Dissertação - Tópico: Em que condições o "princípio místico da mão invisível" (na
interpretação de Samuelson!) se aplica à organização social da economia?
Desde a primeira revolução industrial, com o seu característico recrudescimento
no poder de produção do homem, o caráter de subsistência do processo produtivo deu lugar à busca pelo excedente; à busca pelo lucro. Essa busca tornou-se central na escala individual do capitalismo, todavia, o efeito da mesma no que se refere à coletividade é passível de extensa discussão. Assim sendo, será feita, nesta dissertação, uma discussão quanto ao modo como a busca do homem pelo lucro afeta a interdependência entre agentes econômicos, tendo como base, o conceito da mão invisível do filósofo e economista britânico Adam Smith. Antes de dar início à argumentação, é premente elucidar o que o autor da dissertação quer dizer com a interdependência entre agentes econômicos e com o conceito da mão invisível. Respectivamente, essa ideia concerne a questão da organização social da economia, ou seja, se refere à importância da socialização do processo produtivo na otimização do uso de recursos – Adam Smith, no seu livro, Riqueza das Nações, considera a "divisão do trabalho", alicerçada na especialização do trabalhador e dependência entre diversos setores da sociedade, fundamental para a otimização da produção e, consequentemente, para o desenvolvimento econômico de uma nação. Quanto à ideia da mão invisível, para Adam Smith, a mesma é uma referência ao fato do mercador, enquanto na tentativa de satisfazer os seus próprios interesses, levar benefícios não propositais à sociedade – se pensarmos que os consumidores preferem consumir o que há de melhor no mercado, para que o comerciante lucre, ou seja, alcance o seu interesse próprio, é necessário que o mesmo forneça para o mercado o melhor produto possível. De modo incipiente, é importante ressaltar que a socialização do processo produtivo envolve, principalmente, três agentes: o dono do capital, o trabalhador, e o consumidor – o consumidor é considerado, pois o mesmo é a base do capitalismo, em outras palavras, sem ele não haveria a busca pelo lucro. No que tange esta discussão, será trabalhado o modo como o "princípio místico da mão invisível" influência a relação dono do capital-consumidor e dono do capital-trabalhador. Começando pela relação dono do capital-consumidor, a mesma é passível de mais fácil visualização, pois é evidente que o consumidor, na busca da sua satisfação, procura no mercado a melhor mercadoria existente, enquanto que o comerciante, também na busca da sua satisfação, busca oferecer a melhor mercadoria possível. Socialmente falando, a interdependência entre ambos, em um mercado competitivo – ou seja, sem influência de agentes externos -, tende a uma harmonia, pois estes têm interesses equivalentes. Isso é corroborado, pelo ilustre britânico, na sua obra Teoria dos Sentimentos Morais: "Por mais egoísta que se suponha o homem, evidentemente há alguns princípios em sua natureza que o fazem interessar-se pela sorte de outros, e considerar a felicidade deles necessária para si mesmo, embora nada extraia disso senão o prazer de assistir a ela." (Teoria dos Sentimentos Morais, 1759, p. 69). Desse modo, é exequível afirmar que o dono do capital, ao se interessar pela sorte do consumidor, considera a felicidade dele necessária para a sua própria - embora não seja possível afirmar que ele extraia nada da mesma. Entretanto, no que se refere a relação dono do capital-trabalhador, o modo como o conceito da mão invisível se aplica já contrasta com a relação supracitada quanto à sua simplicidade. Sendo mais específico, há dois modos em que isso se aplica: no contexto de estagnação intelectual da produção e no contexto de constante inovação produtiva. No contexto de estagnação intelectual da produção, tem-se uma relação indiretamente proporcional entre o lucro do comerciante e o salário do trabalho – na medida que um aumentar, o outro diminuirá -, pois, nesta conjuntura, o mercado de um produto, em função da impossibilidade de incrementar a sua qualidade, se torna altamente competitivo –que tem como consequência a diminuição dos lucros do mercador -, levando a uma alta demanda por mão-de- obra – o que leva a aumento nos salários. O exposto acima é ratificado pela seguinte parte do capítulo 9 de Riqueza das Nações, de Adam Smith: "O aumento do capital, o qual faz subir os salários, tende a baixar o lucro. Quando o capital de muitos comerciantes ricos é aplicado no mesmo negócio, naturalmente sua concorrência mútua tende a reduzir seus lucros; e quando há semelhante aumento de capital em todos os diversos ramos de negócio de uma mesma sociedade, a mesma concorrência produz necessariamente o mesmo efeito em todos eles." (A Riqueza das Nações, 1776, p. 137). Portanto, quando aplicado o conceito da mão invisível nesta situação, não é estabelecida uma relação social harmoniosa. Contudo, no contexto de constante inovação produtiva, tem-se uma relação diretamente proporcional entre o lucro do comerciante e o salário do trabalho, pois, dentro destas circunstâncias, há diminuição da competição nos mercados antigos – devido ao fato de, geralmente, a quantidade de capital disponível não ser suficiente para a máxima aplicação em todos os diferentes mercados – e devido à sua ínfima competição - de acordo com Smith, no livro Riqueza das Nações, " um monopólio, outorgado a um indivíduo ou a uma companhia de comércio, tem o mesmo efeito que um segredo comercial ou industrial." (A Riqueza das Nações, 1776, p. 114) -, o que significa afirmar que caso um modo inovador de produção ou uma nova mercadoria vier a se manter em segredo pelo homem mercante, haverá, por parte deste, uma vantagem competitiva, que lhe proporcionará consideráveis lucros. No que tange a posição do trabalhador, o seu salário, na medida em que há expansão nos setores de comércio da sua nação, se eleva, pois, geralmente, um aumento das áreas do comércio leva a um aumento na demanda de trabalhadores - é por esta razão que, para Adam Smith, no livro Riqueza das Nações, urge que em países cuja indústria cresce vertiginosamente haja um recrudescimento populacional. O exposto acima é ratificado pela seguinte passagem: "Embora a América do Norte não seja ainda tão rica como a Inglaterra, é muito mais progressista, avançando com rapidez muito maior para a aquisição de maiores riquezas. O indício mais claro da prosperidade de um país é o aumento do número de seus habitantes. Na Grã- Bretanha, e na maioria dos países europeus, supõe-se que a população necessita de no mínimo quinhentos anos para duplicar. Na América do Norte verificou-se que duplica em 20 ou 25 anos." (A Riqueza das Nações, 1776, p. 122). À vista do exposto acima, é possível afirmar que, caso haja uma proporcionalidade entre o desempenho do patrão e do trabalhador, o princípio da mão invisível é benéfico para esta relação social. Com base na argumentação desenvolvida acima, é exequível afirmar que o princípio da mão invisível pode ser considerado em diversas situações econômicas. Pode-se perceber que, sim, a relação salário-lucro não é exatamente de caráter antagônico, todavia, no mundo hodierno, sabemos que a situação que predomina é a do sexto parágrafo. Pode-se concluir, então, que a condição em que há uma harmoniosa organização social econômica intermediada pela busca do lucro é a de constante inovação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 - Smith, Adam. Teoria dos Sentimentos Morais. Tradução de Lya Luft. Revisão de Eunice Ostrensky. São Paulo: Martins Fontes: 1999. 2-Smith, Adam, Riqueza das Nações. Tradução de Luiz João Baraúna. Apresentação de Winston Fritsch. São Paulo: Nova Cultural: 1996.