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HISTÓRIA ANTIGA

Caroline Silveira Bauer


A formação da Grécia Antiga
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Descrever os aspectos geográficos e o povoamento da Grécia.


 Relacionar os diferentes períodos históricos da Grécia Antiga.
 Analisar a hegemonia ateniense e a construção da democracia grega.

Introdução
A Grécia Antiga compreende o período que vai da ocupação do território
grego por povos nômades e ágrafos até o domínio da região pelos ro-
manos. Ainda que essa periodização possa ser contestada, ela é didática
e importante para você compreender aspectos relevantes da formação
da sociedade grega antiga.
Neste capítulo, você vai estudar a geografia do território da Grécia e a
sua influência na organização política e social dos diferentes povos que
se estabeleceram ali. Você também vai conhecer os períodos em que é
dividida a Antiguidade Grega e os marcos utilizados para circunscrevê-
-los. Além disso, você vai verificar por quê, entre todas as cidades-estado
da região, Atenas conquistou a hegemonia em diferentes aspectos e
instaurou um regime democrático.

Aspectos geográficos e povoamento da Grécia


Antes de conhecer os aspectos geográficos e o povoamento da Grécia, é
importante você ter em mente que o povo que hoje é chamado de “grego” não
dava esse nome a si mesmo. Essa nomenclatura foi cunhada pelos romanos
para caracterizar aqueles que falavam a língua grega, ou seja, tampouco estava
em jogo uma ideia de nação. Os “gregos” chamavam seu território de Hélade,
onde viviam os helenos, e denominavam “bárbaros” os estrangeiros que não
falavam a sua língua e não tinham os seus costumes. Na Figura 1, a seguir,
você pode ver a localização atual da Grécia.
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Figura 1. Mapa atual da Grécia.


Fonte: Guia geográfico ([201-?]).

A região ocupada originalmente pelos helenos foi a atual Península Balcâ-


nica (também chamada de Grécia Continental). Em um movimento expansio-
nista, os gregos ocuparam também ilhas do mar Egeu, do mar Mediterrâneo
e do mar Jônico (chamada de Grécia Insular). Expandiram-se ainda para o
litoral da Ásia Menor, da antiga Jônia e da região da atual Turquia (chamada
de Grécia Asiática), bem como para o sul da Itália (chamada de Magna Grécia)
(FUNARI, 2002, documento on-line).
A Grécia Continental possui um relevo montanhoso com planícies fér-
teis, mas descontínuas, o que dificultou o desenvolvimento da agricultura e
impulsionou o movimento expansionista pela região. Por sua vez, o extenso
litoral facilitou a navegação e o desenvolvimento de uma frota marítima
de comércio e defesa. Alguns autores afirmam que o relevo montanhoso e
acidentado foi um dos fatores para o fracionamento administrativo e político
da Grécia em cidades-estado, devido às dificuldades de comunicação. Além
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disso, havia muita competição e rivalidade entre as cidades. Contudo, essa é


uma interpretação fatalista, assentada no determinismo geográfico.
Mas você sabe o que era uma cidade-estado grega? Veja o que afirma
Funari (2002, documento on-line):

A cidade — pólis, em grego — é um pequeno Estado soberano que com-


preende uma cidade e o campo ao redor e, eventualmente, alguns povoados
urbanos secundários. A cidade se define, de fato, pelo povo — demos — que
a compõe: uma coletividade de indivíduos submetidos aos mesmos costumes
fundamentais e unidos por um culto comum às mesmas divindades protetoras.
Em geral, uma cidade, ao formar-se, compreende várias tribos; a tribo está
dividida em diversas frátrias e estas em clãs; estes, por sua vez, compostos de
muitas famílias no sentido estrito do termo (pai, mãe e filhos). A cada nível, os
membros desses agrupamentos acreditam descender de um ancestral comum
e se encontram ligados por estreitos laços de solidariedade. As pessoas que
não fazem parte destes grupos são estrangeiros na cidade e não lhes cabe
nem direitos, nem proteção.

Por essas características da cidade-estado, é importante reforçar a ideia de


que a Hélade, ou Grécia Antiga, não era um Estado unificado, com um governo
único e uma única nação: era um conjunto de cidades independentes, que
tinham governos, leis e características culturais, políticas e sociais próprias.
Quais foram os povos que ocuparam a Hélade? Acredita-se que o início
da ocupação do território da Grécia tenha ocorrido há 4 mil anos. Estudos
arqueológicos permitem afirmar que quatro grandes povos indo-europeus
ocuparam essa região. A seguir, veja quais foram esses povos.

 Aqueus: fundadores da cidade de Micenas, ocuparam a ilha de Creta há


3,5 mil anos, fundando a sociedade creto-micênica e espalhando-se pelo
mar Egeu. Mantiveram a dominância desse território até o século 13 a.C.
 Jônios: fixaram-se na região da Península por volta do século 18 a.C.
e fundaram a cidade de Atenas. Expandiram-se para a região da Ásia
Menor e a chamaram de Jônia.
 Eólios: ocuparam a região norte da Grécia por volta de 3,8 mil anos
atrás. Foram os fundadores da cidade de Tebas.
 Dórios: foram os fundadores da cidade de Esparta e caracterizavam-se
pelo militarismo. Foram o último povo a dominar a Hélade.

Alguns estudos mais contemporâneos afirmam que o território da atual


Grécia era ocupado, em sua “pré-história”, por povos ágrafos, chamados leleges
e pelasgos. Assim, é possível considerar esses povos indo-europeus como
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“invasores” que, juntamente aos “povos originais”, deram origem à Hélade.


Segundo Funari (2002, documento on-line), a sociedade grega se originou
durante os séculos que se seguiram às invasões dórias: “Ela não surgiu como
um milagre, e sim como herdeira dos avanços e conhecimentos aprendidos e
adaptados de outros povos”.

Periodização da Grécia Antiga


A Grécia Antiga corresponde aos eventos compreendidos entre a ocupação
do território por povos nômades e ágrafos e o domínio pelos romanos. No
entanto, essa datação e as suas subdivisões, que você vai ver a seguir, estão
baseadas na experiência ateniense, que deixou maior número de vestígios, o
que permite estudá-la historicamente. Dessa forma, é importante você lembrar-
-se das peculiaridades de cada uma das cidades-estado e perceber que nem
sempre a periodização está isenta de imprecisões.
Assim, de forma didática, a Grécia Antiga divide-se nos períodos listados
a seguir.

 Sociedade cretense ou minoica (2000 a 1500 a.C.): estabeleceu-se na


ilha de Creta e seu nome deriva de um lendário monarca chamado Minos.
A organização política e social era feita em torno de palácios, que se
disseminaram pela ilha, dando origem a reinos autônomos. Segundo
Funari (2002, documento on-line), as invasões dóricas provocaram a
desagregação da sociedade cretense, dando início a um processo de
longa duração que resultou na formação da sociedade grega.
 Período micênico ou pré-homérico (1500 a 1200 a.C.): o período
“micênico” ficou assim conhecido em função do rei aqueu Micenas, que
ocupou o território continental da Grécia e a ilha de Creta. As aldeias
e os palácios-fortalezas possuíam características bélicas, em função da
disputa por terras, rotas comerciais e outras riquezas. A partir dessas
atividades, o território da Grécia foi sendo ocupado. Com a invasão
dos dórios, houve a destruição ou o abandono de diversos palácios
e aldeias, gerando um processo de ruralização da população e a sua
organização em “genos”.
 Período homérico ou idade das trevas (1200 a 800 a.C.): corresponde
ao processo de formação das estruturas sociais chamadas “genos”, termo
que costuma ser traduzido como “família”, mas que corresponde a uma
organização mais ampla do que a abarcada pelo sentido de “família”
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contemporâneo. Os genos incluíam relações hereditárias e também laços


afetivos em relação a agregados. A organização da vida em coletividade
nesses “genos” daria origem às cidades-estado gregas. De acordo com
Barbosa (2009, p. 56), existem diferentes motivos para a desintegração
dos genos, como o crescimento populacional que acelerou mais do que
a produção de alimentos, resultando, assim, em disputas por alimentos
e em disputas por terrenos cultiváveis; diversos conflitos nos genos,
tais como as concorrências entre filhos, o desinteresse dos jovens pelo
trabalho monótono, a expulsão dos criminosos do convívio nos genos,
etc.”. Esse período possui o nome de “homérico” devido às obras Ilíada
e Odisseia, textos atribuídos a Homero que são as principais fontes para
se conhecer esse momento histórico, principalmente a Guerra de Troia
e as suas consequências.
 Período arcaico (800 a 500 a.C.): é nesse período que ocorre o desen-
volvimento das cidades-estado gregas, com organizações econômicas
e políticas autônomas (AUSTIN; VIDAL-NAQUET, 1972), além de
manifestações artísticas, culturais e filosóficas cujos registros chega-
ram até o mundo contemporâneo. Uma das características do período
arcaico é a valorização e uma relativa separação entre o pensamento
social dos mitos e da religião. Também foi nesse momento histórico
que se iniciou em Atenas uma série de reformas políticas que levaram
ao desenvolvimento da democracia ateniense. Antes disso, houve uma
sucessão de regimes, como a aristocracia e a tirania (AUSTIN; VIDAL-
-NAQUET, 1972).
 Período clássico (500 a 400 a.C.): esse período corresponde ao mo-
mento de apogeu das cidades-estado gregas, com grande desenvolvi-
mento cultural, econômico e político. O comércio marítimo e as lutas
por hegemonia na região acirram as relações entre as pólis, dando
origem a conflitos e guerras, como a Guerra do Peloponeso, conflito
entre Atenas e Liga de Delos e Esparta e Liga do Peloponeso, ligas estas
formadas por acordos econômicos e militares. Essa guerra, conforme
Finley (1989), teria resultado do confronto entre duas concepções de
mundo (economia, política e sociedade). Mesmo após a derrota de
Atenas para Esparta, continuaram ocorrendo conflitos menores que,
para Funari (2002, documento on-line), acarretaram o enfraquecimento
das cidades, abrindo caminho para a dominação macedônica.
 Período helenístico (400 a 100 a.C.): após a Guerra do Peloponeso
e a derrota de Atenas para Esparta, houve um enfraquecimento das
cidades-estado devido às consequências do conflito. Alexandre, rei
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da Macedônia, aproveitou-se dessa debilidade e invadiu o território


grego, conquistando-o e o incorporando ao seu gigantesco império. O
apreço de Alexandre, o Grande, pela cultura grega foi responsável pela
difusão de diferentes aspectos do pensamento e das práticas gregas,
que, em fusão com culturas orientais, deram origem ao chamado “he-
lenismo”. O helenismo também foi o período que antecedeu o domínio
e o apogeu de Roma na região. Para Funari (2002, documento on-line),
a desintegração do império macedônico em monarquias fez com que as
cidades-estado gregas perdessem a sua autonomia política e, com isso,
não possuíssem mais exércitos próprios. Porém, elas mantiveram as suas
leis e constituições. Além disso, mesmo quando foram gradativamente
incorporadas ao império romano, mantiveram-se fiéis à sua cultura.

Ainda que essa periodização o auxilie didaticamente na sua aprendizagem


sobre a Grécia Antiga, você deve utilizá-la com muito cuidado. Afinal, como
pontua Florenzano (1994), ela foi baseada na experiência de Atenas, a cidade-
-estado a respeito da qual existem mais registros. Além disso, como ocorre
com qualquer periodização, foram feitas algumas escolhas — nesse caso, para
considerar ou desconsiderar alguns povos que ocupavam a região da Hélade.

Hegemonia ateniense e democracia grega


Como resultado de sua liderança durante as Guerras Médicas, seu crescente
prestígio militar em comparação com Esparta e seu poder na Liga de Delos,
Atenas se converteu na cidade-estado mais influente da Grécia, dando origem
a um período que ficou conhecido como “hegemonia ateniense” ou “idade de
ouro de Atenas”, que corresponde ao século V a.C.

As Guerras Médicas, também conhecidas como “medas”, foram um momento essencial


da história do mundo grego. Desse confronto surgiram a hegemonia ateniense e a
civilização clássica associada a ela. Desde o século VI a.C., os persas dominavam os
países situados na região que vai do planalto do Irã às margens do Mediterrâneo.
Eles conquistaram a Mesopotâmia, a Ásia Menor e depois o Egito, assim como as
cidades-estado gregas.
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No início do século V, algumas dessas cidades revoltaram-se e pediram auxílio


aos gregos da Europa. Os atenienses responderam e participaram da tomada de
uma das capitais reais, Sardes. Essa vitória foi usada por Dario como pretexto para
lançar, em 490, uma expedição contra Atenas, que terminou em desastre para o
corpo expedicionário persa. Mais tarde, o filho de Dario, Xerxes, retomou o projeto,
unindo à expedição marítima um imenso exército de mercenários. Esse exército
cruzou o desfiladeiro das Termópilas e dominou a Acrópole de Atenas. No ano
seguinte, os gregos venceram os persas que haviam permanecido na Grécia. Para
a maioria deles, especialmente para os espartanos, a guerra terminara. Contudo,
não para os atenienses.
Os atenienses e os gregos das ilhas e do norte do Egeu formaram uma aliança, a
Liga de Delos, que buscou libertar dos persas as cidades gregas da Ásia. Essa aliança
deu origem ao império ateniense. Encarregando-se da defesa comum, os atenienses
exigiram dos aliados o pagamento de um tributo anual. Tal tributo servia para a ma-
nutenção de uma grande frota, mas permitiu também a Péricles, já o político mais
importante de Atenas, investir na arquitetura da cidade. Assim, Atenas se tornou o
centro da vida intelectual e artística grega, para onde confluíam sábios, filósofos e
artistas (MOSSÉ, 2004).

Sob a liderança de Péricles, houve uma reforma constitucional, estabele-


cendo um modelo democrático bastante específico; foram construídos grandes
edifícios, como o Panteão; e o teatro grego apresentava tragédias escritas por
Ésquilo, Sófocles e Eurípedes. Também datam desse período as obras dos
historiadores Heródoto e Tucídides e do filósofo Sócrates. Do ponto de vista
artístico, cultural, filosófico e histórico, portanto, Atenas representava um
grande centro nas cidades da Antiguidade.
A hegemonia ateniense também era econômica. Após as Guerras Médicas,
Atenas construiu uma frota mercante, que transportava mercadorias de todas as
espécies. Aproveitando a sua posição no mar Egeu, estabeleceu a cobrança de
taxas aduaneiras. Na agricultura, Atenas produzia e comercializava azeitonas
e seus derivados. Produzia também, por meio da fundição de metais, armas
e joias, além de artigos em cerâmica.
Existia um comércio interno na península, baseado nas trocas e em pe-
quenos comércios, em que se trocavam e vendiam produtos necessários para
o cotidiano (como cestos e vasos), além de gêneros alimentícios. Juntamente
a esses pequenos comerciantes, havia “cambistas”, que trocavam moedas e
realizavam pequenos empréstimos. Existia também um comércio exterior,
que era dominado pelos metecos; o trigo era o único produto controlado pela
cidade-estado nesse comércio. Foi dessa maneira que a moeda ateniense se
converteu em uma forma de pagamento aceita em diferentes locais.
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A democracia ateniense
Etimologicamente, a palavra “democracia” vem dos termos gregos demos
(povo) e cratos (poder). Contudo, você deve ficar atento: “povo” e “poder”
possuíam sentidos diferentes dos que têm hoje. Havia toda uma forma es-
pecífica de organização política dos gregos, em mandatos eletivos (em raros
postos, por sorteio) e temporais para assembleias e conselhos. Nesses espaços
de votação e deliberação coletivos, destacavam-se aqueles que possuíam
uma boa oratória e retórica, características muito valorizadas na política
naquele momento.
Veja o que afirma Vernant (1972, p. 35):

A palavra não é mais o termo ritual, a fórmula justa, mas o debate contradi-
tório, a discussão, a argumentação. Supõe um público ao qual ela se dirige
como a um juiz que decide em última instância, de mãos erguidas, entre dois
partidos que lhe são apresentados; é essa escolha puramente humana que mede
a força de persuasão respectiva dos dois discursos, assegurando a vitória de
um dos oradores sobre seu adversário. Todas as questões de interesse geral
que o Soberano tinha por função regularizar e que definem o campo da ar-
ché são agora submetidas à arte retórica e deverão resolver-se na conclusão
de um debate [...] Entre a política e o logos [conhecimento], há assim uma
relação estreita, vínculo recíproco. A arte política é essencialmente exercício
de linguagem; e o logos, na origem, toma consciência de si mesmo, de suas
regras, de sua eficácia, através de sua função política.

Mas isso não significa que todas as pessoas pudessem participar da


política. Somente os cidadãos possuíam direitos políticos. Outros grupos
sociais, como os escravizados e os metecos (considerados estrangeiros),
por sua origem e por transmitirem geracionalmente sua condição, eram
excluídos da política.
De acordo com Funari (2002, documento on-line):

Na democracia ateniense [...], apenas tinham direitos integrais os cidadãos.


Calcula-se que, em 431 a.C., havia 310 mil habitantes na Ática, região que
compreendia tanto a parte urbana como rural da cidade de Atenas, 172 mil
cidadãos com suas famílias, 28.500 estrangeiros com suas famílias e 110
mil escravos. Os escravos, os estrangeiros e mesmo as mulheres e crianças
atenienses não tinham qualquer direito político e para eles a democracia
vigente não trazia qualquer vantagem.
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A democracia ateniense era direta, ou seja, todos os cidadãos podiam participar


da assembleia do povo (eclésia). Essa assembleia tomava as decisões relativas aos
assuntos políticos em praça pública. Entretanto, o regime democrático ateniense
tinha limites, e pode-se mesmo dizer que a democracia grega dependia da escravidão.
Eram considerados cidadãos apenas os homens adultos (com mais de 18 anos de
idade) nascidos de pai e mãe atenienses. Os cidadãos possuíam três direitos principais:
liberdade individual, igualdade com relação aos outros cidadãos perante a lei e direito
a falar na assembleia.
A eclésia reunia-se 10 vezes por ano, mas para cada uma dessas reuniões havia mais três
encontros extraordinários. As sessões começavam no início e terminavam ao final do dia.
Qualquer cidadão ateniense tinha o direito de pedir a palavra e ser ouvido. Contudo, na
prática, eram os líderes que falavam. Além disso, as decisões da assembleia eram inapeláveis.
No entanto, havia um conselho (bulé ou senado) de pessoas que se dedicavam o ano todo
a analisar questões e aconselhar sobre temas de interesse público. Os 500 senadores que
faziam parte da bulé eram homens sorteados entre aqueles que se apresentassem como
candidatos, necessariamente cidadãos com ao menos 30 anos de idade.
Como os participantes do conselho ateniense precisavam permanecer um ano no
cargo dedicando-se a reuniões diárias, adquiriam o direito a receber uma ajuda de
custo. Os magistrados eram apenas os executores das decisões da eclésia e da bulé.
Eles possuíam o poder de manter a ordem e o respeito a leis e decretos. Os magis-
trados podiam ser homens eleitos pela assembleia ou escolhidos por sorteio entre
os candidatos. Os gregos consideravam que o sorteio era influenciado pelos deuses.
O tribunal popular, ou helieia, contava com milhares de juízes, escolhidos por sorteio.
A partir de 395 a.C., os cidadãos que participavam da assembleia também adquiriam
o direito de receber um pagamento por sua presença. A ideia era que cidadãos de
menos posses pudessem assistir às reuniões e usufruir dos direitos políticos do mesmo
modo que os mais abastados (FUNARI, 2002).

Instaurada em Atenas após a queda dos tiranos, entre os anos 510 e 500
a.C., a democracia foi criticada por vários pensadores gregos, como Platão e
Aristóteles. Antes do período democrático, Atenas incorporou as seguintes
formas de governo: monarquia, oligarquia e tirania. Na monarquia, o rei
acumulava funções jurídicas, militares e religiosas. Posteriormente, com os
oligarcas, a autoridade real passou ao grupo aristocrático dos eupátridas e o
rei permaneceu apenas com atribuições religiosas. A tirania correspondeu
ao período em que o monarca, Pisístrato, e seus filhos tomaram o poder e se
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mantiveram nele por meio da atuação de soldados mercenários. Apenas com as


Guerras Médicas e a união da sociedade ateniense contra um inimigo comum,
os persas, foi possível consolidar o regime democrático (ROSSET, 2008).
Os fundamentos da democracia ateniense baseavam-se na igualdade (a
isonomia perante a lei), na liberdade (de votar, de ser votado e de se expressar)
e na construção de uma ideia de responsabilidade pela política, em que cada
cidadão era responsável pelo seu voto e por suas ações.
Veja o que afirma Rosset (2008, documento on-line):

Em Atenas, o cidadão exercia a democracia diretamente. O fundamento da


democracia ateniense era a igualdade de todos perante a lei. Bastava ser ci-
dadão para ter o direito de tomar parte nas decisões políticas, participar das
assembleias, fazer uso do direito da palavra, sentar-se no conselho e exercer
a maioria das magistraturas. Os cidadãos atenienses tinham fundamental-
mente três direitos democráticos: 1. liberdade individual; 2. igualdade de
todos os cidadãos perante a lei; 3. falar na assembleia. Apesar de ser direta,
a igualdade democrática ateniense era apenas teórica. Na prática, tratava-se
de uma democracia para poucos.

Como você viu, somente eram considerados cidadãos os homens livres e


nascidos de pais cidadãos atenienses. A mulher permaneceu sem o direito à
cidadania, assim como os estrangeiros e os escravizados. O exercício pleno da
democracia era realizado na assembleia e implicava uma dinâmica de debate,
de circulação de opinião e de exposição pública, além da elegibilidade, da
rotatividade, da anuência e da coesão social (LESSA, 2008).

AUSTIN, M.; VIDAL-NAQUET, P. Economia e sociedade na Grécia Antiga. Lisboa: Edições


70, 1972.
BARBOSA, M. T. Do antigo Oriente próximo a Roma: uma abordagem da antiguidade.
Guarapuava: Unicentro, 2009.
FINLEY, M. Economia e sociedade na Grécia Antiga. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
FLORENZANO, M. B. O mundo antigo: economia e sociedade. São Paulo: Brasiliense, 1994.
FUNARI, P. P. Grécia e Roma. São Paulo: Contexo, 2002. E-book.
GUIA geográfico. Mapa da Grécia. [S. l.: s. n., 201-?]. Disponível em: http://www.europa-
-mapas.com/grecia.htm. Acesso em: 7 jul. 2019.
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LESSA, F. de S. Democracia e esportes em Atenas. Synthesis, v. 15, 2008. Disponível


em: http://www.memoria.fahce.unlp.edu.ar/art_revistas/pr.3582/pr.3582.pdf. Acesso
em: 7 jul. 2019.
MOSSÉ, C. Dicionário da civilização grega. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.
ROSSET, L. A democracia ateniense: filha de sua história, filha de sua época. Revista de
Cultura Teológica, n. 64, jul./set. 2008. Disponível em: https://revistas.pucsp.br/culturateo/
article/view/15535/11601. Acesso em: 7 jul. 2019.
VERNANT, J.-P. As origens do pensamento grego. Rio de Janeiro: Difel, 1972.

Leituras recomendadas
CARDOSO, C. F. A cidade-estado antiga. São Paulo: Ática, 1993.
FINLEY, M. História antiga: testemunhos e modelos. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
FUNARI, P. P. A antiguidade clássica: a história e a cultura a partir dos documentos.
Campinas: Unicamp, 1995.
RAGO, M.; FUNARI, P. P. Subjetividades antigas e modernas. São Paulo: Annablume, 2008.
VERNANT, J.-P. Mito e pensamento entre os gregos: estudo de psicologia histórica. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
VEYNE, P. Acreditaram os gregos nos seus mitos? Lisboa: Edições 70, 1987.
VIDAL-NAQUET, P. O mundo de Homero. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

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