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NOME: Felipe Kula TURMA: DIR 9 SAN

PROFESSOR: Rafael dos Santos Pinto MATÉRIA: DIREITO FALIMENTAR

As inovações na recuperação e na falência por força da Lei 14.112/2020

A Lei 11.101/2005 representa a mudança de paradigma no Direito Empresarial, na


medida em que passou a privilegiar, em caso de crise momentânea da empresa, a
recuperação das atividades econômicas viáveis diante dos objetivos coletivos econômico-
sociais da livre iniciativa.
Os agentes econômicos passaram a identificar a existência de impedimentos à
eficiência e à eficácia da recuperação judicial. Entretanto após a aprovação pela Câmara e
pelo Senado, foi sancionada, no dia 24, a Lei 14.112, que introduz modificações à Lei de
Falências.
Destacam-se as seguintes inovações: 1) incentivo à concessão de crédito para a
empresa em recuperação; 2) descontos e prazos maiores para parcelamento de débitos
tributários com a União; 3) incentivo à negociação extrajudicial; 4) proteção dos bens
essenciais à manutenção da atividade econômica; 5) inexistência de sucessão ou
responsabilidade por dívidas a credor e/ou a investidor ou em caso de alienação de ativos
a terceiros; 6) possibilidade de ser apresentado plano de recuperação pelos credores, em
caso de rejeição do plano indicado pelo devedor; 7) previsão de nomeação de um
profissional para constatar as reais condições de funcionamento da devedora; 8) suspensão
das execuções movidas contra coobrigados; 9) pessoa física que exerça a atividade rural
poderá se valer do pedido de recuperação.
Uma das inovações mais relevantes consiste no incentivo à concessão do crédito
em prol da empresa em recuperação, ao estabelecer que o empréstimo tem preferência de
pagamento sobre os créditos extraconcursais, contraídos durante o processo de
recuperação, mediante a constituição de garantia de bens pertencentes ao ativo não
circulante do próprio devedor ou de terceiros para financiar as suas atividades e as
despesas de reestruturação, subordinados à autorização judicial.
Entretanto ocorreram vetos pelo presidente da República, sendo: 1) suspensão da
execução das dívidas trabalhistas por negociação coletiva; 2) não se sujeitariam à
recuperação os créditos e as garantias vinculados à Cédula de Produto Rural; 3) a receita
obtida pela empresa em recuperação judicial não seria computada no cálculo do PIS, do
Pasep e da Cofins; 4) a possibilidade da recuperação das cooperativas médicas; 5) a
alienação judicial de bens em processo de recuperação não implica sucessão de
obrigações ambientais e de anticorrupção.
Portanto as inovações contidas na nova lei são relevantes, porque motivadas no
propósito meritório de concretizar o princípio maior que é o da preservação das atividades
econômicas viáveis, tornando-o mais transparente e com melhoria na recuperação de
créditos, como a possibilidade de a empresa negociar com os credores antes de iniciar a
recuperação judicial, o incentivo ao financiamento durante a fase de recuperação judicial e
a ampliação dos prazos de parcelamento das dívidas tributárias federais.
Lei facilita acesso do produtor rural à recuperação, mas restringe créditos

A Lei 14.112, de 2020, trouxe importantes mudanças no processo recuperacional e


falimentar brasileiro, entre as quais destacam-se as questões ligadas ao pedido de
recuperação judicial por produtores rurais.
O primeiro e grande ponto positivo abordado pela nova lei trata a respeito do
requisito temporal para que o produtor rural seja apto ao pedido de recuperação judicial. A
antiga redação da lei tratava do assunto em seu artigo 48, que definia como necessário o
prazo de dois anos de atividade regular do produtor rural para a concessão da recuperação,
sem deixar claro a partir de quando esse tempo seria contado. Porem apesar do Código
Civil prever um tratamento diferenciado para este tipo de atividade, facultando-a o registro
na junta comercial e, a partir deste, equiparando o produtor rural, para todos os efeitos, ao
empresário sujeito a registro, nem sempre os juízes admitiam o tempo anterior ao registro
para atender o supracitado requisito temporal.
Apesar de não preverem expressamente a contabilização do prazo anterior ao
registro na junta comercial para fins de comprovação dos dois anos de atividade exigidos
pela lei, preveem que para comprovação do referido prazo, poderá o produtor rural
apresentar: escrituração contábil fiscal (ECF) ou por meio de obrigação legal de registros
contábeis que venha a substitui-la; livro-caixa digital do produtor rural (LCDPR) ou por meio
de obrigação legal de registros contábeis que venha a substitui-lo; ou pela declaração do
Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (DIRPF) e balanço patrimonial. Isso deixa claro a
posição adotada pelo legislador de que o período anterior ao registro na junta comercial
contará para o alcance do prazo exigido no caput do artigo 48, visto que alguns desses
documentos referem-se ao tempo que o produtor rural exercia atividade como pessoa física.
Outra inovação positiva trazida pela Lei 14.112/2020, está prevista no artigo 70-A, é
a possibilidade de o produtor rural optar pelo procedimento simplificado, que até então era
prerrogativa exclusiva de microempresas e empresas de pequeno porte, desde que o valor
do passivo sujeito à recuperação judicial não exceda R$ 4,8 milhões.
Entretanto a nova redação não trouxe somente mudanças positivas. Logo no §6º do
artigo 49, há a primeira má notícia aos produtores rurais, pois a nova lei define que: "Estão
sujeitos à recuperação judicial apenas os que constarem na contabilidade do devedor".
Previsão que trata o produtor rural diferentemente de todos os demais agentes econômicos,
e não o favorece, pois aos demais admite-se, como sujeitos aos efeitos da recuperação
judicial, os mesmos créditos não contabilizados. Na sequência, no §7º do mesmo artigo,
também são excluídos do processo recuperacional os créditos decorrentes de "recursos
controlados e abrangidos nos termos dos artigos 14 e 21 da Lei nº 4.829, de 5 de novembro
de 1965", que são os créditos voltados ao fomento da atividade rural. Todavia, nesse
ponto há uma flexibilização, pois, em caso de em nenhum momento prévio ao pedido tais
créditos terem sido alvo de renegociação, eles ficam sujeitos ao processo. Já o §9º exclui
o crédito para aquisição da propriedade rural, se a dívida for constituída nos três anos
anteriores ao pedido de recuperação judicial.
Concluímos que raramente o legislador acerta por completo, se por um lado o
produtor rural teve seu acesso facilitado com a pacificação do entendimento de que é
possível contabilizar o período anterior ao registro para fim de comprovar os dois anos de
atividade previstos na lei, por outro grandes foram as restrições a quais créditos este podem
incluir em sua recuperação judicial.
A mediação e a conciliação na nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas

As previsões da lei que dispõem sobre a mediação e a conciliação envolvendo a


recuperação de empresas. Especificamente o artigo 22, letra "j", que acrescenta o dever do
administrador judicial em estimular a mediação e a conciliação em processos de
recuperação judicial, e os artigos da Seção II- A (artigos 20-A a 20-D), o qual tratam da
utilização da mediação e conciliação, antecedentes ou incidentais, nos processos de
recuperação judicial.
Em 2015, duas leis incluíram a perspectiva de solução de conflitos de forma
consensual: o novel Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) e a Lei de Mediação (Lei
nº 13.140/2015). Especificamente em relação à recuperação judicial, foi aprovado, em
2016, o enunciado nº 45 da 1° Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios,
prevendo que a mediação e a conciliação são compatíveis com a recuperação judicial, a
extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, desde que observadas
as restrições legais. Mais recentemente, em 2019, foi emitida a Recomendação nº 58 do
CNJ, que estimula os magistrados responsáveis pelo processamento e julgamento dos
processos de recuperação judicial a promoverem a mediação, sempre que possível.
Assim como houve o colapso do sistema de saúde, também o Poder Judiciário,
conhecido por sua morosidade, pode colapsar. Nesse sentido, foi editada a Recomendação
nº 71/2020 do CNJ, que propõe a criação de Centros Judiciários de Solução de Conflitos e
Cidadania (Cejuscs) empresariais nos tribunais do país (a exemplo de TJ-SP, TJ-RJ, TJ-
ES e TJ-RS), seguindo-se o pioneirismo da 2ª Vara Cível e da Fazenda Pública da Comarca
de Francisco Beltrão, no Paraná, que criou o primeiro Cejusc de recuperação empresarial
do Brasil. Esses núcleos foram implementados para evitar a judicialização de processos,
com a utilização da mediação ou da conciliação na fase pré-processual.
A lei acrescenta que um dos deveres do administrador judicial é estimular, sempre
que possível, a conciliação, a mediação e outros métodos alternativos de solução de
conflitos relacionados à recuperação judicial e à falência, respeitados os direitos de
terceiros (artigo 22, inciso I, letra "j", da Lei nº 11.101/2005). Essa previsão está em
consonância com o artigo 3º, §3º, do CPC/15, segundo o qual "a conciliação, a mediação e
outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes,
advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do
processo judicial".
Apesar de o administrador judicial ter um papel de órgão auxiliar da justiça e não de
representante das partes, seja da devedora ou dos credores, devendo atuar de forma
imparcial, entende-se que, pelas características próprias de cada função, não cabe ao
administrador exercer o papel de mediador de forma cumulada, na esteira do que prevê a
Recomendação nº 58 do CNJ, no seu artigo 6º. Pode o administrador judicial, no entanto,
auxiliar as partes no procedimento de mediação ou conciliação; contratar alguém na forma
do artigo 22, I, letra "h", da Lei de Recuperação de Empresas, que atuará sob sua
responsabilidade, desde que tenha autorização do juízo; sugerir o mediador, uma lista de
mediadores ou uma câmara de mediação.
Para sua aplicabilidade em maior número, é importante que os profissionais que
trabalham na área tenham qualificação técnica sobre a mediação e conciliação, além dos
conhecimentos já desejados para quem lida com recuperação de empresas.
A união desses instrumentos, mediação ou conciliação e recuperação judicial,
acredita-se que a prestação jurisdicional ocorrerá de forma mais célere, eficiente e menos
onerosa, com a concretização de um dos princípios basilares da recuperação judicial, a
preservação da empresa.
Recuperação judicial de grupos econômicos conforme as novas regras
estabelecidas pela lei 14.112/20

A lei 14.112/20 inclui a seção IV-B (arts. 69-G a 69-L) na lei 11.101/05, para disciplinar
a recuperação judicial e falência de empresas pertencentes a um mesmo grupo econômico,
de fato ou de direito. Essa seção aborda a consolidação processual e a consolidação
substancial, que foram uma construção jurisprudencial no Brasil e que agora restaram
normatizadas pela reforma da legislação falimentar.
A consolidação processual reúne as empresas de um mesmo grupo econômico no
polo ativo de um único processo, mas permite que cada empresa seja tratada
separadamente, respeitando as suas personalidades jurídicas.
Portanto, cada pessoa jurídica devedora deve preencher os requisitos legais e
apresentar individualmente a documentação exigida pela Lei, conforme seus ativos e
passivos, e apresentar planos de recuperação autônomos, formulados conforme as
circunstâncias de cada uma, ou, um plano único, mas subdividido, de forma que seja
possível identificar as medidas previstas para cada devedora.
Os atos processuais, entretanto, são coordenados para evitar uma multiplicidade de
processos que oneraria excessivamente o Poder Judiciário e dos quais poderiam resultar
decisões conflitantes ou desencontradas. Um único feito envolvendo as empresas
integrantes de um mesmo grupo econômico também aprimora a atuação do magistrado,
que pode compreender a crise em todas as suas nuances.
Com a Lei reformada, garante-se a independência dos devedores, deixando claro
que a consolidação processual não impede que alguns devedores obtenham a concessão
da recuperação judicial enquanto outros possam ter a falência decretada, considerando a
realidade econômico-financeira de cada um. Se isso ocorrer, o processo será
desmembrado em tantos autos quantos forem necessários, visto que há diferenças entre
os procedimentos recuperacional e falimentar.
Entretanto apenas um administrador judicial será nomeado, efetivando a economia
processual, a redução dos custos para os devedores e a harmonia dos atos praticados.
Trata-se de uma medida eficiente, pois o administrador judicial terá conhecimento
detalhado da situação patrimonial de todo o grupo.
Portanto com a alteração da lei 11.101/05, foi mantida a consolidação substancial
como ultima ratio, estando a Lei, portanto, de acordo com a construção jurisprudencial. Isso
porque, além de interferir na autonomia patrimonial e desnaturar os negócios jurídicos
originários, o plano unitário será submetido a uma única AGC, à qual serão convocados
todos os credores do grupo consolidado, de forma que ocorre uma alteração no poder de
voto de cada credor - em comparação ao que ocorreria se os planos de recuperação fossem
individualizados -, pois os débitos estarão inseridos no passivo total do grupo. O mesmo
ocorre com o ativo a ser liquidado. Se o plano unitário vier a ser rejeitado pela AGC ou
descumprido, a recuperação judicial será convolada em falência para todo o grupo
consolidado.
Considerando que até recentemente não havia previsão legal quanto aos critérios
para o deferimento e os procedimentos das consolidações processual e substancial, a lei
14.112/20 traz maior segurança jurídica e previsibilidade decisória para o sistema de
insolvência brasileiro, uniformizando a atuação dos magistrados e reduzindo a
discricionariedade.

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