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Introdução
A historiografia sobre a Roma Antiga, abarcando os períodos monárquico,
republicano e imperial, está em constante renovação, apresentando
abordagens inovadoras e diferentes formas de interpretar dados ou fatos
já conhecidos. A história de Roma desperta um fascínio no grande público,
sendo tema de documentários, filmes, histórias em quadrinhos, séries,
entre outras tantas produções culturais. Como será que esses produtos
dialogam com a historiografia? Há uma coincidência nas interpretações
ou uma discrepância entre a ficção e a historiografia?
Neste capítulo, você vai estudar os aspectos geográficos do território
da Roma Antiga e ver como se deu o povoamento da região. Você tam-
bém vai aprender sobre os diferentes períodos históricos da Antiguidade
Romana, estabelecidos a partir de marcos políticos. Por fim, você vai
conhecer algumas especificidades sobre o período imperial e a expansão
de Roma, que envolveu conquistas e enfrentamentos com outros povos,
além de uma relação estreita com o mar Mediterrâneo.
Em seu poema épico Eneida, Virgílio afirma que os primeiros romanos descendiam de
Eneas, herói de Troia. Assim, quando os gregos destruíram Troia, em aproximadamente
1400 a.C., Eneas fugiu e chegou à Itália, onde fundou a cidade de Lavínio. Seu filho
Ascânio fundou Alba Longa e seus descendentes, Rômulo e Remo, fundaram Roma
em 753 a.C. De acordo com a lenda, Rômulo e Remo eram filhos gêmeos da princesa
albana Rea Sílvia e do deus Marte. Quando recém-nascidos, eles foram atirados ao rio
Tibre por ordem do rei Amúlio, usurpador do trono de Alba Longa. Amamentados
por uma loba e depois criados por camponeses, os irmãos retornaram a Alba Longa
e tomaram o trono de Amúlio, colocando Númitor em seu lugar. Depois disso, eles
receberam a missão de fundar Roma (ARRUDA, 1994).
A formação da Roma Antiga 3
Entre 753 a.C. e 509 a.C., Roma desenvolveu-se como cidade, e o latim
consolidou-se como língua corrente. Acredita-se que, em 509 a.C., os patrícios,
que eram os nobres romanos, revoltaram-se contra seus dominadores etruscos,
depondo os tarquínios, reis etruscos, e instaurando o regime republicano.
Brutus teria sido o líder da revolta e tornou-se o primeiro magistrado da nova
república (FUNARI, 2002). Uma das consequências do acúmulo de poder por
Roma foi a transformação da Península Itálica em um eixo de poder no mar
Mediterrâneo, disputando a hegemonia com os gregos e os persas.
Monarquia
Esse período se estende das origens de Roma (753 a.C.) à queda da realeza
(509 a.C.). As fontes históricas para o estudo desse momento são escassas,
com referências a reis lendários citados nas obras dos historiadores romanos
Tito Lívio e Virgílio.
Sabe-se que os reis acumulavam as funções executiva, judicial e religiosa,
mas seus poderes eram limitados por órgãos legislativos, como o Senado ou
Conselho de Anciãos, que podiam sancionar ou vetar as propostas apresentadas
pelo monarca. As leis eram corroboradas na Assembleia ou Cúria, formada
por todos os cidadãos em idade militar. As atividades econômicas, inclusive
a expansão comercial, coincidiu com o domínio etrusco, iniciado no século
VII a.C.
Nesse período, a sociedade romana estava dividia em três grupos sociais:
os patrícios, cidadãos de Roma, possuidores de terras e de gado, que consti-
tuíam a aristocracia romana; os plebeus, pessoas que pertenciam aos povos
conquistados por Roma, eram livres, mas não possuíam direitos políticos
universais; e os clientes, indivíduos subordinados a alguma família patrícia
(seus patronos), cumpridores de obrigações econômicas, morais e religiosas.
Existem divergências em relação ao término do período monárquico. Alguns
afirmam que a Monarquia terminou de forma abrupta, com uma sublevação
patrícia que depôs Tarquínio, o Soberbo, em 509 a.C. Outros defendem que
esse processo foi lento e teria se prolongado de 509 a 376 a.C.
República
A República Romana (do latim res publica, que significa, literalmente, “coisa
pública” ou “bem comum”) compreende o recorte temporal que vai do fim da
Monarquia, em 509 a.C., ao estabelecimento do Império Romano, em 27 a.C.
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Ainda de acordo com Funari (2002), por meio da luta dos plebeus, foram
obtidas outras conquistas, tais como a abolição da escravidão por dívidas, a
criação do cargo de tribuno da plebe — magistrado que defenderia os plebeus
com o poder de vetar medidas governamentais que prejudicassem a plebe —,
o reconhecimento de poderes da Assembleia da Plebe e a possibilidade de
casamentos entre nobres e plebeus, anteriormente proibidos.
Da mesma forma como ocorria com as mulheres gregas, as romanas não tinham o
direito de ocupar cargos no governo. Os cidadãos da República Romana se reuniam
em assembleias e escolhiam os tribunos da plebe. Estes eram magistrados que
tinham direito a veto sobre as decisões do Senado e dos outros magistrados. Os
romanos utilizavam a sigla SPQR (Senatus Populusque Romantis — O senado e o
povo de Roma) para se referir ao seu próprio Estado. Contudo, apenas formalmente
o poder estava dividido entre o Senado e o povo. Na prática, os senadores eram
muito influentes.
No geral, a cidadania romana era mais ampla e versátil do que a de Atenas. Por
exemplo, ex-escravos alforriados podiam se tornar romanos, mesmo que os plenos
direitos políticos só fossem adquiridos pelos filhos de libertos. Além disso, os romanos
concediam a cidadania a indivíduos aliados e até a comunidades inteiras. Para alguns
pesquisadores, esse tipo de flexibilidade é uma das causas do dinamismo romano.
Afinal, a incorporação de cidadãos possibilitou que os romanos se tornassem cada
vez mais numerosos (FUNARI, 2002).
Foi durante o período republicano que Roma iniciou a sua expansão por
meio de uma série de conquistas territoriais, primeiramente na Península Itálica
e depois nas orlas do mar Mediterrâneo. Com essa expansão, houve profun-
das modificações na vida cultural, econômica, política e social de Roma. As
conquistas se deram por meio de muitas batalhas e guerras, além de outras
dinâmicas mais diplomáticas.
Um dos marcos da expansão territorial foram as Guerras Púnicas, con-
fronto entre Roma e Cartago (os cartaginenses eram chamados de puni, isto
é, fenícios). Cartago era uma cidade-estado fenícia localizada no norte da
África que, desde o século III a.C., dominava o comércio no mar Mediterrâneo.
Os ricos comerciantes cartagineses possuíam diversas colônias no que hoje são
os territórios da Sicília, da Sardenha, da Córsega e da Espanha, bem como em
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toda a costa setentrional da África (você vai aprender mais sobre o expansio-
nismo de Roma na próxima seção).
O regime republicano entrou em crise no princípio do século I a.C., devido a
uma série de medidas inconstitucionais de Sila, que tomou a cidade de Roma com
seu exército, em 82 a.C., e se declarou governante vitalício. Posteriormente, Sila
renunciaria e devolveria o poder ao Senado, mas havia uma descrença em relação
ao sistema político. Essa crise deu origem aos triunviratos. O primeiro, composto
por César, Pompeu e Crasso. O segundo, por Otávio, Marco Antônio e Lépido.
Império
A expressão “Império Romano” é de uso corrente entre os historiadores e o grande
público. Mas o que ela designa? O Império compreenderia o período entre 27
a.C. e 476 d.C., mas também “[...] um vasto território, da Britânia ao Egito, da
Lusitânia à Síria. Além disto, engloba[ria] uma população de cerca de 60 milhões
de pessoas que se articulavam mediante as mais diversas formas de organização
política de caráter local e regional [...]” (FAVERSANI; JOLY, 2014, p. 10).
Por isso, a historiografia contemporânea tem relativizado essa expressão,
conforme explicam Faversani e Joly (2014, p. 10):
Castigada após tantas guerras civis, Roma adotou o regime imperial de governo.
Os imperadores tinham grandes poderes, mas não eram reis, nem a sucessão
era, necessariamente, hereditária. No período imperial, a administração dos
domínios romanos foi reorganizada, visando à maior centralização do poder; o
imperador passou a acumular todos os poderes apesar de continuarem a existir
os órgãos administrativos da República. O imperador era reverenciado e adorado
como um dos deuses romanos, daí sua enorme autoridade, derivada também do
temor que inspirava. No "período de paz", novas conquistas foram efetivadas e
as atividades econômicas e culturais ganharam grande impulso, surgindo novos
e portentosos edifícios, monumentos, aquedutos, pontes, circos e anfiteatros.
[...] para que se tenha uma ideia da importância dessas guerras, basta pensarmos
que antes da Primeira Guerra Púnica os romanos não haviam saído, ainda, da
Península Itálica, e ao final da Terceira Guerra já haviam submetido o norte
da África e a Península Ibérica e estavam dirigindo seus olhares para terras
mais distantes, como a Britannia (atual Inglaterra) e regiões mais orientais [...].
Púnica (264 a 241 a.C.), a Segunda Guerra Púnica (218 a 201 a.C.) e a Terceira
Guerra Púnica (149 a 146 a.C.).
Como você já viu, Cartago era uma cidade-estado fundada pelos fenícios
que possuía larga experiência comercial e marítima. A cidade controlava
boa parte do comércio realizado pelo mar Mediterrâneo. Seus domínios se
estendiam do norte da África, passando pelo oeste da Sicília, pela Sardenha
e pela Córsega, chegando até a Península Ibérica.
A Primeira Guerra Púnica foi declarada com a invasão e a conquista dos
romanos da colônia cartaginesa de Messina, na região da Sicília. Os romanos
saíram vitoriosos dos conflitos e conquistaram a Sicília, a Córsega e a Sarde-
nha. O segundo conflito teve origem a partir dos ataques empreendidos pelo
cartaginês Aníbal, que, partindo da Península Ibérica, que fora conquistada
por seu pai, Amílcar, foi vencendo os romanos em diferentes conflitos. Roma
contra-atacou investindo contra Cartago, o que obrigou Aníbal a mudar o
palco dos combates.
A derrota de Cartago significou a submissão a Roma, por meio do pa-
gamento de impostos e da proibição de se envolver em guerras. Ela também
possibilitou a Roma reconquistar a Península Ibérica. Já a Terceira Guerra Pú-
nica consistiu na invasão e na destruição da cidade de Cartago pelos romanos.
A cidade foi incendiada, e os sobreviventes, escravizados (GARRAFFONI, 2006).
Porém, nem todas as conquistas efetuadas pelos romanos foram feitas
por meio de conflitos e guerras. Muitas se deveram a alianças com os povos
vizinhos, permitindo o domínio de toda a Península Itálica, em um primeiro
momento. Veja:
Roma foi uma cidade que expandiu seu poder ao ponto de se tornar um
grande Império, com sua territorialidade presente por séculos em boa parte
da Europa Ocidental, além do norte da África e parte da Ásia. Suas táticas
de territorialização iam desde o inicial domínio militar até a utilização
das políticas de romanização, onde incluímos a introdução dos costumes
romanos como a religião, as tradições, numa clara tentativa de transfor-
mação dos povos sob o domínio de Roma em romanos. Entre essas táticas
existentes destacamos em nossos estudos a padronização da arquitetura e
o planejamento urbanístico das cidades construídas ou reconstruídas por
Roma (FREITAS, 2009, p. 61).
deles era vendida como escrava, enquanto outros davam ao Estado romano
rendas significativas em impostos e tributos.
Considere o que afirma Funari (2002, documento on-line):
O exército romano era profissional e permanente. Ele era formado pela população de
todo o Império. Isso incluía todos os cidadãos da Itália e das províncias, assim como
aqueles que não possuíam cidadania romana. Assim, a submissão do exército significava
a submissão de todos os habitantes do Império ao imperador (MENDES, 2007).
Leituras recomendadas
BROWN, P. O fim do mundo clássico. Lisboa: Verbo, 1972.
FINLEY, M. I. A economia antiga. Porto: Afrontamento, 1986.
FINLEY, M. I. Escravidão antiga e ideologia moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1991.
FUNARI, P. P. A antiguidade clássica: a história e a cultura a partir dos documentos.
Campinas: UNICAMP, 2003.
FUNARI, P. P. A. A cidadania entre os romanos. In: PINSKY, J.; PINSKY, C. B. (org.). História
da cidadania. São Paulo: Contexto, 2003. p. 49–76.
FUNARI, P. P. A.; SILVA, G. J.; MARTINS, A. (Org.). História antiga: contribuições brasileiras.
São Paulo: Annablume, 2008.
GUARINELLO, N. L. Imperialismo greco-romano. São Paulo: Ática, 1987.
SANTOS, M. C. P. Roma e o Mediterrâneo. NEARCO: Revista Eletrônica de Antiguidade,
v. 10, n. 1, p. 117–219, 2018.