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MARY K A L A N T Z I S A N D B I L L C O P E

EDUCAÇÃO LINGUÍSTICA E MULTILETRAMENTOS 1

INTRODUÇÃO: DESENVOLVIMENTO INICIAL DO CONCEITO DE


MULTILETRAMENTOS

Em setembro de 1994, o Centro de Comunicação e Cultura do


Trabalho na Universidade James Cook de North Queensland, na
Austrália, iniciou um projeto internacional para considerar o futuro do
ensino do letramento: o que precisaria ser ensinado em um futuro
próximo, que se encontra em rápida mudança e como seria ensinado.
O Centro convidou alguns dos líderes mundiais no campo da pedagogia
do letramento para se reunirem por uma semana na pequena cidade
de New London, New Hampshire, EUA, a fim de considerar o estado da
arte. Naquele momento, observaram-se múltiplas ironias na própria
ideia de New London. No final do século XX, um bilhão de pessoas
falava inglês, aquela pequena língua diferente, que há quatro séculos
antes era falada por apenas cerca de um milhão de pessoas nas
vizinhanças de Londres, a velha Londres. A história da língua e a história
dos últimos séculos, incluindo suas muitas injustiças, é a história de
muitos novos londrinos.
Essa questão - como a língua se encontra com a diversidade
cultural e linguística - foi uma das nossas principais preocupações.
Depois, houve a ironia da serenidade dos cartões postais daquela Nova

1
Essa tradução tem caráter não poderá circular fora da sala de aula.
2

Londres em particular, uma vila pós-industrial que vendia pouco mais


do que sua idílica imagem de cartão-postal do século XVIII. Isso, em um
mundo, onde a missão fundamental dos educadores é melhorar as
oportunidades educacionais de todas as crianças - um mundo que, na
maior parte do tempo, está longe de ser idílico. Isso parecia um lugar
estranho para se fazer algumas das perguntas mais difíceis que agora
enfrentamos como educadores. O que é uma educação apropriada
para as mulheres, para os povos indígenas, para os imigrantes que não
falam a língua nacional (cf. Maio, Educação Linguística, Pluralismo e
Cidadania, Volume 1), e para os falantes de dialetos não-padrão? O que
é apropriado para todos, no contexto, cada vez mais críticos, dos
fatores de diversidade local e de conectividade global (cf. Block,
Language Education and Globalization, Volume 1)? À medida que os
educadores tentavam abordar a difícil questão da diversidade cultural
e linguística, ouvíamos afirmações e contestações estridentes sobre o
cânone da grande literatura, gramática e back-to-basics 2. Esses
debates pareciam muito distantes das colinas tranquilas de um turista
de New Hampshire.
Dez pessoas se conheceram e conversaram naquela semana em
New London. Courtney Cazden, dos EUA, passou uma carreira longa e
altamente influente trabalhando no discurso da sala de aula (Cazden,
1988, 2001), aprendizagem de línguas em contextos multilíngues
(Cazden, 1989) e na pedagogia do letramento (Cazden, 1983). Bill Cope,
da Austrália, escreveu currículos abordando a diversidade cultural nas
escolas (Kalantzis e Cope, 1989) e pesquisou a pedagogia do
letramento (Cope e Kalantzis, 1993) e as culturas e discursos em

2
Em tradução livre, retorno aos fundamentos básicos de aprendizagem.
3

mudança dos locais de trabalho (Cope e Kalantzis, 1997a). Da Grã-


Bretanha, Norman Fairclough era um teórico da linguagem e do
significado social, e estava particularmente interessado na mudança
linguística e discursiva como parte da mudança social e cultural
(Fairclough, 1989, 1992). James Gee, dos EUA, foi um dos principais
pesquisadores e teóricos sobre linguagem e mente (Gee, 1992, 1996) e
sobre as demandas linguísticas e de aprendizado dos mais recentes
locais de trabalho capitalistas rápidos 3 (Gee, Hull e Lankshear, 1996).
Mary Kalantzis, uma australiana, esteve envolvida em projetos
experimentais de educação social e letramento (Cope e Kalantzis,
1993), e estava particularmente interessada em educação multicultural
e em cidadania (Kalantzis e Cope, 1999; Kalantzis, Kope, Noble e
Poynting, 1991; Kalantzis, Cope e Slade, 1989). Gunther Kress, da Grã-
Bretanha, era mais conhecido por seu trabalho em linguagem e
aprendizado, semiótica (Kress, 1990), letramento visual (Kress e van
Leeuwen, 1996) e as letramentos multimodais, que são, cada vez mais
importantes para toda a comunicação, particularmente a comunicação
de massa. Allan Luke, da Austrália, foi um pesquisador e teórico do
letramento crítica que trouxe a análise sociológica para o ensino da
leitura e da escrita (Luke, 1991, 1992a, 1993).
Carmen Luke, também da Austrália, escreveu extensivamente
sobre pedagogia feminista (Luke, 1992b, 1994). Sarah Michaels, dos
EUA, tem uma vasta experiência no desenvolvimento e pesquisa de
programas de aprendizagem em sala de aula em ambientes urbanos
(Michaels, 1986; Michaels, O'Conner e Richards, 1993). Martin Nakata,
um australiano, pesquisou e escreveu sobre a questão do letramento

3
Tradução livre de “fast capitalista”
4

em comunidades indígenas (Nakata, 1993). Nosso propósito para o


encontro era engajar-nos na questão do que fazer na pedagogia do
letramento com base em nossas diferentes experiências nacionais e
culturais e com base em nossas diferentes áreas de especialização. O
foco era o quadro geral, a perda da hegemonia da palavra e as novas
demandas que tornam as pessoas produtoras de significado - na
mudança de locais de trabalho; como cidadãos, na mudança dos
espaços públicos e na mudança de dimensões de nossas vidas
comunitárias, nossas vivências 4.
Decidimos que os resultados das discussões em New London
poderiam ser resumidos em uma única palavra: Multilitetramentos -
uma palavra que criamos para descrever dois importantes argumentos
que podem surgir com a emergente ordem cultural, institucional e
global. O primeiro foi a crescente significação da diversidade cultural e
linguística (S.F. May, Language Education, Pluralism and Citizenship,
Volume1). As notícias nos nossos canais de televisão gritam essa
mensagem diariamente. E, em termos mais construtivos, temos de
negociar diferenças todos os dias, em nossas comunidades locais e em
nossa, cada vez mais global, vida profissional e comunitária (Sf.
também Block, Language Education and Globalization, volume 1).
Como consequência, algo paradoxal estava acontecendo com o inglês.
Ao mesmo tempo em que se tornava uma língua mundial e uma língua
franca, uma língua comum do comércio global, midiática e política, o
inglês também estava se proliferando em múltiplos e cada vez mais
diferentes ingleses, marcados pelo sotaque nacional de origem, estilo
subcultural e comunidades profissionais ou técnicas. Cada vez mais, o

4
Traduziremos a palavra Lifeword por vivência.
5

principal desafio comunicativo era poder atravessar fronteiras


linguísticas, mesmo dentro do inglês.
Já se foram os dias em que aprender unicamente a variante
padrão da língua era suficiente. A migração, o multiculturalismo e a
integração econômica global diariamente intensificaram esse processo
de mudança. A globalização das comunicações e dos mercados de
trabalho tornou a diversidade linguística uma questão local cada vez
mais crítica. A segunda grande mudança englobada no conceito de
Multilitetramentos foi a influência das novas tecnologias de
comunicação. O significado foi sendo, cada vez mais, construído de
maneira multimodal, de modo que os significados são construídos e
expressos em combinatória entre o modo verbal escrito e os modos
visuais, auditivos e espaciais. O New London Group considerou as
formas multimodais em que os significados são feitos em lugares como
a (então muito nova) World Wide Web, ou em legendagem de vídeo,
ou em multimídia interativa, ou em editoração eletrônica, ou no uso de
textos escritos em um shopping center. Para terminar o nosso caminho
em torno deste mundo emergente de significado, exigiu um novo
letramento multimodal. Esses dois desenvolvimentos, concluiu o
grupo, tinham o potencial de transformar tanto a substância quanto a
pedagogia do letramento do inglês e em outras línguas do mundo.
As antigas pedagogias de uma língua nacional formal,
padronizada e escrita, não tinham mais o uso que já tiveram. Em vez
disso, o argumento dos Multiletramentos sugeriu uma gramática
funcional aberta e flexível que ajuda os alunos de línguas a descrever
as diferenças linguísticas (culturais, subculturais, regionais / nacionais,
técnicas, específicas do contexto, etc.) e os canais multimodais de
6

significado agora tão importantes para a comunicação. O resultado da


reunião de New London foi um trabalho de autoria conjunta -
decidimos nos chamar de New London Group - que foi publicado mais
tarde na edição de primavera de 1996 da Harvard Educational Review:
Uma Pedagogia dos Multiletramentos: Projetando Futuros Sociais
(New London Group, 1996), e posteriormente, um livro, Multiliteracies:
Literacy Learning e Design of Social Futures publicado na Austrália pela
Macmillan e no Reino Unido e América do Norte pela Routledge em
2000 (Cope and Kalantzis, 2000). Na medida em que a ideia foi longe,
na década seguinte, uma pesquisa do Google em 2007 retornou 140
mil páginas da web que mencionavam a palavra multiletramentos.

PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES: MUDANDO A SOCIEDADE E


MUDANDO OS LETRAMENTOS

A mudança dos mundos sociais do trabalho, cidadania e


identidades requer uma nova resposta educacional. Essa foi a principal
proposta subjacente à agenda dos Multiletramentos desde o início.
Para entender o mundo do trabalho, as imagens do velho mundo do
trabalho são familiares - as fábricas com chaminés perfurando o
horizonte que costumávamos ver como sinais de progresso. Atrás dos
muros da fábrica estava a planta pesada que se somava aos ativos fixos
do capitalismo industrial. Voltados para a produção em massa de longo
prazo de produtos manufaturados, os seres humanos se tornaram
meros apêndices da máquina. De fato, a lógica da linha de produção
minimizava os requisitos de habilidade humana, pois as tarefas eram
7

divididas em funções cada vez menores - apertando esse parafuso


específico no objeto fabricado à medida que passava pela esteira
rolante. Esta foi a degradação humana da fábrica moderna. Também
foi seu gênio, organizar a tecnologia de modo a ser capaz de fabricar
itens de sofisticação tecnológica sem precedentes (como o aparelho de
rádio de Marconi ou o carro de Henry Ford), usando uma força de
trabalho não qualificada (Cope e Kalantzis, 1997a).
Sistemas educacionais antigos se encaixavam perfeitamente
nesse mundo de trabalho. O estado determinou o plano de estudos, os
livros didáticos seguiram o plano de estudos, os professores seguiram
os livros didáticos e os alunos seguiram os livros didáticos,
esperançosamente, para passar nos testes. Henry Ford sabia o que era
melhor para seus clientes - qualquer cor que você goste, desde que seja
preto - e o estado sabia o que era melhor para as crianças. E, de certo
modo, os professores tornaram-se um pouco como orkers 5 de linha de
produção, escravos do plano de estudos, os livros didáticos e o sistema
de exame (cf. Wiley, Language Policy e Teacher Education, Volume 1).
O currículo estava repleto de informações na forma de fatos bem
definidos - fatos sobre a história, fatos sobre ciência e fatos da
linguagem na forma de gramática correta e correção
ortográfica. Juntos, isso deveria se somar ao conhecimento útil para a
vida. Muitos desses fatos provaram ser menos duráveis do que o
currículo daquele período que parecia promissor. No entanto, houve
uma lição importante que os bons alunos levaram para o antigo local
de trabalho. Todos sentados eretos e ouvindo o professor, toda a rígida
disciplina de sala de aula, todo o conhecimento transmitido a eles e

5
N. t.: Refere-se a divindades mitológicas germânicas.
8

engolidos acriticamente, aprenderam a aceitar a autoridade recebida e


a fazer exatamente o que lhes era dito (Kalantzis e Cope, 2001a).
Os conceitos básicos da aprendizagem antiga foram
encapsulados nos três Rs 6 - leitura, escrita e aritmética. O processo era
aprendido mecanicamente e conhecendo as respostas corretas. A
Disciplina era também demonstrada em testes, como a aquisição bem-
sucedida de fatos recebidos e a regurgitação de verdades rigidamente
definidas. Esse tipo de educação certamente produziu pessoas que
aprenderam coisas, as quais eram, entretanto, muitas vezes, estreitas,
descontextualizadas, abstratas e fragmentadas em áreas de estudo
criadas artificialmente pelo sistema educacional. Mais do que tudo,
como já se viu, produziu alunos complacentes, pessoas que aceitariam
o que lhes fosse apresentado como correto, e que, passivamente,
aprendiam de cor o conhecimento que não poderia ser facilmente
aplicado em diferentes e novos contextos. Eles podem ter sido
superficialmente conhecedores (declinações latinas, ou a gramática
das orações adverbiais, ou os rios da geografia nacional, ou as datas da
história europeia), mas eles não tinham conhecimento com
profundidade suficiente para uma vida de mudança e de diversidade.
Foi um conhecimento apropriado para um tempo que se imaginou
ordenado e controlável (Cope e Kalantzis, 1993). Se a imagem
predominante da velha economia era a fábrica e a chaminé, a imagem
da chamada nova economia é o trabalhador sentado em frente a uma
tela de computador. As tecnologias de informação e comunicação
dominam essa economia do conhecimento. Na verdade, apesar do
entusiasmo, não vivemos apenas do conhecimento, como se a

6
“reading, writing and arithmetic”
9

economia tivesse abandonado de repente as coisas para o comércio de


informações e símbolos. Nós não podemos viver apenas de símbolos.
Mas os símbolos estão, no entanto, em todo lugar. Eles estão no centro
das novas tecnologias e, especialmente, das tecnologias de
convergência digital - nas áreas de comunicações, manufatura
automatizada, comércio eletrônico e mídia. Mesmo no setor
manufatureiro, onde as pessoas ainda fazem as coisas energicamente,
elas agora as utilizam usando interfaces baseadas em telas, e estas são
linguisticamente, visualmente e simbolicamente dirigidas. A linha de
produção ainda está lá, mas agora os robôs estão apertando os
parafusos. Essas tecnologias, além disso, estão mudando
constantemente.
As novas tecnologias são mais intensivas em software do que
em hardware, além de flexíveis e abertas a múltiplos usos. As
substituições de software são feitas com maior frequência do que no
caso da substituição de plantas na economia antiga. Isso significa que
o conhecimento técnico tem uma vida útil mais curta, portanto, a
requalificação precisa ocorrer continuamente. Na verdade, ao
contrário do processo de desqualificação da velha economia, a pessoa
precisa ser multiqualificada, ser mais flexível, mais capaz de realizar
uma série de tarefas, e ainda ser capaz de mudar de uma tarefa para
outra, conforme necessário. A principal vantagem competitiva de uma
organização, até mesmo o valor dessa organização, não se baseia mais
no valor de seus ativos fixos e fábrica, ou, pelo menos, não apenas
nisso, mas nas habilidades e no conhecimento de sua força de trabalho.
De fato, a tecnologia agora é muito mais uma relação entre as
ferramentas e o conhecimento dessas ferramentas interiorizado pelo
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usuário. A riqueza tem, cada vez mais, uma base de habilidades


humanas e não de capital fixo.
Enquanto isso, a diversidade está em toda parte na organização
da nova economia, e trabalhar com a cultura de fato significa trabalhar
com a diversidade. Em vez da afirmação de Henry Ford, em que as
necessidades individuais dos clientes são irrelevantes porque os
clientes são todos iguais, as organizações agora querem estar próximas
dos clientes, o que realmente querem é atender às suas necessidades
de uma maneira que funcione para elas. Levar o atendimento ao cliente
a sério inevitavelmente significa descobrir que as pessoas são
diferentes, de acordo com várias combinações de idade, origem étnica,
localização geográfica, orientação sexual, interesse, moda, modismo
ou fetiche. Servir nichos de mercado, isso se denomina assim; e
sistemas de customização em massa são criados no ponto em que high
tech atende ao soft touch - como os sistemas de e-commerce ou
procedimentos de registro de hotéis que constroem o perfil de um
cliente e suas necessidades e interesses específicos.
Então, há a diversidade dentro da organização. As equipes
trabalham com altos níveis de contato interpessoal e trabalham
melhor, não quando os membros são forçados a compartilhar os
mesmos valores, mas quando diferenças - de interesse, associação,
rede, conhecimento, experiência, estilo de vida e idiomas falados - são
respeitadas e usadas como uma fonte de criatividade, ou como um link
para a miríade de nichos no mundo em que a organização tem que
operar. Esse mundo de diversidade existe tanto no nível local de
sociedades cada vez mais multiculturais, quanto no nível global, onde
mercados, produtos e organizações distantes e diferentes tornam-se,
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em um sentido prático, cada vez mais próximos (Cope e Kalantzis,


1997a). Estamos no meio de uma revolução tecnológica, que, além
disso, não apenas muda nossa maneira de trabalhar, mas também a
maneira como participamos como cidadãos. Do velho mundo da
radiodifusão ao novo mundo de narrowcasting, considere o que
aconteceu com uma das mídias, a televisão. Em vez das pressões para
conformidade, pressões para moldar sua pessoa à imagem dos meios
de comunicação de massa, quando todos assistiram às antigas redes
nacionais, agora temos centenas de canais na televisão a cabo ou via
satélite. Esses canais atendem não ao público em geral, mas a
comunidades cada vez mais definidas: os serviços em diferentes
idiomas, os interesses esportivos específicos, os gêneros
cinematográficos. Além disso, estamos assistindo à TV on-demand
transmitida pela Internet.
Na verdade, para aproveitar a internet de hoje, os milhões de
sites refletem qualquer interesse ou estilo que você queira nomear,
alimentando uma miríade de comunidades cada vez mais
diferenciadas. Depois, há o fenômeno dos feeds de pointcasting ou
syndication, onde o usuário personaliza o feed de informações que
deseja - solicitando que as informações sejam transmitidas para eles
apenas sobre uma equipe esportiva em particular, um setor de
negócios específico, um país de origem específico. Como parte desse
processo, o espectador se torna um usuário; é substituído pela
seletividade do usuário e, em vez de sermos receptores passivos da
cultura de massa, nos tornamos criadores ativos de informações e
sensibilidades que se ajustam precisamente às nuances de quem
somos e da imagem na qual queremos nos moldar. De fato, a
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convergência digital transforma toda a relação de mídia em outra


direção - a imagem digital de um bebê que pode ser transmitida para o
mundo pela internet ou o filme digital que você pode editar no
computador, gravar em um CD ou transmitir da sua página inicial ou do
YouTube. Há simplesmente mais espaço para ser você mesmo nesse
ambiente de tecnologia e para ser você mesmo de uma maneira
diferente. A convergência tecnológica vem com a divergência cultural,
e quem sabe qual é a maior influência no desenvolvimento um do
outro? A única coisa que fica clara é que a tecnologia é uma das chaves
para esses novos tipos de autoexpressão e construção da comunidade.
Faz parte de um processo de criação de novas pessoas - pessoas de
identidade própria, em vez de identidade recebida e identidades
diversas, em vez de uma identidade nacional singular. Nesse contexto,
os sentidos de pertencer surgirão de um compromisso comum com a
abertura e inclusão.
Assim, o que todas essas mudanças em tecnologia, trabalho e
comunidade significam para a educação? A essência do básico 7 antigo
foi encapsulada simplesmente nas áreas de assunto dos três Rs: leitura,
escrita e aritmética. Na verdade, a própria ideia do básico indicava algo
sobre a natureza do conhecimento: era um tipo de lista de coisas a
serem conhecidas – por meio de treino das tabuadas, memorização de
listas ortográficas, aprendizado das partes do discurso e correção da
gramática. Isso não quer dizer que a multiplicação ou a compreensão
dos processos de comunicação escrita não tenham mais valor
educacional - eles o fazem, mas de uma forma pedagógica diferente. O
problema era com a antiga orientação para o conhecimento: primeiro,

7
Básico, aqui, é que o aluno deveria aprender a ler, escrever e fazer conta.
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a suposição de que esse tipo de conhecimento era uma base suficiente;


segundo, esse conhecimento envolvia claramente respostas certas e
erradas (e se você tivesse alguma dúvida sobre isso, os resultados do
teste o deixariam certo); e terceiro, esse conhecimento era sobre ser
contado pela autoridade e que era melhor aceitar a exatidão da
autoridade passivamente. Se a lição subjacente dos princípios antigos
era sobre a natureza do conhecimento, então é uma lição menos
apropriada em um mundo que valoriza a criatividade, a resolução de
problemas e a contribuição ativa de cada pessoa em um ambiente de
trabalho ou comunidade.
As palavras contemporâneas mais extravagantes para esses
velhos básicos são letramento e numeramento. E, claro, a matemática,
a leitura e a escrita são hoje tão importantes quanto antes, talvez até
mais importantes. No entanto, letramento e numeramento podem ser
palavras substitutas para o antigo básico, ou podem significar algo
novo, algo apropriado para o novo aprendizado. Quando são meras
palavras substitutas para os velhos princípios, na maioria das vezes, não
são mais do que lamentações nostálgicas por um mundo que está
desaparecendo, ou, então, refletem nossa incapacidade, como adultos,
de imaginar qualquer coisa diferente ou melhor do que as nossas
próprias experiências como crianças na escola. Vamos voltar ao básico,
as pessoas dizem, e a palavra operacional é voltar.
Quando usamos o termo novos princípios, estamos sinalizando
uma abordagem do conhecimento muito diferente. A matemática não
é um conjunto de respostas corretas, mas um método de raciocínio,
uma maneira de descobrir um certo tipo de sistema e de estrutura no
mundo. Tampouco o letramento é uma questão de uso correto (a
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palavra e as regras de ortografia e de gramática ligadas à sentença).


Pelo contrário, é uma maneira de se comunicar. De fato, o novo
ambiente de comunicação é aquele em que as antigas regras de
letramento precisam ser suplementadas. Embora a ortografia continue
sendo importante, ela passa a ser agora algo para os programas de
verificação ortográfica; e mais, as mensagens de e-mail não precisam
ser gramaticais, em um sentido formal (embora eles tenham novas e
peculiares convenções que temos de aprender à medida que
avançamos - abreviaturas, informalidades amistosas e expressões
enigmáticas de entrada). E muitos textos envolvem relações complexas
entre visual, espaço e texto: as dezenas de milhares de palavras em um
supermercado; o texto escrito em torno da tela nos noticiários,
esportes ou programas de negócios na televisão; o texto de um caixa
eletrônico; sites construídos em ícones visuais e links ativos de
hipertexto; as sutis relações entre imagens e texto em revistas
impressas em papel brilhante de alta qualidade. Textos são agora
projetados em um sentido altamente visual, e o significado é carreado
tanto visualmente quanto verbalmente (Kalantzis e Cope, 2001a, 2004,
2005).
Isso significa que os antigos fundamentos que tentam, por
qualquer motivo, ensinar orações adverbiais de tempo ou mesmo os
casos em torno do verbo ser, faz com que seja preciso serem
suplementados a fim de que se aprenda sobre o design visual dos
textos (como fontes e tamanhos de pontos - apenas tipógrafos sabiam
no passado). Isso também significa que a antiga divisão disciplinar entre
língua e arte não é tão relevante quanto antes. O letramento também
não é mais apenas sobre o aprendizado chamado uso adequado. Em
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vez disso, é também sobre a miríade de diferentes usos em diferentes


contextos: um e-mail particular (pessoal, para um amigo), não pessoal
(candidatar-se a um emprego); um tipo particular de apresentação de
editoração eletrônica (um boletim de notícias para seu grupo de
esporte), com outra finalidade e público (uma página de propaganda);
e diferentes usos do inglês como língua global (em diferentes países de
língua inglesa, por falantes não nativos, por diferentes grupos
subculturais). As capacidades do letramento envolvem não apenas o
conhecimento de convenções gramaticais, mas também a
comunicação eficaz em diversos contextos, e o uso de ferramentas de
design de texto que podem incluir processamento de texto, editoração
eletrônica e manipulação de imagens.
Mais do que sobre novos conteúdos como esses, os novos
fundamentos são também sobre novos tipos de aprendizado.
Letramento, por exemplo, não é apenas sobre regras e sua aplicação
correta. Trata-se de se deparar com um tipo de texto desconhecido e
ser capaz de procurar pistas sobre o seu significado sem,
imediatamente se sentir alienado e excluído dele. Trata-se também de
entender como esse texto funciona para participar de seus sentidos
(suas próprias regras particulares) e sobre como elaborar o contexto e
os propósitos particulares do texto (assim, se encontrará mais pistas
sobre o significado do texto para o comunicador e para você).
Finalmente, letramento é sobre a comunicação ativa em um contexto
desconhecido e aprender com seus sucessos e erros. A educação
sempre forma tipos de pessoas. Os antigos fundamentos formavam:
pessoas que aprendiam as regras e as obedeciam; pessoas que
respondiam ao mundo em vez de considerar o mundo como muitos
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problemas a serem resolvidos; e pessoas que tinham incutidas em suas


cabeças certezas absolutas ao invés de serem alunos flexíveis e
colaborativos. Os novos fundamentos são claramente coisas que
definem novos tipos de pessoas, pessoas mais bem adaptadas ao tipo
de mundo em que vivemos agora e ao mundo do futuro próximo.

TRABALHO EM PROGRESSO: O SIGNIFICADO PROCESSO

A ideia de Multiletramentos aborda algumas das principais


dimensões da mudança em nosso ambiente de comunicações
contemporâneo. Assim, o letramento poderia ser entendido como o
ato de colocar palavras em frases nas páginas, e fazendo isso
corretamente, de acordo com o uso padrão da língua. Agora, os
letramentos, no plural, são inevitavelmente múltiplos, de duas formas
principais. O primeiro é o tipo de letramento em inglês no trabalho em
diversos contextos culturais, sociais ou profissionais. Por mais que o
inglês esteja se tornando uma língua global, essas diferenças estão se
tornando cada vez mais significativas para o nosso ambiente de
comunicação. A segunda é a natureza das novas tecnologias de
comunicação. O significado é produzido de maneira cada vez mais
multimodal – em que os modos de significado verbais escritos estão
em combinatórias com os modos visuais, auditivos, gestuais e espaciais
de significado. O ponto de partida para a estrutura dos
Multiletramentos é a noção de que conhecimento e significado são
histórica e socialmente localizados e produzidos, que são artefatos
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projetados. Mas, mais do que artefatos, o Design 8 é um processo


dinâmico, um processo de interesse e transformação subjetivos,
consistindo em: (i) O Designed (os recursos de produção de significado
disponíveis e os padrões e convenções de significado em um contexto
cultural particular); (ii) Designing (o processo de moldar o significado
emergente que envolve a reapresentação e a recontextualização - isso
nunca envolve uma simples repetição do Designed porque cada
momento de significado envolve a transformação dos Designs
disponíveis de significado); e (iii) o Redesigning (o resultado de projetar
algo através do qual o produtor de significado – projetista - refez e criou
um novo recurso de produção de significado - é nesse sentido que
somos verdadeiramente projetistas de nossos futuros sociais (Cope e
Kalantzis , 2000).
Dois aspectos principais da noção de Design o distinguem da
abordagem da questão das convenções linguísticas de ensino adotadas
por muitas tradições anteriores da pedagogia do letramento: variação
e agência. O ensino tradicional de gramática, por exemplo, ensinou
com vista a um único fim sociolinguístico: as formas oficial, padrão ou
superior da língua nacional (s.f. Tollefson, Planejamento de Linguagem
na Educação, Volume 1). A questão da variabilidade da língua mal fazia
parte do processo de ensino. E sempre intimamente ligada a essa
questão da variação está a questão da agência ou da subjetividade. As
experiências linguísticas que os alunos trouxeram para aprender
gramáticas tradicionais, por exemplo, eram desprezadas; o objetivo era
induzir os alunos à forma escrita padrão por meio de uma pedagogia

8
O sentido aqui é o de design de comunicação. Ver mais em
https://pt.wikipedia.org/wiki/Design_de_comunica%C3%A7%C3%A3o
18

da transmissão. A escola tratava da reprodução das formas culturais e


linguísticas recebidas. A noção de Design segue o caminho oposto em
ambas as frentes: o ponto de partida é a variação da linguagem - os
diferentes sotaques, registros e dialetos que servem a fins diferentes
em diferentes contextos sociais e para diferentes grupos sociais. E a
questão principal do uso da língua é a agência e a subjetividade - a
maneira pela qual todo ato da linguagem se baseia em recursos
linguísticos díspares e refaz o mundo de uma forma que nunca havia
sido adotada antes. A realidade da língua não é simplesmente a
reprodução de padrões e convenções regularizados. É também uma
questão de intertextualidade, hibridismo e língua como base da
mudança cultural. Nesse sentido, a língua é um recurso já projetado e
a base de projetos (designs) para futuros sociais.
Qual, então, é o escopo dos Designs de significado? Uma das
principais ideias pressupostas na noção de Multiletramentos é a
crescente complexidade e inter-relação entre diferentes modos de
significação, nos quais a língua é muitas vezes inseparavelmente
relacionada a outros modos de significação. Identificamos uma série de
áreas importantes nas quais gramáticas funcionalistas -
metalinguagens que descrevem e explicam padrões de significado - são
necessárias: Design Linguístico, Design Visual, Design de Áudio, Design
Gestual, Design Espacial e Design Multimodal, em que significados são
construídos na relação de diferentes modos de significação.
Particularmente, com o surgimento de novas tecnologias de
informação e comunicação, esses diferentes modos de significado
estão cada vez mais inter-relacionados - em e-mail, em editoração
eletrônica, em vídeo e em multimídia e em hipermídia. Isso significa
19

que o ensino do letramento tem que se mover bem para além de suas
antigas fronteiras disciplinares.
Como base para interpretar e produzir significado nesse
ambiente, podemos fazer as seguintes perguntas.
1. Representacional - a que os significados se referem?
2. Social - Como se relacionam os significados e as pessoas
envolvidas?
3. Organizacional - Como os significados estão coesos?
4. Contextual - Como os significados são negociados, ajustados
no mundo maior dos sentidos?
5. Ideológico – A quem interessam os significados produzidos?
As respostas a essas perguntas formam a base para uma
gramática funcional, para nomear o o quê da representação particular
de um significado particular em relação a seu porquê. Essas perguntas
não são a base para regras de uso correto que os alunos possam
aprender. Pelo contrário, são conceitos que podem ser usados em uma
linguística contrastiva educacionalmente utilizável. São ferramentas
que os alunos podem usar para avaliar as razões pelas quais escolhas
específicas de Design são feitas em contextos culturais e situacionais
específicos. Eles são, em outras palavras, uma heurística por meio da
qual os estudantes podem descrever e explicar as variações do Design
no mundo dos significados. O objetivo é dar aos alunos uma noção de
como os padrões de significado são produtos de diferentes contextos -
particularmente, nos contextos mutáveis criados pelas novas
tecnologias de comunicação e nos contextos diversos e interculturais
em que a linguagem é usada.
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PROBLEMAS E DIFICULDADES: ENSINANDO E APRENDENDO

Dessa forma, como a visão dos Multiletramentos em relação ao


ambiente de comunicação em mudança e sua concepção do processo
de significação se traduzem na pragmática da pedagogia? O modelo de
Multiletramentos propõe que o ensino e a aprendizagem sejam
abordados sob quatro ângulos, na perspectiva de quatro orientações.
Não há nada terrivelmente surpreendente em cada um desses quatro
ângulos; cada um está bem representado na história da teoria
educacional e nas práticas pedagógicas contemporâneas dos
professores. No entanto, todos os quatro precisam fazer parte do
processo de aprendizagem, embora não necessariamente em qualquer
sequência fixa particular ou como partes nitidamente separadas.
Ensinar e aprender sobre o Design do significado deve levar em
consideração três aspectos intercorrelacionados: Prática Situada,
Instrução Aberta, Enquadramento Crítico e Prática Transformada.
A Prática Situada envolve, de um lado, a imersão na
experiência; e, de outro, a utilização de Designs disponíveis, incluindo
tanto aqueles Designs advindo das vivências dos estudantes, como os
Designs de simulações das relações que se desenvolvem nos locais de
trabalho e nos espaços públicos. Por exemplo, essa prática poderia
envolver a imersão em Designs de significado que produzem sentido
intuitivo, senso comum ou, pelo menos, algo com algum sentido,
mesmo que vago. Em uma situação de aprendizado, isso pode envolver
tanto o trabalho com Designs derivados das próprias experiências
vivenciadas dos estudantes, ou, ao contrário, lança estes alunos ao
desconhecido, apresentando-lhes Designs com os quais terão menos
21

familiaridade, produzindo-lhes, provavelmente, no primeiro momento,


apenas sentido meio vago, mas lhes fornecendo muitas pistas
contextuais. Usando esse modelo pedagógico, o ensino e a
aprendizagem bem-sucedidos podem vir a culminar em resolução do
problema de comunicação, mesmo que seja de maneira intuitiva,
talvez; ou com a ajuda de um especialista e mesmo com suporte
didático.
A instrução explícita envolve compreensão sistemática,
analítica e consciente. No caso dos Multiletramentos, isto requer a
introdução de metalinguagens explícitas que descrevam e interpretem
os elementos de Design de diferentes modos de significado. Por
exemplo, isso envolve o desenvolvimento de uma linguagem que
descreva os padrões nos Designs disponíveis de significado, como
fazemos Designing e como o significado se torna Redesigning. Quando
o novo texto expressa voz e experiência?, podemos perguntar.
Evidências de ensino e aprendizagem bem sucedidos do ponto de vista
da Instrução Pública podem ser aquele momento quando os alunos
apresentam um modo próprio de descrever os processos e padrões do
Design de uma maneira significativa.
Enquadramento Crítico significa interpretar o contexto social e
cultural de determinados Designs de significado. Isso requer que os
alunos deixem os significados que estão estudando, e passe a abordá-los
criticamente em relação a seu contexto. Por exemplo, como é que um
Design se ajusta aos significados locais e aos significados mais globais?
Qual é o propósito do Design? O que ele está realizando? Para quem?
De quem? Por meio de quem? Por quê? Para que efeito? Qual é o
contexto social imediato (estruturas e funções localizadas e
22

particulares, conexões, sistemas, relacionamentos, efeitos)? Qual o


maior contexto social (cultura, história, sociedade, política, valores)? As
sinalizações de que os alunos conhecem a função do Design – o que
ele realiza e por que o realiza, são evidências de um ensino e
aprendizado bem-sucedidos, a partir do modelo pedagógico.
A Prática Transformada implica transferência na prática de produção
de significado; ou seja, transpõe-se um significado transformado para
ser trabalhado em outros contextos ou locais culturais. Por exemplo,
essa mudança pode envolver a aplicação de um determinado Design
em um contexto diferente daquele usual, ou a produção de um novo
design. Pode envolver tirar um significado do contexto e adaptá-lo em
outro de modo que funcione. Isso inevitavelmente implicará que os
alunos acresçam, ao significado, algo de si. Envolverá também
intertextualidade (as conexões, influências, recriação de outros textos
e referências cruzadas da história, cultura e experiência) e hibridismo
(um Design tem voz, mas de onde vem o toque de familiaridade?).
O ensino e a aprendizagem bem-sucedidos, a partir desse
modelo específico, envolverão boa reprodução (se for esse o jogo) ou
alguma medida de extensão da criatividade e seu valor na
transformação e na aptidão de transformação ou na transferência de
um contexto para outro (funciona)?
Esses quatro aspectos da pedagogia não constituem uma sequência de
aprendizagem rígida, mas sim quatro elementos essenciais de uma
pedagogia plena e eficaz. O modelo dos Multilitetramentos visa
suplementar - e não criticar ou negar - as várias práticas de ensino
existentes. De fato, cada um dos aspectos dessa pedagogia representa
uma tradição na pedagogia em geral. Assim, a Prática situada se insere
23

na tradição de muitos dos vários avanços pedagógicos, segundo


Dewey, referentes à língua e ao processo de escrita. A Instrução
explícita está na tradição de muitas pedagogias transmissivas centradas
no professor, da gramática tradicional à instrução direta. O
Enquadramento Crítico está na tradição mais recente de letramento
crítico. A Prática Transformada é um pouco mais difícil de localizar na
tradição, mas seus antecedentes são as várias estratégias para se usar
uma aprendizagem em contexto diferente, transformando a teoria em
prática e assim por diante.
Os quatro aspectos representam, em certo sentido, universais
pedagógicos. O paradoxo desses universais, no entanto, é que seu
ponto de partida vem das vivências inevitavelmente heterogêneas da
prática situada. E, para sobrepor paradoxo sobre paradoxo, os outros
três pontos de vista pedagógicos envolvem três formas de
distanciamento do Situado, porém sem nunca o deixar para trás. O
Situado é o reino da vivência, da experiência original, "sem educação",
da vida cotidiana pragmática. Cada um dos outros três pontos de vista
pedagógicos, à sua maneira, expande os horizontes da vivência. A
Instrução Explícita explicita os regras(e funcionamento) de significado
implícitos. O Enquadramento Crítico interroga contextos e objetivos. A
Prática Transformada transfere os significados e as subjetividades para
novos domínios e menos familiares. Partindo dos fenômenos culturais
das vivencias e sempre retornando a esses fenômenos, os outros três
ângulos trazem perspectivas de profundidade e amplitude. Para avaliar
a dimensão da profundidade, precisamos ir além de nossa leitura dos
fenômenos de cultura e das diferenças, e mensurando-os em contraste
com as estruturas profundas da vida cotidiana e do significado (que são
24

mais difíceis de serem vistos quando você está imerso nelas) e os fatos
morais de nossa natureza humana. Isso envolve a suspensão da crença
ou bracketing: pensamento crítico, pensamento sistêmico,
reflexividade, pensamento holístico, trabalhando por meio de inter-
relações entre fenômenos aparentemente separados e descobrindo
paradoxos e contradições.
E, em uma dimensão ampla, precisamos empreender o
processo de comparação transcultural. Como esta vivência particular,
nossa vivência (ou, para ser mais preciso, cada uma das camadas da
multiplicidade de fontes da vivência sobrepostas que constituem nossa
experiência diária), se compara a maneiras alternativas de ser humano,
de fazer cultura? Nem é essa amplitude transcultural simplesmente a
visão de um observador desinteressado, à maneira de uma espécie de
curiosidade antropológica. Em uma era de crescente diversidade local
e interconexão global, essa amplitude deve ser a matéria-prima da
prática, do aprendizado ao cruzar constantemente as fronteiras
culturais, do desvio entre um contexto da vivência e outro. As
dimensões de profundidade e amplitude são processos para
"desnaturalizar" a vivência, de tornar o cotidiano estranho a fim de
lançar uma nova luz sobre esse cotidiano e de ter uma base com mais
informação sobre a qual se projetarão (designs de) os significados
iminentes e nossos futuros sociais mais amplos.

DIREÇÕES FUTURAS: APLICAÇÕES DO CONCEITO DE


MULTILETRAMENTO
25

Na década, desde a primeira publicação do manifesto


Multiletramentos original na Harvard Educational Review, houve uma
considerável produção internacionalmente, inclusive na África do Sul
(Newfield e Stein, 2000), Malásia (Kalantzis e Pandian, 2001; Pandian,
1999), e na Grécia (particularmente no trabalho de Intzidis e
Karantzola). Esse trabalho também foi representado em uma série de
publicações e antologias de visão geral (Cope e Kalantzis, 1997b;
Kalantzis e Cope, 2000, 2001b; Kalantzis, Varnava-Skoura e Cope,
2002). Também houve muitas aplicações da noção de multiletramentos
além do New London Group original e do grupo expandido de
colaboradores internacionais, incluindo vários livros (Healy, 2000;
Newman, 2002; Unsworth, 2001) e vários artigos acadêmicos. A
Conferência de Aprendizagem anual (www.LearningConference.com),
continua a ser um ponto focal para discussões sobre Multiletramentos
e para apresentar o trabalho em andamento de vários membros do
New London Group. Nos últimos anos, a Conferência de Aprendizagem
foi realizada na Malásia (Penang, 1999), Austrália (Melbourne, 2000),
Grécia 208 (Spetses, 2001), China (Pequim, 2002), Reino Unido
(Universidade de Londres, 2003), Cuba (Instituto de Ciências
Pedagógicas, 2004), Espanha (Universidade de Granada, 2005) e
Jamaica (Montego Bay Teachers College, 2006). A conferência atrai
agora cerca de 800 pessoas anualmente. Os artigos da conferência são
publicados no International Journal of Learning (www.Learning-
Journal.com). Trabalhos recentes estendendo e desenvolvendo as
noções de Multiletramentos incluíram o trabalho de Kress sobre
imagens e multimodalidade (Kress e van Leeuwen, 1996) e mídia
contemporânea (Kress, 2003), o trabalho de James Paul Gee em
26

videogames (Gee, 2003, 2005), Kalantzis e o trabalho de Cope na


pedagogia (Kalantzis e Cope, 2004, 2005) e uma literatura crescente
aplicando o conceito de Multiletramentos ao mundo das tecnologias
de informação e comunicação digital (Chandler-Olcott e Mahar, 2003;
Cope e Kalantzis, 2003; 2004).
Veja também: David Block: Language Education and
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