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do CEPA

Vol. 21 - Ne 26 - setembro 1997


UNISC - Universidade de Santa Cruz do Sul


ÍNSELHO EDITORIAL ::: UIMISC
UNIVERSIDADE DE SANTA CRUZ DO SUL

Reitor
lriana Schmidt Dias - UFRGS Luiz Augusto Costa a Campis
ídré Luiz Jacobus - MARSUL Vice-Reitora
ul Eduardo Seiger Milder - UFSM Helga Haas
Pró-Reitor de Pós-Graduação,
rgio Klamt - UNISC Pesquisa e Extensão
Wilson Kniphoff da Cruz
Pró-Reitora de Graduação
Luci Elaine Kràmer
Pró-Reitor de Administração
Vilmar Thomé
Pró-Reitor de Planejamento
e Desenvolvimento Institucional
Marcos Moura Baptista dos Santos
EDITORA DA UNISC
Editora
Helga Haas

artigos são de responsabilidade dos respectivos autores.

Revista do CEPA. -- Vol. 21, n.26 (set. 1997.) -- Santa Cruz do


Sul: Editora da UNISC, 1998.
ISSN 0103-3093
1. Arqueologia. I. CEPA - Centro de Ensino e Pesquisas
Arqueológicas.
CDU 902
Catalogação: Bibliotecária Mirca Silveira - CRB - 10/718

EDUNISC
Avenida Independência, 2293
Telefone: (051)717-7461 e 717-7462 - Fax: (051) 717-1855
96815-900 - Santa Cruz do Sul - RS
SU M Á R IO

Editorial............................................................................................................. 5
PEQ U EN O GLOSSÁRIO ILU STR A D O PARA
REPRESENTAÇÃO GRÁFICA D E ARTEFA TO S
L ÍT IC O S
Marcha Daisson Hameister, João Darcy de Moura Saldanha e
Adriana Schmidt D ias ...................................................................................... 7
...GUAIANÁ, BURACO DE BUGRE, KAINGANG/
XOKLENG: ...qual ancestralidade?...qual analogia?
...de que campo pode-se falar?...
José Alberione dos R eis ..............................................................................35
GARRAFAS, FRASCOS E PO NTAS DE FLECHA.
CONSIDERAÇÕES SOBRE O VIDRO DO SÍTIO
DA GUARDA DE SÃO MARTINHO - RS
João Heitor Silva M acedo .............................................................................91
DISTÂNCIAS E N T R E AS ÁREAS DE CAPTAÇÃO
DE RECURSOS LÍTICOS E O SÍTIO ARQUEOLÓGICO
DO ARROIO DO CONDE, RIO GRANDE DO SUL
Francisco Silva Noelli ..................................................................................113
>á m

V ' ■ ' ,
PEQ U EN O GLOSSÁRIO ILU STR A DO PARA
R EPRESENTAÇÃO GRÁFICA
DE A RTEFA TO S LÍTICO S

Martha Daisson Hameister *


João Darcy de Moura Saldanha *
Adriana Schmidt Dias **

I. Introdução
O desenho de um artefato lítico corresponde à última etapa de seu
processo de estudo, tendo por função representar de forma gráfica os
critérios analíticos utilizados pelo pesquisador para sua decodificação.
Embora esta atividade possua papel fundamental na pesquisa, observa-se
na bibliografia especializada a ausência de critérios padronizados para a
documentação dos diferentes fenômenos passíveis de serem identificados
quando da análise dessa categoria de artefatos (PROUS, 1992:100). Esta
mesma preocupação é compartilhada por Vallejo e Sánchez (1996:89) ao
destacarem que: •
" Uma olhada superficial em diversas publicações permite
constatar como, às vezes, esquece-se que a comunicação
entre investigador (es) e leitor realiza-se através de um
sistema dual (texto e ilustrações). Disto deriva-se que o
escrito expõe de forma desorbitada, o que poderia
simplificar-se por meio de um maior desenvolvimento
dos convencionalism os icônicos" (V A L L E JO E
SÁNCHEZ, 1996:89).
A mesma sorte tem a bibliografia brasileira voltada ao estudo de
coleções líticas, na qual ocorre uma prolixidade de códigos que reflete-se,
por vezes, em mais de uma forma de representação ou denominação para

* Acadêmicos do curso de História e bolsistas do NUPArq - UFRGS.


** Professora do curso de História e pesquisadora do NUPArq - UFRGS.
Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7-33, set. 1997
mesmo tipo de elemento presente no artefato. Partindo dessas
nstatações iniciais, a proposta deste glossário estruturou-se no sentido
: fornecer um possível léxico unificado para a representação de artefatos
icos, destacando aspectos ligados à tecnologia de produção, às alterações
; superfície e às modificações causadas por uso. Optou-se por elaborar
presente proposta partindo da definição dos aspectos tecnológicos e
rmais das cadeias operatórias que dão origem a estes artefatos, passando
>s processos que geram alterações em suas superfícies. Procedeu-se
;sta maneira por entender-se que este glossário esteja voltado a atender
demandas tanto de especialistas quanto de neófitos no tema.
Esse glossário organiza-se em quatro partes, estando os verbetes
spostos de acordo com as etapas do trabalho de representação gráfica,
esta forma, inicia com as regras básicas para o desenho técnico de
>jetos tridimensionais no plano, prosseguindo com a tecnologia de
odução de artefatos líticos, a representação de alterações de superfície
is peças e, por último, o registro de marcas de utilização nas mesmas,
abe ainda destacar que a proposta de léxico apresentada é decorrência
) amadurecimento das pesquisas desenvolvidas por Hameister e Saldanha
997a; 1997b), integradas ao projeto de análise da coleção lítica do sítio
3-S-358: Toca Grande1 (DIAS, 1997).

II. Elementos para Desenho Técnico de Objetos Tridimen-


onais e Artefatos Líticos no Plano
A representação gráfica do artefato lítico deve enquadrar-se nas já
insagradas normas de desenho técnico de objetos tridimensionais, o que
;m sempre fica claro nas publicações existentes sobre o assunto. Longe
: ser um “retrato” do artefato, essa representação gráfica é resultado de
na elaboração mental, não sendo desenhado aquilo que se vê, e sim, a
rtir do objeto real, o que é interpretado. O termo “representação

»s desenhos de artefatos líticos que ilustram esse glossário foram feitos a partir das coleções
rtencentes aos sítios arqueológicos RS-C-43: Capivara I, RS-S-358: Toca Grande (ambos
tradição Umbu) e da coleção de machados Guarani do Rio Grande do Sul/ MARSUL. Foram
ífeccionados por Eduardo Kickhõfel, João Darcy de Moura Saldanha e Adriana Schmidt
as, com arte final realizada por Martha Daisson Hameister. Ao longo do texto, para casos
>eciais, a título de ilustração dos verbetes, optou-se por representar diferentes fenômenos
-n a utilização de um mesmo artefato, não correspondendo, portanto, a representação ao
jeto real.
Rev. do C E P A Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7-33, Set. 1997
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gráfica” deixa claro que não é o objeto real que se tem em mãos, e sim uma
representação codificada dos elem entos que foram considerados
significativos para a sua compreensão. Corresponde a uma sucessão de
escolhas que vai desde o momento em que o pesquisador elege as vistas
a serem representadas, passando pela julgamento do que seriam elementos
significativos e pela definição e elaboração dos códigos gráficos que os
representarão. Nem sempre o tipo de representação escolhida corresponde
a aparência do objeto real. Todavia, o objetivo é saber que tal código
significa um tipo somente de elemento passível de ocorrer nos artefatos
líticos, tornando sua compreensão e “leitura” acessíveis a qualquer um
que domine o léxico utilizado.
1 Sistema Cilíndrico de Projeção de Vistas Ortogonais - A
representação gráfica de objetos tridimensionais no plano pode obedecer
a vários sistemas de representação. O mais utilizado em grande número
de países e em especial no Brasil é baseado no método bi-projetivo
mongeano. Grosso modo, este trata da projeção de diferentes vistas do
objeto em um plano de projeção que rota ortogonalmente em torno de si.
Nesse sistema, cada vista do objeto está posicionada de maneira
paralela ao plano de projeção, sendo “atravessada” por linhas conceituais,
paralelas entre si e perpendiculares ao plano de projeção e ao objeto, que
“impressionam” este plano. É um sistema dito cilíndrico2 (fig. 1),
contrapondo-se ao sistema chamado cônico (fig. 2), onde as linhas
conceituais têm origem em um ponto comum.

Figura 1* Figura 2*

Todas as ilustrações assinaladas com asterisco foram extraídas de BORNANCINI,


PE TZ O L D & ORLANDI Jr., 1981.
Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7-33, set. 1997
0
A vantagem do sistema cilíndrico sobre o cônico é a de serem
spresentados em verdadeira grandeza, todas as linhas e planos paralelos
o plano de projeção (fig. 3). Assim, o tamanho do objeto representado
íantém-se inalterado quando de sua representação, ficando isento de
istorções de perspectivas (como as demonstradas em fig. 4).

O sistema cilíndrico de projeção de vistas ortogonais é, portanto, a


ase para a representação de objetos em geral e pode ser utilizada em
specífico para a representação dos artefatos líticos.
2 Escala - Outro elemento necessário para a correta interpretação
o objeto é a presença de escala: numérica ou gráfica, denota a relação da
apresentação que se tem em mãos com o tamanho real do objeto. Por
erem as representações dos artefatos líticos passíveis de sofrer redução
u ampliação no tamanho original para fins de edição, sugere-se a
tilização de escala gráfica (exemplo em fig. 5) junto ao desenho. Nos
asos em que as proporções da representação do objeto não são alteradas
uando de sua edição, pode-se utilizar escala numérica, que indica a
:lação do tamanho da representação com o objeto real, sob forma de
roporção (exemplos em fig. 6).
0,5

Figura 5
1 : 10 ou 1/10
Figura 6
Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7-33, Set. 1997
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3 Efeitos de Iluminação e Sombra Própria do Objeto - Para
conferir volume à representação gráfica, utiliza-se uma “iluminação”
ideal, que convenciona-se como que partindo de um foco de luz situado
no canto superior esquerdo (ou Io quadrante), a 45° . Este foco eleva-se
sobre o objeto representado também a 45°, colocado conforme a ilustração
abaixo (fig. 7):

Figura 7* Figura 8
A intensidade da luz abate-se, portanto, de maneira diferente em
cada uma das partes do objeto e, por conseqüência, de sua representação,
como visto em fig. 8. A luz é mais intensa no segundo quadrante, variando
para uma intensidade média, com predomínio de luz no terceiro, inten­
sidade média com predomínio de sombras no primeiro e sombras intensas
no quarto quadrante.
4 Escolha de Vistas de Objetos Tridimensionais - A escolha das
vistas a serem representadas também obedece a determinadas regras,
dependendo do artefato que se pretende representar. A colocação dessas
vistas no plano de representação deverá obedecer a disposição ditada
pelas convenções do desenho técnico de objetos tridimensionais,
largamente adotada no desenho mecânico, arquitetônico ou no design de
objetos. De acordo com as normas da ABNT, a vista principal do objeto
é escolhida por conter uma maior riqueza de detalhes a serem
representados, ocupando a posição central, no desenho. A sua direita,
representa-se a vista lateral esquerda, e a direita desta a vista posterior.
Abaixo da vista principal, localiza-se a vista superior do objeto, sendo que
as vistas inferior e lateral direita deverão ser colocadas acima e à esquerda
da vista principal, respectivamente. O posicionamento descrito para a
representação destas vistas, consideradas como as principais do objeto,
confere uma forma de cruz à representação, com a maior dimensão sendo
Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v-21, n.26, p. 7-33, set. 1997
a horizontal, como é ilustrado a seguií (figs. 9, 10 e 11)

5 Representação Gráfica de Artefatos Líticos - Quando da


presentação gráfica de um artefato lítico lascado, é usual serem
jresentadas no mínimo quatro vistas, dispostas no plano suporte da
presentação (a folha de papel) de maneira ordenada e constante,
rrespondendo cada uma das vistas à sua localização padrão, dispensando
escrita do nome da vista junto desta. As quatro vistas normalmente
presentadas e que em geral são suficientes para a compreensão do
efato lítico lascado recebem as seguintes denominações:
a) Vista externa ou face externa, também denominada face dorsal;
b) Vista interna ou face interna, também denominada face ventral;
c) Vista lateral esquerda, assim denominada pois fica à esquerda do
jeto, se considerado este com a face interna voltada para o papel;
d) Vista superior, que é a visão que se obtém posicionando o artefato
ti sua terminação proximal voltada para o plano suporte de representação.
Existindo uma riqueza de detalhes ou presença de algum elemento
jgado significativo, elucidativo ou mesmo indispensável para a compre-
ião do objeto real, também poderão ser representadas as vistas inferior
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e lateral direita do objeto, usualmente dispensadas.
No caso da representação do artefato lítico que tem por suporte uma
lasca, convenciona-se posicionar a representação da face externa, com o
talão', por tratar-se da porção proximal da lasca, voltado para baixo,
próximo de quem representa o objeto, ficando portanto a porção distai no
“topo” da representação, como segue na fig. 12.

No caso de objetos no qual são inidentificáveis os processos


tecnológicos de origem, orienta-se a representação segundo o eixo
morfológico (aqui assinalado com a linha tracejada), ficando, o vértice da
forma, voltado para cima. Assim dispõem-se, por exemplo, as pontas de
projétil (fig. 13). Pode ainda o objeto a ser representado não possuir
nenhum desses elementos que orientam a disposição do desenho no plano
suporte. O pesquisador deve utilizar o já mencionado critério de eleger a
vista que contenha maior riqueza de detalhes ou elementos considerados
significativos na análise da peça, e proceder conforme o explicitado
anteriormente. .

Figura 13
Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.27, n.26, p. 7 -3 3 , set. 1997
14

III. Representação Gráfica da Tecnologia de Produção de


Artefatos Líticos
Um enfoque de pesquisa tecno-tipológico, ao destacar as cadeias
operatórias, ou seja, a seqüência de passos técnicos que dão origem aos
artefatos, demanda uma correlação precisa entre os aspectos tecnológicos
identificados como significativos e seu registro gráfico. Desta forma,
torna-se necessário o desenvolvimento de um sistema de representação
gráfica que documente a maior quantidade de características tecnológicas
que sustentam e intervém na identificação de uma indústria lítica
(VALLEJO e SÁNCHEZ, 1996: 92-93). No caso das indústrias líticas
arasileiras, algumas convenções são adotadas no que diz respeito, por
jxemplo, a orientação das peças, representação de superfícies corticais,
jntre outras. Contudo, a análise da bibliografia pertinente aponta uma
falta de padronização quanto à representação de processos tecnológicos
distintos, empregados na confecção de artefatos. Sugerimos alguns
procedimentos para a representação gráfica de artefatos líticos que
permitam distinguir aspectos tecnológicos diferenciados de confecção
itravés das técnicas de lascamento unipolar e bipolar, de picotamento e
polimento.
1 Tecnologia de Lascamento Unipolar - A técnica de lascamento
unipolar também é chamada de lascamento por percussão direta ou
lascamento controlado (CRABTREE, 1972: 11-12). Segundo esta, o
artesão segura um bloco (núcleo) de matéria-prima em uma das mãos e
sscolhendo uma superfície adequada (plano de percussão), bate nesta
:om um percutor para retirar lascas. O ângulo entre o plano de percussão
2 a parte externa do bloco a ser lascado deve ser igual ou inferior a 90°,
para que o desprendimento de lascas ocorra (PROUS, 1986/1990: 17-18).
Em função dos sucessivos golpes desferidos em sua superfície, os
íúcleos unipolares apresentam-se vincados de cicatrizes que correspondem
10 negativo da face internas das lascas que se destacaram. Tanto a cicatriz
leixada no núcleo, quanto a face interna da lasca unipolar apresentam
ividências da dispersão do impacto que provocou o lascamento, na forma
le ondas de força. A força do golpe faz com que parte da plataforma
percutida desprenda-se do núcleo, formando o talão da lasca. A percussão
ambém produz na lasca unipolar um bulbo marcado e proeminente, de
mde divergem as ondas de força, conferindo a sua face interna uma
:onformação levemente côncava (DIAS & HOELTZ, 1997:30-31).

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Tendo em vista as peculiaridades deste processo de produção de
artefatos líticos, torna-se necessário estabelecer convenções de
representação gráfica que lhes sejam específicas. A seguir sugerimos
alguns procedimentos padrões para o registro de aspectos tecnológicos
associados a lascas e núcleos unipolares.
a) Lasca Unipolar:
1. Na orientação da vista principal, o talão da lasca deve situar-se
próximo a quem representa;
2. com um traço mais espesso deverão ser assinalados o contorno da
peça. Os limites das cicatrizes de lascamentos presentes em sua superfície
devem ser representadas com traço médio;
3. o interior das cicatrizes de lascamento deve ser preenchido com
ondas de força representadas com traço fino, concêntricas e mais próximas
entre si quanto mais próximas do ponto de impacto estiverem. Estas
devem sempre ser mais marcadas nas áreas menos iluminadas, tornando-
se traços e pontos nas zonas mais claras. Tais ondas sempre serão
representadas como sendo perpendiculares ao vetor da força aplicada
para o descolamento da lasca;
4. no caso de impossibilidade de localização de elementos que
indiquem a direção de lascamento, no preenchimento da cicatriz nada
deverá constar, ficando apenas os limites da cicatriz demarcados na
representação;
5. na face interna da lasca, as ondas de força devem ser representadas
em pequena quantidade na região limítrofe do bulbo, assinalando-o dessa
maneira. Este pode ser ressaltado através da representação de lancetas
que para ele convergem;
6. o ponto de impacto ou percussão que produziu a lasca, de acordo
com o caso, pode ser assinalado com uma seta em traço médio;
7. em geral, a representação de quatro vistas é o suficiente para
representar o objeto, sendo elas: externa, interna, superior e lateral
esquerda, podendo as demais serem omitidas ou representadas, a critério
de quem representa.

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Figura 14

b) Núcleo Unipolar:
1. Se todas ou a maioria das lascas foram desprendidas num mesmo
;entido, a vista superior será aquela que contém o plano de percussão
mncipal. A vista frontal, bem como as demais, ficam a critério de quem
epresenta, desde que estas sempre formem ângulo de 90° com as vistas
]ue lhes são contíguas;
2. no caso de não haver o predomínio de nenhum sentido no
iesprendimento das lascas, considera-se como vista frontal aquela que
:ontiver o maior número de informações;
3. não sendo possível hierarquizar as vistas, pela quantidade de
nformações, sua escolha fica a critério de quem representa, desde que
sstas formem ângulo de 90° com as vistas que lhes são contíguas;
4. representam-se as cicatrizes e características das superfícies de
cordo com o já dito no item relativo à lasca unipolar.

Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7-33, set. 1997
Figura 15

2 Tecnologia de Lascamento Bipolar - A técnica de lascamento


bipolar proporciona o rompimento de núcleos a partir de percussão com
apoio (RÜTSCHILLING, 1989: 47). O termo bipolaridade dá-se em
função dos dois pólos de força em ação no processo de produção de lascas.
O golpe no plano de percussão direta produz uma contra-força no ponto
de apoio (plano de percussão indireta), gerando dois pólos de força em
oposição linear, cuja ação acarreta a ruptura do núcleo (DIAS & HOELTZ,
1997:31).
As lascas bipolares geralmente tem faces planas, podendo apresentar
em suas extremidades plataformas opostas que correspondem às zonas de
impacto direto e indireto, cujos talões são substituídos por linhas de
esmagamento. A face mais plana, quase sempre é a interna e a face
externa apresenta freqüentem ente irregularidades provocadas por
lascamentos ou desprendimentos anteriores (RÜTSHILLING, 1989:
50; PROUS & LIMA, 1986/90:100). A distinção entre lascas e núcleos
bipolares dá-se em função da quantidade de planos de lascamento ou
cicatrizes que estes apresentam.
As convenções de representação gráfica destas peças obedecem os
seguintes critérios:
Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7 -3 3 , set. 1997
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a) Lasca Bipolar:
1. A disposição das vistas no plano de representação, bem como a
hierarquia de traço, devem seguir a orientação já explicitada no item
anterior;
2. quando há a presença de plano de percussão direta e indireta, o
primeiro é colocado próximo de quem o representa;
3. na ausência de plano de percussão direta e possuindo a lasca
porção distai em forma de vértice, orienta-se esse vértice para a parte
superior do plano de representação;
4. caso estas especificações estejam ausentes, orienta-se a lasca
colocando sua maior dimensão seguindo o eixo longitudinal;
5. no preenchimento das cicatrizes de lascamento, representam-se
estrias (ranhuras, no sentido da maior dimensão da cicatriz, orientadas
paralelamente aos limites destas) com linhas paralelas entre si, em traço
de pequena espessura. Este procedim ento perm ite diferenciar
graficamente resíduos de lascamento unipolar do bipolar;
6. localizado o plano de percussão direta e os pontos de impacto,
pode-se assinalá-los com três setas com traço de média espessura;
7. também utilizam-se as quatro vistas padrão para a representação
desse tipo de lasca.

0 0,5 1 2 cm
1U l

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19
b) Núcleo bipolar:
1. Como em geral esse tipo de núcleo se caracteriza pelo
desprendimento aleatono das lascas, a eleição das vistas fica a cnteno de
quem representa, aconselhando-se, no entanto, que a maior dimensão do
núcleo seja orientado na posição vertical;
2. as faces com maior número de informações ou particularidades
que se desejam representar também podem ser decisivas na escolha das
vistas;
3. representam-se os limites das cicatrizes e suas características,
bem como a escolha das vistas, de acordo com o já dito no item relativo
à lasca bipolar.

0 0,5 2 cm

Figura 17

3 Artefatos Lascados Unifaciais e Bifaciais — Correspondem a


peças líticas lascadas com a finalidade de apropriação de uma forma pré-
concebida, evidenciada pela presença de retoques (MORAES, 1987:170)
ou por uma morfologia recorrente. Os artefatos bifaciais correspondem a
utensílios total ou parcialmente lascados, através de retiradas invasoras
em ambas as faces, caracterizando-se pela presença de um gume periférico
Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7 -3 3 , set. 1997

de bordas levemente convexas (PROUS, 1986/1990:29). Nos artefatos


unifaciais, por sua vez, as retiradas restringem-se apenas a uma das faces
da peça, dando-lhe uma configuração geralmente plano-convexa.
Quanto à sua representação gráfica, destacam-se as seguintes
convenções:
1. Quando, em um artefato elaborado sobre lasca, não se verifica a
presença de talão, mas indicadores tais como presença do bulbo ou de
lancetas, pode-se pressupor a posição do mesmo. Orienta-se o artefato de
acordo com a posição em que estaria tal talão;
2. quando da impossibilidade de se obter tal informação, orienta-se
a representação segundo o eixo morfológico da peça, dispondo esse na
posição longitudinal. Havendo um vértice na forma do objeto, este deverá
ficar no topo da representação;
3. as cicatrizes de lascamento deverão ser assinaladas na peça de
acordo com o já explicitado anteriormente quanto à hierarquia de traços.
Seu preenchimento obedece aos mesmos critérios sugeridos quanto à
representação de resíduos de lascamento unipolar e bipolar, como
exemplificado na figura 18.

Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7 - 3 3 / Set. 1997


21
4 Artefatos Picotados - O picotamento corresponde a uma técnica
de produção de artefatos líticos que consiste em martelar-se uma superfície
com pequenos golpes até obter-se a forma desejada. Esta técnica está
associada a produção de formas que o lascamento não permite, relacionadas
à produção de concavidades, abatimento de arestas e confecção de sulcos
correspondendo, muitas vezes, a um procedimento preliminar ao polimento
que daria um acabamento final à peça. O picotamento também associa-se
a rochas resistentes ao lascamento, cuja percussão produz somente
desprendimento de matéria na forma de pó, deixando uma cicatriz
pequena, com esfarelamento provocado pelo golpe (PROUS, 1986/90:8-
9). Embora sua presença corresponda a um índice tecnológico importante
para a compreensão da cadeia operatória associada à produção de determi­
nados artefatos, não há convenção gráfica para sua representação. Para
sanar tal lacuna sugerimos o seguinte tipo de procedimento:
1. Orienta-se a representação no plano com a maior dimensão
colocada na vertical;
2. quando há um vértice bem notado no artefato, este deverá ficar
no topo da representação;
3. para os artefatos com grande regularidade na forma, que
apresentam morfologia cilíndrica ou fusiforme, em geral duas vistas são
suficientes para sua representação. Seriam estas as vista superior e frontal;
4. caso ocorram em outras faces do artefato fenômenos considerados
relevantes, adicionam-se essas vistas, sempre com o cuidado de que sejam
representadas formando um ângulo de 90° com as vistas que lhes são
contíguas;
5. a representação das superfícies picotadas dar-se-á através de
composição de formas semicirculares associadas ao pontilhado, para
conferir certo volume à superfície, que pode apresentar depressões
irregulares ou não;
6. para destacar a área que apresenta picotamento intencional na
peça, sugere-se a aplicação de cinza médio ao longo da superfície em que
este ocorre, conforme processos já descritos em Hameister e Saldanha
(1997b);
7. somente deve-se assinalar a área de picotamento como sendo
intencional quando não restar dúvidas quanto a isso. O exemplo e a figura
19 consta de uma das vistas de uma boleadeira produzida sobre seixo, na
qual é evidente a presença de picotado intencional na produção do sulco
periférico.

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[ —---- 1 Figura 19
0 0.5 1 2 cm

5 Artefatos Polidos - O polimento corresponde a uma técnica de


acabamento de peças líticas através da ação de agentes abrasivos sobre
sua superfície. Os agentes abrasivos podem corresponder a superfícies
rochosas irregulares (como o arenito ou o granito) ou a fricção da peça
sobre superfícies cobertas com areia e água, sendo a qualidade do
polimento obtido em função da fineza dos grãos abrasivos (LAMING-
EMPERAIRE, 1967:29-30). Áreas que apresentam polimento intencional
em artefatos líticos podem ser representadas graficamente da seguinte
forma:
1. A orientação da peça, bem como as
escolha das vistas a serem representadas
obedecem aos mesmos critérios do item anterior,
sendo dependentes da morfologia do artefato;
2. as áreas que apresentam polimento
intencional são cobertas por um reticulado
diagonal, usando-se o distanciamento entre as
linhas do reticulado para conferir os efeitos de
iluminação, como no exemplo ao lado.

Figura 20

Rev. do C E PA Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7-33, set. 1997


23
IV. Representação Gráfica de Alterações de Superfície em
Artefatos Líticos
A representação gráfica de alterações de superfície pré ou pós-
deposicionais em peças líticas tem recebido um tratamento desigual na
literatura. Embora encontremos referências à documentação gráfica de
córtex e fraturas, por exemplo, aspectos relevantes como a presença de
pátinas, concreções ou fraturas térmicas têm sido desprezados. Dedicamos
este item do glossário a sugestões sobre o tratamento gráfico destes
fenômenos, enquanto complementação aos aspectos tecnológicos tratados
no item anterior. Para tanto, optamos por representar em uma única lasca
unipolar, a título de ilustração, as possíveis variações de superfície à
exceção dos tipos de fratura.
1 Córtex - O córtex corresponde às alterações da camada externa
da matéria-prima lítica ocasionadas pela ação dos agentes naturais,
distinguindo-se do interior da rocha por sua composição físico-química e
coloração (LAMING-EMPERAIRE, 1967:24). A convenção para sua
representação gráfica dá-se a partir do preenchimento por pontos da
superfície cortical, cuja intensidade e concentração dá volume à peça e
ilustra as variações das áreas de sombra e luz (figura 21).

Figura 21

2 Fraturas - Os padrões de fraturas dos artefatos líticos podem


estar relacionados aos processos de abandono da peça ou à processos pós-
deposicionais sofridos pelo material. Em sua representação gráfica
podemos diferenciar dois tipos de fratura:
a) Fratura na peça: Ocorre por alguma peculiaridade da matéria-
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prima que pode impedir a continuidade do lascamento. Convencionamos
representar este tipo de fratura assinalando o limite onde ocorre com uma
linha tracejada de média espessura, conforme exemplo abaixo:

0,5

Figura 22

b) Fratura da peça: A convenção para a representação de uma área


de fratura adotada consta de linhas curtas que seguem a direção dos
limites da peça, realizada através de uma espessura média de traço, com
um ponto finalizando a representação, conforme exemplo abaixo:

^ Alterações Pós_deposicionais (patina e concreções) _ Após o


descarte, as peças liticas podem sofrer alterações físico-químicas em
funçao de seu ambiente de deposição, sendo as mais comuns a presença
de concreçoes e de patina. A anotaçao e distinção destas alterações torna-
sc importante, tendo em vista 3. compreensão dos processos pós_

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deposicionais pelos quais as peças líticas passaram. Para tanto, reco­
mendamos os seguintes critérios de representação gráfica destes
fenômenos:
a) Concreção: Corresponde a deposições de carbonato de cálcio
sobre o artefato lascado, podendo decorrer de processc naturais ou
associação prolongada à depósitos antrópicos, como fogueiras.
C onvencionam os assinalar a área atingida por concreção,
delimitando-a com traço de média espessura e cobrindo a área com um
tom de cinza escuro, obtido conforme especificações de Hameister e
Saldanha (1997b), de acordo com a figura 24.

Figura 24

b) Pátina: A pátina corresponde a uma película que se sobrepõem


a área lascada em função de alteração físico-química do meio, após longo
período de abandono. Por vezes, as peças líticas podem apresentar áreas
com pátina que apresentam lascamentos mais recentes sobrepostos,
indicando retomada da peça.
Utilizamos um tom de cinza médio, obtido de acordo com as
especificações de Hameister e Saldanha (1997b), para convencionar a
presença de pátina sobre o artefato lítico, com prévia delimitação da área
por traço de média espessura, conforme o expresso na figura 25.
4 Alterações Térmicas - A ação do fogo sobre diferentes matérias-
primas líticas pode dar origem a variados tipos de alterações de superfície.
Processos de fratura e lascamento irregular podem ser produtos de
exposição ao calor excessivo. O lascamento térmico costuma produzir
desprendimento de lascas ovaladas de superfície irregular nas faces da
peça exposta ao fogo. Estas lascas térmicas não apresentam talão ou bulbo
e geralmente são mais espessas no centro do que nas bordas, podendo
também apresentar um formato estrelado quando desprendem-se de
cantos em ângulo (PROUS, 1986/90:14-16, LAMING-EMPERAIRE,
1967:25). Na literatura não há regras para notação gráfica deste tipo de
alteração de superfície, sendo sugerido para tanto a delimitação da
superfície atingida pelo fenômeno com traço de espessura mediana,
aplicando-se sobre esta pontos dispostos com distância regular entre si.
Um destaque final deste tipo de cicatriz térmica pode ser obtido aplicando-
se sobre seu fundo um tom de cinza médio, conforme o explicitado em
Hameister e Saldanha (1997b), como exemplifica a figura 26.
27
V. Representação Gráfica de Marcas de Utilização em
Artefatos Líticos
Este último item procura dar conta da representação gráfica de
diferentes categorias de marcas de utilização passíveis de observação
macroscópica em bordas ou superfícies de peças líticas. A variedade de
utilizações que as peças líticas podem sofrer demanda a utilização de
códigos icônicos próprios que permitam registrá-las de forma distinta.
Contudo, assim como no caso anterior, esses fenômenos também têm sido
pouco trabalhados na literatura pertinente. Procurando sanar esta lacuna,
sugere-se alguns padrões de representação que, agregados à representação
gráfica de aspectos tecnológicos e de alterações de superfície, podem
permitir um registro uniforme de fenômenos associados aos artefatos
líticos. Igualmente, procuramos ilustrar fenômenos funcionais associados
à definição dos chamados “artefatos brutos”, que correspondem aos
seixos ou fragmentos de matérias primas em estado natural, nos quais
observa-se “o resultado involuntário da mão humana” a partir da presença
das marcas de utilização. (PROUS, 1986/1990:10).
1 Marcas de Uso Associadas às Bordas de Artefatos Lascados
- A representação gráfica de áreas de desgaste de bordas provocadas pelo
uso de artefatos líticos lascados é convencionada pela presença de uma
linha pontilhada, representada com traço médio, próxima à borda ativa da
peça. Contudo, de acordo com o tipo de desgaste de borda identificado
(KEELEY,1979), este pontilhado pode ser representado em diferentes
posições, indicando o movimento e o tipo de atividade ao qual o artefato
associa-se.
1. Desgaste paralelo à borda - Indica atividades de cortar, serrar ou
fender materiais. Sua indicação gráfica dá-se através de pontilhado
associado nas projeções das vistas frontal e posterior da peça, junta à área
desgastada;
2. desgaste perpendicular à borda - Indica atividades de raspar ou
aplainar superfícies. O pontilhado é representado neste caso apenas
próximo à face da peça que apresenta marcas de uso, como ilustrado a
seguir.

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CO

Figura 27
2 Marcas de Uso Associadas à Artefatos Brutos - Os artefatos
brutos podem ser classificados como ativos, quando a marca de uso
presente nestes é o resultado da aplicação ou ampliação da força humana
no ato de transformar a matéria-prima, ou como passivos, quando serviram
de suporte para a aplicação de golpes ou pressões (MOURA &
PRO U S,1989:409; PROUS, 1986/90: 11-12). Como a distinção das
diferentes categorias de artefatos brutos decorre dos tipos de marcas de
uso que estes apresentam, optou-se por estabelecer critérios gráficos
específicos para a sua diferenciação. Sua representação gráfica geral
obedece às mesmas especificações já explicitadas nos itens II e III,
agregando-se a estas as particularidades icônicas relativas às marcas de
uso.
a) Picotamento Decorrente de Percussão Direta e Indireta:
Corresponde a marcas pontuais em forma de pequenas vírgulas relacionadas
às áreas de impacto, dispostas de modo concêntrico na periferia e/ou nas
faces de seixos utilizados para percutir (percutores) ou nas faces planas de
seixos utilizados como apoios para o lascamento bipolar (bigornas).
Podemos fazer uma distinção entre picotamento passivo, causado pelo
uso, e picotamento ativo ou intencional, associado à tecnologia de
produção de artefatos através do esmagamento de arestas ou produção de
depressões ou sulcos, cujas regras de representação já foram explicitadas
(PROUS, 1986/1990:13).
A representação gráfica do picotamento passivo, decorrente do uso
da peça bruta, dá-se da seguinte forma:
1. Delimitação por traço médio da área que apresenta o picotamento
passivo;
2. preenchimento desta área por marcas semicirculares, na forma de
vírgulas, sobreposto ao padrão pontilhado que marca a presença de córtex
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29
e dá volume à peça.
Nas ilustrações selecionadas representamos um percutor com marcas
de picotamento passivo periféricas (fig. 28) e uma bigorna com marcas
semelhantes em uma de suas faces (fig. 29).

Figura 28 Figura 29

b) Marcas de Esmagamento e Maceração Causadas pelo Uso:


Correspondem a marcas irregulares, onde observa-se uma superfície
picotada, arredondada e com micro-desprendimento de matéria disposta
de forma concêntrica, associadas a seixos utilizados para exercer pressão
sobre superfícies lisas (maceradores - figura 31) e seixos usados para
exercer pressão/percussão difusa sobre superfícies côncavas (trituradores
- figura 30), utilizados para esmagamento/trituração de grãos e pigmentos
(PROUS, 1986/90:10). A representação gráfica destas alterações funcionais
dá-se de acordo com os seguintes critérios:
1. Delimitação por traço médio da área que apresenta marcas de
esmagamento e/ou maceração;
2. preenchimento desta por um padrão de cruzes alinhadas ao plano
de representação, sobrepondo-se a um padrão pontilhado, relacionado ao
córtex, que confere volume à peça;
3. caso ocorra associação de marcas de pigmento às áreas desgastadas
Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7 - 3 3 , set. 1997
30

pela maceração ou trituração, este pode ser representado pelo acréscimo


de cor cinza média, para o destaque da área, como ilustrado na figura 30.

Figura 30 Figura 31
c) Marcas de Polimento Causadas pelo Uso: Fragmentos naturais
de matérias-primas de superfície áspera podem ser utilizados como
superfície abrasiva. A pressão difusa exercida sobre estas causa a formação
de áreas mais regulares, onde observa-se marcas passivas de polimento.
A representação gráfica deste fenômeno utiliza as seguintes
convenções:
1. Delimitação por traço médio da área que apresenta o polimento
passivo;
2. preenchimento desta área por reticulado, sobreposto ao padrão
pontilhado que marca a presença de córtex e dá volume à peça;
3. cobertura da área desgastada por o tom de cinza claro, de acordo
com os critérios sugeridos por Hameister e Saldanha (1997b).

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31

c
0 0,5 1 2 cm

Figura 32 h -y — i

VI Considerações Finais
A plena implementação dessa proposta depende de um processo de
artefinalização adequado, podendo ser empregadas técnicas manuais ou
recursos da informática. Para a confecção das ilustrações aqui apresentadas,
após a digitalização das imagens brutas, realizou-se o tratamento destas
com a utilização dos programas IPHOTOPLUS e ADOBE PHOTOSHOP
3.0 e 4.0.
Há ainda uma decorrência da utilização desses recursos ao longo
deste processo: a elaboração, por parte da equipe responsável por este
projeto, de um banco de imagens de representação de fenômenos, tais
como padrões de ondas de força, córtex e alterações de superfície, entre
outros. O desenvolvimento desse trabalho permitirá, futuramente, a
composição de representação de vistas dos artefatos com excelente
qualidade gráfica por pesquisadores sem as habilidades manuais de um
bom desenhista.
Também desenvolve-se no NUPArq-UFRGS um projeto que visa
estender as propostas aqui apresentadas, com a devida adaptação a outras
categorias de artefatos arqueológicos como o cerâmico.

Rev. do CEPA, Santa Cruz do Sul, v.21, n.26, p. 7 -3 3 , set. 1997


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VII Referências Bibliográficas
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HAMEISTER, M., SALDANHA, J. D. M. Representação Gráfica do
Artefato Lítico do Sítio RS-S-358: Toca Grande - Uma Proposta de
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