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REAÇÕES PÓS-VACINAIS EM CÃES IMUNIZADOS COM VACINAS

COMERCIAIS CONTRA LEISHMANIOSE VISCERAL

*Clauceane de Jesus¹, Consuêlo Barreto Fernandes², Paulo Roberto Bahiano Ferreira², Carlos
José Santos Virgens¹, Daniela Farias Larangeira³, Stella Maria Barrouin-Melo³

Resumo:
As vacinas comerciais para leishmaniose visceral canina (LVC) são objeto de investigação e
discussão em órgãos de saúde pública do governo e no meio acadêmico. Para os guardiões de
cães, uma das principais preocupações é quanto às reações adversas que a vacinação poderia
causar. Este trabalho teve o objetivo de descrever os resultados de uma investigação sobre
reações pós-vacinais em animais imunizados com duas vacinas comercializadas no Brasil.
Setenta e um (71) cães foram estudados em dois grupos: no grupo 1 (G1), 35 cães receberam
o produto Leishmune® e no grupo 2 (G2), 36 receberam a Leish-tec®, seguindo-se o
protocolo preconizado pelos fabricantes. Os guardiões foram questionados sobre as alterações
observadas até sete dias após cada dose aplicada. Foram relatadas reações à vacina em oito
animais: dois dos 35 vacinados com a Leishmune® (5,7%) e seis dos 36 cães que receberam a
vacina Leish-tec® (16,6%). Os dois animais do G1 apresentaram edema local, estando
associado à edema de face, apatia e anorexia em um animal, e à formação de nódulo e dor no
local da aplicação no outro cão. Dos seis animais do grupo G2, quatro apresentaram apatia
(66,6%); quatro, edema local (66,6%); três, claudicação (50%); três, dor no local da aplicação
(50%); dois, anorexia (33,3%); dois, hiporexia (33,3%) e dois, formação de nódulo no local
da aplicação (33,3%). Essas reações ocorreram apenas uma vez em cada animal, sendo em
dois cães diferentes na primeira e segunda dose respectivamente e na terceira dose em seis
animais; persistindo de um a cinco dias e cessando totalmente após esse período. As reações
ocorridas encontraram-se dentro do limite aceitável.
Palavras-chave: Leishmaniose, Cão, Vacina, Reações pós-vacinais, Leishmania

Summary
The commercial vaccines for canine visceral leishmaniasis (CVL) are subject to investigation
and discussion in public health agencies of government and academia. To the keepers of dogs,
is a major concern regarding adverse reactions to vaccination could cause. This study aimed
to describe the results of an investigation into post-vaccination reactions in animals
immunized with both vaccines sold in Brazil. Seventy-one (71) dogs were studied in two
groups: group 1 (G1), 35 dogs received the product Leishmune ® and Group 2 (G2), 36
received the Leish-tec ®, following the protocol recommended by manufacturers. The
guardians were asked about the changes observed until seven days after each dose. Reactions
to the vaccine were reported in eight animals: two of 35 vaccinated with Leishmune ® (5.7%)
and six of the 36 dogs that received the vaccine Leish-tec ® (16.6%). The two animals of G1
had local swelling, being associated with facial swelling, lethargy and anorexia in an animal,
and nodule formation and reactions of pain at the injection site in another dog. Of the six
animals in group G2, four showed apathy (66.6%), four, local swelling (66.6%), three,
claudication (50%), three, reactions of pain at the injection site (50%), two, anorexia (33.3%),

_______________________
¹Graduando em Medicina Veterinária-UFBA; ²Médico Veterinário – Mestrando em Ciência Animal nos
Trópicos-UFBA; ³Drª.Profª da Escola de Medicina Veterinária –UFBA. *Rua Apolinário Santana, nº12, apt:202,
Engenho Velho – Federação, Salvador-Bahia. CEP: 40220-100. clauceanedejesus@gmail.com.
two, appetite loss (33.3%) and two, nodule formation at the injection site (33.3%). These
reactions occurred only once in each animal being, an animal with the first dose, one in a
second and six animals in the third vaccine dose, persisting for one to five days and ceased
completely after that. The reactions that occurred were within the acceptable limit.
Key words: leishmaniasis, dog, vaccine, adverses reactions, Leishmania

Resumo expandido:
No ambiente urbano, os cães domésticos são considerados o principal reservatório da
Leishmania e desenvolvem papel relevante na transmissão aos seres humanos, sendo
preconizado a eutanásia de cães infectados e/ou soropositivos (BRASIL, 2006).
O tratamento da leishmaniose visceral (LV) em cães infectados ou doentes com
produtos de uso humano ou produtos não registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (MAPA) foi proibido no Brasil através da Portaria interministerial n° 1.426
(BRASIL, 2008). A inexistência de tratamento efetivo para a cura total da doença canina e a
polêmica sobre a eliminação indiscriminada de cães infectados, estimulou a tentativa de
desenvolvimento de novas estratégias, centradas em vacinas eficazes (TESH, 1995). O êxito
da vacinação de cães pode reduzir significativamente a incidência de leishmaniose visceral
humana, sendo a estratégia de controle com melhor relação custo-benefício (DYE, 1996).
O MAPA registrou em 2003 e 2007 as duas vacinas canina para LV comercializada
no Brasil, a Leishmune® e a Leish-tec® respectivamente. A Leishmune® é composta pelo
antígeno complexo glicoprotéico ligante de fucose e manose (FML) de Leishmania donovani,
presente na superfície da Leishmania sp. durante todo o seu ciclo (FORT DODGE, 2004). Já a
Leish-tec® é uma vacina recombinante que utiliza o antígeno A2, uma proteína específica do
estágio amastigota de várias espécies de Leishmania sp. (HERTAPE CALLIER, 2008). As
duas vacinas possuem como adjuvante a saponina, indicada como a principal responsável
pelos efeitos adversos, e ambos fabricantes preconizam o exame sorológico antes da
vacinação para comprovação da soronegatividade e a aplicação de três doses, respeitando-se
um intervalo de 21 dias entre elas e revacinação anual.
Alguns guardiões apresentam certa insegurança com o uso da vacina em relação às
reações que o animal pode apresentar após aplicação da mesma. Segundo o fabricante da
vacina Leishmune®, 25% dos cães podem responder a vacinação apresentando dor ou
inflamação transitória no local da aplicação, além de letargia e anorexia. Mas a maioria desses
sinais geralmente regride em poucos dias. Em poucos casos o cão pode apresentar queda de
pêlos no local da aplicação (FORT DODGE, 2004). Em relação à vacina Leish-tec® não há
informações sobre as reações adversas, o fabricante relata que em casos de reações de
hipersensibilidade o cão deve ser tratado conforme a orientação médico veterinária
(HERTAPE CALLIER, 2008).
Com o objetivo de elucidar as reações adversas causadas pela Leishmune® e Leish-
tec®, setenta e um (71) cães foram vacinados respeitando-se o protocolo preconizado pelos
fabricantes, sendo avaliada a presença de sinais clínicos associados às vacinações. Para tanto,
foram formados dois grupos: grupo 1 (G1), 35 cães vacinados com a Leishmune® e o grupo 2
(G2), 36 cães vacinados com a Leish-tec®. O teste ELISA indireto foi realizado para a
confirmação da soronegatividade dos animais e em seguida a aplicação de três doses das
vacinas por via subcutânea (SC) na cernelha com o intervalo de 21 dias. Os sinais clínicos
foram detectados através do exame clínico (anamnese e exame físico) realizado antes da
aplicação de cada dose, sendo anotadas as informações em fichas clínicas.
Foram relatadas reações à vacina em oito animais: dois dos 35 vacinados com a Leishmune®
(5,7%) e seis dos 36 cães que receberam a vacina Leish-tec® (16,6%). Os dois animais do G1
apresentaram edema local, associado a edema de face, apatia e anorexia em um animal, e à
formação de nódulo e dor no local da aplicação no outro. Dos seis animais do grupo G2,

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quatro apresentaram apatia (66,6%); quatro, edema local (66,6%); três, claudicação (50%);
três, dor no local da aplicação (50%); dois, anorexia (33,3%); dois, hiporexia (33,3%) e dois,
formação de nódulo no local da aplicação (33,3%). Essas reações ocorreram apenas uma vez
em cada animal sendo, em um animal na primeira, um na segunda e em seis animais na
terceira dose da vacina, persistindo de um a cinco dias e cessando totalmente após esse
período.
A dor local, apatia, edema e anorexia são relatados como efeitos adversos da Leishmune®
(FORT DODGE, 2004; PARRA et al., 2007), no entanto vômitos e diarréia também podem
ocorrer (PARRA et al., 2007). A maior parte das reações são atribuídas à mistura de
saponinas de Riedel de Haen, especialmente pela presença de 18% de saponina QS21
(KENSIL et al., 1991; SANTOS et al., 2002). Não são descritos, detalhadamente, os efeitos
adversos da Leish-tec®, contudo a presença de saponinas como adjuvante pode ser associada
aos sinais clínicos provocados pelo uso dessa vacina observados no presente estudo.
As reações ocorridas nos animais vacinados com a Leishmune® encontraram-se dentro do
limite aceitável de acordo com as informações deste fabricante.

Referências:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica.


Manual de vigilância e controle da Leishmaniose Visceral. Brasília: Ministério da Saúde, 2006.
BRASIL. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria Interministerial n° 1.426. Brasília: Ministério
da Saúde, 2008a.
DYE, C. The logic of visceral leishmaniosis control. The American Journal of Tropical Medicine and
Hygiene, v.55, n.2, p.125-130, 1996.
FORT DODGE SAÚDE ANIMAL Ltda. Manual Técnico Vacina Leishmune, 51p., 2004.
HERTAPE CALLIER SAÚDE ANIMAL Ltda. Manual Técnico Vacina Leish-tec, 76 p., 2008.
KENSIL CR; PATEL U; LENNICK M; MARCIANI DJ. Separation and characterization of saponins with
adjuvant activity from Quillaja saponaria Molina cortex. J Immunol 1991;146:431–7
PARRA LE; BORJA-CABRERA, GP; SANTOS, FN; SOUZA, LO; PALATNIK-DE-SOUSA, CB; MENZ, I.
Safety trial using the Leishmune vaccine against canine visceral leishmaniasis in Brazil. Vaccine, v.25, n.12, p.
2180–2186, 2007.
SANTOS WR; DE LIMA VMF; PARAGUAI DE SOUZA E; BERNARDO RR; PALATNIK M; PALATINIK
DE SOUSA CB. Saponins, IL12 and BCG adjuvant in the FML-vaccine formulation against murine visceral
leishmaniasis. Vaccine 2002;21:30–43.
TESH, R. Controlo f zoonotic visceral leishmaniasis. Is it time to chamg strategies? American Journal of
Tropical Medicine and Hygiene, v. 52, p. 287-292, 1995.

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