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Uma das razões que permitem essa noção de conhecimento plural e heterogêneo é o
fato de que diferentes áreas do globo estão interconectadas, ou seja, o processo
compreendido como globalização, no qual “diferentes contextos sociais ou regiões se
tornam interconectadas em toda a superfície da terra. A globalização pode, assim, ser
definida como a intensificação das relações sociais mundiais que ligam localidades
distantes de tal forma que os acontecimentos locais sejam moldados por eventos que
ocorreram muitas milhas de distância e vice-versa” (GIDDENS, 1996:64 tradução
nossa).“
Embora a globalização não seja um fenômeno recente (GIDDENS, 1996), é por volta
dos anos 70 que a integração global aumenta, “acelerando os fluxos e os laços entre
as nações” (HALL, 2000:69). A difusão de recortes e imagens de diversas culturas,
principalmente a norte-americana, se expandiu de forma que em um mesmo lugar é
possível encontrar restaurantes “característicos” de diferentes países e entrar em
contato com produtos culturais, como filmes, livros e músicas, de diversas
nacionalidades.
Ainda que esse contato com outras culturas seja limitado por recortes e, muitas vezes,
transformado em mercadoria cultural, para Hall (2000:87), a globalização “tem um
efeito pluralizante sobre as identidades, produzindo uma variedade de possibilidades e
novas posições de identificação, e tornando as identidades mais posicionais, mais
políticas, mais plurais e diversas; menos fixas, unificadas ou trans-históricas”. Isto é, a
globalização pode influenciar o processo de constituição da identidade já que ela
“surge não tanto da plenitude da identidade que já está dentro de nós como indivíduos,
mas de uma falta de inteireza que é ‘preenchida’ a partir de nosso exterior” (HALL,
2000:39 destaque do autor). Eu sei quem eu sou em relação ao outro.
No entanto, Rocha (2010) explica que o termo multiculturalismo tem sido usado para
significar coisas muito distintas e, em muitos casos, acaba sendo utilizado para limitar
e estereotipar a cultura do estrangeiro tida como una, ou ainda representar situações
em que culturas minoritárias coexistindo com tradições dominantes têm que se
adequar a elas ou ser assimiladas por elas. O termo ainda não especifica se as
culturas tratadas se misturam ou não, no geral, refletindo culturas que coexistem, mas
que não se influenciam.
Nesse sentido, o ensino de línguas estrangeiras que dialogue com o período atual e
forneça uma multiplicidade de perspectivas pode favorecer o contato dos alunos com a
cultura do outro, não se limitando a apresentar apenas a cultura dos países falantes da
língua que se ensina. já que, num mundo interconectado e com fronteiras difusas,
diferentes culturas e identidades podem coexistir num mesmo espaço.
Outro exemplo, no caso dos países falantes de espanhol pode ser comparar as
diferentes maneiras de se dizer XXXXXX, ou propor que os alunos façam uma
pesquisa sobre os países em que há predominância de uso da palavra cookie ou
biscuit e, então, analisar os possíveis motivos dessa predominância (maior influência
norte-americana, colonização inglesa) e ainda verificar se existem palavras
alternativas para o mesmo alimento. Em seguida, pode-se trazer a discussão para a
realidade brasileira e pesquisar os locais em que é mais comum se utilizar bolacha ou
biscoito.
Ainda, o conhecimento da diferença e do outro pode ser usado pelo professor em sala
para que os alunos estabeleçam conexões entre seu contexto e aqueles apresentados
durante a aula. Para Read (2015), estabelecer conexões é uma das condições para
que os educandos desenvolvam o pensamento criativo.
Para o contexto dos anos iniciais da Educação Básica, isso parece importante, pois permite que
extrapolemos visões mais restritas de língua/linguagem e práticas educacionais que distanciam
a escola da vida e busquemos encaminhamentos que reforcem esse vínculo, ao mesmo tempo
em que fortalecem o potencial agentivo e crítico da criança.
“Também na área da Educação, creio que as fronteiras devam e possam passar a ser vistas
como o lugar a partir do qual algo começa a ser fazer presente, já que as diferenças são, ao
mesmo tempo, “uma visão e uma construção – que leva alguém para além de si para poder
retornar, com espírito de revisão e reconstrução, às condições políticas do presente”
(BHABHA, 2005, p. 22), sempre em devir.” (p. 114)
Referências Bibliográficas
1
A pesquisa publicada em 2016 pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade
da Informação (Cetic.br) e pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br) mostrou que
apenas 58% dos brasileiros tem acesso à internet. Informações disponíveis em
http://agenciabrasil.ebc.com.br/pesquisa-e-inovacao/noticia/2016-09/pesquisa-mostra-que-58-da-
populacao-brasileira-usam-internet. Acesso em 21 de maio de 2017.
BRASIL, Parâmetros Currículares Nacionais, 1998.
GIDDENS, A. The Consequences of Modernity. Cambridge: Polity Press, 1996.
HALL, S. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade, Rio de Janeiro: DP&A, 2000.
READ, C. Seven Pillars of Creativity in Primary ELT. In: MALEY, Alan; PEACHEY, Nik
(orgs.). Creativity in the English Classroom. London: British Council, 2015.
ROCHA, C. H. Propostas para o Inglês no Ensino Fundamental I Público:
Plurilinguismo, Transculturalidade e Multiletramentos. Tese de doutorado. Campinas:
UNICAMP, 2010.