Nessa tarde, o Tony tinha convencido todos a finalmente explorarem a casa do
lago. - Já vos disse que é má ideia, temos teste na segunda, de Biologia. – disse a Nô, preocupada. - Tranquilo, é o último teste e a tua média é de 18! – respondeu relaxadamente o Joel. - Vá pessoal, voltamos para casa antes do anoitecer. – esclareceu a Marta. Seguiram, de bicicleta, pelo atalho do pinhal em direção ao lago. Avistaram a casa ao longe. Estava tão coberta por musgo que nem se via a madeira de que era feita. Havia telhas partidas e árvores que tinham crescido para dentro da casa, cujos ramos partiram os vidros e entravam pelas janelas. Havia um pequeno alpendre, em que as tábuas que o constituíam se começavam a levantar. - ‘Tá frio! Vou parar para tirar o casaco. – disse a Nô, tremendo o queixo. - ‘Tamos mesmo a chegar, não vale a pena. – afirmou o Chico, cansado de estar à espera da irmã. Ao chegarem, deitaram as bicicletas no chão, ficando a olhar para a porta da entrada daquela pequena casa. - Sabem o que se diz desta casa? – perguntou Tony. - Como assim?! – questionou Marta, assustada. - Morou aqui um caçador, que tinha perdido a família e… - Um dia foi atacado por um lobo, que lhe comeu a perna! – contou o Chico, com gestos aterradores, interrompendo Joel. - Não foi nada, puto! – disse o Tony – o lobo não lhe chegou a comer a perna, a noite de luar transformou-os num só e diz-se que ele ainda vagueia pela floresta, voltando a casa nas noites de lua cheia. - Que dia é hoje?! – perguntou o Chico, curioso e contente por achar que finalmente veria um lobisomem. - Se na passada semana estava quarto-crescente, hoje estará… - tentou explicar a Nô, sendo interrompida pela Marta. - Voltamos para casa antes do anoitecer, não se preocupem. - Então entramos já! Vamos lá ver esse lobisomem! – entusiasmou-se o Chico correndo para abrir a porta. Todos entraram atrás de Chico e admiram o lugar, arrepiando-se pelo frio e pelo medo. Tony, que ficou para trás, acende a lanterna do telemóvel e leva-a à cara para parecer assustador, atirando com a porta abruptamente e fazendo todos pular e gritar de susto. - És tão parvo! Que brincadeira idiota! – disse Marta irritada. - Desculpa fofinha. – aproxima-se da namorada, dando-lhe um abraço reconfortante. - Liguem as vossas lanternas e vamos lá encontrar esse lobisomem. – disse Marta tentando disfarçar o medo. - Não trouxe o meu. – replicou a Nô. - Não tenho bateria. – completou Joel. - Perdi o meu ontem, pá! – terminou o Chico. - Ótimo! – disse ironicamente Marta – vamos aproveitar enquanto há luz natural. Os cinco amigos começaram a explorar a casa, pegando em objetos e mostrando- os uns aos outros. Cansado, Joel sentou-se no sofá libertando poeira pela divisão, fazendo todos espirrar e tossir. Nesse momento, a Nô gritou de uma outra divisão e os outros correram até ao quarto, que se situava na parte superior da casa. - Que se passa?! – questionou Marta, arrepiando-se. - Olhem ali! – ordenou Nô, apontando para cima da cama e correndo para abraçar o irmão. - Topem-me isto! São ossos! – exclamou Joel entusiasmado – Que bacano! Todos se aproximaram dos ossos, examinando-os, exceto Marta. - Vou-me embora. Isto deixou de ter graça! – disse Marta saindo do quarto e descendo as escadas violentamente. Ao aproximar-se da porta da entrada, uma parte do teto caiu aos seus pés, juntamente com as telhas e as vigas de madeira, deixando a porta bloqueada à sua saída. Quando ouviram o estrondo, todos correram em seu auxílio. Esta estava já sentada no chão, a chorar do susto. - Está tudo bem. – diz Tony, ajudando a namorada a levantar-se – Vamos embora. - Acho que não existe outra saída. – advertiu a Nô. - Tem de haver! – grita Marta correndo à procura de uma saída em todas as divisões da casa, procurando também no primeiro andar. – Mas quem é que teve esta ideia genial de colocar estacas nas janelas?! – continuou enumerando palavrões. - Está a ficar escuro. – gozou o Chico – Acham que o lobisomem aparece entretanto? Marta para e fica petrificada, apercebendo-se que dali a poucos minutos não haverá mais luz. - Tenho de sair daqui! Tenho de ir para casa! - Marta, nós estávamos a gozar! Não há lobisomem nenhum! Vá, até podemos passar todos aqui a noite, não há perigo. – tentou tranquiliza-la Tony. - Não ‘tás a perceber… Tenho mesmo de sair daqui! - Se calhar o lobisomem és tu e estás quase a transformares-te! – goza Joel, levanto de imediato uma estalada de Marta. Subitamente, o grupo começa a ouvir barulhos vindos das sombras do quarto, que rapidamente identificam como o dono dos grandes olhos amarelos que os olhava por detrás de uma cortina velha e desgastada. Imediatamente, Marta e Nô gritam e correm em direção ao andar de baixo, tentando retirar do caminho todos os destroços que impedem a sua saída pela porta da entrada. São seguidas pelos rapazes, também assustados, que as tentavam acalmar, ainda que ofegantes também se precipitavam a retirar o máximo de tijolo do caminho. Olhando para trás, com medo, os colegas viam as sombras mudar de forma, aumentando a sua dimensão e deixando-os visivelmente mais assustados. - ELE VEM AÍ! – gritou Marta atemorizada. – Rápido, despachem-se! - Vi num filme que a prata fere os lobisomens! Vou à cozinha procurar talheres para lhe atirarmos! – gaguejou o Chico. - Estou farta das tuas piadas! – respondeu a irmã. - Pode resultar! Enquanto os amigos continuam a tentar arranjar uma saída, Chico corre à cozinha, abrindo todas as gavetas e armários. Tira de lá os poucos talheres que encontra e partilha-os com o resto do grupo. - Não quero isso para nada! – grita a Marta, atirando com o talher à parede. - Chega, Chico! Não existem lobisomens! – grita Tony. Os quatro amigos começam a discutir. Nisto, um vulto desce as escadas e apanha o talher com os dentes. Joel é o único que estava virado para as escadas e que viu efetivamente o que estava a acontecer. - Malta, calma. Olhem ali. – diz Joel apontando para a sua frente. - Cala-te, Joel! – gritam todos em uníssono. O som de um latido ecoa na entrada e os quatro se viram para observar de onde vinha o som. - É um cão… - constatou a Nô. - Que lindo! Que fofo! – diz Marta, correndo a abraçar o cão. – Eras tu que estavas na cortina! Afinal não és um lobisomem! Até porque eles não existem, Chico! – afirma olhando com desprezo para o Chico. - Será que está aqui há muito tempo? – diz Tony. - Os dentes dele são pequenos, é ainda um cachorrinho. – constata Nô – deve ter sido esquecido pela mãe… - Vamos ficar com ele? – pede Marta com entusiasmo. - E como é que lhe chamamos? – pergunta Tony. - Nightfall! – grita o Chico! Todos concordam e mimam o pequeno cachorro, enrolando-o num casaco. - Marta, já anoiteceu… - afirma o Tony, em tom de brincadeira. - Eu sei, não há problema. – diz Marta, sorrindo para os amigos. - Se tivesses dito há mais tempo que tinhas medo do escuro, teríamos cancelado esta aventura. – comenta Nô. - Mas nunca teríamos encontrado o Fall!