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Infancia

Milagros nasceu em 08/01/1985, resido em São Paulo. Sua vida ja era previsto ser dificil a partir do
momento em que seu nome foi dado, sua mãe Yolanda Pérez dos Montes, o nomeou dessa forma
simbolicamente, porque ela orava pra que um de seus filhos resolvesse os problemas da familia e os
tirasse daquela situação com algum sustento. Ele havia nascido em uma casa onde ja tinha outro cinco
irmãos, sendo ele o mais novo, a casa tinha condições financeiras complicadas. O desespero de sua mãe
não era atoa, por causa de seu marido e pai do garoto, André Astrapios Souza era uma pessoa nojenta e
uma pessima figura paterna. Ele trazia dinheiro pra casa atraves da sua fabrica de sapatos, a quantidade
consideravel de filhos não era acidental, depois do primeiro filho, todos os outros eram feitos com o
intuito de virarem mão de obra dentro de sua fabrica mesmo sendo muito novos. Yolanda sabia disso e
ela detestava aquele homem, André sabia disso, ele não via ela como sua esposa, mas sim como uma
especie de "investimento".

Não so um individuo eticamente horrivel, mas tambem agressivo e com "contatos". Trazia medo em
Yolanda suficiente pra que ela não pedisse um divorcio, mas não ficava calada. Por isso era
frequentemente ameaçada pelo marido e brigas aconteciam recorrentemente, tudo isso na frente de
seus filhos. Milagros começou a trabalhar na fabrica cedo assim como o resto de seus irmãos, nos seus 8
anos de idade, as condições de trabalho do local eram horriveis. Não so eles que trabalhavam la, outras
pessoas mais novas assim como eles estavam dentro da fabrica, junto de outras pessoas mais velhas, o
lugar era empoeirado, sujo e frequentemente eram maltratados por André. Não so os desconhecidos
mas tambem seus filhos, não so no trabalho, mas ele agredia constantemente por desobediencia em
casa. Seus filhos estavam cheio de feridas, os mais velhos ate tentavam reagir mas tomavam o dobro de
agressões de volta.

A cabeça de Milagros era contornadas por sentimentos melancolicos de uma forma que não cabia em
uma criança, se perguntava do porque de merecer aquilo. Se sentia em uma gaiola, preso, acorrentado.
Sem chão e nem lugar pra fugir. Sua mãe frequentava a igreja e mesmo com o estado deploravel etico
que seu pai se encontrava, ele tambem ia. André era um homem ate que bem rigido na sua religião, e
fazia que os filhos fossem obrigados a ir. O garoto nunca prestava atenção direito nos cultos, porem
entre seus 10 anos de idade, ele decidiu prestar pelo menos uma vez. Estava sentado em um local um
pouco mais a frente diferente das outras vezes, a madeira dura deixavam seus joelhos doloridos por
causa das rezas longas.

Mas uma coisa fez com que ele ignorasse essa dor, foi quando ele deu atenção a musica dessa igreja, em
especial, uma pessoa que tocava um violino, assim como qualquer outro que estava ali dentro na
comunhão tocando. Porem pra Milagros, algo naquela vez parecia diferente, seus olhos se encheram de
brilho quando prestou atenção. Aquele momento parecia durar um seculo em sua mente, ele observava
os movimentos dos arcos entre as linhas do violino. Como se fosse uma forma de expressão, tão natural
quanto mover um braço. Naquele momento ele viu algo diferente, a liberdade, a naturalidade, a
movimentação, não se importava com a letra do coro que vinha logo atras, mas so naquela pessoa em
especifico. Que era so um individuo comum, mas pra ele é como se tivesse vendo um anjo brandir suas
asas, como um quadro emoldurado em sua mente, expressando a liberdade, foi naquele momento que
ele entendeu o que ele queria. Talvez uma de suas primeiras alegrias, o som provacado pelo
instrumento era o suficiente pra que sua cabeça ficasse isolado do resto dos sons da igreja. Ele desejava
aquilo naquela hora, acima de qualquer coisa.

Ele começou a pedir pros seus pais pra passar um pouco mais de tempo na igreja depois desse dia, a sua
mãe não via problema. Seu pai era rigido na igreja tanto quanto no seu trabalho, ele dizia que ele
poderia desde de que não escapasse do seu horario de voltar pra fabricar, que era quase que grande
parte do horario do dia. Mas mesmo com um tempo que poderia ser maior ele ficava la. Quase como
uma forma de fugir daquela realidade, ele observava o corô pelas pilastras da igreja e os musicos, os que
ele mais prestava atenção, principalmente os violinistas. Milagros continuou fazendo isso por um bom
tempo, graças a isso desenvolveu ate um certo grau de ouvido musical. Porque ele não so ouvia mas
tambem lia as anotações dos musicos. Os participantes da igreja percebiam isso, alguns ate mostravam
pra ele como as coisas funcionavam dentro do coral. O padre e dono da igreja estava sempre la, Nicolo
Goncharov Andrade, um homem bem influente, ele era não so reconhecido na igreja mas tambem
dentro do bairro que moravam, que tambem era amigo de seu pai. Aquele lugar pro garoto era uma
forma de escapar da realidade horrivel que vivia, mas de vez em quando acabava por perceber
comportamentos agressivos por partes da igreja, agredindo alguns garotos que não se mantinham na
linha, em forma de aparencia ou de expressão, mas como era pequeno ainda ele não fazia nem ideia do
peso do que acontecia la dentro.

O tempo se passou, mantendo essa rotina de trabalhar e ficar na igreja ouvindo os violinos. Ate tentou
pegar algumas vezes os instrumentos escondidos pra tentar tocar, mas ele não tinha tanto conhecimento
teorico pra conseguir, mas ele se sentia feliz tentando. Ele estava com 12 anos, as agressões, o trabalho a
mão de obra, não haviam mudado em sua vida. Constantemente continuava a ser agredido junto de seus
irmãos, mas não tinha como ele reagir, apenas restava o silencio dentro de sua casa e um pequeno
espaço de liberdade pra ouvir os instrumentos. Ate um fatidico dia, Milagros ficou na igreja dessa vez um
pouco a mais do que deveria, percebeu e foi diretamente correndo, estava um pouco tarde. Ele correu
ate a fabrica, com um pouco mais de pressa que o normal com medo da raiva de seu pai, mas o que ele
devia ter medo era outra coisa, algo que ele ainda não sabia que tava prestes acontecer. Essa fabrica de
sapatos, constantemente era muito fechada, o ambiente era confinado completamente empoeirado,
dificilmente limpo. Um acumulo de pó extremo havia em toda area, paredes imundas e o chão sujo.
Quase como um retrato da ganancia de seu pai, seus irmãos estavam no horario de descanso e
incendiaram algumas madeiras pra fazer uma fogueira.

Pois estavam sem luz naquele momento, algo frequente, por conta da falta de preocupação com a
segurança dos trabalhadores la dentro. Foi nesse momento onde uma visão do inferno começou.
Milagros estava olhando por uma janela da fabrica, batendo nela pra chamar atenção dos trabalhadores
pra que abrissem o portão pra ele entrar. Ao mesmo tempo que um de seus familiares estava prestes a
acender o isqueiro na madeira. Uma coisa dificil de se acontecer mas certamente possivel em uma
fabrica, graças ao um acumulo de pó e uma fonte de ignição, somada a um lugar confinado. O calor da
chama fez com que uma reação quimica dentro do ambiente acontecesse, uma rapida expansão de
gases. Ele tava prestes a ver algo que nunca esqueceria. Derrepente como se fosse em questão de
segundos, uma explosão se alastrou. Da janela que ele estava observando tudo acontecer, era possivel
ver seus cinco irmãos em volta da fogueira que haviam feito. Que foram os primeiros a serem
consumidos pelas chamas, pouco viu da face de seus irmãos, mas parece ele era mais o que o suficiente.
Seus rostos eram preenchidos de desespero, de sofrimento, em um contexto tão caótico e tão injusto.
Tão improvavel, mas sorte definitivamente é uma das coisas que ficam mais distantes dessa familia.
Quando a explosão havia se alastrado, as janelas explodiram. Fazendo com que Milagros fosse lançando
pra tras, ficando ferido por alguns cacos e pelo impacto da explosão. Que não estava proximo o
suficiente pra ser incendiado, as portas abriram e muitos corriam em desespero. Gritos, pedidos por
socorros, choros eram escutados dos trabalhadores que haviam escapado do incendio, enquanto os que
restavam la dentro, apenas tinham sido consumidos por fogo. O desespero é o sentimento que poderia
definir melhor uma situação assim. Milagros estava chorando, mas não gritando, ele olhava tudo aquilo
como um espectador. Se perguntando o que ele havia feito pra merecer um evento tão horrivel em sua
vida. Ficou paralisado, com sua mente encharcada de pensamentos caoticos em relação a tudo que
acontecia.

Se passaram alguns minutos e o corpo de bombeiros havia sido acionados, que rapidamente começaram
a apagar o incendio e a chama que se alastrava em volta do local. Milagros olhava em volta com seus
olhos chorosos e viu de longe a figura de André. Que olhava com um olhar boquiaberto, quando ele viu
sua face ele ja tinha pensando em um principal culpado. Os bombeiros estavam puxando os corpos e
tentando ajudar quem havia conseguido se salvar, seu pai ja estava conversando com eles explicando
que não havia entendido como aquilo tinha acontecido. Horas se passaram e alguns grupos mais
especializados que pra analisar a situação junto dos bombeiros haviam dito pro senhor que a razão era
muito provavel que a razão do incendio, era o confinamento, o acumulo de pó e alguma chama que
havia sido muito provavelmente acessa, pelo menos era o mais proximo que acharam. Milagros
acompanhou toda a situação que durou algumas horas e quando falaram isso, ele lembra do isqueiro na
mão de um dos seus irmãos. O que pensava sobre a culpa ser de André so havia se confirmado agora.
Uma hora ou outra, depois de analises dos trabalhadores presente na situação. Seu pai soube da morte
de seus irmãos, que ao saber mordeu seus dentes, muito provavel que não de tristeza, mas de raiva e
frustração. Depois de um tempo quando tudo começou a se amenizar, Milagros e ele sairam de carro de
volta pra sua casa. Completamente em silencio, André tremia de raiva, mordendo os dentes, enquanto o
garoto mais atras derrubava lagrimas em silencio, com sua mente encharcada de pensamentos.

Chegando em casa, com o silencio preenchendo os corredores, Milagros se encostou em um dos


corredores. Observando o chão, tentando se distanciar da realidade pesada que havia a sua volta. Em
paralelo estava do lado da sala de estar, onde André contou os detalhes pra Yolanda. Falando da morte
de cada um dos seus irmãos, mesmo tentando se distanciar de tudo que tava acontecendo, era
impossivel não ouvir. Os surtos de sua mãe, gritando, ofendendo, a voz desesperada e tremida de sua
mãe, de odio, de raiva. Ela batia no peito de seu marido, falando como ele podia deixar isso acontecer,
dizendo que nem o diabo cometeria um ato tão hediondo. A cabeça de Yolanda estava destruida, era a
primeira vez que André não abriu a boca pra falar nada, de tanta raiva que sentia. No fundo ele sabia de
sua etica e de sua falta de escrupulo, mas sua perspectiva de vida superava qualquer uma dessas coisas,
a sua vontade de ver o mundo girando como se fosse o dono dele era tão grande quanto a amargura de
sua esposa. Durante o surto de sua esposa, ele levantou sua mão, fechando os punhos. Enfiando contra a
cara de Yolanda, a derrubando no chão, ele dava mais algumas porradas de frustração em cima dela,
com gritos de raiva e de frustração. Dirigidos diretamente a si mesmo, que nada daquilo era culpa dele,
que ela so devia ficar em silencio que nem ela sempre fez, que em a qualquer momento ela podia sumir
com ela. Essa cena de horror era inteiramente escutado por Milagros que não podia evitar ouvir,
preenchido de um olhar vazio de profunda amargura. Ele andou ate seu quarto trancando sua porta e se
sentando em um canto, olhando pela janela o céu, procurava respostas. Era tudo tão pesado pra uma
criança, ele so continuava ali parado se perguntando, queria por um instante so fugir da gaiola mas isso
era longe do possivel, então so continuou estatico. Acabou por dormir ali mesmo.

Era o dia seguinte, completamente vazio ele andava pela casa, sua mãe so estava sentanda de olhos
vazios e enquanto ele se aproximava. Yolanda falava pra ele com os olhos escorrendo ainda um pouco de
lagrimas, pedindo desculpas por ter feito ele nascer em um lugar tão deploravel, suas frases eram
recheadas de dor e de sofrimento. Entravam na cabeça de Milagros, mas ele tinha um olhar muito vazio
pra responder. So ficou andando pelos comodos da casa, não tinha mais como trabalhar por conta que a
fabrica estava sendo ajeitada. Seu pai havia saido pra cuidar dos assuntos e do acidente que havia
acontecido. No mesmo dia havia igreja, dessa vez estava muito mais quieto do que antes, ouvindo os
violinos como um som de tragedia, pensando nas faces de cada um de seus irmãos que havia perdido.
Talvez o unico fio de companheirismo que ele tinha, ficou la vazio e estatico.

Uma semana se passa, a fabrica aos poucos ainda ta se ajustando e André esta muito mais calado do que
antes. Os olhares da casa são de desprezo, principalmente dele em relação a Yolanda e Milagros,
enquanto ambos retrucavam com olhares vazios. No dia que ele acordou, sua mãe e nem seu pai
estavam em casa, era normal André não estar presente. Mas sua mãe passava quase que o dia inteiro
em casa. Ele andava pelos corredores procurando nos comodos por ela, ate entrar no quarto dela. Que
ficava um pouco mais em cima na casa do que o resto, havia um trapo de roupa preso em uma fresta da
janela. Quando ele se aproximou e olhou pra baixo, mais uma das visões traumatizantes da sua vida. Sua
propria mãe, Yolanda estava jogada no chão, de uma altura consideravelmente grande. Ficou por um
momento parado, tentando entender o que havia acontecido. Novamente uma cena muito pesada pra
um garoto tão novo, o que aconteceu não era atoa. Sua mãe passou muito tempo sendo usada, a ponto
que não resistiu as ameaças do marido, a gota d'agua havia sido a morte de seus cinco filhos. Então ela
decidiu tirar sua propria vida, porque não aguentava mais aquela situação. Milagros observava aquilo,
seus olhos estavam secos de mais pra chorar. Então apenas o vazio do olhar era o que ele poderia ter.
Arrancou o trapo da janela depois de um tempo olhando a situação e telefonou pro numero de seu pai
que tava anotado em cima da mesa, normalmente do local que ele fica de administração do trabalho.
André atendeu e antes dele dizer qualquer coisa o garoto falou o que havia acontecido desligando o
telefone. Se sentou na sala onde sua mãe costumava sentar e encarou o chão.

Algum momento André voltou pra casa, apos um curto tempo de espera. Ele passou correndo por volta
da casa e viu a situação, desesperado entrou em casa, passando reto por Milagros e pegando o telefone,
ligando pra qualquer ajuda que podesse. Acabou que foi a policia que chegou ao local, ele falava com
tristeza do que havia acontecido, quase como se tivesse esquecido de quem havia causado todos esses
problemas. Apos isso o corpo foi retirado e ele foi levado pra que ele desse mais detalhes, o tempo
continuava se passando e em algumas horas voltou pra casa, enquanto Milagros estava acompanhado
por alguns policiais que ficaram na residencia, nessas horas eles acabaram por concluir que o que havia
acontecido era realmente um suicidio. Eles foram saindo aos poucos e falaram que a investigação ainda
teria que continuar pra terem certeza sobre tudo. André concordou e apenas restou ele e Milagros. Essa
figura paterna que pra ele não passava de um monstro se sentou na frente dele, com um olhar frustrado
e desgostante, teve quase que poucas vezes uma conversa direta com o garoto. Disse que havia perdido
parte de seus esforços, em suas proprias palavras, e que agora uma das poucas coisas que restavam pra
ele, era o Milagros, disse que pra ele, o garoto era um retrato que lembra pra ele de tudo que é ruim,
jogando diversas vezes a culpa em cima dele. Falou pra ele que independentemente, ele ia continuar
trabalhando naquela fabrica, ate que ele perdesse o movimento das pernas. Seu olhar vazio, sutilmente
se transformava em raiva. Mas é um odio que so iria ser alastrado e compreendido pelo mesmo no
futuro.

Adolescencia

Graças aos eventos de sua infancia, afeteram fortemente a sua psique durante a adolescencia. Milagros
havia desenvolvido um jeito enraivecido e sarcastico, diversas vezes esse seu jeito provocava seu pai. As
agressões de André não haviam parado tambem. Continuou a ir a igreja e apreciar os violinos, mas agora
depois de tanto tempo ignorando as palavras do pastor, ele começou as ouvi-las. Era convencido por
algumas e por outras não, mas uma sensação estranha como uma pulga atras da orelha sempre estava
la, principalmente se referindo a discursos. Discursos esses que ditavam sobre o que aqueles la dentro
poderiam ou não fazer, que o contato com pessoas do "mundo" era pecaminoso e conderia eles ao
inferno. Ele tambem agora observava com um olhar um pouco melhor pros outros problemas da igreja,
principalmente as agressões aos participantes da igreja, principalmente garotos e garotas. Que saiam da
linha que era definido como "correto" la dentro. Percebendo cada vez mais as fortes problematicas do
lugar que ele utilizava como conforto. Mesmo sendo mais "largado" e sarcastico, ele temia fortemente a
palavra do pastor, sabendo que algo tava errado ali. Mas não se sentia na liberdade criticar, foi reprimido
sua vida inteira de diversas formas possiveis, não tinha como ele contestar aquela situação.

Dentro da escola o garoto ouvia ofensas de alguns outros, mas não é como se isso podesse o afetar
naquele momento, sempre debochando. Mesmo que isso ocassionasse em violencias contra ele. As
provocações realmente não eram fortes o bastante na percepção dele pra se importar. Com o tempo ele
conseguiu ate alguns amigos que se identificavam com seu jeito mais "largado". Ele criou uma certa
rejeição a pessoas no geral por conta dos seus diversos traumas na infancia, mas eles insistentes o
bastante pra sempre tentar puxar assunto com ele. Mesmo ele mostrando uma falta de interesse, eles
decidiram mostrar algumas musicas pro mesmo, algo que convenientemente o interessava. Mas seu
conhecimento por musica era muito pequeno afinal so cresceu ouvindo os cantos da igreja, mostraram
com uma radio musicas punk, rock e metal da epoca pra ele. No começo ele não comentava muito pra
eles, mas começou a pegar gosto pelo genero. Fazia algumas perguntas bobas sobre instrumentos da
musica e eles falavam que sabiam tocar alguns das musicas que eles ouviam. Com o tempo ele se
interessava em falar com eles não exatamente pela amizade mas pelos instrumentos, mas indiretamente
estavam virando colegas. As vezes matavam aula so pra ficar na casa um dos outros aprendendo a tocar.
Foi uma das primeiras vezes que Milagros tocou em uma guitarra, ele ja tinha certo conhecimento
musical por conta da igreja e tentava aplicar no instrumento, o que dava certo.

Ele sempre foi completamente reservado em relação as coisas que aconteciam na sua vida, qualquer
pergunta sobre sua familia ou sobre esse tipo de coisa. Ele retrucava de forma ignorante, algo que seus
amigos percebiam e acabam por ficar curiosos. Mas ele sempre rejeitava qualquer tipo de entrada nesse
assunto. No fim a sua forma agressiva e meio sarcastica foi a forma que ele começou a lidar com
pessoas, era o jeito que ele encontrava de lidar com seus problemas.

Milagros continuava indo pra igreja, alguns garotos da mesma idade perguntavam coisas dele. Ele
respondia sobre, bem pouco mas chegava a mencionar as musicas que ele escutava por causa de seus
colegas e sobre outro instrumento que ele tocava alem do violino. Nessa epoca ele começou a tocar
dentro do coral algumas vezes e ele falava pra eles sobre guitarra. Nicolo, o pastor da igreja uma vez
ouviu as conversas e quando os garotos se afastaram, ele reprimiu fortemente as ideias que ele estava
aprendendo com seus conhecidos. Toda vez que essa repreensão acontecia ele sentia medo, mas
tambem no fundo achava uma imbecilidade a atitude de reprimir ele por algo tão bobo. Por causa que
ele começou a sair com seus amigos, alem de matar aula. Ele frequentemente faltava na igreja, algo que
o pastor percebia. Aos poucos a clara passivo agressividade do dono daquele lugar se mostrava, se
transformando em algumas agressões verbais e ate fisicas, que ele começou a sofrer do homem.
Dificilmente o questionava ou tentava retrucar, ja que o medo que desenvolveu perante aquela figura da
religião era enorme. Cada vez mais que o tempo passava ele percebia a falha daqueles lugares,
principalmente quando ele começou a estranhar o fato que muitos dos participantes da igreja, tambem
trabalhavam na fabrica de seu pai. Isso sempre coçou sua orelha, mas ele com medo de fazer perguntas,
sempre levava, so pensando sobre isso.

Ele se divagava diversas vezes sobre as palavras do pastor, sobre o que era certo e errado, mas
continuava com a percepção que seus discursos pareciam restringentes. Aos poucos sua visão sobre
igreja mudava, tinha encontrado ate que um lugar novo pra se sentir livre, junto desses colegas. Depois
de um tempo com essa amizade, eles frequentemente tocavam e praticavam juntos. Ate tentavam
compor letras, não so isso mas ele usava esses tempos de sobra que não frequentava mais a igreja pra ir
a shows que esse amigos dele convidavam. Ele se sentia animado de ver as bandas no palco, a sensação
as vezes era similar a primeira vez que ele havia visto um violino. Milagros tava animado com o que tava
acontecendo, essas saidas ficavam frequentes. Ele conseguia sentir um pouco daquela liberdade, mas no
fundo se sentia muito preocupado, porque tinha medo do padre. O seu pai percebia de vez em quando
essas fugidas dele, retrucando como ele sempre fez, com agressões verbais e fisicas. Com os eventos do
passado, André continuou com sua fabrica aberta e conseguiu aumentar um pouco o ramo e tambem
entrou no mundo do alcool. Frequentemente bebia pra tentar aliviar a culpa que sentia por tudo que
havia acontecido no passado, mas não é como se ele tivesse arrumado sua etica. Ele continuava
maltratando seus funcionarios e seu proprio filho, mas enchia a cara de alcool pra afogar as magoas do
que havia acontecido, ele continuou como um nojento. Milagros viu essa decadencia e o que ele menos
sentia era dó, sentia bastante desprezo por André e deixava isso claro. Ele inclusive sempre carregava
consigo o pano que encontrou na janela de sua mãe, um tecido roxo que ja estava velho, mas ele
guardava consigo pra não se esquecer dela. No fundo mesmo se sentindo triste pela perda, ele sentia
raiva de sua mãe por ter feito o nascer. Mas essa raiva tambem era de si mesmo tambem. Porque ele
tambem sabia que ela não podia ter as melhores condições mas ela tentava.

O tempo continua se passando e a vida de Milagros continuando com uma rotina semelhante. Porem
por causa de seus novos amigos, ele acabou começando a ir em algumas pequenas festas. De novo com
muito medo porque a religião ainda estava em sua vida, mas ele aproveitava. Ele começou a ter um
estilo um pouco mais diferente com o tempo, o que acabou parando nos ouvidos da igreja. As agressões
por parte do pastor ficaram frequentes, ate ele começar a perceber que toda vez que ele via quando
criança pessoas apanhando por estar fora da "linha" na visão do pastor, era isso que tava acontecendo,
essa repressão que ele não entendia completamente quando pequeno. Estava no lugar daqueles que ele
observava, as palavras da igreja uma hora não o pegavam mais e começava a pensar ate com um
pensamento mais oposto do que era pregado. Mas seu medo da repressão e da igreja não tinham
acabado. Ele não reagia mesmo sendo agredido de formas diferentes pelo pastor.

Quando eles tavam terminando o terceiro ano do ensino medio, eles decidiram ir pra uma balada pela
primeira vez. Seus amigos receberam a recomendação de alguns colegas que eles tinham. Milagros
sempre foi em algumas festas aqui e ali, mas nunca tinha ido pra uma balada porque eles não eram
maior de idade na epoca, como eles tavam terminando o ensino medio, todos eles ja tinham idade pra ir.
O nome da tal balada era a "Casa do caos", eles se organizaram e ele havia se arrumado pra que seu pai
não descobrisse onde ele estava. Então eles estavam na frente da boate, a casa era iluminada por um
clarão roxo, em outros tons variados com rosa, verde, azul e outras cores explosivas ao olhar.
Adentrando a festa os tres estavam consideravelmente assustados, bem colados pra não se perderem, a
musica era muito alta. Parecia que adentrava o cerebro deles, seus pés tremiam de ansiedade. Eles viam
diferentes tipos de pessoas se embembedando e fazendos diferentes tipos de contextos caoticos.
Pessoas se beijavam, se embebedavam, alguns pareciam tar alucinados, outros brigavam e ate pros
amigos de Milagros que tavam acostumado a sair pra lugares mais "pesados" não tavam acostumado
com tanta coisa acontecendo. Algumas pessoas dentro da festa pareciam estar ate um pouco fora do
normal pra uma balada, como se algo estranho tivesse acontecendo.

Mas eles começaram a tentar pegar o clima da boate, começaram bebendo aos poucos, ate começar a
escalonar. Eles tentavam se afastar de drogas ou entorpecentes mesmo sendo de certa forma dificil
porque tinham pessoas que acabavam por usar drogas que se espalhavam. Estavam no centro da pista,
agora pra Milagros tudo fazia sentido, quando ele imergiu dentro do caos que rodiava aquela festa,
deixando a razão de lado. Parecia finalmente por pelo menos um curto espaço de tempo ser livre de
verdade. Sua visão ficava um pouco turva pela bebida e por conta das cores fortes que distorciam o local,
somado a musica que parecia tar dentro da cabeça dele. Eles dançavam loucamente no meio das
pessoas, deixando o caos e a anarquia dominar suas mentes. Parece que ele havia vivido a sua vida
inteira so pra esse momento, não se importava mais com quem era deus ou quem era o diabo, o que era
inferno e o que era céu. Essa dualidade parecia ridicula agora, a ambiguidade, a improvabilidade, tudo
que fugia de preto e branco agora parecia lindo pra ele. Não se importava nem um pouco se a imagem
que ele passava era de um anjo ou de um demonio, agora o caos reinava, independente de qualquer
dessas coisas futeis. Derrepente em meio aquela loucura, um desconhecido acertou um soco na sua
amiga ao lado, imprudente agora, sem nenhuma estribeira. Ele não pensou em outra coisa, ele partiu
pra cima do individuo, trocando socos e porrada. Mas algo parecia tar estranho, ele sentia que não era
so sua visão turva se misturando com o resto das luzes da festa. De dentro do olho daquele
desconhecido saia uma forte energia roxa e aquela figura que na sua visão estava preta por conta da
iluminação da festa, começava a se distorcer. O corpo parecia esticar e a silhueta parecia ficar
incongruente, como se estivesse em constante estado de mudança. Em um curto pico de sanidade, ele
segurou os braços dos seus amigos e o afastaram dali, na hora que começaram a correr aquela coisa que
se centrava no meio da festa no momento que tinha se transformado, parecia estar se expandindo. Ela
continuou ate que uma explosão de raios acontecessem, pegando um pouco dele e de seus amigos.
Começaram a correr sem parar em direção a saida da festa. Mesmo eles quase no estopim do
enlouquecimento tiveram a sanidade pra escapar, eles olhavam pra tras. Uma bagunça parecia tar
acontecendo la dentro, eles não conseguiam nem ao menos explicar o que era aquilo.

Depois de correrem por um tempo, pararam em uma praça que estava um pouco mais longe e se
sentaram. Um pouco mais calmos mas tentando absorver tudo o que tinha acontecido, apos um certo
periodo deles em estado ofegante. O seu amigo do lado falou que tinha sido extremamente "foda" essa
festa mesmo não tendo entendido quase nada. Acabaram que os tres mesmo correndo um perigo
extremo, haviam achado uma experiencia gratificante, mas os dois amigos estavam bem assustados
mesmo achando aquilo tudo maneiro. Porem Milagros, ate tava com medo, mas graças a seus problemas
psicologicos desenvolvidos e da sua frustração. Ele tinha achado alem do que os seus amigos, ele se
sentiu em um plano que ele quase não conseguia explicar, finalmente parecia que a sua vida tinha valido
a pena, pra ele o caos era belo naquele momento. Ele nunca teve tanta liberdade na sua vida inteira,
vivendo em uma gaiola por todo esse tempo. Foi o momento que soltou suas correntes, sentiu como por
um momento pudesse fazer tudo e nada ao mesmo tempo.

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