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Supremo Tribunal Federal

Ementa e Acórdão

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07/04/2015 PRIMEIRA TURMA

AG.REG. NO HABEAS CORPUS 124.677 SÃO PAULO

RELATOR : MIN. ROBERTO BARROSO


AGTE.(S) : WINSTON JOSÉ TRISTÃO OU WISNTON JOSÉ
TRISTÃO
ADV.(A/S) : PEDRO HENRIQUE MENEZES NAVES E
OUTRO(A/S)
AGDO.(A/S) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EMENTA:PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS


CORPUS. DELAÇÃO ANÔNIMA. TRANCAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL.
AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER.
1. O julgamento monocrático do habeas corpus pelo Ministro Relator,
na linha da jurisprudência da Corte, não viola o princípio da
colegialidade. Precedentes.
2. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal consolidou
entendimento no sentido da inadmissibilidade do uso do habeas corpus em
substituição ao recurso ordinário previsto na Constituição Federal.
3. Hipótese em que a mera instauração formal do inquérito policial
não acarretou restrição a direito constitucionalmente protegido do
paciente, limitando-se a polícia judiciária à adoção de providências
preliminares para averiguar a idoneidade da delação anônima.
Precedentes.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da


Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência da
Ministra Rosa Weber, na conformidade da ata de julgamento e das notas
taquigráficas, por maioria de votos, em negar provimento ao agravo
regimental, nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro Marco
Aurélio, que o provia.
Brasília, 07 de abril de 2015.

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Ementa e Acórdão

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HC 124677 AGR / SP

MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO - RELATOR

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Relatório

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07/04/2015 PRIMEIRA TURMA

AG.REG. NO HABEAS CORPUS 124.677 SÃO PAULO

RELATOR : MIN. ROBERTO BARROSO


AGTE.(S) : WINSTON JOSÉ TRISTÃO OU WISNTON JOSÉ
TRISTÃO
ADV.(A/S) : PEDRO HENRIQUE MENEZES NAVES E
OUTRO(A/S)
AGDO.(A/S) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

RE LAT Ó RI O

O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (RELATOR):

1. Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão


monocrática de minha lavra que negou seguimento a este habeas corpus,
com apoio nos seguintes fundamentos:

(i) a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal não


admite o uso da ação de habeas corpus em substituição ao
recurso ordinário previsto na Constituição Federal (v.g HC
109.956, Rel. Min. Marco Aurélio, e HC 104.045, Rel.ª Min.ª Rosa
Weber);

(ii) a inocorrência de ilegalidade flagrante ou abuso de


poder impede a concessão da ordem de ofício, tendo em vista
que “o inquérito policial deflagrado a partir da delação apócrifa se
limitou a ordenar a realização de diligências que poderiam ser – e
possivelmente seriam – livremente determinadas sem a formalização
da investigação; que o inquérito em comento não culminou em
nenhuma medida cautelar em desfavor do paciente – tais como, prisão
cautelar, busca e apreensão e interceptação telefônica – e que nem
sequer houve indiciamento, afigura-se excesso de formalismo
proclamar, no caso, a ilegalidade da deflagração do Inquérito Policial
n. 09/2009”.

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2. O Ministério Público do Estado de São Paulo recebeu, por


meio de formulário próprio contido na página oficial do Grupo Especial
de Delitos Econômicos (GEDEC) na internet, mensagem eletrônica
contendo delação apócrifa “relatando a suposta prática de crime de lavagem
de dinheiro e exploração de jogos de azar”, supostamente praticado pelo ora
paciente.

3. Em 29.07.2009, o Promotor de Justiça encaminhou ofício à


autoridade policial “para conhecimento e as providências que julgar cabíveis”.

4. Diante disso, o Delegado de Polícia instaurou Inquérito


Policial “destinado a apurar crime de Lavagem de Dinheiro, em tese imputado a
Windston José Tristão, figurando como vítima (s) o Estado”.

5. No dia 24.09.2009, o paciente prestou declarações à Polícia,


havendo negado qualquer envolvimento com os fatos investigados.

6. Apontando o Delegado de Polícia como autoridade


coatora, a defesa impetrou habeas corpus perante o Juiz de primeiro grau,
postulando o trancamento do inquérito policial. A ordem foi denegada.

7. Contra essa decisão, a defesa impetrou habeas corpus


perante o TJ/SP. Oportunidade em que a ordem foi parcialmente
concedida para “vedar quaisquer indiciamentos que não tenham sido
motivadamente determinados pelo Órgão do Poder Judiciário...”

8. Não obstante a concessão parcial da ordem no TJ/SP, foi


impetrado novo habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça. O pedido
não foi conhecido pela Quinta Turma do STJ, por inadequação da via
processual, e a ordem não foi concedida de ofício, vencido o Ministro
Jorge Mussi. O Ministro Marco Aurélio Bellizze foi designado redator
para o acórdão.

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9. Neste habeas corpus, a parte impetrante reitera o pedido


para que seja determinado o trancamento do Inquérito Policial nº 09/2009
instaurado contra o paciente. Alega, em síntese, que há precedentes do
STF e do STJ, no sentido de que não é admissível a instauração de
inquérito policial com base em denúncia anônima.

10. Indeferida a liminar, a Procuradoria-Geral da República,


em parecer da Dra. Deborah Macedo Duprat de Britto Pereira, opinou
pela denegação da ordem.

11. Diante dos poderes conferidos ao relator – tanto no art. 21,


§ 1º, do RI/STF quanto no art. 38 da Lei nº 8.038/90 – não conheci do
habeas corpus, com apoio nos fundamentos já referidos.

12. A parte agravante alega, em síntese, o seguinte:

(i) a decisão agravada, unipessoal, incorreu em equívoco


por ofensa ao princípio da colegialidade;
(ii) a instauração formal do inquérito policial, com apoio
exclusivo em delação apócrifa, “implicou desrespeitar a
privacidade do aqui paciente”, em clara ofensa ao art. 5º, IV, da
CF/88;
(iii) nos termos do art. 102, I, “i”, o Supremo Tribunal
Federal é competente para conhecer e julgar este habeas corpus.

13. Com essa argumentação, a defesa pede para que seja


reconsiderada a decisão agravada, com a submissão do caso ao Colegiado
competente. No mérito, requer a concessão da ordem para que seja
trancado o Inquérito Policial nº 09/2009.

14. É o relatório.

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VOTO

O SENHOR MINISTRO LUÍS ROBERTO BARROSO (RELATOR):

1. O agravo regimental não merece provimento.

2. Começo pela consideração de que o julgamento


monocrático da causa não configura equívoco ou ofensa ao princípio da
colegialidade. Seja porque se trata de prerrogativa conferida ao Relator da
causa mediante previsão legal expressa (art. 38 da Lei nº 8.038/90; arts. 21,
§ 1º, e 192 do RISTF; art. 557 do CPC 1), seja porque esse entendimento

1 Lei nº 8.038/90 :
“Art. 38 - O Relator, no Supremo Tribunal Federal ou no Superior Tribunal de Justiça,
decidirá o pedido ou o recurso que haja perdido seu objeto, bem como negará seguimento a
pedido ou recurso manifestamente intempestivo, incabível ou, improcedente ou ainda, que
contrariar, nas questões predominantemente de direito, Súmula do respectivo Tribunal.”
RI/STF:
“Art. 21. São atribuições do Relator:[...] § 1º¹ Poderá o(a) Relator(a) negar seguimento a
pedido ou recurso manifestamente inadmissível, improcedente ou contrário à jurisprudência
dominante ou a Súmula do Tribunal, deles não conhecer em caso de incompetência
manifesta, encaminhando os autos ao órgão que repute competente, bem como cassar ou
reformar, liminarmente, acórdão contrário à orientação firmada nos termos do art. 543-B do
Código de Processo Civil.”
“Art. 192. Quando a matéria for objeto de jurisprudência consolidada do Tribunal, o Relator
poderá desde logo denegar ou conceder a ordem, ainda que de ofício, à vista da
documentação da petição inicial ou do teor das informações.”
CPC:
“Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível,
improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante
do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.”

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Voto - MIN. ROBERTO BARROSO

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decorre da pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Veja-se,


nessa linha, trecho do voto proferido pelo Ministro Celso de Mello, no
julgamento do HC 113.655-AgR:

“[...] Registro, preliminarmente, que se mostra


inacolhível o pedido de sustentação oral formulado pelo ora
agravante, eis que se revela inadmissível, em sede de recurso
de agravo (agravo interno ou “agravo regimental”), a
possibilidade de sustentação oral, em razão de expressa
proibição inscrita no § 2º do art. 131 do Regimento Interno
desta Suprema Corte, constante de preceito cuja validade
constitucional já foi confirmada, inúmeras vezes, sob a égide
da Constituição de 1988, por este Tribunal (RTJ 158/272-273 –
HC 91.765-MC-AgR/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO):
[...]
Passo a examinar, desse modo, a postulação recursal em
causa. E, ao fazê-lo, entendo não assistir razão à parte ora
agravante, eis que a decisão impugnada na presente sede
recursal, além de haver sido proferida por órgão judiciário
competente (o Relator da causa, na espécie), ajusta-se, com
absoluta fidelidade, ao magistério jurisprudencial desta
Suprema Corte.
Cabe ressaltar, por necessário, que o Supremo Tribunal
Federal, mediante edição da Emenda Regimental nº 30, de 29 de
maio de 2009, delegou expressa competência ao Relator da
causa, para, em sede de julgamento monocrático, denegar ou
conceder a ordem de “habeas corpus”, “ainda que de ofício”, desde
que a matéria versada no “writ” em questão constitua “objeto de
jurisprudência consolidada do Tribunal” (RISTF, art. 192, “caput”,
na redação dada pela ER nº 30/2009).
Ao assim proceder, fazendo-o mediante interna
delegação de atribuições jurisdicionais, esta Suprema Corte,
atenta às exigências de celeridade e de racionalização do
processo decisório, limitou-se a reafirmar princípio consagrado
em nosso ordenamento positivo (RISTF, art. 21, § 1º; Lei nº
8.038/90, art. 38; CPC, art. 544, § 4º) que autoriza o Relator da

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causa a decidir, monocraticamente, o litígio, sempre que este


referir-se a tema já definido em “jurisprudência dominante” no
Supremo Tribunal Federal.
Por certo, tampouco procede a alegação de que essa
orientação implicaria transgressão ao princípio da
colegialidade, eis que o postulado em questão sempre restará
preservado ante a possibilidade de submissão da decisão
singular ao controle recursal dos órgãos colegiados no âmbito
do Supremo Tribunal Federal, consoante esta Corte tem
reiteradamente proclamado (RTJ 181/1133-1134, Rel. Min.
CARLOS VELLOSO – AI 159.892-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE
MELLO, v.g.).
A legitimidade jurídica desse entendimento decorre da
circunstância de o Relator da causa, no desempenho de seus
poderes processuais, dispor de plena competência para exercer,
monocraticamente, o controle das ações, pedidos ou recursos
dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, justificando-se, em
consequência, os atos decisórios que, nessa condição, venha a
praticar (RTJ 139/53 – RTJ 168/174-175 – RTJ 173/948), valendo
assinalar, quanto ao aspecto ora ressaltado, que este Tribunal,
em decisões colegiadas (HC 96.821/SP, Rel. Min. RICARDO
LEWANDOWSKI – HC 104.241-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE
MELLO), reafirmou a possibilidade processual do julgamento
monocrático do próprio mérito da ação de “habeas corpus”,
desde que observados os requisitos estabelecidos no art. 192 do
RISTF, na redação dada pela Emenda Regimental nº 30/2009
[...]”

3. Nessa mesma linha de orientação, confiram-se os seguintes


precedentes: RHC 119.231-AgR, Rel.ª Min.ª Cármen Lúcia; HC 101.450-
AgR, Rel. Min. Celso de Mello; HC 123.250-AgR, Rel. Min. Luís Roberto
Barroso; e HC 122.257-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli.

4. Nessas condições, não cabe falar em “equívoco” no


julgamento monocrático da causa, até mesmo pelo fato de que os dois
precedentes da Segunda Turma que foram mencionados pela defesa (HC

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116.218, Rel. Min. Gilmar Mendes; e HC 120.774, Rel. Min. Ricardo


Lewandowski) não se aplicam ao caso concreto, tendo em vista que
discutiram a atuação individual de Ministro do Superior Tribunal de
Justiça, não de Ministro do Supremo Tribunal Federal.

5. Constatada a legitimidade jurídica do julgamento


monocrático do processo pelo Relator da causa no STF, passo a
demonstrar os motivos pelos quais se me afiguram corretos os demais
fundamentos da decisão agravada.

6. Com o julgamento do HC 109.956, em 14.08.2012, da


relatoria do Ministro Marco Aurélio, esta Primeira Turma passou a
considerar inadequada a utilização da ação constitucional do habeas
corpus em substituição ao recurso ordinário de que trata o art. 102, II, a, da
CF/88. Nessa mesma linha, vejam-se, entre outros, o HC 118.568, Rel.ª
Min.ª Rosa Weber; o HC 110.055, Rel. Min. Marco Aurélio; o HC 106.158,
Rel. Min. Dias Toffoli; o HC 114.932, Rel. Min. Luiz Fux; e o HC 118.555,
da minha relatoria.

7. Esse entendimento vem sendo adotado sem maiores


restrições pela maioria da Turma (Ministra Rosa Weber, Ministro Luiz
Fux e eu próprio). O Ministro Marco Aurélio, contudo, salvo engano de
minha parte, tem admitido a impetração nas hipóteses em que esteja em
jogo, ainda que indiretamente, a liberdade de locomoção do paciente.

8. A hipótese é de habeas corpus, substitutivo de recurso


ordinário, em que se pretende o trancamento de inquérito policial. Não
há nos autos nenhuma notícia de risco efetivo ou potencial à liberdade de
locomoção do paciente. Essa circunstância evidencia a inadequação da
via eleita, conforme reiteradamente decidido neste Colegiado:

“[..]
HABEAS CORPUS ORDEM CONCESSÃO DE OFÍCIO.
A concessão de ordem de ofício pressupõe ato ilegal a

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alcançar a liberdade de ir e vir, direta ou indiretamente, o que


não ocorre considerada a observância, em caso concreto, no
qual envolvida atividade comercial, da forma qualificada da
receptação prevista no § 1º do artigo 180 do Código Penal...”
(HC 116.718, Rel. Min. Marco Aurélio)

“[...]
Se não há constrangimento atual ou próximo à liberdade
de locomoção, se a perspectiva de prisão é remota e depende
de incerta e futura condenação criminal transitada em
julgado, o remédio apropriado contra eventuais ilegalidades
ou abusos é o devido processo legal, com o trâmite natural da
ação penal, e seus consectários.
O habeas corpus não é a única garantia pertinente ao
Estado de Direito e justamente por sua relevância e
envergadura constitucional, não se justifica a sua banalização.
Em qualquer hipótese, o trancamento da ação penal só se
mostra cabível em casos excepcionalíssimos, quando
evidenciada a manifesta atipicidade ou licitude ou a falta de
justa causa.
Ordem denegada.” (HC 115.012, Rel. Min. Rosa Weber)
“[...] 3. É firme a jurisprudência consagrada por esta Corte
no sentido de que a concessão de habeas corpus com a
finalidade de trancamento de ação penal em curso só é possível
em situações excepcionais, quando estiverem comprovadas, de
plano, atipicidade da conduta, causa extintiva da punibilidade
ou ausência de indícios de autoria, o que não se vislumbra neste
writ.
4. Ausência de ilegalidade flagrante na decisão, que, em
observância à lei de regência, concedeu ao paciente o benefício
da liberdade provisória mediante condições.
5. O magistério jurisprudencial da Corte não tem
admitido habeas corpus quando com ele se pretende discutir
questões alheias à privação da liberdade de locomoção, razão
pela qual o pedido de restituição de patrimônio sob sequestro
não deve ser conhecido.

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6. Habeas corpus conhecido em parte e, nessa parte,


denegado.” (HC 102.262, Rel. Min. Dias Toffoli)

9. Não obstante a inadequação da via processual eleita, nada


impediria eventual concessão da ordem de ofício. Contudo, as peças que
instruem este processo não evidenciam nenhuma ilegalidade flagrante ou
abuso de poder que justifique o deferimento da ordem de ofício.

10. O principal argumento defensivo está no fato de que se


instaurou inquérito policial com base exclusivamente em delação
anônima. Segundo a defesa, a simples instauração formal do inquérito,
sem a realização de diligências preliminares, já configuraria
constrangimento ilegal, tendo em vista que a Constituição Federal proíbe
o anonimato (art. 5º, IV, CF/882).

11. É certo que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal


não admite, em princípio, a instauração de inquérito policial com base em
delação anônima. Vejam-se, nessa linha, o HC 108.147, Rel. Min Cármen
Lúcia; e o RHC 117.972, Rel. Min. Luiz Fux. Esse entendimento
jurisprudencial tem por finalidade evitar a instauração de persecuções
penais arbitrárias, que possam vulnerar bens jurídicos
constitucionalmente protegidos . 3

12. Na concreta situação dos autos, embora sob a roupagem


de inquérito policial, a polícia judiciária se limitou a averiguar a
idoneidade e a procedência das informações contidas na delação
apócrifa4. Fazendo-o nos termos de ordem de serviço, assim redigida pelo

2 “IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”


3 Luís Roberto Barroso. “COMISSÕES PARLAMENTARES DE INQUÉRITO E SUAS
COMPETÊNCIAS: POLÍTICA, DIREITO E DEVIDO PROCESSO LEGAL”.
4 Na verdade, estas foram as providências preliminares tomadas pela autoridade
policial: i) comparecimento dos policiais nos locais indicados na denúncia anônima em que
funcionariam casas de jogos ilegais; ii) oitiva de pessoas que se encontravam nos locais

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Delegado de Polícia:

“[...]
Determino aos policiais encarregados da presente, que
realizem diligências, em caráter reservado, à a) à av. Alda, nº
901, Diadema-SP; b) à rua Maturi, nº 117, Moema; c) à av. Nove
de Julho (não menciona número) em uma mansão de cor verde;
d) à rua Wanderley (próximo à Cardoso de Almeida) bairro
Pacaembu; e) à rua Frederico Abranges (ou Abranches), nº 457,
Santa Cecília, visando apurar as atividades ali realizadas,
sobretudo verificando a existência de indícios de que ali
esteja ou possa estar ocorrendo atividade criminosa (p/ex.:
exploração de jogo ilegal), ofertando circunstanciado relatório
a respeito do que puderem apurar...Sr. Investigador: Esta
Ordem de Serviço é de caráter RESERVADO, vedada a
exibição a estranhos...”

13. Veja-se que não foi adotada nenhuma medida investigativa


que pudesse configurar violação aos direitos constitucionalmente
protegidos do paciente (como prisão cautelar, busca e apreensão, quebra
de sigilos de dados e das comunicações, violação domiciliar, entre
outros). Assim, tal como apontou o parecer subscrito pela Dra. Deborah
Macedo Duprat de Britto Pereira,

“...É fácil perceber que a discussão está limitada a uma


formalidade. Fez-se, a partir do inquérito, diligências que
deveriam antecedê-lo. Daí não resultou dano ao paciente, pois
não teve decretada contra si qualquer medida invasiva. De
resto, o trancamento do inquérito não teria utilidade alguma,

relacionados na denúncia; iii) constatação de que o paciente, apontado como dono de


diversos Bingos clandestinos na região de São Paulo, também é investigado em outros
inquéritos policiais, acusado inclusive de Corrupção Ativa e Desobediência; iv) por último,
ou seja, quase um mês após a instauração do inquérito, houve a tomada de declarações do
paciente, supostamente responsável pelas infrações penais listadas na “denúncia” anônima.
Oportunidade em que negou qualquer envolvimento nos fatos apurados na “denúncia”.

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pois poderia ser reaberto a qualquer tempo diante de nova


evidência. E ela certamente viria, pois as investigações ainda
eram bastante embrionárias....”

14. Seja como for, a realidade é que o Tribunal de Justiça de


São Paulo concedeu parcialmente ordem de habeas corpus para impedir
que o paciente sofresse indiciamento sem supervisão judicial:

“[...] O Dr. Promotor de Justiça do Grupo Especial de


Delitos Econômicos – GEDEC, ao encaminhar a notícia anônima
à autoridade policial, fê-lo ‘para conhecimento e as
providências que julgar cabíveis’ (fls. 2 do apenso). Observe-se
que a Promotoria de Justiça não requisitou instauração de
inquérito policial. O motivo dessa prudente posição decorre dos
termos da notícia anônima, vazia de dados precisos quanto à
materialidade e autoria de eventuais delitos (fls. 4 do apenso).
Contudo, a autoridade policial, sem mais, lançou
despacho manuscrito no ofício do Ministério Público:
‘Instauro inquérito policial’ (fls. 2 do apenso).
A providência açodada poderá configurar
constrangimento ilegal mesmo. A ‘denúncia’ anônima, por sua
natureza espúria mesma, não se presta a justificar a instauração
de inquérito policial. Contudo, pode deflagrar investigações
preliminares que venham a servir de base eventualmente à
instauração do inquérito. Note-se que, mesmo quando pessoa
bem identificada comunica prática infracional, a autoridade
policial só mandará instaurar inquérito depois de verificada a
procedência das informações (§3º, do art. 5º, do CPP).
Logo, embora os autos apensados pareçam
consubstanciar inquérito policial, não passam de um
procedimento investigatório preliminar. Por sinal, o paciente
nem foi indiciado, limitando-se a prestar as declarações
contidas no termo de fls. 85/87.
[…]
De qualquer modo, para que não se frustrem as
investigações, na realidade preliminares, o procedimento

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Voto - MIN. ROBERTO BARROSO

Inteiro Teor do Acórdão - Página 14 de 17

HC 124677 A GR / SP

administrativo não deve ser trancado, mas, para que se afaste


a ocorrência eventual de constrangimento ilegal, nenhum
indiciamento poderá ser efetivado sem prévia e motivada
determinação judicial.
Pelo exposto, conhecida a impetração, concede-se
parcialmente a ordem para vedar quaisquer indiciamentos que
não tenham sido motivadamente determinados pelo Órgão do
Poder Judiciário...”

15. Em última análise, portanto, as providências preliminares


adotadas pela autoridade policial – pontualmente corrigidas pelo TJ de
São Paulo – seguiram a diretriz da jurisprudência desta Corte, no sentido
de que “nada impede a deflagração da persecução penal pela chamada ‘denúncia
anônima’, desde que esta seja seguida de diligências realizadas para averiguar os
fatos nela noticiados”(HC 105.484/MT, Rel. Min. Cármen Lúcia). De modo
que não enxergo ilegalidade ou abuso de poder por parte da autoridade
impetrada, ao assim decidir:

“[...]
...a instauração do Inquérito Policial n. 09/2009 não
ocasionou nenhum constrangimento ilegal ao paciente na
medida em que somente culminou na ordem de serviço para a
realização de diligências investigatórias, as quais poderiam
ter sido perfeitamente requeridas por via de VPI (Verificação
de procedência de informação), como cotidianamente ocorre
no meio policial. Desse modo, constatado que o inquérito
policial deflagrado a partir da delação apócrifa se limitou a
ordenar a realização de diligências que poderiam ser – e
possivelmente seriam – livremente determinadas sem a
formalização da investigação; que o inquérito em comento não
culminou em nenhuma medida cautelar em desfavor do
paciente – tais como, prisão cautelar, busca e apreensão e
interceptação telefônica – e que nem sequer houve
indiciamento, afigura-se excesso de formalismo proclamar, no
caso, a ilegalidade da deflagração do Inquérito Policial n.
09/2009 […] ”

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Voto - MIN. ROBERTO BARROSO

Inteiro Teor do Acórdão - Página 15 de 17

HC 124677 A GR / SP

16. Diante do exposto, nego provimento ao agravo regimental.

17. É como voto.

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Voto - MIN. MARCO AURÉLIO

Inteiro Teor do Acórdão - Página 16 de 17

07/04/2015 PRIMEIRA TURMA

AG.REG. NO HABEAS CORPUS 124.677 SÃO PAULO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Presidente, provejo o


agravo para que o habeas venha ao julgamento da Turma.

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Extrato de Ata - 07/04/2015

Inteiro Teor do Acórdão - Página 17 de 17

PRIMEIRA TURMA
EXTRATO DE ATA

AG.REG. NO HABEAS CORPUS 124.677


PROCED. : SÃO PAULO
RELATOR : MIN. ROBERTO BARROSO
AGTE.(S) : WINSTON JOSÉ TRISTÃO OU WISNTON JOSÉ TRISTÃO
ADV.(A/S) : PEDRO HENRIQUE MENEZES NAVES E OUTRO(A/S)
AGDO.(A/S) : SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão: Por maioria de votos, a Turma negou provimento ao


agravo regimental, nos termos do voto do Relator, vencido o Senhor
Ministro Marco Aurélio, que o provia. Presidência da Senhora
Ministra Rosa Weber. 1ª Turma, 7.4.2015.

Presidência da Senhora Ministra Rosa Weber. Presentes à Sessão


os Senhores Ministros Marco Aurélio, Luiz Fux e Roberto Barroso.
Compareceu o Senhor Ministro Dias Toffoli para julgar processos a
ele vinculados.

Subprocuradora-Geral da República, Dra. Cláudia Sampaio


Marques.

Carmen Lilian Oliveira de Souza


Secretária da Primeira Turma

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