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As aventuras de Pi: uma fábula sobre a existência de Deus

Article · October 2010

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Albert Drummond
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
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As aventuras de Pi: uma
fábula sobre a existência de
Deus.
Albert Drummond 23 de outubro de 2010

A História se passa em torno de uma conversa entre o protagonista e um


escritor em decadência, que procura uma história comovente e intensa para se
reerguer em sua carreira. Por intermédio de um estranho ele conhece Piscine
Molitor Patel, um homem que decide lhe contar sua história de vida e lhe
fazer acreditar em Deus. Temos então, três momentos, o presente
com Piscine adulto, um passado distante, em que o protagonista
relembra sua infância e parte de sua construção como ser humano e
um passado presente, em que todo o filme é representado.

O seu pai decide montar um zoológico e é neste cenário que o menino vive.
Cansado de sofrer com as piadas na escola sobre seu nome, ele decide
modificar essa situação, fazendo com que as pessoas os reconheçam e o
enxergue com Pi.

Pi tem seu primeiro conflito aos 14 anos de idade; o seu pai é um cético, sua
mãe uma crente que utiliza da religião para resgatar memórias boas outrora
vividas. Entre a fé e a razão, Pi, desperta sua curiosidade para com a questão e
(ou) fenômeno religioso, ele é crescido na doutrina religiosa da mãe, o Hindu,
mais tarde, por vontade própria ele se introduz no Cristianismo e no

Islamismo e começa a seguir todas as três religiões, buscando uma


compreensão de Deus através do olhar de cada uma delas.

Anos mais tarde, o pai de Pi com problemas relacionado ao terreno do


Zoológico decide ir para o Canadá e lá vender os animais, construindo uma
nova vida com sua família. Porém, uma tempestade arrebata o cargueiro e o
afunda, Pi é o único sobrevivente, solto em alto mar em um bote, na
companhia de uma zebra, um orangotango, uma hiena e um tigre de bengala.

As aventuras de Pi começam nesse ponto da história, juntamente com o


conflito entre os animais. Os animais possuem uma carga emocional forte,
cada um deles é uma representação de uma realidade paralela, que Pi utiliza
para abrandar o seu real. Temos um confronto; a hiena, provocadora e voraz
acaba por matar a zebra que já se encontrava ferida, sem poder de reação, o
orangotango ainda reluta mas também é morto pela carniceira; a agonia que se
segue é por parte do tigre de bengala que estava escondido em um
compartimento do bote e dá fim a vida da hiena. Tigre e Pi lutam, inicialmente
como rivais, depois como “unidade” por sobrevivência.

Uma longa jornada entre a vida e a morte, entre sua fé e a racionalidade dão
início há uma inquietante aventura que culmina com Pi sendo resgatado ao
chegar em uma ilha. O Tigre some em meio terra firme.

A história é contada fantasticamente ao escritor, porém uma nova versão da


mesma história surge, em que os animais são substituídos por pessoas, a zebra
uma vez abatida representa um chinês budista em sua versão paralela da
história e ou (verdadeira), que Pi conhece após o conflito entre sua mãe
(orangotango) e um cozinheiro, ignorante e asqueroso (hiena)
assim como é representado por sua versão animal. Pi no entanto é a
personificação do tigre de bengala. Seu lado animalesco, em sua
metáfora de si mesmo.

A primeira observação é acerca do nome do protagonista, Pi, que para a


matemática pode estar:

“[...] no rolar das ondas numa praia, no trajeto aparente diário das estrelas
no céu terrestre, no espalhamento de uma colônia de cogumelos, ou no
movimento articulado dos animais, na propagação dos campos
eletromagnéticos e um sem número de fenômenos e objetos, do mundo natural
da matemática, que estão associados às ideias de simetria circular e esférica.
Ora, o estudo e uso de círculos e esferas, de um modo quase que inexorável,
acaba produzindo o PI.”(DELAHAYE, 1997).

Em outras palavras, de forma grosseira, o Pi é o valor da razão entre a


circunferência de qualquer círculo e seu diâmetro. Temos então a simbologia
do círculo, algo constante e infinito (Deus) e Pi (Razão), que encontra uma
lógica para esse infinito. No início do filme o Escritor diz a Pi: – “Me falaram
que você iria me fazer acreditar em Deus.”

E realmente ele o faz, a concepção dada a esse filme, talvez seja a mesma
concepção de religião e fé comum à grande maioria das pessoas.

O filme trata do embate histórico entre Religião e Ciência, ou melhor, entre fé


e razão, porém, utiliza de uma forma fantástica, ou de uma fábula para
contrapor este conflito.

Antes de sabermos a verdadeira história acerca do naufrágio de Pi,


consideramos duas possibilidades: A primeira; de que tudo poderia ser uma
ilusão de uma mente machucada em alto mar, e a segunda, de que realmente
os animais ali, tivessem vida e por vezes “sentimento”.

Mas a verdade é dura, crua e amarga. Duas pessoas foram assassinadas a


sangue frio no bote, e Pi mata a Hiena (o cozinheiro assassino). A alegoria do
Tigre (Pi), nos conduz a própria ideia do animal, forte, voraz, mas que
consegue ser adestrado, domado jamais. Como todos nós.

Uma outra parte do filme que aborda esse conflito, é sobre a ilha, uma ilha
que durante o dia oferece o melhor do comer e do beber, uma água potável e
um ambiente acolhedor, a noite ela tira tudo que lhe deu durante o dia, suas
águas se tornam ácidas e o que era sonho se torna pesadelo. O bom e o ruim, o
claro e o escuro, a fé e a razão. Talvez seja esse o maior conflito na
história, a linha tênue entre a fé e nossa animalidade, que graças a
ética, e a ordem social podemos controla-la.

Ao final do filme, Pi, pergunta ao escritor: “Agora que você sabe as duas
histórias, em qual história você quer acreditar? – e o escritor responde – “Na
história do tigre.”

E Pi conclui, – “Assim é Deus.”

A quem nos apegamos para suprir nossa realidade sombria. Homens e


Mulheres que, como seres imperfeitos em constante transformação, vemos a
necessidade do transcendente, do mistério como parte de nossa essência.

Termino então essa resenha critica com uma citação de Russell, bastante
pertinente para as reflexões oferecidas pelo filme:

“Uma crença religiosa difere de uma teoria científica, ao alegar a incorporação


plena de uma verdade eterna, ao passo que a ciência é sempre experimental,
esperando que as modificações em suas teorias atuais, mais cedo ou mais
tarde sejam necessárias e ciente de que seu método é um daqueles logicamente
incapaz de chegar numa demonstração final e completa. [...] Não posso
admitir qualquer outro método de se chegar a verdade se não pela ciência,
entretanto no reino das emoções, não posso negar o valor das experiências que
geraram a religião[...]” (RUSSELL, 2009, p. 6 – 143.)

Referências

J.P. Delahaye. Le Fascinant nombre Pi. Editions Belin. Pou La Sience, Paris. 1997.
RUSSELL, Bertrand. Religião e Ciência. São Paulo. Funpec Editora. 2009.

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