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Arte na Pré-História e

Sociedade Antiga

Brasília-DF.
Elaboração

Eduardo Silveira Netto Nunes

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

APRESENTAÇÃO.................................................................................................................................. 5

ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA..................................................................... 6

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................... 8

UNIDADE I
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA...................................................................................................................... 10

CAPÍTULO 1
AS POPULAÇÕES PRÉ-HISTÓRICAS: CARACTERIZAÇÃO............................................................. 11

CAPÍTULO 2
A ARTE EM SOCIEDADES PRÉ-HISTÓRICAS, CAÇADORAS E COLETORAS................................... 15

CAPÍTULO 3
ARTE EM TRANSIÇÃO: SOCIEDADES PRÉ-HISTÓRICAS PRÉ-AGRÍCOLAS.................................... 24

UNIDADE II
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA.................................................................................................................. 36

CAPÍTULO 1
A ANTIGA ARTE GREGA: CARACTERIZAÇÃO............................................................................. 37

CAPÍTULO 2
A ARTE GREGA ARCAICA........................................................................................................ 41

CAPÍTULO 3
A ARTE GREGA CLÁSSICA....................................................................................................... 49

CAPÍTULO 4
A ARTE HELENÍSTICA................................................................................................................ 55

UNIDADE III
A ARTE NA ROMA ANTIGA..................................................................................................................... 63

CAPÍTULO 1
A ANTIGA ARTE ROMANA: CARACTERIZAÇÃO.......................................................................... 63

CAPÍTULO 2
A ARTE NO IMPÉRIO ROMANO................................................................................................ 71

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 84
Apresentação

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela
interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da
Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade


dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos
específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém
ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a
evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

5
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos
básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar
sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para
aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

6
Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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Introdução
Seja bem-vindo à disciplina Arte na Pré-História e Sociedade Antiga.

Desejamos convidá-lo para participar ativamente nesta viagem a épocas passadas muito
remotas e que acabaram elaborando formas de expressão humana que representavam
aspectos organizacionais, simbólicos, ideológicos e culturais extremamente significativos
das populações que as criaram.

Por meio da arte e de seus artefatos, as sociedades cristalizavam visões de mundo,


hierarquias sociais, atividades produtivas, crenças, estéticas, estilos e técnicas de saber
fazer e expressavam influências, inovações e apropriação amalgamando culturas,
descartando aspectos “arcaicos” ou desprovidos de razão para a reprodução.

As sociedades pré-históricas e as sociedades da antiguidade registraram em suas


obras a transposição de fatores espontâneos na produção de objetos simbólicos para
a conformação de tradições artísticas, delineados pela escolha do artefato (escultura,
pintura rupestre); da matéria-prima (terracota, mármore, bronze, tinturas de diferentes
cores); do estilo (naturalismo, geometrismo, realismo, entre outros); e da época do seu
aparecimento, do seu aperfeiçoamento, e do seu ocaso ou ostracismo.

O objeto do nosso curso é extremamente amplo e complexo, pois podemos considerar


que trata de produções artísticas humanas de cerca de 25 mil anos antes do presente,
até o fim do Império Romano no século V d. C. Logo, fica evidente a impossibilidade
de tratar pormenorizadamente todos os estilos, tradições e inovações, em todo esse
período, em todas as regiões do planeta Terra. Apesar de muito estimulante e tentador
falar de todas as variáveis envolvidas, a tarefa se mostra inviável. Por esse motivo,
realizamos os seguintes recortes para nos aproximarmos de aspectos da arte ao longo
da história.

O primeiro recorte trata-se do período instigante da pré-história. A arte pré-histórica


será observada e analisada desde as suas primeiras aparições, consideradas pelos
arqueólogos expressivas de “uma arte pré-histórica”, ao redor de 25 mil anos, e
caminhará pelo desenvolvimento estético das populações pré-históricas. Trataremos
ainda de introduzir alguns apontamentos sobre a arte pré-histórica no território
brasileiro, com datações que chegam a 12 mil anos.

8
Em sequência, daremos um pulo temporal de cerca de mais de 10 mil anos para começar
a percorrer aspectos da arte no mundo ocidental, em sociedades que alçaram o patamar
cultural de civilização, em especial a civilização grega.

Acompanharemos como elementos da arte – em especial da escultura grega –


canalizaram exemplarmente o desenvolvimento estético grego, percorrendo a Grécia
Arcaica e a Grécia Clássica e identificando os fatores de transição para a Arte Helenística,
considerada uma das primeiras manifestações de “internacionalização” da arte.

E chegaremos ao final observando e analisando os processos da arte ao longo da


sociedade romana, em especial durante o período em que Roma esteve sob influência
da arte etrusca, e depois, quando o Império Romano vai expandindo e forjando um
estilo próprio imperial, através da escultura e da arquitetura.

Os nossos objetivos principais ao longo desse percurso são os seguintes:

Objetivos
»» Delinear as características gerais dos estilos da arte desde a pré-história
até a antiguidade clássica.

»» Exemplificar com imagens de obras artísticas os diferentes estilos e suas


peculiaridades.

»» Introduzir a arte ao longo da história dos povos pré-históricos, gregos


e romanos antigos, como fruto das relações sócio-históricas e culturais,
identificando áreas de influência e inovação estética mútuas entre as
sociedades.

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A ARTE NA UNIDADE I
PRÉ-HISTÓRIA

Seja bem-vindo.

Nesta Unidade trataremos de:

1. Problematizar a forma como as sociedades primitivas viviam e deixavam


consignadas objetos, representações sobre o existir e o conceber da vida.

2. Identificar e exemplificar a expressão dos primeiros registros de “arte”


primitiva e seu desenvolvimento.

3. Caracterizar o naturalismo como expressão da arte pré-histórica e a


transição para o estilo Geométrico.

4. Apresentar aspectos da arte rupestre no território brasileiro.

Para trabalhar esses aspectos, dividimos as atividades em três capítulos:

Capítulo 1. As populações pré-históricas: caracterização.

Capítulo 2. A arte em sociedades pré-históricas, caçadoras e coletoras.

Capítulo 3. Arte em transição: sociedades pré-históricas pré-agrícolas.

Boa leitura.

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CAPÍTULO 1
As populações pré-históricas:
caracterização

Na história da humanidade, em especial aquela que começa com o aparecimento do


homo sapiens sapiens ao redor de 200 mil anos atrás, convivendo inicialmente com
outros homos como homo neanderthalensis e homo erectus, as atividades humanas
eram marcadas pela provisoriedade.

A nossa história como homo sapiens foi lentamente passando por modificações, durante
a maior parte de nossos 200 mil anos de existência. Nossa expectativa de vida era
relativamente curta, e mortalidade infantil era alta; a satisfação de nossas necessidades
alimentares – indispensáveis para a sobrevivência – eram urgentes, impondo
frequentemente deslocamentos e reassentamentos; nossa cultura era relativamente
prosaica, e as funções sociais pouco diversificadas; os artefatos e a linguagem eram
muito rudimentares.

O ritmo das alterações tecnológicas e da cultura também foi muito lento. Entre 200
mil anos antes do presente e, aproximadamente, 12 mil anos atrás, as transformações
na cultura das diversas populações humanas na Terra ocorreram muito lentamente. A
partir da chamada Revolução da Agrícola, com a crescente domesticação de plantas e
animais úteis à alimentação e à produção, o ritmo das mudanças passou a ser intenso,
permitindo o surgimento de sociedades agrícolas, sedentárias, altamente complexas,
hierarquizadas, culturalmente civilizadas, associadas ao desenvolvimento urbano.

De 12 mil anos antes do presente para adiante, as mudanças passam a ser frenéticas,
com expressões no campo das artes e da cultura, vinculadas às sociedades sedentárias
intimamente viabilizadas pela disseminação da agricultura, pelo adensamento
populacional e pela complexificação das relações sociais.

Para pensarmos em uma História da Arte nas sociedades primitivas de períodos muito
remotos (antes de maior complexificação social e produtiva), é necessário levarmos em
consideração alguns elementos, uma vez que a nossa ideia atual de arte, muito associada
ao campo das artes eruditas ou popular (artes plásticas, arte musical, arte escultórica,
entre outras), é pouco útil para perceber a expressividade dessas sociedades, que não
compartimentavam as atividades da vida em segmentos ou setores bem delineados,
como fazemos atualmente.

11
UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

Um fator que caracterizava as sociedades rudimentares, chamadas de pré-históricas,


antiquíssimas, é que viviam a totalidade das dimensões socioeconômico-cultural
integradas, sem precisar profundamente as fronteiras entre essas dimensões. Podemos
pensar, baseado no campo de trabalho da antropologia pré-histórica e da antropologia
social, que essas sociedades intercambiavam permanentemente as fronteiras entre
a produção, as técnicas, a sua organização, suas crenças, seus conhecimentos, sua
eventual linguagem, e suas criações, não existindo, portanto, um lugar específico para
a produção artística, nem para o sujeito artista.

Quando pensamos na estrutura das sociedades primitivas, recorremos à antropologia


pré-histórica e à antropologia social ou cultural/etnologia, pois a integração entre essas
áreas busca observar de modo abrangente e totalizante a vida social e individual; em
outras palavras, o todo social. Segundo Laplatine (2006), a:

Antropologia pré-histórica é o estudo do homem através dos vestígios


materiais enterrados no solo (ossadas, mas também quaisquer marcas
da atividade humana). Seu projeto, que se liga à arqueologia, visa
reconstituir as sociedades desaparecidas, tanto em suas técnicas e
organizações sociais, quanto em suas produções culturais e artísticas.
[...] A antropologia social e cultural (ou etnologia) [...] diz respeito a
tudo que constitui uma sociedade: seus modos de produção econômica,
suas técnicas, sua organização política e jurídica, seus sistemas de
parentesco, seus sistemas de conhecimento, suas crenças religiosas, sua
língua, sua psicologia, suas criações artísticas” (LAPLATINE, 2006, p.
17-19).

Isso quer dizer que aquilo que hoje reconhecemos como arte nas sociedades primitivas
era algo profundamente integrado e significante à vida daquela sociedade e, muito
provavelmente, o objeto observado como arte, por nós, não ocupava esse lugar de
objeto, mas sim algo profundamente enraizado ou significativo na cultura vivida deste
ou daquele grupo.

Outro aspecto a se considerar sobre as sociedades primitivas muito antigas – apesar de


todas serem formadas por grupos de caçadores e coletores e de serem muitas das vezes
percebidas como semelhantes em termos de suas características – é a existência de
uma grande diversidade e variedade de modos de viver, de se alimentar, de conceber as
tarefas do cotidiano em suas vidas. Ao lado da diversidade dessas sociedades, temos que
entendê-las como sendo dinâmicas, ou seja, acabam produzindo e sofrendo mudanças
com o passar do tempo, aprendem novas coisas, desenvolvem e aperfeiçoam técnicas,
o gosto e as preferências, o que redundará, no plano das artes, a criação e conformação
de certas tradições estilísticas a partir de determinado momento e, ao mesmo tempo, o
12
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

desaparecimento de determinada tradição, em dada circunstância, ou a fusão de uma


tradição em outra, desaparecendo registros desse processo.

Com o passar do tempo e o desenvolvimento das capacidades cognitivas, o aprendizado


de novas técnicas foi conformando os campos de saber no plano das artes, e
crescentemente foram aparecendo artesãos mais habilidosos e criativos que outros, e
que provavelmente ocupavam papel de maior destaque no grupo quando o assunto era
a confecção de artefatos significantes, situação que os fazia se aproximarem de algo que
nós, hoje, podemos chamar de objeto-arte, por ser um produto apreciado e significativo,
composto com determinada intencionalidade que dialogava profundamente com a
cultura comum. O assunto era a confecção de artefatos significantes, situação que os
fazia se aproximarem de algo que nós, hoje, podemos dizer objeto-arte, por ser um
produto apreciado e significativo, composto com determinada intencionalidade que
dialogava profundamente com a cultura comum.

Um exemplo da produção de artefatos/objetos artísticos dessas sociedades com


uso ritual-religioso, e que denotaria a necessidade da existência de um saber-fazer
minimamente sofisticado, foi mencionado por Harari (2018, p. 67) ao descrever
os objetos presentes em um túmulo de 30 mil anos a. C. (Figura 1), encontrado por
arqueólogos em Sungir, na Rússia, em 1955:

Os arqueólogos descobriram um túmulo que continha dois esqueletos


enterrados lado a lado, um era de um garoto de 12 ou 13 anos de idade
e o outro, uma garota de 9 ou 10 anos. O garoto estava coberto com 5
mil contas de marfim. Ele usava um chapéu com dentes de raposa e um
cinto com 250 dentes desse animal (pelo menos 60 raposas precisaram
ter os dentes removidos para se obter essa quantia). A garota estava
adornada com 5,25 mil contas de marfim. Ambas as crianças estavam
cercadas por estatuetas e vários objetos de marfim. Um artesão (ou
artesã) habilidoso provavelmente precisaria de uns 45 minutos para
preparar uma única conta de marfim. Em outras palavras, para fabricar
10 mil contas de marfim que cobriam as duas crianças, sem mencionar
os outros objetos, seriam necessárias aproximadamente 7,5 mil horas
de trabalho delicado, bem mais de três anos de trabalho de um artesão
experiente. (HARARI, 2018, p. 67)

Produzir sistematicamente estes artefatos em número tão volumoso indica, no local


e na época em que foram elaborados, um refino estilístico e técnico suficientemente
sofisticado, que fazia com que alguns membros do grupo tivessem uma habilidade
destacada e fossem percebidos como artesãos dotados de certa especialização para
elaborar tais objetos. Hoje, guardadas as devidas distâncias e diferenças, poderíamos
chamá-los de artistas.

13
UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

Isso é o que podemos chamar de arte das sociedades pré-históricas, produzidas


por populações basicamente entendidas como viventes de sociedades de períodos
remotíssimos e sem escrita, caracterizadas pela condição produtiva e comunitária
de caçadores-coletores (Quadro 1), agrupados em pequenos bandos. Esses grupos
eram bastante dependentes dos recursos naturais disponíveis para a satisfação
das necessidades alimentares básicas, e se deslocavam constantemente com certo
nomadismo, pois mudavam seus acampamentos de tempos em tempos em função de
questões climáticas (muito frio, muito calor), de pressão ecológica (esgotamento de
recursos alimentares), de crença, entre outros.

Quadro 1. Desenvolvimento Humano por Critério Produtivo.

Desenvolvimento Humano por Critério Produtivo


1º Caçador-Coletor
2º Caçador-Coletor Especializado
3º Pré-Agricultor
4º Agricultor

Fonte: Elaboração própria.

Figura 1. Túmulo de Sungir, Rússia, Ossos de 30 mil antes do presente e reconstituição.

Fonte: <https://www.proza.ru/pics/2009/05/21/141.jpg>. Acesso em: 29/5/2019.

Mas, afinal de contas, qual era a arte produzida nessas sociedades pré-históricas,
caçadoras e coletoras?

No próximo item passamos a responder!

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CAPÍTULO 2
A arte em sociedades pré-históricas,
caçadoras e coletoras

É comum pesquisadores da área da História das Artes Pré-Históricas relacionar


o desenvolvimento das artes em sociedades muito arcaicas a suas transformações
tecnológicas, sobretudo para identificar determinadas trajetórias e aperfeiçoamentos
nas técnicas de produção dos artefatos ou dos registros arqueológicos (cultura material)
entendidos como arte. A “linha de tempo” começaria com a arte no Paleolítico, seguida,
em geral, da arte no período Neolítico e depois pelas sociedades agrárias (Quadro 2).

A antropologia pré-histórica nos indica que, nas sociedades dos primórdios da


humanidade, os grupos humanos não faziam distinções, exatamente rigorosas, entre
diferentes instâncias da vida. Isso quer dizer que a produção, as relações de parentesco,
os aspectos cognitivos e as crenças estão todos entremeados, constituindo o universo
existencial coletivo das populações pré-históricas profundamente entrelaçado.

Quadro 2. Critério de Classificação das Artes na Pré-História.

Critério de Classificação das Artes na Pré-História


1º Paleolítico
2º Mesolítico
3º Neolítico
4º Agricultura

Fonte: Elaboração própria.

Falar de modo definitivo de como os povos pré-históricos viviam ou, sobretudo, como
pensavam e enxergavam o mundo é tarefa difícil, para não dizer impossível, porque
os registros arqueológicos não permitem acessar precisamente o imaginário dessas
pessoas e suas culturas. O que os arqueólogos propõem são hipóteses de estruturas de
pensamento e visões de mundo que reverberavam também nas manifestações artísticas
(ver Quadro 3).

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UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

Quadro 3. Classificação da Arte Pré-Histórica no Paleolítico Superior (30 mil anos), a partir do sistema crono-

estilístico de A. Leroi-Gourhan.

Datas Antes do Presente Estilo


Magdaleniense Superior Estilo IV recente
13 - 11 mil anos
Magdaleniense Médio Estilo IV antigo
16 - 13 mil anos
Magdaleniense Inferior/ Estilo III
Solutrense Superior
20 - 16 mil anos
Solutrense Antigo/ Estilo II
Gravetiense
25 - 20 mil anos
Aurinhaciense Estilo I
32 - 25 mil anos

Fonte: Adaptado de Bozal (1995, pp. 13-14).

Diz Harari, sobre a estrutura animista do pensamento dos humanos pré-históricos, que:

O mundo do pensamento, da crença e do sentimento (das sociedades


pré-históricas) é muito difícil de decifrar. A maioria dos acadêmicos
concorda que as crenças animistas eram comuns entre os antigos
caçadores-coletores. O animismo é a crença de que praticamente todo
lugar, todo animal, toda planta e todo fenômeno natural tem consciência
e sentimentos, e que pode se comunicar diretamente com os humanos.
[...] No mundo animista, objetos e coisas vivas não são os únicos seres
animados. Há também entidades imateriais – os espíritos dos mortos, e
seres benévolos e malévolos, do tipo que hoje chamamos de demônios,
fadas e anjos. Os animistas acreditam que não existe barreira entre
os humanos e outros seres. [...] Assim como não existe barreira entre
os humanos e outros seres, tampouco existe uma hierarquia rígida.
(HARARI, 2018, p. 64)

Exatamente por conta da relação íntima entre as expressões das hoje consideradas
artes pré-históricas com outras dimensões estruturantes da vida cotidiana dessas
sociedades arcaicas, é difícil falarmos de uma arte como um setor dotado de autonomia.
Nesse sentido, segundo Hauser, qualquer explicação da arte paleolítica, como forma
decorativa ou expressiva, por exemplo, é “insustentável” (HAUSER, 2010, p. 6). Nessa
época, a vida era profundamente prática, e quase todas as dimensões da vida desses
indivíduos “gravitava em torno da mera subsistência, e nada justifica supormos que
a arte servia a qualquer outro propósito que não fosse o de constituir um meio para a
obtenção de alimentos” (HAUSER, 2010, p. 4).

16
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

Ainda que o posicionamento de Hauser deva ser suavizado no sentido de entender


que existia, crescentemente, uma seletividade, criatividade, aprendizado, técnicas
expressivas e sentido nas manifestações da arte pré-históricas associadas a campos
mítico-religiosos, e não apenas expressão ocasional e natural (como se houvesse uma
relação quase animalesca nos humanos que já expressavam-se através de registros
gráficos nas paredes de cavernas). A própria dificuldade de acesso às cavernas e paredões
nas quais estão gravadas as mais antigas pinturas humanas indica provavelmente
a especificidade técnica e ritualística presente em tais situações, além de um forte
propósito de sentido que estava relacionado às inscrições produzidas nas cavernas.

Se o animismo compunha a estrutura de pensamento dos humanos pré-históricos, esse


animismo também acabou tendo expressão na constituição da arte dessas populações.
A caracterização da arte pré-histórica, das populações caçadoras coletoras, é chamada
de NATURALISMO.

Como é entendido o naturalismo para o período pré-histórico?

Para Lopera e Andrade, o naturalismo derivava da condição dos “homens do


paleolítico superior” (aproximadamente a partir de 40 mil anos antes do presente),
“desconhecedores da agricultura e da domesticação de animais”, serem “caçadores
sempre ao capricho das inclemências do tempo e provavelmente do azar, sempre
temerosos do dia de amanhã”, e que representavam frequentemente animais presentes
em suas caças ou em momentos de defesa de seus ataques. O registro um tanto fidedigno
desses animais (Figura 2) em locais como cavernas acabou permitindo a classificação
dessas obras como naturalísticas.

17
UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

Figura 2. Aspecto das Pinturas da Caverna de Lascaux, França, que datam de 15 a 20

mil anos antes do presente.

Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/1e/Lascaux_painting.jpg>.

A imagem de Lascaux como um dos registros mais antigos da pintura pré-histórica é


extremamente significativa como exemplar sugestivo dos sentidos possíveis de serem
atribuídos ao fazer artístico dos homens da idade da pedra. Os paredões de Lascaux,
segundo a avaliação de Janson, é uma “imagem viva e realista, assombrosa pela agudeza
da observação, pelo traçado firme e vigoroso, pelos matizes sutis que dão volume e relevo
às formas ou, talvez ainda mais, pela força e dignidade” dos animais representados
como “bisões, veados, cavalos, touros, correndo ao longo das paredes em selvagem
profusão, alguns esboçados em preto, outros inteiramente pintados em cores vivas”,
todos, entretanto, expressando um “misterioso sentido de vida” (JANSON, 2001, p.
40).

De fato, a caverna de Lascaux congrega uma série de expressões que são fruto de uma
história do aprimoramento técnico de suas formas, cores e temas, materializado nos
contornos e traços firmes que atribuem concretude e vivacidade aos animais, entre
os quais bisões e veados; no emprego de cores com tonalidades intensas que dão um
refino estético aprimorado e belo ao naturalismo; no mistério do sentido que as figuras
suportam e que se relacionam com dimensões da vida e da sobrevivência da comunidade.

Relacionando o naturalismo à expressão nas paredes de Lascaux, Hauser mencionou


que:

Quando o artista paleolítico pintava um animal na rocha, produzia um


animal real. Para ele, o mundo de ficção e de representação pictórica,

18
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

a esfera da arte e mera imitação ainda não era um domínio especial


autônomo, diferente e separado da realidade empírica; não colocava em
confronto as duas esferas distintas, vendo numa continuação direta e
indiferenciada da outra (HAUSER, 2010, p. 5).

Essa forma de expressão artística, como no caso de Lascaux ou da Caverna de Chauvet


(Figura 3), através do desenho em paredes de cavernas, alcança um nível tão grande
de “virtuosismo”, tornando viável governar “atitudes e aspectos cada vez mais difíceis,
movimentos e gestos cada vez mais fugazes, esforços e interseções cada vez mais
audaciosos” (HAUSER, 2010, p. 2), como podemos observar na Figura 3 e que explicitam
um aprimoramento técnico extremamente vigoroso, permitindo ao artista a realização
de encenações carregadas de dinâmica que teatralizam aspectos do imaginário e do
real, fusionando em um naturalismo riquíssimo para a História da Arte pré-histórica.

Figura 3. Fotografia de fragmento da Caverna de Chauvet.

Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/0d/Chauvet%C2%B4s_cave_horses.jpg>.

A conceituação de naturalismo é relativamente convergente entre os teóricos do assunto.


Para o importante historiador da arte Hauser, o naturalismo é uma “arte que, a partir
de uma fidelidade linear à natureza, na qual as formas individuais ainda são moldadas
rígida e laboriosamente, avança para uma técnica ágil e brilhante, quase impressionista”
(2010, p. 2). Ou seja, Hauser considera como característico do estilo naturalístico a

19
UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

proximidade, a associação, a relação íntima entre o objeto artístico e a natureza; é da


natureza que brota o referencial, os traços básicos, as facetas principais; o diálogo entre
natureza e capacidade mimética mas também inventiva do artista-artesão é que conflui
para a concretização do artefato ou registro artístico.

A capacidade e inventividade do artista pré-histórico acabaram por ficar evidenciados


nas imagens das pinturas presentes nas cavernas reproduzidas acima, imagens essas
que indicam um atencioso e cuidadoso processo de composição de cada animal, de
cada traço e das situações representadas. Para Hauser, essas pinturas da Caverna de
Chauvet são frutos de um “processo que mostra a compreensão crescente de como dar à
impressão óptica final uma forma cada vez mais pictórica, instantânea e aparentemente
espontânea” (2010, p. 2).

A aparente espontaneidade não pode iludir o observador, pois nada tem de fator
ocasional, ou de um aspecto meramente espontâneo/natural pelo fato do artista ser
pré-histórico. Não! A espontaneidade tem espaço em uma técnica e uma cultura que já
sabia fazer e expressar-se no sentido apontado na caverna. Não forma pinturas ao acaso;
foram registros irmanados na história sociocultural das populações que a produziram e
que, em dado momento tiveram a capacidade de produzir e sintetizar as obras-primas
observadas tanto na Caverna de Chauvet como na Caverna de Lascaux.

Entretanto, mesmo sendo o Naturalismo o estilo da arte pré-histórica acima indicada,


os humanos pré-históricos não obedeciam obrigatoriamente a algum rigor formal ou
“estético” para confeccionar suas “obras” (Figuras 4 e 5). Isso se deve ao fato de que não
existia um único modo de ser humano pré-histórico e de produzir arte. Mesmo assim,
quando se menciona que um aspecto convergente no desenvolvimento da arte nesses
longínquos períodos da pré-história humana, explicitado pela constância na forma de
construir suas representações e a inserção dessas elaborações em seus mundos mentais,
é que configuraram a presença frequente do estilo naturalístico através de pinturas
em cavernas, covas ou paredões. O que quer dizer que eles não confeccionavam suas
obras para obedecerem à forma ou ao estilo, mas a obra realizada carregava consigo
essa apropriação e registro simbólico do mundo no qual estavam vivendo. No dizer de
Hauser, “esse naturalismo” não pode ser considerado jamais como uma “fórmula fixa
e estacionária”, ao contrário, ele “constitui antes, uma forma viva e cambiante” que
viabiliza um tratamento que objetiva a “tradução da realidade com os mais variados
meios de expressão e cumpre sua tarefa com maior ou menor perícia.” (2010, p. 2).

Ademais, é preciso considerar a arte rupestre como fruto da construção coletiva e


do delineamento, com o passar do tempo, de tendências estilísticas, conhecidas,
reproduzidas e aperfeiçoadas nas sociedades pré-históricas. Isso, na perspectiva

20
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

de Roger Bastide, confirma a percepção de que a “arte só podia ter nascido duma
colaboração de indivíduos” (BASTIDE, 1979, p. 45). Ou seja, a arte rupestre, mesmo
com variâncias e dimensões específicas, sempre teve uma origem coletiva. Pensar que
a arte nasce de tradições, se desenvolve técnica e estilisticamente através da história
impõe ao observador a necessidade de sempre considerar relevante e importante pensar
o artista, sua obra, seus temas e seu brilhantismo (eventual) no interior do contexto
histórico da sua sociedade e da História da Arte em geral.

Figura 4. Aspecto de pinturas da Caverna de Chauvet.

Fonte: <https://www.donsmaps.com/images22/chauvetpan.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Figura 5. Aspecto das Pinturas da Caverna de Lascaux.

Fonte: <https://www.donsmaps.com/images25/lascauxmainhallunicorn.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Outro aspecto da arte pré-histórica no paleolítico é o de que, apesar de haver


controvérsias, muitos autores convergem em considerar a existência de uma dimensão

21
UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

mágica na produção artística dessas populações. Segundo Janson (2001), “escondidas


nas entranhas da terra, fora do alcance de eventuais intrusos”, muitas imagens presentes
em cavernas “devem ter obedecido a um propósito muito mais sério que o simples gosto
de decorar”, qual seja, “não parece haver dúvida de que foram executadas para servir
um rito mágico, destinado, talvez, a assegurar o êxito na caça” (p. 41). Para Gombrich
(1999), esses “caçadores primitivos imaginavam que, se fizessem uma imagem da sua
presa, os animais verdadeiros também sucumbiriam ao seu poder” (p. 42). Em outras
palavras, segundo Hauser (2010), “quando o artista paleolítico pintava um animal na
rocha, produzia um animal real [...] a representação pictórica nada mais era do que a
antecipação do efeito desejado; o evento real tinha de se seguir inevitavelmente à ação
mágica da representação” (p. 5).

Ainda que para a arqueologia sejam hipóteses e conjecturas a relação entre a produção
dos desenhos nas cavernas e aspectos mágico-religiosos, essas hipóteses buscam oferecer
interpretações plausíveis a respeito do caráter da produção artística no paleolítico e
procuram afastar fortemente explicações mirabolantes e instintivas sobre essa mesma
arte, ressaltando a existência de fortes indícios de laços profundos entre os desenhos
e dimensões imaginárias ligadas às crenças e rituais dessas populações pré-históricas.

Ao pensar sobre as sociedades humanas muito antigas, chamadas de pré-


históricas, é comum imaginar que não viviam dentro do tempo histórico. Muitas
das vezes, imagina-se que viviam quase como animais. E, como animais, não
seriam capazes de produzir cultura, a não ser por instinto. Esse instinto em geral
é associado ao instinto de sobrevivência. Se os humanos viviam por instinto
de sobrevivência, pouco teriam a ensinar e a aprender. À luz das reflexões que
apresentamos sobre o ser humano pré-histórico, pense sobre a condição cultural
desses humanos e reflita se o humano pré-histórico vivia apenas através de seus
instintos.

Pensando no período paleolítico, podemos perceber o lento aparecimento de


manifestações, consideradas artísticas pelos arqueólogos, que ao mesmo tempo foram
ganhando certo refinamento e complexidade, explicitando a emergência de artesãos que
dominavam aspectos técnicos que eram movimentados para atingirem resultados em
pinturas, em objetos que constituem a arte rupestre dessa época. O modo naturalístico
que a arte no paleolítico vai concretizando diz muito das relações íntimas entre arte e
vida, arte e sentido, arte e magia.

Em sequência, continuamos percorrendo a trajetória da arte nas antigas sociedades


humanas, no caso, buscando perceber a transição pela qual a arte passou quando das
mudanças na vida dos humanos pré-históricos pré-agrícolas.

22
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

Para acessar mais informações sobre as Cavernas de Lascaux, veja o site que,
apesar de estar em inglês, é muito descritivo das Cavernas e das pinturas, ver:
<https://www.donsmaps.com/lascaux.html>

Para acessar mais informações sobre as Cavernas de Chauvet, veja o site que,
apesar de estar em inglês, é muito descritivo das Cavernas e das pinturas, ver:
<https://www.donsmaps.com/chauvetcave.html>

NATURALISMO PRÉ-HISTÓRICO: representa a maneira como os humanos pré-


históricos elaboravam suas expressões artísticas, pela qual o “artista pintava o
animal do modo como a via, reproduzindo a natureza tal seus olhos a captavam”
(PROENÇA, 2012, p. 6).

23
CAPÍTULO 3
Arte em transição: sociedades
pré-históricas pré-agrícolas

A transição da forma de vida e cultura das sociedades humanas é um tanto controversa


quanto ao momento de demarcação inicial e final. Isso porque as mudanças não
ocorrem em todos os territórios ao mesmo tempo, nem seguem, obrigatoriamente,
um fluxo evolutivo necessário. Temos continuidades, descontinuidades; irrupção e
definhamento de culturas; trocas e intercâmbios ao mesmo tempo que zonas que não
se comunicam nem se interferem. Entretanto, a arqueologia converge em compreender
que existem certos demarcadores de mudanças significativos na história humana, e que
sinalizam alterações profundas no modo como as sociedades desenvolveram suas vidas.
As zonas cinzentas de transição costumam apresentar, paulatinamente, “novidades”
e, ao mesmo tempo, deixam evidência de que certos modos de vida vão se tornando
arcaicos, sinalizando novos tempos com novos traços culturais.

O período que envolve o mesolítico (na Europa isso ocorreu, aproximadamente, entre
12 e 9 mil anos antes do presente) e o neolítico (na Europa isso aconteceu entre 9 e 8 mil
e 7 mil anos antes do presente) é caracterizado pelas profundas alterações decorrentes
da crescente domesticação de plantas e animais; da mudança na forma de sobrevivência
que sai da exclusividade da caça-coleta, aproximando-se pouco a pouco da agricultura;
da alteração da dinâmica da vida social, partindo do nomadismo atingindo o incipiente
sedentarismo (pré-condição para a constituição de civilizações) e vida em aglomerações
humanas aldeãs (CARDOSO, 2004, pp. 14 e 15).

Buscando explicar a longa gestação da transição do mundo de caçadores-coletores para


agricultores, Harari afirma que as mudanças começaram ao redor de 10 mil anos antes
do presente, “quando os sapiens começaram a dedicar quase todo o seu tempo e esforço
a manipular a vida de espécies de plantas e de animais”. Essa manipulação pode ser
traduzida como a domesticação de espécies da fauna e da flora e que ocorreram em
diferentes regiões do globo por diferentes populações, mas essas alterações começaram
entre os anos “9500-8500 a. C., no sudoeste da Turquia, no Oeste do Irã”, e outras
regiões do Oriente. Inicialmente o cultivo começou com o “trigo e bodes domesticados
por volta de 9000 a. C.; ervilhas e lentilhas em torno de 8000 a. C.; oliveiras, 5000 a.
C.; cavalos, 4000 a. C. e videiras em 3500 a. C.” (HARARI, 2018, p. 87). Também no
continente americano em período equivalente ocorreu a domesticação de tubérculos,
batatas e, em especial, do milho.

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A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

A domesticação de plantas e animais acabou por permitir que o homo sapiens se


reproduzisse em números extraordinários, ampliando as áreas de migração e presença
humana; isso porque, ao redor de 13000 a. C., “quando as pessoas se alimentavam
coletando plantas silvestres e caçando animais selvagens”, era comum que as regiões
pudessem sustentar bem nutridos “bandos nômades” com poucos humanos (HARARI,
2018, p. 93). Ao redor de “8500 a. C., quando plantas silvestres deram lugar aos campos
de trigo”, os antigos bandos deram lugar a grandes aldeias, “abarrotadas” com mais
de “mil pessoas” (HARARI, 2018, p. 93), inaugurando uma nova etapa da organização
humana na terra, carregada de complexidade e viabilizando o desenvolvimento de áreas
de domínio de especialistas (na arte da guerra, na arte do governo, na arte do sagrado,
na arte das técnicas dos ofícios e da cultura).

Essas mudanças na forma de realizar a vida acabaram estendendo-se para a expressão


artística das sociedades da era mesolítica e, especialmente, neolítica. De acordo com
Hauser, o estilo naturalístico “predominou até o final do paleolítico”, período no qual
“nenhuma mudança ocorreu até iniciar-se a transição para o neolítico, e foi essa a primeira
mudança estilística em toda a História da Arte” (HAUSER, 2010, p. 9). As novidades no
estilo da produção artística serão expressas por Hauser, comparativamente ao período
anterior, pois ele menciona que apenas a partir do neolítico a “atitude naturalística
cedeu lugar a uma ESTILIZAÇÃO GEOMÉTRICA”, típica da nova época, “na qual o
artista era mais propenso a fechar-se para a riqueza empírica” (HAUSER, 2010, p. 9).

A novidade estilística explicitada pela estrutura geométrica das representações


também acabou expressando uma inovação na extensão do fazer artístico. Se no
paleolítico a esfera da arte estava fusionada com a dimensão mágico-religiosa, no
neolítico haverá uma cisão na produção artística, podendo falar-se de uma tendência
de compartimentação e segmentação do fazer a arte e os seus artefatos. De um lado,
terá expressão a arte sagrada; do outro lado, existirá outra manifestação, a arte profana.
A arte sagrada dedicada à “arte sepulcral e da escultura de ídolos”, bem como “da
execução de danças rituais”, dominadas por homens-artistas (HAUSER, 2010, p. 21). A
arte profana, por sua vez, será dedicada a “solucionar problemas decorativos”, ligando-
se a expressões “impessoais e tradicionalistas” (HAUSER, 2010, pp. 21-22) vocalizando,
mais explicitamente, as inovações estéticas de conformações geométricas.

Isso quer dizer que o campo cultural e da arte se tornará mais complexo e secionado.
O espectro profano é o espaço no qual o artesão e artista domina e navega, através
da experimentação e inovação estética. Nesse sentido, a expressão artística elaborada
é dotada de intencionalidade e acaba construindo referenciais importantes para
compreender o desenvolvimento da História da Arte. A dimensão da cultura/arte
religiosa também sofreu alterações, mas dentro de outro espectro expressivo e de

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UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

intencionalidade, rico e belo, diferente da arte profana. A arte profana foi sendo
responsável por inscrever mais robustamente as inovações estilísticas que a arte
sagrada que, também, com o tempo, sofre desenvolvimentos, mas responde a outros
mandamentos espirituais e do imaginário religioso.

O novo estilo desenvolvido desde o neolítico, “em vez de representações fiéis à


natureza, com paciente e extremoso cuidado na reprodução detalhada do objeto” –
característica do naturalismo –, expressará, de agora em diante, em inúmeros registros
e crescentemente, “sinais esquemáticos e convencionais que sugerem mais do que
reproduzem o objeto, como se fossem hieróglifos; [...] no lugar de uma concretização
da experiência cotidiana de vida”, a novidade estilística na arte “procura deter-se na
ideia, no conceito, na substância íntima da coisa – mais para criar símbolos do que
semelhanças do objeto” (HAUSER, 2010, p. 9). Exatamente a predominância em fazer
dizer, através do artefato, ganhar corpo um conceito, uma ideia, representou uma
ruptura absolutamente significativa com a anterior naturalismo. As representações
passam a sugerir situações, objetos, temas, personagens, animais, flora, que, ao
contrário de buscar parecer o objeto, passam a, através dos traços, sinalizar o que se
quer dizer, o que se ambiciona comunicar e registrar. De parecer a situação o objeto
representado, passa-se a indicar conceitualmente o que se ambiciona dizer.

A perda do naturalismo refletiu também o enfraquecimento de certa mentalidade


mágica, presente em muitos momentos da arte, forjada em covas, cavernas de acesso
relativamente difícil. Um exemplo desse aspecto é o local no qual parte das pinturas
desse novo estilo estão registradas. É comum encontrar manifestações das inovações
em espaços e regiões acessíveis, ao ar livre, em paredões e paredes viáveis de serem
percebidos e frequentados. Lopera e Andrade, comentando expressões desse estilo na
área mediterrânea da Espanha, mencionam que a parte importante da execução ocorreu
“ao ar livre, em abrigos rochosos, com tintas planas, e a escala das figuras estavam
apresentadas de forma bastante reduzida” (1995, p. 26), e não mais nas profundezas
de cavernas ou grutas de difícil acesso como era comum ao estilo naturalístico anterior.

As feições estilísticas novas expressaram o desenvolvimento da “esquematização” que


“avançou notavelmente, e foi fruto de um processo de seleção e captação das linhas e
movimentos essenciais” do objeto construído/representado, o que acabou redundando
na produção de uma manifestação artística “extraordinariamente vívida e depurada”
(LOPERA; ANDRADE, 1995, p. 26) na qual a presença de figuras antropomórficas,
que sinalizam os seres humanos, passam a ser observadas, constituindo uma novidade
relevantíssima na História da Arte. Essas figuras buscavam mencionar, construir uma
ideia da presença humana na arte, mas de modo esteticamente estilizado, fugindo à
busca da associação com qualquer aspecto naturalístico.

26
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

Um exemplo extremamente significativo e relevante das mudanças na arte pré-histórica


é o conjunto de manifestações presentes na Cova del Moros (Figura 6), localizada na
região da Andaluzia na Espanha. Analisando a Cova del Moros, Lopera e Andrade
indicam que o homem antes “raramente” era “representado” e, na Cova, ele “torna-se
presente” em inúmeras “cenas de caça ou de guerra, em danças ou nas atividades de
colheita” (1995, p. 26). Além dos homens, também aparecem “várias mulheres, vestidas
de saias” ao redor de um “homem nu, numa dança ritual”. Essa amplitude de temas e
de maneiras de representar os humanos, bem como as encenações que são sugestivas
mas não possuem identidade figurativa com as situações retratadas, são indicativos
importantes para essa nova etapa da arte.

Figura 6. Dança Ritual na Cova del Moros (Cogul) +- 5 mil a 7 mil a. C.

Fonte: <https://patrimonioculturalandaluciaangela.wordpress.com/category/edad-de-los-metasel/>. Acesso em: 29/5/2019.

A presença humana, estilizada, dissemina-se no período neolítico. Agora, ao lado de


animais, da fauna, entre outros temas, as figurações humanas vivenciam encenações,
“esquematizando as figuras, reduzindo-as a puros ideogramas”, como o exemplo da
representação do “ser humano” que pode ser “representado com traços que aludem
a cabeça, tronco e extremidades”, sendo possível inclusive “prescindir de partes do
corpo tão vitais como a cabeça, fundir o tronco e as pernas”, sendo viável construir
“um esquema em T” que ganha a condição de aparecer como um “símbolo de valor
antropomórfico” (LOPERA; ANDRADE, 1995, p. 26).

Esse esquema de sinalizar o ser humano de modo estilizado em T também se estende


às representações de figuras animais, que se afastam da associação naturalística e

27
UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

procuram construir um animal de formas mais simplificadas e traços mais marcantes


– sugestivos do animal retratado –, como no caso das pinturas da caverna de Rocó
Nando, em Benassal, Valência, Espanha (Figura 7), em que é o possível verificar que
parte do conjunto está indicando a atitude de um ser humano no momento preciso da
realização da caça de um animal, retratado em formatos mais simplórios e demarcado
pelos traços que sugerem ser determinada espécie.

Apesar de, aos olhos atuais, essa representação humana ou de animais através de traços
parecer uma simplificação frente às expressões naturalísticas, uma vez que os animais
e os humanos, como objetos forjados pelos traços, acabam traduzindo uma certa
simplicidade e facilidade construtiva, aproximando-se de uma pobreza de competência
artística (diria uma pessoa não versada na arte – simples traços), tratando-se da
História da Arte e dos estilos, esta simplificação das formas, esta desnecessidade de
parecer que o objeto ou a situação que se quer descrever ou mencionar através da arte
seja próxima ou parecida com o objeto ou situação representada na verdade significa
um extremo aprimoramento estilístico no campo artístico, uma vez que se afasta dos
limites da representação naturalística e amplifica as potencialidades estéticas dos seres
humanos. Com esse afastamento do aspecto naturalístico, que tem expressão inicial
nesse momento, a arte viabiliza toda uma possibilidade de criação do gênio humano,
permite toda uma liberdade criativa antes difícil de ser imaginado.

Figura 7. Pintura Neolítica na caverna de Rocó Nando, em Benassal, Valência, Espanha.

Fonte: Cabanilles e Olivier (1987, p. 29). Disponível em: <http://www.museuprehistoriavalencia.es/web_mupreva_dedalo/


publicaciones/245/va>. Acesso em: 28/5/2019.

28
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

Esses esquemas inovadores visíveis nos exemplos mencionados da Cova del Moros e
da caverna de Rocó Nando não são, entretanto, universalizáveis, ou seja, válidos para
todas as regiões do planeta, indicando, mesmo assim, certas tendências dos estilos
artísticos, em especial na Europa ocidental. Ainda que não seja aplicável a todos os
locais, o desenvolvimento de tendências estilísticas possivelmente relacionou-se
ao desenvolvimento das expressões artísticas de regiões circunvizinhas das áreas
mediterrâneas na África e no Oriente (LOPERA e ANDRADE, 1995, p. 26). Isso quer
dizer que todas essas regiões, relativamente próximas, possivelmente intercambiaram
influências mutuamente, sendo difícil de precisar que os elementos culturais irradiaram
puramente de apenas uma localidade em direção às demais.

Mesmo não sendo um estilo universal, a estética neolítica representa uma importante
alteração de estilo que leva à geração de formas predominantemente ou “inteiramente
abstratas de arte”, sendo condicionada pelas modificações mais amplas no âmbito
cultural e da “civilização”, explicitando uma época de mudança profunda, relacionada
diretamente às novas formas de levar a vida (HAUSER, 2010, p. 13).

Em síntese, as mudanças nas formas de produzir e levar a vida, saindo de condições


mais áridas, provisionais, rudimentares e precárias para condições sensivelmente “mais
estáveis”, tiveram implicações diretas na produção da arte, na “expressão artística”,
sendo no interior dessas alterações que o artesão ou “artista do Neolítico passou a
retratar a figura humana em suas atividades cotidianas” (PROENÇA, 2012, p. 8) e mais
prosaicas, cotidianidade que também passaram a amplificar a quantidade e variedade
de fazeres, elevando a complexidade produtiva e social.

Ao lado da pintura, expressão à qual estamos dando destaque até o momento, é


importante saber que também no neolítico as mudanças acabaram por ter concretização
no desenvolvimento de outros suportes, que demandavam outras técnicas e que
possuem especificidades em relação à pintura quanto aos seus desenvolvimentos, como
a arte da tecelagem, a arte cerâmica, a arte da construção de moradias, a arte escultórica
em pedra, metal e barro e a arte metalúrgica, que teve início com a “fundição de metais”
(PROENÇA, 2012, p. 8). Todas essas alterações acabaram repercutindo na produção de
artefatos dos humanos em idades mais remotas, que começam a abundar nas antigas
sociedades pré-históricas e que atualmente rendem muitos estudos e pesquisas em
milhares de sítios arqueológicos espalhados ao redor do planeta.

Pensando na História da Arte ocidental, podemos perceber que a arte pré-histórica


esteve envolvida em lentos processos de mudanças estilísticas, passando de uma arte
naturalística para uma arte geométrica associada aos períodos do paleolítico e do
neolítico, respectivamente. Mesmo sabendo que essa trajetória de desenvolvimento
observou inúmeras alterações com o passar do tempo, e que não será objeto de
nossa atenção aqui acompanhar todas as mudanças passíveis de serem observadas

29
UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

na arte ao longo da história, buscaremos, na sequência, pensar como no Ocidente, a


partir da existência de civilizações, em especial a grega e a romana, a arte foi sendo
constituída, caracterizada e modificada; principalmente através da arte escultórica, que
congregava consigo traços sintéticos das inovações e da construção de tradições, sendo
representativa das dinâmicas da História da Arte.

Entretanto, antes de adentrar essa seara das sociedades agrícolas tendencialmente


urbanizadas, com configuração social de maior civilidade e crescente complexidade da
tessitura social, é importante mencionar a existência de significativos registros de arte
primitiva dentro do atual território brasileiro.

Diversas grutas, cavernas, paredões e áreas espalhados pelo Brasil contêm registros de
arte rupestre e que manifestam diferentes tradições ou horizontes no nosso território
nacional. Parte dessas áreas está tombada pelo patrimônio arqueológico e acessível à
população, podendo ser visitada presencialmente, como no caso do Lajedo da Saudade,
localizado na cidade de Apodi, no Rio Grande do Norte, com suas significativas pinturas
rupestres datadas de aproximadamente 5 mil anos a. C. (Figura 8). Estima-se que os
registros arqueológicos no país estejam espalhados por mais de 25 mil sítios, distribuídos
em todas as regiões do território nacional, e que na sua grande maioria esses registros
datam de um período posterior a 12 mil anos antes do presente (IPHAN, 2018), sendo
que as mais antigas predominam na região Nordeste.

Figura 8. Pintura Rupestre, Lajedo da Saudade, +- 5.000 a. C. a +- 3.000 a. C.

Fonte: <https://a6ee1d56-a-62cb3a1a-s-sites.googlegroups.com/site/lajedosoledade/home/IMG-20181209-WA0004.
jpg?attachauth=ANoY7cr8W6iIAv4-0CALrl4fbwXq67cl8NOa8EGZc4tVKx7DUcJlvOa6iqxngelI7IZTIuHgUlrjC9GqlzymYrjynKAV8RqJ1Jj
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0F6YX-S5VwJXCKceWz97aEeKmTNG02mH9UQldK9PoSE%3D&attredirects=0>. Acesso em: 28/5/2019.

30
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

A arte rupestre, ou “pinturas e gravuras rupestres pré-históricas”, nas palavras de


Anne-Marie Pessis e Gabriela Martin, sintetizam “expressões de dois aspectos únicos do
fenômeno humano”: o primeiro aspecto é a capacidade do ser humano de “desenvolver
técnicas de controle da matéria-prima para produzir objetos de funcionalidade
polivalente”; o segundo aspecto é a “potencialidade de utilizar esse produto para
representar materialmente o seu símbolo e a sua imaginação” (PESSIS; MARTIN,
2014, p. 27). Ou seja, na produção de artefatos entendidos como arte estão presentes
pelo menos duas dimensões, a técnica e a confecção, ou transformação de um objeto
em outro objeto dotado de significado agregado ao novo artefato produzido e que não
se reduz a mera dimensão utilitária.

Governar a técnica e desenvolvê-la apresenta-se como fundamental para que o humano


tenha a potencialidade de sintetizar em novos artefatos dimensões do seu imaginário, de
seu modo de ver e viver o mundo, de traduzir aspectos de sua sensibilidade e percepções
da existência, de exteriorizar o aprendizado e as inovações técnicas sinalizando
constâncias e mudanças estéticas.

A respeito de características genéricas da arte rupestre, Pessis e Martin sugerem que


“pinturas e gravuras rupestres são vestígios arqueológicos que constituem sistemas
visuais de comunicação social”, e são compostos por “elementos gráficos que fazem
parte de padrões de apresentação próprios das comunidades pré-históricas” (PESSIS;
MARTIN, 2014, p. 27). Exatamente as pinturas e gravuras são manifestações inseridas
profundamente na cultura e nos modos de vida das populações que os produziram, e
dificilmente podem ser compreendidos fora do seu contexto sócio-histórico. Os registros
foram elaborados carregados de sentidos para aqueles humanos e a História da Arte
precisa considerar aspectos externos ao registro para compreender os seus significados,
os seus sentidos e mesmo os seus aprimoramentos estilísticos, as suas tradições.

Frequentemente, a narrativa histórica sobre as raízes do Brasil reporta um vínculo


cultural estreito com as populações de língua guarani e tupi e uma suposta carência
de conhecimentos sobre os povos anteriores à chegada dos portugueses (ALMEIDA,
2013, p.35). Quando se buscou construir um imaginário identitário brasileiro, expresso
e forjado também nas artes, em especial desde os modernistas de 1922 (por meio do
movimento cultural que fomentou a Semana de Arte Moderna de 1922), as etnias
falantes das línguas guarani e tupi foram alçadas à condição de uma das fontes de uma
suposta matriz cultural nacional que amalgamaria a cultura ibérica, a cultura africana
e a cultura indígena (leia-se guarani e tupi).

Ao elegerem guarani e tupi como a cultura mais antiga e a mais representativa das
populações autóctones nacionais, na realidade acabou-se por inventar uma suposta

31
UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

herança cultural, bem como sugeriu-se uma antiguidade para a presença humana no
território brasileiro muito mais recente do que a que os achados arqueológicos hoje
podem confirmar. Isso quer dizer que a arte rupestre e a arte pré-histórica, em suas
diferentes expressões, representam os artefatos mais antigos produzidos com um
sentido próximo de arte dos humanos no país, e são muito mais antigas (pelo menos
datam de 12 mil anos antes do presente) do que os guaranis e tupis dos anos 1500.

Para as autoras Pessis e Martin, é possível afirmar que os registros rupestres,


materializados através de “pinturas e gravuras” no território nacional, é a “primeira
manifestação estética da Pré-História brasileira”, sendo tal arte de “interesse
arqueológico e etnológico [...] indicadores de grupos étnicos” e que esses registros
“na ótica da História da Arte [...] representam o começo da arte brasileira” (PESSIS;
MARTIN, 2014, p. 27). Enfim, se fossemos buscar uma genealogia da produção artística
nacional, teríamos de remontar e considerar como demarcação inicial exatamente os
registros produzidos milênios atrás, quando nossos “parentes” pré-históricos habitavam
as regiões do país e deixavam consignado manifestações de suas percepções da vida, da
morte, da sobrevivência, da sociabilidade.

As amostras de arte pré-histórica são inúmeras e estão dispersas por todos os quadrantes
do país e, em nível federal, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(IPHAN) é a entidade responsável por financiar, proteger, inventariar e estimular a
valorização do patrimônio arqueológico. Atualmente, o IPHAN possui o cadastro de
mais de 12 mil sítios arqueológicos no território nacional. Mesmo que todos esses
inúmeros sítios arqueológicos tenham a sua importância, alguns deles acabam por se
destacar, como no caso do Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí; do Parque
Arqueológico do Lajedo, no Rio Grande do Norte; e do Parque Nacional das Cavernas
do Peruaçu, em Minas Gerais. Cada qual guardando verdadeiros tesouros arqueológicos
e registros importantíssimos para a História da Arte brasileira.

Dentre os diferentes exemplos de repositórios de arte pré-histórica brasileira,


destaca-se o Parque Nacional da Serra da Capivara, no estado do Piauí. O Parque de
Serra da Capivara contém um número de registros de arte rupestre impressionante
e cuja densidade não existe equiparação na América como a deste sítio arqueológico,
e que, segundo Pessis e Martin, “se acumula, por quilômetro quadrado, uma das
maiores concentrações de pinturas rupestres do mundo”, colocando esse parque como
um importante patrimônio arqueológico da humanidade, reconhecido pelas Nações
Unidas através da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura) (PESSIS e MARTIN, 2014, p. 36). A imensidão da área desse
sítio é difícil de ser sintetizada; de todo modo, apresentamos algumas amostras
significativas dos registros rupestres encontrados na localidade e que explicitam a

32
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

riqueza e intensidade dos humanos que os produziram, sinalizando toda uma vida
intensa (Figura 9).

Figura 9. Aspecto de Rupestre, Parque Nacional da Serra da Capivara.

Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/7/70/Serra_da_Capivara_-_Several_Paintings_2b.jpg/800px-
Serra_da_Capivara_-_Several_Paintings_2b.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Sendo considerado um “santuário cultural das épocas pré-históricas”, o conjunto de 717


sítios arqueológicos constantes do Parque da Serra da Capivara é representativo por si
só, mas também porque é considerado como o “epicentro de difusão de um horizonte
cultural que se iniciou há aproximadamente 10 mil anos a. C. e espalhou-se”, como
passar do tempo “por áreas do semiárido, como o Seridó, no Rio Grande do Norte, e a
Chapada Diamantina, na Bahia” (PESSIS e MARTIN, 2014, pp. 36-37). A importância
desse epicentro cultural está na capacidade de fundar uma tradição estilística que
estará presente em outros sítios arqueológicos da região e em períodos equivalentes.
Isso significa que a Serra da Capivara acabou se tornando a difusora pré-histórica de
uma tradição estilística desenvolvida pelas populações rupestres e que demarcam os
mais remotos traços de uma área cultural no território.

As imagens da Serra da Capivara possuem como característica a “grande variedade de


temas”, contemplando “figuras antropomórficas e zoomórficas reconhecíveis”, as quais
realizam “ações, compondo diferentes cenas”; as imagens possuem “enfeites e atributos”
que acompanham figuras humanas, “sugerindo hierarquias e diferentes tribos”; as
cenas contêm “quase sempre” uma representação de movimento; “a luta, a caça a dança
e o sexo são habilmente” apresentados “com grande riqueza de interpretações”; apesar

33
UNIDADE I │ A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA

da presença frequente da policromia com cores como “a branca, a amarela, a preta


e a cinza”, o predomínio é da coloração vermelha, em “suas numerosas tonalidades”
(PESSIS e MARTIN, 2014, pp. 38-40) (Figura 10).

Figura 10. Aspecto Antropomórfico e Zoomórfico, Parque Nacional da Serra da Capivara.

Fonte: <http://www.fumdham.org.br/wp-content/uploads/2015/07/fumdham-0412.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Ou seja, o conjunto de registros rupestres do sítio da Serra da Capivara explicitam toda


uma vitalidade, uma criatividade e exuberância da arte pré-histórica, dentro de um
universo estilístico aprimorado no qual as cenas, os temas, as dinâmicas construídas
relacionam-se com situações de vida, rituais, aspectos cotidianos tratados esteticamente
pelos nossos artistas mais antigos. A arte brasileira não deriva apenas de guaranis ou
tupis, mas as pesquisas arqueológicas têm nos informado que uma suposta raiz cultural
das populações do nosso território remonta, pelo menos, ao redor de 10 mil anos
antes do presente, sendo, portanto, antiquíssimas. Essas estéticas ainda estão por ser
“descobertas” pelos nossos artistas e em nossas academias.

Por fim, nessas pinturas rupestres da Serra da Capivara e em outros registros em regiões
sob sua influência, “o mundo que aparece é o da vida cotidiana da Pré-História, às
vezes trágica e violenta”, outras vezes, é representado “um mundo lúdico e brincalhão”,
materializando uma complexidade social das populações que as produziram muito
significativa.

Após esse passeio pela arte pré-histórica, o que inclui o território brasileiro, nos
próximos capítulos trataremos do desenvolvimento da arte em sociedades agrícolas,
crescentemente urbanizadas e civilizadas, sobretudo da região mediterrânea e do
ocidente europeu.

34
A ARTE NA PRÉ-HISTÓRIA │ UNIDADE I

O Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, pode ser visitado e, pela


internet, é possível acessar mais informações sobre as características, a riqueza
arqueológica, geológica e natural. Ver: <http://www.fumdham.org.br/>.

O Sítio Arqueológico do Lajedo, localizado na cidade de Apodi, no Rio Grande


do Norte, pode ser visitado e é possível acessar mais informações sobre as
características, a riqueza arqueológica, geológica e natural. Ver: <http://www.
lajedodesoledade.org.br/>.

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) mantém site no


qual constam os sítios arqueológicos no Brasil; o Instituto também mantém o
Centro Nacional de Arqueologia. Ver: <http://portal.iphan.gov.br/cna> e <http://
portal.iphan.gov.br/cna/pagina/detalhes/42>.

35
A ARTE NA GRÉCIA UNIDADE II
ANTIGA
Dando continuidade aos estudos sobre História da Arte Antiga, nesta Unidade
trataremos de:

1. Refletir sobre aspectos do território grego, as origens da sua cultura e os


vínculos com o Mar Mediterrâneo.

2. Identificar, analisar e caracterizar os diferentes períodos da Arte Grega


Antiga, em especial a partir do período Arcaico, chegando até o período
Helenístico.

3. Analisar e exemplificar especialmente a arte escultórica como


representativa do desenvolvimento estético grego nos períodos Arcaico,
Clássico e Helenístico.

4. Identificar as principais inovações artísticas especialmente na escultura,


em cada um dos períodos.

Para trabalhar esses aspectos, dividimos as atividades em quatro capítulos:

Capítulo 1. A Antiga Arte Grega: caracterização.

Capítulo 2. A Arte Grega Arcaica.

Capítulo 3. A Arte Grega Clássica.

Capítulo 4. A Arte Helenística.

Boa leitura.

36
CAPÍTULO 1
A Antiga Arte Grega: caracterização

A História da Arte no Ocidente sofreu profundas mudanças com o surgimento de


sociedades agrícolas, sedentárias e, em sequência, de sociedades urbanas. Associado
a essas alterações, paulatinamente é observado o surgimento de civilizações (também
chamadas de altas culturas) caracterizadas pela extrema complexidade nas relações
sociais, pela grande divisão de tarefas sociais ou do trabalho, pela diversificação
econômica e produtiva, pela interdependência das comunidades, pela hierarquização
social, pela ordenação sociopolítica mais ritualizada e pelo refinamento cultural.

A cultura grega, considerada um dos berços da civilização ocidental, de modo nenhum


é uma cultura gestada de um momento para outro simplesmente, ou uma cultura
“exclusivamente” grega desde sempre. Se é verdade que a civilização grega, em especial
a partir de 700 a. C. aproximadamente, desenvolveu de forma profunda certos aspectos
da cultura, das artes, da filosofia, e de instituições que serão extremamente significativos
para o chamado mundo ocidental, também é verdade que a Grécia Antiga é tributária
de uma longa história sociocultural mediterrânea e mesmo oriental.

A Grécia Antiga, composta por uma série de ilhas e trechos continentais, fazia parte de
uma região extremamente dinâmica em termos culturais – o Mediterrâneo e outros
mares – (conferir a Figura 11 – Mapa atual de países na região do Mar Mediterrâneo),
pela qual as trocas, os intercâmbios, as apropriações de aspectos de uma região eram
comumente incorporados por outra.

As mútuas influências culturais eram amplificadas pelas navegações, pelo intercâmbio


comercial, pelos conflitos e pelos processos de conquistas de um povo/civilização sobre
outros. O mapa da Grécia Antiga (Figura 12 – Mapa das áreas sob interferência grega,
800 a. C. a 500 a. C.) e suas áreas de influência no período Arcaico, entre 800 a. C. e
500 a. C. aproximadamente, reforçam a dimensão de uma área cultural grega inter-
relacionada fortemente com o Mar Mediterrâneo, abrangendo a costa do Mar Negro e
do norte da África e (Black Sea, na Figura 8), do sul da Itália, França e Espanha.

De acordo com Cunha (2012a):

por volta do VIII milênio a. C. até meados do VI, o mundo grego estendia
suas colônias da Península Ibérica, no sul da Espanha, à costa oriental
do Mar Negro, a Cirene e seu porto Apolônio, na costa da Líbia, no norte
da África, como também a cidades do próprio Egito como Neucratis, no

37
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

Delta do Nilo. [...] A influência grega não se estendia apenas pela língua,
comércio, cultura ou religião, [...] também na arquitetura, resultado
de séculos de aprendizado com os povos do Mediterrâneo (CUNHA,
2012a, pp. 230-231).

Figura 11. Mapa atual de países na região do Mar Mediterrâneo.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Mar_Mediterr%C3%A2neo#/map/0>. Acesso em: 29/5/2019.

Figura 12. Mapa das áreas sob interferência grega, 800 a. C. a 500 a. C.

Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/26/Location_greek_ancient.svg>. Acesso em: 29/5/2019.

Apesar de a Grécia e a Roma serem consideradas os “berços” da civilização ocidental,


atribuindo-se uma certa excepcionalidade germinal a ambas na difusão de aspectos
basilares de uma suposta longa história sociocultural europeia, inúmeros autores
têm contestado essas perspectivas. Muitos criticam, como o antropólogo Jack Goody
(2008), a percepção exclusivista de que o Ocidente se fez fundamentalmente por si
próprio, se autogestou sem influências determinantes de outras culturas, sendo por essa
conceituação equivocada entendida com uma aura de excepcionalidade, de uma cultura

38
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA │ UNIDADE II

autônoma e sem maiores origens que a si mesma, fundamentalmente autêntica.Em seu


livro O roubo da história, Goody (2008) fundamentalmente enfrenta os argumentos de
uma suposta autenticidade do Ocidente, que teria iniciado com a cultura clássica grega
e romana, apresentando inúmeros exemplos de aspectos dos quais o chamado Ocidente
é tributário de culturas africanas, orientais e asiáticas. Tratando-se de uma ideia de
tradição artística ocidental iniciada na Grécia Antiga ou, para Goody, “a ideia de que os
gregos ‘criaram a arte’ parece uma apropriação”, bem como, “as reivindicações de terem
introduzido o elemento pessoal na poesia e na crítica social, um novo individualismo,
conceitos morais e políticos” indicam serem um tanto “exageradas, etnocêntricas”,
explicitando uma autoimagem de “superioridade da tradição europeia sobre as outras”
(GOODY, 2008, p. 46).

A consideração da contribuição de outras culturas para o desenvolvimento do “berço”


da civilização ocidental, segundo Goody, é indispensável para pensar em uma história
sociocultural europeia intrinsecamente interligada à história de outras sociedades. O
Ocidente, para o autor, seria tributário não apenas da Grécia mas de inúmeras culturas,
isso porque “a Grécia Antiga foi precedida pelas culturas cíclade, micênica e aquemênida,
sem falar da dos hititas e da do antigo Oriente Médio e, claramente, tem uma dívida
para com todas essas tradições artísticas substanciais” (GOODY, 2008, p. 46).

Tratando-se de arte, Goody é ainda mais enfático ao afirmar que “o que é marcante na
questão da herança europeia da Grécia [...] não é tanto esta ter mostrado um caminho,
mas toda a tradição artística ter sido decisivamente rejeitada” ao longo de parte da
antiguidade e na Idade Média, sendo retomada em uma verdadeira “reinvenção do
passado” (GOODY, 2008, pp. 46, 47).no período do Humanismo e Renascença (séculos
XIV, XVI). Essa afirmação de Goody não objetiva desvalorizar a importância da arte
grega nem seus incrementos para a História da Arte, mas tem a intenção de chamar
a atenção para o processo histórico-social de descontinuidade dos fenômenos e da
não “evolução” linear das sociedades e das culturas. Reconhecer a existência de um
“renascimento” é lembrar a necessidade de compreender os processos históricos como
partes integrantes na história das artes.

Seja como for, essas observações por vezes polêmicas de Goody em nada obscurecem
a grandiosidade da produção artística na Grécia Antiga. É comum classificar a arte
grega em dois períodos: o período Arcaico, do século VII a. C. até V a. C., e o período
Clássico, que vai do século V a. C. até IV a. C. Ao lado da divisão entre o Arcaico e o
Clássico, podemos agregar um terceiro momento da “tradição” grega, que foi o período
Helenístico, entre o século IV a. C. o século I a. C. aproximadamente, ainda que o
período Helenístico não seja apenas grego, mas sim uma projeção da arte grega a partir

39
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

do Império de Alexandre, o Grande, rei da Macedônia, que estendeu seus domínios


sobre a Grécia, Pérsia, Egito (PROENÇA, 2005, p. 24-30).

Após termos tratado de alguns aspectos da formação multifacetada da cultura grega,


passamos, a seguir, a apresentar características da Arte Grega no período Arcaico.

40
CAPÍTULO 2
A Arte Grega Arcaica

A partir do século VII a. C., a Arte Grega Arcaica aparecerá expressando um grande
processo de síntese cultural e inovação estética, com significativas manifestações na
escultura, na pintura, na arte ornamental, na poesia e na arquitetura, entre outras. O
estilo arcaico refletirá, de certo modo, as inovações nos modos de vida e sociabilidade
dos gregos, sociedade que será marcada pelo alvorecer da dominância das “formas
urbanas” que suplantará as formas de orientação anteriores da “sociedade rural”,
sendo que, em termos estéticos, a “rigidez dos padrões geométricos” anteriores
sofreram um “relaxamento”, iniciando-se “um novo período de esculturas e arquitetura
monumental” (HAUSER, 2010, p. 67-68) que deixarão exemplares extremante ricos
para a posteridade, demarcando suas diferenças em relação aos períodos anteriores.

O desenvolvimento dessa nova fase na arte grega está associado a inúmeros fatores,
como: o “comércio florescente de cidades ricas”; a realização de ações exitosas de
colonização de territórios da região; da cristalização de uma estratificação social
muito importante expressa pela consolidação de uma aristocracia social que encetará
a produção de uma arte direcionada a si, a fim de produzir mecanismos de distinção
social entre os diferentes estratos sociais. Essa nobreza buscará patrocinar uma arte
refinada e elaborada por artesãos profissionais e habilidosos (HAUSER, 2010, pp.
67-68) que alimentará o sentimento do belo, do sensível, do distinto, do culto.

A arte produzida para a aristocracia grega, de acordo com Hauser, estará associada a
uma “sociedade cuja elite [...] de magnatas e de uma aristocracia” começam a “gastar
suas rendas nas cidades e a participar da indústria e do comércio” (2010, p. 68), sendo a
arte um dos lócus para reafirmar hierarquicamente o lugar social desses sujeitos. A arte
buscava sintetizar a urbanidade, a monumentalidade, o caráter cosmopolita (aberto
às influências estrangeiras) sendo desapegada de tradições anteriores, o que abria as
portas para a inventividade e criação fora de parâmetros consolidados, bem como a
possibilidade de artesãos e artistas serem financiados pelos aristocratas e poderem se
dedicar com maior demora e cuidado na confecção de suas obras, entregando resultados
mais expressivos.

No aspecto estético, de acordo com Hauser, as tendências do estilo arcaico são ainda
“muito variadas e dão um passo na direção do naturalismo”, ao tempo que é uma
arte “governada por um certo número de princípios formais, sobretudo os princípios
de frontalidade e simetria, de forma cúbica” e de aspectos do “estilo geométrico”,

41
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

visando “sempre uma expressão e diferenciação dos meios de expressão acessíveis ao


artista” (HAUSER, 2010, p. 68). Ainda que no período Arcaico a arte grega “careça
do equilíbrio e sentido de perfeição do período clássico”, ela acaba explicitando “um
frescor particularmente interessante”, pela explosão do “gênio artístico da Grécia na
pintura de vasos, na arquitetura monumental e na escultura” (JANSON, 2001, p. 150).

Passamos a comentar, exclusivamente, como esta Arte Grega Arcaica teve expressão
na arte escultórica, que começara com a Escultura Arcaica, por entender que foi a
escultura, ao lado da arquitetura, que melhor expressou as características diferenciais
das inovações artísticas da época.

Os gregos são considerados prolíficos na inovação da arte escultórica e na definição de


uma estética nessa área, muito porque através das estátuas eles falavam a respeito das
suas “crenças, de suas concepções e valores”; apresentavam uma “imagem convincente
do mundo” em que estavam inseridos e que desejavam ver explicitado; conseguiam
viabilizar um diálogo com esse mundo e “interpretá-lo e racionalizá-lo, ordená-lo
conforme um significado cultural e histórico” (BOZAL, 1995, p. 85). Enfim, através das
esculturas era possível construir uma representação intensa sobre o imaginário que
constituía aquela sociedade, suas hierarquias, suas crenças e suas noções de belo.

Nesse sentido, os “escultores gregos criaram um mundo”, partindo do “corpo humano”,


das “formas naturais”, mas ampliando sua representação, definindo-as, “colocando
nome às coisas”, revelando aquilo que era próprio dos deuses e aquilo que era do
mundo dos homens (BOZAL, 1995, p. 85). Em poucas palavras, para Bozal, a escultura
arcaica grega “é a história da conquista de um sentido” (BOZAL, 1995, p. 85). Sabemos
que conquistar um sentido tratando-se de arte é um feito extremamente relevante,
pois o sentido faz com que se diga e se queira dizer algo passível de ser entendido e
comunicada à sociedade à qual está direcionada o discurso-arte.

No início do desenvolvimento da escultura arcaica, o “motivo religioso” teve maior


destaque, estando presente em templos que acolheram as esculturas com “imagens de
deuses, de suas proezas, batalhas e assembleias” dos mais diferentes “mitos”; dando
feições e corporeidade aos deuses, colocando-os “adiante” da população ao “esculpi-
los” configurando os seus “rasgos” e características (BOZAL, 1995, p. 85).

O papel da escultura grega arcaica e clássica, lembra Bozal, não é uma ilustração, mas
uma “criação que introduz caracteres”, configurando uma “presença” distinta da pessoa
comum, uma “presença” divina, com um “caráter modélico que se afasta do realismo”
mas constrói uma ideia do lugar e da “vida” dos deuses, que “nada escondem”, nem
“necessitam vencer resistência nenhuma” (BOZAL, 1995, p. 86, 87).

42
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA │ UNIDADE II

Os deuses, assim, passam a ganhar corporeidade com feições humanas, ainda que
não de simples humanos, mas de figuras que ganham rosto, dorso, braços, eventual
gestualidade, dinâmica. São deuses que, estando no plano mítico-religioso, no mundo
dos deuses no interior do qual lutam e atuam entre si, falam aos vivos, aos seres
humanos, sejam aristocratas ou não; deuses que encarnam e personificam cenas no
interesse do mundo dos terrenos.

Além de deuses, as estátuas também falam de uma “ética de nobreza”; de um “ideal


aristocrático de beleza corporal e espiritual”. Exemplificam essa construção visual em
esculturas de nobreza, corpos belos e sentidos espirituais, os “Apolos” (ou chamadas
de Kouroi) que eram representações de “nobres mancebos que tinham obtido vitórias
nos Jogos Olímpicos”; também os “frontões” presentes em templos da ilha de Egina”
(ver Figuras 13, 14 e 15), são exemplares importantes, e através dos quais explicitam
o orgulhoso vigor corpóreo e nobreza do porte”, replicando o “estilo heroicizante
aristocrático” baseado no “ideal varonil” e na “concepção da vida como competição”
(HAUSER, 2010, p. 71).

Figura 13. Templo de Afaia.

Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/8/8a/Model_temple_of_Aphaia_Glyptothek_Munich.
jpg/800px-Model_temple_of_Aphaia_Glyptothek_Munich.jpg>. Acesso em: 29/5/2019.

43
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

Figura 14. Aspecto de esculturas do frontão do Templo de Afaia, 500 a 480 a. C.

Fonte: <https://it.wikipedia.org/wiki/File:Panorama_of_the_west_pediment_of_the_temple_of_Aphaia_in_the_Glyptothek_
Munich_n1.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Figura 15. Detalhe de Guerreiros do frontão do Templo de Afaia, 500 a 480 a. C.

Fonte: <https://it.wikipedia.org/wiki/File:Panorama_of_the_west_pediment_of_the_temple_of_Aphaia_in_the_Glyptothek_
Munich_n1.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

A construção de atletas olímpicos estava relacionada à participação nos Jogos Olímpicos,


reservada apenas aos nobres. Ainda que fossem os aristocratas os envolvidos nos jogos,
as estátuas de atletas não buscam relação com indivíduos particularizados; ao contrário,
são “retratos idealizados cujo objetivo é conservar a memória e fazer propaganda dos
jogos” (HAUSER, 2010, p. 72). Essas esculturas do templo de Afaia, “fala dos heróis e
dos homens” (no sentido genérico da palavra) (BOZAL, 1995, p. 88).

As estátuas arcaicas também são representadas através de figuras femininas ou


masculinas. As estátuas femininas são as Korai (“plural de Koré, mulher jovem”) e
as masculinas são os Kouroi (“plural de Kouros, homem jovem”) (JANSON, 2001, p.
156). Essas esculturas das Korai e dos Kouroi, à diferença dos frontões que comportam
muitas divindades, configuram imagens “impessoais, não são deuses nem homens,
mas seres intermédios, tipos de um ideal de perfeição física e de vitalidade” (JANSON,
2001, p. 157). Se a perfeição física e espiritual é um ideal estético para a arte, também o
será para a vida comum.

44
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA │ UNIDADE II

No caso das Korai e dos Kouroi, as esculturas carregam consigo um diálogo de


aproximação estilizada do artefato artístico com as pessoas comuns – que podem ou
não ser da nobreza – pois constroem uma idealização iconográfica de como é belo,
forte, portentoso o modelo conformado na obra. A arte sugere aos vivos um estágio
corporal anímico a ser atingido, e que dificilmente será plenamente alcançado, pois a
vida está em um plano e a arte em outro.

Os exemplares destas estátuas são numerosos e muito expressivos da inovação estética


e estilística dos gregos no período Arcaico; apresentamos dois casos (Figuras 16 e 17):
o Kouros de Anavisos, com datação de 520 a. C.; e, a Koré de Peplos, datada de 530 a.
C.Figura 16. Kouros de Anavisos, 520 a. C.

Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Kouros_anavissos2.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

A estátua Kouros de Anavisos, de acordo com a descrição acurada de Janson, era


pintada como todas as estátuas semelhantes, sendo que o corpo acabava por revelar
uma “preocupação maior pelos volumes maciços e também uma nova elasticidade”
(JANSON, 2001, p. 157), exemplificados pela composição dos braços descolados do
corpo e das pernas sinalizando um leve andar. Para Bozal, os traços desses Apolos/
Kouros, assim como as Korai, “não aludem a qualquer sujeito”, se afastando de certa
característica do “realismo” quando busca associar a escultura/retrato a determinada
pessoa. De outra parte, o rosto não comporta relação com aspectos vivenciados pelas
pessoas em comum, pois “não está marcado por rugas, nem lágrimas”, a boca delineada
“não se distorce na gargalhada ou com o choro, alegria e penas”, atitudes “demasiado
humanas”. Oferece no máximo um “sorriso estereotipado” que nada diz de um “interior
inexistente; o tempo está aí sozinho, como presente eterno, sem final nem acabamento”

45
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

(BOZAL, 1995, p. 87). Não sendo deus, não sendo qualquer humano, o Kouros coloca-
se no lugar de referencial idealizado, distanciando-se dos simples mortais.

Figura 17. Koré de Peplos, 530 a. C.

Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:ACMA_679_Kore_1.JPG>. Acesso em: 28/5/2019.

Por outra parte, as Koré, desta fase, terão características como a que se pode observar na
Koré de Peplos, que são: o corpo humano em formato de coluna, à diferença dos Kouros
cujas pernas têm independência; a vestimenta, espécie de túnicas e as suas pregas
caem retilineamente; o corpo está coberto; braços mais contidos que o dos homens;
continuidade do busto, dando “majestosidade” à escultura (BOZAL, 1995, p. 94).

Para Janson, a construção da figura vestida reflete “mudanças nos hábitos”, e as


peculiaridades das vestimentas indicam “diferenças locais nos modos de tarjar”, roupas
apresentadas com simplicidade que denotam novidade e sofisticação (JANSON, 2001,
pp.160-161). Os cabelos, “caindo sobre o corpo em suaves madeixas onduladas”, explicita
um tratamento “orgânico”; o rosto “cheio, redondo”, com “encantadora expressão de
alegria” sinalizam dignidade (JANSON, 2001, p. 161).

Os Kouros e as Koré passaram por modificações estilísticas ao longo do período


Arcaico, e em especial algumas esculturas sintetizam exemplarmente essas mudanças,
como a escultura de Kouros Aristódicos (+- 500 a. C.) (Figura 18). Ela contém uma
maior “verossimilhança” com os humanos, sinalizando um passo de transição para o

46
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA │ UNIDADE II

classicismo e suas expressões naturalísticas, isso porque há uma “ligeira inclinação da


cabeça”, as feições do rosto denotam uma intencional “expressividade”, ambos efeitos
alcançados não pela produção meramente “naturalista”, mas pelo uso “estrito de
recursos geometrizantes” na produção (BOZAL, 1995, p. 91-92).

Ainda explorando aspectos de Kouros Aristódicos, Bozal entende que a “composição” é


fruto de trabalho mental e racional, explicitando uma organização geometrizante, e que
alcançou formas plenamente naturais, “participando assim nesse cosmo que o logos,
razão e medida, atravessam como destino universal todas as coisas” (BOZAL, 1995,
p. 92). Entender que a confecção da arte escultórica faz convergir o logos, a razão e a
medida como referencial organizador de si mesma acaba por dialogar também com uma
máxima atribuída ao filósofo sofista grego Protágoras, quando escreveu que “o homem
é a medida de todas as coisas”. Homem este que agora não apenas traduz em criações
escultóricas de deuses que se assemelham a seus traços, mas passa a representar e se
aproximar de si mesmo. Arte que oportuniza o espaço para o humano em si se fazer arte.
É claro que ainda não estamos no momento em que qualquer humano será convertido
e eternizado nas obras, mas o humano enquanto referência idealizada ganha espaço e
passa a dividir o lugar com os deuses na arte grega.

Figura 18. Kouros Aristódicos 500 a. C.

Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/archive/5/5f/20170207232712%21NAMA_3938_Aristodikos_Kouros.JPG>.
Acesso em: 28/5/2019.

47
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

Faça uma visita ao Museu de Acrópoles, veja detalhes e interaja com Koré de
Peplos pintando-a: <https://www.theacropolismuseum.gr/peploforos/>.

Faça uma visita virtual ao Museu de Acrópoles <https://artsandculture.google.


com/partner/acropolis-museum>.

Por fim, os desenvolvimentos pelo qual passou a escultura no período Arcaico


representaram modificações profundas na estética, “revolucionando” completamente
a História da Arte (BOZAL, 1995, p. 92), através da conformação no suporte escultura
de um sentido urdido com intencionalidade e governo de técnicas como a frontalidade,
a simetria, aspectos do estilo geométrico, da transposição de formas do corpo humano
natural – sempre estilizado –, forjando formas corpóreas idealizadas para deuses, para
eventos – como as Olimpíadas – e conquistas militares ou não –, as assembleias, que
desvelam uma construção de um referencial hierarquizado de supostos padrões da
nobreza – e a ética da nobreza. Crescentemente, as esculturas foram adquirindo novas
variáveis estéticas, em especial a maior verossimilhança com os humanos, sinalizando
a transição do período Arcaico para o período Clássico.

Vejamos como teve continuidade essa arte escultórica grega no período Clássico.

48
CAPÍTULO 3
A Arte Grega Clássica

O período do classicismo na arte grega concentrará desenvolvimentos no plano


da estética em duas direções: de um lado, a expansão do naturalismo; de outro, o
desejo de ordem e de proporção, fruto, segundo Hauser (2010, p. 81), da expansão
do liberalismo, do individualismo e da democracia. Esta época foi de grande profusão
cultural, filosófica, política e do estabelecimento de referências para a chamada cultura
clássica grega, que, por via de consequência, reverberou nas artes em geral e na arte
escultórica, em especial.

Para Hauser, nessa fase ocorre um certo nivelamento nos interesses entre as classes
altas (nobreza, burguesia) que repercutiu no plano estético, porque a burguesia urbana
tinha o interesse em promover esse nivelamento democrático (que a elevaria de posição
relativa no social, aproximando-a da aristocracia e a distanciando dos plebeus) e a
aristocracia perde “a velha unidade e coerência de princípios e assimila-se à burguesia
racionalista e sem tradições” (2010, p.81).

A vida social ganha uma dinamicidade, “sem restrições, livre de todas as tradições rígidas
e de todos os preconceitos”, e esse romper de amarras acabou favorecendo o “surgimento
de uma arte mundana, impregnada de alegria de viver” o presente. Apesar de todas as
modificações, ainda se manteve, pela força que possuía, uma tendência “conservadora”
(HAUSER, 2010, p. 82). Isso quer dizer que muitas coisas foram ressignificadas, mas
guardavam lastro com tradições que nasceram em períodos pretéritos sem, entretanto,
afastar as inovações.

Na tentativa de classificar as diferentes etapas do classicismo, dividiu-se o período


Clássico em: estilo “severo” (480-450 a. C.); estilo “rico” (420 -370 a. C.); “classicismo
ideal” (450-420 a. C.) e o “realismo”, que transita um pouco no interior do período
“rico”, aparecendo ao redor de 390 a. C. (BOZAL, 1995, p. 100). A periodização sugere
etapas do desenvolvimento estético, divisão temporal que foi percebida como carregada
de falhas e problemas, acabando por nem sempre auxiliar na melhor compreensão do
período em geral, motivo pelo qual não seguiremos nela. Optamos por apresentar obras
representativas do período no campo da escultura, para permitir uma percepção ao
longo de como foram operadas as alterações estilísticas mais significativas.

Seja como for, esteticamente o período Clássico observa um agudo “impulso da


representação fiel da natureza, quase tão forte quanto o desejo de proporção e de ordem”
ou, em outras palavras, “naturalismo e estilização”, que não objetiva apenas o belo, o

49
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

distinto e o espetacular, mas tematiza também “o feio, o vulgar e o trivial”; procura


dar “probabilidade lógica na trama” e “plausibilidade psicológica nos personagens”.
(HAUSER, 2010, p. 88). As esculturas ganham expressividade, movimento, vitalidade,
buscando traduzir uma estilização naturalística de inúmeros aspectos da cultura, sendo
um exemplo citado por Hauser os frontões do Tempo de Zeus em Olímpia (Figura 19), em
especial o detalhe para o qual ele chama atenção: um ancião portando uma vestimenta
detalhada com partes enrugadas e com seu ventre flácido (Figura 20), evidenciando
a representação do “feio”, e não apenas do hígido, tonificado, como era comum em
diversas obras sobre deuses.

Figura 19. Frontão Oeste do Templo de Zeus em Olímpia, 450 a. C.

Fonte: <https://arsartisticadventureofmankind.wordpress.com/tag/greek-temple/>. Acesso em: 29/5/2019.

Figura 20. Detalhe de Ancião, com ventre flácido, Frontão Oeste do Templo de Zeus em Olímpia, 450 a. C.

Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:GR_08-04-23_Olympia_Museum_Zeustempel_Ostgiebel2.JPG>.
Acesso em: 28/5/2019.

Outro aspecto que ganha visibilidade é a questão do movimento dos sujeitos e das cenas
materializadas nas esculturas. A dinâmica que a inclusão de aspectos indicativos de ação

50
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA │ UNIDADE II

às obras traz foi destacado por Janson, pelo fato de que as inovações produzidas nessa
etapa da arte grega traduziam-se em uma interessante “mobilidade” e “movimentação”,
em especial na “estatuária monumental” cujo resultado fora a “suprema realização” que
permitia a representação, por exemplo, do “arremesso de dardo” na estátua de Poseidon
– um dos deuses olímpicos – , datada entre 460-450 a. C. (Figura 21), em cujo o gestual
“impressiona não como fase de sucessão de movimentos, mas como expressão temível
do poder de um deus”, sendo “o arremesso da arma um atributo divino” (JANSON,
2001, p.189-190). Poseidon, associado ao mar e ao Olimpo, com seu dardo sinaliza o
potencial enérgico cujas forças de um deus o habilitam a utilizar quando necessário. O
movimento aqui não é indicado pela trivialidade do arremessar um dardo, mas reflete
e encena a potencialidade de um deus mobilizar sua força e poder.

Ao lado de Poseidon, o Discóbolo, datado de 450 a. C. (Figura 22), apesar de “não


representar nenhum progresso fundamental” em relação à primeira obra, possui uma
“representatividade” e simboliza a expressividade do ritmo do movimento, pois “o braço
alargado”, segurando o disco (BOZAL, 1995, p. 100), e que para lançá-lo encurva o dorso
e flexiona as pernas, sugerindo um início, meio e fim da ação. Aqui, o movimento e não
o poder de um eventual deus ganha destaque. Se Poseidon e a dinâmica dada à sua
estátua relaciona-se ao seu poder divino, com Discóbolo o culto é aos jogos olímpicos,
ao atleta e ao efeito do movimento conquistado na estátua.

Outro marco da composição escultural com movimento, agregado da novidade do nu


feminino, que, segundo Janson, fora o “mais antigo da arte grega” (JANSON, 2001, p.
193) é Nióbida Moribunda, datada de 450-440 a. C. (Figura 23). Nessa escultura que,
segundo a lenda, “tinha humilhado a mãe de Apolo e Ártemis, gabando-se de ter seis
filhos e sete filhas, pelo que os dois deuses os mataram”, tendo ferido Nióbida “nas
costas enquanto fugia” e, “sem forças”, ela acabou por “tombar, tentando retirar a seta/
lança fatal” das costas (JANSON, 2001, p. 192). Nióbida, portanto, ao ostentar uma
condição de fertilidade pela prole conquistada e humilhar Ártemis em relação a essa
sua capacidade de grande progenitora, sofre a retaliação da força dos deuses – Apolo
e Ártemis –, tendo seus filhos e filhas assassinados e sofrendo uma perfuração fatal de
lanças nas costas. Essa encenação presente na escultura faz traduzir toda a dor, todo o
movimento do receber o ferimento e resistir a ele e do cambalear frente à gravidade da
agressão sofrida.

Outro aspecto destacado em Nióbida Moribunda é sua nudez parcial, relacionando-se


ao violento “movimento dos braços”, expresso pelas suas vestes que escorregam, sendo
o nu um “artifício dramático”, buscando levar o observador a “sentir o sofrimento
da vítima” (JANSON, 2001, p. 193). Sobre Nióbida, Janson conclui: “olhando para o
rosto de Nióbida, sentimos que, pela primeira vez, o sentimento humano se exprimiu

51
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

tão eloquentemente na fisionomia como no resto do corpo” (JANSON, 2001, p.


193), significando, portanto, um adendo à tradição escultórica grega extremamente
importante.

Figura 21. Poseidon, 460-450 a. C.

Fonte: <https://en.wikipedia.org/wiki/File:Netuno16b.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

52
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA │ UNIDADE II

Figura 22. Discóbolo, 450 a. C.

Fonte:<http://ancientrome.ru/art/artworken/img.htm?id=1475>. Acesso em: 28/5/2019.

Figura 23. Nióbida Moribunda, 450-440 a. C.

Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Wounded_Niobid_2014-11-9.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

53
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

Apesar do período Clássico ser extremamente significativo na cultura grega, na filosofia,


na literatura, na arquitetura na cultura em geral, como mencionado acima, optamos
por sintetizar as características do período na arte escultórica. Fruto de inovações e
aperfeiçoamentos, a escultura nesse período acrescentou movimento, vitalidade e
expressividade psicológica e episódica às obras, que, desse modo, passaram a ganhar
conexão com dimensões mundanas. Se no arcaico a busca do belo era um objetivo
constante, agora ele mantém e amplifica essa busca, mas incorpora o vulgar, o feio,
o trágico, contemplando uma estilização naturalística. Outro aspecto importante é a
primeira representação em escultura do nu feminino, segundo os autores, que dataria
de 450-440 a. C., com a escultura Nióbida Moribunda (Figura 23) e sua dramática
representação da morte fruto de vingança divina.

Enfim, ao lado das artes do período Arcaico e Clássico, expressas através das esculturas,
existe um intervalo temporal e estilístico que não exploraremos, mas que é denominado
por Janson de “pré-helenístico”, ocorrido entre 400 a. C. e a subida ao poder de Alexandre
Magno (JANSON, 2001, p.189-190). A transição do Clássico para o período Helenístico
é marcada pela Guerra do Peloponeso e pela expansão do Império de Alexandre, o
Grande, entre os séculos IV a. C. e III a. C., caracterizado pela expansão da cultura
grega. Mas, antes desse momento, observa-se na Grécia a crescente “popularidade”, na
“arte de divindades olímpicas mais jovens e mais impulsivas”, em especial com Afrodite
e Artemisa (HAUSER, 2010, p. 100).

Agora, quais eram as características da arte helenística? Qual o desenvolvimento da


escultura no período helenístico?

Essas perguntas passamos a responder no próximo tópico.

54
CAPÍTULO 4
A Arte Helenística

A Grécia Antiga não era um país como entendemos nos dias atuais. Entretanto, na
região norte grega, o que compreendia também a Macedônia, sob o reinado de Felipe,
pai de Alexandre Magno – o Grande –, a matiz cultural grega ganha uma expansão
extraordinária, acompanhando exatamente a ampliação das áreas de domínio e interação
do Império Macedônico para o leste (Figura 24 e 25). Com extensão das regiões afetadas
do Império da Macedônia, ocorre um fenômeno de difusão e intercâmbio cultural com
impactos significativos no plano da história da arte e da cultura, uma vez que a cultura
grega é projetada para fora de seus territórios originários gregos, chegando inclusive no
Oriente e na Índia; ao mesmo tempo, essa cultura passa a ser matizada pelas influências
advindas das novas regiões que passam a relacionar-se com os gregos.

Figura 24. Império Macedônico sob Felipe II, 336 a. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Map_Macedonia_336_BC-pt.svg>. Acesso em: 28/5/2019.

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UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

Figura 25. Expansão do Império Macedônico sob Alexandre, o Grande, entre 336 a 323 a. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Mapa_de_Alejandr%C3%ADas-pt.svg>. Acesso em: 28/5/2019.

Frente a essa nova época de expansão da cultura e da arte grega, bem como sua interação
e mútua interferência com as culturas e artes do Oriente no período que vai do Império
de Alexandre Magno até a época da expansão do Império Romano (de 336 até +- 100 a.
C.), formatou-se aquilo que se convencionou chamar de cultura e arte helênica, ou, nas
palavras de Hauser (2010, p. 101), a “Era Helenística”. Para Hauser, a Era Helenística
desenvolveu-se “nos três séculos que se seguiram a Alexandre, o Grande”, período no
qual “o centro de gravidade do desenvolvimento artístico deslocou-se acentuadamente
da Grécia para leste”, e esse deslocamento provocou uma nova realidade na qual
“influências recíprocas” estiveram “em ação o tempo todo e, pela primeira vez na
história da humanidade”, é possível perceber a constituição de uma “cultura que é um
híbrido internacional” (HAUSER, 2010, p. 101).

A arte helenística manifesta um processo de renovação e fusão de tendências, porque


as suas expressões representam um “acomodamento entre várias correntes”, ocorrendo
“uma atenuação de divisões profundas entre ocidental e oriental, grego e bárbaro, entre
diferentes níveis sociais” (HAUSER, 2010, p. 101). As distinções sociais permanecem,
mas sofrem atenuações pois o “novo Estado abandona a aristocracia à sua sorte e
acelera a formação de uma classe alta burguesa, sem preconceitos de raça ou casta, que
tem por único esteio o poder econômico”, e que tem expressão “em todos os campos
da vida cultural, na abolição de todas as velhas tradições”, inclusive viabilizando uma
“organização supranacional de produção científica e artística”, estimulada por uma
valorização ampliada do “mundo educado” (HAUSER, 2010, pp. 102-103). Para Bozal,
o Helenismo designa “um complexo entremeado de tendências, focos locais, mudanças
e evoluções ziguezagueantes” difícil de delimitar precisamente (BOZAL, 1995, p. 106).

56
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA │ UNIDADE II

Esteticamente, observa-se um enfraquecimento do “gosto por mera erudição” e a


ascensão tendencial ao ecletismo. Para Hauser, “o ecletismo é o traço dominante
da produção helenística tanto na arte quanto na ciência” (HAUSER, 2010, p. 104).
A arte “culmina num jogo extremamente engenhoso, mas instável de formas, numa
experimentação com meios abstratos de expressão – uma liberdade artística que,
apesar de permitir a realização de algumas obras primorosas, desagrega os padrões da
arte clássica” (HAUSER, 2010, p. 105).

Com todos esses processos de convergência e criação, “a tradição clássica acaba


misturando-se” às expressões de “gênero e ao naturalismo prediletos do burguês e ao
‘barroco’ dos cortesãos” (HAUSER, 2010, p. 105). O ecletismo dá vazão à expressão,
na Era Helenística, de diversos estilos como o “barroco, rococó e o clássico”, cada qual
oferecido ao “público”; a mistura de tendências e formas de composição artística fazem
ter espaço “tanto o majestoso quanto o íntimo, o pomposo e o banal, o colossal e o
miniatural, o delicado e o gracioso” (HAUSER, 2010, p. 105). Talvez a presença desses
aspectos mencionados em uma dada direção e, ao mesmo tempo, a existência do seu
contraponto (esculturas colossais x esculturas miniaturais, por exemplo) simbolize
a profusão de manifestações da arte helênica, sendo difícil de reduzi-la a uma única
tendência.

Esse ecletismo manifesta-se tanto na produção de novas obras quanto na organização


das obras antigamente elaboradas; na construção de “museus, coleções”; pela criação
de “coleções” que passam a “sistematicamente” congregar peças “de acordo com
planos preestabelecidos”, objetivando apresentar “coleções completas que exponham
todo o desenvolvimento da arte grega”. Essas atitudes de selecionar e congregar peças
acaba colocando esse período como considerado dos “precursores de nossos museus e
galerias de arte” (HAUSER, 2010, p. 104). Ao lado da organização e concentração de
obras em “museus”, outro aspecto permite a difusão da arte helenística, a ampliação
dos produtores de obras, através do aumento da demanda de obras, por um lado, e dos
artesãos e oficinas que, por exemplo, passam a copiar e replicar obras primas, criar
“moldes fabris”, e reproduzir peças em “escala gigantesca” (HAUSER, 2010, p. 106).

A dificuldade de classificar as fases da Era Helenística no plano da escultura é grande,


mas seguindo a divisão de Bozal (1995), o Helenismo na escultura seria dividido em:
“primeiro período, denominado de transição, em torno do século IV”, no qual se
“desenvolve o retrato” e obras como “o sarcófago de Alexandre” (Figura 26); o segundo
período, vinculado ao século III, “que assiste ao retorno a um certo classicismo, em
especial no retrato”, e no “tratamento da escultura decorativa”; e o terceiro período,
iniciado ao final do século III, e desenvolvido “em três focos artísticos, Pérgamo, Rodas
e Alexandria” (Bozal, 1995, p. 107).

57
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

Figura 26. Aspecto do Sarcófago de Alexandre, representando batalha contra persas, 305 a. C.

Fonte: <https://en.wikipedia.org/wiki/File:Alexander_Sarcophagus_Battle_of_Ussus.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Como o nosso propósito é o de apresentar aspectos e algumas características das


esculturas do período, passamos a observar algumas obras com características e
inovações da Era Helenística.

O Sarcófago de Alexandre, representando batalha contra persas, por exemplo, passa a


explicitar uma das dimensões dessas novas representações e obras, a de culto a figuras
diretamente terrenas, e a feitos históricos-factuais, como a luta e vitória contra os persas,
buscando elevar os nobres, dirigentes e, no caso, o imperador, a um status heroico. A
antiga representação de deuses agora incorpora o culto aos grandes homens – homens,
bem verdade, que não eram “comuns”, mas sim alçados a uma condição quase-divina,
sendo os seus feitos retratados nessa ambiguidade: feitos terrenos conquistados por
bravura que explicita vigor e nobreza, mas também pela superioridade de quem vence,
superioridade porque está no lugar dos grandes e os grandes triunfam. Aspectos de
realismo dos cavalos, do movimento nas batalhas e da imposição do jugo por Alexandre
aos persas explicitam algumas das inovações importantes para a História da Arte
trazidas no período.

Ao lado do Sarcófago, temos outra obra significativa do período – a estátua de


Apoxiomenos (Figura 27), cuja cópia é em mármore e o original provavelmente em
bronze, produzida pelo artista Lisipo, que transita dentro do esquema clássico de
reproduzir “figuras humanas, erguidas e nuas, deuses e adolescentes, atletas, tipos
hercúleos”, agregando dois aspectos “originais”: a “relação entre a peça e o espaço, e a
composição também” (BOZAL, 1995, p. 108).

A escultura de Apoxiomenos “representa um jovem atleta a limpar-se” (JANSON, 2001,


p. 207). Segundo Bozal, Apoxiomenos, “estando no espaço, é a figura que o cria: os seus

58
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA │ UNIDADE II

braços, cruzando-se por diante, partem a estrita frontalidade, como partem as pernas;
cada parte do corpo se prolonga contígua”, não se limitando a “sobrepor nem estar
ao seu lado, conforme uma direção que concentra o movimento e acentua a tensão,
indicando o momento da ação” (BOZAL, 1995, p. 109). Essa composição confere uma
“nova capacidade de movimento tridimensional”, e até o “cabelo emaranhado” explicita
a “nova corrente no sentido de espontaneidade” (JANSON, 2001, p. 207).

Com Apoxiomenos de Lisipo, a frontalidade anteriormente desenvolvida sofre


mudanças, sobretudo na configuração da tridimensionalidade e do movimento, dando
novos sentidos para os vínculos entre a composição, o espaço e a peça. Também os
cabelos expressarão um sentido menos rígido e condensarão uma certa espontaneidade.

Figura 27. Apoxiomenos de Lisipo, 320 a. C.

Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Apoxyomenos_Pio-Clementino_Inv1185.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Por sua vez, a estátua do Gaulês Moribundo de 230 a. C. (Figura 28) compõe a
representação “comemorativa da derrota” dos gauleses frente a Átalo I (JANSON, 2001,
p. 207), na qual está reproduzida “cuidadosamente o seu tipo étnico, na estrutura facial
e no cabelo hirsuto”, apesar de “em tudo mais” estar associado ao estilo “da heroica
nudez dos guerreiros gregos” e de que sua “agonia parece infinitamente realista, com
uma dignidade”. A morte representada “é um processo físico muito concreto; incapaz
de mover as pernas, o Gaulês concentra todas as suas forças declinantes nos braços”,

59
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

resistindo até o possível ao peso da morte, que tende a levá-lo ao chão e o “esmague
contra o solo” (JANSON, 2001, p. 208).

Figura 28. Gaulês Moribundo, 230 a. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Dying_Gaul_-_Palazzo_Nuovo_-_Musei_Capitolini_-_Rome_2016_(4).jpg>. Acesso


em: 28/5/2019.

Concretamente, o Gaulês Moribundo acaba por sintetizar perfeitamente a tensão do


desenvolvimento das esculturas, pois a sua composição procura dar uma dramaticidade
“real” a um evento concreto – a derrota dos gauleses frente a Átalo I –, através da
representação que busca referenciar de um homem Gaulês com traços que lembram a
sua realidade étnica estilizada, utilizando alguns recursos consolidados na escultura de
tradição grega, como o nu. Mas o corpo que está sinalizando derrota também contém o
seu oposto, a dignidade e a força “moral-étnica” gaulesa que se recusa a entregar-se, o
que representa um valor de nobreza e não uma baixeza ou vilania.

Entretanto, a estátua Nike de Samotrácia (Figura 29), segundo Janson (2001, p. 212),
representa a “maior obra-prima de toda a escultura helenística” pois congrega todo um
efeito dramático associado a uma encenação pela qual “a deusa acabou de pousar na
proa de um navio com as grandes asas abertas, semissustentada pelo forte vento contra
o qual avança” (JANSON, 2001, p. 211). A resistência do vento e a sua força ficaram
plasmadas no “espantoso movimento”, criando uma representação que congrega uma
“relação ativa entre estátua e o espaço que a envolve, como nunca tínhamos visto antes
e não veremos outra por muito tempo” (JANSON, 2001, pp. 211-212).

60
A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA │ UNIDADE II

Figura 29. Nike de Samotrácia, 200 a 190 a. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Vit%C3%B3ria_de_Samotr%C3%A1cia>. Acesso em: 28/5/2019.

Realmente, a expressividade, o movimento, a reconfiguração dos aspectos a serem vistos


e destacados na obra fundem e inovam em uma série de aspectos que delimitam as
múltiplas referências da arte helenística e que não são reproduzidas em todas as obras,
mas em esculturas que acabaram por se tornar icônicas dessas novidades e releituras
inovadoras de aspectos da tradição artística grega. Nike de Samotrácia congrega esses
elementos, sendo extremamente representativa do período Helenístico.

Apesar de existirem muitos outros aspectos a serem destacados da Era Helenística,


como a dimensão grandiosa de muitas das estátuas e das encenações em altares, como
no caso do Altar de Zeus e o friso Atena e Alcioneus (expressando temáticas como a
“batalha dos deuses e dos gigantes” com “intensa força dramática; os corpos musculados
precipitando-se uns contra os outros; os intensos contrastes de luz e sombra, as asas
a bater e as roupagens agitadas pelo vento”, possuem um “dinamismo esmagador)
(JANSON, 2001, p. 211), nossa proposta era apresentar uma perspectiva da arte,
expressa principalmente através das esculturas dessa época da História da Arte.

Como dito no início do capítulo, é importante considerar que, durante o período


Helenístico, a arte passará por uma certa “profissionalização”, como o desenvolvimento
de especialistas, de uma “indústria” da reprodução de peças e da construção de
“coleções” de arte, o que, associado às inovações e fusões estéticas – de feição eclética
–, constituíram narrativas importantes para a História da Arte, como viabilidade da
percepção e identificação de tradições artísticas ensejando “museus”, com a ordenação
de sequências e desenvolvimento da percepção das mudanças e referências dos estilos
no tempo.

61
UNIDADE II │ A ARTE NA GRÉCIA ANTIGA

Propriamente, o período Helenístico não expressará uma única estética, mas um


ecletismo fusionando tradições e aspectos de diferentes locais e culturas associados
à expansão e à difusão do Império desde Alexandre o Grande. Nesse aspecto, a arte
ganhará um cosmopolitismo importante e uma feição que atravessa fronteiras, podendo
ser considerada como internacional.

O período da arte helenística encerrará seus principais processos com a emergência e


expansão do Império Romano, a partir do século I e II a. C., tema que passaremos a
analisar na próxima Unidade.

62
A ARTE NA ROMA UNIDADE III
ANTIGA
Dando continuidade aos estudos sobre História da Arte Antiga, nesta Unidade
trataremos de:

1. Caracterizar o surgimento de Roma como matriz da futura área de


influência política, militar, econômica e cultural associada ao Império
Romano.

2. Identificar os elementos e influências culturais na região romana, em


especial o da cultura etrusca.

3. Identificar os aspectos culturais inovadores durante o Império Romano.

4. Perceber os elementos estéticos que emergiram, expandiram e entraram


em decadência com a história de ascensão, difusão e declínio do Império
Romano.

Para trabalhar esses aspectos, dividimos as atividades em quatro capítulos:

Capítulo 1. A Antiga Arte Romana: caracterização.

Capítulo 2. A Arte no Império Romano.

CAPÍTULO 1
A Antiga Arte Romana: caracterização

É muito comum associar a história de Roma e do Império Romano à história da Itália.


Partindo dos dias atuais, o imaginário coletivo por vezes tem dificuldade de separar a
história da atual configuração dos Estados-nações modernos com os arranjos de poder
e territoriais do passado. Se é correto dizer que Roma está na Itália moderna, não é
correto dizer que a Itália esteve em Roma desde sempre. Entretanto, pela importância
que o Império Romano teve na difusão de parâmetros culturais na história ocidental e
da região da Península Itálica e pelos processos desenvolvidos no plano da arte durante
a emergência de Roma à condição de catalisador de um poder imperial, Roma é sim um
63
UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

referencial fundamental da futura cultura do país Itália, mas essa condição esteve no
futuro e não no passado, ao tempo do apogeu do poderio romano.

Pelo fato de o Império Romano ser importantíssimo na história antiga do Ocidente, a


arte e cultura romana antiga possui um percurso todo próprio relevante de ser visitado,
que abordaremos panoramicamente nas páginas a seguir.

A Península Itálica foi ocupada por povos indo-europeus provenientes da Ásia e, em


meados do século VII a. C., acabou ocupada, principalmente, pelas etnias dos italiotas,
etruscos e gregos, entre outras. Essa população conformaria a base cultural que
convergiria posteriormente na formação de traços específicos de cada região em termos
culturais na Antiguidade. Por volta de 750 a. C., teria ocorrido a fundação de Roma,
cercada de mitos e lendas fundacionais. Um dos mitos relativos à origem de Roma
indica que a cidade foi fundada pela etnia etrusca em 753 a. C. (UPJOHN, 1979, p. 38),
e foi encabeçada por “Rômulo, irmão gêmeo de Remo”. Rômulo e Remo seriam “filhos
da Sacerdotisa Rea Sílvia”, tendo como filiação paternal atribuída ao “deus Marte”, e
coube a ambos a herança do “Reino de Alba Longa” (PROENÇA, 2012, p. 34). O tio de
Rômulo e Reno, Amúlio, tinha ambições de subir ao trono que cabia aos seus sobrinhos
e, em função deste desejo, teria mandado “jogá-los no rio Tibre” ainda pequenos. Apesar
da tentativa de assassiná-los, ambos acabaram sobrevivendo pois foram “encontrados
por uma loba” que os teria alimentado, sendo posteriormente criados pelo pastor de
animais Fáustolo, tornando-se “adultos fortes e corajosos”. Conseguiram converter-se
em “reis” e, ao fim, Rômulo “tornou-se o único chefe” e a cidade fundada recebeu o
nome de Roma (PROENÇA, 2012, p. 34).

Frente à lenda mencionada da fundação de Roma sob influência etrusca, atribui-se


a escultura da Loba Capitolina de 470 a. C. (Figura 30), que é um exemplar muito
significativo da arte etrusca “arcaica”. A Loba Capitolina explicita visivelmente
“ferocidade da expressão, vigor físico latente do corpo e das patas”, representando o
mito fundador de Roma, por mim configurando-se em “emblema totêmico de Roma”
(JANSON, 2001, p. 227), confluindo “vitalidade, realismo e ornamentação” em uma
estética que sinaliza a contribuição etrusca para a futura arte romana imperial (BOZAL,
1996, p. 10). A Loba ainda carrega outra contribuição etrusca: o uso do bronze na arte
escultórica e em aplicações irmanadas, como nos retratos/bustos/cabeças característicos
da antiga arte etrusca.

Observando a Loba, que é fruto de uma antiga tradição etrusca desenvolvida na


escultura e no uso do bronze, a representação do mito fica explicitamente visível através
de recursos muito interessantes, como a dinâmica da cena com a loba movimentando o
seu pescoço, as crianças (Rômulo e Reno) em pleno ato de alimentarem-se nas mamas,

64
A ARTE NA ROMA ANTIGA │ UNIDADE III

com suas bocas abertas sinalizando o exercitar da sucção e a posição ativa dos corpos
infantis e seus detalhes, a higidez muscular daquela que garantiu a sobrevida de futuros
reis – a loba.

Figura 30. Loba Capitolina, 470 a. C.

Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/archive/a/aa/20110703134533%21Capitoline_she-wolf_Musei_
Capitolini_MC1181.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

A Roma Antiga e sua afirmação histórica foi dando-se pouco a pouco, como espécie de
cidade-estado que expandiu o seu poderio e áreas de influência inicialmente às regiões
vizinhas, no período da República Romana (509 a 27 a. C) e, posteriormente, no
período do Império Romano (27 a. C. a 476 d. C.) (UPJOHN, 1979, p. 38), a vastíssimas
extensões da Europa, da Ásia e da África, conforme fica evidenciado no mapa que
registra a extensão máxima do Império Romano, aproximadamente em 117 d. C. (Figura
31). Juntamente com o desenvolvimento do poder imperial, observa-se a afirmação de
uma arte ou estética romana formada a partir de influências variadas, especialmente
da arte grega e da arte etrusca, mas sobretudo em uma estética associada diretamente à
grandiosidade, aos feitos, às histórias, aos personagens e ao poderio do império.

65
UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

Figura 31. Máxima extensão do Império Romano em 117 d. C.

Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Roman-empire-395AD.svg>. Acesso em: 28/5/2019.

Pensando em uma linha sequencial da História da Arte, Hauser (2010) indica que a
“Era Helenística aos poucos” deu “lugar ao predomínio da arte romana”, em especial
“após o início do Império”, e foi no período do Helenismo, e “não na arte grega”, que
teriam ocorrido “todos os desenvolvimentos importantes” como o “túrgido ‘barroco’ e
o delicado ‘rococó’ ”, expressões que “atingiram um impasse e prosseguiram repetindo
fórmulas desgastadas”. Foi com a “Roma, dos césares”, contudo, “a par da administração
uniforme do império”, que produziu-se um novo referencial artístico e estilístico, ou uma
“arte imperial mais ou menos uniforme”, caracterizada pela capacidade de incorporar
“todas as tendências mais progressistas”, acabando por fixar, com o passar do tempo,
“o padrão universal de moda” (HAUSER, 2010, p. 108) que seria difundida aos quatro
cantos dos territórios submetidos ao Império ou influenciados pelas tendências
imanadas do poderio imperial.

Nesse sentido, Roma por um lado exerceu a capacidade de fazer confluir influências
anteriores grega, helenística e etrusca, e de frente a essas influências, diante de sua
realidade, fazer emergir aspectos estéticos inovadores que evidenciam diferenças
entre a arte romana e as anteriores tradições estéticas associadas a outras histórias
socioculturais.

Ao descrever como foi se compondo a arte romana, fruto do constante entrecruzamento


de tendências, e especialmente como isso ocorreu no campo da arquitetura, Cunha
(2002a) afirma que “com a expansão de Roma e a consequente conquista dos territórios

66
A ARTE NA ROMA ANTIGA │ UNIDADE III

mais diferentes, os vencidos foram tomados como escravos” e levados “até a metrópole
para participarem da construção da cidade”. Esses humanos escravizados portavam
inúmeros domínios e capacidades, e carregavam consigo saberes técnicos usualmente
aplicados em suas sociedades originárias. Com a incorporação desses humanos cheios de
competências ao Império, isso acabava ocasionando a introdução de uma “diversidade
de conhecimentos e culturas ligada às artes, à arquitetura e à construção”, circunstância
que permitiu aos romanos apoderarem-se dessas influências e, com o tempo, essas
diversas fontes da arte e estética romana acabaram por dificultar a percepção dos
fatores e elementos que teriam vindo “de fora ou o que foi desenvolvido pela própria
criatividade” romana (CUNHA, 2012b, p. 33). Roma representou, nesse sentido,
um centro que amalgamou diferentes tradições, ao mesmo tempo em que inscreveu
inovações em saberes e técnicas previamente desenvolvidas por outras populações.

Uma das fontes da arte romana foi sem dúvida a arte grega, a qual já foi objeto de
nossas reflexões. Uma outra fonte importante para a produção artística romana foi a
arte etrusca, que, como mencionado acima, se relacionam desde a fundação de Roma e,
como etnia, os etruscos eram vizinhos às populações itálicas. Por sua vez, a arte etrusca
destaca-se pelo recebimento de “influências estrangeiras” desde os séculos VII a. C.,
seja grega, seja “oriental”, entretanto, acaba por expressar “tendências e um espírito
totalmente originais” (UPJOHN, 1979, p. 22). A originalidade etrusca configura toda
uma outra trajetória para a história da sua arte e de suas técnicas. A arte etrusca,
assim como as helenística e grega, participam da emergência de uma arte romana que
diferencia-se de suas fontes exatamente por beber de diferentes origens que não se
influenciaram anteriormente, e que possibilitarão aos romanos fazer fusões inovadoras
a partir de tradições mutuamente estranhas.

No campo da arquitetura, por exemplo, os etruscos pouco utilizavam da pedra que era
“reservada aos túmulos e às fortificações”; os artistas etruscos preferiam “materiais
menos duráveis, como a madeira e o tijolo cru ou cozido” (UPJOHN, 1979, pp. 22-23).
A respeito das esculturas, uma primeira diferença substancial se refere aos materiais,
uma vez que os “escultores helênicos trabalhavam as imagens no mármore, ou até na
pedra, a golpes de cinzel”, os etruscos terão predileção pela “argila” que é extremamente
“moldável”, relativamente fácil de manipular, e “dócil à pressão dos dedos”; apesar
disso, eles também utilizaram da fundição de metais, em especial produziam esculturas
em bronze, como no caso da Loba Capitolina, para as quais são imprescindíveis modelos
pré-elaborados em barro (UPJOHN, 1979, p. 27).

Ainda que com o passar do tempo os romanos realizassem uma maior aproximação
com a forma grega de escultura, é possível notar “desde o início, um interesse particular
pelo rosto humano, em que concentravam toda a sua atenção” (UPJOHN, 1979, p. 27),

67
UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

sendo os etruscos considerados por Upjohn “inventores do retrato” (1979, pp. 27-28). A
valorização da expressividade, característica dessa arte, para Janson, tem certa relação
com a escolha do material para fazer a escultura, terracota, viabilizando “formas
elásticas, suavemente arredondadas”, que viabilizam “uma vivacidade e espontaneidade
extraordinária (JANSON, 2001, p. 222), da qual é um exemplo o grande Sarcófago da
Necrópole de Cereteri, de 520 a. C. (Figura 32).

Ou seja, do lado etrusco a existência prévia da forte tradição de produção de retratos a


partir de diferentes materiais mais fáceis de modelar é acomodada a uma tradição grega
e helenística de retrato de figuras grandiosas produzidas em mármore, mas com menor
elasticidade – que viria do lado etrusco. O processo de junção ou amalgamação dessas
influências permitiria aos romanos explorar possibilidades menos desenvolvidas, tanto
com os etruscos como com os gregos, conformando novidades estéticas significativas
para a História da Arte.

Figura 32. Sarcófago da Necrópole de Cereteri, 520 a. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Banditaccia_Sarcofago_Degli_Sposi.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Outra manifestação etrusca que terá repercussão durante o Império e que foi
desenvolvida no período da República Romana é o retrato/busto/cabeça em bronze,
elaborados nos séculos III e II a. C., que, de acordo com Upjohn, congregava em si o
“poder de expressão e o realismo”, características artísticas que estarão presentes, por
exemplo, em retratos da Roma Imperial (1979, p. 32).

Um exemplo intenso do retrato etrusco é o de Lucio Brutus (Figura 33), cuja


expressividade está materializada pela “linha, desde o contorno plástico, totalmente
impassível e fechado, até a articulação e a arquitetura da cabeça”, na qual a “cabeleira

68
A ARTE NA ROMA ANTIGA │ UNIDADE III

amolda-se estreitamente ao crâneo, as mechas parecem talhadas e cinzeladas, e as


demais partes da cabeça correspondem totalmente à interpretação descrita, lineal e
plana” (BOZAL, 1996, p. 11), e os olhos expressivos e firmes junto à força da face dão
dignidade e altivez ao senador representado, indicando, indubitavelmente, os poderes
e a sua importância social e política. Mesmo tendo sido elaborado aproximadamente
no século III a. C., o retrato de Lucio Brutus constitui um exemplar significativo da
arte etrusca, explicitando sua força, sua expressividade, sua capacidade de sugerir uma
dada condição de dignidade ao sujeito transformado em ícone e a busca pela correlação
entre a figura representada e o retrato produzido.

Figura 33. Lucio Brutus, século III a. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Capitoline_Brutus_Musei_Capitolini_MC1183.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Outra virtude ou característica importante dos retratos etruscos diz respeito ao emprego
da metalurgia na confecção de suas obras, o que implica a necessidade do domínio de
outras técnicas, sendo imprescindível também o emprego de moldes; e, também, ao
fato de que, através da manipulação da fundição, conseguiam resultados significativos
como o retrato de Brutus, que contém uma densidade expressiva e uma riqueza de
traços e detalhes. Sobre retratos como esse, Janson destacou a “excelente qualidade
da fundição e do acabamento”, confirmando a “antiga fama dos etruscos como artífices
magistrais do metal” (2001, p. 229).

69
UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

A respeito dos moldes, é importante mencionar que, além de servirem para a produção
de retratos, também eram utilizados na confecção de artefatos em terracota, viabilizando
que uma peça pudesse ser reproduzida e replicada em maior número de exemplares,
vulgarizando a sua divulgação e retirando a exclusividade da peça, por um lado, e,
por outro lado, permitindo a difusão dessas mesmas peças em diferentes localidades
e territórios, viabilizando a circulação de elementos estéticos, referenciais icônicos
que gravitariam para além de um único local. A disseminação de elementos icônicos
produzidos em objetos de arte será utilizada pelo futuro Império Romano e facilitará
a construção de referenciais culturais e de poder nos vastos territórios vinculados a
Roma.

Relativamente ao momento da ascensão de Roma, em especial no período da República


Romana, tratando-se da História da Arte, os autores consideram como uma fase de
transição entre as influências anteriores – já mencionadas, do entrecruzar helenístico,
etrusco e de outras culturas – e o aparecimento delineado da arte propriamente romana,
florescida ao longo da realidade imperial. Em especial, o busto de Brutus é identificado
como um referente de uma eventual fase de transição, denominada de “arte etrusca-
itálica”, equivocadamente na opinião de Bozal (1996, p. 11), uma vez que ainda não
estariam maduras as feições da arte imperial, mesmo que Brutus abra “caminho para
a escultura romana republicana”, pois “adiantam seu realismo, sua atitude perante as
coisas” (BOZAL, p. 11), que será importante ao logo do apogeu romano.

De toda forma, a manutenção de aspectos dos modos de vida e de aspectos culturais dos
etruscos irão desaparecendo com a passagem do tempo durante a fase da república, e
outras referências amadurecerão no desenrolar do Império. Essa transição conformará
e constituirá uma arte que se inspirou em referências passadas, mas que também
proporcionará inovações, sínteses e fusões inventivas, conformando algumas das
contribuições romanas imperiais para a História da Arte.

Pensando nesse processo de surgimento mais definido da arte romana no período


Imperial, quais foram as maneiras pelas quais essa arte ganhou expressão através da
arquitetura, da escultura e, ao final do império, da pintura? Na busca por responder
panoramicamente a essas questões, passamos a analisar a Arte Romana no Império.

70
CAPÍTULO 2
A Arte no Império Romano

A Arte no Império Romano, ainda que não seja resumida a uma única expressão ou a
uma única síntese, é frequentemente explicada pela dominância de certa tendência de
menor refinamento e, digamos, feições mais populares. Quem melhor exemplifica isso,
resumidamente, é Hauser, ao mencionar que “duas tendências diferentes evoluíram
paralelamente: de um lado, o estilo helenizante, idealista, tipicamente e teatralmente
emocional da aristocracia cortesã, e do outro lado, o estilo naturalista, sóbrio e genuíno
da classe média, dotada de maior mobilidade” (HAUSER, 2010, p. 109). Traduzindo
resumidamente essas tensões e tendências, Proença esclarece que “os romanos
receberam dos etruscos a ideia de que a arte deve expressar a realidade vivida”, e dos
“gregos, herdaram a visão de que a arte deve expressar um ideal de beleza” (PROENÇA,
2012, p. 34).

É importante relembrar que o Império Romano durou quase quinhentos anos, de


27 a. C. a 476 d. C., e que muitos processos sócio-históricos ocorreram, sendo difícil
sintetizar “tanta” história e uma vultuosa produção artística. Entretanto, apesar disso e
das diferentes influências, para Hauser, ocorreu o “triunfo do tipo popular de arte sobre
o da elite”, mas essa vitória não foi de igual intensidade nem teve a “mesma extensão
nos vários ramos da criação artística” (HAUSER, 2010, p. 109).

Resumidamente, as duas principais fontes inspiradoras da arte desenvolvida no


Império Romano, em especial no seu nascedouro, provieram da cultura helênica
– com feições idealistas, naturalistas, sóbrias – e da cultura etrusca – com
referências à realidade, à reprodutibilidade através de moldes, à cotidianidade.

Se pensarmos na arquitetura como uma das expressões da arte romana imperial, é


possível perceber que paulatinamente ela foi tomando “consciência da sua originalidade,
encaminhando-se para as grandes realizações”, sendo que, “a partir do reinado de
Adriano (século II d.C.) até o fim do Império, a arquitetura romana, de proporções cada
vez mais imponentes”, deixou nos territórios conquistados “edifícios e monumentos
que serviriam de modelo para os séculos futuros” (UPJOHN, 1979, p. 38).

Para Upjohn, mais do que a escultura ou a pintura, foi a arquitetura que mais esteve
relacionada ao “caráter dos Romanos”, pois, para esse autor, “o romano” seria “mais
um soldado que um poeta, mais um homem ambicioso e realista que um artista, mais
um homem de negócios do que um intelectual ou um pensador” (1979, p. 38). Pensar
nesse sujeito romano com um senso prático, pragmático dotado de menor preocupação
71
UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

sensível realmente vincula-se mais proximamente às necessárias características de um


Império que se impõe pela força e pelo poderio militar, menos que pelos elementos
sedutores da cultura.

De certo modo, a ideia de ser um soldado antes que um poeta sintetiza singularmente
as diferenças entre a alma grega e o espírito romano; enquanto o primeiro tem uma
atenção firme pelo belo, pelo culto ao sensível, o segundo preza pela conquista, pelo
senso prático. Essa diferença, entretanto, não quer dizer que uma arte é melhor ou
superior que a outra, apenas busca precisar como que, partindo de perspectivas de
mundo diversas, redunda na produção artística também diferente entre si, arte que
dialoga com a vida e o mundo concreto e não apenas como supostas dimensões etéreas.

Nesse sentido, os romanos, de acordo com Upjohn, nunca “manifestaram sensibilidade


e sentido de equilíbrio”, nem conseguiram “aquela harmonia perfeita entre concepção
do conjunto e o pormenor” de grandes obras atenienses; confundiam “ornamentação
com profusão” (1979, p. 38). Em síntese, as obras da arquitetura romana “encaram a
magnificência imperial, cheias de grandeza, e logo caem na vulgaridade; [...] preferem a
opulência e a sobrecarga à elegância equilibrada e discrição helênica” (UPJOHN, 1979,
pp. 39-42).

Mesmo não sendo demérito dos romanos estruturarem suas obras arquitetônicas
a partir de outros pressupostos que não aqueles emuladores dos arquitetos gregos,
é importante explicitar as diferenças entre ambos e como cada um, de certo modo,
proporcionou novidades e aspectos interessantes na História da Arte.

Como está evidenciado, para os romanos as urgências e as necessidades da expansão


imperial exigiam que suas construções tivessem estruturação reprodutível, carregando
ao longo dos territórios conquistados expressões icônicas de uma identidade romana.
Ou seja, na arquitetura e na escultura, o Império Romano precisava estar presente
e representado por uma identidade visual e funcional mínima, cabendo aos estilos e
técnicas construtivos conformarem esses elementos identitários.

Se aparentemente essa classificação da arquitetura romana pode sugerir um desvalor,


é preciso considerar que ela era fruto de escolha e da “descoberta de uma verdadeira
eficácia funcional” (UPJOHN, 1979, p. 42) que, uma vez entendido o conceito, era
reproduzido e aperfeiçoado na escala do gigantesco império. A profusão de técnicas, de
estruturas e de construções é interminável durante o Império Romano. Para exemplificar
certos aspectos estilísticos, apresentaremos sucintamente dois tipos de construções: o
Coliseu e o Arco de Triunfos.

72
A ARTE NA ROMA ANTIGA │ UNIDADE III

A arquitetura romana desenvolvida ao longo do Império congregava feições


imponentes, funcionalidade, reprodutibilidade e técnicas construtivas uma vez
aprendidas repetidas em fórmulas simplificadas e utilitárias. Ao contrário dos
gregos, que primavam pela beleza, suavidade e equilíbrio, os romanos buscavam
funcionalidade prática, incorrendo, por vezes, em simplificações vulgarizantes.
Ambicionava-se falar e representar o poder e a grandiosidade imperial, o belo
seria o imponente.

Para acessar inúmeras variáveis da arquitetura e construção romana, sugerimos


a leitura de A história das construções. Volume 3: das construções Olmecas, no
México, às revelações de Pompeia (2012a), de José Celso da Cunha, e A história
das construções. Volume 4: do panteão de Roma ao panteão de Paris (2012b),
também de Cunha.

O Coliseu de Roma (reproduzido aqui em imagem da sua maquete, Figura 34),


como é conhecido, foi construído entre 70 e 82 d. C., e é o maior dentre todos os
anfiteatros romanos. Os anfiteatros imperiais, que foram construídos em inúmeras
localidades, eram destinados a “espetáculos – combates, lutas de gladiadores”, entre
outras atividades, catalisadoras de “multidões” que afluíam para acompanhar suas
iniciativas (UPJOHN, 1979, p. 53). Segundo Cunha, o Coliseu de Roma, anteriormente
chamado de “Anfiteatro Flaviano”, apenas séculos depois de sua inauguração, é que
passou a ser designado da forma como é conhecido hoje (2012b, p. 75), e foi concebido
objetivando “construir um monumento triunfal – na tradição romana de celebrar
grandes vitórias”, ou como “forma populista de retornar ao povo uma região que lhes
pertencia anteriormente”, no “coração de Roma”, ao contrário da tradição de construir
essas instalações nas periferias das cidades, a exemplo do que ocorre atualmente com a
implantação de estádios e arenas esportivas, frequentemente localizadas distantes das
áreas centrais (CUNHA, 2012b, p. 75).

A capacidade do Coliseu de Roma beirava os 50 mil lugares, e estruturalmente exigiu


uma planta em forma de elipse, com quatro andares, em linhas horizontais, que
“suportam a pressão interior das bancadas que circundam a arena”; sendo “necessário
prever um grande número de escadas e de saídas para o público” (UPJOHN, 1979, p.
53). Desse modo, os Coliseus explicitam o “amor que os romanos tinham pelo motivo
arquitetônico do arco associado à coluna”, sendo o “edifício construído por arcadas
sobrepostas que se apoiam sobre pilares disfarçados por colunas adossadas, que
suportam o entablamento” (UPJOHN, 1979, p. 53). Exatamente o domínio da técnica
permitiu a construção e a difusão de Coliseus ao longo dos domínios do Império

73
UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

Romano, é claro que em dimensões diminutas em relação ao construído em Roma, a


capital imperial durante a maior parte do império.

Figura 34. Maquete do Coliseu de Roma, construído originalmente entre 70 e 82 d. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Maquette_du_Colis%C3%A9e_(5839478980).jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

A técnica dos arcos seria também empregada em outra “obra de arte” da arquitetura
romana: os “Arcos de Triunfo” (CUNHA, 2012b, p. 51), “muito difundidos na Roma
Antiga” que eram “grandes monumentos comemorativos que tinham como função
perpetuar grandes feitos dos reis de Roma”; dos inúmeros arcos construídos ao longo
da história romana, cada um estava “relacionado a uma comemoração específica de um
imperador” determinado, “de uma batalha” ou de alguma conquista (CUNHA, 2012b,
p. 51-52).

De fato, lembra Upjohn, a função dos arcos é de celebração e de fixação de marcos de


memória, uma vez que são “construções isoladas não tendo qualquer utilidade prática”,
como era comum aos arcos, que em geral compunham parte da estrutura das edificações
(UPJOHN, 1979, p. 58). Ou seja, de arcos que compunham elementos estruturais de
outras edificações, os romanos os retiram de sua finalidade originária – estrutural – e
convertem em marco que objetiva o culto e o rememorar de grandes personagens e
feitos. A “utilidade” dos arcos neste emprego memorialístico, de fato, era a de narrar
ações significativas e épicas, atribuindo crédito ao rei e à força do Império que alcançou
as referidas conquistas. Portanto, os arcos serviam para construir uma memória

74
A ARTE NA ROMA ANTIGA │ UNIDADE III

histórica a partir da suntuosidade e da narrativa descritiva/ilustrativa da conquista


alcançada, atribuindo vitalidade e força aos romanos e aos seus líderes, forjando uma
história epopeica a ser cultuada e lembrada.

Existem muitos exemplos de Arcos localizados em Roma e em outros lugares vinculados


ao Império Romano; a maior parte não resistiu ao tempo e perdeu-se. Dentre os que
ainda resistem, os principais são aqueles conhecidos como o Arco de Tito, datado de 81
d.C.; o Arco de Sétimo Severo, com datação de 203 d.C.; e, o Arco de Constantino com
data de 312 d.C. Os três Arcos mencionados foram construídos em mármore, possuíam
“proporções generosas”, estavam ricamente ornamentados e eram carregados de
inúmeros “elementos decorativos”, contendo baixos relevos, estátuas, entre outros
aspectos (UPJOHN, 1979, p. 58). O Arco de Constantino (Figura 35), segundo Janson,
acabava por refletir “a concepção que o próprio Constantino tinha de sua missão”, que
era a de ser o “restaurador da glória de Roma e legítimo sucessor dos ‘bons imperadores’”
(2001, p. 270-272). Esse arco evocava “episódios militares e políticos”, simbolizando as
virtudes do imperador (BOZAL, 1996, p. 19).

O Arco de Constantino contava também com arranjos estéticos elaborados por artesãos
que construíram “cenas” que acabaram preenchendo “inteiramente toda a superfície
disponível”, evitando-se que a “ação parecesse continuar para além da moldura que a
contém e a delimita”, descrições estas que também se faziam presentes em medalhas
comemorativas produzidas para lembrar e cultuar determinado imperador por algum
grande feito (JANSON, 2001, p. 272). Esse exercício de encenação total de um episódio
foi percebido por Janson (2001) como uma inovação significativa da arte romana,
presente nos arcos.

Dessa maneira, a descrição total de um evento economizava espaço e forjava a


necessidade de, na cena produzida, conter elementos essenciais que remetam ao
episódio a ser lembrado, aos sujeitos e às dificuldades principais enfrentadas, bem como
à ação heroica do personagem a ser lembrado. Exatamente essa seleção e construção
imagética explicitava uma inovação estética significante, pois conversava com a história
dos fatos, a história dos sujeitos e das sociedades, e a História da Arte.

75
UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

Figura 35. Arco de Constantino, 312 d.C.

Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/e/e8/Arch_of_Constantine_at_Night_%28Rome%29.jpg/800px-
Arch_of_Constantine_at_Night_%28Rome%29.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Os Arcos de Triunfo foram obras nas quais se encontravam técnicas variadas de diferentes
artes como da arquitetura, das esculturas e dos baixos relevos, entre outros. Esses
arcos memorialísticos oportunizaram um registro sintético de certas características
das concepções artísticas romanas que vão além das inventividades de engenharia e da
arquitetura. Para Upjohn, o “espírito prático dos romanos orientava-se para o prático e
não para o imaginário”, sendo que, na escultura, assim como na arquitetura, “o objetivo
principal foi fixar os traços que governam o Império, continuando com a tradição
etrusco-itálica do retrato fiel, muito expressivo, quase psicológico” (UPJOHN, 1979, p.
68).

Assim, os retratos e os bustos passaram a ser de um “realismo impressionante” e


sugeriam, conforme o caso, a representação de “homens severos, a conduzir legiões à
vitória”; conterá detalhes expressivos como “rugas, estrutura óssea do crânio e todas as
particularidades do rosto” retratado, sugerindo que o observador tivesse uma ideia do
“caráter” de quem foi tornado escultura/retrato/busto (UPJOHN, 1979, p. 69).

Pensar nos retratos que condensaram aspectos estéticos do naturalismo e do realismo,


traduzidos em riqueza de expressividade, dos traços humanos, das intencionalidades
potenciais dos sujeitos representados, mesmo de um eventual espírito da pessoa
retratada, de fato significou um desenvolvimento artístico extremamente relevante,

76
A ARTE NA ROMA ANTIGA │ UNIDADE III

uma vez que foi ao limite técnico e estético da criação, associando fontes da realidade
e da natureza com a sua reelaboração pelo artista, produzindo um artefato da cultura
que não é apenas uma fotografia do real e do natural, mas uma criação de realidade e
de imaginário através da arte. E com os romanos ao longo do tempo, como veremos
abaixo, o retrato passou do realismo/naturalismo para um abandono desses aspectos,
na fase final do Império, aumentando ainda mais a sua importância como sinalizadora
dos aspectos estéticos da arte imperial.

A utilização da “escultura-retrato” foi extremamente frequente ao longo do Império


Romano e entrelaçava-se com a “antiga tradição romana, que se mantivera sem
interrupção nas máscaras de ancestrais que se conservavam nos lares”. Isso quer dizer
que os retratos guardavam enraizamento profundo na cultura romana e que acabou
sendo percebido como importante pela sociedade em geral, mas sobretudo pela arte
das elites governantes. Essa tradição arraigada acabaria por consolidar a permanência
de um certo “naturalismo informal e imediato do retrato romano”, presente, inclusive,
em “obras destinadas a fins públicos” (HAUSER, 2010, p. 109), como no caso do busto
de Marco Aurélio (Figura 36), que passamos a analisar em alguns de seus aspectos mais
destacados.

A representação de Marco Aurélio através da criação do seu busto explicita um estágio


avançado do desenvolvimento estético, elaborado ao longo do tempo, pois adquirirá
feições para além do mero realismo “patético”, fruto de inovações na técnica do retrato
manifestado pelo “olhar, mediante a verruma e o buril, prescindindo dos olhos pintados
até então habituais” (BOZAL, 1996, p. 19) e que podemos observar, comparativamente,
no busto de Lucio Brutus (Figura 33), anteriormente apresentado.

O fato de deixar de pintar os olhos – comum tempos atrás, como no busto de Brutus
–, apesar de ser, aparentemente, apenas uma pequena mudança, na realidade acabou
dando aos retratos/bustos e esculturas o “domínio e concreção do gesto”; eles ganharam
uma “singularidade e temporalidade dos personagens” muito mais “acuradas”, ao
mesmo tempo em que, “sem perder sua natureza temporal”, atribuiu-se uma “tensão
que transcende a mera narração”, elevando-a à “categoria de símbolo” (BOZAL, 1996,
p. 20).

Marco Aurélio, neste busto, está sendo representado no tempo humano dos processos
históricos, e não na temporalidade dos deuses, mas a sua figura, do modo como está
forjada, também não está na condição vulgar dos seres humanos comuns nem na
condição mitológica a-histórica das divindades, ao contrário: Marco Aurélio está
alçado a uma posição entre o mundo dos homens e dos deuses, sem ser completamente
nenhum deles, passando a ser um herói, um ser sobre-humano associado ao mundo do
tempo, dos fatos e dos acontecimentos reais, mas acima deles, como que atuando para
fabricar a história e por isso ser mais que um humano qualquer.

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UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

Figura 36. Busto de Marco Aurélio.

Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Kunsthistorisches_Museum_Vienna_June_2006_048.jpg>. Acesso em:


28/5/2019.

O desenvolvimento e as mudanças técnicas na produção de esculturas, retratos e bustos


romanos foram sendo expressos de maneira especial por algumas obras icônicas. Um
outro exemplo de retrato que sinaliza essas mudanças significativas na produção
escultural e seus derivados é a Cabeça de Constantino (Figura 37).

A Cabeça de Constantino mede mais de dois metros e é parte da escultura grandiosa


do Imperador Constantino, datado de 330 d. C., sinalizando alterações fundamentais,
pois nela se manifesta uma fina especificidade em uma arte que constantemente havia
reverenciado o poder através do recurso à “divinização” dos homens-imperadores,
mas que agora aceitava e utilizava “desaforadamente” recursos mais simplórios e mais
triviais para explicitar um vigoroso imperador, exatamente no momento em que a
grandeza do Império começava sua decadência e, apesar da “colossal escultura”, ela foi
insuficiente para manter os tempos grandiosos do Império (BOZAL, 1996, p. 22).

Para Janson, a obra sobre Constantino foi o “prenúncio do fim do retrato” do modo
como era conhecido até aquele momento – fundindo aspectos do naturalismo e do

78
A ARTE NA ROMA ANTIGA │ UNIDADE III

realismo, temperado pela divinização dos grandes homens de Roma –, pois de agora
em diante, algo relevante anteriormente – a “semelhança física” –, pouco importava,
tendo destaque o “sentido” adquirido de “símbolo visível do eu espiritual”, condição
que está associada à situação do rei em questão de ser o “primeiro Imperador cristão e
reorganizador do Estado romano” (JANSON, 2001, p. 270).

Com a escultura da qual a Cabeça faz parte, Constantino adquire, com essa novidade
estética, feições “sobre-humanas, não só por causa do seu tamanho”, mas pela falta de
criação de uma representação sugestiva de suas características anatômicas ou físicas,
equivalentes e proporcionais ao modelo, e também pela transfiguração da figura do
imperador em algo supremo, algo que transcende a dimensão terrena e que coloca
a “majestade imperial” em um patamar equivalente a imagens divinas estilizadas
(JANSON, 2001, p. 270).

Figura 37. Cabeça de Constantino, 330 d. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Colossal_statue_of_Constantine_-_Palazzo_dei_Conservatori_-_Musei_Capitolini_-_
Rome_2016.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

79
UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

Essa tendência de se afastar do chamado realismo também está presente na estátua


da qual a Cabeça de Constantino faz parte, e esse distanciamento tem como referência
anterior o aperfeiçoamento da arte escultórica presente em exemplares como a estátua
de Augusto de Prima Porta, de 20 a. C. (Figura 38), na qual a evocação ao realismo
ainda está presente, mas tencionando a sua transição para a dimensão e o status sobre-
humano do imperador.

Precisamente o enfraquecimento do realismo na representação de figuras imponentes


socialmente é ressaltado por Janson ao analisar a estátua de Augusto Prima Porta,
dizendo que “à primeira vista, nem sabemos se representa um deus ou um ser humano,
e a dúvida é justificada porque a figura pretende ser ambas as coisas” (JANSON, 2001,
p. 254). Apesar de construir essa representação quase divina e heroica, em Augusto
de Prima Porta os traços são inconfundivelmente romanos: o rosto é de uma “nítida
semelhança, claramente individual”; o “gesto e o traje” são de uma “precisão concreta
na textura”, sendo que este último dá a “impressão de se tratar de tecido, couro e metal”
(JANSON, 2001, p. 254).

Figura 38. Augusto de Prima Porta, 20 a. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Statue-Augustus.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

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A ARTE NA ROMA ANTIGA │ UNIDADE III

A reprodução em massa de retratos fez com que “a qualidade artística” raramente


fosse elevada, “exceto quando os retratos eram executados sob o patrocínio direto
do monarca” (JANSON, 2001, p. 254). As esculturas também participam dessa
“vulgarização”. Segundo Upjohn, a descoberta da escultura helenística, em fins do
século I a. C., proporcionou uma “nova orientação das artes decorativas e da escultura
romana” e, para satisfazer o “esnobismo dos cidadãos ricos, copiam-se obras gregas”
(UPJOHN, 1979, p. 72).

Com a maciça popularização da escultura é que se observa um fluxo do fenômeno


do realismo e, de outra parte, certa necessidade de que a representação visual dos
chamados grandes homens dessem conta de criarem expressões de distinção, poder e
hierarquia, como materializado na Estátua Equestre de Marco Aurélio, de 161 a 180 d.
C. (Figura 39).

A Estátua Equestre de Marco Aurélio procura fixar uma “imagem do imperador à cavalo,
como invencível conquistador da Terra, como general invicto”; o cavalo, por sua vez, de
“extraordinário vigor e fogosidade” corporifica o “espírito marcial”; o imperador, sem
as vestes de guerra, as armaduras ou armas, sinaliza a postura de “desprendimento” e
de pacificador (JANSON, 2001, p. 254).

A imponência do Imperador sem armas e com o cavalo simbolizando a dimensão


guerreira propõe um discurso visual no qual o poder pede força e fortaleza, mas ao
mesmo tempo pacificação, concórdia; o líder, o chefe, nessa representação, encarna
brilhantemente essa ambiguidade da paz necessária ao governo e da força necessária
ao poder de governar. Há de destacar ainda a beleza da construção da dinâmica e do
movimento explicitado pela mão que se dirige ao horizonte e a palma aos súditos; o
cavalo com musculatura evidenciada mas não utilizada – sugerindo que se necessária
a força e a energia eventualmente fazem parte do governante – , e o trotar elegante
comum ao mundo equestre junto ao ritmo da respiração conferem realismo ao tempo
em que fazem ascender Marco Aurélio ao lugar dos sobre-humanos, não acessível ao
comum dos mortais. Esse conjunto, ainda assim, transita entre o belo pela fineza dos
tratos e da construção visual e o belo pelo realismo estilizado que materializa, sendo
vitoriosa essa última opção.

81
UNIDADE III │ A ARTE NA ROMA ANTIGA

Figura 39. Estátua Equestre de Marco Aurélio, de 161 a 180 d. C.

Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Rome-MuseeCapitole-ConstantinSurCheval.jpg>. Acesso em: 28/5/2019.

Apesar de termos direcionado a nossa atenção prioritária sobretudo à escultura e


às manifestações a ela associadas como os bustos/retratos, acompanhando o seu
desenvolvimento desde a Grécia Arcaica, é importante mencionar, rapidamente, as
modificações técnicas observadas na arte da pintura na Roma Imperial.

A respeito das pinturas no Império Romano, de acordo com Upjohn, as manifestações


dessa arte no período que sobreviveram ao tempo e chegaram até nós são as “pinturas
murais”, as quais estão essencialmente subordinadas a certos critérios decorativos
e arquitetônicos”, e que estariam divididas em quatro variantes – tomando como
referência em um dos principais registros dessas pinturas, a cidade de Pompeia: a
primeira, de tradição puramente “helenística que perdurará até 80 a. C., em paredes
horizontais de uma só cor ou com motivos lavrados, imitando lajes de mármore”; o
segundo, chamado de “arquitetônico” e vai até os anos 10 a. C., com forte influência da
“decoração teatral”, com frontões pintados em falsa perspectiva enquadrando paisagens
ou grupos de pessoas que cobrem toda a superfície da parede”; o terceiro estilo,
“chamado de ornamental”, surgindo a partir do ano 10 a. C., ganhou destaque pela
“decoração pura”, a partir de “elementos decorativos de origem egípcia”; ou o quarto
período, chamado de “estilo flaviano”, que apareceu ao redor de 50 d.C., caracterizado

82
A ARTE NA ROMA ANTIGA │ UNIDADE III

por “painéis” em que se “desenrolam cenas minúsculas sobre fundos lisos, vermelhos
ou negros”, e os “elementos arquitetônicos em falsa perspectiva tornam-se totalmente
imaginários” (UPJOHN, 1979, pp. 74-77).

As questões relativas à pintura não iremos aprofundar, pois nossa ênfase foi sobre as
esculturas (retratos, estátuas, bustos), tangenciando em aspectos da arquitetura que
dialogavam com o universo das esculturas (arcos do triunfo, arenas – que fornece em
parte a técnica do arco para os arcos do triunfo).

Enfim, a importância das diversas expressões artísticas e arquitetônicas forjadas durante


o Império Romano para o transcorrer histórico, em especial do Ocidente, é fundamental,
porque em diversos momentos da arte e da construção, fórmulas, estratégias e técnicas
foram retomadas e inspiraram novos artefatos da cultura. Em especial, a partir do
Renascimento, a Antiga Roma artística foi procurada e serviu de inspiração para
a criação artística, e a partir do século XVIII, passando pela expansão da sociedade
industrial, passou a ter fundamental participação na história da arquitetura, com o
elaboração de uma estética neoclássica expressiva de soluções técnicas importantes e
discursos monumentais ou, como disse Upjon, durante “o entusiasmo pela Antiguidade
Romana”, tornou-a a “única fonte inspiradora até o fim do século XVIII”, sendo “fato
histórico a influência longa e cada vez mais extensa de Roma”, e mesmo no “século XIX
todas as academias permaneceram ligadas a tradições herdadas de Roma, como que
fascinada” pela “civilização que soubera resolver de maneira feliz os mais complexos
problemas arquitetônicos” (UPJOHN, 1979, p. 68).

A História da Arte com Roma Imperial e sua decadência interrompe um ciclo de


desenvolvimentos inter-relacionados no plano da estética e do sentido dos artefatos
artísticos. A escultura – campo que dedicamos maior atenção –, a pintura, a
arquitetura, a literatura, a filosofia e as instituições sociais, desde a Grécia Antiga até
o fim do Império, sofreram expansão extraordinária, nem sempre sobrevivendo de
modo intocável. Ao contrário, no período analisado, as mudanças, às vezes mais sutis,
outras ocasiões mais agudas, foram constantes; bem como as influências na produção
desses campos permanentemente “dialogavam” com tradições, descartavam “modos-
de-fazer”, fundiam estilos e técnicas diferentes em novas e interessantes soluções.

Esta disciplina procurou oportunizar uma aproximação de alguns dos processos


envolvendo a construção da arte desde os tempos Pré-históricos até o fim da Roma
imperial. Foi um prazer compartilhar com você essas reflexões e conhecimentos na
busca de colaborar com a sua formação de especialização.

83
Referências

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Crédito de Imagens:

Figura 1. Túmulo de Sungir, Rússia, Ossos de 30 mil antes do presente e reconstituição.


Fonte: <https://www.proza.ru/pics/2009/05/21/141.jpg>.

Figura 2. Aspecto das Pinturas da Caverna de Lascaux, França, que datam de 15 a


20 mil anos antes do presente. Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/
commons/1/1e/Lascaux_painting.jpg>.

Figura 3. Fotografia de fragmento da Caverna de Chauvet. Fonte: <https://upload.


wikimedia.org/wikipedia/commons/0/0d/Chauvet%C2%B4s_cave_horses.jpg>.

Figura 4. Aspecto de pinturas da Caverna de Chauvet. Fonte: <https://www.donsmaps.


com/images22/chauvetpan.jpg>.

Figura 5. Aspecto das Pinturas da Caverna de Lascaux. Fonte: <https://www.donsmaps.


com/images25/lascauxmainhallunicorn.jpg>.

Figura 6. Dança Ritual na Cova delMoros (Cogul) +- 5 mil a 7 mil a. C. Fonte: <https://
patrimonioculturalandaluciaangela.wordpress.com/category/edad-de-los-metasel/>.

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REFERÊNCIAS

Figura 7. Pintura Neolítica na caverna de Rocó Nando, em Benassal, Valência,


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museuprehistoriavalencia.es/web_mupreva_dedalo/publicaciones/245/va>.

Figura 8. Pintura Rupestre, Lajedo da Saudade, +- 5.000 a. C. a +- 3.000 a. C. Fonte:


<https://a6ee1d56-a-62cb3a1a-s-sites.googlegroups.com/site/lajedosoledade/home/
IMG-20181209-WA0004.jpg?attachauth=ANoY7cr8W6iIAv4-0CALrl4fbwXq67cl8N
Oa8EGZc4tVKx7DUcJlvOa6iqxngelI7IZTIuHgUlrjC9GqlzymYrjynKAV8RqJ1Jjl3i6za
JNiTGRk3mRqJCcLMSNTHSoHRmmQZgi9RiU2mT7h0lz_9Evh3XouiHFz3vQJHAj
Rl3moZiNgyqcwwDoDcAR3qe63IxNuo7M9Q6TH0F6YX-S5VwJXCKceWz97aEeKmT
NG02mH9UQldK9PoSE%3D&attredirects=0>.

Figura 9. Aspecto de Rupestre, Parque Nacional da Serra da Capivara. Fonte: <https://


upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/7/70/Serra_da_Capivara_-_
Several_Paintings_2b.jpg/800px-Serra_da_Capivara_-_Several_Paintings_2b.jpg>.

Figura 10. Aspecto Antropomórfico e Zoomórfico, Parque Nacional da Serra da Capivara.


Fonte: <http://www.fumdham.org.br/wp-content/uploads/2015/07/fumdham-0412.
jpg>.

Figura 11. Mapa atual de países na região do Mar Mediterrâneo. Fonte: <https://
pt.wikipedia.org/wiki/Mar_Mediterr%C3%A2neo#/map/0>.

Figura 12. Mapa das áreas sob interferência Grega, 800 a. C. a 500 a. C. Fonte: <https://
upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/2/26/Location_greek_ancient.svg>.

Figura 13. Templo de Afaia. Fonte: Fonte: <https://upload.wikimedia.org/wikipedia/


commons/thumb/8/8a/Model_temple_of_Aphaia_Glyptothek_Munich.jpg/800px-
Model_temple_of_Aphaia_Glyptothek_Munich.jpg>.

Figura 14. Aspecto de esculturas do frontão do Templo de Afaia, 500 a 480 a. C. Fonte:
<https://it.wikipedia.org/wiki/File:Panorama_of_the_west_pediment_of_the_
temple_of_Aphaia_in_the_Glyptothek_Munich_n1.jpg>.

Figura 16. Kouros de Anavisos, 520 a. C. Fonte: <https://commons.wikimedia.org/


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File:ACMA_679_Kore_1.JPG>.

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Olímpia, 450 a. C. Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:GR_08-04-23_
Olympia_Museum_Zeustempel_Ostgiebel2.JPG>.

Figura 21. Poseidon, 460-450a a. C. Fonte: <https://en.wikipedia.org/wiki/


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Figura 22. Discóbolo, 450 a. C. Fonte: <http://ancientrome.ru/art/artworken/img.


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Figura 23. Nióbida Moribunda, 450-440 a. C. Fonte: <https://commons.wikimedia.


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Figura 24. Império Macedônico sob Felipe II, 336 a. C. Fonte: <https://pt.wikipedia.
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Figura 25. Expansão do Império Macedônico sob Alexandre, o Grande, entre 336 a 323
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pt.svg>.

Figura 26. Aspecto do Sarcófago de Alexandre, representando batalha contra persas,


305 a. C. Fonte: <https://en.wikipedia.org/wiki/File:Alexander_Sarcophagus_Battle_
of_Ussus.jpg>.

Figura 27. Apoxiomenos de Lisipo, 320 a. C. Fonte: <https://commons.wikimedia.org/


wiki/File:Apoxyomenos_Pio-Clementino_Inv1185.jpg>.

Figura 28. Gaulês Moribundo, 230 a. C. Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/


Ficheiro:Dying_Gaul_-_Palazzo_Nuovo_-_Musei_Capitolini_-_Rome_2016_(4).
jpg>.

Figura 29. Nike de Samotrácia, 200 a 190 a. C. Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/


Vit%C3%B3ria_de_Samotr%C3%A1cia>.

Figura 30. Loba Capitolina, 470 a. C. Fonte: <https://upload.wikimedia.org/


wikipedia/commons/archive/a/aa/20110703134533%21Capitoline_she-wolf_Musei_
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Figura 32. Sarcófago da necrópole de Cereteri, 520 a. C. Fonte: <https://pt.wikipedia.


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Figura 32. Lucio Brutus, século III a. C. Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/


Ficheiro:Capitoline_Brutus_Musei_Capitolini_MC1183.jpg>

Figura 34. Maquete do Coliseu, construído originalmente entre 70 e 82 d. C.


Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Maquette_du_Colis%C3%A9e_
(5839478980).jpg>.

Figura 35. Arco de Constantino, 312 d.C. Fonte: <https://upload.wikimedia.org/


wikipedia/commons/thumb/e/e8/Arch_of_Constantine_at_Night_%28Rome%29.
jpg/800px-Arch_of_Constantine_at_Night_%28Rome%29.jpg>.

Figura 36. Busto de Marco Aurélio. Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/


File:Kunsthistorisches_Museum_Vienna_June_2006_048.jpg>.

Figura 37. Cabeça de Constantino, 330 d.C. Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/


Ficheiro:Colossal_statue_of_Constantine_-_Palazzo_dei_Conservatori_-_Musei_
Capitolini_-_Rome_2016.jpg>.

Figura 38. Augusto de Prima Porta, 20 a. C. Fonte: <https://pt.wikipedia.org/wiki/


Ficheiro:Statue-Augustus.jpg>.

Figura 39. Estátua Equestre de Marco Aurélio, de 161 a 180 d. C. Fonte: <https://
pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Rome-MuseeCapitole-ConstantinSurCheval.jpg>.

Crédito de Quadros:

Quadro 1. Desenvolvimento Humano por Critério Produtivo. Fonte: Elaboração própria.

Quadro 2. Critério de Classificação das Artes na Pré-História. Fonte: Elaboração própria.

Quadro 3. Classificação da Arte Pré-Histórica no Paleolítico Superior (30 mil anos), a


partir do sistema crono-estilístico de A. Leroi-Gourhan. Fonte: Essa sequência temporal
classificatória está presente, resumidamente, em: BOZAL, 1995, p. 13-14.

Sites referenciados:
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<http://www.lajedodesoledade.org.br/>

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<https://artsandculture.google.com/partner/acropolis-museum>

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