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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2019.0000598619

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1006084-78.2017.8.26.0624, da Comarca de Tatuí, em que é apelante SOLUTUDO
MARCAS, ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÃO LTDA., é apelado EVANDRO
LUIZ ANANIAS.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 6ª Câmara de Direito Privado


do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram parcial
provimento ao recurso, para afastar a condenação da apelante ao pagamento de danos
morais, reduzidno-se o quantum fixado à título de danos materiais. A Relatora
originária, Des. Ana Maria Baldy, ficou vencida e declara. , de conformidade com o
voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RODOLFO


PELLIZARI, vencedor, ANA MARIA BALDY, vencida, VITO GUGLIELMI
(Presidente), PAULO ALCIDES E MARCUS VINICIUS RIOS GONÇALVES.

São Paulo, 31 de julho de 2019.

RELATOR DESIGNADO
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Apelação Cível - Digital


Processo nº 1006084-78.2017.8.26.0624
Comarca: 2ª Vara Cível de Tatuí
Magistrado: Dr. Rubens Peterson Neto
Apelante: Solutudo Marcas, Administração e Participação Ltda.
Apelado: Evandro Luiz Ananias
Voto nº 06589

Indenização por danos materiais e morais. Uso indevido de


imagem. Utilização de fotografia do autor em periódico
publicitário da ré de circulação gratuita, no Município de Tatuí,
sem a prévia e expressa autorização dele. Dever de indenizar
caracterizado. Danos materiais configurados. Redução, todavia,
do quantum arbitrado no primeiro grau. Sentença parcialmente
reformada. Recurso parcialmente provido, para afastar a
condenação em danos morais e reduzir o valor fixado a título
de danos materiais.

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a r.


sentença de fls. 72/75, proferida nos autos da “Ação Ordinária
Com Preceito Cominatório Cumuladamente Com Perdas e
Danos” (sic), ajuizada pelo recorrido, que julgou PROCEDENTE o
pedido inicial, para (i) condenar a ré ao pagamento, em favor do
autor, das quantias de R$9.370,00 a título de compensação pelos
danos morais sofridos, e R$50.000,00 referentes aos danos
materiais, ambos corrigidos de acordo com a Tabela Prática do
Tribunal de Justiça de São Paulo e acrescidos de juros de 1% ao
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mês, devidos a partir da citação, consoante artigo 405 do Código


Civil, além do pagamento das custas e despesas processuais e
honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor da
condenação.

Apela a requerida, alegando, preliminarmente,


cerceamento de defesa, tendo em vista a r. sentença ter sido
proferida sem que lhe fosse oportunizada a produção de provas
quanto à cessão das obras pelo autor à Prefeitura de Tatuí/SP.
Requer o acolhimento da prejudicial, para anular o julgado,
convertendo-se o feito em diligência para a produção a respectiva
prova.

No mérito, afirma não ter havido ofensa ao direito autoral,


por tratar-se de reprodução da obra em tamanho pequeno, sendo
que a fotografia não era, em si, o objeto principal do panfleto.
Rechaça a alegação de danos morais, diante da publicação de três
erratas em jornal local, sinalizando boa-fé e disposição de
solucionar o litígio administrativamente. Pugna, por fim, pelo
provimento do apelo.

Recurso tempestivo e processado.

É o relatório.

Ao contrário do que defende o apelante, não há violação ao


contraditório ou à ampla defesa quando não há exaurimento da
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instrução probatória.

A lei processual preceitua que ao juiz cabe determinar as


provas necessárias ao julgamento da lide, podendo dispensar, por
decisão fundamentada, a produção daquelas que entender como
inúteis ou meramente protelatórias, sem que isso implique em
cerceamento de defesa dos litigantes, notadamente por serem as
provas destinadas à formação do convencimento do julgador.

No caso, os elementos probatórios constantes dos autos


mostraram-se suficientes para a apreciação da demanda. Por isso,
considerando o princípio do livre convencimento motivado
sacramentado no artigo 371, do CPC/2015, com acerto o
Magistrado julgou a lide no estado em que se encontrava.

No mais, o recurso comporta parcial provimento.

O autor, fotógrafo independente, alega na petição inicial que


a ré, ora apelante, utilizou-se de duas fotografias de sua autoria em
catálogos contendo endereços e pontos turísticos por ela
distribuídos.

Em primeiro lugar, cumpre consignar que a obra fotográfica


encontra proteção legal na Lei n.º 9.610/1998 (Lei de Direito
Autoral), em seu artigo 7º, caput, inciso VII, e 24, inciso II. O
controle do uso da obra, por sua vez, encontra respaldo no artigo
29, inciso I, da lei em comento, de onde se conclui que, inexistindo
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arranjo promovido entre o autor da obra e quem a utiliza, a violação


de direitos autorais está configurada.

Em arremate, prevê o artigo 18 da Lei de Direitos Autorais


que “a proteção aos direitos de que trata esta independe de
registro”.

Pois bem.

A utilização da fotografia do autor sem sua devida


autorização gera o dever de indenizar.

Diante disso, pouco importa se a fotografia foi


disponibilizada em outro sítio eletrônico, porque isto não tem o
condão de autorizar, por si só, que a mesma seja divulgada a bel
prazer de qualquer pessoa ou empresa. Aliás, a disponibilidade das
obras é uma forma de o fotógrafo armazenar e organizar as
imagens por ele produzidas, ou seja, trata-se de um verdadeiro
portfólio digital, consistente na coleção do trabalho do artista para
sua divulgação e não de terceiros de forma indiscriminada.

As fotos em questão possuem identificação de autoria no


site da Prefeitura de Tatuí/SP, consoante documento acostado à fls.
25/32, logo, não poderia a apelante alegar desconhecimento,
utilizando-a como se provenientes de origem anônima.

E nesse sentido, o Colendo Superior Tribunal de Justiça:


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RECURSO ESPECIAL - DIREITOS AUTORAIS -


FOTOGRAFIAS - PROTEÇÃO LEGAL - PUBLICAÇÃO SEM
AUTORIZAÇÃO - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DO PERIÓDICO -
INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 103, DA LEI 9.610/98 - DANOS
MATERIAIS - CABIMENTO - CRITÉRIO OBJETIVO - ARTIGO 944,
DO CÓDIGO CIVIL - EXTENSÃO DO DANO MATERIAL - VALOR
USUALMENTE RECEBIDO PELO AUTOR DA OBRA ARTÍSTICA -
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL - AUSÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
I - O Superior Tribunal de Justiça não se presta à análise
de matéria constitucional, cabendo-lhe, somente, o exame de
questões infraconstitucionais, conforme determina o art. 105, III, da
Constituição Federal.
II - A proteção dos direitos autorais sobre fotografias está
expressamente assegurada, nos termos do inciso VII do art. 7 da
Lei 9.610/98.
(...)
VI - Recurso especial improvido. (REsp 1.158.390 RJ,
Rel. Min. Massami Uyeda, j. em 15.11.2011)

A situação fática, diferentemente do alegado pela


recorrente, não encontra respaldo no disposto no artigo 46, inciso
VIII, da Lei n.º 9.610/98:
“Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais:
VIII a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos
trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra
integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si
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não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a


exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo
injustificado aos legítimos interesses dos autores”.

Ora, a recorrente utilizou-se das fotografias do autor para


compor um “periódico”, cujo objetivo era divulgar os pontos
comerciais e turísticos da cidade, logo, não é possível dissocia-las
do objetivo primordial da revista. As fotos representam ferramenta
essencial para a divulgação pretendida, ou seja, imprescindíveis ao
contexto proposto pela publicação da ré.

Nunca é demais ressaltar que caso a apelante contratasse


um fotógrafo para ilustrar suas promoções turísticas teria
dispendido valor econômico.

Diante de tal panorama, inafastável o dever de indenizar,


aliás, tal obrigação subsiste mesmo com a publicação das erratas
em jornal local, porque tal atitude não afasta o dano causado ao
autor da obra, pois efetivamente utilizada sem sua autorização ou
atribuição dos créditos devidos.

Os danos materiais, portanto, estão demonstrados e, a


meu ver, devem ser ressarcidos no montante de R$1.000,00.
Referido valor mostra-se dentro dos ditames da razoabilidade e
proporcionalidade. Há que se considerar, ainda, que se trata de
periódico que circula em pequena cidade, no Município de Tatuí, e
de forma gratuita.
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Por fim, ante o acolhimento do apelo e o princípio da


sucumbência, inadmissível manter a sentença na parte em que
condenou integralmente a ré a arcar com as custas e verbas
sucumbenciais. Assim, com base no princípio da causalidade e da
sucumbência, fixo a sucumbência recíproca, uma vez que as partes
decaíram em partes proporcionais dos pedidos, nos termos
do artigo 86 do CPC: Se cada litigante for, em parte, vencedor e
vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as
despesas. Cada parte arcará com metade das custas e despesas
processuais além dos honorários da parte adversa, que ora fixo
em 20% sobre o valor em que sucumbiu o autor, em favor do
patrono da ré, e em 20% sobre o valor atualizado da
condenação, em favor do patrono do autor.

Para que não se alegue cerceamento do direito de


recorrer, dou por prequestionados todos os dispositivos legais
referidos na fase recursal, bastando que as questões tenham sido
enfrentadas e solucionadas no voto, como ocorreu, pois
“desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais”
(STJ EDCL. No RMS 18.205/SP, Rel. Min. Felix Fischer, j.
18.04.2006).

Pelo exposto, pelo meu voto, DOU PROVIMENTO


PARCIAL ao recurso e o faço para afastar a condenação por danos
morais, mantendo-se, no mais, os danos materiais agora fixados
em R$1.000,00.
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RODOLFO PELLIZARI
Relator Designado
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Apelação Cível nº 1006084-78.2017.8.26.0624

Apelante : Solutudo Marcas, Administração e Participação Ltda.


Advogado : Marcos Cesar Rodrigues (Fls: 55)
Apelado : Evandro Luiz Ananias
Advogado : Rubens Glauco Fundão Guimarães Mendes (Fls: 12)
Comarca: Tatuí
Voto nº 04603
ig

DECLARAÇÃO DE VOTO

Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c reparação por


danos materiais e morais que EVANDRO LUIZ ANANIAS move em face de
SOLUTUDO MARCAS, ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÃO LTDA. Aduz o
autor que é fotógrafo profissional e que fotografou pontos turísticos da cidade de
Tatuí/SP, por contratação da Prefeitura daquela cidade. Afirma que a requerida se
utilizou de suas fotografias em materiais publicitários (catálogos) com pontos turísticos,
endereços comerciais na cidade e propagandas, todavia, sustenta que a utilização de
duas de suas fotografias é indevida. Diante de tais fatos, o autor propôs a presente
demanda pleiteando indenização por danos morais no valor de 50 salários mínimos e
materiais no importe de R$ 100.000,00.

Contestação (fls. 37/54), pleiteando a substituição do polo


passivo pela franquia SOLUTUDO BRASIL FRANSCHISING LTDA ME, afirmando
a requerida tratar-se de apenas uma das unidades franqueadas. Preliminarmente,
pretende, ainda, a revogação da justiça gratuita concedida ao autor. No mérito, pugna
pela improcedência da demanda.

Réplica, fls. 68/71.


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Adveio a r. sentença que, julgando antecipadamente a lide,


acolheu parcialmente o pedido inicial para: 1) CONDENAR a ré ao pagamento, em
favor do autor, das quantias de R$ 9.370,00, a título de compensação pelos danos
morais sofridos, e R$ 50.000,00 referentes aos danos materiais, ambos corrigidos de
acordo com a Tabela Prática do Tribunal de Justiça de São Paulo e acrescidos de juros
de 1% ao mês, devidos a partir da citação, consoante artigo 405 do Código Civil. Ante a
sucumbência em maior parte, condenou o réu a arcar com o pagamento das custas,
despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em 20% sobre o valor da
condenação.

A requerida interpôs embargos de declaração (fls. 79/85),


que foram rejeitados, ante a pretensão infringente (fls. 89).

Inconformada, apela a requerida (fls. 91/106), objetivando


em síntese, o reexame e a reversão do julgado, aduzindo, preliminarmente, cerceamento
de defesa, tendo em vista a r. sentença ter sido prolatada sem a possibilidade de
produção de provas quanto à cessão das obras pelo autor à Prefeitura de Tatuí/SP.
Requer o acolhimento da prejudicial, para anular o feito, convertendo-o em diligência
para produção da respectiva prova. Ainda, pugna seja afastada a condenação imposta
pelo juízo em razão da interposição de embargos de declaração. No mérito, reafirma a
tese de não ofensa ao direito autoral, por tratar-se de reprodução da obra em tamanho
pequeno, sendo que a obra em si, não era o foco principal do panfleto produzido. Refuta
a aplicação de danos morais, ante a publicação de três erratas em jornal local, como
demonstração de boa-fé e disposição de solucionar o litígio administrativamente, ou
subsidiariamente, pretende a redução do quantum aplicado. No que pertine aos danos
materiais, justifica que o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo
estipulou (fls. 51) que o valor da foto é de R$ 347,16, sem importar o número de
tiragem, justificando que a condenação em R$ 50.000,00 é abusiva e implica em
enriquecimento sem causa.
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O recurso foi regularmente processado, decorrendo o


prazo sem apresentação de contrarrazões (fl. 111).

É o relatório.

Inicialmente, a preliminar recursal arguida pela apelante,


de ausência de fundamentação lógica, deve ser afastada, uma vez que a r. sentença
articulou todas as razões que levaram à formação do entendimento do Magistrado na
forma prolatada.

De fato, o Juízo de origem indicou adequadamente os


motivos que lhe formaram o convencimento, analisando de forma clara e precisa as
questões relevantes do processo e solucionando a controvérsia com a aplicação do
direito que entendeu cabível à hipótese.

Lembra-se, a propósito, que o juiz da causa não está


obrigado a responder a toda e qualquer indagação das partes, mas tão só àquelas
“capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador”, consoante estabelece
claramente o artigo 489, § 1º, inciso IV, do Código de Processo Civil1.

Nesse sentido:

SENTENÇA. NULIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO.


OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. HIPÓTESE DE DECISÃO OBJETIVA
E SUCINTA, PORÉM SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADA.
PRELIMINAR REJEITADA. SEGURO. PLANO DE SAÚDE.
PEDIDO DE CUSTEIO DE MEDICAMENTO NECESSÁRIO AO
TRATAMENTO INDICADO À PATOLOGIA QUE ACOMETE A
AUTORA. ALEGAÇÃO DE QUE O MEDICAMENTO É
IMPORTADO E NÃO GOZA DE REGISTRO JUNTO À ANVISA.
JURISPRUDÊNCIA DO STJ E DO TJSP, TODAVIA, QUE VÊM SE
ORIENTANDO PELO RECONHECIMENTO DA ABUSIVIDADE
DAS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO DE COBERTURA NESSA
1
Art. 489. São elementos essenciais da sentença:
§ 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou
acórdão, que:
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão
adotada pelo julgador;
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HIPÓTESE. PRECEDENTES DO STJ E SÚMULAS Nº. 100 E 102


DO TJ/SP. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.(TJSP -
Apelação nº 1019735-51.2014.8.26.0506 - Relator(a): Vito
Guglielmi; Comarca: Ribeirão Preto; Órgão julgador: 6ª Câmara de
Direito Privado; Data do julgamento: 15/02/2017; Data de registro:
15/02/2017).

Cabe ressaltar, ainda, que a adoção de fundamento


contrário ao preconizado pela apelante não constitui falha de fundamentação a ensejar a
pretendida nulidade do julgado.

Não há como falar, portanto, em prestação jurisdicional


lacunosa ou deficitária apenas pelo fato de a sentença recorrida ter decidido em sentido
contrário à pretensão da ré/recorrente.

Ademais, a decisão que rejeitou os embargos


declaratórios, ao contrário do que alegado, não ofende o princípio do contraditório e da
ampla defesa, uma vez que, conforme assinalado pelo Juízo 'a quo', a insurgência quanto
ao contido na sentença deve ser manifestada no recurso de apelação, quando ausentes os
requisitos do artigo 1.022 do CPC.

Da mesma forma, deve ser afastada a preliminar de


cerceamento de defesa, ante o julgamento antecipado da lide.

Como é sabido, a prova se destina, de maneira precípua,


ao magistrado, a quem cabe, com absoluta exclusividade, o exercício de um prévio juízo
de verossimilhança, relevância e pertinência acerca de cada um dos requerimentos para
produção de provas, independentemente de impugnação pela parte contrária.

Nesse sentido, o Código de Processo Civil admite que o


magistrado julgue antecipadamente a lide se entender que as questões fáticas se
encontram suficientemente demonstradas, conforme dispõe o artigo 355:

Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo


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sentença com resolução de mérito, quando:


I - não houver necessidade de produção de outras provas;

E ainda, de acordo com o art. 370, parágrafo único, do


CPC, cabe ao juiz determinar as provas pertinentes para à instrução do feito, indeferindo
aquelas inúteis ou protelatórias.

In casu, a produção da prova requerida (contrato com a


Prefeitura de Tatuí/SP) se mostra desnecessária e nada acrescentaria aos autos, vez que,
somente afastaria o dever de indenizar a prova de que o município teria cedido à
apelante os direitos da obra, posto que os cessionários, adquirindo os direitos do autor
original, podem voltar a cedê-los a terceiros, em nada influenciando, na hipótese, o
contrato de cessão original, que teria sido formulado em favor da prefeitura e não da ora
apelante.

Incontestável, assim, que os autos encontravam-se


suficientemente instruídos, dando condições para que o magistrado formasse seu
convencimento, razão pela qual os argumentos deduzidos pela ré para anular a r.
sentença não podem ser admitidos, sendo de rigor a rejeição da preliminar.

Quanto ao mérito, entendo que o recurso deveria ser


provido em parte nos termos que se seguem.

É sabido que as fotografias constituem obras intelectuais


que usufruem de proteção especifica, nos termos do artigo 7º, VII2, da Lei 9.610/98, lei
que regula os direitos autorais.

O artigo 18 do mesmo diploma legal, assegura proteção


jurídica ao titular da obra intelectual, independentemente de seu registro.

2
Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou
fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como:
(...)
VII - as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia;
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No caso dos autos, ainda que não se tenha discutido se a


obra do autor encontra-se registrada perante a Biblioteca Nacional através de seu
Escritório de Direitos Autorais, ainda assim resta resguardada sua proteção autoral,
tendo em vista que tal medida visa meramente a declaração de direito autoral sobre
obra, não tendo natureza constitutiva e, na hipótese dos autos, não se discute a autoria
das fotografias, fato incontroverso nos autos.

Desse modo, a utilização da fotografia do autor sem a


autorização do mesmo, gera o dever de indenizar.

Ressalte-se que o fato das imagens estarem disponíveis na


rede mundial de computadores não tem o condão de autorizar a utilização da fotografia
indiscriminadamente por qualquer pessoa ou empresa, já que as fotografias possuem
identificação de autoria no site eletrônico da Prefeitura de Tatuí/SP (fls. 25/32), o que
demonstra que a apelante tinha pleno conhecimento da autoria das imagens utilizadas.

Assim, em consonância ao entendimento da douta maioria,


entendo que a mera utilização indevida da fotografia caracteriza o dever da ré de
indenizar o autor.

Nesse sentido já decidiu esta Câmara:

APELAÇÃO RESPONSABILIDADE CIVIL INDENIZAÇÃO POR


DANOS MATERIAIS E MORAIS DIREITO AUTORAL
FOTOGRAFIA UTILIZADA EM PÁGINA DE REDE SOCIAL PARA
PROMOVER PACOTE TURÍSTICO. CONFIGURAÇÃO DE DANOS.
Autoria do projeto comprovada. Obra registrada. Proteção legal da
Lei no. 9.610-1998 arts 7º "caput", VII e 24º, II, bem como o
controle do uso de obra, "LDA", art. 29, I Diante da inexistência de
arranjo promovido entre o autor da obra e quem a utiliza, a violação
de direitos autorais resta configurada Disponibilidade em sítio
eletrônico de armazenamento de fotos acessível ao público que não
tem o condão de autorizar, por sí só, a divulgação por qualquer
pessoa ou empresa Finalidade de exposição que se equipara ao
portifólio do artista Desnecessidade de outras provas, haja vista
que a simples utilização indevida da foto pelas recorrentes gera o
dever de indenizar Aplicabilidade do art. 371 do CPC Elementos
constantes dos autos que mostraram-se suficientes para a apreciação
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da lide Princípio do Livre Convencimento do Juiz APELAÇÃO


RESPONSABILIDADE CIVIL INDENIZAÇÃO POR DANOS
MATERIAIS E MORAIS DIREITO AUTORAL ARBITRAMENTO
Valores arbitrados que encontram-se dentro dos ditames da
razoabilidade e proporcionalidade APELAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL ARBITRAMENTO DE
HONORÁRIOS - Fixação dentro dos limites impostos pelo art. 85
parágrafo, 2º do Código de Processo Civil Sentença integralmente
mantida. RECURSO IMPROVIDO.
(TJSP; Apelação 1046283-79.2015.8.26.0506; Relator (a): Rodolfo
Pellizari; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado; Foro de
Ribeirão Preto - 7ª Vara Cível; Data do Julgamento: 02/08/2018;
Data de Registro: 02/08/2018)

Direito autoral Fotografia Uso sem autorização e sem atribuição


de créditos autorais Danos morais caracterizados Indenização
majorada Danos materiais O uso sem remuneração enseja o
pagamento de indenização, uma vez que serviço efetivamente
prestado pelo fotógrafo e usufruído pelo contrafeitor Valor da
indenização a ser apurado em liquidação de sentença, ocasião em
que se verificará a verdadeira expressão econômica da obra para a
hipótese em tela Recurso parcialmente provido.
(TJSP; Apelação 1031696-86.2014.8.26.0506; Relator (a): Eduardo
Sá Pinto Sandeville; Órgão Julgador: 6ª Câmara de Direito Privado;
Foro de Ribeirão Preto - 3ª Vara Cível; Data do Julgamento:
16/01/2017; Data de Registro: 16/01/2017)

Ressalte-se que a situação dos autos não se encaixa no


disposto no artigo 46, inciso VIII, da Lei 9610/98 como pretende fazer crer a apelante.

Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais:


VIII - a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de
obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral,
quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o
objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração
normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos
legítimos interesses dos autores.

Na espécie, o material publicitário produzido objetivava a


divulgação de comércios e pontos de atrações turísticos da cidade de Tatuí/SP, sendo as
fotografias utilizadas especificamente de pontos turísticos, não havendo como se
afirmar que a reprodução das fotografias do autor não eram o foco principal do panfleto,
o qual, ainda que tenha sido distribuído gratuitamente, possuía claramente cunho
comercial, ante as propagandas de endereços comerciais da cidade.

Assim, os fins e objetivos dos panfletos eram a divulgação


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da cidade (tratando-se as fotografias especificamente de pontos turísticos) e o


auferimento de lucro (propagandas de endereços comerciais), o que excepciona a
aplicação do artigo 46, da Lei dos Direitos Autorais.

Nesse sentido, ensina JOSÉ CARLOS COSTA NETTO,


E. Desembargador deste Tribunal de Justiça:

“Finalmente, 'inclusão' de obra intelectual em outra obra ou produto


vai merecer tratamento jurídico semelhante ao da sincronização.
Nesses casos não há, propriamente, uma 'sincronização' (de sons e
imagens, por exemplo), mas sim o ato de a obra intelectual ser
incluída no todo ou em parte, em determinado contexto: como música
de abertura de um programa de rádio, por exemplo, como um verso
ou estrofe de um poema em um outdoor publicitário, uma obra
fotográfica que ilustre um artigo escrito para uma revista e outras
situações do gênero. Naturalmente, a exemplo das outras
modalidades de utilização de obra intelectual, não prescindirão de
autorização prévia dos respectivos titulares de direitos autorais.”.
Direito Autoral no Brasil. 2ª ed. São Paulo: FTD, 2008, p. 150.

Reconhecido o dever de indenizar, cabe a análise do valor


da indenização a título de danos materiais e morais e, nesse ponto, ouso discordar, com
o devido respeito, do nobre Relator Designado.

O autor, indicou que a tiragem feita pela ré foi de 15.000


exemplares, postulando indenização por danos materiais baseado na tiragem do material
publicitário com duas fotografias de sua autoria no valor de R$ 100.000,00(fls. 10/11), o
que resultou em condenação da requerida no valor de R$ 50.000,00 pela r. sentença
guerreada.

Entendo que o quantum indenizatório comporta reforma,


posto que foge aos parâmetros tanto do mercado, quanto da atual jurisprudência
aplicada em casos similares, resultando em inequívoco enriquecimento sem causa da
parte autora.

A jurisprudência deste E. Tribunal de Justiça tem


entendido que, em casos similares, fotógrafos auferem em média R$ 1.500,00 por
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imagem comercializada, independente do número de tiragens (apelações nº


1025055-48.2015.8.26.0506; 1023792-10.2017.8.26.0506; 1019558-19.2016.8.26.0506;
1025090-08.2015.8.26.0506 e 1046283-79.2015.8.26.0506).

Desse modo, fixaria em R$ 3.000,00 o valor a ser pago


pela requerida a título de dano material, pela utilização das fotografias, corrigido
pela Tabela Prática do TJ e com juros de mora de 1% ao mês a partir do evento
danoso, ou seja, a partir da divulgação do material (janeiro/2017).

Entendo que a publicação desautorizada também


importa em dano moral, já que decorrentes da violação do direito autoral, a teor do
disposto no artigo 108 da Lei de Direitos Autorais.

Assim, deveria a apelada responder por sua conduta,


impondo-lhe indenização pela reparação moral, contudo, entendo que o quantum fixado
também comportaria redução, devendo ser fixado no montante de R$ 5.000,00, valor
que mais se adequa aos precedentes jurisprudenciais em casos semelhantes, a ser
corrigido monetariamente desde a sua fixação pela r. sentença (Súmula 362 do Superior
Tribunal de Justiça) e com juros de mora de 1% ao mês a contar do evento danoso
(janeiro/2017), data da divulgação das imagens (Súmula 54 do Superior Tribunal de
Justiça).

À propósito:

DIREITO AUTORAL Fotografia de paisagem usada em website de


publicação sem autorização Revelia Ausência de dúvida quanto à
autoria da obra - Proteção prevista na Lei n. 9610/98 Contrafação
Direito autoral violado Desnecessidade de registro prévio, o qual
tem caráter meramente declaratório Determinação para publicação
do crédito da fotografia e, após, sua retirada do website
Condenação em danos materiais, pelo valor de comercialização da
obra, e morais, estimada a indenização em R$ 5.000,00
Desnecessidade de publicação em jornais de grande circulação, em
vista da presumida circulação modesta da revista eletrônica -
Recurso provido em parte.
(TJSP; Apelação 1025090-08.2015.8.26.0506; Relator (a): Mônica
de Carvalho; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

de Ribeirão Preto - 8ª Vara Cível; Data do Julgamento: 08/08/2018;


Data de Registro: 09/08/2018)

DIREITO AUTORAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C.


REPARAÇÃO DE DANOS. Utilização de fotografia na reportagem de
pontos turísticos. Disponibilização do conteúdo em rede social.
Subsistência, ao tempo da divulgação, de registro da obra na
Biblioteca Nacional. Autoria incontestável. Contrafação configurada.
Indenização devida. Danos materiais estabelecidos em R$-1500,00.
Apontamento de valores, pelo demandante, que não recebeu a devida
impugnação. Danos morais, outrossim, ex lege. Precedentes. Verba
estabelecida em R$-5000,00. Excesso não apontado em sede recursal.
Impossibilidade de alteração desse montante. Vedação à reformatio
in pejus. APELO DESPROVIDO.
(TJSP; Apelação 1036791-49.2017.8.26.0100; Relator (a): Donegá
Morandini; Órgão Julgador: 3ª Câmara de Direito Privado; Foro
Central Cível - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 24/07/2018; Data
de Registro: 26/07/2018)

Ressalte-se, finalmente que, na hipótese, já foi realizada


pela requerida três publicações em jornal de grande circulação informando sobre a
autoria da obra (fls. 61/63).

Do exposto, pelo meu voto, DARIA PARCIAL


PROVIMENTO AO RECURSO, reduzindo as indenizações pelo uso indevido das
fotografias para R$ 3.000,00 a título de danos materiais e R$ 5.000,00 a título de
danos morais, atualizados e com juros de mora nos termos da fundamentação
acima.

ANA MARIA BALDY


Relatora Vencida
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Este documento é cópia do original que recebeu as seguintes assinaturas digitais:

Pg. inicial Pg. final Categoria Nome do assinante Confirmação


1 9 Acórdãos RODOLFO PELLIZARI CFF851A
Eletrônicos
10 19 Declarações de ANA MARIA ALONSO BALDY CB1F8CD
Votos

Para conferir o original acesse o site:


https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, informando o processo
1006084-78.2017.8.26.0624 e o código de confirmação da tabela acima.

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