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Aulas n.ºs 1, 2 e 3.

CONCEITO GENÉRICO DE FAMÍLIA, AS RELAÇÕES JURÍDICO-


FAMILIARES E A SUA AUTONOMIA

As relações jurídicas têm como alicerce um fenómeno social que é


constituído pela família. A família é em si um fenómeno natural inerente
a sociedade humana. A socialização da pessoa humana inicia-se na
família.

Entre as várias organizações sociais e jurídicas, o conceito, a


percepção e a extensão de família são os que mais se alteraram no curso
dos tempos. Neste início de mais um século, a sociedade de mentalidade
urbanizada, embora não necessariamente urbana, cada vez mais
globalizada pelos meios de comunicação, pressupõe e define uma
modalidade conceitual de família bastante distante das civilizações do
passado.

O conceito de família não é, de qualquer forma um conceito estático


e imutável. Muito pelo contrário: como os demais fenómenos humanos e
sociais, está sujeito a um processo de evolução e transformação.

Do ponto de vista genérico, família, são as várias relações que se


estabelecem na sociedade entre pessoas, cujas relações exigem uma
reciprocidade de direitos e deveres.

É a partir desse conceito genérico de família que o direito retira o


conceito técnico-jurídico (específico) de família.

Juridicamente falando, família é o conjunto de relações que se


estabelecem entre pessoas que estão ligadas entre si em razão do
parentesco, casamento, união de facto e da afinidade.

Dentro do direito da família estão englobados diversos sub-ramos


de direito, por ex:

O direito matrimonial, que regula as relações que se estabelecem


entre os cônjuges.

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O direito de filiação ou direito paterno-filial, que estabelece os


direitos e deveres entre pais e filhos e é sobre este tipo de relação que
iremos cingir o nosso estudo.

O direito de parentesco que determina os efeitos jurídicos


existentes entre pessoas ligadas por laços de sangue provenientes de uma
ascendência comum;

O direito da afinidade, que regula as normas vinculativas da


aliança que se estabelece entre o cônjuge e os parentes do outro cônjuge.

O direito que regula as relações que advêm da adopção (uma das


maiores formas de demonstração de afecto), a qual, como veremos,
estabelece um vínculo jurídico idêntico ao da filiação entre pessoas não
ligadas entre si por laços de filiação biológica, etc.

Outra situação de facto de grande relevância no Direito de Família


é a chamada posse de estado das relações jurídicas familiares, a que o
legislador reconhece efeitos, tais como a posse de estado de casado ou a
posse de estado de filho, que atribui ao filho uma real vivência como tal.

O estado familiar é a situação subjectiva da pessoa dentro da


família, como titular duma pluralidade de direitos, poderes e deveres
específicos.

O Direito de família é, em geral, nada mais do que o direito que


tutela os interesses das pessoas que fazem parte da comunidade familiar.

A CODIFICAÇÃO DO DIREITO DE FAMÍLIA

Há três visões a considerar:

A visão socialista: que rejeita a divisão tradicional bipartida do


direito, em direito público e em direito privado, adoptando uma
concepção unitária do direito. Para esta visão o direito da família
constitui um ramo autónomo do direito, há códigos próprios.

A visão romano - germânica: segundo a qual as normas de direito


de família estão integradas nos respectivos códigos civis.

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A visão anglo – saxónica: para esta o direito da família é integrado


em leis específicas sobre os seus institutos fundamentais, como o
casamento, divórcio, filiação e direitos da criança. Há portanto
codificação destes institutos.

A FUNÇÃO PROMOTORA DO DIREITO DE FAMÍLIA

A função promotora do direito de Família consiste em definir,


regulamentar e estabelecer o modelo de família, através das suas regras
ou normas disciplinadoras.

O que o direito da família faz é promover a valoração das relações


jurídico - familiares.

Muitas vezes as normas do direito de família são, na sua essência,


normas de conteúdo ético-jurídico que definem o tipo ideal das relações
familiares. Este ramo do direito não pode, por conseguinte, ser encarado
de forma passiva como a reprodução, a nível jurídico, de uma realidade
social. Ele deve antes traduzir-se num meio de actuação nas estruturas
sociais, visando em concreto um novo comportamento e um novo
relacionamento entre os membros da família.

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO DE FAMÍLIA

Podemos, em síntese, apontar os seguintes princípios


fundamentais comuns aos diversos sistemas jurídicos actuais:

- O princípio da separação do estado e das confissões religiosas:


nestes sistemas todas as questões relativas à validade e a dissolução do
casamento, etc. são resolvidas pelos tribunais judiciais e não por
tribunais eclesiásticos.

- Princípio da liberdade de escolha da forma de constituir família e


da dignidade dos seus membros: segundo o qual assiste a cada pessoa o
direito fundamental de constituir família, através do casamento, da união
de facto ou até de não constituir.

- O princípio da igualdade de direitos e deveres entre o homem e a


mulher.

- O princípio da estabilidade: pelo qual se procura reforçar os laços


familiares, dando especial valor à manutenção da família de forma a
estabelecer relações fortes e duráveis.

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- Protecção da criança em geral: como objecto primordial da


actividade de adultos da família. Com este princípio ficou abolida a
discriminação entre os filhos nascidos dentro e fora do casamento,
deixaram de existir filhos bastardos. Este princípio é um corolário da
concretização do direito à identidade, deixou de haver prazos para as
acções de estabelecimento e impugnação de filiação.

- Princípio da protecção do Estado à família: essa protecção


desenvolve-se em múltiplos aspectos, tais como a prestação de habitação,
de serviços de saúde, de educação, a atribuição de subsídios de
segurança social, etc.

INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DIREITO DE FAMÍLIA

Nos dias de hoje, já é um facto a intervenção do Estado nas relações


familiares, visando não só a solução consensual dos conflitos familiares,
como também a protecção dos membros mais débeis da família, com
maior realce na defesa dos direitos da criança quando se mostre que os
titulares da autoridade parental não estão a exercê-los de acordo com a
lei.

Por outro lado, a relevância dada às relações familiares é


evidenciada pela instituição de tribunais de competência especializada
para apreciar os respectivos litígios.

Importa realçar que o Procurador da República tem poderes de


largo alcance nas acções familiares que versem sobre os direitos da
criança, devendo obrigatoriamente intervir em todas as acções relativa a
menores.

INTERLIGAÇÃO DO DIREITO DE FAMÍLIA E OUTROS RAMOS DO


DIREITO

O direito de família está interligado a outros ramos de direito e as


suas normas vão aí repercutir-se.

A ligação mais próxima é com o direito sucessório, cujas normas da


sucessão legítima lhe estão directamente coorelacionadas.

No direito penal encontramos normas que sancionam condutas de


natureza familiar.

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No direito fiscal, a existência de vínculos familiares, proporcionam


certos efeitos de protecção à família, designadamente com isenções
fiscais e deduções em razão de encargos familiares.

No direito processual quer civil quer criminal existe normas que


estabelecem impedimentos para exercício de funções para magistrado do
M.P ou judicial e oficiais de justiça, no caso destes, terem algum vínculo
com uma das partes processuais.

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO CÓDIGO DE FAMÍLIA E


SEUS CONCEITOS GENÉRICOS

O primeiro título do C.F., “Dos princípios fundamentais”, contém


normas que, pelo seu alcance e importância normativa, se podem
equiparar a verdadeiras normas de natureza constitucional.

Os princípios básicos enunciados no capítulo referido, vão servir


de estrutura e nortear toas as demais normas contidas no Código.

Podemos, em síntese, apontá-los da forma que se segue:

1. Especial obrigação do Estado de protecção à família, pela sua


importância como núcleo fundamental da organização da
sociedade, promovendo o direito à instrução, ao trabalho, ao
repouso e a seguros sociais.
2. Especial obrigação da família de promover a educação cultural
e moral de todos os seus membros dentro dos princípios do
amor ao trabalho e de fidelidade à pátria e em especial a dos
jovens, em ordem à sua integração na sociedade.
3. O direito de cada membro da família ao desenvolvimento da sua
personalidade e aptidões no interesse da nova sociedade.
4. A igualdade do homem e da mulher em todas as relações
jurídicas familiares.
5. A igualdade de todas as crianças perante o Estado e a especial
obrigatoriedade da sua protecção, tanto pela família como pelo
Estado.
6. A criação de uma nova moral das relações familiares,
estruturada na igualdade de direitos, no respeito da
personalidade dos seus membros e no princípio da solidariedade
recíproca.

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