Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
e formatos
Estado da arte e diálogos contemporâneos
Organizadoras
Marli dos Santos
Clarissa Josgrilberg Pereira
Ana Carolina Temer
Maria Elisabete Antonioli
Roseméri Laurindo
1
Biblioteca Universitária da FURB
208 p. : il.
Inclui bibliografias.
ISBN: 97865.....
CDD 070
2021
SUMÁRIO
5 APRESENTAÇÃO
9 INTRODUÇÃO
17 PARTE 1 – ESTADO DA ARTE 10 ANOS DE
PESQUISA EM GÊNEROS JORNALÍSTICOS
40 AUTORES
43 PARTE 2 – DIÁLOGOS CONTEMPORÂNEOS
45 O (en)canto que vem das ruas: leituras das crônicas
de João do Rio e Luiz Antonio Simas em Comunicação
Social (Jornalismo)
5
Já na Parte II foram reunidos os artigos apresenta-
dos durante o 430 Congresso Nacional da INTERCOM, em
2020, selecionados pela coordenação do GP e as coorde-
nadoras convidadas para as 4 sessões, para as quais foram
realizadas as chamadas temáticas, que abrangeram: Gêne-
ros, Inovações e Entretenimento; Gênero e Narrativas; Gê-
neros: Opinião e Informação; e Gêneros, Desinformação e
Educação Midiática. No total foram 25 trabalhos aprovados,
sendo que de cada uma das sessões foram selecionados as
duas pesquisas que mais se aproximaram da proposta das
temáticas divulgadas na chamada de trabalhos. A seguir,
apresentamos as ementas das chamadas divulgadas para
a submissão de trabalhos:
6
Gêneros e Narrativas
7
vedetização dos jornalistas. Contradições entre os conte-
údos informativos e opinativos. O conteúdo opinativo e a
questão da objetividade e credibilidade no jornalismo.
8
INTRODUÇÃO
Ementa
9
mo e outros espaços digitais. Gêneros jornalísticos e suas
relações com outros conteúdos midiáticos. A questão da
hibridização e a formação de novos gêneros. Formatos e
categorias jornalísticas. Novas formatações e gêneros no
jornalismo alternativo. O jornalismo especializado e suas
características de linguagem e formatação.
Objetivos
10
O início dos trabalhos sobre Gêneros Jornalísticos
na obra de Marques de Melo é resultado da tese de livre-
-docência do autor na Escola de Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo (ECA-USP), em um trabalho que
resultou no livro “A opinião no Jornalismo Brasileiro”, lan-
çado em 1983. Nesse trabalho é apresentada uma análise
sobre os gêneros jornalísticos no Brasil, com considerações
sobre as características específicas do jornalismo brasileiro,
mas igualmente considerando a característica mutante dos
gêneros, que se modificam e se adaptam a novos veícu-
los, novos contextos, novas formas de produzir e consu-
mir os produtos midiáticos, e em particular, o jornalismo.
Inspirado nos postulados dessa obra, Marques de Melo dá
início a uma série de pesquisas em jornais impressos bra-
sileiros, que igualmente resultam em obras clássicas, entre
elas “Gêneros Jornalísticos na Folha de S. Paulo”, publicado
em 1992, e mais recentemente, “Gêneros Jornalísticos no
Brasil”, em coautoria com Francisco de Assis, de quem era
orientador, publicado em 2016. Além dessas obras voltadas
para o jornalismo impresso ou para uma catalogação mais
ampla sobre gêneros jornalísticos, Marques de Melo tam-
bém produziu artigos e trabalhos de pesquisa em conjunto,
e foi o responsável pela orientação de teses e dissertações
que apresentaram classificações sobre gêneros voltadas
para veículos específicos, como televisão, rádio e web, mas
também para detalhamento de diferentes gêneros, contri-
buindo assim para melhorar suas definições/catalogações.
Marques de Melo (2009) assinalou ainda que, quan-
do voltou a pesquisar sobre os gêneros jornalísticos brasi-
leiros, na primeira metade dos anos de 1980, durante sua
tese de livre docência, evidenciou algumas mudanças
1) o vulto de matérias focalizando “serviços” não mais ca-
bia no formato “nota” do gênero informativo, sinalizando
11
a emergência do gênero utilitário; 2) a presença de ma-
térias do tipo enquete que se desgarravam dos formatos
entrevista ou reportagem, denotando o reflorescimento
do gênero interpretativo; e 3) o aparecimento significativo
de textos conotados pelo humor ou pela ironia que dei-
xavam de perfilar no território pertencente ao gênero opi-
nativo, ensejando o cultivo do gênero diversional (2009,
p. 5).
12
mesmos resultados. No caso do gênero informativo, privi-
legiando os formatos notícia, reportagem e entrevista. Com
relação ao gênero opinativo, os formatos mais difundidos
foram comentário e artigo.
Em relação a teses e a dissertações foram inúmeras
as pesquisas orientadas por ele, sendo que as mais recen-
tes aprofundaram sua nova proposta de classificação, que
passou de dois gêneros (Informativo e Opinativo) para cin-
co (Informativo, Interpretativo, Opinativo, Utilitário e Diver-
sional).
Nas publicações de Marques de Melo há destaques
para os estudos pioneiros sobre gêneros jornalísticos atri-
buídos a Jacques Kayser, que teve produção relevante so-
bre o tema, divulgada em seu livro póstumo, lançado em
1963, “El periódico: estudios de morfologia, de metodolo-
gia y de prensa comparada”. Esse papel de referência, que
partiu da França para o mundo com Kayser, coube mais
tarde a Martínez Albertos, na Espanha, depois a Irena Tete-
lowska, da Universidade de Cracóvia. No Brasil, os gêneros
jornalísticos, como recorte importante dos estudos da im-
prensa, se disseminaram a partir de Luiz Beltrão, da Univer-
sidade Católica de Pernambuco, Recife, especialmente na
trilogia “A imprensa informativa (1969), Jornalismo Interpre-
tativo (1976) e Jornalismo opinativo (1980)” (MARQUES DE
MELO, 2010, p. 15-16).
Marques de Melo também destaca que outros auto-
res brasileiros, como Rizzini (1957) e Werneck Sodré (1966),
fazem registros em seus estudos sobre a narrativa jorna-
lística, mas não há uma noção aprofundada sobre estudos
nessa área no Brasil que pudessem delinear trajetória e
eventuais perspectivas de gêneros jornalísticos entre os
pesquisadores. A oferta da disciplina na pós-graduação
stricto sensu oferecida pelo pesquisador alagoano, bem
13
como sua atuação como pesquisador em universidades
brasileiras, especialmente a Universidade Metodista de São
Paulo (UMESP), demarcaram um território de estudos em-
píricos no qual ingressantes nos cursos de mestrado e dou-
torado tornaram-se produtores de pesquisas e nucleadores
de estudos sobre gêneros no Brasil em suas localidades de
origem.
A produção científica de Luiz Beltrão e Marques de
Melo trouxeram à tona o debate sobre a questão dos gêne-
ros e provocaram pesquisadores a realizar novas classifi-
cações. Entre estas propostas destaca-se a de Manuel Car-
los Chaparro que realizou um debate sobre o paradigma
até então adotado nos estudos de Marques de Melo, que
separava informação de opinião. Em “Sotaques d’aquém e
d’além mar – travessias para uma nova teoria de gêneros
jornalísticos” (2008), Chaparro faz uma proposta de clas-
sificação baseada nas ciências da linguagem, discutindo a
perspectiva teórica apresentada por Marques de Melo em
“A opinião no jornalismo brasileiro”. Trata-se de uma aborda-
gem a partir das ciências da linguagem, baseada na prag-
mática, que traz também importantes contribuições para os
estudos de gêneros. Chaparro (2008) propõe uma classifi-
cação considerando os gêneros como relatos ou comentá-
rios, argumentando que a separação clássica entre opinião
e informação foi uma estratégia adotada pelo pioneiro jor-
nal britânico Daily Courant, publicado a partir de 1702, que
dividiu notícias de comentários, como maneira de atrair a
atenção do público. Ao propor a classificação dos gêneros
relato e comentário, Chaparro se inspira na botânica para
as nomenclaturas, atribuindo ao relato as espécies narrati-
vas e práticas, e ao comentário, espécies argumentativas e
gráfico-artísticas. Ressalta o autor que gêneros não se divi-
dem em opinião e informação, e que essas são característi-
cas não excludentes e nem exclusivas de um gênero, pois,
14
os relatos são resultados de escolhas em todo o processo,
desde o enfoque da pauta, passando pelas fontes e a es-
colha lexical; assim como os comentários não prescindem
da informação, sem as quais não há condições de opinar.
Dessa forma, tanto Marques de Melo quanto Chaparro são
considerados os dois teóricos brasileiros de referência nos
estudos de gêneros jornalísticos.
Outros pesquisadores também trazem contribuições
relevantes, como Lailton Costa (2010) que apresenta um
estado da arte naquele momento, tendo como referência
a taxonomia proposta por Marques de Melo, que evoluiu
de uma classificação que separava gênero informativo de
opinativo, para um rol de cinco gêneros, e seus respecti-
vos formatos, resultado de pesquisas empíricas realizadas
pelo autor. Costa reconhece, em sua revisão, a dificuldade
em apreender o conceito de gêneros jornalísticos, atribuí-
da à fragmentação das práticas jornalísticas em diferentes
meios. O autor chega a questionar se é “possível apresen-
tar um conceito de gênero jornalístico que se sobreponha à
diversidade de mídia?” (2010, p. 47). De todo o modo, Costa
traz uma definição de gênero:
um conjunto de parâmetros textuais selecionados em
função de uma situação de interação e de expectativa dos
agentes do fazer jornalístico, estruturado por um ou mais
propósitos comunicativos que resulta em unidades tex-
tuais autônomas, relativamente estáveis, identificáveis no
todo pelo processo de transmissão de informações por
meio de uma mídia/suporte (COSTA, 2010, p. 47).
15
autoria, temporalidade do fato, tema, entre outros, como
aspectos considerados como importantes para a classifi-
cação de gêneros, identificando “um critério-chave: fun-
ção ou finalidade”. A pesquisadora identifica nos autores
espanhóis, especificamente da Universidade de Navarra,
nos norte-americanos e nos brasileiros a recorrência desse
critério. “No Brasil, Luiz Beltrão falava de função, enquan-
to José Marques de Melo classificou os textos produzidos
pela indústria jornalística por ‘intencionalidade dos relatos’
e ‘natureza estrutural dos relatos’ (2009, p. 63). Há autores
que seguiram também caminhos diversos, eventualmente
recorrendo a clássicos, como Bakhtin (1993).
O último trabalho que Marques de Melo orientou
aborda gêneros na internet, doutorado realizado por Claris-
sa Josgrilberg Pereira, intitulado “Jornalismo digital e novas
tecnologias: estudo de gêneros e formatos nos principais
sites jornalísticos brasileiros” (2018), que apresenta novos
formatos a partir dessa nova classificação. A pesquisadora
confirma o impacto do meio nos formatos na internet, apli-
cando a matriz impressa para novas descobertas na pes-
quisa empírica em sites e portais de veículos jornalísticos.
16
PARTE 1 - ESTADO DA ARTE 10
ANOS DE PESQUISA EM GÊNEROS
JORNALÍSTICOS
17
Referencial Teórico
18
dos a demandas sociais e, portanto sujeitos a constantes
atualizações. Dessa forma, essa classificação é atualizada
em 2016 (MARQUES DE MELO; ASSIS, 2016) com uma ca-
tegorização mais ampla:
Gênero Função
19
Tabela 2 - Gêneros e formatos propostos por Assis e
Marques de Melo (2016)
Gênero Formatos
Procedimentos Metodológicos
20
No caso da pesquisa empreendida pelo GP, ado-
tou-se um formulário como instrumento de pesquisa, com
24 questões abertas e fechadas, sendo 6 questões sobre
os pesquisadores, 5 sobre os dados gerais da pesquisa,
3 sobre metodologia, 5 especificamente sobre gêneros e
principais autores de referência. Após a sistematização dos
dados, foram elaborados gráficos e tabelas para uma me-
lhor análise dos resultados., que abrangeram desde aspec-
tos ligados ao pesquisador e sua origem institucional, bem
como a abordagem dos gêneros nos estudos apresentados
e principais autores. O formulário de coleta de dados pas-
sou por um pré-teste, o qual “[...] tem por objetivo assegu-
rar-lhe validade, clareza dos termos e precisão” (GIL, 1999,
p.137). Cada pesquisadora submeteu dois trabalhos de sua
amostra para adequar o instrumento a versão final. Depois
que o grupo de pesquisadoras validou o instrumento, cada
um realizou a tabulação dos dados por meio do Google
Forms e posterior análise.
As técnicas adotadas são as da pesquisa documen-
tal (GIL, 2008) e de análise de conteúdo, de acordo com
Bardin (2011). De acordo com Gil, a pesquisa documental
se assemelha à pesquisa bibliográfica, pois analisa docu-
mentos que serão sistematizados e vão receber um trata-
mento analítico não realizado antes. Já Bardin, a análise de
conteúdo é
um conjunto de técnicas de análise das comunicações
visando a obter, por procedimentos sistemáticos e obje-
tivos de descrição do conteúdo das mensagens, indica-
dores (quantitativos ou não) que permitam a inferência
de conhecimentos relativos às condições de produção/
recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BAR-
DIN, 2011, p. 47).
21
din (2011) supera a perspectiva quantitativa, anteriormente
explorada nos estudos dos anos 1940/50, e avança no sen-
tido de identificar, compreender e contextualizar os conte-
údos em processos comunicacionais inferidos pelo pes-
quisador/a. Os procedimentos para o cumprimento desses
objetivos incluem a pré-análise do corpus da pesquisa, ex-
ploração do material e tratamento dos resultados, fase em
que se faz inferências e interpretações do que foi coletado
e sistematizado, de acordo com os objetivos da pesquisa.
Nesse sentido, é importante destacar que a análi-
se de conteúdo opera por meios de categorias de análise,
definidas a priori e a posteriori, que devem estar ligadas à
questão de pesquisa e ao objetivo estabelecido. As cate-
gorias de análise foram naturalmente consideradas a par-
tir do formulário elaborado como protocolo de pesquisa e
disponibilizado no aplicativo Google Forms. Isso facilitou
a compilação dos dados e as análises dos resultados, in-
clusive na comparação dos biênios estudados. Para a co-
leta de dados procedeu-se primeiramente à leitura dos
resumos, posteriormente da introdução e, eventualmente,
o texto inteiro para o preenchimento das categorias, caso
não fossem detectadas as informações nesses dois tópicos
primeiramente.
O aplicativo Google Forms gerou automaticamente
os gráficos por questão de múltipla escolha, e listou as res-
postas das perguntas abertas. A pesquisa foi dividida em
cinco etapas, compreendendo a coleta e análise de dados
dos trabalhos disponíveis nos Anais do Portal INTERCOM
a cada dois anos. Para a apresentação dos resultados ao
longo dos 10 anos neste livro optamos por juntar os cinco
biênios, para observar os padrões e, ao mesmo tempo, as-
pectos peculiares em cada amostra estudada.
22
O Estado da Arte – 10 anos de Pesquisa do GP
Gêneros Jornalísticos
37
26
24 23 23
22
20
18
12 11
2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018
Fonte: as autoras
23
No total foram apresentados 2018 trabalhos, com
média de 21,8 trabalhos por evento, sendo que em 2013 e
2018 observou-se as menores quantidades de trabalhos, 12
e 11, respectivamente. Em 2015, no evento realizado no Rio
de Janeiro, houve maior adesão ao GP, com 37 trabalhos
apresentados. Infere-se que a localidade de realização do
evento também teve influencia no maior número de inscri-
tos e participantes do GT.
24
ção comunitária e outra pública, infere-se que a razão pode
estar na presença de um dos autores mais citados quan-
do se trata de gêneros jornalísticos, José Marques de Melo,
que atuou na UMESP como docente-fundador da pós-gra-
duação stricto sensu em Comunicação, tendo ocupado o
cargo de docente de graduação e pós-graduação, diretor
da Faculdade de Comunicação, coordenador do Progra-
ma de Pós-Graduação em Comunicação Social e diretor-
-titular da Cátedra Unesco/Metodista para o Desenvolvi-
mento Regional. No caso da UFG, uma das pesquisadoras
que atualmente coordena o Programa de Pós-graduação
em Comunicação, Ana Carolina Temer, foi orientanda de
mestrado e doutorado de Marques de Melo, e é uma das
autoras mais presentes nos estudos de gêneros no telejor-
nalismo no Brasil, portanto, trata-se também de nucleação
de egressos da UMESP.
Também se verifica a crescente participação das
universidades públicas, que no biênio 2011/12 represen-
tam 53,3%. Em 2013/14, por exemplo, a maioria dos traba-
lhos apresentados tem origem em universidades públicas
(58,6%), 24% de instituições privadas e 20,7% comunitá-
rias. Infere-se que se trata também da dispersão de orien-
tandos do professor José Marques de Melo, egressos da
UMESP. Em 2013/14 foram 21 instituições representadas
nos trabalhos apresentados. No biênio 2015/16, a origem
dos trabalhos se dá majoritariamente nas instituições públi-
cas e comunitárias, o que condiz com o cenário nacional de
pesquisa. Em 2017/18 os dados apontam que houve mais
equilíbrio entre as instituições públicas e privadas, com
uma leve vantagem para a primeira. A UFG passa a ser a
instituições mais representada no GP. Também acrescenta-
-se a presença de um pesquisador vinculado a duas univer-
sidades fora do país nesse biênio, mas foi uma participação
muito pontual.
25
Localidade das instituições dos pesquisadores
26
majoritária de doutores (31%). Já no biênio 2015/16, en-
tre os apresentadores de trabalhos, a maioria era mestre
60,3% (35) e doutor 43,1% (25). No último biênio, a situação
de prevalência de titulados no strictto sensu se mantem.
Analisa-se que essa presença se deve particularmente a
presença de pesquisadores em gêneros jornalísticos e seus
formatos em várias instituições, como professores e/ou
pesquisadores.
c) Procedimentos Metodológicos
27
Técnicas de pesquisa
Foco da pesquisa
28
d) Gêneros, formatos e autores predominantes.
Clareza metodológica
Abordagem da pesquisa
29
qualitativa. Em 2013/14, são 72,4%, porém, há pesquisas
mistas, 17,2%, que acenam para um movimento multipers-
pectivo nesse biênio, com uso de técnicas mais diversifica-
das. Em 2015/16, novamente maioria muito expressiva de
estudos qualitativos, 86,2% dos trabalhos, apresenta abor-
dagem qualitativa, seguindo como majoritária no último bi-
ênio estudado. Ao observar-se tipos e técnicas de pesquisa
mais adotada, confirma-se essa tendência de pesquisado-
res no GP pouco adotarem métodos quantitativos.
Tipos de pesquisa
30
nero nos trabalhos estudados, que a princípio possuem
uma centralidade maior como objeto teórico e empírico.
Em 2009/10 os gêneros jornalísticos e seus formatos foram
centrais em 74% dos trabalhos; no biênio seguinte, 2011/12,
esse percentual aumenta para 91%. Já nos biênios 2013/14
e 2015/16 houve uma queda abrupta na centralidade de
gêneros como foco dos trabalhos apresentados, 38% e
36,2%. Eles aparecem como contexto e/ou pano de fundo
para compreender outros objetos empíricos. Em 2017/18
houve recuperação, com 60% das pesquisas apresenta-
das em que os gêneros são o objeto empírico. Mesmo não
sendo o foco central de todos os trabalhos analisados, são
visíveis as colaborações que as abordagens trazem para o
tema. Outro aspecto a considerar é que pode haver falta
de estímulo no estudo de gêneros jornalísticos nos cursos
de graduação, ou o interesse mais em formatos e as suas
interfaces com outras áreas de conhecimento, como a lite-
ratura, a desinformação, a educação, entre outras.
Veículo predominante
31
Em 2015/16, a maioria (64,5%) dos trabalhos cen-
trou-se na discussão de um veículo, na seguinte sequên-
cia: 20,6% em web; 17,2%, jornais; 10,3%, revistas. Porém,
34,5% dos trabalhos discutiram gêneros jornalísticos sem
associar a discussão a um veículo específico, com é o caso
da pesquisa “Diretrizes Curriculares de Jornalismo: a rele-
vância dos conteúdos e gêneros jornalísticos na formação
do egresso”. De acordo com Pereira,
temos pesquisas sobre gêneros radiofônicos, televisivos,
impressos e mais recentemente digitais. Essa separação
é feita por alguns autores como forma de organização e
busca de melhor compreensão das particularidades de
cada meio, mas, por outro lado gera críticas que apontam
a faltam de coerência de gêneros de uma característica
maior: a jornalística, além de indicarem que o fato dos
estudos ficarem reféns dos suportes, não contribui para
uma discussão maior (PEREIRA, 2018, p.87).
32
de 54% dos 50 trabalhos estudados, seguido do gênero
opinativo, que representa 14%. Em 2011/12 são quase 69%
de trabalhos que apresentam um gênero predominante, e
destes, 51,1% eram do gênero informativo. Em 2013/14, qua-
se 38% dos trabalhos abordam o gênero informativo, em
seguida vem o opinativo (17,2%). Conforme Santos, Silva
Filho e Méo (2019), a primazia dos gêneros informativos, e
seus formatos - especialmente a notícia e a reportagem - é
notada nos veículos e também nos estudos sobre gêne-
ros jornalísticos nesse período. Os gêneros interpretativo,
diversional e utilitário estão presentes também nesse biê-
nio, como também nos trabalhos apresentados em 2015/16,
provavelmente resultantes das pesquisas orientadas por
Marques de Melo.
Quanto aos formatos, majoritariamente aparecem
estudos sobre reportagens, primeiramente, depois notícia.
Há outros diversos formatos presentes nos estudos, ligados
ao gênero opinativo, como crônica, editorial, artigo, cartas,
entre outros.
33
em 2015/16, em que a discussão sobre jornalismo literário
trouxe autores como José Salvador Faro e Felipe Pena, que
trabalham com jornalismo cultural e de literatura. Em 2015
e 2016 também foram apresentados trabalhos que focavam
o jornalismo comparado1. Destaca-se, ainda, algumas pes-
quisas que buscaram atuar em vertentes ainda pouco ex-
ploradas como é o caso do trabalho que discutiu jornalismo
em quadrinhos, “Notas sobre Gaza: o relato jornalístico em
quadrinhos de Joe Sacco” e o que discutiu jornalismo de
personagem ;’ Ponderações Sobre Jornalismo de Persona-
gem”.
Rotas traçadas
34
deles, para que, inclusive, se possa receber e produzir con-
teúdos com qualidade e que estes não sejam confundidos,
por exemplo, com a desinformação.
Os resultados alcançados com o estado da arte das
pesquisas apresentadas no GP Gêneros Jornalísticos tam-
bém nos mostram uma certa regularidade na quantidade
de trabalhos, com momentos de queda, mas também com
picos de participação, e que o avanço se dará efetivamente
com maior participação e discussão de pesquisas na área.
Temas como hibridização de conteúdos, inovação nos for-
matos em contextos midiáticos desafiadores, as condições
de produção desses gêneros e formatos e a recepção dos
mesmos pela sociedade, são temáticas que precisam ser
enfrentadas pelos pesquisadores, além de também contri-
buírem para uma reflexão teórica em sintonia com contex-
tos históricos e sociais diferenciados. Como Marques de
Melo menciona, os gêneros precisam ser estudados em
seus contextos, em suas realidades, porque são dinâmicos
e se transformam de acordo com a vida que pulsa no co-
tidiano das nossas ações e relações com o outro, nos pro-
cessos comunicativos do jornalismo.
Na realidade da hiperinformação e hiperconectivi-
dade, das multitelas e multiplataformas, dos dispositivos
móveis, da convivência entre veículos tradicionais e digitais,
das empresas comerciais e das organizações alternativas/
independentes, é preciso considerar que cada vez mais
no estudo de gêneros jornalísticos será necessário adotar
critérios e estratégias metodológicas que deem conta da
complexidade da comunicação e do jornalismo contempo-
râneo.
35
Referências
36
compare de 17 grands quotidiens pendant 7 jours. Paris:
Unesco, 1953.
MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Metodologia científica.
4.ed. São Paulo: Atlas, 2002.
MARQUES DE MELO, José. Gêneros jornalísticos no
Brasil: o estado da questão. Anais do Congresso Intercom
– Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da
Comunicação XXXII Congresso Brasileiro de Ciências da
Comunicação – Curitiba, PR – 4 a 7 de setembro de 2009.
Disponível em: http://www.intercom.org.br/papers/nacio-
nais/2009/resumos/R4-0763-1.pdf. Acesso em: 10 de junho
de 2019.
MARQUES DE MELO, José. Panorama diacrônico dos
gêneros jornalísticos. Anais do Congresso Intercom –
Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Co-
municação XXXIII Congresso Brasileiro de Ciências da
Comunicação – Caxias do Sul, RS – 2 a 6 de setembro de
2010. Acessível em http://www.intercom.org.br/papers/
nacionais/2010/resumos/R52215-1.pdf. Acesso em 20 de
julho de 2019.
MARQUES DE MELO, José; ASSIS, Francisco de. Gêneros
Jornalísticos no Brasil. São Paulo: Universidade Metodis-
ta, 2010.
MARQUES DE MELO, José. Gêneros jornalísticos no Brasil:
o estado da questão. Anais do Anais do Congresso Inter-
com – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares
da Comunicação XXXII. Congresso Brasileiro de Ciências
da Comunicação – Curitiba, PR – 4 a 7 de setembro de
2009. Acessível em http://www.intercom.org.br/papers/
nacionais/2009/resumos/R4-0763-1.pdf. Acesso em 20 de
julho de 2019.
37
PEREIRA, Clarissa J. Jornalismo digital e novas tecno-
logias: estudo de gêneros e formatos nos principais sites
jornalísticos brasileiros”. Tese (doutorado). São Bernardo do
Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2018.
RIZZINI, Carlos. Hipólito da Costa e o Correio Brazilien-
se. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1957.
SCHWINGEL, Carlo. Ciberjornalismo. São Paulo: Pauli-
nas, 2013.
SEIXAS, Lia. Por uma outra classificação: uma proposi-
ção de critérios de definição de gêneros jornalísticos
por impressos e digitais. 2008. Tese (Doutorado em Co-
municação e Cultura Contemporânea) – Universidade Fe-
deral da Bahia, Salvador, 2008.
SEIXAS, Lia. Redefinindo os gêneros jornalísticos. Pro-
posta de novos critérios de classificação. Covilhã, Portugal:
LabCom Books, 2009.
STUMPF, Ida Regina. Pesquisa bibliográfica. In: DUAR-
TE, Jorge; BARROS, Antonio. (Orgs.). Métodos e técnicas de
Pesquisa em Comunicação. 2 ed. São Paulo: Ed. Atlas, 2011.
SODRÉ, Muniz; FERRARI, Maria Helena. Técnica de Re-
portagem: Notas sobre a narrativa jornalística. São Paulo;
Summus, 1986.
TEMER, Ana Carolina Pessôa. Noticias e servicos: um es-
tudo sobre o conteúdo dos telejornais da Rede Globo. 2001.
339 f. Tese (Doutorado em Comunicação Social) – Univer-
sidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo,
2001.
TEMER, Ana Carolina Rocha Pessôa. Por uma teoria dos
Gêneros em Comunicação. Anais do Congresso Inter-
com – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares
da Comunicação XXXII Congresso Brasileiro de Ciências
38
da Comunicação – Curitiba, PR – 4 a 7 de setembro de
2009. Acessível em http://www.intercom.org.br/papers/
nacionais/2009/resumos/R4-0776-1.pdf. Acesso em 20 de
junho de 2019.
WERNECK SODRÉ Nelson. História da imprensa no
Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.
39
AUTORES
40
Professora efetiva de Jornalismo Digital na Universidade de Blumenau
(FURB). Chefe da Divisão de Modalidades de Ensino (DME) da FURB.
Vice-coordenadora do Grupo de Pesquisa de Gêneros Jornalísticos da
Intercom. Tutora e professora orientadora de cursos do ensino a distân-
cia da Unigran. Profissional credenciada como revisora, conteudista e
tutora do ensino a distância da Escola do Governo de Mato Grosso do
Sul (Escolagov). Mestre pelo curso de pós-graduação da Universidade
Metodista de São Paulo (UMESP) e graduada em Comunicação Social
- Jornalismo pelo Centro Universitário da Grande Dourados (Unigran).
41
Social pela Universidade Metodista de São Paulo (1998). Graduada em
Comunicação Social, habilitação em Publicidade e Propaganda (1979) e
Jornalismo (1989) pela UMESP. Estágio pós-doutoral pela Universidade
Federal de Goiás, UFG, com a supervisão da profa. Dra. Ana Carolina
Rocha Pessoa Temer. É docente permanente do Programa de Pós-Gra-
duação em Comunicação da Faculdade Cásper Líbero, linha de pesqui-
sa Jornalismo, Imagem e Entretenimento. Líder do Grupo de Pesquisa
EMANCIPA-JOR - Jornalismo contemporâneo: práticas para emancipa-
ção social na cultura tecnológica, ligado à Rede Nacional de Combate à
Desinformação - RNCD. Coordenadora do GT Estudios sobre periodis-
mo da ALAIC - Associación Latinoamerica de Investigadores de Comu-
nicación e Coordenadora do GT Gêneros Jornalísticos, da INTERCOM
- Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. É
membra da APJOR - Associação Profissão Jornalista. Atuou como coor-
denadora e docente do Programa de Pós-Graduação em Comunicação
Social da UMESP, de 2011 a 2017. Foi docente titular do curso de Jor-
nalismo da UMESP, de 1999 a 2017, tendo assumido a coordenação de
2011-2013.
Roseméri Laurindo
Professora titular de Teorias da Comunicação na Universidade Regional
de Blumenau (FURB), nos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propa-
ganda. Pós-doutora pela Cátedra Unesco de Comunicação da Univer-
sidade Metodista de São Paulo, com apoio do CNPq e supervisão do
eterno professor José Marques de Melo. Doutora em Ciências da Comu-
nicação pela Universidade Nova de Lisboa. Mestre em Comunicação e
Cultura Contemporâneas pela Universidade Federal da Bahia. Gradua-
da em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Federal de
Santa Catarina. Publicações jornalísticas e científicas disponíveis em ht-
tps://rosemerilaurindoblog.wordpress.com Atuou como repórter, editora
e assessora de comunicação em empresas de Santa Catarina, Alagoas e
Bahia. Foi diretora editorial e coordenadora de grupo de pesquisa na So-
ciedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares em Comunicação (Inter-
com). Diretora da Associação Brasileira de Ensino de Jornalismo (ABEJ).
Coordenadora fundadora do Curso de Jornalismo da FURB. Em 2019 e
2020 coordenou a Central Multimídia de Conteúdo da FURB. Em 2014
recebeu o Prêmio Luiz Beltrão de Ciências da Comunicação da Intercom,
na categoria Liderança Emergente. Presidente da Comissão de Ética do
Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina.
42
PARTE 2 – DIÁLOGOS
CONTEMPORÂNEOS
43
Nesta segunda parte do livro, apresentamos 8 tex-
tos selecionados das quatro sessões realizadas a partir das
Temáticas propostas na chamada de trabalhos para o GP
Gêneros jornalísticos para o 43o Congresso INTERCOM.
São elas: Gêneros: Opinião e Informação; Gêneros, Desin-
formação e Educação Midiática; Gênero e Narrativas; e Gê-
neros, Inovações e Entretenimento. Os textos a seguir estão
organizados nessa ordem.
44
O (en)canto que vem das ruas: leituras das crônicas de
João do Rio e Luiz Antonio Simas em Comunicação So-
cial (Jornalismo)1
45
certa profundidade de significado e um certo acabamento
de forma que de repente podem fazer dela uma inesperada
embora discreta candidata à perfeição” (CANDIDO, 1981,
p.5). Para além da afirmação elogiosa do sociólogo e profes-
sor, fato é que a crônica se estrutura a partir de elementos
que se distanciam da linguagem demasiadamente erudita
ou técnica que outros gêneros textuais mobilizam e perpe-
tuam. A oralidade, os falares de diferentes regionalidades
e coloquialidades, o despojamento sintático, a perspicácia
de colher das vivências proporcionadas estilos simples que
impressionam são características bastante perceptíveis em
crônicas de diferentes autores, em diferentes épocas.
Candido, assim como Adorno o fez em “O ensaio
como forma” (1954), acaba por ressaltar as virtudes que
tornam um gênero discursivo, a princípio menosprezado,
legítimo. Aliás, há semelhanças entre ensaio e crônica se
se pensar no hibridismo envolvido em ambos. O ensaio,
destacado pelo filósofo da Escola de Frankfurt como texto
“bastardo”, poderia ser comparado à crônica que por sua
vez se apresenta como gênero essencialmente “elástico”
e mestiço, uma vez que se aproxima do conto, do artigo
de opinião, da reportagem e do próprio ensaio, a depender
do estilo de cada cronista, da relação conteúdo-forma que
a estrutura permite e do modo como cada autor a recria.
Convivem a forma relativamente estável do gênero e o esti-
lo impresso por cada autoria a cada crônica produzida.
Do grego khronikós – derivado de khrónos (tempo),
passando pelo latim chronica –, o vocábulo crônica de-
signava, no início da era cristã, uma lista ou relação de
acontecimentos ordenados segundo a marcha do tempo,
ou seja, em ordem cronológica. Justificando o nome do
gênero, os primeiros cronistas relatavam, principalmente,
acontecimentos históricos relacionados a pessoas impor-
46
tantes, como reis, imperadores, generais etc. Relatavam
visitas, ordenamentos, resoluções e ações em textos que
funcionavam como registros. Com o passar do tempo, as
crônicas passaram por transformações e acabaram por se
reportar a assuntos mais arejados, retrata pessoas comuns,
abordando questões que estão “na ordem do dia”, aspectos
pouco notórios, minúcias impensadas por outrem, enfim, se
reporta à “vida ao rés-do-chão”3.
Os primeiros registros brasileiros da crônica moder-
na datam do século XIX. Em 1828, no periódico Espelho
Diamantino, havia uma seção fixa de registro de usos e cos-
tumes da sociedade da época. Em 1839, surgiram comen-
tários livres sobre o que se passava nas ruas em jornais
como O Carapuceiro (sob a batuta de Padre Lopes Gama) e
Correio da Moda (a encargo de Martins Pena). No entanto,
somente em 1854, no Correio Mercantil, é que o jeitão da
crônica atual começa a ganhar forma pelas mãos de José
de Alencar e sua publicação semanal “Ao correr da pena”,
coluna em que narrava acontecimentos e eventos sacra-
mentando o casamento definitivo entre literatura e jornalis-
mo. Já em 1861, no Jornal do Commercio, Joaquim Manuel
de Macedo passa a escrever textos intitulados “Um pas-
seio”, caracterizando o estilo andarilho do cronista flanêur,
elemento que trava relação íntima com os devaneios, diva-
gações e errâncias de cronistas e que delimitará o recorte
do corpus a ser analisado neste projeto.
No Brasil, importantes escritores brasileiros produzi-
47
ram crônicas: Coelho Neto, José de Alencar, Machado de
Assis, Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga, João
do Rio, Luís Fernando Veríssimo, Millôr Fernandes, Nelson
Rodrigues, Clarice Lispector, Adélia Prado, Paulo Mendes
Campos, Fernando Sabino, Rubem Alves entre tantos ou-
tros. Como podemos observar, muitos romancistas brasi-
leiros se dedicaram à escrita de crônicas, não apenas, mas
também, como meio de angariar verba para o financiamen-
to de seus livros. Destinada a leituras rápidas e não durá-
veis, em virtude de sua veiculação em revistas, periódicos
e jornais (hoje sites, redes sociais e blogs), historicamente
elas conseguiram, entretanto, alcançar alguma perenidade
quando publicadas em livros e coletâneas ou, atualmente,
ao serem mantidas em plataformas digitais por um tempo
maior. A crônica, assim como os demais gêneros, sofreu e
sofrerá mudanças em função dos suportes em que é apre-
sentada. Mas há características que lhe são peculiares e
constantes: precisão, concisão e síntese; presença mar-
cante de comicidade; relação com o que lhe é contemporâ-
neo (o que lhe confere um caráter de “ata”, de registro his-
tórico de costumes, linguajares, hábitos que documentos
oficiais, por exemplo, não oferecem); mescla entre o factual
e o ficcional, entre jornalismo e literatura, entre variações
linguísticas normativas e coloquiais4.
Por vezes, as quimeras retratadas nas crônicas, jus-
48
tamente pela liberdade com que são abordadas – algo per-
mitido (e desejável) no gênero em questão –, revelam as-
pectos fundamentais para se pensar a política de um país,
a violência como projeto de nação, a riqueza das culturas
populares, as resistências, a extrema pobreza gerada pela
desigualdade social e econômica, o contexto pandêmico,
dentre outros assuntos fulcrais. Mas é pelo pequeno – pelo
detalhe – que tais recortes são pensados, estruturados, es-
critos e apresentados ao leitor. Por vezes de modo alegó-
rico, metafórico, pela chave da ironia e da despretensão.
Também por esses motivos a crônica pode ser estrategica-
mente potente.
49
O livro A alma encantadora das ruas está dividido
em quatro partes: uma primeira grande crônica isolada de
23 páginas intitulada “A rua”; um primeiro bloco nomeado
como “O que se vê nas ruas” (composto de 14 crônicas);
um segundo chamado “Três aspectos da miséria” (compos-
to de 6 crônicas) e uma terceira e última parte intitulada
“Onde às vezes termina a rua” (composta de 6 crônicas).
São 27 crônicas. Já o livro O corpo encantado das ruas não
é subdividido e apresenta 42 crônicas. Estão sendo analisa-
das, portanto, 69 crônicas ao todo.
A primeira etapa consistiu em pesquisar o gênero
crônica. Na etapa subsequente estão sendo analisadas as
duas obras em seus aspectos linguísticos, estilísticos, literá-
rios, discursivos. Para tanto, utilizamos referenciais teóricos
próprios dos campos da teoria literária, do jornalismo, da
sociolinguística e da análise do discurso: a literatura social,
descrita e estudada por Antonio Candido; o jornalismo lite-
rário segundo Edvaldo pereira Lima; as variações diafásicas
(contextuais), diatópicas (regionais), diastráticas (grupos
sociais) e históricas, bem como preconceitos linguísticos,
esmiuçados por Marcos Bagno; os gêneros discursivos, a
estética e a arquitetura das estruturas textuais, provenien-
tes de estudos de Mikhail Bakhtin. Ao longo do percurso,
outros autores e obras serão incluídos para subsidiar os
elementos provenientes das diferentes etapas de pesquisa.
Concomitantemente, um estudo sobre as religiosida-
des, musicalidades e papéis sociais, presentes em ambos
os livros que compõem o corpus de pesquisa, mostrou-se
necessário. Por exemplo, um levantamento de referenciais
que forneçam elucidações básicas a respeito de elementos
culturais africanistas e de terminologias de diferentes ma-
trizes africanas, mencionadas nas crônicas, será de suma
importância para compreensão do universo ao qual elas se
50
reportam.
Em se tratando de obras que guardam entre si uma
distância histórica de mais de cento e dez anos, o presen-
te projeto prevê um estudo comparativo que destaque as-
pectos relacionados à representação de espaços públicos
(ruas), dos sujeitos que neles circulam, das práticas políti-
cas, econômicas e socioculturais descritas nos textos, das
interações e relações de lazer e de trabalho etc.
Um eixo importante ainda a ser trabalhado é pen-
sar a crônica e a rua como memória. Coletiva, individual,
alegre, violenta, ancestral. Nesse sentido, buscaremos nos
referenciar em estudos da psicologia social, em especial os
desenvolvidos por Ecléa Bosi, e em conceitos de memória
e esquecimento explorados por Jeanne Marie Gagnbein e
Maurice Halbwachs.
Pretendeu-se ainda pensar sobre como a rua (e
outros espaços públicos) incide na formação jornalística
contemporânea, e sobre como o gênero crônica, por se
tratar de texto elástico que mescla ficção e fato, pode (ou
não) permitir: 1) a expressão jornalística de questões pou-
co aprofundadas ou reveladas em outros gêneros textuais
mais estritamente técnicos e rígidos; 2) a presença da voz
do cronista que direciona o olhar do leitor para as temáticas
abordadas sem transformar o discurso erigido em verdades
únicas e neutras, o que faz com que o leitor tome suas pró-
prias conclusões a partir do exposto; e 3) a ampliação de
perspectivas no sentido de incluir ângulos, detalhamentos
e narrativas mais plurais.
51
Pensando a rua ontem e hoje: flanação, memória,
ofício e controle
52
poemas de Baudelaire com os personagens operários de
Victor Hugo para salientar diferenças e pôr em xeque os
aspectos mencionados.
Para nosso estudo, caberia pensar em que medida o
cronista – enquanto jornalista-escritor que necessita exe-
cutar tarefas em função de seu ofício, mas também como
aquele que se permite (ou se obriga a) observar as ruas e
experienciá-las, para depois sobre elas escrever – desem-
penha os dois papéis, circulando pelas duas esferas (ócio/
ofício) separada ou concomitantemente. De que modo isso
influencia (ou não) o seu fazer, a sua percepção, a sua prá-
tica jornalística? Em tempos digitais, velozes e incessan-
tes, “sujar os sapatos”, flanando ou trabalhando, ainda é
necessário? Escrever textos em gêneros mais livres como
a crônica pode interferir no olhar da/do jornalista e, conse-
quentemente, influir na detecção e construção de diferen-
tes ângulos e narrativas do real?
No posfácio “Olhar insubordinado” do livro A vida que
ninguém vê (uma reunião de perfis e crônicas publicadas
em 1999 no Jornal Zero Hora), a jornalista e repórter Eliane
Brum – atualmente colunista do El País, colaboradora do
The Guardian e autora de oito livros – salienta sua predile-
ção por “histórias comuns”:
Sempre gostei das histórias pequenas. Das que se repe-
tem, das que pertencem à gente comum. Das desimpor-
tantes. O oposto, portanto, do jornalismo clássico. (...) O
que esse olhar desvela é que o ordinário da vida é o extra-
ordinário. E o que a rotina faz com a gente é encobrir essa
verdade, fazendo com que o milagre do que cada vida é
se torne banal. Esse é o encanto de A vida que ninguém
vê: contar os dramas anônimos como os épicos que são,
como se cada Zé fosse um Ulisses, não por favor ou exer-
cício da escrita, mas porque cada Zé é um Ulisses. E cada
pequena vida uma Odisseia (BRUM, 2006, p.187).
53
O jornalista e professor Edvaldo Pereira Lima, ao
discorrer sobre o jornalismo literário no capítulo “Histórias
com sabor e cor”, do livro Jornalismo literário para iniciantes
(2014), assinala as sinestesias decorrentes dessa verten-
te jornalística e a importância da experiência sensorial do
leitor, a partir da condução de quem escreve, e tem como
premissa “cheirar o real”:
O jornalismo literário prefere esse modo de narrar por-
que seu compromisso implícito com o leitor é dar-lhe não
apenas informação sobre alguma coisa. É fazer com que
o leitor passe pela experiência sensorial, simbólica, deen-
trar naquele mundo específico que a matéria retrata. (...)
na vida real, os lugares onde as coisas acontecem têm
cheiro. As pessoas e objetos têm formas e tamanhos. Têm
cores. Os ambientes geralmente têm sons. As pessoas fa-
lam alto ou baixo. Há ruídos em torno, barulhos distantes
podem chegar até o local. Tudo isso apela para os senti-
dos humanos (LIMA, 2014, p.15).
54
Entre a alma encantadora e o corpo encantado
das ruas
55
ses fatores também estão sendo objeto de análise. Trata-
-se de uma obra já abordada à luz de diferentes áreas de
conhecimento (literatura, sociologia, antropologia) que, no
entanto, mereceria análise, em perspectiva comparativa, a
outra obra – contemporânea e ainda não estudada – que a
ela alude logo no título: O corpo encantado das ruas. Nesse
sentido, o conceito de “regimes de historicidade”, difundido
por François Hartog, nos auxiliará a mapear e a traçar pon-
tes entre as obras, suas representações e seus contextos
de produção tendo como perspectiva os diferentes regimes
em que surgiram e ao qual se reportaram.
Luiz Antonio Simas, autor de O corpo encantado das
ruas, obra publicada em 2019, nasceu em 1967, é historiador,
professor e escritor. Formado pela UERJ, é carioca e apre-
senta em seu livro uma reunião de textos-crônicas todos
iniciados com “As ruas (...)”. Numa primeira leitura do livro
é possível perceber a forte presença da religiosidade pela
utilização de cantos, vocábulos, rimas e conceitos próprios
da Umbanda e do Candomblé. Há ainda traços marcados
da íntima relação que o cronista guarda com o samba, a
musicalidade e a “gramática dos tambores”, o que encharca
poeticamente a visão que se tem das ruas do Rio de Janeiro
da atualidade. O autor defende um fazer a partir da “escu-
lhambação criativa”5, que traduz um pouco a sua relação
com a escrita.
Embora guardem a já mencionada distância tempo-
56
ral, muito do Rio de Janeiro de 1900 se faz sentir no de
2019 nas obras desses autores. Semelhanças e diferen-
ças vão completando um quebra-cabeças que pode não
revelar uma imagem completa, mas explicita inúmeras
complexidades. As sensações vagas, as visões plurais, as
percepções ora precisas ora difusas fornecem chave para
reflexões e lampejos de entendimento sobre o que somos,
sobre de que lugares e raízes descendemos, de que manei-
ra historicamente reagimos, resistimos e também sucum-
bimos. Fantasmas e materialidades do ontem e do agora,
instantâneos de diferentes Brasis, vão emergindo dessa
leitura comparada que certamente revelará interessantes
desdobramentos a partir de análises mais detidas.
Algumas considerações
57
passa.
Já na obra de Luiz Antonio Simas, o cronista parece
evocar uma percepção outra do Rio de Janeiro contem-
porâneo. A exaltação do popular, das brincadeiras infantis
de rua, das rodas de samba, das singelezas presentes nas
quitandas, bodegas, botequins, nas músicas entoadas por
pessoas simples nas feiras, a sacralidade do comum, do
que atravessa a rua são características que atribuem aos
textos uma carga afetiva, embora igualmente crítica e con-
tundente, que comove. Não se trata mais do “complexo de
vira- lata”, da necessidade de se equiparar ao contexto ou
ao beletrismo europeu, mas sim de valorizar e resgatar as
belezas e riquezas do pequeno, do miúdo, do simples – na
linguagem e na abordagem –, o que coincide com um des-
gaste da noção de progresso pela urbanização. Nas crôni-
cas de Simas, o que frutificou a partir das resistências ne-
gras, indígenas e populares, é o que ainda vive e possibilita
respiro. O autor traduz esse movimento como “inventar a
vida no precário”, algo que ele exemplifica com a “gramática
dos tambores” ou a “imaginação percussiva”, se referindo a
como gerações de pessoas negras e pobres resistiram por
intermédio da reinvenção do cotidiano pelo samba, pelo
candomblé, pelo toque sagrado dos tambores, pela comida
profana e santa ao mesmo tempo.
Considerando-se a parte prática que subsidiou a pes-
quisa – leituras das crônicas junto a turmas de Jornalismo e
produção de reportagens-crônicas a partir do contato com
as ruas – depreende-se que o gênero em questão (crônica)
parece promover ou favorecer uma flanação literária que,
em alguma medida, prepara, dialogo, corresponde, reflete
ou impulsiona a práxis da flanação. Um termo que surgiu
para nos reportarmos ao ato de “olhar com olhos de ver” as
ruas, ainda que para lidar jornalisticamente com elas, foi a
58
flanação de ofício, algo que transitaria entre o perambular
sem amarras e as andanças em busca da matéria-prima da
escrita jornalística. Nesse sentido, o cronista parece sem-
pre se deparar com a encruzilhada. Algo metaforizado pela
alma encantadora e pelo corpo encantado das ruas.
Referências bibliográficas
59
dicos do século XIX. [S.l.]: UEFS, 2013.
GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar escrever esquecer. São
Paulo: Editora 34, 2009.
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo:
Centauro, 2003.
HARTOG, François. Regimes de historicidade – presentismo
e experiências do tempo. Belo Horizonte: Autêntica, 2015.
LIMA, Edvaldo Pereira. Jornalismo literário para iniciantes.
São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2014.
MEDINA, Cremilda. Ciência e Jornalismo: da herança positi-
vista ao diálogo dos afetos. São Paulo: Summus, 2008.
MOISÉS, Massaud. “A crônica”. In: A criação literária – prosa
e poesia. São Paulo: Cultrix, 2012.
RIO, João do. A alma encantadora das ruas. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 2012.
SANTOS, Joaquim Ferreira dos (org.). As cem melhores crô-
nicas brasileiras. São Paulo: Objetiva, 2007.
SIMAS, Luiz Antonio. O corpo encantado das ruas. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2019.
60
A cobertura da Folha de S.Paulo sobre a liberdade do
ex-presidente Lula: um estudo sobre os gêneros jorna-
lísticos que compuseram seu noticiário1
Maria Elisabete Antonioli2
Introdução
Sexta-feira, oito de novembro de 2019, o ex-presiden-
te Lula foi solto após passar 581 dias preso na Superinten-
dência da Polícia Federal, em Curitiba, pela condenação
de crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, em
função do caso do apartamento triplex situado no muníci-
pio do Guarujá, estado de São Paulo.
Um dia antes, o Supremo Tribunal Federal (STF) der-
rubou o entendimento da possibilidade de prisão depois do
julgamento em segunda instância, o que beneficiou direta-
mente o ex-presidente. Em 8 de novembro de 2019 a Folha
de S.Paulo publicou:
O que estava em debate era a constitucionalidade do ar-
tigo 283 do Código de Processo Penal, que diz que, em
razão de condenação, ninguém pode ser preso exceto se
houver “sentença condenatória transitada em julgado” —
ou seja, quando não couber mais recurso. Para a maioria
dos ministros, esse artigo do Código de Processo Penal
condiz com o que está escrito no artigo 5o da Constitui-
ção: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito
em julgado da sentença penal condenatória”.
61
petição na Justiça do Paraná, solicitando a soltura do ex-
presidente. Após a liberdade de Lula, o jornal trouxe na pri-
meira página a manchete: “Após 580 dias, Lula deixa a pri-
são e ataca PF, Lava Jato e Bolsonaro”. Assim como a Folha
de S.Paulo, as mídias nacional e internacional cobriram não
apenas a saída do ex-presidente da prisão, mas também
seu discurso no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernar-
do do Campo posteriormente, como também, outros even-
tos dos quais ele participou no decorrer dos dias seguintes.
Diante desse cenário político e de grande audiên-
cia midiática, foi realizada uma pesquisa com os objetivos
de: acompanhar as matérias publicadas no jornal Folha de
S.Paulo sobre o ex-presidente Lula, após sua liberdade, e
verificar qual a composição dos gêneros jornalísticos es-
tava presente nessas publicações. Foram pesquisadas dez
edições do jornal, a partir da data em que o ex-presidente
foi solto: 8 de novembro de 2019.
A hipótese levou em consideração que o gênero opi-
nativo teria um número expressivo de publicações, pois os
articulistas e convidados do jornal emitiriam suas opiniões
e o próprio veículo poderia se manifestar por meio de edi-
torial.
Para compor a pesquisa, os gêneros jornalísticos fo-
ram objeto de estudo, tendo como referência a classifica-
ção proposta por José Marques de Melo. Quanto à questão
metodológica, foram utilizados os estudos de Análise de
Conteúdo, de caráter quantitativo e de caráter qualitativo,
conforme as referências de Laurence Bardin.
62
Sobre o jornal Folha de S.Paulo
63
tima de um câncer no pâncreas. Em seu lugar, assumiu a
direção de redação, sua irmã, Maria Cristina Frias, que aca-
bou ficando pouco tempo, pois seu irmão Luiz Frias me-
diante uma disputa judicial conseguiu destitui-la, após seis
meses no cargo. Ao final, o jornalista Sérgio Dávila assumiu
a posição de diretor de redação, com aprovação da maioria
dos acionistas. Jornalista na Folha de S.Paulo há 25 anos,
Dávila era editor-executivo desde 2010.
Atualmente, a Folha tem como presidente Luiz Frias
e seu conselho editorial é composto por: Rogério Cezar de
Cerqueira Leite, Marcelo Coelho, Ana Estela de Sousa Pin-
to, Cláudia Collucci, Hélio Schwartsman, Heloísa Helvécia,
Mônica Bergamo, Patrícia Campos Mello, Suzana Singer,
Vinicius Mota, Antonio Manuel Teixeira Mendes, Luiz Frias
e Sérgio Dávila (secretário).
64
É relevante considerar, também, os estudos pioneiros
sobre os gêneros jornalísticos no Brasil nos anos de 1960,
realizados por Luiz Beltrão que, como o próprio José Mar-
ques de Melo (2010) diz, se tornaram a sua principal fonte
de referência. Para Marques de Melo (1985), Beltrão foi o
pesquisador que se preocupou sistematicamente com esse
fenômeno. Nesse sentido, Costa (2010) lembra da trilogia
de obras publicadas por Beltrão: A Imprensa Informativa
(1969), Jornalismo Interpretativo (1976) e Jornalismo Opina-
tivo (1980).
Marques de Melo (2010) também lembra da pesqui-
sa pós-doutoral de outro pesquisador, o professor Manuel
Carlos Chaparro:
Se não altera substancialmente a compreensão dos gêne-
ros jornalísticos, sua contribuição adquiriu relevância pela
precisão que atribuiu ao conceito de gênero, entendido
como categoria abrangente, ou classe, agrupando suas
variantes em espécies, o que ajudou a ordenar o universo
textual, neutralizando a tendência de fragmentação a que
minha geração foi induzida pelos pioneiros no estudo dos
gêneros jornalísticos (MARQUES DE MELO, 2010, p. 27).
65
nativo. Para o pesquisador, o monolitismo era uma carac-
terística dos primeiros jornais e revistas publicados no Bra-
sil, pois eram considerados obra de uma só pessoa. Como
exemplo, Marques de Melo cita o primeiro jornal brasileiro,
O Correio Braziliense, “cuja unidade opinativa deve-se à
circunstância de haver sido produzido solitariamente por
Hipólito da Costa” (1985, p. 77).
Conforme o autor, o jornalismo informativo ganha he-
gemonia no século XIX, por meio da imprensa norte-ameri-
cana, mas o jornalismo opinativo não desapareceu, apenas
teve seu espaço reduzido. Afirma também que, desde que
a imprensa se organizou como empresa com equipes de
funcionários e colaboradores a “expressão da opinião frag-
mentou-se seguindo tendências até mesmo conflitantes”
(MARQUES DE MELO, 1985, p. 77).
Conforme já exarado neste trabalho, o Jornalismo
Opinativo, de acordo com a classificação de José Marques
de Melo apresenta os formatos: editorial, comentário, arti-
go, resenha, coluna, crônica, caricatura, carta.
Editorial
66
Para o pesquisador, a criação do editorial é uma ativi-
dade complexa, pois passa por um processo sofisticado de
depuração dos fatos, de conferência de dados e de checa-
gem das fontes.
A decisão é tomada pela diretoria, funcionando o edi-
torialista, que se imagina alguém integrado na linha da
instituição, como intérprete dos pontos de vista que se
convenciona devam ser divulgados. Além disso, o conta-
to com personalidades externas à organização significa a
sintonização com as forças de que depende o jornal para
funcionar ou cujos interesses defende na sua política edi-
torial (MARQUES DE MELO, 1985, p. 81).
Comentário
67
profissional de grande experiência e um observador privi-
legiado, “que tem condições para descobrir certas tramas
que envolvem os acontecimentos e oferecê-las à compre-
ensão do público”. Em comparação ao editorial, o pesqui-
sador afirma que, enquanto o primeiro trata da emissão de
fatos de maior relevância, o segundo, além de examinar os
fatos mais significativos, mas de menor abrangência, são
independentes da linha editorial. Assim a responsabilidade
do comentário é do próprio comentarista que, como Ana
Regina Rêgo e Maria Isabel Amphilo (2010, p. 104) afirmam:
“é um profissional valorizado, devido a sua bagagem cultu-
ral, estando apto para emitir opiniões e valores, sendo visto
pela sociedade como um líder de opinião”.
Artigo
68
e vincula-se à assinatura do autor. Quanto à finalidade do
artigo, Marques de Melo diz que há dois tipos: doutrinário e
científico. O doutrinário corresponde ao artigo jornalístico e
o científico com o objetivo de divulgar os avanços da ciên-
cia, por meio de novos conceitos e conhecimentos.
Luiz Beltrão (1980) comenta que o artigo possui ca-
racterísticas do editorial, quanto à topicalidade (estilo e
natureza) e quanto à estrutura (título, introdução, discus-
são/argumentação e conclusão). No entanto, não implica
em responsabilidade para o editor. “Em regra, os autores
de artigos são pensadores, escritores e especialistas em
diversos campos, e cujos pontos de vista interessam ao
conhecimento e divulgação do editor e seu público típico”
(BELTRÃO, p. 65, 1980).
Resenha
69
É importante, ainda, o registro de Ana Regina Rêgo
e Maria Isabel Amphilo (2010) sobre a resenha, enquanto
categoria do gênero opinativo, que continua em evolução e
às vezes aparece de forma mais elaborada ou mais simples,
de acordo com o público-alvo do veículo.
Coluna
Crônica
70
a partir da observação do próprio narrador ou tomando
como fonte de referência as informações coligidas junto
a protagonistas ou testemunhas oculares (MARQUES DE
MELO, 1985, p. 123).
Caricatura
71
ser recursos gráficos informativos ou explicativos. Para o
pesquisador, a opinião se manifesta por meio da caricatura,
pois a finalidade satírica pressupõe juízos de valor.
Enquanto gênero jornalístico, a caricatura cumpre uma
função social mais profunda que a emissão rotineira da
opinião nos veículos de comunicação coletiva. É que a
imagem, na imprensa, motiva de tal modo o leitor e produz
uma percepção tão rápida da opinião que se torna instru-
mento eficaz de persuasão (MARQUES DE MELO,1985,
p. 123).
Carta
72
obedece a critérios de edição que se coadunam com a
política editorial da empresa. Como nem todas as cartas
recebidas podem ser publicadas, há uma triagem, uma
seleção (MARQUES DE MELO, 1985, p. 123).
73
Sobre a pesquisa efetuada
3 Deve ser observado que, por se tratar de jornal impresso, o fato é publicado
no dia seguinte após ocorrido.
74
da maioria das edições, ou seja, das 10 edições analisadas,
sete citavam o ex-presidente e em apenas três ele não es-
tava presente. Outro aspecto, se refere as três entrevistas
contabilizadas. Nenhuma foi feita diretamente com Lula,
mas sim, com outros entrevistados que o citaram.
Quanto ao gênero opinativo foi possível constatar o
elevado número de publicações. De um total de 137 publi-
cações, 66 eram opinativas. Se comparadas as do gênero
informativo, verifica-se que o número é alto e quase alcan-
çou as 71 matérias informativas. Foram 15 artigos, 17 co-
mentários, 10 colunas, 22 cartas e 2 editoriais. Nessa con-
dição, também deve ser observado que o jornal impresso
ainda possui um perfil informativo. Portanto, uma diferença
de apenas cinco publicações representa uma quantidade
pouco significativa.
Um destaque interessante é para o número de cartas
publicadas. Vinte e duas cartas, sendo que em 10, os leito-
res foram críticos ao ex-presidente Lula, nove foram favorá-
veis e três comentaram apenas a situação.
Já em relação aos dois editoriais publicados, um foi
crítico ao discurso de Lula, após sair da prisão. Outro edi-
torial não se reportava diretamente ao ex-presidente, mas
uma crítica a Bolsonaro que ameaçou Lula com a Lei de
Segurança Nacional. Há um editorial publicado em 17 de
outubro, intitulado “Chega de Guinadas – No julgamento da
prisão após a 2a instância, STF deveria favorecer estabilida-
de”, que não cita Lula, mas há um posicionamento do jornal
de que o STF deveria manter o entendimento previsto, e
não derrubar como acabou ocorrendo. Este editorial foi pu-
blicado antes do período definido para esta pesquisa, mas
deve ser mencionado pois colabora para a compreensão
da posição do jornal perante o tema.
75
Dos 15 artigos publicados,13 eram de jornalistas da
Folha. Dois artigos eram de professores. Desses dois ar-
tigos um foi favorável a Lula e o outro analisou o contexto
político entre Lula e Bolsonaro. Dois jornalistas da Folha
criticaram o ex-presidente e um foi favorável. Dois jornalis-
tas criticaram o julgamento do Supremo Tribunal Federal e
citaram o ex-presidente. Sete jornalistas escreveram sobre
a polarização Lula x Bolsonaro e um escreveu sobre Bolso-
naro, mas citou o ex-presidente.
Das 10 colunas publicadas, 3 eram de jornalistas da
Folha: uma foi favorável a Lula, outra, uma sátira e a últi-
ma, uma análise da situação do ex-presidente. As outras
7 escritas por professores, roteirista, economista, servidor
público e jornalista/escritor se dividiram entre: duas favorá-
veis à decisão do STF, com citação a Lula, duas favoráveis
ao próprio Lula, duas sobre a polarização Lula x Bolsonaro
e a última sobre os golpes na América Latina, com citação
favorável a Lula. Verifica-se assim, que a maioria dos colu-
nistas externos foram favoráveis ao ex-presidente.
No conjunto dos textos opinativos entre colunas e
artigos foi possível verificar que os colunistas e articulistas
externos foram mais favoráveis ao ex-presidente do que os
jornalistas do veículo. O que ficou bastante claro, também,
é que a própria Folha de S.Paulo, por meio de seu editorial
foi contra a posição do Supremo Tribunal Federal, sendo
acompanhada por alguns jornalistas em seus textos. Nesse
sentido, é possível presumir que, sendo contra a decisão do
STF o jornal era desfavorável também à liberdade de Lula.
76
Considerações Finais
77
Referências bibliográficas
78
O Fact-checking à Luz da Teoria dos Gêneros Jorna-
lísticos: o Jornalismo Interpretativo e seu Potencial de
Educar para as Mídias1
Edson Francisco LEITE JUNIOR2
Introdução
79
checking à luz da teoria dos gêneros jornalísticos, para
efeitos de análise, este trabalho irá analisar apenas as
iniciativas brasileiras que possuem o selo da International
Fact-checking Networking (IFCN), uma organização,
sediada no Instituto Poynter, nos Estados Unidos, que
avalia anualmente iniciativas de checagem em todo o
mundo a partir de doze critérios, baseados na transparência
dos processos e escolhas, política pública de correções e
apartidarismo. A certificação da IFCN funciona como um
selo de qualidade internacional, que também obedece ao
princípio da transparência, uma vez que os processos de
avaliações das agências ficam disponíveis ao público no site
da instituição. Em outubro de 2020, havia 84 signatários e
as agências Lupa, Aos Fatos e Estão Verifica eram as únicas
brasileiras verificadas e ativas. De acordo com a IFCN, a
iniciativa Truco, da Agência Pública, teve sua avaliação
expirada3.
Voltando ao foco deste trabalho, a hipótese inicial é
que o fact-checking se enquadraria dentro do jornalismo
interpretativo, de acordo com o modelo proposto por José
Marques de Melo (2009) uma vez que sua principal função
seria educativa ao esclarecer a sociedade sobre o que seria
uma informação verdadeira ou falsa.
80
sando nisso, Ireton e Posetti (2018, p.7) adotam essa es-
tratégia de diferenciação e explica que o termo fake news
(notícias falsas) é evitado “porque “notícias” significam in-
formações verificáveis de interesse público, e as informa-
ções que não atendem a esses padrões não merecem o
rótulo de notícias”, já desinformação, termo que tem sido
preferido, principalmente por acadêmicos, se refere a “ten-
tativas deliberadas (frequentemente orquestradas) para
confundir ou manipular pessoas por meio de transmissão
de informações desonestas”.
Apesar disso, é inegável o quão popular se tornou o
termo fake news, que é disseminado por toda a sociedade,
embora nem sempre com o significado correto.
Atribui-se o rótulo de fake news àquelas notícias que
se têm a intenção de deslegitimá- las, apenas pelo fato de
não se concordar com o que se lê, ouve ou vê nos jornais,
revistas ou nas telas da TV, computadores e celulares. E,
dessa forma, descredita-se também o próprio jornalismo
enquanto instituição.
O que pode ajudar a explicar esse fenômeno é o fato
de que a construção da realidade é resultado da reação dos
indivíduos diante dos acontecimentos. Ou seja, as ideias
são construídas não apenas pelo o que é exposto aos in-
divíduos, mas também pela forma como a informação ex-
posta se relaciona com seu corpo, acionando experiências,
memórias, emoções e sentimentos. Assim, as emoções e
sentimentos são ativados na construção do pensamento de
cada pessoa e, por consequência, na tomada de decisões,
o que leva as pessoas a selecionar a informação que mais
favorece a decisão que já estava inclinada a tomar (CAS-
TELLS, 2013).
Isso leva os indivíduos, muitas vezes, a abrir mão da
81
realidade ou da verdade em prol de suas crenças e posicio-
namentos pessoais. Assim, a convicção prevalece mesmo
diante de provas e evidências materiais. Dessa forma, a es-
sas situações, em que fatos objetivos são menos influentes
na formação da opinião pública do que apelos à emoção e
à crença pessoal, dá-se o nome de pós-verdade (OXFORD,
2016).
No entanto, o termo “pós-verdade” tem sido critica-
do por pesquisadores como Berckemeyer (2017, p. 26-27).
Ele acredita ser mais oportuno não usar o termo verdade,
mesmo acompanhado do prefixo pós. Para o autor, é pre-
ferível chamar esse tipo de conteúdo de “mentira”, “farsa”
ou “engano”. Para ele, pós-verdade trata-se de um conceito
artificial, carregado de modismo, para referir-se a algo que
sempre existiu na humanidade e minimiza e atenua o quão
grave é esse fenômeno que tem como resultado a desin-
formação.
Nesse cenário, a partir dos anos 2000, apesar da
checagem de dados não ser uma novidade do jornalismo
(faz parte - ou pelo menos deveria fazer - da sua rotina pro-
dutiva), surgiram as primeiras iniciativas de checagem após
a publicação voltada para as declarações feitas por figuras
públicas nos moldes que conhecemos hoje e a esse fenô-
meno deu-se o nome de fact-checking. (SPINELLI; SAN-
TOS, 2018).
O Fact-checking no Brasil
82
terem ocorrido experiências desse tipo de formas pontuais
e descontinuadas desde 2010, principalmente em períodos
eleitorais, como foi o caso do Mentirômetro e do Promessô-
metro, do jornal Folha de S. Paulo em 2010, e os blogs Preto
no Branco, do jornal O Globo, e Truco, da Agência Públi-
ca, ambos em 2014. No entanto, há uma guerra de versões
para detectar qual seria a primeira iniciativa.
Lupa diz ser em seu site a primeira agência de fact-
-checking brasileira, tendo sido fundada em 1o de novembro
de 2015. E de lá pra cá, já produziu checagens nos mais
diversos formatos (texto, áudio e vídeo), tendo divulgado
suas verificações em jornais, revistas, rádios, sites, canais
de televisão e redes sociais.4 No entanto, a agência Aos Fa-
tos, também em seu site, afirma ser a primeira plataforma
brasileira de checagem contínua e sistemática, oferecendo
a data de 7 de julho de 2015 como o marco de criação5.
Entram ainda nessa guerra de versões outros dois sites es-
pecializados em desmentir boatos: o Boatos.org (criado em
2013) e o E-farsas, que afirmar acabar com a as fake news
desde 2002 (SEIBT, 2019).
E longe dessa briga de versões que reivindicam ser
a primeira agência de fact-checking brasileira, encontra-se
a iniciativa Estadão Verifica, criada em 1o de junho de 2018.
Especializado em política, trata-se do núcleo de checagem
de fatos do jornal O Estado de S. Paulo6.
83
Gêneros Jornalísticos e Fact-checking
84
Chaparro (2000, p 100) acredita que a simples sepa-
ração do jornalismo entre informação e opinião acaba por
tornar a discussão superficial e “torna cínica a sua prática
profissional”. Para o autor, o jornalismo não pode ser dividi-
do entre opinião e informação porque, em sua visão, ele é
construído de forma híbrida. Ou seja, para Chaparro (2000),
nos conteúdos, tanto a opinião quanto a informação per-
manecem na intencionalidade do jornalista ao escrever, in-
dependente da estrutura formal que apresenta.
Segundo Chaparro (2000, p. 110), “face à dinâmica e
ao grau de complicação das interações que o jornalismo
viabiliza no mundo atual, já não é possível explicar e en-
tender a ação discursiva do jornalismo pela dicotomia Opi-
nião/Informação”. Jorge Pedro Sousa concorda com essa
visão e explica que isso ocorre porque “os gêneros jorna-
lísticos não têm fronteiras rígidas e, por vezes, é difícil clas-
sificar uma determinada peça, até porque, consideradas
estrategicamente, todas as peças jornalísticas são notícias,
se aportarem em informação nova” (SOUSA, 2005, p. 168).
Os gêneros jornalísticos correspondem a determinados
modelos de interpretação e apropriação da realidade
através de linguagens. [...] A realidade não contém notí-
cias, entrevistas, reportagens, etc. Sendo uma forma de
interpretação apropriativa da realidade, os gêneros jorna-
lísticos são uma construção e uma criação. Obviamente
que, uma vez criados, os gêneros jornalísticos passam,
também eles, a fazer parte da realidade, que paradoxal-
mente, referencial. [...] Os gêneros jornalísticos existem
em determinados momentos e contextos sócio-histórico-
-culturais. Há, certamente, gêneros jornalísticos que ain-
da não viram a luz do dia e outros que já não se praticam.
(SOUSA, 2005, p. 168-169)
85
veis, variáveis, dinâmicos, às vezes até mesmo contraditó-
rios e irregulares” (ALVES FILHO, 2011, p. 20). Assim, essa
natureza híbrida que hoje pode ser encontrada no jornalis-
mo contribui com a ideia de que “os gêneros passaram a
ser vistos como formas de organizar dinamicamente a co-
municação humana e de expressar diversos significados de
modo recorrente” (ALVES FILHO, 2011, p. 21).
Mesmo assim, “não se pode negar que a classificação
dos textos tem suas utilidades” (ALVES FILHO, 2011, p. 23).
Até porque não podemos desprezar a primeira separação
no Jornalismo, proposta por Buckley, da qual deriva todas
as demais. Ana Carolina Temer (2009, p. 181), mesmo reco-
nhecendo que os gêneros como um espécie de categorias
que congregam trabalhos semelhantes (em relação a es-
trutura e estética textual), acredita que o fator fundamental
e o conceito chave que define os gêneros recorrentes na
mídia é a “promessa de conteúdo, ou de uma possibilidade
de conteúdo, uma espécie de contrato previamente acor-
dado entre emissor e receptor”.
E ao tentar descrever “o sistema de organização do
trabalho cotidiano de codificação das mensagens de atu-
alidade”, José Marques de Melo (2003, p. 11), apresenta o
seguinte panorama dos gêneros jornalísticos: informativo
(vigilância social), opinativo (fórum de ideias), interpretativo
(papel educativo, esclarecedor), diversional (distração, la-
zer) e utilitário (auxílio das tomadas de decisão cotidianas).
Focando no gênero interpretativo, uma vez que a hi-
pótese inicial deste trabalho é que o fact-checking se insere
nessa categoria, é preciso entender que a interpretação é
“uma das características básicas do jornalismo, o que vale
dizer uma atitude de ofício do agente da informação de atu-
alidade” (BELTRÃO, 1980, p. 47). Assim, a interpretação jor-
nalística consiste na análise preliminar a qual os jornalistas
86
submetem os dados que recolhem a uma seleção crítica.
Se o jornalista ultrapassa os limites da busca do sentido
das diferentes forças que atuam em uma situação, confi-
gurada em suas origens e em suas possíveis projeções, se
submete os dados colhidos e o sentido encontrado a uma
escala de valores própria, pessoal, estará em pleno domí-
nio da opinião. Se, por outro lado, menospreza, camufla
ou subtrai aspectos essenciais à exata compreensão do
acontecimento ou destaca, apenas, aqueles de natureza
impactual e facilmente perceptíveis, estará no campo da
informação mutilada, superficial e/ou sensacionalista.
(BELTRÃO, 1980, p. 48)
87
classificar produtos, gêneros e formatos jornalísticos, para
avaliar características da produção de indivíduos, grupos e
organizações, para identificar elementos típicos, exemplos
representativos e discrepâncias” (HERSCOVITZ, 2007, 123).
Além disso, trata-se de uma metodologia eficaz para se fa-
zer inferências sobre algo publicado.
“Os pesquisadores que utilizam a análise de conteúdo
são como detetives em busca de pistas que desvendem
os significados aparentes e/ou implícitos dos signos e
das narrativas jornalísticas, expondo tendências, confli-
tos, interesses, ambiguidades ou ideologias presentes
nos materiais examinados.” (HERSCOVITZ, 2008, p. 127)
88
No texto, a agência de checagem deixa claro que seu foco
é verificar declarações de políticos e autoridades, principal-
mente aqueles que estão no poder, porque possuem mais
relevância.
Dessa forma, embora afirme que preza pela plurali-
dade e pela busca de acompanhar todos os lados envolvi-
dos no debate político, agentes políticas que detém o poder
é prioridade de Aos Fatos, que afirma ainda que não checa
opiniões, previsões ou tópicos de pouca relevância para
o debate público por envolverem vícios de linguagem ou
questões íntimas dos agentes públicos.
Depois de todo o processo de checagem, a informa-
ção passa então a ser classificada como verdadeira, impre-
cisa, exagerada, contraditória, insustentável, distorcida ou
falsa. Entre os sete selos de classificação, quatro se aplicam
apenas a declarações. Cada um tem um significado, con-
forme explicação do portal de checagem.
Para além da sessão de checagem de declarações,
o site também tem páginas dedicadas a investigações e
explicações. Na seção “investigamos”, as reportagens são
mais extensas e utilizam jornalismo de dados, com infor-
mações históricas, levantamentos e maior contextualização
das informações. Já na seção “explicamos”, as produções
buscam responder a perguntas que começam com “como”,
“por que”, “o que”, e possuem caráter mais educativo, no
sentido de esclarecer dúvidas sobre assuntos do momento.
Aprofundando um pouco mais nos conteúdos das
iniciativas de checagem, tanto a agência Lupa quanto a ini-
ciativa Estadão Verifica apresentam em suas homepages as
suas checagens de forma única, sem dividí-las por catego-
rias, enquanto Aos Fatos possui o que podemos chamar de
cinco editorias principais: checamos, investigamos, expli-
89
camos, nas redes e outros. E dentro de outros, são encon-
tradas outras dez subdivisões: Radar, Tempo Real, Manuais,
Eleições 2020, Aos Gráficos, Análises, HQ, Aos Fatos Lab,
Eleições 2018 e Tudo.
No entanto, vale destacar que a agência Lupa até
tenta realizar uma subdivisão temática do trabalho apre-
sentado. No entanto, a maioria está desatualizada o que faz
com essa subdivisão não faça tanto sentido na prática. Mas
com um processo de checagem muito parecido com Aos
Fatos, a agência Lupa se diferencia de Aos Fatos, principal-
mente, por também realizar o trabalho de debunking, que é
a verificação de conteúdo publicado por fontes não oficiais
(Aos Fatos trabalha apenas com fontes oficiais).
Outra diferença encontrada no modelo de análise da
agência Lupa, comparada com Aos Fatos, é que ela apre-
senta nove etiquetas (Aos Fatos possui apenas sete) para
classificar tudo o que analisa: verdadeiro; verdadeiro, mas;
ainda é cedo para dizer; exagerado; contraditório; subesti-
mado; insustentável; falso e de olho.
Por fim, a iniciativa Estadão Verifica sequer apresen-
ta selos formais para identificar os conteúdos que analisa.
No entanto, ao explicar o seu método de checagem, afirma
utilizar a classificação de Claire Wardle (2017) para os sete
tipos de desinformação existentes, na visão da autora: con-
teúdo inventado (quando o conteúdo é 100% falso), conteú-
do manipulado (quando o conteúdo – texto ou imagem – é
manipulado com a intenção de enganar), conteúdo enga-
noso (quando ocorre o uso enganoso de uma informação
para enquadrar uma situação ou indivíduo), conteúdo im-
postor (quando fontes genuínas são imitadas), falso con-
texto (quando o contexto de uma informação é fraudado ou
omitido), falsa conexão (quando a titulação ou manchetes
não correspondem com seu conteúdo) e sátira ou paródia
90
(quando o conteúdo de humor não tem a intenção de pre-
judicar, mas apresenta potencial para enganar).
De qualquer maneira, a análise dos dados coletados
nos sites das três iniciativas de checagem analisadas per-
mite a inferência de que o fact-checking pode ser enqua-
drado dentro do gênero interpretativo, mais especificamen-
te sob no formato de análise, conforme o modelo proposto
por José Marques de Melo (2009). A observação de como
os próprios sites se estruturam e dispõem seu conteúdo
evidencia a intenção de esclarecer e desfazer enganos,
dando a essas iniciativas de fact-checking, um papel edu-
cativo, na iniciativa de trazer ao leitor informações necessá-
rias para decisões políticas e/ou cotidianas.
No caso da agência Lupa, especificamente, cabe
ainda destacar o projeto Lupa Educação que reforça ainda
mais caráter educativo do fact-checking ao promover pa-
lestras e cursos de aperfeiçoamento tanto no Brasil quanto
no exterior. Ao oferecer aos cidadãos uma educação midiá-
tica que os tornem capazes de, por conta própria, checarem
a veracidade de fatos que lhes são expostos, há um empo-
deramento desses cidadãos e lhes é garantido, assim, um
direito básico e fundamental que é o direito à informação.
Para José Marques de Melo (1986), o direito à infor-
mação é uma categoria em processo de configuração, situ-
ada na fronteira entre o direito de comunicação (liberdade
de expressão e de pensamento) e o direito de educação
(aprendizagem do conhecimento acumulado). Claude-Jean
Bertrand (2002, p. 41) é ainda mais taxativo ao dizer que
“na prática, o indivíduo não dispõe de nenhum de seus di-
reitos se não possuir um deles: o de saber. Todo direito se
conquista, e, depois, se defende sem tréguas. Ora, nesse
combate, se não tiver informado, o ser humano está desar-
mado”.
91
Justamente por isso, não basta que a lei assegure,
de forma universal, liberdade de expressão. É preciso do-
tar a todos da capacidade de saber, fazer, transformar, criar.
Até porque, para comunicar e expressar livremente fatos e
ideias, o domínio do código linguístico e o livre acesso aos
conteúdos que permitirão produzir, difundir e divulgar men-
sagens são pressupostos fundamentais.
Considerações Finais
92
ouvem. Nem comunicam autonomamente, nem se sentem
motivados para buscar informação – ainda mais uma infor-
mação confiável e de qualidade. E consequentemente não
participam da vida em sociedade, limitando-se a legitimar
os que falam e decidem o que os outros devem ouvir e falar.
(MARQUES DE MELO, 1986, p. 70)
Em outras palavras, os cidadãos que se limitam a
consumir pouca informação – ou uma informação de pou-
ca qualidade –, inseridos em um meio repleto de desinfor-
mação, acabam adotando um “comportamento passivo,
acrítico, que imobiliza grande parte da nossa sociedade”
(MARQUES DE MELO, 1986, p. 75). E essa atitude tem
como consequência a preferência pelo consumo de pro-
dutos midiáticos facilmente digeríveis e que acabam por
promover a desinformação na sociedade.
Portanto, a conquista do direito à educação deve
ser anterior ao direito à informação, sendo o segundo con-
sequência do primeiro. Isso porque “garantir a educação
para todos, educação de boa qualidade, que permita aos
cidadãos compreender o mundo em que vivem e adquirir
habilidades para o desempenho cívico/profissional, consti-
tui o fundamento do direito à informação” (MARQUES DE
MELO, 1986, p. 73).
E negar o direito à informação – e também à edu-
cação – é negar a própria cidadania. Romper esse ciclo
implica em educar os cidadãos para consumir informação
confiável e de qualidade, combatendo a desinformação.
Como consequência, eles descobrirão os direitos básicos
de cidadania e lutar por eles (MARQUES DE MELO, 1986).
Por isso a importância das iniciativas de fact-checking de
desenvolverem seu potencial para a educação midiática.
93
REFERÊNCIAS
ALBERTOS, José Luis Martínez. Curso general de redaccion
periodistica: linguaje, estilos y géneros periodísticos em
prensa, radio, televisión y cine. Madri: Paraninfo, 1993.
ALVES FILHO, Francisco. Gêneros jornalísticos: notícias e
cartas de leitor no ensino fundamental. São Paulo: Cortez,
2011.
BELTRÃO, Luiz. Jornalismo interpretativo: filosofia e técnica.
Porto Alegre: Sulina, 1980.
BERCKEMEYER, Fernando. A pós-verdade: entre a falsida-
de e o engano. UNO, São Paulo, n 27, p. 26-30, 2017.
Disponível em: https://www.revista-uno.com.br/
wp-content/uploads/2017/03/UNO_27_BR_baja.pdf.
Acesso em: 02 abr. 2020.
BERTRAND, Claude-Jean. A deontologia dos media. Coim-
bra: MinervaCoimbra, 2002.
BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão, seguido de A influ-
ência do jornalismo e Os jogos olímpicos. Rio de Janeiro: J.
Zahar, 1997.
CASTELLS, Manuel. O poder da comunicação. Lisboa: Fun-
dação Calouste Gulbenkian, 2013.
CHAPARRO, Manuel Carlos. Sotaques d’aquém e d’além
mar: percursos e géneros do Jornalismo português e brasi-
leiro. Santarém: Jortejo, 2000.
HERSCOVITZ, Heloisa Golbspan. Análise de conteúdo em
jornalismo. In: LAGO, Cláudia; BENETTI, Marcia. Metodo-
logia de pesquisa em jornalismo. Petrópolis: Editora Vozes,
2007.
94
HOHENBERG, John. Manual de Jornalismo. Rio de janeiro:
Fundo de Cultura, 1962.
IRETON, Cherilyn; POSETTI, Julie. Journalism, fake news &
disinformation: handbook for journalism education and trai-
ning. UNESCO Publishing, 2018.
MARQUES DE MELO, José. A opinião do jornalismo brasilei-
ro. Petrópolis: Vozes, 1985.
MARQUES DE MELO, José. Comunicação: direito à infor-
mação. Campinas, SP: Papirus, 1986.
MARQUES DE MELO, José. O desafio do estudo dos gê-
neros. Pauta Geral, Salvador, n.5, p.11- 20, 2003. Entrevista
concedida a Tatiana Teixeira.
MARQUES DE MELO, José. Jornalismo: compreensão e
reinvenção. São Paulo: Saraiva, 2009.
MARQUES DE MELO, José; ASSIS, Francisco de. Gêneros
e formatos jornalísticos: um modelo classificatório. Inter-
com: Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, v. 39,
n. 1, p. 39- 56, 2016.
PENA, Felipe. Teoria do jornalismo. São Paulo: Contexto,
2005.
SOUSA, Jorge Pedro. Elementos de jornalismo impresso.
Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2005.
TEIXEIRA, José Antônio. Jornalismo de opinião. Rio de Ja-
neiro: Folha dirigira, 2002.
OXFORD LEXICO. Definition of post truth. Oxford, 2016. Dis-
ponível em <https://www.lexico.com/en/definition/post-
-truth>. Acesso em 7 out. 2020.
SEIBT, Taís. Jornalismo de verificação como tipo ideal: a prá-
tica de fact-checking no Brasil. Tese (Doutorado em Comu-
95
nicação) Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFR-
GS). Porto Alegre, p. 265. 2019.
SPINELLI, Egle Müller; SANTOS, Jéssica de Almeida. JOR-
NALISMO NA ERA DA PÓS- VERDADE: fact-checking
como ferramenta de combate às fake news. Revista Obser-
vatório, v. 4, n. 3, p. 759-782, 2018.
TEMER, Ana Carolina Rocha Pessôa. Gêneros e gêneros:
apontamentos teóricos sobre os conceitos e sua atribuição
ao jornalismo feminino. Comunicação & Sociedade, São
Bernardo do Campo, ano 30, n.51, p.177-200, jan./jun. 2009.
WARDLE, Claire. Fake news. It’s complicated. First Draft, v.
16, 2017. Disponível em: <https://firstdraftnews.org/latest/
fake-news-complicated/> Acesso em: 07/10/2020.
96
A Reportagem Interpretativa como Gênero da Checa-
gem: Reflexões sobre a Experiência do NUJOC1
Marcio da Silva GRANEZ2
Introdução
97
CHEVA, 2020) que a imitação do formato da notícia é um
aspecto recorrente das notícias falsas. Elas buscam des-
sa forma a credibilidade associada à imprensa para fins de
propagar desinformação.
Nesse sentido, apresenta-se aqui uma análise dos
formatos textuais utilizados na checagem de informações
falsas, e uma proposta de interpretação. Trata-se de um pri-
meiro olhar resultante da experiência do autor na checa-
gem de informações junto ao Núcleo de Pesquisa em Jor-
nalismo e Comunicação – NUJOC, da Universidade Federal
do Piauí.
98
de forma ágil e direta. O editorial é opinativo porque traz a
apreciação valorativa do grupo jornalístico sobre determin-
do fato. E assim sucessivamente.
A função que o texto desempenha – informar, opinar,
entreter etc. – é uma qualidade inerente aos gêneros, e por
isso merece atenção ao se considerar o tipo textual mais
adequado para determinadas finalidades. A função do en-
tretenimento, por exemplo, vem sendo largamente utilizada
na cobertura esportiva, talvez pela proximidade temática
entre o esporte e a “leveza” do assunto, que permite toque
mais informal e autoral no nível discursivo.
O mesmo se pode dizer da abordagem feita pelos ca-
dernos de cultura, nos quais o o gênero diversional se faz
presente na forma de jornalismo literário. Por outro lado, a
“objetividade” da notícia prevalece nos textos cuja função
é reportar ou relatar o fato. A função precípua de informar
– sem comentário e sem o toque autoral – coloca a seu
serviço toda a narrativa da notícia.
Dessa foma, funções específicas plasmaram ao longo
do tempo formas discursivas também específicas de abor-
dagem no jornalismo. Atualmente, apresenta-se a questão
da checagem de informações no contexto da pademia da
Covid-19, cujo primeiro caso reportado no Brasil foi em
março de 2020.
Os esforços para combater as fake news ou a desin-
formação vêm sendo coordenados por diversos setores,
que incluem grupos de mídia, organizações independen-
tes, universidades, fundações, entre outros. Sabe-se que as
fake news precedem a pandemia, remontando pelo menos
a eventos como o Brexit e a eleição de Donald Trump em
2018 – considerando-se como fator decisivo para esses
eventos o advento das mídias sociais.
99
Todavia, com a pandemia da Covid-19, recrudesceu
a produção e circulação de conteúdos deletérios focados
na crise sanitária, o que demandou também o esforço re-
dobrado no combate à desinformação. A checagem de in-
formações falsas ou maliciosas passou a ser instrumento
de apuração rotineiro para veículos e organizações ligadas
à mídia, por representar uma forma de depurar as informa-
ções e validá-las conforme critérios previamente definidos
e conhecidos.
O autor do presente trabalho participa de um grupo
encarregado de checar informações sobre a pandemia da
Covid-19, o Núcleo de Pesquisa em Jornalismo e Comuni-
cação - NUJOC, da Universidade Federal do Piauí. Tal ce-
nário possibilitou as condições para que se faça a presente
reflexão sobre a função da checagem jornalística e sua for-
ma de materialização como tipo e gênero textual.
100
Fiscalizo”, recebendo denúncias do aplicativo.
A atividade de checagem de informações no NUJOC
tem basicamente quatro fases: acolhimento, verificação, re-
visão e conclusão. No acolhimento é feita a distribuição
das mensagens aos checadores – todos eles voluntários,
alunos e professores ligados ao curso de Jornalismo ou à
pós-graduação na área.
Na fase da verificação acontece a checagem pro-
priamente, com a pesquisa em fontes independentes, o
contraste entre diferentes versões, entrevistas com espe-
cialistas etc. A revisão é a fase de retomar o texto sob o
olhar do orientador/editor, para eventuais ajustes em nível
de forma como de conteúdo. E, finalmente, a conclusão é
a fase em que a checagem é entregue e divulgada no site
do Núcleo e nas redes dos parceiros do projeto. Em média,
são feitas duas checagens por dia, seguindo-se uma escala
que vai de segunda a sexta. A equipe conta com um total
de seis voluntários para o trabalho de checagem e um edi-
tor. Para o trabalho com as mídias sociais, conta ainda com
duas voluntárias, responsáveis pela divulgação dos textos
nas redes. Esses números variam conforme a disponibili-
dade da equipe.
O site do NUJOC (Fig. 1) reúne as checagens sobre
a pandemia e também outras seções do projeto, como Di-
vulgação Científica, voltada a temas sobre ciência, e Outros
Boatos, que reúne checagens sobre temas que extrapolam
a pandemia.
101
Fig. 1: Reprodução da página principal do site do NUJOC
Fonte: http://nujocchecagem.com.br/
102
Gêneros discursivos e tipos textuais na Checa-
gem do NUJOC
103
Quanto aos tipos textuais, há também grande va-
riedade: notícia, reportagem, artigo de opinião, vídeos de
humor, notas curtas, documentários, comentários de inter-
nautas, depoimentos em vídeo, comunicados em áudio etc.
A variedade dos tipos é proporcional às potencialidades
abertas pela convergência e pela midiatização, no contexto
da comunicação online.
Esse material variado serve de ponto de partida para
a checagem efetuada pela equipe do NUJOC. É com base
nele que são tomadas as decisões sobre como abordar de-
terminada mensagem, quais métodos empregar para fazer
a verificação e, não menos importante, que narrativa será
elaborada para apresentar o resultado da checagem.
O resultado é um corpus de matérias jornalísticas que
pode ser analisado a partir da perspectiva dos gêneros dis-
cursivos e tipos textuais que caracterizam a checagem de
informações efetuada pelo NUJOC. Ao todo, são 112 ma-
térias em cerca de seis meses de atividades. Os dados da
Tabela 1 resumem o quadro.
Tabela 1 – O NUJOC Checagem em números
Comunicação Outros
Período Covid-19
Científica Boatos
Março/agosto/2020 112 12 43
Fonte: http://nujocchecagem.com.br/category/covid-19/, em
31/08/2020.
104
Outros Boatos tem assuntos que extrapolam a questão da
Covid-19. Esses dados revelam a preponderância da pan-
demia na pauta da equipe durante o período em análise, o
que permite um olhar sobre os textos produzidos no âmbito
da checagem sobre a pandemia do novo coronavírus.
105
preocupação em compreender o fato, em uma temporali-
dade alongada, que admite formas narrativas diferenciadas,
eventualmente emprestadas da literatura, a fim de conquis-
tar o leitor (LONGUI; KÉRLEY, 2015; ASSUNÇÃO; PINTO,
2018).
Dentre os formatos ou tipos textuais dedicados a
aprofundar o fato, a reportagem investigativa merece des-
taque. Ela tem sido historicamente o lugar da informação
em profundidade, oferecendo uma gama de enfoques nas
mais variadas editorias. A reportagem permite desde a aná-
lise aprofundada dos especialistas até o testemunho vívido
dos que presenciaram os fatos, em uma narrativa que pode
se estruturar de formas também diversas (BOAS, 1996).
A temporalidade estendida, outra marca da repor-
tagem interpretativa, permite que a apuração dos fatos se
desdobre em um ritmo mais lento do que o fechamento
cotidiano das matérias informativas. A intepretação ganha
assim em perspectiva, em abordagens que se distendem
no tempo e no espaço, e nesse sentindo podendo se apro-
ximar dos modelos narrativos tradicionais da literatura e de
outras estruturas narrativas (BOAS, 1996; LONGHI; KÉR-
LEY, 2015; ASSUNÇÃO; PINTO, 2018).
As funções que a checagem desempenha vão ao
encontro das funções que se observam na interpretação:
aprofundar um fato – no caso, uma denúncia de fake news,
uma mensagem que ganhou repercussão na mídia, um
post que viralizou em redes sociais etc. – e esclarecê-lo so-
bre sua correspondência ou não à realidade factual (UNES-
CO, 2019).
A checagem parte de um pressuposto – o de que de-
terminada mensagem precisa ser investigada para se es-
clarecer a sua correspondência à realidade. Para essa tare-
106
fa, se mobiliza a gama de informações e de conhecimento
acumulado sobre determinado assunto, e a mensagem ori-
ginal é então classificada segundo os critérios da equipe de
checagem como verdadeira, falsa, em análise, entre outras
classificações possíveis.
Dessa forma, a checagem requer o tipo de texto que
permita aprofundar a informação, assim como o tempo
necessário para que esse aprofundamento seja efetuado.
A checagem atenderia à função de esclarecimento, de ve-
rificação, com base na pesquisa e no aprofundamento da
informação.
As características do gênero interpretativo e do tipo
textual reportagem permitem abranger o tipo de texto que
vem sendo desenvolvido nas checagens ou fact-checking
efetuadas pelo NUJOC, como se pretende demonstrar no
próximo segmento.
107
cebida e, na sequência, a descrição da própria mensagem.
Por vezes, esta é incorporada na íntegra ao texto, utilizan-
do-se os recursos da multimídia. Por vezes, e mais frequen-
temente, apenas um excerto da mensagem original é re-
produzido na matéria, sob a forma de captura de tela (print
screen), devidamente creditada. A Fig. 2 mostra como isso
se manifesta em uma checagem efetuada pelo NUJOC.
Fig. 2: Excerto de mensagem reproduzida em checagem
do NUJOC
Fonte: http://nujocchecagem.com.br/vacina-inglesa-para-covid-19-nao-
-foi-produzida-a-partir-de-fetos-abortados/
108
linha argumentativa desenvolvida na checagem, já que por
meio deles o leitor confere as declarações na fonte original
e pode elaborar sua própria interpretação sobre os fatos
em análise.
Há uma tese que é levantada pela mensagem a ser
checada: a tese implica um ou mais fatos. A checagem se
detém sobre os fatos para confirmá-los ou refutá-los. Para
isso, mobiliza uma série de procedimentos relativos à apu-
ração jornalística: contraste entre diferentes versões; en-
trevistas com especialistas; leitura de documentos; uso de
instrumentos tecnológicos de investigação pela web, como
softwares e sites de verificação; entre outros. A Fig. 3 ilustra
esses procedimentos.
Fig. 3 – Trecho de checagem com destaque aos links
para outras fontes
Fonte: http://nujocchecagem.com.br/e-fato-que-o-consumo-de-hidroxi-
cloroquina-na- italia-cresceu-4-662-mas-uso-e-desautorizado-no-pais/
109
também se reflete em textos mais longos, para os quais se
utiliza, como forma de amenizar a extensão dos parágrafos,
os entretítulos em destaque por negrito. A “quebra” do tex-
to por meio de entretítulos visa a dar maior legibilidade ao
material disposto no site e, embora varie quanto ao uso feito
pela equipe, mantém certa regularidade nas produções.
A partir da checagem, a matéria recebe uma etiqueta,
que indica sua veracidade ou não – verdadeiro; falso; pro-
cede, mas se liga etc. Esse traço textual também se reflete
nas chamadas em destaque, já que ali todas as matérias re-
cebem uma etiqueta, assim como nas redes sociais – Twit-
ter, Facebook e Instagram – do NUJOC, onde as checagens
são divulgadas. A Fig. 4 ilustra a etiqueta de mensagem
falsa.
Fig. 4 – Mensagem identificada com a etiqueta FALSO
Fonte: http://nujocchecagem.com.br/medico-utiliza-dados-falsos-ao-
-tentar-deslegitimar- a-pandemia-de-covid-19/
110
para potencializar o efeito sobre os leitores. Nesses casos,
a etiqueta em destaque fica com a informação também em
destaque na mensagem, ou aquela que se aplica ao teor
geral da mensagem.
As checagens apresentam, geralmente nos pará-
grafos finais, a indicação de outras checagens realizadas
pelo NUJOC sobre a mesma temática. Com isso, busca-se
ampliar o tempo de atenção do leitor ao site. Por meio de
hiperlinks, é possível acessar as checagens que remetem à
página do próprio NUJOC, o que aponta novamente para o
aprofundamento da informação – e a fidelização do leitor. A
Fig. 5 mostra isso em imagem.
Fig. 5 – Links que remetem a checagens de assuntos
afins na página do NUJOC
Fonte:http://nujocchecagem.com.br/jornalista-faz-afirmacoes-inveridi-
cas-sobre-a- pandemia/
111
semelhante formam uma espécie de banco de dados vir-
tual a partir do conhecimento acumulado pelo grupo na
tarefa de checagem de assuntos sobre a Covid-19 e outros
assuntos.
Analisando o teor dessa estrutura textual, é possível
avançar na proposição de um gênero para a checagem
efetuada pela equipe do NUJOC – e que talvez possa ser
extrapolada para outras experiências de fact-checking.
112
amplo, como forma de trazer elementos do mundo sensível
ao nível discursivo. Mas a checagem precisa avançar para a
esfera da investigação e interpretação das informações que
servem de ponto de partida – no caso, os boatos e mensa-
gens disseminados pela mídia e redes sociais. É só com a
pesquisa e o contraste entre diferentes versões dadas por
fontes diversas que se pode considerar realizada a tarefa de
checar determinado fato (UNESCO, 2020).
Por essas razões, entende-se que a checagem de
informações é um dos subgêneros do jornalismo investi-
gativo e interpretativo, tomados aqui como sinônimos. A
função da checagem é aprofundar a informação, ampliá-la
e dar-lhe perspectiva, o que a coloca no âmbito da função
desempenhada pelo gênero do jornalismo de interpretação.
O tipo textual da reportagem em profundidade (LONGUI;
KÉRLEY, 2015; ASSUNÇÃO; PINTO, 2018), tradicionalmen-
te destinado a ampliar o fato na linha espaço-temporal, é o
que mais se adapta à necessidade da checagem, como se
verifica na experiência do NUJOC.
Nela, as checagens partem do dado – a mensagem
que vai ser verificada – e fazem o aprofundamento dele,
mediante consulta a fontes especializadas e comparação
entre diferentes versões dadas pela mídia. Isso se reflete na
estrutura textual e nos recursos que são utilizados nas che-
cagens, como vídeos e áudios, hiperlinks e entretítulos etc.
A reportagem interpretativa tem sido um caminho
espontâneo da produção das checagens efetuadas pelo
núcleo. Ela não foi imposta nem sugerida pela coordenação
do projeto, mas sim adotada de forma tácita pela equipe, à
medida que o trabalho foi sendo estruturado. Desde o início
das atividades, é possível encontrar a estrutura textual da
reportagem de interpretação, que foi sendo aprimorada ao
longo dos meses, considerando março a agosto de 2020
113
como o período de tempo analisado.
Pode-se argumentar que, em sentido amplo, a che-
cagem também se enquadra no gênero informativo, e no
tipo textual da notícia. De fato, há elementos que apontam
para essas características nas checagens: elas informam
sobre a veracidade ou não de fatos- notícia, e elas pode-
riam ser abordadas no formato da notícia.
Todavia, e ainda como uma hipótese, parece que o
caráter informativo da checagem é residual, não esgotando
a sua função principal, que é aprofundar e entender o fato,
colocando-o em perspectiva, e não apenas descrevê-lo e
narrá-lo como acontecimento ou informação. Nesse senti-
do, há informação na checagem tanto quanto há informa-
ção na crônica e no editorial (MARQUES DE MELO, 1985),
e nem por isso se considera que a segunda e o terceiro
sejam do gênero informativo.
A função da checagem, condizente com o aprofunda-
mento da informação, a coloca no patamar da investigação
e da interpretação, próprios do gênero interpretativo. Nesse
sentido, a reportagem vai ser o formato textual que permite
alcançar o aprofundamento, na medida em que distende
a narrativa em linhas temporais e espaciais, buscando re-
constituir e dar perspectiva ao fato.
Embora se configure como texto do gênero inter-
pretativo, a checagem parece ter menos propensão a dar
voz autoral aos textos – uma das possibilidades do texto
da reportagem de interpretação. Na experiência do NU-
JOC, poucos são os traços autorais presentes nas matérias.
Isso parece decorrer do entendimento de que a função pri-
mordial da checagem está na verificação da veracidade da
mensagem em análise, não na forma como essa análise é
desenvolvida pelo autor do texto. O foco, por assim dizer, é
114
o conteúdo, não a forma.
Considerações Finais
115
se a estrutura descrita na análise prévia se faz presente em
projetos de checagem de outros veículos dedicados a essa
tarefa no contexto da pandemia da Covid-19.
REFERÊNCIAS
116
CRV, 2017, v. 2, p. 161-172.
LONGHI, Raquel Ritter; WINKES, Kérley. O lugar do long-
form no jornalismo online: qualidade versus quantidade e
algumas considerações sobre o consumo. Brazilian Jour-
nalism Research, v. 1, n. 1, 2015.
MARQUES DE MELO, José. A opinião no jornalismo bra-
sileiro. Petrópolis, RJ: Vozes, 1985. 166 p.
POSETTI, Julia; BONTCHEVA, Kalina. Desinfodemic: de-
ciphering COVID-19 desinformation. Paris: Unesco, 2020.
Disponível em: https://en.unesco.org/sites/default/files/
disinfodemic_deciphering_covid19_disinformation.pdf.
Acesso em 20 de junho de 2020.
UNESCO. Jornalismo, fake news & desinformação: ma-
nual para educação e treinamento em jornalismo. Paris:
Unesco, 2019.
YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamentos e métodos.
2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.
117
Um olhar para Profissão Repórter a partir das vozes de
quem produz o programa1
Magali Moser
Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Jor-
nalismo na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
e bolsista FAPESC
Introdução
118
digma do jornalismo de comunicação, a partir de final dos
anos 1970 com base em estudo das práticas dominantes
da imprensa da América do Norte, mas com diálogo com
as práticas jornalísticas universais, destaca-se pela oferta
abundante e disputa cada vez mais acirrada pela atenção
do público. Esse tipo de jornalismo, típico de sociedades
em que a informação é marcada pelo excesso e diversi-
dade, na visão dos autores, investe em temas associados
ao consenso, principalmente no que se refere ao entrete-
nimento e lazer. Para os pesquisadores, fatores técnicos e
econômicos, com o contexto de industrialização dos bens
e serviços, melhoria na circulação da informação, urbaniza-
ção e avanços de escolarização possibilitaram a emergên-
cia dessa mudança.
Assim, na avaliação de Charron e Bonville (2016,
p.339) “o controle remoto e o clique do mouse do compu-
tador são os símbolos de um novo regime de consumo de
informação”, expondo uma relação de profunda competiti-
vidade. Com o desgaste das regras, a inovação passa a ser
uma condição de sobrevivência: a distinção como impera-
tivo. Neste regime concorrencial, a informação estabelece
uma relação mais próxima com o entretenimento para sus-
citar a atenção do público, contrastando com a concepção
tradicional do jornalismo. Tendo em vista as transformações
apontadas, as dinâmicas do Profissão Repórter, na grade
de programação da Rede Globo desde 2006, revelam-se
instingante objeto de análise para observar essas mudan-
ças, com foco na caracterização dos gêneros jornalísticos.
O programa já foi considerado como “marco de inovações
técnicas, estéticas e narrativas” (SOARES; GOMES, 2012,
p. 13).
Profissão Repórter possibilita um jornalismo que per-
mite pensar a si mesmo a medida que procura pautar o
119
próprio processo de produção da reportagem, proporcio-
nando construir novos formatos, linguagens e possibilida-
des jornalísticas. Com amparo metodológico em pesquisa
bibliográfica e documental, além de depoimentos da equi-
pe, este artigo busca refletir sobre as relações a partir do
programa conduzido por Caco Barcellos e uma equipe de
jovens repórteres. Nesta abordagem, o foco não está no
produto. O objeto da análise deste estudo que chamo de
exploratório são os discursos construídos em torno do pro-
grama pela própria equipe. Assim, o gesto de interpretação
mobilizado aqui se volta para os enunciados dos agentes
em diferentes espaços, como no livro Profissão Repórter: 10
anos (2016), depoimentos, reportagens e entrevistas reali-
zadas por mim com a equipe2.
120
conteúdo. Ao contrário dos outros paradigmas jornalísticos,
no jornalismo de comunicação, a mídia e os profissionais da
informação buscam não apenas formas de distinção dos
concorrentes como maneiras de valorizar as preferências
do público:
[...] os jornalistas deixam transparecer mais abertamen-
te sua subjetividade e tentam estabelecer com o público,
cada vez mais “especialializado”, laços de conivência e in-
tersubjetividade. Os gêneros jornalísticos que dão amplo
espaço ao comentário (crônicas opinativas, de humor e
temátias, linha aberta, etc.) estão em nítida ascensão; a
notícia, gênero por excelência do jornalismo de informa-
ção, incorpora mais e mais julgamentos e comentários. O
hibridismo entre o discurso de imprensa e as outras for-
mas do discurso midiático é tolerado, até mesmo encora-
jado: a ficção se mistura à realidade; notícias secundárias
adquirem o status de acontecimento; a informação se faz
entretenimento e adota facilmente o tom do humor ou um
tom familiar, de convensa; a efusão e a emoção substi-
tuem a explicação; o tom e o estilo do discurso promo-
cional impregnam o discurso de imprensa. (CHARRON;
BONVILLE, 2016, p.30)
121
um modelo teórico que permita compreender seu desen-
volvimento e identificar os traços essenciais que o carac-
terizam como prática discursiva específica e diferenciada.
Ao estudar as interpretações sobre o Brasil pelas te-
lenovelas do país, também nos anos 2000, a pesquisadora
Esther Hamburger chamava a atenção para o papel cen-
tral exercido pela televisão na realidade brasileira, marcada
por contrastes sociais e exclusões. Segundo Hamburger
(2005, p.79), “[...] quando o acesso à informação depende
fortemente da escolaridade e quando essa escolaridade
está associada à discriminação social, a televisão constitui
uma fonte privilegiada, acessível e compreensível a amplos
segmentos”. A potencialidade representada pelo meio, num
contexto de extrema desigualdade como o brasileiro3, é
acentuada pela autora. Hamburger também assina o prefá-
cio da obra Profissão Repórter em diálogo (2012), resultado
de ampla pesquisa sobre o programa, quando observa a
possibilidade de fazer televisão de modo instigante, com
base na experimentação.
Por ser um meio de comunicação de fácil acesso e
popular, sendo o mais utilizado para busca por informações
ou entretenimento no Brasil, a televisão significaria deste
modo um potencial imenso no desenvolvimento da consci-
ência crítica e difusão do conhecimento. Profissão Repórter
estaria, na avaliação de Hamburger (2012, p.9-10) “sintoni-
zado com a sensação de cansaço que o telejornalismo con-
3 “Em uma sociedade que herdou do passado colonial escravocrata uma de-
sigualdade que se reitera em barreiras discriminatórias como a cor da pele, o
analfabetismo e a falta de cultura literária, a ‘ignorância’ sintetiza a discrimi-
nação, marca a superioridade de quem domina as mínimas regras da cultura
erudita. Nesse contexto, a televisão, reconhecida como veículo que, entre outras
coisas, pode informar e ensinar sobre o significado e a maneira de usar novos
produtos, assume papel estratégico para um público sedento de informação”
(HAMBURGER, 2005, p.72).
122
vencional provoca”, distinguindo-se “porque se aventura na
experimentação de pautas, na diversificação de pontos de
vista sobre um mesmo assunto e na tematização do próprio
processo de construção da notícia”. Aproximações entre jor-
nalismo e entretenimento compõem uma antiga discussão
que gera muitos embates, conflitos e disputas no campo
profissional e teórico. Enquanto há quem veja com preocu-
pação esse diálogo, temendo o possível comprometimento
da finalidade principal do jornalismo, há também quem seja
entusiasta da convergência, sem ressalvas.
Ao defender a compreensão do jornalismo como for-
ma de conhecimento, Meditsch (1997) considerou a espe-
tacularização como um dos aspectos mais problemáticos
desta vertente. No seu entendimento, o que difere uma
narrativa jornalística de um relato científico, de um texto
didático ou de um relatório policial é a condição de se diri-
gir a pessoas que não teriam necessariamente a obrigação
de ler aquilo. Isso a faz buscar formas e tentativas de atrair
as pessoas para que se interessem por aquela informação,
por meio de técnicas narrativas e dramáticas, o que não
seria um problema: “o uso destas técnicas se justifica am-
plamente pela eficácia comunicativa e cognitiva que pro-
porcionam. O problema é quando passam a ser utilizadas
em função de objetivos que não os cognitivos, como a luta
comercial por audiência e o esforço político de persuasão”
(MEDITSCH, 1997, p.10).
Na mesma linha, ao confrontar discursos de dife-
rentes vozes sobre as finalidades do jornalismo, Reginatto
(2019) considerou que divertir não é papel do jornalismo. Ela
compreendeu que o entretenimento também pode exercer
a função de informar, mas advertiu que seu compromisso
não é com a informação. Na sistematização daquelas que
seriam as principais finalidades do jornalismo e amparada
123
nos estudos de Márcia Amaral, ela explicou: “A retirada do
papel de divertir deriva do entendimento de que esse não
é um papel de dever-ser no discurso dos leitores” (REGI-
NATTO, 2019, p.243). Assim: “Ao buscar divertir enquanto
algo a priori, o jornalismo corre o risco da superficialidade
e da fragmentação, excluindo as finalidades que fazem ser
jornalismo e não outra coisa”. (REGINATTO, 2019, p.243). A
pesquisa da autora indicou que a principal função do jorna-
lismo é informar de modo qualificado e orientar com base
no interesse público.
Vistas com ressalvas por parte de estudiosos, as
articulações entre jornalismo e entretenimento recebem
diferentes nomes entre pesquisadores que não veem a
aproximação como distorção. Gomes (2008; 2009) define
esse embaralhamento de fronteiras como infotenimento
ou infotainment, considerando-o uma estratégia midiática.
Assim, seria num cenário global, resultante de “uma com-
plexa articulação entre políticas macroeconômicas, marcos
regulatórios, possibilidades tecnológicas, estratégias em-
presariais, expectativas históricas e culturais sobre os sis-
temas televisivos e seus produtos” (GOMES, 2009, p.11). Ela
interpreta que o entretenimento é frequentemente associa-
do a algo depreciativo, em contraposição ao jornalismo e
que, embora sejam fenômenos distintos, o infotenimento
se aproxima do jornalismo popular, a medida que ambos
buscariam recursos para alcançar melhores índices de au-
diência.
124
so de construção da reportagem, com ênfase nas decisões
tomadas, parecem ser algumas das estratégias utilizadas
pelo Profissão Repórter na busca por tentativas de distin-
ção da concorrência e apreensão da audiência. O episódio
piloto do programa foi ao ar em 28 de abril de 2006 como
especial do Globo Repórter, sobre o tema trânsito em São
Paulo. Dia 7 do mês seguinte, teve estreia com 12 minutos
de duração, como quadro do Fantástico, revista eletrônica
dominical onde permaneceu nos dois anos iniciais. Exibido
de abril a dezembro, desde 2016 nas noites de quarta-fei-
ra, às 23h45min em três blocos, o programa está há mais
de dez anos na grade da emissora líder de audiência do
país. A temporada de 2020 foi prejudicada com a pandemia
de Covid-19, que adiou a exibição do programa por tempo
indeterminado pela primeira vez desde o seu lançamento,
mas não impediu a atividade da equipe.
Deslocado para ajudar na cobertura da pandemia,
o Profissão Repórter segue na produção de reportagens
temporariamente exibidas em outros programas da grade.
A permanência do programa desde 2006 é um dos indica-
tivos de sua aprovação junto ao público, apesar do horário
de exibição. Se pode ser impedimento para a audiência, no
olhar de quem o produz, a exibição tardia é uma forma de
garantir “liberdade para abordar temas diversos”, como ex-
plica a chefe de reportagem, Márcia Gonçalves, em entre-
vista à pesquisadora4. A editora-chefe do programa, Janaina
Pirola, complementa: “Uma coisa positiva é que nos permi-
te abordar temas mais pesados. O jornalismo não tem cen-
sura, como é o entretenimento, então tem que ter uma au-
to-regulação”. A audiência alcançou em 2019 o registro de
125
15 pontos em São Paulo, recorde da temporada, de acordo
com a colunista especializada em televisão Patrícia Kogut,
do Jornal O Globo5.
O programa ganhou edições especiais até entrar para
grade fixa semanal da Globo, em 2008. O didatismo na pro-
messa estava presente no anúncio do lançamento do qua-
dro, pelo então apresentador Pedro Bial: “Jornalismo à flor
da pele. O repórter Caco Barcellos entra em campo com
uma equipe de jovens jornalistas para mostrar com quantas
informações, com quantas imagens, com quantas emoções
se faz uma reportagem. Estreia agora o Profissão Repórter”.
Idealizado pelo jornalista Caco Barcellos6 com direção de
Marcel Souto Maior, Profissão Repórter alcançou em outu-
bro de 2019 a marca de 400 edições com um especial sobre
povos isolados na Amazônia, resultado de uma imersão de
25 dias anunciada como a “expedição mais longa feita por
repórteres da equipe”. No site da Globo7, constam alguns
números que dão a dimensão do trabalho de 14 anos: a
equipe já percorreu todos os estados brasileiros e 41 países.
Protagonistas anônimos desconsiderados da pauta
tradicional costumam estar na centralidade do programa
que desde o início procurou no cruzamento de olhares so-
126
bre o mesmo fato, um diferencial, no esforço para evitar o
jornalismo declaratório. No livro Profissão Repórter: 10 anos,
Marcel Souto Maior (2016, p.13) apresenta logo na abertura
as finalidades que os conduziram inicialmente: a busca por
“repórteres que – além de contar com talento e garra – acei-
tassem o pacto proposto por nós: o de empunhar câmeras
compactas, participar de todo o processo de construção
da reportagem [...] dividir com o público suas dúvidas e –
o mais importante – suas emoções”. A posição de Souto
Maior parece ir ao encontro da definição de Caco Barcellos
(2016, p. 31), para quem “não existe regra para se produzir
uma reportagem. A busca por uma boa história depende
da experiência de cada um e pode nos surpreender a todo
instante e em todo lugar”.
Ao longo de sua trajetória, Profissão Repórter procu-
rou colocar em pauta temas que não costumam ser trata-
dos na cobertura jornalística habitual, como a desigualdade
social na cidade de São Paulo, a mais rica do país, episódio
que foi ao ar em 6 de novembro de 2019, ou as condições
de trabalho dos cortadores de cana, exibido em 26 de maio
de 2006, quando Profissão Repórter ainda era um quadro
do Fantástico. Há um nítido esforço por tratar de modo di-
ferenciado ou com outro olhar mesmo assuntos que estão
sempre no noticiário, lançando novas possibilidades de
interpretação e análise. Na descrição do programa no site
Memória Globo, o Profissão Repórter apresenta cinco ei-
xos temáticos: violência, educação, transporte, moradia e
saúde, além dos assuntos que estão na ordem do dia. O
programa identifica-se com a abordagem de temas sociais,
ligados aos direitos humanos e à cidadania.
Criado com a promessa de mostrar “os bastidores da
notícia, os desafios da reportagem”, como anuncia o slogan,
não é propriamente uma inovação no fazer jornalístico. Pelo
127
menos desde os anos 1970, a busca de novas narrativas no
telejornalismo brasileiro mostra uma corrida nessa direção8.
Mas constitui prática incomum à medida que valoriza os
processos envolvidos, opção que justifica sua relevância
como objeto de estudo. Além de integrar a programação
da maior emissora comercial do país, Profissão Repórter
quer se diferenciar ao mostrar a produção da reportagem,
com as etapas e dilemas envolvidos, algo comum nos pro-
gramas de entretenimento, mas atípico no jornalismo. Di-
ferentemente do jornalismo tradicional, onde o público em
geral acessa apenas o resultado final do trabalho, no Pro-
fissão Repórter os desafios e os percalços no caminho são
levados como parte da própria pauta. A escolha pelo pro-
grama se faz relevante ainda à medida que seu idealizador
é considerado referência entre o campo jornalístico. Caco
Barcellos é lembrado pela trajetória consolidada, com mais
de 40 anos de carreira, vencedor de alguns dos prêmios de
jornalismo e direitos humanos mais prestigiados do país.
Ele soma na bagagem três livros-reportagem com números
expressivos para o mercado editorial brasileiro. Nicarágua,
a Revolução das Crianças (1982), Rota 66, a história da polí-
cia que mata (1992) e Abusado, o dono do Morro Dona Mar-
ta (2003) - os dois últimos escolhidos na categoria livro do
ano, do Prêmio Jabuti de Literatura, concedido pela Câmara
Brasileira do Livro. Questões sociais são uma marca do jor-
nalista, imprimindo certo estilo próprio de reportar (MOU-
RA, 2007), com ênfase para o jornalismo investigativo. Na
Apresentação de Rota 66 (2010, p.13), Narciso Kalili se refere
ao colega como “um jornalista que tem lado”, “o dos mais
128
fracos, das vítimas”9.
Ao longo do tempo, o programa conduzido por ele tem
despertado a atenção da academia, tornando-se tema de
diversos estudos (PROCÓPIO, SOUZA, 2018; COUTINHO,
SANTOS, 2017; ALENCAR JUNIOR, 2015; CHIARIONI, 2014;
KLEIN, 2012; SANTOS, 2011). Um dos mais abrangentes é
o trabalho de MidiAto, Grupo de Estudos de Linguagem:
Práticas Midiáticas, da Universidade de São Paulo, resulta-
do de análise detalhada e criação de um amplo banco de
dados com base em 149 edições dos primeiros quatro anos
do programa. A pesquisa de fôlego foi lançada em 2012
no livro Profissão Repórter em Diálogo, organizado pelas
professoras Rosana Soares e Mayra Gomes, com artigos
de vários pesquisadores. Entre as constatações do estudo,
chama a atenção que “a discussão da pauta e de edição da
reportagem não é tão preponderante quanto o slogan pode
sugerir” (GROSS, PASCHOALICK; 2015, p. 36).
À luz dos processos de midiatização e entre uma
multiplicidade de ângulos acionados, Klein (2012) analisou
o jornalismo praticado em Profissão Repórter e sua articu-
lação com lógicas associadas ao entretenimento. Na sua
avaliação, a principal diferença de Profissão Repórter em
relação a outros programas jornalísticos, especialmente
os de reportagem, está em assumir a autorreferencialida-
de como eixo norteador. Entre as conclusões, ela obser-
vou “uma edição que associa elementos de entretenimento
(formas de edição de elementos sonoros e visuais diver-
sos, estilo conversacional, tratamento de assuntos amenos
[...] que alteram – agregando informação[...]” (KLEIN, 2012,
9 “Caco Barcellos é um jornalista que está do lado da maioria. O lado dos des-
graçados, dos miseráveis. Gente sem privilégios, indefesa, e para quem o traba-
lho de jornalistas como Caco Barcellos ou Donald Wood representa a porta de
entrada em direção à vida.” (apud BARCELLOS, 2010).
129
p.401). Ao estudar infotainment, Santos (2011, p.192) obser-
vou Profissão Repórter como exemplo, reconhecendo ele-
mentos como estratégias de narrativas ficcionais, o foco em
repórteres-personagens e ênfase na emoção.
Análises
130
2016, p.208), sem perceber a contradição10. O editor Rafael
Armbrust (2016, p.187) também procura demarcar a dis-
tinção: “É claro que fazer um trabalho de edição somente
com informações – jornalismo informativo – é diferente de
lidar com histórias, emoções e narrativa, como é no Pro-
fissão Repórter. E nesse caso a ilha [de edição] é como se
fosse um pequeno cinema particular [...]”. Em contraponto
ao telejornalismo diário, o formato valoriza a imagem que
conduz a narrativa, em detrimento do texto narrado pelo
repórter, o off.
Ainda que seja uma influência no modo de apresen-
tação da narrativa, cabe ressaltar essa inspiração que ajuda
a compreender o modo como o programa foi concebido ao
longo do período. Desde o início no Profissão Repórter, o
editor de imagem e finalizador Júlio Inácio, que estava há
19 anos na emissora quando o entrevistei, em 201811, explica
que o formato do roteiro é baseado na simultaneidade de
acontecimentos. Ele reconhece o trabalho de edição como
“um filtro” e lembra as resistências iniciais sofridas pelo
programa, quando muitos achavam que “isso não vai dar
certo”. Inácio pontua o caráter laboratorial assumido pelo
programa ao estimular o envolvimento dos repórteres em
todas as etapas de produção da reportagem, inclusive na
edição, o que facilita o trabalho de finalização dos editores.
Ao falar de sua busca por inovar linguagens e formatos, ele
131
ressalta:
“É trazer um pouco da dramaturgia para o jornalismo,
na edição. Você consegue fazer isso também no texto, mas
não é o formato do Profissão[...]. Nós fizemos programas
em que dá pra usar um pouco da dramaturgia na edição”
(Júlio Inácio, editor de imagens, entrevista, 2018). Em fun-
ção da dinamização criada pela edição, Inácio comenta que
muitas pessoas achavam no início que o programa era fina-
lizado em produtora. “Se a gente traz isso para a edição de
imagens, você sai do jornalismo normal. E você começa a
contar de uma forma diferente. Toda a semana é um desafio
contar uma história. E contar de uma maneira que conven-
ça as pessoas.” Nessa tentativa por diferenciar o conteúdo
produzido, ele recorda como foi sua chegada à equipe, em
2006:
Nessa época tava passando um filme do Denzel Washin-
gton, Chamas da Vingança [...] Eu assisto muito filme, mui-
to documentário, o tempo todo. Você tem que fazer essa
viagem para poder ter esse resultado. Eu pensei... a gente
tem que criar uma forma de que a câmera seja mais
nervosa, seja mais impactante. E a ideia partiu desse
filme. Se você assistir ao piloto visual, vai perceber isso.
(Júlio Inácio, editor de imagens, entrevista, 2018. grifos
nossos)
132
do foi lançado o programa, o jornalista dizia querer mostrar
“as dúvidas, conflitos, conquistas e decepções” da equipe.
Por isso, não apresentaria o programa de uma bancada, mas
da rua: “Vou sempre estar no local da notícia, Precisamos
estar no cenário real do jornalismo”, anunciava (CORREIO
BRAZILIENSE, 07 de maio de 2006, p. 3), deixando à mos-
tra alguns dos efeitos de verdade mobilizados no programa.
No lançamento, Caco anunciou à imprensa: “A minha ex-
pectativa é de que o programa apresente novos caminhos
para a reportagem. Que os novos repórteres se convençam
de que o melhor jornalismo se faz mesmo é nas ruas”. Em
entrevista à pesquisadora, o próprio Caco conta que, na sua
avaliação, o fazer jornalístico no Profissão está mais voltado
para o passado do que propriamente para o futuro: “É uma
exceção no núcleo da Globo repórteres se envolverem na
produção. Cada programa dispõe de uma equipe de repor-
tagem e de uma equipe de produtores” (Caco Barcellos,
jornalista, entrevista, 2018). Há 14 anos no ar, Profissão
Repórter também experimentou mudanças que ajudam a
compreender as relações entre jornalismo e entretenimen-
to no programa. Nas primeiras edições, Caco desafiava os
jornalistas a mostrarem os bastidores da reportagem e os
diferentes ângulos da notícia, lançando inicialmente a frase:
“Será que eles vão conseguir?” Talvez numa tentativa de
tirar o foco dos repórteres frente às críticas recebidas pelo
excesso de protagonismo, a pergunta foi suprimida, assim
como tom de desafio, e o programa passou a dar mais des-
taque para o conteúdo apresentado em vez dos dilemas e
dificuldades enfrentadas pelos repórteres. Com a mudan-
ça de rumo, o programa se concentrou no conteúdo em
vez dos dilemas e dificuldades enfrentadas. Em entrevista
à pesquisadora, em novembro de 2018, Caco destacou: “o
conteúdo deve se sobrepor aos bastidores”, como defendia
anteriormente.
133
Uma noção que não aparece no trabalho de campo
mas salta aos olhos na pesquisa sobre o programa e escan-
cara as relações com o entretenimento é a de aproximação
com a proposta de reality show jornalístico, especialmente
no período inicial do programa. Tanto que Profissão Repór-
ter é anunciado pela imprensa no seu lançamento, como
“uma espécie de reality show” (CORREIO BRAZILIENSE,
7 de maio de 2006, p.3). Este viés não é mencionado por
nenhum dos integrantes do programa nas entrevistas reali-
zadas por mim. Antes disso, Caco já reforçava (2016, p.39):
“Os bastidores ajudam o público a entender as circunstân-
cias em que a apuração foi feita. Mas os repórteres não
são personagens. São contadores de histórias e não podem
perder nunca o foco principal: as pessoas comuns que fa-
zem a notícia”. A ressalva, no entanto, contradiz explicita-
mente posição anterior:
Então quando a gente foi montando as equipes, a primeira
equipe, a gente falava claramente para eles: olha, vocês
são repórteres, mas vocês também são personagens.
Vocês têm que estar dispostos a se expor. Vocês vão ser
expostos [...] E aí você tem as fragilidades da equipe, você
tem as angústias, você tem os medos. Você tem as inse-
guranças todas. E isso a gente tinha que transformar em
conteúdo também e botar no ar. (MAIOR, 2008)
134
programa é a reportagem, seus dramas, seus conflitos e
nossos erros. Isso nunca foi visto na televisão”, afirmava
Caco quando do lançamento (PASSO A PASSO, 2006, p.3).
Enquanto o diretor Marcel Souto Maior antecipava, sem ro-
deios: “Será uma espécie de reality show sem eliminação e
sem prêmios” (PASSO A PASSO, 2006, p.3).
Desde o início, o programa mostrava seu desejo de
reunir uma equipe jovem formada por recém-formados,
sem experiência em televisão e com trajetórias diversifica-
das, “que não tivessem vícios”, define Caco na entrevista
me concedida. O programa iniciou em 2006 com jornalistas
em torno dos 25 anos, selecionados entre quase 9 mil can-
didatos inscritos num programa de estágio na emissora, o
que pode ser lido também como uma estratégia. O estágio
pode ser laboratório e treinamento da própria Globo, ‘em
formar’ parte dos seus funcionários, por exemplo, já que
muitos deles ingressam no programa e passam a assumir
outros postos na emissora.
Editora-chefe do programa, a jornalista Janaina Piro-
la, acredita que o perfil do Profissão Repórter mudou muito
com o passar do tempo. Ela lembra que, nos primeiros epi-
sódios, situações como o repórter que não segurava bem
o microfone eram tematizadas como bastidor, situação que
perdeu importância com o passar do tempo. Nos últimos
anos, a prioridade tem sido mostrar bastidores que tenham
relevância para o tema em pauta, argumenta a editora. A
concepção do programa tem forte influência do documen-
tário, na sua avaliação, o que levou a equipe a estudar ro-
teiro.
A pauta precisa ter movimento. Ela precisa que as coisas
estejam acontecendo. Isso é um ponto muito importante
pra pauta. Porque tem muita pauta boa que a gente fala:
“não cabe no nosso formato”. Dentro de um programa,
135
você pode até ter uma reportagem mais parada, com en-
trevista e tal, mas as duas outras reportagens tem que ter
movimento. Não é que tem que ter movimento. O assunto
tem que ter uma característica tal que a gente possa mos-
trar aquilo acontecendo. Não pode ser uma reportagem
que a gente não tenha acessos, que a pessoa não quer
que a gente acompanhe. Não quer que vá ao casamen-
to. Não quer mostrar o dia que sai da cadeia. Não quer
mostrar o dia que vai ser preso [...] (Janaina Pirola, edito-
ra-chefe, entrevista, 2018).
Considerações finais
136
tástico. Lançado como reality show jornalístico, conforme
anunciava seu diretor, procurou se desvincular desse rótu-
lo, apagado dos depoimentos da equipe colhidos para esta
pesquisa, em momento diferentes. Talvez essa tentativa de
dissociação reflita inclusive um esforço por não misturar o
que seria visto de modo pejorativo. Investiu em estratégias
para reforçar sua identidade diferenciada entre os progra-
mas jornalísticos da Rede Globo. No entanto, conservou a
estrutura inicial, que se tornou sua marca, baseada em três
eixos temáticos de um mesmo assunto, promovendo uma
mutiplicidade de olhares acerca de um mesmo assunto. As
evidências levantadas permitem inferir ainda que se utiliza
de recursos de edição que flertam com o entretenimento,
embora os profissionais recusem - ou talvez não se deem
conta - de qualquer aproximação.
Como observam Charron e Bonville (2016, p.381),
com o crescimento da oferta, no jornalismo de comunica-
ção, “a prática do zapping muda não somente a escolha
dos programas a que se assiste, mas também a maneira de
se assistir”. Assim, “um programa de televisão, independen-
temente do momento em que se ‘entra’ nele, deve ter um
sentido imediato [...]. A televisão sequencial e programada
dos primóridos cede progressivamente o lugar à TV da hi-
perconcorrência, interativa e sincrética” (CHARRON; BON-
VILLE, p.381-382), destacando o aspecto de movimento
associado à navegação na web. Apesar das negativas em
torno da interação entre jornalismo e a lógica do entreteni-
mento em Profissão Repórter, depoimentos de integrantes
do programa permitem identificar, ora de modo sutil ora de
modo mais explícito, essas aproximações, sobretudo pelo
uso de recursos e estratégias de edição interessadas na
mobilização de sensações ou no amortecimento da narra-
tiva visual oferecida.
137
O que se percebe na análise dos depoimentos é um
hibridismo nos gêneros tradicionais do jornalismo, num
diálogo com estratégias do entretenimento. Novas análi-
ses sobre essas relações exigem um olhar também para o
produto, em busca desses elementos no programa, dada
a complexidade do fenômeno. No entanto, para fins deste
estudo inicial, consideramos que foi importante acessar as
vozes e sentidos envolvidos nos discursos de quem pro-
duz o programa. Por fim, é necessário reconhecer o papel
exercido por Profissão Repórter na televisão aberta no país.
O programa aparenta querer de distinguir no jornalismo
não apenas pelo formato, mas como laboratório, espaço de
experimentação de abordagens, linguagens e recursos de
outras áreas. Por estar na grade fixa da principal emissora
de televisão aberta do Brasil, reúne condições, estrutura e
possibilidades diferenciadas. Por reunir características pe-
culiares, merece particular atenção. Deve ser, portanto, es-
tudado, analisado e compreendido em diferentes aspectos,
pois configura múltiplas possibilidades de pesquisa.
REFERÊNCIAS
138
Grandes aventuras, grandes coberturas/Caco Barcellos.
São Paulo: Planeta, 2016.
CHARRON, Jean; BONVILLE, Jean. Natureza e transfor-
mação do jornalismo. Brasília: FAC Livros; Florianópolis:
Insular, 2016.
CHIARIONI, Bruno Teixeira. Sublime olhar: memória e
experiência na narrativa do Profissão Repórter. São Paulo:
Editae! Cultural, 2014.
PASSO A PASSO. Correio Braziliense, Brasília, 7 maio 2006,
p.3
MAIOR, Marcel Souto. [Entrevista cedida ao Memória Glo-
bo]. In: MEMÓRIA GLOBO. Profissão Repórter. Webdoc so-
bre o programa Profissão Repórter com entrevistas exclu-
sivas de Caco Barcellos e Marcel Souto Maior ao Memória
Globo. 1 vídeo (12 min). [S. l.: s. n.]: 2008. Disponível em:
https://memoriaglobo.globo.com/jornalismo/jornalismo-
-e-telejornais/profissao-reporter/. Acesso em 18 nov, 2021.
CORREIO BRAZILIENSE. Outro lado. Outro lado. Brasília,
03 de maio de 2006.
CORREIO BRAZILIENSE. Passo a passo. Brasília, 07 de
maio de 2006. Suplemento TV, p.3
COUTINHO, Iluska Maria da Silva; SANTOS, Victor Faria
dos. Entre os bastidores da notícia e o desenvolvimen-
to da reportagem: O papel do Jornalista mediador no pro-
grama Profissão Repórter. Trabalho apresentado na Inter-
com – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares
da Comunicação, 2017
ESCALADA, Ana. Corte e costura. As decisões de um edi-
tor-chefe. In: CAVECHINE, Caio (org.). Profissão Repórter
10 anos: Grandes aventuras, grandes coberturas / Caco
Barcellos. São Paulo: Planeta, 2016. p.197-209.
139
GOMES, Itania Maria Mota. O embaralhamento de frontei-
ras entre informação e entretenimento e a consideração do
jornalismo como processo cultural e histórico. In: DUARTE,
Elizabeth Bastos; CASTRO, Maria Lília Dias de (Org.). Em
torno das mídias. Porto Alegre: Sulinas, 2008.
GOMES, Itania Maria Mota. O infotainment na televisão.
In: Encontro anual da COMPÓS, 18., 2009, Belo Horizonte.
[Anais...] Belo Horizonte: PUC, 2009. GT de Mídia e Entre-
tenimento.
GROSS, Daniele; PASCHOALICK, Paula. Profissão Repór-
ter, um panorama. In: SOARES, Rosana de Lima; GOMES,
Mayra Rodrigues. Profissão Repórter em Diálogo. São
Paulo, Alameda, 2012.
HAMBURGER, Esther. Jovens pesquisadores, jovens repór-
teres. In: SOARES, Rosana de Lima, GOMES, Mayra Rodri-
gues. (Orgs). Profissão Repórter em Diálogo. São Paulo:
Alameda, 2012. p.9-11.
HAMBURGER, Esther. O Brasil antenado: a sociedade da
novela. Rio de janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005.
KLEIN, Eloísa Joseane da Cunha. Circuitos comunicacio-
nais ativados pela autorreferência didática no jornalis-
mo: o caso do Profissão Repórter. 2012. 440 f. Tese (Douto-
rado em Ciências da Comunicação) – Universidade do Vale
do Rio dos Sinos - UNISINOS, São Leopoldo, Rio Grande
do Sul. 2012.
MEDITSCH, Eduardo. O jornalismo é uma forma de co-
nhecimento? Florianópolis: Universidade Federal de San-
ta Catarina, 1997. Disponível em: <http://bocc.ubi.pt/pag/
meditsch- eduardo-jornalismo-conhecimento.pdf> , aces-
so em 8 out 2020.
MEMÓRIA GLOBO. Profissão Repórter. 2008. 12m52s. Dis-
140
ponível em:<https://memoriaglobo.globo.com/jornalismo/
jornalismo-e-telejornais/profissao-reporter/> em 07 de ou-
tubro de 2020.
MOURA, Sandra. Caco Barcellos: o repórter e o método.
João Pessoa: Editora Universitária, 2007.
REGINATTO, Gisele Dotto. As finalidades do jornalismo.
Florianópolis: Insular, 2019.
SANTOS, Thiago Emanuel Ferreira. Infotainment na TV: as
estratégias de endereçamento do Profissão Repórter. In:
GOMES, Itania Maria Mota Gomes (org). Gênero televisi-
vo e modo de endereçamento no telejornalismo [onli-
ne]. Salvador: EDUFBA, 2011, pp. 173-196.
SOARES, Rosana de Lima, GOMES, Mayra Rodrigues.
(Orgs). Profissão Repórter em Diálogo. São Paulo: Ala-
meda, 2012.
141
A Intersubjetividade na Cobertura de Saúde: O Jorna-
lismo e a Pandemia do Coronavírus no Brasil1
Raissa Nascimento dos SANTOS2
Marília Gabriela Silva RÊGO3
Heitor Costa Lima da ROCHA4
Introdução
142
estão envolvidos, além da influência da organização e da
pressuposição de seus públicos. Esse é o fundamento que
nos leva a recusar a objetividade jornalística e seus envol-
tos (neutralidade, imparcialidade) e a considerar a narrativa
jornalística como constitutivamente intersubjetiva.
Tratar sobre a intersubjetividade torna-se relevante
para contribuir com reflexões que superem a tendência jor-
nalística de conceber a notícia como reprodução do real.
Este exercício inclui entender que o valor intersubjetivo
não compromete o rigor jornalístico. Isso quer dizer que o
zelo pela apuração crítica e equilíbrio entre as versões dos
acontecimentos continuam norteando o trabalho dos jor-
nalistas. Essa dinâmica já demonstra, inclusive, que o jorna-
lista tem papel ativo no processo de construção da notícia,
envolvendo-a sempre de intencionalidade e responsabili-
dade ética sobre seu enquadramento (CHAPARRO, 1994),
constatação que mais uma vez reforça o contraponto com
a perspectiva positivista no campo do jornalismo que opri-
me o jornalista e pretende neutralizar a sua capacidade de
atribuir sentido às coisas e emitir juízo sobre a realidade.
Para corroborar a afirmação de Popper (1993) de que
o que se entende, na sua melhor compreensão, por “obje-
tividade” seria melhor representado pelo termo “intersub-
jetividade”, Líriam Sponholz (2009, p. 172) garante que um
indivíduo “objetivo no sentido de sem julgamentos de valo-
res não existe. Desta maneira, não se pode exigir liberdade
de juízos de valor do sujeito em um processo de conheci-
mento. Por isso, Popper define ‘objetivo’ consequentemen-
te como intersubjetivo e com isso se refere ao método do
cientista.” Neste sentido, não podemos negar ao cientista
social, bem como ao cidadão ou, especialmente, ao jorna-
lista, a característica essencial da espécie humana de ela-
borar julgamentos sobre a realidade.
143
Nós não podemos roubar a parcialidade do cientista sem
roubar a sua humanidade. De maneira bem parecida, nós
também não podemos proibir ou destruir os seus julga-
mentos. (...) O cientista objetivo e sem valores não é o
cientista social. Sem paixão, não funciona, e na ciência
pura não funciona mesmo (POPPER, 1993 apud SPO-
NHOLZ, 2009, p. 172).
144
princípios teóricos através da cobertura jornalística da im-
prensa brasileira sobre a pandemia do novo coronavírus
(Covid-19), atualmente principal crise em saúde pública. A
situação pandêmica provocou mudanças comportamen-
tais da população, desafiou a medicina e a ciência a en-
tender sobre medicamentos e vacinas para conter o vírus
e, também, desafiou o campo do jornalismo em sua prática
diária (medidas sanitárias e comportamentais de proteção)
a se aperfeiçoar na orientação à população nesta situação
de crise (fornecendo informações de interesse público e in-
fluenciando a maneira como a população deve agir nesta
situação). Além de fiscalizar e denunciar constantes cor-
rupções de gestores desviando recursos que deveriam ser
destinados à compra de equipamentos para utilização nas
unidades de terapia intensiva (UTI’s) para atender pacien-
tes em estado grave.
Nosso foco sobre a imprensa brasileira se justifica
pela expressividade de casos e particularidades políticas
no tratamento da pandemia. A pandemia em território bra-
sileiro teve início em 26 de fevereiro de 2020 com a con-
firmação do caso de um homem de 61 anos que veio da
Itália5. Em agosto, o país completou seis meses desde que
ocorreu o primeiro óbito pela doença e, também, no mesmo
mês atingiu o número de mais de 120 mil mortes, estan-
do atrás apenas dos Estados Unidos. No Brasil, a crise tem
sido marcada pela constante discordância entre a Organi-
zação Mundial de Saúde (OMS) e o presidente Jair Bolso-
naro, principalmente com relação às orientações científicas
sobre isolamento social e uso da cloroquina defendida pelo
presidente e recusada pelos especialistas na área da saú-
de, situação que já provocou a saída dos ex-ministros Luiz
5 Ver: <https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2020/02/26/ministerio-
-da-saude-fala-sobre-caso-possivel-paciente-com-coronavirus.ghtml>.
145
Henrique Mandetta e Nelson Teich (este último completan-
do apenas 29 dias no cargo). Desde a saída de Teich em
15 de maio de 2020, ainda não há um ministro efetivo no
Ministério da Saúde, este sendo conduzido interinamente
pelo general Eduardo Pazuello6. Assim, o jornalismo brasi-
leiro, portanto, tem o desafio de cobrir duas crises: a de
saúde pública e a política RIBEIRO (2020).
Essa situação conturbada, em que o presidente da
República, numa postura negacionista da gravidade do
problema, menospreza a pandemia considerando-a ape-
nas uma “gripezinha” e estimula a população a não seguir
as recomendações médicas de isolamento social e uso de
máscara, desafia ainda mais o jornalismo diante da tare-
fa de orientar as pessoas sobre que medidas devem ser
seguidas durante esse período. Diante deste contexto, a
imprensa teve até de se articular em um conglomerado mi-
diático formado por diferentes empresas de comunicação7
e profissionais, para apurar e monitorar a quantidade de
óbitos no Brasil, devido à tentativa assumida pelo Ministé-
rio da Saúde de ocultar e/ou mascarar o número de óbitos
e infectados pela doença. Desta maneira, para enfrentar a
atitude contrária à boa prática da transparência na gestão
pública do governo Bolsonaro, o consórcio de meios de
comunicação difunde informações diárias de dados sobre
infecção e óbitos, não na perspectiva de reprodução da re-
alidade, já desconsiderada dentro da análise deste texto,
mas, sim, como leitura de mundo, organizadas em enredos
compreensíveis para que os públicos possam interpretá-la
(MOTTA, 2017). Os dados por si só também não represen-
6 O general Eduardo Pazuello assumiu oficialmente o Ministério da Saúde em
16/9/2020, sendo exonerado em 23/3/2021.
7 O consórcio de veículos da imprensa é formado pelas empresas: O GLOBO,
Extra, G1, Folha de S.Paulo, UOL e O Estado de S. Paulo. Os números são conta-
bilizados e consolidados a partir das secretarias estaduais de saúde.
146
tam uma universalidade, mas, sim, um recorte dessa reali-
dade que nos ajuda a compreender o mundo a nossa volta.
Por isso, torna-se relevante identificar que, mesmo
nas notícias mais factuais e/ou mais envolvidas com da-
dos, a sua constituição intersubjetiva permanece. Torna-se
ainda mais interessante observar nos exemplos da grande
mídia brasileira porque, recorrentemente, a objetividade é
um lema defendido pela mídia comercial8 em contrapon-
to aos veículos de posicionamento explícito (Comunicação
Pública, Jornalismo Independente, Comunitário).
Ao lado do pensamento de Bakhtin (2011), a discus-
são conta também com as reflexões de Motta (2017), Tra-
quina (2016) e Schudson (2010), que auxiliarão no olhar
sobre a narrativa jornalística como intersubjetiva. Os casos
que exemplificam as considerações teóricas são da im-
prensa brasileira de alcance nacional. As reflexões permiti-
ram esclarecer que o jornalismo está lutando a favor de sal-
var vidas, utilizando a informação de qualidade e verídica
como instrumentos necessários e vitais, para o combate ao
enfrentamento da Covid-19, tendo inclusive a grade de pro-
gramação das emissoras alteradas para que o espaço de-
dicado a notícia fosse maior e mais eficaz neste momento
em que se faz imprescindível a verdade dos fatos, como a
entrada do novo programa matinal da TV Globo, Combate
ao Coronavírus, apresentado pelo jornalista Márcio Gomes,
que foi veiculado na imprensa nacional entre 17 de março e
22 de maio de 2020, chegando a ter na TV aberta 11 horas
consecutivas de programas jornalísticos, das 4h da manhã
147
às 15h9. Nosso objetivo não é trazer uma análise discursiva
das notícias, mas de refletir elementos que confirmam a in-
tersubjetividade no discurso jornalístico.
148
Essa escolha é “orientada pela aparência que a realidade
assume para o jornalista, pelas convenções que moldam a
sua percepção e fornecem o repertório formal para a apre-
sentação dos acontecimentos, pelas instituições e rotinas”
(TRAQUINA, 2016, p. 235). Sobre isso, Motta (2017) carac-
teriza a narrativa jornalística como uma experimentação da
realidade, de forma que o contato com o mundo possibilita
a formação de referências e cria modelos de ordenamento,
fazendo com que a notícia nos permita “explorar perma-
nentemente nossa experiência temporal, compor enredos
e histórias superpostas, compreender quem somos e onde
estamos em cada momento. Elas explicam, ensinam, insti-
tuem provisoriamente o mundo, nosso mundo que refaze-
mos sem cessar” (MOTTA, 2017, p. 239).
Para discutir o valor da intersubjetividade, recorre-se
primeiro ao conceito bakhtiniano de dialogismo. Este prin-
cípio considera que a essência do discurso é ser sempre
constituído por outro discurso. Essa ideia é fundamentada
pelo ato da comunicação que envolve interações verbais
e não-verbais, em diálogo constante não somente com o
interlocutor, mas com o passado histórico, as relações cul-
turais, sociais, religiosas, políticas. Esse diálogo não pres-
supõe uma resposta imediata, mas é sempre feito com in-
tencionalidade para alguém. Assim sendo, é acertado dizer
que existem discursos anteriores ao nosso que nos cons-
tituem.
Cada enunciado é pleno de ecos e ressonâncias de ou-
tros enunciados com os quais está ligado pela identi-
dade da esfera de comunicação discursiva. Cada enun-
ciado deve ser visto antes de tudo como uma resposta
aos enunciados precedentes de um determinado campo
(aqui concebemos a palavra “resposta” no sentido mais
amplo): ela os rejeita, confirma, completa, baseia-se neles,
subentende-os como conhecidos, de certo modo os leva
em conta (BAKHTIN, 2011, p. 297).
149
A característica dialógica abre a discussão para en-
tendermos a natureza intersubjetiva da narrativa jornalísti-
ca, uma vez que, se todo discurso é permeado pelo outro,
assim também é o discurso jornalístico. Essa perspectiva
rompe com a compreensão de objetividade jornalística
marcada pela neutralidade e espelhamento da realidade.
Isso nos é concebido como impossível já que no ato da
produção da notícia estão envolvidos aspectos como: o
discurso do jornalista (perpassado por suas experiências
de vida, contexto famílias, político, social e religioso), da or-
ganização do veículo (linha editorial, publicidade envolvida,
condições de produção, tecnologia) e dos públicos.
Há um embate, no entanto, persistente sobre o fazer
jornalístico com relação à ilusória dicotomia entre fato e opi-
nião. Isso é tão recorrente que dentro dos gêneros jornalís-
ticos existem aqueles prioritariamente opinativos (editorial,
artigo de opinião, colunas) e os veículos de comunicação
tendem a reproduzir essa separação nas redações em que
apenas alguns profissionais tem acesso a esse espaço opi-
nativo. Se assim compreendêssemos, a grande maioria de
jornalistas, então, estaria apenas narrando fatos sem que
sua interpretação/opinião estivesse presente. Mas, esta
condução de pensamento é equivocada uma vez que, con-
forme Schudson (2010) observa, o fato é, na verdade, um
juízo majoritário sobre o acontecimento, distinguindo-se da
opinião apenas por uma questão de gradação de esforço
cognitivo de interpretação.
Outro importante ponto a reforçar é que todo discur-
so é ideológico, portanto, é impossível conceber um texto
jornalístico isento de ideologia10. A problemática que incide
150
sobre essa abordagem se refere à ideologia como marca
negativa (VAN DIJK, 1998) e dada essa perspectiva é que
se cria a polaridade entre um jornalismo ideológico e o su-
posto “a-ideológico”. Não há possibilidade deste último ser
concebido porque a ideologia não significa uma crença fal-
sa, mas sim “a base das representações sociais comparti-
lhadas pelos membros de um grupo (VAN DIJK, 1998, p. 21).
Isto quer dizer que as ideologias possibilitam as pessoas a
organizar a complexidade de crenças sociais e a agir so-
bre determinada(s) questão(ões). Assim sendo, todos nós
somos seres ideológicos e fazemos partes de grupos com
ideologias próprias. A mídia, por sua vez, é constituída de
ideologias e é um espaço de divulgação e fortalecimento
delas.
Todos esses pontos reforçam a natureza intersubjeti-
va do jornalismo: não há como conceber o discurso jorna-
lístico sem o envolvimento da presença do outro, sem sua
relação comunicativa com o mundo. Não é possível falar
do jornalismo sem apresentar o processo de ações cons-
cientes e intencionadas que envolvem os princípios éticos
jornalísticos, mas também dos atores do processo: “No jor-
nalismo as ações, os afazeres e seus contextos são de alta
complexidade, pois se trata de um processo social e cultu-
ral de intermediação com múltiplos emissores produtores
(de informações e opiniões) e receptores usuários” (CHA-
PARRO, 1994, p. 17-18). A notícia, por si só, é inevitavelmente
concebida em diálogo.
151
Desafio jornalístico: O contexto da Pandemia do
Coronavírus
152
dem ter um direcionamento distinto das diretrizes nacio-
nais (SCHULZ, 2020). O Instituto Reuteurs divulgou uma
pesquisa realizada entre os meses de janeiro e fevereiro de
2020 sobre a valorização das notícias locais. O Brasil apa-
rece em primeiro lugar dos 40 países analisados, contabi-
lizando 73% da população como interessada em notícias
locais (SCHULZ, 2020), o que ressalta a importância da
presença do regionalismo nos trabalhos jornalísticos.
A pandemia evidenciou as mídias tradicionais de
referência como protagonistas na divulgação das notícias
como as mais confiáveis, já que as redes sociais têm po-
tencializado a divulgação da fake news (RIBEIRO, 2020).
Houve um crescimento significativo na audiência de TV,
contabilizando 77% da população que recorre ao telejor-
nalismo para se manter informado (Vogel/Pesquisa Kantar
Ibope realizada entre os dias 20 de abril e 07 de maio de
2020). Diante da conjuntura atual e dos desafios jornalísti-
cos para informar, busca-se enfocar na intersubjetividade
desta narrativa que, por numa situação adversa como essa,
pode ser cobrada a espelhar a realidade da doença e dos
casos, ideia desmistificada neste trabalho.
153
as notícias. Nos jornais diários, a cobertura tem sido mais
pontual com foco nos casos de infectados e mortos, em
como as cidades e estados estavam se organizando para
combater o vírus. Já em um dos maiores jornais televisivos
do Brasil, o “Fantástico”, exibido há mais de 30 anos nos do-
mingos, em horário nobre da Rede Globo, buscou-se apre-
sentar as vítimas do Covid-19 não apenas como números,
mas através da montagem de um painel de fotos com as
imagens de uma boa parte das vítimas, além de ter reali-
zado uma parceria com os atores da emissora que drama-
tizaram os relatos com a narração da história das vítimas,
sempre destacando a vida, os sonhos não finalizados, os
parentes que ficaram e a vulnerabilidade da vida humana.
Esta narrativa representou uma tentativa autêntica e iné-
dita de trabalhar a emoção e sensibilizar o público sobre a
importância de se proteger respeitando o isolamento so-
cial. Aqui se desmistifica, portanto, que a intersubjetividade
aconteça somente quando há uma valorização emocional
ou partidária no jornalismo. Nos dois casos há a intersub-
jetividade porque, como afirmado durante o texto, é parte
constitutiva do fazer jornalístico.
Outro momento delicado no Brasil foi quando o país
alcançou a marca das 50 mil mortes. Isso aconteceu no dia
20 de junho de 2020, e o editorial do Jornal Nacional abor-
dou diretamente este momento histórico quando o jorna-
lista e editor-chefe, William Bonner, afirmou: “A história vai
registrar também aqueles que se omitiram, que foram ne-
gligentes, que foram desrespeitosos. A história atribui glória
e atribui desonra. E a história fica para sempre”. Enquanto
o editorial era apresentado, as imagens das vítimas eram
mostradas ao fundo em um grande painel da solidariedade
às famílias, com o intuito de sensibilizar os espectadores e
reafirmar a necessidade dos cuidados para evitar a propa-
gação da Covid-19. E, após 49 dias, o número de vítimas
154
fatais torna-se o dobro, alcançando a marca dos 100 mil
mortos pela Covid-19, no dia 8 de agosto de 2020, tendo
no mesmo dia registrado a marca de 3 milhões de casos
confirmados no país, perpassando 143 dias após a primeira
morte da doença no Brasil12.
É relevante destacar que os exemplos citados per-
tencem ao formato audiovisual que, além do recurso das
imagens, tem-se também, a nível discursivo, a entonação.
Essa entonação também expressa sentido, principalmente
reforçando a presença do outro no discurso (a sua inter-
subjetividade) porque:
A expressão do falante penetra através desses limites e
se dissemina no discurso do outro, que podemos trans-
mitir em tons irônicos, indignados, simpáticos, reveren-
tes (essa expressão é transmitida com o auxílio de uma
entonação expressiva – no discurso escrito é como se a
advinhássemos e a sentíssemos graças ao contexto que
emoldura o discurso do outro – ou pela situação extraver-
bal – ela sugere a expressão correspondente (BAKHTIN,
2011, p. 299).
155
Uma notícia impressa, por outro lado, não possui o
recurso de entonação “falada”, mas uma entonação “escri-
ta” através, principalmente, da pontuação (pontos de excla-
mação, reticências, aspas) e marcas de ironia.
Em outra notícia, desta vez veiculada no site do Mi-
nistério da Saúde13 quando foi confirmado o primeiro caso
da doença no país (26 de fevereiro de 2020), temos o caso
comum de um discurso jornalístico mais factual. Com o tí-
tulo “Brasil confirma primeiro caso da doença”, verificamos
que mesmo uma notícia nos termos factuais está envolvida
por suas relações dialógicas e isso fica ainda mais claro
quando a fala dos entrevistados são citadas, mesmo que
em discurso direto, quando aparenta-se se distanciar do
que é citado, mas que na verdade é resultado da interpre-
tação e relação com aquele que escreve a notícia, podendo
ser utilizado estrategicamente para criar efeito de autentici-
dade, distanciamento por não concordar ou até a demons-
tração de adesão ao que é dito (MAINGUENEAU, 2008).
Essa notícia em particular mencionou constantemente
suas fontes através do uso do discurso direto, com falas do
até então Ministro Luiz Henrique Mandetta e do secretário
de Vigilância em Saúde, Wanderson de Oliveira explicando
como o Brasil, naquele momento, enfrentaria a pandemia,
reforçando os hábitos de higiene e garantindo o acesso às
informações.
CONCLUSÃO
156
até seu produto final. É evidenciar que o jornalista é parte
deste processo, mas não somente ele. Nele estão presentes
ecos do mundo que reverberam inevitavelmente no texto
jornalístico. A partir de Bakhtin vimos que as vozes estão
sempre presentes no discurso e que a narrativa jornalís-
tica as reúne e forma enredos compreensíveis (MOTTA,
2017). Nesses termos, a presente pesquisa reafirma que,
para além de destacar o envolvimento ativo do jornalista
como uma subjetividade aparente que pressupõe marcas
discursivas da emoção, estamos reforçando a natureza in-
tersubjetiva, ou seja, a relação do indivíduo com o mundo
presente no texto.
Discute-se também que as reportagens que apre-
sentem um possível apelo emotivo ou posicionamento ex-
plícito ainda são questionadas diante do embate contra a
objetividade. A emoção não é hierarquicamente menor ou
uma fraqueza humana no jornalismo como pressupõe as
crenças positivistas. A insistente proposição que distancia
jornalismo opinativo do jornalismo informativo impede de
olhar mais profundamente que, explícita ou não, a opinião
é própria da interpretação jornalística. Isso quer dizer que,
mais do que a marca da subjetividade exposta em emoção
ou posicionamento explícito, a intersubjetividade se refere
à constituição do discurso jornalístico em ser sempre en-
volvido pelo outro e pelas relações que o cercam (culturais,
históricas e sociais).
Essa abordagem não é um desafio somente perce-
bido na prática profissional, mas desde o ensino do jor-
nalismo influenciado pelo processo de padrão jornalístico
americano em que havia o incentivo ao conceito de profis-
sionalismo neutro (HALLIN; MANCINI, 2010). Na realida-
de, o desafio não deveria ser o de informar imparcialmente,
mas de apurar de forma consistente e transparentemente
157
fundamentada, através de uma perspectiva pluralista, re-
presentando a diversidade significativa de versões existen-
tes sobre o acontecimento.
Atualmente, diante de um momento histórico-social
que se vivencia da pandemia do novo coronavírus, encon-
tra-se a imprensa brasileira imersa no objetivo ideológico
de ser um instrumento normativo de combate, na área da
saúde, ao vírus, mas, também, de combate ao vírus político-
-social que agrava a ameaça à nação brasileira e a desafia
a ter que lutar mais em todos os âmbitos para salvar vidas,
utilizando a informação de qualidade, a educação e os cui-
dados básicos de saúde como mecanismos de luta por dias
melhores. Nestes termos, o jornalismo revela ainda mais a
sua importância para a sociedade. Foi discutido, inclusive,
que diante do desafio de informar em circunstâncias e difi-
culdades tão particulares como as vivenciadas nesta pan-
demia, o jornalismo precisa cumprir com seu dever social,
sendo reconhecida a sua intersubjetividade.
REFERÊNCIAS
158
HALLIN, D.C; MANCINI, PAOLO. Sistemas de Media: Es-
tudo Comparativo – Três Modelos de Comunicação e Polí-
tica. LIVROS HORIZONTE, LDA: Lisboa, 2010.
JORNAL NACIONAL. (2020). Editoria do Jornal Nacio-
nal. Retirado de https://globoplay.globo.com/v/8641367/.
Acessado em 14 de agosto de 2020.
MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de comu-
nicação. 5ª Ed. São Paulo: Cortez, 2008.
MOTTA, L, G. Narrativas jornalísticas e conhecimento
de mundo – representação, apresentação ou experimenta-
ção da realidade? In: PEREIRA, F.; MOURA, D.;
ADGHIRNI, Zélia (Orgs). Jornalismo e Sociedade. Floria-
nópolis: Insular, 2017.
PARK, R. A notícia e poder da imprensa. In: BERGER, C.;
MAROCCO, B. (org.). A era glacial do jornalismo. Porto
Alegre/RS: Sulina, v. 2., 2008, p.71-82.
RIBEIRO, M. A cobertura da pandemia do novo coro-
navírus trouxe maior credibilidade ao jornalismo. Dis-
ponível em: <http://www.observatoriodaimprensa.com.br/
coronavirus-covid- 19/a-cobertura-da-pandemia-do-novo-
-coronavirus-trouxe-maior-credibilidade-ao-jornalismo/>.
Acessado em 14 de agosto de 2020.
SCHUDSON, Michael. Descobrindo a notícia. Petrópolis:
Vozes, 2010.
SCHULZ, Anne. Global Turmoil in the Neighbourhood:
Problems Mount for Regional and Local News. Reuters
Institute. 2020. Disponível em: <http://www.digitalnews-
report.org/survey/2020/global-turmoil-in-the-neighbou-
rhood/>. Acessado em: 14 de agosto de 2020.
SPONHOLZ, Líriam. Jornalismo, conhecimento e objeti-
159
vidade. Florianópolis: Editora Insular, 2009.
TRAQUINA, Nelson. Jornalismo: questões, teorias e ‘estó-
rias’. Florianópolis: Insular, 2016.
VOGEL, M. A TV em tempos de Covid-19: impactos e mu-
danças no comportamento da sociedade. Disponível em:
<https://www.kantaribopemedia.com/a-tv-em-tempos-
-de-covid-19- impactos-e-mudancas-no-comportamento-
-da-sociedade/>. Acessado em 14 de agosto de 2020.
160
Realeza na Mídia: O Jornalismo de Entretenimento e a
Invasão de Privacidade de Pessoas Públicas1
Maria Thereza Oro SARAIVA2 Ivone Maria CASSOL3
Introdução
161
levantar discussões a respeito de temáticas vistas na época
como polêmicas (como a AIDS), a mídia sensacionalista a
via como um produto para aumentar suas vendas, através
de matérias que exploravam a vida princesa. Adorada pelo
povo, este consumia qualquer conteúdo que fizesse men-
ção a ela, mesmo que a informação fosse obtida infringindo
sua vida íntima.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos da
Organização das Nações Unidas (1948) assegura, em seu
artigo XII, o direito à proteção legal contra interferências
à vida privada e ataques à honra e reputação. Porém, es-
ses veículos de comunicação chegam a transpassar essa
determinação para obter alguns conteúdos, especialmente
quando se referem ao cotidiano e intimidade de celebri-
dades. Segundo Severino (2010), pesquisa realizada pelo
Centro PEW de Pesquisas para a População e Imprensa
(2007) constatou que 40% dos americanos acreditam que
há um excessivo espaço dedicado à vida de artistas em re-
lação a outras editorias, como saúde e economia.
A princesa de Gales foi desprovida de seu direito à
vida privada em detrimento da demanda por conteúdos
que fossem além de suas aparições públicas e eventos,
mas também sua intimidade. Esta mesma invasão de pri-
vacidade, 22 anos depois, se repete com Kate Middleton e
Meghan Markle? Este é problema de pesquisa que motiva
as reflexões do artigo.
162
Johannes Gutenberg, em 1455, ela ganha maior densidade
(RAMOS, 2012, p. 19) em sua forma escrita: a mídia impres-
sa.
De acordo com Aguiar (2008), os jornais, com o pas-
sar do tempo, assumiram caráter comercial, tornaram-se
um negócio e incluíram maior diversidade de temas em
suas matérias para se aproximar de novos públicos que
preferiam conteúdos mais leves do que os da política, por
exemplo. A partir disso, surge a penny press, um modelo
de jornal vendido ao valor de um centavo e de alta circula-
ção, sendo a precursora da mídia sensacionalista (AGUIAR,
2008)
A emergência de um amplo mercado de massas incre-
menta a publicidade, que se torna o principal fator eco-
nômico de sustentação da empresa jornalística. Para
assegurar fartas verbas publicitárias, os jornais precisam
atingir uma alta vendagem, ampliando constantemente
seu público através de estratégias comunicacionais. O
sensacionalismo configurou-se [...] como uma das mais
eficientes estratégias de comunicação para fascinar e se-
duzir o público, visto elevar a potencialidade de entreteni-
mento do acontecimento. (AGUIAR, 2008, p. 20)
163
cificidades da narrativa sensacionalista, Angrimani (1995)
utiliza da metáfora do sangue para definir esse nicho jorna-
lístico, onde bastaria “espremer o jornal” para sair o sangue.
“Onde há morte, há jornalistas”, declara Traquina (2008,
p. 79). Apesar de estar diretamente ligada ao estímulo de
emoções negativas, não apenas da tragédia se faz o sensa-
cionalismo. O entretenimento também se encontra entre os
conteúdos consumidos pelos leitores, uma inclinação em
crescimento nas últimas décadas.
Arbex Jr. (2001) associa a teoria da sociedade do es-
petáculo, do francês Guy Debord, ao efeito que o entrete-
nimento inserido nos meios de comunicação provoca no
público. A teoria de Debord (1997) faz crítica à mídia e nas
representações que oferecem, transformando a sociedade
e as relações sociais em um espetáculo idealizado por elas.
Guy Debord afirmava que “a sociedade de consumo”,
apoiando-se nos meios de comunicação de massa, tor-
nara-se a “sociedade do espetáculo”, ou melhor o espetá-
culo tornara-se a forma de ser da sociedade de consumo.
O espetáculo – diz Debord – consiste na multiplicação de
ícones e imagens, principalmente através dos meios de
comunicação de massa, mas também dos rituais políticos,
religiosos e hábitos de consumo, de tudo aquilo que que
falta à vida real do homem comum: celebridades, atores,
políticos, personalidades, gurus, mensagens publicitárias
– tudo transmite uma sensação de permanente aventura,
grandiosidade e ousadia. (ARBEX JR; 2001, p. 69)
164
se dedica mais à frente - e sua morte como um elemen-
to importante dentro dessas particularidades. O acidente
rendeu para a mídia um grande aumento da procura por
exemplares dos jornais como The Guardian, Daily Express
e The Sun que tiveram acréscimos de 50% cada em sua
tiragem regular, o último vendendo mais de um milhão de
cópias extras, de acordo com a Folha de São Paulo5.
O fato foi um exemplo de “interação máxima entre a
informação e o público” (DEJAVITE, 2007, p.6). O acidente
se enquadra dentro de três características da notícia “light”
de entretenimento (que a autora define como “conteúdo rá-
pido, de fácil entendimento, efêmero, de circulação intensa,
que busca divertir o receptor”) segundo Taurela e Gil (cita-
dos por DEJAVITE, 2007, p. 6), que são:
“a) Capacidade de distração – ocupa o tempo livre, para
não aborrecer;
b) Espetacularização – estimula e satisfaz aspirações,
curiosidades, ajuste de contas, possibilidades de extrava-
sar as frustrações, nutre a imaginação;
c) Alimentação das conversas – facilita as relações so-
ciais, oferecendo temas de conversação do dia-a-dia,
como boatos e notícias sobre celebridades.”
165
Vendo e lendo sobre a vida dos astros, as pessoas se tor-
nam cada vez mais próximas, mais íntimas deles. Através
da revista, da TV e outros meios, eles se tornam “fami-
liares” para elas. [...] Acompanhando a vida das celebri-
dades, os leitores acabam se envolvendo com elas, cha-
mando-as pelo primeiro nome, enfim, ampliando, o seu
universo cotidiano pela incorporação dessas pessoas ao
seu círculo de parentes, amigos e conhecidos, formando
uma espécie de “família extensa” ou “comunidade imagi-
nada”. (MIRA, 1999, p. 12)
166
Charles foi assistida por cerca de 750 milhões de pessoas7.
Além dos fatores que levam ao consumo de conte-
údo relacionado às celebridades, a nobreza ainda possui
um aspecto adicional. Farley (em entrevista a DUCHARME,
2018) explica que esse interesse do público pela família real
britânica - uma das poucas remanescentes do mundo - em
específico, deriva-se de um sentimento de curiosidade. O
psicólogo acrescenta à curiosidade a atmosfera de contos
de fada que esses personagens estão envoltos, vivendo
com influência, fama e fortunas herdadas em castelos.
A constante demanda por essa temática, que está
ligada ao psicológico do público, afeta também o merca-
do que a oferece. Buscando conteúdo para venda, alguns
veículos cruzam o limite ético do jornalismo, bem como
barreiras legais. Os paparazzi são exemplos dos exageros
cometidos, especialistas em perseguições para obterem
“cliques” com as celebridades.
167
os Princípios Internacionais da Ética Profissional no Jorna-
lismo, acordado em 20 de novembro de 1983, em Paris. O
documento serve como base e inspiração para os códigos
nacionais, como o Código de Ética dos Jornalistas Brasilei-
ro (2007).
Entre os dez princípios, encontram-se a dedicação
do jornalista para realidade objetiva, integridade do jor-
nalista profissional, respeito ao interesse público e outros
itens aqui destacados por abordarem aspectos condizen-
tes a esta pesquisa. Dessa forma, o Princípio VI - Respeito
à Privacidade e à Dignidade Humana assegura:
Uma parte integrante dos padrões profissionais do jorna-
lista é o respeito ao direito de privacidade do indivíduo e
à dignidade humana, em conformidade com o que está
previsto na lei nacional e internacional relativa à proteção
dos direitos e da reputação de outros, proibindo calúnia e
difamação. (UNESCO, 1983)
168
a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização
pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
Em um âmbito internacional, a Convenção Europeia dos
Direitos Humanos (1953) regula a privacidade dos cidadãos
europeus, como os citados nessa pesquisa.
Porém, esse direito acaba sendo transposto, muitas
vezes, pelo sensacionalismo, especialmente ao tratar de
pessoas públicas, que, apesar de ocuparem cargos ou fun-
ções de interesse dos cidadãos, ainda possuem uma vida
privada que deve ser respeitada. O alto consumo de conte-
údos referentes à vida de celebridades, bem como a liber-
dade de expressão tornam-se justificativas apresentadas
por esses meios ao burlar sua privacidade.
Essas pessoas – os homens públicos – perdem, por assim
dizer, grande parte de sua vida privada, como se os limi-
tes de sua vida reservada recuassem para fronteiras mí-
nimas e imprimíveis, quando cotejadas suas vidas com a
vida do homem comum em ordinárias circunstâncias. Por
conseguinte, as vidas e as imagens dessas pessoas são
esquadrinhadas às largas pelos meios de comunicação,
em busca de fatos ou imagens reveladoras de suas pre-
ferências, às vezes pelas coisas mais banais, suas idios-
sincrasias, seus estilos de vida, relacionamentos íntimos,
etc. Enfim, suas vidas e modo de ser são escrutinados a
todo tempo sem que essas figuras notórias nada, ou qua-
se nada, possam fazer. Este é o ônus de quem goza de
uma vida predicada por uma das hipóteses acima ou as-
semelhadas, exibindo-se como o campo de privacidade
mais restrito de todos o dos chamados homens públicos,
cujas vidas podem ser uma referência, ou uma advertên-
cia, para toda a sociedade. Quando alguém busca uma
função inerente ao que se pode chamar de homem públi-
co está automaticamente abdicando do direito de man-
ter certas reservas que a qualquer dos simples mortais é
conferido. (CALDAS, 1997, p. 104)
169
de conteúdo são os paparazzi. A palavra italiana – papara-
zzo, no singular – designa profissionais, normalmente fo-
tógrafos, responsáveis por “caçarem” histórias envolvendo
pessoas públicas e foi popularizada pela revista Time (SA-
MUELSON, 2017, p. 2). Segundo o autor, os jornais sensa-
cionalistas de formato tabloide, como o britânico The Sun,
foram responsáveis pela disseminação da profissão. Curry
Jr. (2000) reforça essa ideia:
Armados com lentes objetivas, microfones de alta potên-
cia e a promessa de grandes recompensas em dinheiro
por uma exposição exclusiva de alguma celebridade, os
paparazzi têm se tornado mais intrusivos e agressivos
que nunca em sua perseguição por informações privadas
de celebridades. (CURRY Jr, 2000, p. 946, tradução nossa)
170
irmão, Charles Spencer, a descreveu em seu funeral, em
1997, como “a pessoa mais caçada da história moderna”. Na
época em que esteve na mídia, Diana não era encoraja-
da pela família real britânica a usar a lei ao seu favor em
relação à sua privacidade (BBC, citada por SAMUELSON,
2017). Porém, após seu fatídico acidente, em 31 de agosto
de 1997, causado pela perseguição de paparazzi ao carro
em que estava, essa abordagem mudou. Por outro lado,
20 anos depois, esperava-se que estes veículos, que sob o
preceito do interesse do público pelo conteúdo publicado,
tivessem aprendido e adotado uma conduta muito mais éti-
ca e respeitosa. Essa pesquisa busca identificar e analisar
as possíveis mudanças de conduta.
171
recebeu um presente inesperado, que mudaria sua vida, até
então bastante pacata: a companhia da mídia.
Tudo começou a aumentar de proporção, no sentido de
que a imprensa tornava tudo insuportável ao seguir cada
um dos meus movimentos. Eu entendia que aquele era o
trabalho deles, mas as pessoas não se davam conta de
que eles usavam binóculos para me espionar o tempo
todo. Eles alugaram um apartamento do outro lado da
Old Brompton Road que tinha uma biblioteca com vista
para o meu quarto, e isso não era justo com as meninas.
Eu não podia deixar o telefone fora do gancho porque
algum membro da família delas podia adoecer durante
a noite. Os jornais costumavam me telefonar às duas da
manhã – estavam apenas publicando mais uma história.
“Você pode confirmar ou negar?” (SPENCER, citada por
MORTON, 2013, p. 41)
172
nalista não a deixava em paz:
Os relatórios iniciais da polícia descreveram uma cena
de desordem com “flashes de máquinas fotográficas dis-
parando como tiros de metralhadora ao redor do lado
direito traseiro do veículo onde a porta estava aberta”. O
primeiro policial a chegar à cena teve de chamar reforços
para lidar com os paparazzi truculentos, cujas ações ao
perseguirem Diana, a princípio, indicavam que ela fora,
literalmente, caçada até a morte. Sete fotógrafos foram
presos e investigados formalmente por tentativa de homi-
cídio e por omissão de socorro às vítimas de um acidente.
(MORTON, 2013, p. 335)
174
financeiro pelo interesse do público nessa temática a res-
peito de celebridades. Caso houvesse interesse genuíno
em adotar uma abordagem ética, o tabloide deveria apoiar
a decisão de um acréscimo na legislação em relação ao
direito à privacidade, além de uma mudança própria condi-
zente com essa decisão.
Até aquele ano, o Reino Unido não possuía uma lei
específica que garantisse o direito à vida privada dos seus
cidadãos. Na reportagem “Políticos discutem lei sobre pri-
vacidade” (BRAGA, 1997) do mesmo caderno, o deputado
Roger Gale defendeu seu argumento: “talvez essa tragédia
faça com que as pessoas acordem para o poder excessivo
da imprensa e para a necessidade de regulamentação na-
cional e internacional”. Apenas no ano 2000 o país aderiu à
legislação da Convenção Europeia dos Direitos Humanos,
três anos após o acidente.
O legado de Diana para seus filhos, William e Harry,
foi o de garantir o direito de resposta a suas noras, quando
vítimas do mesmo problema: os tabloides.
Catherine “Kate” Elizabeth Middleton é natural de Re-
ading, na Inglaterra. Em sua juventude, conheceu o primo-
gênito da princesa, William, durante a faculdade: segundo o
portal de notícias da BBC9, além do curso, ambos compar-
tilharam durante quatro anos o mesmo apartamento, tor-
nando-os bastante próximos. No início do relacionamento,
o Palácio estabeleceu um acordo de privacidade com os
tabloides para os dois. O acordo, porém, não durou muito
tempo:
[...] Kate foi trazida pela primeira vez à atenção do públi-
co depois de inúmeros tabloides a fotografarem ao lado
175
do Príncipe William e Príncipe Charles em um resort de
esqui em Klosters, na Suíça, em 2005. As fotografias apa-
receram, mesmo com os esforços dos assessores para
manterem as férias privadas. [...] Em outubro de 2005, de-
pois da publicação de uma foto mostrando Kate olhando
pela janela de um ônibus em Londres, seus advogados
escreveram para os editores de jornais e revistas pedin-
do por respeito e por sua privacidade. Eles alegavam que
fotógrafos a seguiam noite e dia desde que saiu da uni-
versidade. (BBC, 2010)
176
leitor. Mesmo que irreal, ele se vê compelido a consumir
esse conteúdo, seja para comentar as fotos (ilegalmente
obtidas) da duquesa, ou para “informar-se” a respeito de
um possível distúrbio alimentar.
A atual Duquesa de Sussex, Rachel Meghan Markle,
por outro lado, é americana, divorciada, birracial (filha de
pai caucasiano e mãe negra), engajada em causas sociais e
ambientais e não era uma estranha para a mídia: estrelou a
série Suits em 2011, como a assistente jurídica Rachel Zane.
Porém, quando seu relacionamento com o príncipe Harry
(filho mais novo de Diana e Charles) veio a público, ela ex-
perienciou uma face diferente dos tabloides:
As histórias pareciam um soar de trombetas abrindo a
temporada de caça por meio de uma enxurrada de abu-
sos racistas de valentões virtuais. Em questão de dias,
Meghan vivenciou racismo e sexismo em níveis que ela
jamais enfrentou na vida. Embora ela vivesse debatendo
e escrevendo sobre tais assuntos nos últimos anos, nada
se aproximava dessa carnificina. Meghan, a ativista, a hu-
manitária e a mulher, sendo reduzida a uma criatura bidi-
mensional. Como escreveu o biógrafo Sam Kashner: “As
críticas a Markle eram recheadas de pedantismo, racismo
e desinformação”. (MORTON, 2018, p. 192)
177
xá-la em suas acusações, tornando sua imagem em algo vil.
Não apenas cruel em suas críticas, a imprensa tam-
bém recorre a artifícios para tecê-las. Estes recursos, assim
como os mencionados nas análises anteriores, são formas
de obtenção de conteúdo através de invasão de privacida-
de. Entre eles estão a presença de paparazzi (em caso cita-
do em outra matéria reproduzida pela Folha de São Paulo12,
o príncipe Harry foi indenizado pela publicação não autori-
zada de imagens de sua residência obtidas por fotógrafos
em helicópteros) e quebra de sigilo de correspondência.
O jornal The Mail on Sunday divulgou uma carta pri-
vada que Meghan enviou ao seu pai, Thomas Markle. Em
resposta, Harry publicou em um site oficial13 uma declara-
ção em que afirma que o casal recorreu a advogados em
um processo contra o jornal e também acusando-o de uma
perseguição contra Meghan, assim como a mídia fez com
sua mãe, Diana, manipulando informações e divulgando in-
verdades.
Essa ação legal específica depende de um incidente em
um padrão longo e perturbador de comportamento da
mídia tabloide britânica. O conteúdo de uma carta par-
ticular foi publicado ilegalmente de maneira intencional-
mente destrutiva para manipular você, o leitor, e promover
a agenda divisória do grupo de mídia em questão. Além
da publicação ilegal deste documento particular, eles pro-
positadamente o enganaram ao omitir estrategicamente
parágrafos selecionados, sentenças específicas e até pa-
lavras singularespara mascarar as mentiras que haviam
perpetuado por mais de um ano.
178
correta. Porque meu medo mais profundo é a história se
repetindo. Vi o que acontece quando alguém que eu amo
é comoditizado a ponto de não ser mais tratado ou visto
como uma pessoa real. Perdi minha mãe e agora vejo mi-
nha esposa sendo vítima das mesmas forças poderosas.
(DUQUE DE SUSSEX, 2019)
179
membros sêniores da realeza, trabalhando de forma inde-
pendente. O casal mudou-se para os Estados Unidos, onde
poderiam ter a liberdade de criar seu filho e dedicar-se às
suas fundações, sem estarem diretamente ligados à ima-
gem real.
Tanto Kate como Meghan mantém uma postura rea-
tiva em relação à abordagem dos tabloides sobre si e sua
família, defendendo seu direito à vida privada. Direito este
que foi negado à Princesa do Povo durante todo o perío-
do em que esteve na mídia e mesmo no momento de sua
morte.
Conclusão
180
de altruísmo e compaixão com seu povo, conquistando o
público. Porém, a avidez deste público em buscar sentir-se
próximo de sua princesa favorita, a Princesa do Povo, en-
controu-se com a avidez dos tabloides em venderem essa
proximidade em forma de matérias e fotos. O acidente, em
31 de agosto de 1997, envolvendo paparazzi, foi o ápice dos
absurdos cometidos para obter fotografias suas.
Após o incidente, esperava-se que a posição e com-
portamento da mídia sensacionalista mudaria. Não são vis-
tos mais enxames de jornalistas e fotógrafos ao redor dos
membros da família real, todavia, a ética ainda é algo em
falta em sua abordagem. As análises referentes às duque-
sas de Cambridge e Sussex, através das matérias reprodu-
zidas pelo jornal Folha de São Paulo, são provas disso.
Paparazzi ainda usam lentes objetivas para capturar
momentos privados de Kate Middleton durante suas férias
com o marido e parte da mídia britânica ainda faz de Me-
ghan Markle seu alvo de críticas. A maior mudança, porém,
é vista na forma como essas personalidades passaram a
reagir ao serem vítimas do comportamento antiético dos
meios de comunicação.
Ambas as duquesas (com apoio público de seus ma-
ridos) recorreram aos advogados para usufruírem da pro-
teção legal a sua privacidade. Além disso, utilizaram canais
públicos, como a publicação de uma carta aberta e entre-
vistas reclamando das ações a que foram submetidas.
O povo, sob os encantos de um ideal de uma vida em
castelos, vestidos extravagantes e casamentos assistidos
por milhões de pessoas, mas que também é próximo de
si, por sofrerem com desilusões amorosas, escândalos de
família e divertirem-se de (ou sem) biquíni em suas férias,
consome esses materiais da mídia. Fomentados por isso,
181
os meios de comunicação procuram, sob qualquer circuns-
tância, suprir essa demanda através de fotografias invasi-
vas e textos, por vezes, ofensivos ou fictícios (ou ambos) a
respeito dessas pessoas públicas, transpondo limites éti-
cos e legais.
O estudo realizado permite tecer considerações a
respeito do modo como celebridades são tratadas pelos ve-
ículos de comunicação e suas respostas. Apesar da funda-
mentação dos princípios éticos, a mídia nacional (no caso
da brasileira), como internacional, quando se trata das per-
sonalidades, acaba ignorando completa ou parcialmente o
respeito à privacidade. Essa invasão hoje pode ser ainda
mais ousada com recursos tecnológicos disponíveis (como
drones) e acontece de diversas formas, mas principalmente
com publicação de imagens captadas sem consentimento.
Entre os casos analisados, pouca mudança é constatada a
respeito da abordagem às pessoas públicas pelos meios de
comunicação, bem como o interesse do público a seu res-
peito. A diferença, mais de 20 anos depois, é que, cansados
de serem alvos marcados pelo seu status de celebridade,
as personalidades estão mais reativas atualmente e fazem
uso do amparo legal para preservar sua vida privada.
REFERÊNCIAS
182
Acesso em: 17 out. 2019.
ANGRIMANI Sobrinho, Danilo. Espreme que sai sangue:
um estudo do sensacionalismo na impresnsa. São Paulo:
Summus, 1995.
ARBEX Jr., José. Shownarlismo: a notícia como espetáculo.
3.ed. São Paulo: Casa Amarela, 2001.
ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração
Universal dos Direitos Humanos. Paris, 1948. Disponível
em: <https://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.
aspx?LangID=por>. Acesso em: 17 nov 2019.
BBC NEWS. Meghan sues Mail on Sunday over priva-
te letter. 02 out. 2019. Disponível em: <https://www.bbc.
co.uk/news/amp/uk49901047? twitter_impression=true>.
Acesso em: 17 out. 2019.
BBC NEWS. Royal baby: Meghan, Harry and the fine line
between public and private life. 06 mai. 2019. Disponí-
vel em: <https://www.bbc.co.uk/news/amp/uk48079417>.
Acesso em: 17 out. 2019.
BBC NEWS. Royal wedding: The Kate Middleton Story. 16
nov. 2019. Disponível em: <https://www.bbc.com/news/
uk-11767308>. Acesso em 17 out. 2010.
BBC NEWS. The Wedding of Prince Charles and Lady
Diana Spencer. 29 jul. 1981. Disponível em <https://www.
bbc.com/historyofthebbc/anniversaries/july/wedding-of-
-prince-charlesand-lady- diana-spencer>. Acesso em: 06
dez. 2019.
BRAGA, Paulo Henrique. Políticos discutem lei sobre
privacidade. Folha de São Paulo: 1997. Disponível em: ht-
tps://www1.folha.uol.com.br/fsp/1997/9/01/caderno_espe-
cial/38.html. Acesso em 26 de novembro de 2021.
183
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República
Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
CALDAS, Pedro Frederico. Vida Privada, liberdade de im-
prensa e dano moral. São Paulo: Saraiva, 1997.
CBS NEWS. “Not many people have asked if I’m OK”:
Meghan Markle gives emotional interview in new documen-
tary. 09 out 2019. Disponível em: <https://www.cbsnews.
com/news/meghan-markle-interview-duchess-of-sus-
sexopens-up-about-being-new-mom-in-itv-documentary-
-with-prince-harry- 2019-10-19/>. Acesso em: 09 nov 2019.
COUNCIL OF EUROPE. Convenção Europeia dos Direi-
tos Humanos. 1953. Disponível em: <https://www.echr.
coe.int/Documents/Convention_POR.pdf>. Acesso em 17
out. 2019.
CURRY JR., Richard J. Diana’s Law, Celebrity and the
paparazzi: the continuing search for a solution. In: Journal
of Competence and Information Law. Issue 4. 2000. Dispo-
nível em: <https://repository.jmls.edu/jitpl/vol18/iss4/3/>.
Acesso em: 17 out. 2019.
DEJAVITE, Fabia Angelica. Infotenimento. São Paulo: Pau-
linas, 2006.
DUCHARME, Jamie. Why people are obsessed with the
royals, according to psychologists. In: TIME. 2018. Dis-
ponível em: <https://time.com/5253199/royalobsession-
-psychology/>. Acesso em: 17 out. 2019.
FOLHA DE SÃO PAULO. ‘A duquesa difícil’: Por que os
tabloides britânicos odeiam Meghan Markle. 1 ago. 2019.
Disponível em: <https://f5.folha.uol.com.br/celebrida-
des/2019/08/a-duquesa- dificil-por-que-ostabloides-brita-
nicos-odeiam-meghan-markle.shtml>. Acesso em: 17 out.
2019
184
DUQUE DE SUSSEX, Declaração de Sua Alteza Real o
Príncipe Harry. Disponível em https://sussexofficial.uk/.
Acesso em 26 de novembro de 2021.
FOLHA DE SÃO PAULO. Meghan Markle processa jor-
nal britânico por bullying, e Harry lembra perseguição
à Lady Di. 2 out. 2019. Disponível em: <https://f5.folha.uol.
com.br/celebridades/2019/10/meghan-markle-processa-
-jornalbritanico-por- bullying-e-harry-lembra-perseguicao-
-a-lady-di.shtml>. Acesso em: 17 out. 2019.
FOLHA DE SÃO PAULO. Príncipe Harry é indenizado
por publicação de fotos de sua residência particular. 16
mai. 2019. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/
amp/mundo/2019/05/principe-harry-e-indenizado-por-
publicacao-de- fotos-de-sua-residencia-particular.shtml>.
Acesso em: 17 out. 2019.
FOLHA DE SÃO PAULO. Revista que publicou fotos de
topless de Kate Middleton terá que pagar multa. 19 set.
2019. Disponível em: <https://f5.folha.uol.com.br/celebri-
dades/2018/09/revista- que-publicou-fotos-detopless-de-
-kate-middleton-tera-que-pagar-multa.shtml>. Acesso em:
17 out. 2019.
FOWLER, Danielle. Prince Harry and Meghan Mark -
le’s royal wedding by numbers. 28 abr. 2018. Disponível
em: <https://www.harpersbazaar.com/uk/culture/culture-
-news/a20092105/prince- harrymeghan-markle-royal-we-
dding-numbers-cost/>. Acesso em: 06 dez. 2019.
HARPER’S BAZAAR. Prince Harry and Meghan Mark-
le’s royal wedding by numbers. 28 abr. 2018. Disponível
em: <https://www.harpersbazaar.com/uk/culture/culture-
-news/a20092105/prince- harrymeghan-markle-royal-we-
dding-numbers-cost/>. Acesso em: 06 dez. 2019.
185
HASSAN, Genieveve. Can celebrities expect privacy?
Entertainement&Arts, 15 de julho de 2011. Disponível em:
xx. Acesso em: 17 out. 2019. Citação no texto: (HASSAN,
2011)
MIRA, Maria Celeste. Invasão de Privacidade? Reflexões
sobre a exposição da intimidade na mídia. In: Lugar Co-
mum. N.5-6, 1999, pp. 97-116
MORTON, Andrew. Diana: sua verdadeira história. 3.ed. Rio
de Janeiro: Best Seller, 2013.
MORTON, Andrew. Meghan: A princesa de Hollywood que
conquistou a Inglaterra. São Paulo: Seoman, 2018.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A EDUCA-
ÇÃO, A CIÊNCIA E A CULTURA. Princípios Internacio-
nais da Ética Profissional no Jornalismo. 1983. Dispo-
nível em: <http://www.abi.org.br/institucional/legislacao/
principiosinternacionais-da-etica-profissional-no- jornalis-
mo/>. Acesso em 17 out 2019.
RAMONET, Ignacio. A tirania da comunicação. Florianó-
polis: Vozes, 1999.
RAMOS, Roberto José. Os sensacionalismos do sensa-
cionalismo: uma leitura dos discursos midiáticos. Porto
Alegre: Editora Sulina, 2012.
REUTERS. French magazine found guilty over topless
photos of British Duchess. 5 set 2017. Disponível em:
<https://www.reuters.com/article/us-britainroyals-france-
-photos/french-magazine- found-guilty-over-topless-pho-
tos-of-katemiddleton-idUSKCN1BG1Q7>. Acesso em: 09
nov 2019.
SAMUELSON, Kate. The Princess and the Paparazzi:
How Diana’s Death Changed the British Media. In: Time.
27 ago. 2017. Disponível em: <https://time.com/4914324/
186
princess-diana-anniversary-paparazzi-tabloid-media/>.
Acesso em: 17 out. 2019.
SEVERINO, Tiago. Jornalismo de celebridades, para
quê? Observatório da imprensa 16 fev. 2010. Disponível em:
<http://observatoriodaimprensa.com.br/feitosdesfeitas/
jornalismo-de-celebridades- para-que/>. Acesso em: 17
out. 2019.
SIMÕES, Paula Guimarães. A mídia e a construção das
celebridades: uma abordagem praxiológica. In: LOGOS 31:
Comunicação e Universidade. Ano 17 - n. 30, 2009, pp. 67-
79.
SIMÕES, Paula Guimarães. Celebridades na sociedade
midiatizada: em busca de uma abordagem relacional. In:
ECO-Pós. Vol. 16 - n. 1, 2013, pp. 104-119.
SMITH, Robin Callender. Celebrity privacy and the de-
velopment of the judicial concept of proportionality:
How English law has balanced the rights to protection and
interference. 2014. Tese (Doutorado em Filosofia) - Centre
of Commercial Law Studies, Queen Mary University of Lon-
don, Londres, 2014.
SOLOVE, Daniel J. Understanding Privacy. Cambridge:
Harvard University Press, 2008. Disponível em: <https://
papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1127888>.
Acesso em 17 out. 2019.
SUSSEX OFFICIAL. Statement by His Royal Highness
Prince Harry, Duke of Sussex. 01 out 2019. Disponível em
<https://sussexofficial.uk/>. Acesso em: 17 out. 2019.
TOFOLI, Luciene. Ética no jornalismo. Petrópolis: Vozes,
2008.
TRAQUINA, Nelson. Teorias do jornalismo: a tribo jorna-
lística: uma comunidade interpretativa transnacional. Flo-
rianópolis: Insular, 2008.
187
O jornalismo de periferia como gênero: uma análise
dos princípios editoriais da Agência Mural1
Beatriz Rodrigues Araújo2
Cicélia Pincer Batista33
Introdução
188
térios: a finalidade do texto ou disposição psicológica do
autor, o estilo, o modo de escrita, a natureza do tema e as
articulações interculturais. Tudo isso ainda deve ser atrela-
do com os contextos econômico, social, político e cultural
da produção jornalística. (SEIXAS, 2004, p. 5)
Baseando-se nas especificações dos autores, con-
sidera-se como princípio norteador do presente estudo a
proposta do jornalismo periférico, que tem por objetivo a
quebra de estereótipos sobre as regiões localizadas nas
bordas das grandes cidades, ao mesmo tempo em que
usufrui da produção independente como alternativa que
permite a escolha autônoma dos elementos simbólicos -
linguagem e estrutura - para auxiliar na construção da iden-
tidade periférica. Assim, em paralelo com as definições de
gênero, o presente artigo está fundamentado no seguinte
questionamento: “O jornalismo de periferia pode ser classi-
ficado como um gênero jornalístico contemporâneo?”.
A análise desta questão será efetivada a partir da
noção da metodologia qualitativa de enquadramento no-
ticioso (news frame), tendo como referência e objeto de
pesquisa a Agência Mural de Jornalismo das Periferias. Este
percurso metodológico será guiado conforme as indica-
ções dispostas nos 10 Princípios da Cobertura Jornalística
das Periferias, adotados pela agência de notícias e pelos
estudos desenvolvidos por Ada Cristina Silveira e Mara Ro-
vida, no espectro do jornalismo periférico.
Ressalte-se que a análise e as discussões conceitu-
ais aqui apresentadas, especialmente as que se referem ao
jornalismo de periferia, à metodologia do enquadramento
e à Agência Mural têm como base o projeto de Iniciação
Científica “Cultura e periferia: análise do enquadramento da
editoria de arte e cultura da agência mural de jornalismo
das periferias”, em desenvolvimento no Curso de Jornalismo
189
da Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM-SP.
190
sultante dessa ótica excludente promove vieses, ressalta
o poder das autoridades, criminaliza a pobreza, discrimina
cidadãos, aponta culpados sem julgamento prévio, des-
qualifica as sociedades em foco, fomenta relações violen-
tas. E, como se não bastasse, atinge o projeto de nação
com o qual os brasileiros são educados desde crianças ao
compartilhar – ainda que fragmentariamente – o mito da
democracia racial, do homem cordial, da abundância da
natureza etc. (SILVEIRA, 2009, p.173)
191
qual se constata o silenciamento sistemático dos grupos
identitários vinculados às periferias da grande metrópole.
(ROVIDA, 2018, p. 54)
192
Agência Mural de Jornalismo das Periferias
193
pendente da Open Society Foundations, para dar suporte
no desenvolvimento da Agência. Ao contarem com estes
recursos, lançaram o próprio site para ampliar a cobertura
jornalística publicada no blog da Folha e no 32xSP4. (TAVA-
RES, 2019, online, p.111-112)
Essa transição não aconteceu apenas com o objetivo
de ampliar o número de publicações e material jornalístico.
Isso aconteceu com o intuito de obter uma plataforma úni-
ca que permitisse o exercício de um jornalismo comprome-
tido com a redução das desigualdades, conforme propõe
um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)
da Organização das Nações Unidas (ONU)5.
Para atingir esse objetivo, a Mural trabalha em torno
dos 10 Princípios da Cobertura Jornalística das Periferias -
uma espécie de manual de redação da agência -, listados
a seguir:
1. Não utilizar a palavra “carente”;
2. Tomar cuidado com o sensacionalismo e evi-
tar clichês;
3. Não comprovar teses próprias em uma pauta;
4. Lembrar que crianças das periferias e os mo-
radores em geral não são “coitados”;
5. Fugir de lugares comuns ao falar sobre esses
moradores;
6. Não subestimar a capacidade política dos
moradores das periferias;
7. Lembrar que há níveis de renda distintos;
8. A periferia não é só escassez de infraestru-
tura;
194
9. Ter o cuidado de ouvir uma voz de quem mora
na região ao tratar de um tema relacionado à
periferia;
10. Não esquecer que os bairros localizados nas
periferias fazem parte da cidade como qualquer
outro bairro.
A partir destes princípios, entende-se o posiciona-
mento de reflexão da linha editorial da Agência, que preza
pelo preenchimento das lacunas de informação na grande
mídia e pela desconstrução de estereótipos sobre as perife-
rias. Na coleta de dados feita por Tavares (2019), em entre-
vistas com integrantes da redação, a autora conclui que o
morador destes locais se torna fonte prioritária na produção
jornalística da Mural.
O grupo entende como imprescindível ouvir as pessoas
que vivem as situações no seu cotidiano. Seguindo o pro-
tocolo jornalístico, ouvem também as “fontes oficiais”, re-
presentantes do governo, por exemplo. Mas percebem na
imprensa comercial a falta de atenção às pessoas, o que
faria com que a maior parte do público não se identifique
com a cobertura, e tentam suprir essa falta. (TAVARES,
2019, online, p.115)
195
Metodologia
196
framing:
Enquadrar é selecionar alguns aspectos de uma realidade
percebida e fazê-los mais salientes em um texto comuni-
cativo, de forma a promover uma definição particular do
problema, uma interpretação casual, uma avaliação moral
e/ou uma recomendação de tratamento para o item des-
crito. (ENTMAN, 1993, p. 52)
197
expressão (linguagem) e suas expectativas (temáticas), é
evidente que a sua classificação se restringe a universos
culturais delimitados. Por mais que as empresas jornalís-
ticas assumam hoje uma dimensão transnacional em sua
estrutura operativa, permanecem, contudo, as especifici-
dades nacionais ou regionais que ordenam o processo
de recodificação das mensagens importadas. Tais espe-
cificidades não excluem as articulações interculturais que
muitas vezes subsistem através das línguas e são prolon-
gamentos do colonialismo (MELO, 1985 apud. MEDINA,
2001, p. 49).
198
nicação em massa, o jornalismo das periferias utiliza das
ferramentas e técnicas de apuração presentes na estrutura
operativa da profissão, porém, superando o pragmatismo
do modelo de produção da grande mídia. Com isso, agên-
cias de notícias periféricas como a Mural constroem, com
os dados coletados, narrativas que levam em consideração
as características culturais do ambiente em que atuam.
O que pode ser observado, de maneira geral, na
construção das narrativas feitas pela Mural é que a crítica
social de uma população que vive às margens das cidades
está sempre em evidência. Tendo como base a definição
de news frame de Entman e o enquadramento temático de
Rothberg, a inserção e a vivência dos jornalistas no am-
biente periférico permitem superar a superficialidade e dar
destaque às temáticas e angulações não exploradas pela
grande mídia. Para que isto seja efetivo nas produções, fa-
z-se necessária uma organização por parte do veículo de
comunicação.
De acordo com Mikhail Bakhtin (apud. MEDINA, 2001,
p. 46), “o gênero orienta o uso da linguagem no âmbito de
um determinado meio, pois é nele que se manifestam as
tendências expressivas mais estáveis e mais organizadas
da evolução de um meio”. Esta perspectiva, quando aliada
à desconstrução dos estereótipos e ao preenchimento das
lacunas de informação presentes na grande mídia sobre as
periferias, resulta em um novo modelo de organização que
orienta a linguagem utilizada nas narrativas.
Assim, considerando os 10 Princípios da Cobertura
Jornalística das Periferias propostos pela Mural, observa-se
que há uma estrutura pré-estabelecida que norteia o jorna-
lista e, consequentemente, é indicada ao leitor quando con-
some a informação em um portal ou um blog de notícias
periféricas. Em outras palavras, tal estrutura pode ser com-
199
preendida como um gênero jornalístico: o gênero periférico.
Considerações finais
200
los 10 Princípios da Cobertura Jornalística das Periferias, desen-
volvidos com o intuito de guiar as produções jornalísticas da
Mural e de permitir a identificação de uma estrutura, que pode
ser considerada como gênero, por parte do leitor.
REFERÊNCIAS
201
vrac.puc-rio.br/3196/3196.PDF. Acesso em: out. 2020.
ONU BRASIL. Especiais. Disponível em: https://nacoesu-
nidas.org/pos2015/. Acesso em: ago. 2020.
ROTHBERG, Danilo. O conceito de enquadramento e sua
contribuição à crítica de mídia. In: CHRISTOFOLETTI, Ro-
gério (org.). Vitrine e vidraça: Crítica de Mídia e Qualida-
de no Jornalismo. Covilhã: LabCom Books, 2010. p. 53-68.
ROVIDA, Mara. As periferias pelos periféricos: um fenôme-
no jornalístico contemporâneo. Revista Extraprensa, São
Paulo, v. 12 (1), p. 50-65, dez. 2018. Disponível em: https://
doi.org/10.11606/extraprensa2018.149085. Acesso em: ago.
2020
SEIXAS, Lia. Gêneros jornalísticos digitais: um estudo das
práticas discursivas no ambiente digital. XIII Compós, São
Bernardo do Campo, 2004. Disponível em: http://www.
compos.org.br/data/biblioteca_665.pdf. Acesso em: out.
2020.
SILVEIRA, Ada Cristina. Modos de ver e devorar o outro: a
ambivalência na cobertura jornalística das periferias. Re-
vista GHREBH, São Paulo, v.14, p. 157-176, out. 2009. Dispo-
nível em: http://www.cisc.org.br/portal/jdownloads/Ghre-
bh/Ghrebh-%2014/13_silveira.pdf. Acesso em: ago. 2020.
TAVARES, Luisa. O jornalismo das periferias de São Pau-
lo: entre a experimentação e a atualização de práticas
convencionais. Orientador: Prof. Dr. Jacques Mick, 2019,
181 f. dissertação (mestrado) - Curso Sociologia Política,
Universidade Federal de Santa Catarina, Santa Catarina,
2019. Disponível em: https://www.researchgate.net/
profile/Luisa_Tavares/publication/336653546_O_jorna-
lismo_das_ periferias_de_Sao_Paulo_entre_a_experi-
mentacao_e_a_atualizacao_de_praticas_convencionais/
202
links/5daa08a7299bf111d4be6479/O-jornalismo-das-pe-
riferias-de-Sao-Paulo-entre-a- experimentacao-e-a-atu-
alizacao-de-praticas-convencionais.pdf. Acesso em: ago.
2020
203
AUTORES
204
lítica pela Universidade Federal de Pernambuco (1989), doutorado em
Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco (2004) e Pós-Dou-
torado em Comunicação pela Universidade da Beira Interior/Covilhã/
Portugal (2015), através de bolsa de Estágio Sênior Pós-Doutoral da Co-
ordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
É professor associado do Departamento de Comunicação Social e do
Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal
de Pernambuco, integrando o grupo de pesquisa Jornalismo e Contem-
poraneidade. Atualmente, desenvolve pesquisa com bolsa de Produtivi-
dade PQ 2 do CNPQ, edita a revista eletrônica de difusão científica Jor-
nalismo e Cidadania (ISSN 2526-2440) e é Coordenador do 1o Curso de
Pós-Graduação Lato Sensu (Especialização) em Comunicação Política
da UFPE. Atua principalmente nos seguintes temas: teoria do jornalismo;
comunicação; ciência política; mudança social e ideologia.
Magali Moser
205
Doutoranda em Jornalismo na linha de pesquisa Jornalismo, Cultura e
Sociedade pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e bolsis-
ta FAPESC. É mestra em Jornalismo (UFSC/2006), e especialista em Es-
tudos Literários pela Universidade Regional de Blumenau (FURB/2010).
Graduada em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela
Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI/2005). Tem experiência como
repórter de rádio, televisão, jornal impresso e online, além de assessoria
de comunicação. Em 2013 trabalhou por seis meses na redação brasi-
leira da Deutsche Welle (DW), em Bonn, na Alemanha, quando produ-
zia reportagens semanais para o portal. É autora do livro-reportagem A
Vida pelo Cinema: Herbert Holetz entre a realidade e a ficção, premiado
como destaque literário na categoria prosa pela Sociedade Escritores
de Blumenau, em 2006. Com a pesquisa O Processo de Favelização em
Blumenau recebeu prêmio e homenagem da Assembleia Legislativa de
Santa Catarina, em 2011. Pela série de reportagens Negra Blumenau, pu-
blicada em novembro de 2007 no Jornal de Santa Catarina, recebeu a
Comenda Zumbi dos Palmares da Câmara de Vereadores de Blumenau.
Foi professora substituta do Curso de Jornalismo da FURB, tendo atuado
nas disciplinas de Gêneros Jornalísticos, Laboratório de Jornalismo Cien-
tífico, Mídia Regional e Laboratório de Apuração e Escrita Jornalística
(Som). Dedica-se ao estudo sobre a prática da reportagem por repórte-
res especiais e o jornalismo como forma de conhecimento. Participa do
Grupo de Estudos Jornalismo e Conhecimento (PPGJOR/UFSC) e do
Pauta Gênero, Observatório de Comunicação e Desigualdades de Gê-
nero da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT).
206
de Jornalismo. É líder do Grupo de Pesquisa CNPq: Linha de Pesquisa:
Tecnologias, Processos e Narrativas Midiáticas. Faz parte do Comitê de
Iniciação Científica da ESPM. É avaliadora do INEP/MEC. Faz parte do
Comitê Editorial do periódico ALTEJOR ECA/USP, da Revista de Jorna-
lismo ESPM Edição Brasileira Columbia Journalism Review, da Coleção
Ciências da Comunicação e da Revista Comunicação, Mídia e Consumo.
Foi editora científica da Revista Brasileira de Ensino de Jornalismo - RE-
BEJ de 2016 a 2020. Faz parte do Conselho Consultivo da Associação
Brasileira de Ensino de Jornallismo - ABEJ.
207
pelo Portal Imprensa, que homenageia os professores de comunicação
do Brasil.
208