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Introdução
Neste capítulo, você vai conhecer os fatores de ordem econômica, so-
cial, religiosa, militar e política que provocaram as crises sucessivas que
levaram à divisão do Império Romano. Tal divisão deu origem ao Império
Romano do Ocidente, com sede em Roma, e ao Império Romano do
Oriente, com sede em Constantinopla. Posteriormente, ocorreu o fim
do Império Romano Ocidental.
Também tiveram grande impacto nesse processo de divisão os povos
germânicos e “bárbaros”, com suas contínuas pressões, migrações e inva-
sões ao território romano. Por sua vez, o cristianismo exerceu influência
por meio do seu poderio crescente, provocando ações e reações tanto
de pagãos quanto de governantes.
Ao longo do capítulo, você ainda vai ver um novo recorte cronológico
que vem sendo discutido por historiadores e pesquisadores de diver-
sas áreas afins: a Antiguidade Tardia. Embora não totalmente definido
quanto à sua abrangência temporal, tal período situa-se, em geral, entre
os séculos II–IV e VIII d.C.
2 A transição para o medievo e o conceito de Antiguidade Tardia
Círculo vicioso
A dificuldade de encontrar e repor escravos para dar conta da produção neces-
sária à manutenção do Império foi uma de muitas situações que levaram ao
declínio da Roma Imperial. Outros fatores devem ser considerados no longo
prazo que vai do século III ao V a.C. As questões elencadas a seguir são ele-
mentos processuais que se intensificam em determinados períodos, reduzindo
o grau de sua importância em outros. Porém, todas em conjunto fazem parte
do processo de declínio e queda do Império Romano Ocidental. São elas:
Os povos germânicos
São chamados generalizadamente de “povos germânicos” um conjunto de
povos “bárbaros”, termo herdado dos gregos que fazia referência inicialmente
àqueles que não partilhavam a língua, os costumes e a civilização grega.
Apropriado pelos romanos, tal termo passou a designar povos (estabelecidos
ou nômades e seminômades) que viviam fora das fronteiras do Império, na
Ásia, na África ou no Norte Europeu. Numa situação de oposição nós-eles, os
“bárbaros” eram ou outros, estrangeiros, não assimilados, não “civilizados”,
considerando-se a óptica dos romanos (GUERRA, 1991).
forma gradual, a partir das áreas dos antigos limes. Elas foram resultado de
uma série de fatores:
Esses povos que estavam entre Roma e outros povos provenientes da Ásia,
como a federação dos hunos, foram migrando para dentro das fronteiras do
Império ao longo dos séculos. Aos poucos, foi ocorrendo uma integração entre
os povos bárbaros e o mundo romano. Tais povos começaram a fazer parte do
exército e da administração. Contudo, eram povos com costumes diferenciados,
incluindo seus aspectos políticos, sendo o caráter militar um dos mais típicos
diferenciais dos germânicos. Eles tinham técnicas avançadas de fabricação de
armas e também eram bons estrategistas. Dividiam-se em tribos comandadas
por um chefe com seu séquito de jovens guerreiros juramentados. Veja o que
afirma Guerra (1991, p. 18–19):
O mando estava nas mãos dos chefes hereditários ou dos ricos que se achavam
à cabeça de um importante comitatus. Criava-se assim um setor de pessoas
dependentes e um grupo de homens livres para o serviço das armas na guerra
e nas expedições de butim. O enriquecimento dos chefes favoreceu sua trans-
formação em proprietários. Deste setor, surgiu o grupo dirigente da formação
política, seja em uma espécie de principado ou em forma de monarquia. Foi
dessa nobreza que saíram os chefes do exército da época tardia.
Uma das novidades desta nova perspectiva e ponto fundamental para sua
consolidação como novo paradigma é a ascensão de um novo recorte crono-
lógico: a Antiguidade Tardia. Esta mudança na historiografia ainda não se
traduziu na nossa consciência histórica mais ampla, digamos, na memória
histórica do cidadão ocidental médio (quiçá na do brasileiro), mas teve, porém,
grande impacto nos especialistas.
14 A transição para o medievo e o conceito de Antiguidade Tardia
Essa é uma afirmativa bem realista. Levará tempo ainda para que a academia
e principalmente os livros didáticos se adequem às novas conformações crono-
lógicas, bem como para que os questionamentos e os conhecimentos produzidos
a partir desse novo paradigma sejam compartilhados amplamente. Como você
viu, Silva (2008) tem um ponto de vista diferente sobre o assunto, da mesma
forma que muitos outros pesquisadores. Assim, ainda levará tempo antes que
se chegue a um consenso aceito e internalizado pela maioria dos estudiosos.
O fato é que a mudança na cronologia não é uma mera modificação de
nomenclatura; ela implica um novo modo de pensar a história do período tardio
e de refletir sobre os acontecimentos dos períodos imediatamente anterior e
posterior a ele. O Império Romano não acabou em um dia como Hiroshima e
Nagasaki. Ele levou séculos nesse processo. Da mesma forma, a Idade Média
não começou no dia seguinte à deposição de Rômulo Augusto.
Nesse sentido, você deve levar em conta que todas essas divisões cronoló-
gicas são posteriores aos eventos, acordadas entre estudiosos e pesquisadores
de forma a permitir uma localização cronológica dos fatos e dos elementos
mais marcantes de cada período. O primeiro período, a Antiguidade Clássica,
permaneceu vivo no povo romano e, em parte, nos povos romanizados, bem
como na língua latina, em uma série de costumes e em elementos culturais que
estiveram presentes, pois estavam internalizados no ser e no fazer do povo do
Império Romano. A língua latina continuou a ser utilizada na administração
e no direito (por romanos, germânicos e padres). Nesse contexto, não se pode
deixar de lado a Igreja — uma instituição que tinha força e poder em Roma.
Afinal, as missas eram em latim, assim como os documentos episcopais e,
posteriormente, as bulas papais.
Ora, se uma coisa simples como utilizar uma pá para cavar trincheiras se torna tão
difícil, imagine o tempo que foi necessário às diversas populações que viveram em
diferentes períodos históricos para mudarem os seus hábitos mais internalizados.