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G1 – RJ 2010

O jovem que perdeu um braço despedaçado em um triturador de massas na fábrica da


Produtos Alimentícios Cadore S/A, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, afirmou,
em depoimento a policiais da 64ª DP (São João de Meriti), que, apesar de ter sido contratado
como “auxiliar de produção”, desde que entrou na empresa exerce a função de “operador de
máquina”.

O acidente ocorreu na manhã de segunda-feira (17). “Na carteira de trabalho dele está o cargo de
‘auxiliar de produção’. Isso caracteriza um desvio de função”, afirmou o advogado Geraldo
Flávio Campos Dias, que defende Rafael.
“Eu não sou operador de máquina. Não me deram treinamento nenhum”, disse Rafael Costa de
Souza, de 25 anos, em entrevista ao G1. “Por várias vezes eu pedi para trocar de setor”,
acrescentou o jovem, que trabalhava há sete meses na fábrica.

A diretora-administrativa da Cadore, Claudia Scofano, explicou que não há operadores de


máquina trabalhando no triturador de massas, mas somente auxiliares de produção, já que,
segundo ela, o triturador "não é uma máquina para ser operada e não precisa de parâmetros para
funcionar”, pois só tem o botão liga/desliga.
“Essa função é exercida por auxiliares de produção porque não precisa ter expertise de operação
de máquina. Basicamente, o trabalho é abastecer o equipamento”, explicou Claudia Scofano.
Cláudia Scofano afirmou que todas os funcionários da Cadore são treinados para trabalhar com
as máquinas. “Tenho que verificar com o encarregado do setor se o Rafael não foi treinado”,
disse. Ainda de acordo com a diretora-administrativa, o que ocorreu foi um acidente de trabalho
e que, segundo o responsável pela área onde Rafael trabalhava, o funcionário teria agido com
imprudência.
Rafael afirma no depoimento que, “para ter acesso ao triturador onde tinha que jogar o macarrão,
tinha que subir uma escada de dois degraus, que ficava solta, deslizando no chão liso”. O jovem
contou ao G1 que já tinha jogado um saco de macarrão dentro do triturador, e que, quando
jogava o segundo saco, a escada escorregou. Então, ele caiu e sentiu a palma da mão ser puxada
pela máquina.
“O triturador me puxava. Eu gritava muito. A minha cabeça chegou a bater na ferragem do
triturador, e ficou marcada. A máquina quase estoura minha cabeça”, conta Rafael. “Eu fiquei
forçando o peso para fora, para o triturador não me puxar e moer o meu corpo. Eu gritava e pedia
ajuda pelo amor de Deus, mas ninguém escutava, por causa do barulho da máquina”,
complementa.
A diretora-administrativa da Cadore disse que precisa verificar o que ocorreu na hora do
acidente. “Eu não conheço o posicionamento da escada”, afirmou. De acordo com Cláudia
Scofano, a fábrica não dispõe de ambulâncias para atendimento e remoção de urgência.
Funcionário conta que ficou com braço preso por dez minutos
No depoimento à polícia, Rafael conta que só foi socorrido cerca de dez minutos depois que o
braço foi sugado pelo triturador de massas, por um eletricista da Cadore. “Ele foi socorrido por
acaso, pois o eletricista tinha ido verificar um problema na máquina que tinha sido avisado pelo
próprio Rafael”, diz o advogado Cláudio da Fonseca Vieira, que também defende o funcionário.

Ainda no depoimento, Rafael relata que operava o triturador “sem os equipamentos de segurança
necessários”, e que “já havia reclamado com seus superiores sobre a falta de máscaras e óculos
de proteção, mas a empresa alegava que o material estava em falta”.
“O certo é ter um operador de máquina para trabalhar no triturador, junto com um auxiliar. Se
tem alguém do meu lado, podia desligar a máquina. Eu teria perdido um dedo, ou uma mão, mas
perdi meu braço todo”, conta Rafael.
Apesar de afirmarem que a Cadore está apalavrada em dar assistência a Rafael, os advogados do
funcionário fizeram algumas críticas à empresa. “Eu acho que a empresa está acanhada na
prestação de serviços e no pós-operatório”, afirmou Campos Dias. “Nós é que levamos o Rafael
para casa quando ele teve alta do hospital. Isso denota uma falta de atenção da empresa, por não
ter providenciado um carro para levá-lo”, complementou Fonseca Vieira.

Diretora-administrativa da Cadore diz que empresa está prestando toda a assistência


Sobre a falta de equipamentos de segurança, Cláudia Scofano afirmou que não procede a
informação dada por Rafael. “O perito da polícia tirou fotos dos óculos de proteção, que estavam
no local do acidente. E as máscaras estão disponíveis no RH e no Setor de Qualidade, que fica
próximo ao local onde Rafael estava trabalhando”, ressaltou. Sobre o fato de Rafael estar sozinho
no triturador, ela disse que é uma situação normal. “Isso depende da quantidade do produto. Se
for pouco, uma pessoa só é suficiente para abastecer”, explicou.
A diretora-administrativa informou que a Cadore está prestando toda a assistência necessária a
Rafael e acredita que estão ocorrendo “ruídos na comunicação”. “Vamos dar uma cesta básica
para ele e oferecemos uma psicóloga da empresa, mas a família está recusando nossa ajuda.
Inclusive, eles não aceitaram um cartão, assinado pelos funcionários, que enviamos junto com
flores”, contou Cláudia Scofano.
“Mandei para a família uma carta com um e-mail, número de fax e cinco telefones para que não
haja dificuldade em passar as receitas e os medicamentos necessários, que vamos custear. Nós
estamos fazendo um plano de saúde para o Rafael, que pode ser aposentado por invalidez ou ser
recolocado na empresa, após uma preparação específica”, afirmou a diretora-administrativa.
“Todos os traslados dele serão custeado por nós. Só peço, caso a família precise de locomoção,
que avise com 24 horas de antecedência”, acrescentou.
Rafael diz que está sentido muita dor e que sente uma imensa dificuldade para dormir. “Dói
muito, e eu choro às vezes. É difícil sair de casa. Só dá para utilizar uma mão quando tomo
banho, para me limpar”, conta ele.

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