de recursos europeus (ONFED) e
O primeiro semestre do ano de 2005 foi orientado para a consolidação de comités e planos de ação
setoriais e a gestão de recursos nacionais e de cooperação com organismos multilaterais e bilaterais
para dar resposta aos diferentes componentes do Quadro estratégico. Nesta primeira fase foram
executadas ações de menor custo e impacto elevado, como a incorporação da temática no Sistema
de investimentos nacional, e concebidos sistemas de capacitação e apoio à gestão local, em
particular no domínio da regulamentação urbanística.
Algumas das principais lições do atual processo na República Dominicana podem ser resumidas
deste modo:
• É recomendável que, a partir da avaliação dos impactos socioeconómicos setoriais (tipo
CEPAL), cada país produza processos de análise do sucedido para encontrar um quadro
explicativo dos riscos em cada setor.
• Deve procurar-se aprofundar o conhecimento dos processos de planeamento e gestão de
cada setor e encontrar neles as possibilidades reais de gestão do risco.
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