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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RECÔNCAVO DA BAHIA

CENTRO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES


LICENCIATURA EM LETRAS LIBRAS/LÍNGUA ESTRANGEIRA

Elomar Figueira Mello: uma voz dissonante


na construção da identidade baiana

Discente: Helenoildes M. de Souza


Orientador: Prof. Me. Tarcísio Cordeiro

Amargosa - BA
2016
O MENESTREL DA CAATINGA
APRESENTAÇÃO

A presente pesquisa propõe discutir as relações de poder na


representação da baianidade e suas consequências, no âmbito do
apagamento ou silenciamento de outras vozes que não fazem parte
dos referentes consolidados como pertencentes à identidade
baiana. Deste modo, através da poética do compositor do sertão
baiano, Elomar Figueira Mello, refletiremos sobre como a sua voz
é dissonante dos referentes simbólicos e culturais da Bahia
litorânea.
Das Barrancas do Rio Gavião (1972) Na quadrada das águas perdidas (1978)

ConSertão (1982) Dos Confins do Sertão (1986)


OBJETIVO PRINCIPAL

Nesta pesquisa analisaremos como a voz de Elomar Figueira


Mello é diferente do discurso hegemônico de baianidade e,
também, as relações de poder na escolha dos símbolos da
identidade baiana.
OBJETIVOS SECUNDÁRIOS

➢ Refletir como a ideia da baianidade dá-se por uma seleção de


imagens que silenciam o espaço/tempo do sertão baiano;
➢ Perceber a importância dos discursos midiáticos e artísticos na
construção de uma identidade baiana;
➢ Analisar como a arte de Elomar é subversiva aos valores da
indústria cultural e ao discurso hegemônico de baianidade;
QUESTÃO PROBLEMA

O discurso de baianidade consolidado sócio-historicamente pela


mídia televisiva e também através de manifestações artísticas, tem
uma repercussão muito grande na contemporaneidade. Visto que,
os estereótipos positivos sobre a Bahia, com fins mercadológicos,
silenciaram vozes que não fazem parte desta coletividade. Neste
sentido, através da arte de Elomar Figueira Mello, questiona-se:
de que forma a arte elomariana está no contra-discurso da
referência hegemônica da baianidade?
JUSTIFICATIVA

Mediante os discursos de identidade baiana apresentados de forma


unívoca, esta pesquisa intenta contribuir com a problematização
das representações culturais da capital do estado em detrimento da
ruralidade. Além disso, pela necessidade de dessilenciar o espaço
e a arte sertaneja, produzindo, assim, uma identidade baiana
diferente da que é consolidada pelo discurso hegemônico. E, por
fim, contribuir para a visibilidade das canções de Elomar Figueira
Mello em uma perspectiva identitária.
1 INTRODUÇÃO
2 IDENTIDADE E ALTERIDADE NA CONTEMPORANEIDADE
➢ Identidade e contemporaneidade;
➢ Poder simbólico;
➢ Os estereótipos produzidos sobre o sertanejo/nordestino

2.1 NARCISO ACHA FEIO O QUE NÃO É ESPELHO: DILEMAS DO


MULTICULTURALISMO
➢ Como a identidade vê a alteridade?

2.2 O QUE É QUE A BAHIA TEM?


➢ Endógena
➢ Exógena

2.3 VOCÊ JÁ FOI À BAHIA, NÊGA? NÃO? ENTÃO, VÁ!



O papel da mídia e da arte na formação da baianidade

2.4 TRISTE BAHIA! Ó, QUÃO DESSEMELHANTE!


➢ O descompasso sócio-cultural da Bahia;

2.5 OUTRAS BAHIAS, EU CANTO UM OUTRO CANTO


➢ A Bahia que elomar figueira representa
➢ A arte subversão elomariana
3 ELOMAR FIGUEIRA MELLO:
A RESSIGNIFICAÇÃO DO
SERTÃO
CAMPO BRANCO
Campo branco minhas penas que pena secô vô ter relampo e truvão
todo o bem qui nóis tinha era a chuva era o amô minh’alma vai florescê
num tem nada não nóis dois vai penano assim Quando a amada e esperada trovoada chegá
Campo lindo ai qui tempo ruim iantes da quadra as marrã vão tê
tu sem chuva e a tristeza em mim
sei qui inda vô vê marrã parí sem querê
Peço a Deus a meu Deus grande Deus
amanhã no amanhecê
de Abraão
tardã mais sei qui vô tê
pra arrancar as pena do meu coração
dessa terra seca in ança e aflição
meu dia inda vai nascê

todo bem é de Deus qui vem E esse tempo da vinda ta perto de vim
quem tem bem lôva a Deus seu bem sete casca aruera contaram pra mim
quem não tem pede a Deus qui vem tatarena vai rodá vai botá fulô
Pelas sombra do vale do ri Gavião marela de u’a veis só
os rebanhos esperam a trovoada chovê pra ela de u’a veis só
num tem nada não também no meu coração
CAMPO BRANCO
Campo branco minhas penas que pena secô vô ter relampo e truvão
todo o bem qui nóis tinha era a chuva era o amô minh’alma vai florescê
num tem nada não nóis dois vai penano assim Quando a amada e esperada trovoada chegá
Campo lindo ai qui tempo ruim iantes da quadra as marrã vão tê
tu sem chuva e a tristeza em mim
sei qui inda vô vê marrã parí sem querê
Peço a Deus a meu Deus grande Deus
amanhã no amanhecê
de Abraão
tardã mais sei qui vô tê
pra arrancar as pena do meu coração
dessa terra seca in ança e aflição
meu dia inda vai nascê

todo bem é de Deus qui vem E esse tempo da vinda ta perto de vim
quem tem bem lôva a Deus seu bem sete casca aruera contaram pra mim
quem não tem pede a Deus qui vem tatarena vai rodá vai botá fulô
Pelas sombra do vale do ri Gavião marela de u’a veis só
os rebanhos esperam a trovoada chovê pra ela de u’a veis só
num tem nada não também no meu coração
CURVAS DO RIO
Vô corrê trecho Te dexo/ê/ intregue nas guarda de Deus
Vô percurá ũ’a terra preu podê trabaiá Nocença ai sôdade viu
Pra vê se dexo/ê/ Pai volta pras curva do rio
Essa minha pobre terra véia discansá
Ah mais cê veja
Foi na Monarca a primera derrubada
Num me resta mais creto pra um furnicimento
Derna d’intão é sol é fogo é tai d’inxada
Só eu caino
Me ispera, assunta bem
Inté a boca das água qui vem Nas mão do véi Brolino mermo a deis pur
cento
Num chora conforma mulé
É duro moço ritirá pro trecho alei
Eu volto se assim Deus quisé
Tá um aperto
C’ua pele no osso e as alma nos bolso do véi

Mais qui tempão de Deus no sertão catinguero Me ispera, assunta viu


Vô dá um fora Sô imbuzero das bera do rio
Só dano um pulo agora in Son Palo Triang’ Minero Conforma num chora mulé
É duro moço esse mosquero na cũzĩa Eu volto se assim Deus quisé
A corda pura e a cuia sem um grão de farinha Num dexa/ê/ o rancho vazio
A bença Afiloteus
Eu volto pras curva do rio
CURVAS DO RIO
Vô corrê trecho Te dexo/ê/ intregue nas guarda de Deus
Vô percurá ũ’a terra preu podê trabaiá Nocença ai sôdade viu
Pra vê se dexo/ê/ Pai volta pras curva do rio
Essa minha pobre terra véia discansá
Ah mais cê veja
Foi na Monarca a primera derrubada
Num me resta mais creto pra um furnicimento
Derna d’intão é sol é fogo é tai d’inxada
Só eu caino
Me ispera, assunta bem
Inté a boca das água qui vem Nas mão do véi Brolino mermo a deis pur
cento
Num chora conforma mulé
É duro moço ritirá pro trecho alei
Eu volto se assim Deus quisé
Tá um aperto
C’ua pele no osso e as alma nos bolso do véi

Mais qui tempão de Deus no sertão catinguero Me ispera, assunta viu


Vô dá um fora Sô imbuzero das bera do rio
Só dano um pulo agora in Son Palo Triang’ Minero Conforma num chora mulé
É duro moço esse mosquero na cũzĩa Eu volto se assim Deus quisé
A corda pura e a cuia sem um grão de farinha Num dexa/ê/ o rancho vazio
A bença Afiloteus
Eu volto pras curva do rio
CANÇÃO DA CATINGUEIRA
Maria, minha Maria se ouvires a canção
Não faça assim comigo não
se do fundo das águas
Olhe que as chuvas de janeiro
ouvires a canção
ainda não caíram no chão
Não tenhas minha amada
Olhe que as chuvas de janeiro
ainda não caíram no chão/ temeroso coração
Maria, minha Maria pois são saudades
Não faça assim comigo não são minhas mágoas
Olhe que as flores do umbuzeiro que contigo também vão
ainda não caíram no chão Maria, minha Maria
Olhe que as flores do umbuzeiro
Não vá se embora ainda não
ainda não caíram no chão/
Esqueça o xale, esqueça a rede
Maria, minha Maria
esqueça até o meu coração
Meu ainjo de pés nos chão
Quando tu fores pela estrada mas não te esqueças oh Maria
desse nosso pedaço de chão
CANÇÃO DA CATINGUEIRA
Maria, minha Maria se ouvires a canção
Não faça assim comigo não
se do fundo das águas
Olhe que as chuvas de janeiro
ouvires a canção
ainda não caíram no chão
Não tenhas minha amada
Olhe que as chuvas de janeiro
ainda não caíram no chão/ temeroso coração
Maria, minha Maria pois são saudades
Não faça assim comigo não são minhas mágoas
Olhe que as flores do umbuzeiro que contigo também vão
ainda não caíram no chão Maria, minha Maria
Olhe que as flores do umbuzeiro
Não vá se embora ainda não
ainda não caíram no chão/
Esqueça o xale, esqueça a rede
Maria, minha Maria
esqueça até o meu coração
Meu ainjo de pés nos chão
Quando tu fores pela estrada mas não te esqueças oh Maria
desse nosso pedaço de chão
FUNÇÃO
Vem Juão, vamos meu bichin cantá o moirão
Vem Juão
tem um bicho roeno o meu coração
trais as viola siguro na mão
cuano eu era minino a vida era manera
pega a mandureba atiça os tição
não pensava na vida junto da foguera
carrega pru terrero os banco e as cadera
e chama as minina pra rodá o baião brincano cun’s irmão a noite intera/ê/

Nós dois sentado junto da foguera sem me dá qui esse tempo bom

vamos fazê a nossa brincadera e cantá havera/é/ de passá

a lijera moda de lovação e a saudade me chegá essa fera/é/

em homenage ao nosso São João quem pensá qui esse bicho é da cidade

e pra acabá cum a saudade matadera s’ingana a saudade nasceu cá no Sertão


você canta lijera, canto moirão na beira da foguera de São João
você canta lijera, canto moirão na beira de uma foguera de São João
ai meu São João, lá das aligria ai meu São João, lá das aligria
ai meu São João, lá das aligria ai meu São João, lá das aligria
a saudade cada dia mais me dói no coração a saudade cada dia mais me dói no coração
FUNÇÃO
Vem Juão, vamos meu bichin cantá o moirão
Vem Juão
tem um bicho roeno o meu coração
trais as viola siguro na mão
cuano eu era minino a vida era manera
pega a mandureba atiça os tição
não pensava na vida junto da foguera
carrega pru terrero os banco e as cadera
e chama as minina pra rodá o baião brincano cun’s irmão a noite intera/ê/

Nós dois sentado junto da foguera sem me dá qui esse tempo bom

vamos fazê a nossa brincadera e cantá havera/é/ de passá

a lijera moda de lovação e a saudade me chegá essa fera/é/

em homenage ao nosso São João quem pensá qui esse bicho é da cidade

e pra acabá cum a saudade matadera s’ingana a saudade nasceu cá no Sertão


você canta lijera, canto moirão na beira da foguera de São João
você canta lijera, canto moirão na beira de uma foguera de São João
ai meu São João, lá das aligria ai meu São João, lá das aligria
ai meu São João, lá das aligria ai meu São João, lá das aligria
a saudade cada dia mais me dói no coração a saudade cada dia mais me dói no coração
4 O LOCAL E O UNIVERSAL NA
POÉTICA ELOMARIANA
➢ Anulação simbólica das representações hegemônicas da
baianidade;
➢ Uma voz que representa a cultura marginal;
➢ O regional como circunstância para problematizar o universal;
➢ A linguagem poética potencializa a existência e coexistência do
viver “sertanez”.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa mostra que o discurso ideológico construído acerca da


baianidade silencia/silenciou outras culturas presentes no nosso território
baiano. Assim, o artista Elomar se configura dissonante da baianidade,
primeiramente por ser porta-voz de uma cultura marginal: o sertão baiano. E,
também, por não se render aos ditames da lógica da indústria cultural. A
identidade baiana representada por Elomar não atrai o interesse da indústria
cultural, pois representa a Bahia esquecida, também vista como sinônimo de
atraso, a qual o estado não deseja dar visibilidade. Assim, embora os referentes
simbólicos identitários de baianidade não comportem o modo de vida do sertão
baiano, este trabalho sintetiza a beleza poética da identidade sertaneja,
conferindo, então, à arte de Elomar um lugar reservado aos grandes artistas
que, através do contra-discurso hegemônico, inscrevem outras baianidades.
REFERÊNCIAS
LBERGARIA, Roberto. O que é identidade cultural. Disponível em: < http://www.sbpccultu-ral.ufba.br/identid/semana1/alberga.html>.
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Cultrix, 2007.
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