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Revista

Geriatria &
Gerontologia

ARTIGOS ORIGINAIS
Envelhecimento bem-sucedido e capacidade funcional em idosos brasileiros
Fatores associados à perda da capacidade funcional em idosos em muni-
Órgão Oficial de Publicação Científica cípio no sul do país
Perfil sociodemográfico de idosos com câncer em serviço terciário do
Sociedade Brasileira de Sistema Único de Saúde
Geriatria & Gerontologia Risco nutricional em pacientes idosos hospitalizados como determinante de
desfechos clínicos
Perfil do idoso com AIDS no Brasil
Conhecimento de HIV/AIDS em um grupo de idosos na cidade de
Criciúma – SC/Brasil
Mortalidade por tuberculose pulmonar e síndrome de imunodeficiência
adquirida no idoso: há diferenças?
Efeito do treinamento resistido ondulatório sobre a aptidão funcional de
idosos com diabetes do tipo 2
Sugestões de tratamento na doença de Parkinson: intervenções psicomo-
toras com videogame
Percepção de maus-tratos no domicílio pelo idoso morador no município de
Juazeiro (BA)

ARTIGOS DE REVISÃO
Síndrome do pé doloroso na população idosa
Benefícios da utilização de prebióticos, probióticos e simbióticos em
adultos e idosos
Ambiente físico e acessibilidade espacial: contribuições para o cuidado de
enfermagem na prevenção de quedas em idosos

RELATO DE CASO
Bullying na terceira idade

Volume 8
Número 1
ISSN 1981-8289 Jan/Fev/Mar 2014
EDITORIAL
Envelhecimento de pacientes infectados pelo HIV/AIDS............................................................. 07

ARTIGOS ORIGINAIS
Envelhecimento bem-sucedido e capacidade funcional em idosos brasileiros | Adriana Letícia de
Andrade Silva Botoni, Fausto Aloísio Pedrosa Pimenta, Sílvia Nascimento Freitas, Raimundo Marques
Nascimento, George Luiz Lins Machado-Coelho, Guilherme Almeida Maia, Flávio Chaimowicz........ 11
Fatores associados à perda da capacidade funcional em idosos em município no sul do país |
Adriana Moraes dos Santos, Selma Franco, Marco Antonio Moura Reis.................................... 19
Perfil sociodemográfico de idosos com câncer em serviço terciário do Sistema Único de Saúde | Ana
Beatriz Bortolansa Pacagnella, Emmily Daiane Buarque De Santana, Manoella de Macedo Gomes,
André Fattori, Maria Elena Guariento......................................................................................................... 27
Risco nutricional em pacientes idosos hospitalizados como determinante de desfechos clínicos |
Adriane dos Santos da Silva, Ida Cristina Mannarino, Annie S. Bello Moreira.................................. 32
Perfil do idoso com AIDS no Brasil | Juliano Brustolin, Thais Elisa Lunardi, Naiara Maeli Michels 38
Conhecimento de HIV/AIDS em um grupo de idosos na cidade de Criciúma – SC/Brasil | Kris-
tian Madeira, Priscyla Waleska Targino de Azevedo Simões, Matheus Cipriano Vidal Heluany,
Claudia Cipriano Vidal Heluany.................................................................................................... 43
Mortalidade por tuberculose pulmonar e síndrome de imunodeficiência adquirida no idoso: há dife-
renças? | Luciana Paganini Piazzolla, Francisca M. Scoralick, João Barberino Santos, Liana Lauria-Pires 50
Efeito do treinamento resistido ondulatório sobre a aptidão funcional de idosos com diabetes do tipo 2
| Gilberto Monteiro dos Santos, Fabio Tanil Montrezol, Luciana Santos Souza Pauli, Emilson Colantonio,
Ricardo José Gomes, Bárbara de Almeida Rodrigues, Rodolfo Marinho, José Rodrigo Pauli................. 54
Sugestões de tratamento na doença de Parkinson: intervenções psicomotoras com videogame |
José Eduardo Martinelli, Luciana Maria Pires Santos, Flávia Ogava Aramaki, José Maria Montiel,
Juliana Francisca Cecato................................................................................................................ 60
Percepção de maus-tratos no domicílio pelo idoso morador no município de Juazeiro (BA) |
Maria Luiza Barros Fernandes Bezerra, Edinete Maria Rosa........................................................ 65

ARTIGOS DE REVISÃO
Síndrome do pé doloroso na população idosa | Giovanna Riccitelli do Couto, Nathalie Fernandes Caval-
cante, Rodrigo Sader Heck, Marcel João Zulin, Marcos Carmelita Siqueira, Jorge Luiz de Carvalho Mello 72
Benefícios da utilização de prebióticos, probióticos e simbióticos em adultos e idosos | Luciana
Santos Pereira, Luciano Rodrigues de Oliveira, Marina Teixeira Santos, Talita Barbi, Ana Maria Calil 77
Ambiente físico e acessibilidade espacial: contribuições para o cuidado de enfermagem na
prevenção de quedas em idosos | Edmar Geraldo Ribeiro, Sônia Maria Soares, Raquel Souza
Azevedo, Márcia Maria Soares................................................................................................... 82

RELATO DE CASO
Bullying na terceira idade | Melissa Agostini Lampert, Gabriel Ferreira Tognon, Miguel Luiz Tonet
Jr., Raquel de Oliveira Corbellini, Kelly Caroline Welter, Renata Rosso.......................................... 89

INSTRUÇÕES AOS AUTORES.................................................................................................. 92

Volume 8
Número 1
ISSN 1081-8289 Jan/Fev/Mar 2014
GRANDES
PROJETOS pelo bem da

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que todos tenham aprimoramento da
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é quem mais importa: o paciente.
Revista Geriatria & Gerontologia
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Maysa Seabra Cendoroglo – São Paulo, Brasil (Unifesp)
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EDITORIAL

ENVELHECIMENTO DE PACIENTES INFECTADOS PELO HIV/AIDS.

Há registros de que o diagnóstico de HIV/AIDS tem que, apesar das comorbidades e da polifarmácia, há boa
aumentado em idosos em todo o mundo. Esta informação aderência ao tratamento e baixa taxa de abandono. De
pode ser confirmada, tanto considerando o critério de Biasi e colaboradores (J Exp Clin Med 2011;3) chamam
idade de 60 anos (adotado pelo Centro de Prevenção a atenção para aspectos em comum entre o envelheci-
e Controle de Doenças, em inglês Centers for Disease mento imunológico e essa infecção, que contribuem para
Control and Prevention - CDC) como o de mais de 50 o impacto da doença e modificam a resposta ao trata-
(adotado pela Organização Mundial de Saúde - OMS). mento de doenças associadas e também da epidemio-
No Brasil, nos estudos de Brustolin e de Mello e cola- logia de outras, como a tuberculose (Fenner et al, PLOS
boradores, a escolaridade baixa aparece no perfil dos Genetics, 2013; 9). Piazzolla e colaboradores, analisando
idosos diagnosticados e também no perfil daqueles que dados do DATASUS de 2004 a 2010, compararam os
não previnem e desconhecem a forma de transmissão coeficientes de mortalidade por tuberculose pulmonar
da doença, respectivamente. Estudar o impacto da esco- em pacientes acima de 60 anos com ou sem AIDS, e veri-
laridade na prevenção, no diagnóstico e no tratamento ficaram que os coeficientes de mortalidade em pacientes
do HIV/AIDS, assim como do aumento de risco para sem infecção foram sempre mais elevados que os obser-
outras morbidades, como demência, é necessário para vados naqueles com a coinfecção. O efeito da tubercu-
que ações específicas sejam adotadas. Ainda há demora lose na mortalidade de pacientes com HIV positivo
no diagnóstico de HIV/AIDS em idosos, seja pelo também foi estudado por Straetemans e colaboradores
fato deles serem menos sintomáticos e apresentarem (Plos one, 2010; 5), em uma revisão sistemática. Greene
sintomas atípicos, ou pelos sintomas serem confundidos e colaboradores (JAMA, 2013; 309) fazem uma revisão
como alterações esperadas com o envelhecimento. apontando para o aumento da concomitância de outras
Em idosos, o curso da infecção é mais rápido, e a doenças crônicas, metabólicas e cardiovasculares com
demora no diagnóstico aumenta a mortalidade. O trata- HIV/AIDS. A conduta nesses casos de comorbidades
mento com retrovirais tem permitido a sobrevida dos gera muitas dúvidas, o que estimulou Cardoso e colabo-
pacientes infectados e a cronificação dessa doença. A radores (Braz j infect dis, 2013; 17) a discutirem o tema
revisão de literatura realizada por Avelino-Silva e cola- e a organização de consensos, como o que foi proposto
boradores (Ageing Research Reviews, 2011;10) aponta pelo Work Group for the HIV and Aging Consensus (J
Am Geriatr Soc, 2012; 60).
Os idosos com HIV/AIDS precisam de condutas
Base Editorial adequadas, controle de fatores de risco e prevenção para
comorbidades, objetivando sempre preservar a funcio-
nalidade e a qualidade de vida. Ainda não temos muitas
respostas para situações práticas, mas já são apontadas
muitas propostas que merecerão investigação científica.
Av. Copacabana, 500 sala 609/610, Copacabana
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Ana Lúcia de Sousa Vilela (RJ) Janaína Alvarenga Rocha (ES)
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Silvia Regina Mendes Pereira (RJ) Marisa Accioly R. da C. Domingues (SP)

Diretorias das seções estaduais da SBGG


ALAGOAS MARANHÃO PARANÁ
Presidente: Helen Arruda Guimarães Presidente: Jacira do Nascimento Serra Presidente: Debora Christina de lacantara Lopes
2o Vice-Presidente: Ana Elizabeth Lins 2o Vice-Presidente: Adriano Filipe Barreto Grangeiro 2a Vice-Presidente: Rosemary Rauchbach
Diretor Científico: Oswaldo da Silva Liberal Diretores Científicos: Herberth Vera Cruz Furtado Diretor Científico: Breno Barcelos Ferreira
Marques Júnior e Margareth de Pereira de Paula
BAHIA PERNAMBUCO
Presidente: Rômulo Meira MATO GROSSO DO SUL Presidente: Alexsandra Siqueira Campos
2o Vice-Presidente: Fábio Falcão Presidente: José Roberto Pelegrino 2a Vice-Presidente: Luisiana Lins Lamour
Diretor Científico: Lucas Kuhn Prado Diretora Científica: Marta Dreimeier Diretor Científico: Sergio Murilo Fernandes
CEARÁ MATO GROSSO RIO DE JANEIRO
Presidente: João Bastos Freire Neto Presidente: Roberto Gomes de Azevedo Presidente: Rodrigo Bernardo Serafim
2a Vice-Presidente: Lucila Bonfim Lopes Pinto 2a Vice-Presidente: Roseane Muniz 2a Vice-Presidente: Maria Angélica dos S. Sanchez
Diretor Científico: Jarbas de Sá Roriz Filho Diretora Científica: Janine Nazareth Arruda Diretor Científico: Tarso Lameri Sant’Anna Mosci
DISTRITO FEDERAL MINAS GERAIS RIO GRANDE DO SUL
Presidente: Marco Polo Dias Freitas Presidente: Rodrigo Ribeiro dos Santos Presidente: Ângelo José Bos
2o Vice-Presidente: Vicente de Paula Faleiros 2a Vice-Presidente: Marcella Guimarães Assis 2a Vice-Presidente: Vania Heredia
Diretor Científico: Leonardo Pitta Diretora Científica: Maria Aparecida Camargos Bicalho Diretor Científico: Paulo Roberto Cardoso Consoni
ESPÍRITO SANTO PARÁ SANTA CATARINA
Presidente: Roni Chaim Mukamal Presidente: Karlo Edson Carneiro Santana Moreira Presidente: Paulo Cesar dos Santos Borges
2o Vice-Presidente: Neidil Espinola da Costa 2a Vice-Presidente: Maria Izabel Penha de O. Santos 2a Vice-Presidente: Silvia Maria Azevedo do Santos
Diretora Científica: Daniela Souza Gonçalves Barbieri Diretor Científico: João Sergio Fontes do Nascimento Diretora Científica: Nagele Belettini Hahn
GOIÁS PARAÍBA SÃO PAULO
Presidente: Isadora Crosara Alves Teixeira Presidente: Arnaldo Henriques Gomes Viegas Presidente: Renato Moraes Alves Fabbri
2a Vice-Presidente: Viviane Lemos Silva Fernandes 2a Vice-Presidente: Mirian Lucia Trindade 2a Vice-Presidente: Valmari Cristina Aranha
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VIDA ATIVA EM QUALQUER IDADE

• Fortalece o músculo e a saúde óssea1,2,3


• Restaura a força e a energia1,2,3
• Auxilia no bom estado nutricional1,2,3
• Contribui na melhora da imunidade1,2,3

Referências bibliográficas: 1. Price R. Daly F. Pennington CR, McMurdo


ME. Nutritional supplementation of very old people at hospital discharge
increases muscle streight: A randomised controlled trial. Gerontology.
2005:51:179-185. 2. Fabian E. Bogner M. Kickinger A. Wagner KH,
Elmadfa I. Vitamin status in elderly people in relation to the use of
nutritional supplements. J. Nutr Health Aging. 2012;16(3):206-12. 3.
Morley JE. Sarcopenia in the elderly. Fam Pract. 2012:29 Suppl l.i44-i48.
Artigo original
Envelhecimento bem-sucedido e funcionalidade | 11

Envelhecimento bem-sucedido e
capacidade funcional em idosos

Adriana Letícia de Andrade Silva Botonia,


Fausto Aloísio Pedrosa Pimentab, Sílvia Nascimento Freitasc,
Raimundo Marques Nascimentod, George Luiz Lins Machado-
Coelhoe, Guilherme Almeida Maiaf, Flávio Chaimowiczg

Res umo
Palavras‑chave Introdução e objetivo: Este estudo avalia problemas de saúde em idosos, aplica um índice de envelhecimento
Avaliação bem-sucedido e analisa sua relação com fatores sociodemográficos e capacidade funcional em amostra aleatória
geriátrica, representativa de Ouro Preto. Métodos: Associação entre capacidade funcional e variáveis sociodemográficas e
capacidade clínicas foi avaliada usando regressão logística múltipla. Resultados: A mediana de idade foi 67; 59% eram de
funcional, perfil classe econômica baixa e 50% de baixa escolaridade. Foi elevada a prevalência de incontinência urinária, quedas,
de impacto depressão, dependência, problemas de visão, audição, imunização e rastreamento de neoplasias. Houve associação
da doença, entre dependência funcional e sexo feminino, idade, déficit cognitivo e problemas de visão. A chance de apresentar
levantamentos envelhecimento bem-sucedido foi menor entre mulheres, idosos de 75-79 anos e escolaridade baixa. Conclusão:
epidemiológicos, Os idosos apresentam elevada prevalência de problemas de saúde. Maior expectativa de vida em mulheres não se
saúde do idoso. associou a ganho de expectativa de vida livre de incapacidade. O envelhecimento bem-sucedido pode ser privilégio
de classes mais favorecidas.

Successful aging and functional capacity in


Brazilian elderly people

ABS T RACT
Keywords Introduction and objective: This study evaluates the prevalence of health problems in the elderly, an index of
Geriatric successful aging and considers its relationship with sociodemographic factors and functional capacity, in a random
assessment, sample representative of the residents in Ouro Preto. Methods: Association between functional capacity and socio-
functional demographic and clinical variables was assessed by multiple logistic regression. Results: The mean age was 67
capacity, disease’s years old; 59% were of low socioeconomic level and 50% with low education level. There was high prevalence of
impact profile, urinary incontinence, falls, depression, disability and problems with vision, hearing, immunization and cancer scre-
epidemiological ening. Association was observed between functional dependence and female, age, cognitive impairment and vision
surveys, elderly problems. The probability of presenting successful aging profile was lower among women, for 75-79 years old and
health. low education level. Conclusion: Althoung being young-elderly, they have presented a higher prevalence of health
problems. The expectancy of a longer life in women is not associated with a life expectancy free of disability. Succes-
sful aging could be a privilege of higher social classes.

a
Hospital das Clínicas, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
b
Departamento de Ciências Médicas, Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
c
Escola de Nutrição, UFOP.
d
Departamento de Ciências Médicas, UFOP; contribuiu com interpretação de dados, redação do artigo.
e
Departamento de Ciências Médicas, UFOP; contribuiu com interpretação de dados, redação do artigo.
f
Acadêmico de Medicina da UFOP; contribuiu com interpretação de dados, redação do artigo.
g
Departamento de Clínica Médica, UFMG; contribuiu com interpretação de dados, redação do artigo.

Dados para correspondência


Adriana Letícia de Andrade Silva Botoni – Rua Pistoia, 415, Bairro Bandeirantes, CEP 31340-670, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Telefone: (31) 9701-2731. E-mail: adrianalas@gmail.com
12 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

I ntroduç ão de déficit cognitivo os idosos com média ≤3,4 no


A capacidade funcional resulta não só da interação entre IQCODE e positivos aqueles com média ≥3,7. No
fatores individuais, culturais e recursos compensató- caso de escores intermediários, eram considerados
rios desenvolvidos por uma sociedade, mas também da positivos idosos com média ≥3,5 em duas ques-
fase de transição epidemiológica em que se encontra. tões de elevado poder discriminatório.6 O questio-
Embora idosos brasileiros sejam mais jovens que os de nário daqueles com suspeita de déficit cognitivo era
países desenvolvidos, têm menor chance de evoluir de respondido com auxílio do acompanhante.
modo saudável. Como ostentam piores índices de esco- Foram considerados casos de dependência os
laridade e renda,1 o acesso a estratégias de prevenção de indivíduos com muita dificuldade ou incapaci-
doenças vasculares e neoplásicas é baixo, além de haver dade para realizar pelo menos uma tarefa da escala
elevada prevalência de doenças neuropsiquiátricas.2,3 BOMFAQ. Foram considerados positivos no rastrea-
Este estudo tem como objetivo caracterizar a saúde mento de depressão, quedas e outros domínios,
de idosos brasileiros avaliando a competência nos domí- respectivamente, os idosos com GDS 15 ≥6, relato
nios físico, cognitivo, emocional e social. A prevalência de quedas nos últimos 12 meses ou respostas posi-
de incapacidades e fatores socioeconômicos e clínicos tivas, pelo menos, a uma pergunta daquele domínio.
associados é investigada e incorporada em um índice de Denominou-se envelhecimento bem-sucedido o
envelhecimento bem-sucedido. perfil dos idosos com rastreamento negativo em
menos de 6 dos 11 domínios avaliados.
Métodos Para a análise dos dados, utilizou-se o Statistical
Package for Social Sciences 12.0. A confiabilidade dos
Área e desenho do estudo
questionários foi aferida pela estatística Kappa. Análise
Este estudo foi realizado na cidade de Ouro Preto
descritiva da avaliação multidimensional foi realizada
(Sudeste do Brasil), que possuía, à época da pesquisa,
em relação às variáveis sociodemográficas. Para a análise
9.287 domicílios e 37.603 habitantes.4 A amostra
univariada, utilizou-se o teste quiquadrado de Pearson
procede de inquérito sobre fatores de risco para
ou teste exato de Fischer. A quantificação das associa-
doenças cardiovasculares, realizado em 2001,5
ções foi obtida por odds ratio. Variáveis estatísticas signi-
quando foram selecionados 930 domicílios por meio
cantes na análise univariada e biologicamente plausí-
de sorteio aleatório simples, estratificado segundo a
veis foram examinadas de forma simultânea, mediante
densidade de domicílios de cada setor censitário. Os
regressão logística múltipla para determinar seu efeito
indivíduos com mais de 60 anos foram convidados
independente, tendo como variável a resposta binária à
para a avaliação geriátrica. De cada domicílio selecio-
dependência para realizar AVDs.
nado foram convidados todos os idosos.
Mais informações sobre a metodologia e análise esta-
Cálculo da amostra tística deste estudo estão descritas em Cândido et al.9
O tamanho da amostra (n = 179) baseou-se nas Houve cumprimento dos princípios éticos contidos
premissas: a) tamanho da população: n = 2.661 idosos na Declaração de Helsinque (2000), e o estudo foi apro-
(mais de 60 anos); b) frequência esperada de incapaci- vado pelo comitê de ética local.
dade: ρ = 66,4%;3 c) erro aceitável: E = 7%; d) nível de
significação estatístico: α= 5%; e) perdas: 10%. R esu ltados
Dos 198 idosos elegíveis, 179 (90,4%) foram incluídos na
Variáveis clínicas
amostra. Dois idosos faleceram e 12 foram excluídos por
O rastreamento de demências foi realizado pelo The
não terem acompanhante. A concordância interobservador
Informant Questionaire on Cognitive Decline in the
variou de 0,4 a 0,7 (p = 0,03) em 90,4% dos itens do questio-
Elderly (IQCODE), versão em português contendo 17
nário. A idade dos idosos variou de 60 a 94 anos; a mediana
questões6 respondidas por um informante que convivia
foi de 67 anos (Tabela 1). A análise estatística foi ponderada
com o idoso há pelo menos 10 anos. A dependência para
por sexo e idade, pois a distribuição da amostra segundo
realizar AVDs foi aferida pelo Older Americans Resources
sexo e idade diferia do esperado, de acordo com o censo mais
and Services Multidimensional Functional Assessment
recente.10 A proporção de mulheres, idosos com 60-69 anos
Questionnaire, versão brasileira (BOMFAQ).7 O ques-
e mais de 80 anos foi de 76%, 68% e 5%, respectivamente
tionário de rastreamento continha ainda a versão curta
(esperado: 61%, 51% e 11%). A maioria dos indivíduos da
da Geriatric Depression Scale (GDS),8 além de perguntas
amostra era de não brancos (70%), de classe econômica
sobre quedas, incontinência urinária, isolamento social,
baixa (59%) e 50% tinham até três anos de escolaridade.
problemas de saúde bucal, visão, audição e práticas de
Na Tabela 2 são apresentadas as prevalências dos 11
rastreamento de neoplasias e imunizações.
domínios avaliados segundo as variáveis sociodemográ-
Definição de caso ficas. Todos os idosos apresentaram problemas em pelo
Foram considerados negativos no rastreamento menos três dos domínios avaliados.
Envelhecimento bem-sucedido e funcionalidade | 13

Tabela 1  Características sociodemográficas da amostra de idosos do município de Ouro Preto, Brasil, 2002
Variáveis sociodemo- Mulheres Homens Total
gráficas n % n % n %
Idade
60-64 55 40,4 17 39,5 72 40,2
65-69 31 22,8 18 41,9 49 27,4
70-74 25 18,4 7 16,3 32 17,9
75-79 17 12,5 0 0,0 17 9,5
80 ou mais 8 5,9 1 2,3 9 5,0
Cor
Branco 46 34,6 7 16,7 53 29,6
Não branco 87 65,4 35 83,3 122 68,2
Indeterminado 04 2,2
Classe econômica
AB 16 12,8 8 19,5 24 13,4
C 30 24,0 14 34,1 44 24,6
DE 79 63,2 19 46,3 98 54,7
Indeterminado 13 7,3
Escolaridade
8 anos ou mais 16 11,9 6 14,3 22 12,3
4 a 7 anos 44 32,6 19 45,2 63 35,2
Menos que 4 anos 75 55,6 17 40,5 92 51,4
Indeterminado 02 1,1

Tabela 2  Prevalência (%) de problemas nos domínios avaliados, de acordo com características sociodemográficas dos idosos residentes em Ouro Preto, 2002
Amostra ponderada N Neo Imune Vi Audi Bucal IU AVD Que So Cog GDS

Total 179 98,8 90,2 90,2 52,9 86,7 63,5 47,7 37,9 73,4 23,6 27,7

Sexo

Homens 71 100,0 91,5 90,1 62,0 84,3 54,9 35,7 29,6 80,4 28,2 12,1

Mulheres 108 98,1 89,0 89,9 47,2 88,9 68,8 55,6 43,5 69,8 21,1 37,2

Faixa etária

60 - 64 53 98,1 84,6 90,6 48,1 88,7 56,6 32,7 32,1 61,4 17,0 27,1

65 - 69 39 97,5 89,7 87,2 55,0 84,6 51,3 48,7 33,3 84,6 33,3 25,8

70 - 74 50 98,0 94,0 89,8 58,0 78,0 88,0 46,0 42,0 82,9 20,0 22,0

75 - 79 18 100,0 88,9 88,9 41,2 94,4 58,8 82,4 52,9 66,7 11,1 43,8

80 ou mais 20 100,0 100,0 100,0 60,0 100,0 50,0 60,0 42,1 72,7 42,1 31,3

Cor

Branco 46 95,7 84,8 87,0 50,0 84,4 63,0 47,8 46,7 70,6 26,1 29,3

Não branco 125 99,2 91,2 91,2 57,6 87,2 66,7 49,6 36,8 72,9 23,2 28,6

Indeterminado 08

Classe econômica

AB 26 96,2 92,3 80,8 44,4 61,5 88,5 50,0 15,4 83,3 30,8 9,5

C 41 100,0 88,1 90,5 63,4 85,4 68,3 45,2 41,5 75,8 22,0 33,3

DE 96 99,0 89,6 92,7 57,3 94,8 62,5 51,0 45,8 69,0 25,0 32,1

Indeterminado 16

Escolaridade

Média 23 95,7 91,3 78,3 34,8 69,6 69,6 43,5 21,7 68,4 13,0 13,6

Baixa 62 98,4 87,1 91,9 61,9 87,3 69,4 42,9 36,5 67,3 21,0 22,2

Muito baixa 87 100,0 91,9 92,0 55,2 90,7 63,2 55,8 46,0 77,0 29,1 40,0

Indeterminado 07

Audi: audição; AVD: atividade da vida diária; bucal: saúde bucal; cog: cognição; GDS: escala de depressão geriátrica; imune: imunização; IU: incontinência urinária; neo: neoplasias;
que: quedas; so: social; vi: visão. Valores em negrito: p < 0,05
14 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

A maioria dos idosos, à época da pesquisa, estava atra- bucal e déficit cognitivo. Observou-se, nos idosos com mais
sada para o rastreamento de neoplasias11 e imunizações.12 de 70 anos, maior chance de incontinência urinária (OR =
Dos idosos que conheciam a pesquisa de sangue oculto nas 2,34; IC 95%: 1,2-4,6; p <0,02) e dependência para realizar
fezes (n = 100), somente 4% o haviam realizado nos últimos AVDs (OR = 1,92; IC 95%: 1,0-3,6; p <0,05).
12 meses, e 34,2% nunca o realizaram. Entre os homens, Tratando-se especificamente dos idosos não brancos,
84,9% não haviam realizado o exame digital da próstata verificou-se maior taxa de problemas no rastreamento de
nos últimos 12 meses e 44,2% deles nunca haviam reali- neoplasias (99,2% x 95,7%), imunizações (91,2% x 84,8%) e
zado a dosagem do antígeno prostático específico. Entre audição (57,6% x 50%), mas menor prevalência de quedas
as mulheres, 44,8% não haviam realizado o exame clínico (36,8% x 46,7%). Comparados aos idosos de classe econô-
da mama nos 12 meses precedentes e 51,1% nunca haviam mica AB, idosos da classe DE apresentavam maior preva-
realizado mamografia; 58,6% não haviam realizado o Papa- lência de problemas, como visão (92,7% x 80,8%), audição
nicolau nos últimos três anos ou nunca realizaram o exame (57,3% x 44,4%), saúde bucal (94,8% x 61,5%; p <0,01),
(31,9%). Entre aqueles com mais de 65 anos, 52,7% nunca quedas (45,8% x 15,4%; p <0,01), possível depressão (32,1%
haviam sido imunizados contra pneumococo. Por outro x 9,5%). Contudo, apresentaram menores índices de incon-
lado, 80,1% da amostra foi imunizada contra febre amarela tinência urinária (62,5% x 88,5%; p <0,03), risco de isola-
e 60,8% contra tétano, nos 10 anos precedentes, e 74% mento social (69,0% x 83,3%) e déficit cognitivo (25% x
foram imunizados contra influenza nos últimos 12 meses. 30,8%). Comparados aos idosos de escolaridade média (>8
A maioria dos idosos apresentava problemas relacionados anos), os de escolaridade muito baixa (<4 anos) apresen-
à visão (90,2%), audição (52,9%) e saúde bucal (86,7%), ou tavam menor prevalência de incontinência urinária (63,2%
seja: 63,2% relataram má visão, 32,8% deixaram de realizar x 69,6%), mas maior prevalência de problemas de visão
atividades por algum dos motivos apontados, 56,6% não (92,0% x 78,3%), audição (55,2% x 34,8%), saúde bucal
haviam consultado o oftalmologista nos 12 meses anteriores, (90,7% x 69,6%; p <0,02), dependência para AVDs (55,8% x
44% relataram dificuldade para ouvir, 69% para entender 43,6%), quedas (46,0% x 21,7%), risco de isolamento social
palavras ao conversar e 31,2% para assistir à TV, ouvir rádio (77% x 68,4%), déficit cognitivo (29,1% x 13%) e possível
ou usar o telefone; 79,4% não se consultavam com o dentista depressão (40% x 13,6%; p <0,05).
há pelo menos 12 meses; 14,2% relataram dor, sangramento Além das variáveis sexo (feminino) e idade (>70 anos), a
ou incômodo na boca ou gengiva e 20,2% deixaram de dependência para realizar AVDs estava associada a problemas
ingerir algum alimento por dificuldade de mastigar. nos domínios visão (p = 0,02), audição (p = 0,01), quedas (p
A incontinência urinária foi queixa de 63,5% dos = 0,01) e cognição (p = 0,001) (Tabela 3). Com essas variá-
idosos, levando 42,1% a sentirem-se incomodados ou veis, desenvolveu-se o modelo de regressão logística múltipla
abandonar alguma atividade. Quase metade (47,7%) (Tabela 4), que revelou presença de associação independente
relatou necessidade de muito auxílio ou incapacidade para entre dependência e idade (>70 anos; duas vezes maior),
realizar pelo menos uma AVD. Mais de um terço (37,9%) sexo (feminino; 2,7 vezes maior), déficit cognitivo (4,5 vezes
relatou queda nos 12 meses anteriores, a maioria fora maior) e problemas de visão (3,7 vezes maior).
do domicílio (53,3%), por escorregar ou tropeçar (70%). Em todas as categorias sociodemográficas, menos da
Destes, 12 (17,6%) sofreram fratura. metade dos idosos apresentava o perfil de envelhecimento
Idosos sem déficit cognitivo foram avaliados quanto bem-sucedido (Tabela 5). Esse perfil foi duas vezes menor
ao risco de isolamento social. Foram considerados posi- entre as mulheres, 10 vezes menor nos idosos entre 75 e 79
tivos 73,4% dos idosos que responderam “nunca” ou anos e 4 vezes menor entre os de escolaridade muito baixa.
“poucas vezes” às seguintes questões: se costumavam Esse dado foi menos prevalente (diferenças não significativas)
recorrer à família quando acometidos por problemas de entre idosos não brancos e de classe econômica mais baixa.
saúde ou emocionais (65,2%), se participavam das deci-
sões importantes da família (33,1%), se costumavam se D isc u ssão
encontrar com amigos, vizinhos ou parentes (24,1%). A manutenção da capacidade funcional terá papel
Foram considerados possíveis casos de déficit cognitivo central na qualidade de vida dos idosos. A baixa resolu-
23,6% dos idosos, e de depressão, 27,7% dos idosos. bilidade das políticas de suporte às famílias que cuidam
Dentre as mulheres, foi menor que a dos homens a de idosos aprofundará a anacrônica demanda por insti-
prevalência de problemas de audição (47,2% x 62%), risco tucionalização.12,13 Diante desse quadro, a hipótese da
de isolamento social (69,8% x 80,4%) e déficit cognitivo compressão da morbidade13 propõe que intervenções
(21,1% x 28,2%). Apresentaram, porém, índices maiores durante a vida adulta e entre idosos mitigariam agravos
que dos homens em incontinência urinária (68,8% x à saúde, preservando o estado funcional e prolongando
54,9%), dependência para realizar AVDs (55,6% x 35,7%; p a expectativa de vida livre de incapacidade. Situa-se aí
<0,02), quedas (43,5% x 29,6%) e possível depressão (37,2% a relevância deste estudo. Os dados coletados demons-
x 12,1%; p <0,01). Dos idosos com mais de 80 anos, foram traram que, embora imprescindíveis para reduzir a
mais prevalentes os problemas de visão, audição, saúde mortalidade, os idosos não realizavam rastreamento de
Envelhecimento bem-sucedido e funcionalidade | 15

Tabela 3  Variáveis clínicas associadas à dependência para realizar AVDs na população de Ouro Preto, 2002

Sem dependência Com dependência


Variáveis OR (IC 95%) Valor-p
n n

Déficit visual

Sim 79 82 4,84 (1,24-22,13) 0,018

Não 14 03 1,00

Déficit audição

Sim 40 55 2,40 (1,26-4,57) 0,006

Não 54 31 1,00

Incontinência urinária 0,396

Sim 56 58 1,37 (0,71-2,65)

Não 37 28 1,00

Quedas 0,005

Sim 26 42 2,55 (1,31-4,99)

Não 68 43 1,00

Isolamento social 0,709

Sim 61 39 0,80 (0,35-1,85)

Não 20 16 1,00

Déficit cognitivo 0,001

Sim 12 30 3,73 (1,66-8,49)

Não 82 55 1,00

Sintomas depressivos 0,139

Sim 20 23 1,82 (0,84-3,94)

Não 68 43 1,00

Tabela 4  Análise multivariada de regressão logística para estimativa do UDN Rádio e cálculo do intervalo de confiança, contendo as variáveis
associadas com a presença de dependência para realizar AVD nos idosos de Ouro Preto, 2002

Odds ratio brute (95% CI) Odds ratio adjusted (95% CI)

Idade >70 anos 1,92 (1,01-3,63) 1,97* (1,03 - 3,77)

Sexo feminino 2,25 (1,16-4,39) 2,68* (1,36 - 5,27)

Déficit cognitivo 3,73 (1,66-8,49) 4,50* (1,96 - 10,32)

Déficit visão 4,84 (1,24-22,13) 3,72* (1,06 - 13,10)

*p <0,05; odds ratio >1,0 significa associação com a variável resposta (dependência em AVD); Modelo multivariado ajustado pelas variáveis significativas da análise univariada
a

neoplasias, não estavam imunizados contra pneumonia para realizar AVDs e risco de isolamento social.
e, em outro braço do estudo, apresentavam as maiores Uma intrincada rede causal engloba essas síndromes.
prevalências de fatores de risco cardiovascular.14 Assim, incontinência urinária pode levar a isolamento
Com efeito, este estudo procurou retratar o processo social e depressão;15 quedas podem aumentar a depen-
de envelhecimento nos países em desenvolvimento, nos dência para realizar AVDs ou serem consequências
quais populações de idosos são mais jovens e pertencem de um estado funcional precário.16 Na verdade, trata-
a classes econômicas e escolaridade baixas.12,13 Além se de um círculo vicioso: déficits de visão favorecem
disso, estão expostos a condições de vida precárias, como quedas17 e déficits de audição associam-se ao isolamento
saneamento, infraestrutura, acessibilidade e escassez de e depressão.18 De fato, este estudo demonstrou que
recursos para a saúde. Embora relativamente jovens, problemas de audição e visão, déficit cognitivo e quedas
os idosos da amostra realmente apresentavam elevada associam-se à necessidade de auxílio para realizar AVDs.
prevalência de problemas comuns em idosos mais Os dados aqui tratados assemelham-se aos obtidos em
velhos, como incontinência urinária, quedas, sintomas outro estudo,19 no qual a complexa rede causal, incluindo
de depressão, déficits de visão e audição, dependência idade, escolaridade, déficit cognitivo, má visão e isola-
16 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Tabela 5  Distribuição dos idosos segundo o perfil de envelhecimento bem-sucedido e fatores sociodemográficos nos idosos de Ouro Preto, 2002

Envelhecimento bem-sucedido Valor p OR (IC 95%)

Presente Ausente
N % N %

Sexo

Homens 25 35,2 46 64,8 1,00

Mulheres 22 20,2 87 79,8 <0,04 2,15 (1,0-4,5)

Faixa Etária

Abaixo 65 19 35,8 34 64,2 1,00

65 - 69 10 25,6 29 74,4 0,42 1,62 (0,6-4,5)

70 - 74 10 20,0 40 80,0 0,12 2,24 (0,8-6,0)

75 - 79 1 5,6 17 94,4 <0,04 9,5 (1,2-206,2)

80 ou mais 6 31,6 13 68,4 0,96 1,21 (0,4-4,3)

Cor

Branco 12 26,1 34 73,9 1,00

Não branco 28 22,2 98 77,8 0,74 1,24 (0,5-2,9)

Classe econômica

AB 9 33,3 18 66,7 1,00

C 9 22,0 32 78,0 0,45 1,78 (0,5-6,1)

DE 18 18,9 77 81,1 0,18 2,14 (0,7-6,1)

Escolaridade

8 anos ou mais 10 43,5 13 56,5 1,00

4 a 7 anos 16 25,4 47 74,6 0,18 2,26 (0,7-6,9)

Menos que 4 anos 14 16,1 73 83,9 <0,02 4,01 (1,3-12,3)

mento social, associou-se ao declínio funcional. evidenciaram que a chance de necessidade de auxílio para
Com relação à dependência para realizar as AVDs, este realizar AVDs é 2,4 vezes maior nesse caso. A presbiacusia
estudo verificou, mediante exame médico, que as princi- poderia não só prejudicar mecanismos de compensação dos
pais causas de dependência eram os problemas de mobi- déficits de outros domínios como ser também o determi-
lidade (68,6%), saúde mental (34,3%) e ganho de peso nante principal da dependência funcional de alguns idosos.
(30,4%). A propósito, analisando estudos populacionais Acerca da saúde bucal, embora menos de 15% dos idosos
recentes, Fries13 concluiu que os anos de vida saudáveis, se queixasse de sintomas bucais, 1/5 deles já restringia o
potencialmente ganhos pela redução do hábito de fumar, uso de alguns alimentos por dificuldades de mastigação,
têm sido compensados pelas desvantagens associadas ao um déficit funcional. O fato de 4/5 dos idosos não terem
estilo de vida sedentário e ao aumento da prevalência do se consultado com o dentista nos 12 meses anteriores à
sobrepeso e obesidade (que já atingem 30,2% dos homens pesquisa sugere dificuldade de acesso aos serviços odonto-
e 50,2% das mulheres entre os idosos brasileiros).20 lógicos ou autopercepção inadequada da saúde bucal.23
Já a prevalência de problemas no domínio da visão foi No que tange ao instrumento utilizado para avaliar
superior à de outros inquéritos brasileiros.14,19 Embora 2/3 a presença de déficit cognitivo, é interessante ressaltar
da amostra realmente referissem má visão, a prevalência que os resultados do IQCODE não estavam associados
dela possivelmente é mais acurada, pois foram considerados à escolaridade e apresentaram boa concordância quando
positivos idosos que não compareceram à consulta oftal- repetidos (kappa = 0,61; p = 0,01). Ao contrário do
mológica nos 12 meses anteriores. Além do mais, inqué- miniexame do estado mental,24 o IQCODE já demons-
ritos baseados na autopercepção da saúde subestimam a trou ser adequado para rastreamento de demência em
prevalência de doenças assintomáticas (como glaucoma e populações com baixo nível de escolaridade.6
retinopatias) que aumentam com o envelhecimento.21 Este Por fim, cabe ressaltar que, apesar da idade relativamente
estudo sugere ainda a dificuldade de acesso à avaliação baixa da população, a proporção de idosos que relatou
oftalmológica comum nos países em desenvolvimento.22 quedas assemelha-se à observada internacionalmente.25 As
Com referência às consequências da presença de quedas frequentemente são um marcador de fragilidade. A
problemas no domínio da audição, os dados deste estudo elevada frequência de quedas observada corrobora a hipó-
Envelhecimento bem-sucedido e funcionalidade | 17

tese discutida anteriormente de que o envelhecimento da envelhecer com fragilidade pode ser mais grave nessa popu-
população idosa se associa a elevado risco – potencialmente lação, da qual dois de cada três idosos poucas vezes ou nunca
reversível – de agravos como fraturas, neoplasias, pneumo- recorrem à família quando acometidos de problemas de
nias e doenças cerebrovasculares. saúde ou emocionais. Esse dado surpreendente coloca em
Conclui-se também que cerca de 2/3 dos homens e 4/5 das cheque a visão de que demandas associadas ao envelheci-
mulheres apresentavam problemas em pelo menos seis domí- mento populacional nos países em desenvolvimento pode-
nios, caracterizando a polipatologia precursora da fragilidade. riam ser contempladas pelos fortes elos familiares, o que
Considerado neste estudo como ausência de problemas em alerta para a necessidade crescente de sistemas de suporte
múltiplos domínios, o envelhecimento bem-sucedido parece formais que suplementem o cuidado familiar.
ser uma prerrogativa de idosos do sexo masculino, mais A comparação dos instrumentos de avaliação rela-
jovens ou de melhor escolaridade (Tabela 5). Na realidade, tivos à dependência nas AVDs ampliou as possibilidades
esses resultados podem refletir um viés de mortalidade:2,25 por de escolha do instrumento ideal para a população geral.
serem mais frágeis, os homens faleceriam precocemente; as A utilização de um instrumento com melhor reproduti-
mulheres sobreviveriam com incapacidades.26,27 A associação bilidade interobservador e intraobservador, adequado e
independente entre sexo feminino e necessidade de auxílio validado para a nossa população, que consiga englobar os
para realizar AVDs ou possível depressão reforça essa hipó- domínios que estão diretamente relacionados à indepen-
tese.28 Digno de nota é o fato de que, na população estudada dência e à autonomia do idoso, traduz com maior fide-
aqui, as mulheres parecem usufruir mais dos escassos serviços dignidade a saúde dessa população. Verificou-se, porém,
públicos de saúde, como o rastreamento de neoplasias, o que que a confiabilidade dos questionários pode ser mais bem
certamente contribui para a sua longevidade. avaliada por outros estudos, adequando o tempo entre o
A associação entre envelhecimento bem-sucedido e intervalo das repetições dos instrumentos a uma duração
maior escolaridade possivelmente se relaciona com o perfil que minimize o surgimento de condições agudas que
favorável dos idosos de maior renda, observado em quase interfiram na percepção de capacidade do próprio idoso.
todos os domínios. A associação inversa entre envelheci- Embora este estudo tenha sido realizado em 2001,
mento bem-sucedido e classe econômica baixa não alcançou estudos atuais poderão corroborar a situação nos dias de
significância estatística. Entretanto, o grupo pesquisado hoje e verificar a adequação do instrumento.
apresentou desvantagens nos domínios da visão, audição,
saúde bucal, depressão, quedas e dependência acentuada. C O N C L U S ÃO
A elevada proporção de idosos imunizados contra
tétano, febre amarela e influenza – vacinas gratuitas nas Os idosos apresentam elevada prevalência de problemas
campanhas –, mas não contra pneumonia, é um indício de saúde. A maior expectativa de vida em mulheres não se
da importância do Estado na redução da desvantagem associou a ganho de expectativa de vida livre de incapaci-
dos idosos de menor renda. dade. O envelhecimento bem-sucedido pode ser privilégio
Em última análise, este estudo sugere que o envelheci- de classes mais favorecidas.
mento bem-sucedido será privilégio dos grupos de maior
renda, como já observado em outros países.29,30 Portanto, para
idosos relativamente jovens, mas que apresentem elevada C onflito de interesse
prevalência de fatores de risco para dependência, as chances Os autores declaram não possuir nenhum conflito de
de envelhecimento saudável são menores. A perspectiva de interesse na sua realização e Públicação.

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Artigo
Capacidade funcional original
em idosos | 19

Fatores associados à perda da


capacidade funcional em idosos
em município no sul do país

Adriana Moraes dos Santosa, Selma Francob,


Marco Antonio Moura Reisc

Res umo
Palavras‑chave Objetivos: O presente estudo objetivou avaliar a capacidade funcional, identificar os fatores associados à depen-
Saúde do idoso, dência para a realização das atividades instrumentais da vida diária (AIVD) e descrever o perfil sociodemográfico
envelhecimento, e de saúde dos idosos. Métodos: Trata-se de um estudo transversal realizado com idosos residentes em Joinville
atividades (SC). Foi aplicado um questionário para obtenção dos dados e utilizada a escala de Lawton para a avaliação da capa-
cotidianas. cidade funcional. Para a análise estatística utilizou-se o teste qui-quadrado, considerando-se o nível de significância
de 0,05. Resultados: A amostra foi composta por 935 idosos, sendo 57,3% do sexo feminino, 57,9% na faixa etária
entre 60 e 69 anos, 26,2% analfabetos, 57,4% vivendo em união estável, 84,3% sem exercer atividade remunera-
da e 98,1% com algum problema de saúde autorreferido. Observou-se que 73,2% não possuíam plano de saúde.
Verificou-se que 49,2% apresentaram algum grau de dependência para realizar as AIVD. Conclusões: Os fatores
associados à dependência foram analfabetismo, não ser casado, idade, hipertensão, diabetes, cardiopatia, pneumo-
patia, câncer, problemas de memória, incontinência urinária, incontinência fecal, quedas e qualidade de vida. Esses
resultados apontam que o grupo estudado caracteriza-se por população de idosos jovens, usuários do Sistema Único
de Saúde, com múltiplas comorbidades, quase a metade apresentando algum prejuízo na capacidade funcional. As-
sim, o sistema de saúde necessita compreender a realidade desses idosos, a fim de identificar as possíveis situações
de risco para dependência e planejar de forma adequada o atendimento integral.

Factors related to functional capacity of Elderly people – a


study in a south brazilian city
ABS T RACT
Keywords Objectives: The present study aimed (1) to assess the functional capacity, (2) to identify factors associated with dependency
Health of in the achievement of instrumental activities of daily living (IADL) and (3) to describe the sociodemographic and health profi-
the elderly, les of the elderlies. Methods: A cross-sectional study was carried with elderly people who live at Joinville (SC). A questionnai-
aging, activities re was applied in order to obtain sociodemographic data, health condition and functional capacity evaluated by Lawton’s scale.
of daily living. Statistical analysis was performed using the Chi Square test at significance level of 0.05. Results: The sample was composed
of 935 elderly people: 57.3% females, 57.9% aged between 60 and 69 years old, 26.2% illiterate, 57.4% living in stable union,
84.3% without exerting remunerated activity and 98.1% with some self-referred health problem. It was noted that 73.2% of
them lack any health plan. And 49.2% presented some degree of dependency to accomplish the IADL. The factors associated
with the dependency were illiteracy, not being married, age, hypertension, diabetes, heart disease, cancer, respiratory disease,
memory problems, urinary incontinence, fecal incontinence, falls and quality of life. Conclusion: These results suggest that
the studied group is characterized by a population of elderly people, users of the health system, with multiple comorbidities,
nearly half presented some reduction of functional capacity. So the health system needs to be aware of the reality of these
elderly people, in order to identify the potential risk situations for dependency and adequately plan a comprehensive care.

a
Mestre em saúde e meio ambiente pela Universidade da Região de Joinville (Univille).
b
Pós-doutora pela Universitat Rovira i Virgili, Espanha.
c
Doutor em ciências (Patologia e Informática Médica), Universidade de São Paulo (USP).

Dados para correspondência


Adriana Moraes dos Santos – Rua Jacob Eisenhuth, 512/504, CEP 89203070, Joinville – SC, Brasil.
E-mail: adrimed24@hotmail.com
20 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

I ntroduç ão por Lawton e Brody,15 e compreende a capacidade de


A mudança observada nas últimas décadas, no perfil realizar tarefas, como utilizar meios de transporte, mani-
demográfico e epidemiológico da população brasileira, pular medicamentos, realizar compras, utilizar o tele-
exige especial atenção à saúde da população idosa, que fone, preparar refeições e cuidar das próprias finanças.
poderá chegar a 30 milhões de pessoas em 2025.1-3 Uma adaptação da escala de Lawton realizada posterior-
O governo brasileiro tem formulado políticas e dire- mente propôs a classificação do idoso em dependente e
trizes para promover a inclusão desse grupo popula- independente, e vem sendo a mais utilizada atualmente.16
cional como prioridade assistencial.4,5 Entretanto, apesar As AVD e as AIVD podem ser avaliadas isoladamente
de ter avançado nas políticas públicas dirigidas a esse ou de forma combinada, entretanto as AIVD parecem
grupo, ainda não conseguiu efetivar com integralidade a ser mais sensíveis na detecção precoce de processos
assistência aos idosos. demenciais por se tratar de tarefas mais complexas.17,18
O envelhecimento populacional traz uma mudança Por serem instrumentos de aplicação prática que podem
na prevalência das doenças, gerando aumento das ser utilizados até mesmo no ambiente domiciliar, as escalas
doenças cronicodegenerativas e da incapacidade de Katz e de Lawton tornaram-se as ferramentas mais
funcional, demandando uma reorganização social e da usadas para a avaliação da capacidade funcional em idosos.
área de saúde para atender às necessidades dessa popu- Estima-se que a população idosa funcionalmente
lação e configurando um desafio para a saúde pública.6,7 incapacitada aumentará nas próximas décadas, e o
As condições de saúde da população idosa podem ser número de pessoas idosas dependentes para as AVD
determinadas por diversos fatores, entre eles renda, perfis dobrará na segunda ou terceira década deste século.
de morbimortalidade, presença de déficits físicos e cogni- Assim, urge instituir a avaliação sistemática da capa-
tivos, uso diário de medicamentos e frequência na utilização cidade funcional em idosos para – por meio das polí-
dos serviços de saúde. A avaliação da capacidade funcional ticas sociais e de saúde dirigidas – promover e manter
é um dos grandes marcadores da saúde dos idosos e vem a habilidade funcional, propiciando um envelhecimento
emergindo como componente-chave para a avaliação da saudável pelo sistema adequado de suporte social para a
saúde dessa população.8,9 Capacidade funcional pode ser população idosa.1,4,15
conceituada como sendo o grau de preservação no desem- Condições de saúde, sexo, idade, escolaridade, nível
penho de determinados gestos e atividades da vida coti- socioeconômico, presença de doenças crônicas degenera-
diana, ou seja, para os idosos o potencial que apresentam tivas, depressão, déficit cognitivo e quedas são fatores que
para decidir e atuar em sua vida de forma independente. têm sido associados ao declínio da capacidade funcional.19,20
Prejuízos dessa capacidade levam a aumento da depen- A capacidade funcional é uma condição multifatorial,
dência do indivíduo no seu dia a dia e na sua relação com o sofrendo efeitos de fatores demográficos, sociais, econô-
meio social, trazendo diminuição da qualidade de vida.10,11 micos, epidemiológicos e comportamentais. Dessa forma,
Existem vários instrumentos disponíveis, como escalas a ampliação de conhecimentos sobre os fatores asso-
e questionários, para mensurar a capacidade funcional ciados à incapacidade funcional em diferentes contextos
dos indivíduos idosos, entretanto não existe um método pode ajudar no desenvolvimento de estratégias, a fim de
padrão-ouro definido. O tipo de instrumento utilizado postergar o declínio da capacidade e seus agravos.
depende da disponibilidade de informações e dos obje- Estudos apontam que tanto o envelhecimento quanto
tivos de sua aplicação, seja em uma pesquisa, seja para o acúmulo de morbidades a ele associado podem ser úteis
fins clínicos.12 Os indicadores mais utilizados e conside- na predição de futura incapacidade funcional, sugerindo
rados válidos e confiáveis pela comunidade científica para forte relação entre coronariopatias, artropatias, doença
a avaliação da capacidade funcional são as atividades da pulmonar, hipertensão arterial e a diminuição da capa-
vida diária (AVD) e as atividades instrumentais da vida cidade funcional.6,11,21 Também a ocorrência de quedas
diária (AIVD).10,12,13 As AVD consistem na realização de tem sido citada como fator associado à perda da capaci-
tarefas de autocuidado, como tomar banho, alimentar-se, dade funcional. Sabe-se que o equilíbrio e a mobilidade
vestir-se, mobilizar-se, deambular, ir ao banheiro, manter podem estar prejudicados em idosos por uma série de
controle sobre suas necessidades fisiológicas. A primeira fatores associados a doenças crônicas, uso de medi-
ferramenta desenvolvida foi a escala de Katz, planejada camentos, distúrbios neurossensoriais, entre outros,
para medir a habilidade da pessoa em desempenhar suas podendo representar um fator de risco para quedas.22
atividades cotidianas de forma independente e, assim, A política para o envelhecimento ativo proposta pela
determinar as necessárias intervenções de reabilitação.14 Organização Mundial da Saúde (OMS) visa otimizar a
As AIVD consistem na realização de tarefas mais saúde dos idosos, a fim de melhorar a qualidade de vida à
complexas, relacionadas à participação do idoso em seu medida que as pessoas envelhecem. Portanto, é necessário
meio social, e indicam a capacidade de um indivíduo conhecer os fatores relacionados de forma direta com a
levar uma vida independente dentro da comunidade. A qualidade de vida dos idosos para detectar precocemente
escala utilizada para mensurar as AIVD foi desenvolvida os casos que necessitam de vigilância e acompanhamento,
Capacidade funcional em idosos | 21

prevenindo assim os fatores de risco que aceleram o O instrumento de coleta de dados foi um questio-
processo incapacitante. Quando se avalia a funcionalidade nário estruturado com 27 perguntas que abordavam
dos idosos pode-se determinar o grau de dependência que aspectos sociodemográficos, condições de saúde e utili-
poderá definir os cuidados específicos necessários para o zação dos serviços de saúde.
atendimento desses pacientes. Quanto maior o grau de Para avaliação da capacidade funcional foi utilizada
dependência da pessoa idosa, maiores serão as necessi- a escala de Lawton modificada por Freitas et al.,16 que
dades dela e, por consequência, maior o impacto finan- avalia as AIVD e classifica como independente o idoso
ceiro para a família e para o sistema de saúde. que apresenta Lawton igual a 27 pontos e dependente
Algumas lacunas ainda permanecem no conheci- aquele que apresenta pontuação menor que 27.
mento sobre os fatores determinantes da capacidade A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em
funcional em nosso país, como a influência do nível Pesquisa da Univille (processo no 62/09).
socioeconômico, de aspectos culturais e do contexto Os dados dos questionários foram transcritos para
assistencial do Programa de Saúde da Família. Estudos um banco de dados criado no MS-Excel (v. 2003). Para
multicêntricos de base domiciliar em diferentes municí- garantir a qualidade da transcrição, após serem digitados
pios poderiam propiciar esse conhecimento. O presente os dados de cada questionário foram conferidos por outro
estudo teve como objetivos avaliar a capacidade funcional digitador. Para a análise estatística dos dados utilizaram-
de idosos, descrever o perfil sociodemográfico e identi- se os softwares EpiInfo (v. 6.04) e SPSS (v. 13.0).
ficar os fatores associados à dependência. Acredita-se Para a apresentação das características gerais da
que os resultados poderão fornecer subsídios para um amostra foram utilizados a média e o desvio-padrão para
redimensionamento das ações de saúde voltadas para as variáveis quantitativas contínuas e a análise de frequên-
esse grupo populacional com base no princípio da inte- cias (absoluta e relativa) para as variáveis qualitativas.
gralidade do atendimento em saúde. Na análise preliminar dos dados por histograma e
teste de Kolmogorov-Smirnov, observou-se a inexis-
Métodos tência de distribuição normal ou simétrica para a variável
Trata-se de um estudo transversal, do tipo inquérito dependente (escore de Lawton), o que fundamentou sua
domiciliar, realizado com pessoas com idade igual ou descrição pelo uso da mediana e intervalo interquartil
superior a 60 anos, atendidas por equipes que atuam em e a aplicação de estatística não paramétrica pelo qui-
unidades de saúde da família localizadas no município quadrado (e teste exato de Fisher, quando aplicável) para
de Joinville, no Estado de Santa Catarina, entre os meses o estudo da associação bivariada entre esse desfecho e as
de maio e Outubro de 2009. variáveis independentes. Para tanto, o escore de Lawton
As unidades utilizadas como ambiente de pesquisa foi categorizado para fins de descrição da amostra como
foram selecionadas por conveniência, com base no “dependência total” (Lawton = 9), “dependência parcial”
acesso facilitado ao campo de pesquisa e na disponibili- (9> Lawton <27) ou “independência” (Lawton = 27).
dade de informações cadastrais básicas dos clientes e de Para fins de análise de associação com outras variáveis,
equipe qualificada para a coleta de dados. Tais unidades o mesmo escore foi também categorizado em “depen-
situam-se na periferia do município e oferecem cober- dente” (Lawton <27) ou “independente” (Lawton = 27).
tura assistencial a um total de 16.214 habitantes e 945 Já a variável idade, por apresentar distribuição próxima
idosos cadastrados, em áreas de maior vulnerabilidade da normalidade, teve sua associação com a variável
social e dificuldades de acesso aos serviços urbanos e aos dependente verificada pelo teste t para amostras inde-
serviços de saúde de média e alta complexidade. Foram pendentes, mas também por testes não paramétricos,
selecionadas por serem locais de práticas de ensino dos de forma categorizada por faixas etárias, para fins de
alunos do curso de Medicina da Universidade de Join- melhor compreensão. Para fins de estatística analítica,
ville (Univille) e possuírem preceptores que supervi- foi considerado o nível de significância de 0,05.
sionam as atividades acadêmicas e de pesquisa. Considerado o desfecho de resposta binária, optou-se
Um estudo piloto prévio foi realizado em pequena pela aplicação de modelo de regressão logística na análise
amostra da população não pertencente ao estudo, para multivariada, com a inclusão, em bloco único, das variá-
ajustar o vocabulário e esclarecer as possíveis dúvidas veis independentes que apresentavam p ≤0,10 na análise
dos entrevistadores. bivariada. O teste de Wald foi utilizado para avaliar a
A coleta ocorreu nos domicílios dos idosos, durante contribuição individual das variáveis para o desfecho, e
as visitas mensais dos agentes comunitários de saúde e a chance de ocorrência do desfecho com a alteração dos
foi realizada por 20 acadêmicos de Medicina, treinados e preditores foi avaliada pela razão das chances e seu respec-
supervisionados pelo pesquisador. Considerou-se como tivo intervalo de confiança. Os testes Omnibus (p <0,05) e
perda o caso do idoso não ser encontrado após três de Hosmer e Lemeshow (p ≥ 0,05) foram utilizados para
visitas sucessivas. Foram também excluídos do estudo os verificar a vantagem da aplicação do modelo final, em
idosos com incapacidade de comunicação. comparação com o acaso, para explicar a relação entre a
22 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

variável dependente e as independentes. A análise de resí- Apesar de a maioria dos idosos ser alfabetizada
duos foi utilizada para verificar a eficácia do modelo de (73,8%), destacou-se a existência de uma parcela impor-
regressão em explicar as associações na amostra estudada. tante de idosos analfabetos (26,2%). A maioria não desen-
volvia qualquer tipo de atividade remunerada (84,3%) e
Análise da representatividade da amostra
não possuía cobertura de plano privado de saúde (73,2%).
Na tentativa de estimar as diferenças entre a amostra e a
Com relação às condições de saúde autorreferidas,
população idosa de Joinville e consubstanciar a discussão
observou-se que a grande maioria (98,1%) relatou
acerca das limitações do processo amostral utilizado com
algum problema de saúde (Tabela 2). Dentre os prin-
relação à generalização dos resultados, foram comparadas
cipais problemas relatados, os mais frequentes foram
a posteriori algumas das características gerais da amostra
hipertensão arterial, diabetes, problemas cardíacos,
com aquelas disponíveis da população idosa do muni-
problemas pulmonares, problemas de memória,
cípio, segundo dados públicos do último censo popula-
incontinência urinária e câncer. A ocorrência de
cional (IBGE, 2010). Os dados disponíveis permitiram a
quedas no último ano foi relatada por menos de um
comparação das seguintes características: gênero, distri-
quinto dos indivíduos entrevistados.
buição por faixa etária e frequência de analfabetismo.
Tabela 2  Perfil de saúde dos idosos. Joinville, 2009 (n=935)
Resultados Características N %
Dos 945 sujeitos elegíveis para o estudo, 10 foram consi-
Problemas de saúde
derados como perdas e nenhum outro recusou-se a
Sim 935 98,1
participar do estudo.
Não 18 1,9
Foram incluídos no estudo 935 idosos, cujas caracte-
Hipertensão
rísticas sociodemográficas são mostradas na Tabela 1. Os
idosos participantes do estudo estavam na faixa etária entre Sim 631 67,5

60 e 96 anos, com idade média de 69,2 anos (DP = 7,2). Não 304 32,5

Observou-se predomínio do gênero feminino (57,3%) e de Diabetes

indivíduos casados ou vivendo em união estável (57,4%). Sim 219 23,4

Apenas 9,7% dos indivíduos moravam sozinhos. Não 716 76,6


Problema cardíaco
Sim 122 13,0
Tabela 1  Características socioeconômicas e demográficas dos idosos. Não 813 87,0
Joinville, 2009 (n=935) Problema pulmonar
Variáveis N % Sim 122 13,0
Gênero Não 813 87,0
Feminino 536 57,3 Câncer
Masculino 399 42,7 Sim 62 6,6
Faixa etária Não 873 93,4
60-69 anos 541 57,9 Problema de memória
70-79 anos 288 30,8 Sim 354 37,9
80 ou mais anos 106 11,3 Não 581 62,1
Estado civil Incontinência urinária
União estável 537 57,4 Sim 106 11,3
Solteiro 398 42,6 Não 829 88,7
Situação familiar Incontinência fecal
Moro sozinho 16 12,8 Sim 37 4,0

Moro acompanhado 30 24,0 Não 898 96,0

Escolaridade Ocorrência de quedas no último ano

Analfabeto 245 26,2 Sim 158 17,1

Alfabetizado 690 73,8 Não 766 82,9

Exerce atividade remunerada Uso diário de medicamentos

Sim 145 11,9 Sim 755 80,7

Não 890 15,7 Não 180 19,3

Possui plano de saúde suplementar Dependência para AIVD

Sim 251 26,8 Sim 460 49,2


Não 684 73,2 Não 475 50,8
Capacidade funcional em idosos | 23

Quanto ao uso de medicamentos, a maioria dos formada foram excluídos dessa fase de análise
idosos (80,7%) relatou fazer uso diariamente. Apenas devido à intrínseca relação dessas variáveis com o
12,6% dos entrevistados referiram ter sido hospitali- desfecho estudado (Tabela 5).
zados nos 12 meses anteriores à entrevista.
Na avaliação da capacidade funcional por meio da apli- Tabela 4  Perfil de saúde dos idosos e capacidade funcional. 2009 (n = 935)
cação da escala de Lawton, 49,2% dos idosos apresentavam- Características Dependência Independência p
se com algum grau de dependência (Lawton <27) para as Hipertensão 0,021
atividades cotidianas. A mediana do escore de Lawton foi Sim 327 51,82% 304 48,18%
de 27 (intervalo interquartil = 4).
Não 133 43,75% 171 56,25%
A comparação entre idosos dependentes (Lawton
Diabetes 0,041
< 27) e independentes (Lawton = 27), com relação às
Sim 121 24,30% 377 75,70%
variáveis sociodemográficas, mostrou diferença esta-
tisticamente significativa para os idosos de mais idade, Não 339 77,57% 98 22,43%

solteiros, analfabetos, sem atividade remunerada e com Problema de coração 0,005


pior qualidade de vida relatada (Tabela 3). Sim 308 46,25% 358 53,75%

Não 152 56,51% 117 43,49%


Tabela 3  Características dos idosos e capacidade funcional. Joinville, Problema pulmonar 0,012
2009 (n=935)
Sim 73 59,84% 49 40,16%
Características Dependência Independência p
Não 387 47,60% 426 52,40%
n=460 % n=475 %
Câncer 0,049
Sexo 0,173
Sim 38 61,29% 24 38,71%
Feminino 274 51,12 262 48,88
Não 422 48,34% 451 51,66%
Masculino 186 46,62 213 53,38 Problema de memória 0,033
Faixa etária <0,001 Sim 270 46,47% 311 53,53%
60-69 anos 201 37,15 340 62,85 Não 190 53,67% 164 46,33%
70-79 anos 172 59,72 116 40,28 Incontinência urinária <0,001
80 ou mais anos 87 82,08 19 17,92 Sim 74 69,81% 32 30,19%
Estado civil 0,044 Não 386 46,56% 443 53,44%
Solteiro ou viúvo 211 53,02 187 46,98 Incontinência fecal <0,001

União estável 249 46,37 288 53,63 Sim 30 81,08% 7 18,92%

Situação familiar 0,351 Não 430 47,88% 468 52,12%

Moro sozinho 49 53,85 42 46,15 Quedas <0,001

Moro acompanhado 411 48,70 433 51,30 Sim 102 64,56% 56 35,44%

Escolaridade <0,001 Não 352 45,95% 414 54,05%

Analfabeto 146 59,59 99 40,41 Hospitalizações 0,207

Alfabetizado 314 45,51 376 54,49 Sim 64 54,70% 53 45,30%

Atividade remunerada <0,001 Não 394 48,46% 419 51,54%

Sim 37 25,52 108 74,48

Não 417 53,39 364 46,61


Qualidade de vida <0,001 Tabela 5  Resultado final da regressão logística entre a dependência e
Boa 225 42,45 305 57,55 as variáveis independentes, 2009
Regular 195 54,93 160 45,07 Variáveis B Wald p RC IC 95% RC
Ruim 37 78,72 10 21,28 Analfabeto 0,432 6,929 0,008 1,540 1,117-2,125

Incontinência
Com relação ao perfil de saúde, observou-se-que a depen- urinária 0,765 9,640 0,002 2,149 1,326-3,484
dência esteve associada com todos os problemas referidos Incontinência
pelos idosos, exceto com as hospitalizações (Tabela 4). fecal 1,041 5,231 0,022 2,833 1,161-6,915
Na análise multivariada por regressão logística, Quedas 0,587 9,086 0,003 1,798 1,228-2,632
restaram significativamente associadas com a Idade 0,094 73,662 0,000 1,099 1,075-1,123
dependência as variáveis idade, analfabetismo,
incontinência urinária, incontinência fecal e o Constante -6,85 82,46 0,000 0,001

relato de quedas. Ressalte-se que o exercício de RC: razão das chances; IC 95% RC: intervalo de confiança de 95% da razão das
atividade remunerada e a qualidade de vida autoin- chances; Wald: teste de Wald
24 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Ao serem comparadas as características da amostra Nesses estudos foi evidenciado predomínio de mulheres
estudada com as da população de idosos de Joinville, entre os indivíduos com perda da capacidade funcional,
segundo dados do IBGE (2010), verificou-se haver possivelmente devido à maior expectativa de vida
menor proporção de idosos na amostra (5,4% versus das mulheres e, portanto, maior risco de desenvolver
8,8%, p <0,001). A amostra foi semelhante à do muni- doenças crônicas incapacitantes do envelhecimento.3,23
cípio quanto ao gênero e à distribuição dos idosos por A escala de Lawton se mostrou um instrumento passível
faixa etária, porém observou-se maior taxa de analfabe- de ser aplicado com certa facilidade na AP, permitindo a
tismo na amostra (26,2% versus 9,3%, p <0,001). identificação de pacientes com evidências de perda da capa-
cidade funcional e, a partir disso, a elaboração de um plane-
D iscuss ão jamento individual e coletivo para a manutenção da melhor
Considerando-se as características da subpopulação qualidade de vida possível. Considerando que os gastos com
estudada, residente em área de baixa renda, o achado de a saúde, em especial aqueles relativos aos agravos dos idosos
que seus idosos, em sua maioria, não exercem atividade com dependência, representam uma grande parcela despen-
remunerada e moram com algum familiar é importante dida pelo sistema de saúde, investir no âmbito do diagnós-
para o planejamento da sua inserção em programas tico precoce, dentro das equipes de AP, por intermédio de
e estratégias de prevenção e assistência à saúde, pois a métodos simples como é a escala de Lawton, poderia repre-
evidência de que vivem em um contexto familiar e em sentar uma economia para o sistema e benefícios em saúde
domicílios multigeracionais permite abordagem sistê- para os idosos. Essa é uma área de pesquisa que ainda não está
mica e familiar para que sejam atingidos todos os níveis suficientemente explorada em nosso país e mesmo em países
de prevenção e promoção da saúde. desenvolvidos. Estudos de prevalência da dependência em
Apesar de a maioria dos idosos ser alfabetizada, idosos são escassos no mundo todo.28 Os autores referem que
observou-se importante contingente de analfabetos estudos europeus e norte-americanos vêm sendo realizados
(26,2%), em proporção maior que a do município (9,3%), com maior frequência em pacientes institucionalizados, mas
consideradas as diferenças metodológicas entre o presente ainda são pouco aplicados na APS. Estudos populacionais de
estudo e o censo do IBGE. Tal diferença pode ser justificada rastreio para indentificar pacientes com déficit na capacidade
pelo fato de a população estudada residir em regiões de funcional ainda são pouco utilizados.29
nível socioeconômico mais baixo que a média de Joinville. Quando analisados quanto à capacidade funcional,
É bem conhecida a relação entre baixa condição quase a metade da população idosa estudada apresentou
econômica e elevadas taxas de analfabetismo, e que os algum grau de dependência. A alta prevalência, também
níveis mais elevados de instrução levam a melhor acesso semelhante em outros estudos brasileiros, deve ser
e utilização dos serviços e recursos, além de maior considerada para que se possa atuar de forma preventiva
conhecimento de como evitar os fatores de risco para na tentativa de evitar ou postergar, quando possível, a
a saúde ao longo da vida.23-25 Portanto, o livre acesso à dependência total desses pacientes.9
informação, viabilizado pela alfabetização, parece ser Os idosos com idade mais elevada apresentaram
por si um fator facilitador da autonomia e redução da maior prevalência de dependência funcional, o que é
dependência do idoso. A taxa de analfabetismo na região bastante óbvio e evidencia o efeito do declínio natural
de cobertura deve ser considerada pelas equipes de saúde das funções orgânicas do indivíduo sobre a redução da
que atuam na atenção primária (AP), a fim de que sejam capacidade funcional.12
garantidos o entendimento sobre a doença, o tratamento As doenças crônicas são consideradas fatores asso-
a ser seguido e o acompanhamento da saúde. ciados à perda da capacidade funcional. Alves et al.29
Assim, o analfabetismo constitui um marcador de encontraram maior prevalência de dependência entre
risco, e as equipes de saúde devem estar atentas para os pacientes portadores de doença cardíaca, hiper-
reconhecer previamente esses idosos e prestar a eles e tensão, doença pulmonar e artropatias. No presente
suas famílias uma atenção diferenciada, visando evitar estudo encontrou-se associação significativa com depen-
má compreensão, confusão e até prejuízos ao tratamento. dência em pacientes portadores de hipertensão, diabetes,
Sugere-se que ações interdisciplinares com profissionais problemas pulmonares, problemas cardíacos, problemas
da área da educação possam ser realizadas com esses de memória, câncer, incontinência urinária, incontinência
idosos, a exemplo dos programas de alfabetização para fecal e quedas, dados que coincidem com a literatura.22,28,29
os idosos na comunidade e, assim, reduzir os índices de As quedas estão diretamente associadas à perda da
analfabetismo e diminuir os riscos para dependência. capacidade funcional nos pacientes idosos, seja como
Embora tenha sido observado discreto predomínio consequência, seja como fator causal, pois podem, por
do gênero feminino na amostra estudada, essa caracte- si só, levar à perda da funcionalidade, que pode também
rística não se mostrou relacionada com a dependência tornar-se um fator de risco para novas quedas e, assim,
para a execução de atividades cotidianas, diferentemente trazer mais prejuízos e maior dependência.23
do observado em estudos nacionais e internacionais.26-29 A incontinência urinária e a incontinência fecal foram
Capacidade funcional em idosos | 25

situações clínicas que apresentaram associação com a perda este estudo poderá servir de base para futuras pesquisas
da capacidade funcional. Um estudo espanhol relatou que, que venham a investigar outros importantes aspectos rela-
na população estudada, 1 em cada 3 idosos acima de 64 cionados à incapacidade funcional dos idosos no Brasil.
anos tinha incontinência urinária. Outros estudos seme- Por meio do procedimento de análise da representati-
lhantes também encontraram elevada prevalência (20,8%) vidade da amostra para a população do município de Join-
e relataram associação de incapacidade funcional com ville, observou-se haver semelhança entre os dois grupa-
incontinência urinária. Segundo os autores, a prevalência mentos para as características gênero e distribuição por
de incontinência urinária entre os idosos pode chegar faixa etária, o que permite concluir que, para essas variáveis,
a 30%, sendo um importante fator associado à depen- a população estudada nas áreas de abrangência de equipes
dência.30 Portanto, diagnosticar e tratar o problema poderá de saúde da família pode ser representativa do município
ter impacto positivo na vida dos pacientes. de Joinville. Entretanto, é necessário cautela na generali-
A influência da situação econômica sobre a capacidade zação dos resultados, visto que outras características não
funcional ainda não está bem estabelecida. O baixo nível foram comparadas por indisponibilidade de dados.
socioeconômico e a presença de desigualdades sociais A escolha da amostragem por conveniência pode ser
levam à deficiência na oferta de serviços, como saúde e indicada como limitação do estudo para fins de generalização
educação, podendo influenciar na saúde e na perda da porque, apesar das semelhanças demonstradas com a popu-
capacidade funcional dos indivíduos. No presente estudo, lação de Joinville para algumas variáveis, os dados disponí-
embora o perfil socioeconômico não tenha sido detalha- veis para comparação não foram suficientes para comprovar
damente avaliado, a maioria dos idosos é aposentada e não a representatividade da amostra de forma mais ampla.
exerce nenhum tipo de atividade remunerada. Há estudos Da mesma forma, cumpre lembrar que o envelheci-
que mostram menor frequência de perda de capacidade mento populacional brasileiro não tem sido homogêneo,
funcional entre idosos que trabalham, supondo que idosos sendo mais evidente nas áreas mais desenvolvidas do
que trabalham são mais independentes e saudáveis.12 país, comparado com Joinville, que possui esperança de
Quanto à utilização dos serviços de saúde, a maioria vida ao nascer de 74,5 anos, acima da média nacional de
dos casos estudados é de usuários do Sistema Único de 72,4, é um representante industrializado da Região Sul
Saúde. Embora não esteja bem estabelecida a relação e, nesse contexto, recomenda-se que sejam analisados os
entre possuir plano de saúde privado e capacidade resultados do presente estudo.
funcional, há estudos que mostram que os pacientes A escassez de trabalhos nacionais e internacionais
portadores de plano de saúde suplementar, por terem dessa natureza, que avaliem a capacidade funcional e
acesso facilitado aos serviços de saúde e mais fácil adesão seus fatores associados, também dificulta a comparação
aos tratamentos, provavelmente teriam maior chance de com os achados.
ter melhor capacidade funcional.13 Algumas dificuldades na execução do questionário
Com relação à autopercepção da qualidade de vida, devem ser consideradas, uma vez que nem todos os idosos
embora significativamente associada à presença de apresentam entendimento claro sobre as perguntas e,
dependência, observou-se que mesmo apresentando muitas vezes, necessitam de ajuda de algum familiar para
algum grau de dependência, grande número de idosos complementar as respostas. Essas dificuldades também são
considera possuir boa qualidade de vida. Sabe-se que citadas por alguns autores em trabalhos semelhantes.12,13
a autoavaliação do estado de saúde é uma variável
preditora de incapacidade funcional, refletindo uma C oncl u s ão
percepção integrada do indivíduo, e inclui dimensões A capacidade funcional vem demonstrando ser um
biológicas, social e psicossocial.12 marcador de saúde da população idosa, e sua avaliação
Alguns estudos mostraram haver associação entre permite identificar indivíduos em risco, traçar estra-
hospitalizações e perda da capacidade funcional, suge- tégias de prevenção de agravos e retardar a perda da
rindo que os idosos tornam-se mais vulneráveis ao declínio capacidade funcional. No nível assistencial da atenção
funcional e à dependência após períodos de hospitaliza- primária, a disponibilidade de instrumentos práticos,
ções.13 O presente estudo falhou em demonstrar tal asso- simples e de baixo custo, capazes de medir a capa-
ciação, talvez porque os detalhes temporais dos antece- cidade funcional dos idosos, tal como a escala de
dentes de internação não tenham sido alvo de análise. Lawton, é uma necessidade para a melhor gestão da
Os resultados da regressão logística sugerem que atenção a esse grupo populacional.
incontinência urinária e fecal, quedas, analfabetismo e Sugere-se que o sistema de saúde seja organizado
idade são fatores associados ao comprometimento da para atender as necessidades dos idosos, o que demanda
capacidade funcional, mas não devem ser utilizados para melhor conhecimento da realidade em que eles estão
inferências causais, em função do desenho metodológico inseridos, além de reorganização do processo de trabalho
utilizado. Estudos longitudinais poderão demonstrar com em equipes multidisciplinares, fundamentada nos prin-
melhor clareza uma eventual relação causal. Desse modo, cípios da prevenção e promoção da saúde do SUS, e do
26 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

atendimento humanizado e integral à saúde. evolução da dependência ao longo dos anos e sua possível
Novos estudos utilizando desenhos prospectivos associação com fatores não estudados aqui, como estado
poderiam possibilitar melhor compreensão sobre a psicológico, perdas afetivas e carências materiais.

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Artigo
Perfil de idosos com câncer no original
SUS | 27

Perfil sociodemográfico de idosos


com câncer em serviço terciário
do Sistema Único de Saúde

Ana Beatriz Bortolansa Pacagnellaa, Emmily Daiane


Buarque De Santanab, Manoella de Macedo Gomeb,
André Fattoric, Maria Elena Guarientod

Res umo
Palavras‑chave Objetivos: Avaliar a relação entre status social e acesso ao tratamento antineoplásico em idosos com câncer. Métodos:
Idoso, Esse estudo avaliou algumas características sociodemográficas (idade, sexo, IDH-M, distância entre município
neoplasias, de origem e Campinas) dos idosos com neoplasia atendidos em três unidades do complexo hospitalar da Unicamp
terapêutica, (Campinas, SP), para traçar um perfil regional dessa classe de enfermidades nos idosos, além de avaliar, indiretamente,
evolução a qualidade da assistência oferecida aos mesmos. Os dados sociodemográficos foram confrontados com o tempo entre
clínica, nível a primeira consulta na Unicamp e o início do tratamento. Foram analisados os registros de idosos, de ambos os sexos,
socioeconômico. com diagnóstico de câncer, atendidos no Gastrocentro, Hemocentro ou Hospital de Clínicas/Unicamp, entre janeiro
de 2000 e julho de 2010. Os dados foram obtidos do Serviço de Estatística do Câncer da Fundação Oncocentro de
São Paulo. Resultados: Dos 5.891 registros avaliados, 66,3% eram de homens; 48,8% tinham entre 60 e 69 anos;
67,1% provinham de municípios que distavam, no máximo, 50 km de Campinas; 65,3% provinham de municípios
com IDH-M entre 0,707 e 0,740. IDH-M (p = 0,003) e distância entre município de origem e Campinas (p = 0,019)
mostraram associação com o tempo entre a primeira consulta e o início do tratamento antineoplásico. Conclusão:
Este estudo evidencia a relevância dos fatores sociais no que se refere ao acesso ao tratamento antineoplásico em idosos.

Sociodemographic profile of elderly patients with


cancer in a tertiary care service of SUS
ABS T RACT
Keywords Objectives: Evaluation of the association between social status and access to the cancer treatment of elderly patients with
Aged, neoplasms, cancer. Methods: This study evaluated some sociodemographic characteristics (age, sex, HDI, the distance between home-
therapeutics, town and Campinas) of elderly patients with cancer who were assisted in three units of Unicamp Hospital Complex (Campinas,
clinical evolution, SP), in order to profile this class of disease in the region, and to evaluate, indirectly, the quality of the assistance offered to them.
social class. The sociodemographic data were compared with the period between the first appointment at Unicamp and the beginning of
the treatment. The elderly’s registers were analyzed, both sexes, with a diagnosis of cancer, assisted at Gastrocentro, Hemo-
centro, or Unicamp Clinical Hospital, between January 2000 and July 2010. The data came from the Service of Statistics of the
Cancer linked to the São Paulo Oncocentro Foundation. Results: Of all the 5,891 evaluated registers, 66.3% were men; 48.8%
had between 60 and 69 years old; 67.1% came from cities situated lesser than 51 km from Campinas; 65.3% came from cities
with HDI between 0.707 and 0.740. HDI (p = 0,003) and distance between hometown and Campinas (p = 0,019) had shown
an association with the period between the first appointment and the beginning of the treatment. Conclusion: This study
showed the relevance of social factors in the access to the cancer treatment in elderly people.

a
Mestranda do Programa de Pós-graduação em Gerontologia, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas
(FCM/Unicamp). Coleta dos dados; análise dos dados; redação do artigo.
b
Aluna de graduação bolsista Pibic, FCM/Unicamp. Coleta dos dados; análise dos dados; redação do artigo.
c
Docente do Programa de Pós-graduação em Gerontologia, FCM/Unicamp. Elaboração do projeto; análise dos dados.
d
Docente do Programa de Pós-graduação em Gerontologia, FCM/Unicamp. Elaboração do projeto; análise dos dados; redação do artigo.

Dados para correspondência


Maria Elena Guariento – Departamento de Clínica Médica. FCM/Unicamp. Rua Tessália Vieira de Camargo, 126. Cidade Universitária
Zeferino Vaz, Campinas, SP. CEP: 13083-887.
Telefone: (19) 3521-9211. Fax: (19) 3521-7878. E-mail: meguar@fcm.unicamp.br
28 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

I ntroduç ão que constitui um serviço de referência para a atenção


O processo de transição demográfica atual, que se mani- primária junto a um agrupamento de 19 municípios
festa pelo envelhecimento populacional, coloca como e com população estimada de 2.920.130 habitantes,
desafio aos países em desenvolvimento, entre os quais segundo avaliação da Fundação Seade3 para 2013, dos
o Brasil, a premência de enfrentar uma nova realidade quais 11,99% têm 60 anos ou mais. Também se avalia
associada à mudança na composição da população e que esse tipo de estudo contribuirá para traçar um perfil
as consequências sociais, econômicas e sanitárias do locorregional dessa classe de enfermidades no segmento
progressivo aumento da proporção de idosos e decrés- idoso da população, além de permitir avaliar, ainda que
cimo dos grupos etários mais jovens. indiretamente, a qualidade da assistência oferecida aos
Associada a essa mudança no perfil demográfico percebe- idosos portadores de doenças oncológicas.
se alteração no padrão epidemiológico dos agravos de saúde. Sendo assim, desenvolveu-se o presente estudo, que
As doenças não transmissíveis são responsáveis por parcela objetivou reconhecer o perfil clínico e sociodemográfico
significativa e crescente na carga de doenças no Brasil. dos idosos com diagnóstico de neoplasia assistidos em
Sabe-se, hoje, que as doenças neoplásicas vêm ganhando três (Hospital das Clínicas, Hemocentro, Gastrocentro)
maior dimensão, tornando-se uma questão relevante de das oito instituições que compõem o complexo hospi-
saúde pública, em nível global. No Brasil, as neoplasias são talar da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),
consideradas a segunda maior causa de mortes, represen- bem como o intervalo de tempo entre a primeira consulta
tando 11,84% dos óbitos, sendo precedidas apenas pelas no serviço e o início do tratamento.
doenças do sistema cardiocirculatório.1 O avanço da idade
é um fator de alto risco para o câncer, sendo os indivíduos M é todos
maiores de 65 anos responsáveis por 60% das neoplasias Foram analisados os registros de idosos (≥60 anos), de
malignas e 70% das mortes por câncer.2 ambos os sexos, com diagnóstico de câncer e que foram
Apesar da elevada incidência e prevalência de neopla- atendidos em três dos serviços que integram o complexo
sias entre os idosos, ainda é insuficiente o que se conhece hospitalar da Unicamp (Gastrocentro, Hemocentro,
em relação às abordagens terapêuticas e a melhor forma Hospital das Clínicas), no período de 10 anos (janeiro
de cuidar desses pacientes, fato demonstrado pela de 2000 a julho de 2010). Os dados foram obtidos junto
escassez de ensaios clínicos destinados à abordagem das ao Serviço de Estatística do Câncer, vinculado a essa
neoplasias nessa faixa etária. instituição, o qual notifica os casos por meio do Registro
Nos atuais padrões adotados pela sociedade, há maior Hospitalar de Câncer da Fundação Oncocentro de São
exposição a fatores propiciadores do desenvolvimento de Paulo (RHC/FOSP). Não foram incluídos os registros de
neoplasias relacionados, entre outros, ao estilo de vida, neoplasias ginecológicas, tendo em vista que os dados
padrão alimentar, contato com poluentes e outros produtos referentes a esses tumores são anotados no Centro de
químicos. Por outro lado, com o aumento da expectativa de Atenção Integral à Saúde da Mulher da Unicamp, que tem
vida, a população fica mais tempo exposta a esses fatores, o registro próprio e não foi incluído neste levantamento.
que, associado às características genéticas e biológicas indi- Esses registros foram analisados de acordo com o
viduais, contribui para o aumento da incidência e preva- tempo entre a primeira consulta no complexo hospitalar
lência de doenças neoplásicas entre os idosos.2 da Unicamp e o início do tratamento, bem como quanto à
Portanto, avalia-se que determinar as características ocorrência ou não de óbito no primeiro ano após o início
clínicas e sociodemográficas dos idosos portadores de do tratamento. Também se incluíram as variáveis “sexo”
neoplasias é essencial para permitir o aprimoramento das e “faixa etária”, além do Índice de Desenvolvimento
estratégias de prevenção e, particularmente, das medidas Humano (IDH) do município em que residia o paciente
terapêuticas mais bem orientadas para esse segmento da e a distância (em quilômetros) entre esse município e
população. Entre elas se destaca como um dos fatores o município em que se situa o complexo hospitalar da
de fundamental importância o tempo que decorre entre Unicamp (Campinas). Dessa análise foram excluídos os
o início dos procedimentos para o diagnóstico e o início idosos que não retornaram para consulta ou tratamento
do tratamento proposto. Esse parâmetro permite, entre até um ano após o início do tratamento.
outras coisas, avaliar a qualidade do serviço de saúde Esses dados foram transcritos para uma tabela do
que presta atendimento na área de oncologia, principal- programa Microsoft Office Excel 2007. Em seguida foram
mente para a população idosa. submetidos à análise estatística. As variáveis categóricas (sexo,
Considerando-se a perspectiva desse tipo de reco- faixa etária, distância do município de origem até Campinas,
nhecimento em relação a um grande centro regional IDH-M, ocorrência ou não de óbito) foram submetidas a
(Região Metropolitana de Campinas), decidiu-se estudar análises de frequência, com a apresentação da frequência
o perfil clínico e sociodemográfico dos idosos com absoluta (n) e dos valores percentuais (%). A variável numé-
neoplasia atendidos em unidades do complexo hospi- rica (tempo entre a primeira consulta e o início do trata-
talar da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mento) foi submetida à análise estatística descritiva, com
Perfil de idosos com câncer no SUS | 29

valores de média, desvio-padrão, erro-padrão, valor máximo, Quanto ao tempo entre a primeira consulta na
valor mínimo e mediana. Para fins dessa pesquisa, os valores Unicamp e o início do tratamento para o tumor (tempo
da variável IDH-M foram divididos em quatro categorias, delta), verificou-se grande oscilação. Excetuando-se os
distribuídos da seguinte forma: valores <0,707; valores entre 760 pacientes que não foram tratados, o tempo médio
0,707 e 0,740; valores >0,740. Para a variável “distância entre entre a primeira consulta e o início do tratamento no
o município de origem e o município de Campinas”, avaliada complexo hospitalar da Unicamp foi de 64,92±78,72
em quilômetros, foram utilizadas as seguintes categorias: zero dias, com erro-padrão de 1,099 dia e mediana de 43
(para os que residiam no próprio município) até 30 km; 31 a dias, tendo como valores mínimo e máximo 0 e 1.557
50 km; 51 a 100 km; 101 a 200 km; >200 km. dias, respectivamente.
O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Não se encontrou relação entre sexo e tempo delta
Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (p = 0,236), tampouco entre faixa etária e tempo delta
e aprovado com Parecer no 256.673. (p = 0,796). Contudo, tanto para distância entre o
município de origem e Campinas como para IDH-M,
R es ultados verificou-se associação com tempo delta, conforme
Considerando-se as variáveis sociodemográficas, os apresentado na Tabela 3.
resultados obtidos evidenciaram que, de um total de
5.891 registros avaliados, 66,3% (3.908) eram de idosos
do sexo masculino. Quanto à faixa etária, 48,8% (2.873) Tabela 3  Relação entre delta tempo e distância entre município de
estavam entre 60 e 69 anos, 38,3% (2.254) entre 70 e 79 origem e Campinas, e IDH-M (5.891 idosos – Serviço de Estatística do
anos e 13% (764) tinham 80 anos ou mais. Câncer/Unicamp)
Na Tabela 1, encontra-se a distribuição da população Distância do município de Delta tempo (dias)
origem até Campinas (km)*
estudada segundo a distância entre o município de origem (µ ± EP) MED

e Campinas, e segundo o IDH do município de origem. 0 (N: 1.193) 66,30 ± 2,75 39,09
Até 30 (N: 870) 67,31 ± 2,28 50,00
Tabela 1  Distribuição da amostra segundo distância entre município 31 a 50 (N: 1.411) 65,96 ± 2,11 46,50
de origem e Campinas, e IDH-M (5.891 idosos – Serviço de Estatística 51 a 100 (N: 1.062) 61,46 ± 2,09 41,38
do Câncer/Unicamp)
101 a 200 (N: 541) 59,71 ± 2,99 39,78
Distância do município de
N % >200 (N: 54) 88,39 ± 13,33 60,00
origem até Campinas (km)
0 1315 22,3 IDH-M**

Até 30 1020 17,3 1 (N: 1.631) 67,55 ± 71,24 48,14

31 a 50 1622 27,5 2 (N: 1.679) 62,62 ± 76,79 42,00

51 a 100 1228 20,8 3 (N: 1.819) 64,63 ± 86,45 40,94

101 a 200 644 10,9 * P: 0,019; ** P: 0,003 (Teste de Kruskall-Wallis)


>200 62 1,1
N: distribuição por frequência; delta tempo: tempo entre primeira consulta na Unicamp
e início do tratamento do tumor; µ: média; EP: desvio-padrão; MED: mediana; km:
IDH-M quilômetros; IDH-M: Índice de Desenvolvimento Humano do Município; categoria 1:
0 2 0 IDH-M < 0,707; categoria 2: IDH-M entre 0,707 e 0,740; categoria 3: IDH-M > 0,740
1 1897 32,2
2 1950 33,1
3 2042 34,7 D isc u ssão
N: Distribuição por frequência; %: distribuição percentual; IDH-M: Índice de Desenvol- Sabe-se que mais de 60% dos diagnósticos de neoplasia
vimento Humano do Município; categoria 1: IDH-M < 0,707; categoria 2: IDH-M entre são feitos em indivíduos com 65 anos ou mais, sendo
0,707 e 0,740; categoria 3: IDH-M>0,740 que a partir dessa faixa etária o risco de incidência
de tumores é, aproximadamente, 10 vezes maior do
A evolução após um ano do início do tratamento
que em indivíduos mais jovens. Também se verifica
encontra-se na Tabela 2.
que a maioria das mortes por câncer (mais de 70%)
é registrada na população idosa, o que pode estar
Tabela 2  Distribuição da amostra segundo ocorrência ou não de óbito
(5.891 idosos – Serviço de Estatística do Câncer/Unicamp)
associado à presença de comorbidades.4 Por outro
lado, quando se considera a sobrevida de 5 anos para
Ocorrência de óbito N %
o portador de neoplasia, é importante considerar que
Óbito por câncer 1.277 21,7
o indivíduo aos 65 anos tem expectativa de vida bem
Óbito por outras causas 297 5,0
superior a esse tempo, o que não justifica não oferecer
Não ocorreu óbito 4.317 73,3
tratamento adequado ao idoso.5
Total 5.891 100
Verificou-se, neste estudo, que após um ano
N: Distribuição por frequência; %: Distribuição percentual do início do tratamento antineoplásico 21,7% dos
30 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

idosos tinham morrido em decorrência do tumor. Desenvolvimento Humano) e/ou que se encontravam
Segundo dados da literatura, a sobrevida em relação mais distantes do município onde se localizava o
à doença neoplásica sofre influência das caracterís- serviço de saúde onde deveriam realizar o tratamento
ticas próprias de malignidade de cada tipo de tumor, (complexo hospitalar da Unicamp).
da possibilidade maior ou menor de um diagnóstico É preciso destacar, ainda, que o tempo zero para o
precoce e da existência e acesso a um tratamento início do tratamento, verificado neste estudo, pode
eficaz. Por outro lado, a sobrevida relativa esperada dever-se aos idosos que vieram encaminhados para
para todos os cânceres é de aproximadamente 50% o tratamento antitumoral, para os quais a primeira
em 5 anos para todas as faixas etárias. 6 Entretanto, consulta no complexo hospitalar da Unicamp já tinha
em função das características da presente pesquisa, esse fim. Estes, muito possivelmente, se beneficiaram de
não se dispõe dos dados de mortalidade em 5 anos. procedimentos diagnósticos que permitiram evidenciar
Quanto ao tempo registrado entre a primeira mais precocemente o quadro neoplásico, o que possibi-
consulta na Unicamp e o início efetivo do tratamento lita maior chance de cura e/ou controle da doença.11
antitumoral, no presente estudo registrou-se média de Quanto ao tempo superior a 3 anos para o início
64,92 dias. Por sua vez, o Ministério da Saúde, em 16 do tratamento, pode-se supor que ele se relacione aos
de maio de 2013, baixou a Portaria no 876, que trata do tumores de caráter indolente, que habitualmente são
primeiro tratamento do paciente portador de neoplasia acompanhados até que se faça necessário intervir com
maligna, em nível do Sistema Único de Saúde, determi- terapêutica adequada.
nando que o prazo máximo do mesmo não exceda 60 Finalmente, em relação aos 760 idosos não tratados,
dias.7 Dessa forma, verifica-se que o complexo hospi- é bastante provável que entre os mesmos estivessem
talar da Unicamp aproxima-se dessa meta do governo aqueles com tumor de caráter indolente para os quais se
federal, mesmo em período anterior à promulgação da recomendou acompanhamento ou, ainda, em situação
Portaria (década de 2000 a 2010). clínica muito grave, fora de perspectiva terapêutica, aos
No presente estudo, é importante destacar que não se quais se ofereceram apenas cuidados paliativos.
registrou associação das variáveis “faixa etária” e “sexo” Há que se registrar também que o estudo apresentou
com o tempo entre a primeira consulta na Unicamp e uma limitação associada à qualidade dos registros de
o início do tratamento do tumor. Esse achado sugere casos de neoplasia: foi expressivo o número de casos
que, muito provavelmente, os indivíduos em faixa etária em que os dados estavam incompletos. Além disso,
mais avançada, que também são mais frágeis e mais neste registro não constam duas variáveis sociais muito
suscetíveis a enfermidades crônicas, com maior carga de significativas em termos de estudo de população idosa:
morbimortalidade,8-10 não recebem tratamento diferen- escolaridade e renda. Também não consta do registro
ciado em relação ao quadro neoplásico, o que aumenta a a variável “comorbidades”. As três podem ter relação
probabilidade de ocorrer evolução desfavorável.11 tanto com o acesso ao tratamento antineoplásico como
Além disso, há que se considerar também que o largo à evolução dos pacientes idosos.
predomínio de homens neste estudo se deve, muito prova-
velmente, às características da população atendida nos C oncl u s ão
três serviços da Unicamp, de onde foram coletados os Dessa forma, verifica-se que os achados deste
dados, já que foi excluído do estudo o Centro de Atenção trabalho permitem ressaltar a relevância dos indica-
Integral à Saúde da Mulher (CAISM), onde são atendidas, dores sociais (distância entre o município de origem
predominantemente, as neoplasias ginecológicas. e o local de tratamento, IDH-M) no que se refere ao
Também se verificou associação do tempo entre acesso ao tratamento antineoplásico na população
a primeira consulta na Unicamp e o início do trata- idosa. Embora se trate de um estudo de abrangência
mento com o IDH-M e com a distância do município regional, pode-se cogitar a existência de influência
de origem em relação a Campinas. Recentemente, similar em outras regiões do país.
registrou-se em estudo brasileiro realizado no muni- Decorre daí a necessidade de avaliar e considerar
cípio de Campinas que as condições sociais e a renda esses indicadores na elaboração de estratégias passí-
familiar covariam com vulnerabilidade na velhice, veis de serem aplicadas em serviços de referência que
mostrando-se associação das mesmas com maior integram o Sistema Único de Saúde e que viabilizem a
número de doenças crônicas, incapacidade funcional, detecção de maior risco de vulnerabilidade, bem como
pior percepção da saúde e menor acesso aos serviços de facilitação de acesso aos recursos de tratamento para
de saúde.12 Também na presente pesquisa verificou- idosos portadores de neoplasia.
se que foi maior o tempo para o início do tratamento
antitumoral entre os idosos que eram provenientes de C onflito de interesse
municípios com níveis mais baixos de renda, escola- Os autores declaram não ter conflito de interesse em
ridade e saúde (principais constitutivos do Índice de relação ao presente estudo.
Perfil de idosos com câncer no SUS | 31

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Artigo originalGERIATRIA & GERONTOLOGIA
32 | REVISTA

Risco nutricional em
pacientes idosos hospitalizados como
determinante de desfechos clínicos

Adriane dos Santos da Silvaa,Ida Cristina Mannarinob,


Annie S. Bello Moreirac

R es umo
Palavras‑chave Introdução: A desnutrição afeta tanto a condição clínica do paciente como também aumenta o risco de compli-
Idoso, risco cações em idosos, sendo responsável por contribuir com o aumento do tempo de hospitalização e a taxa de
nutricional, morbimortalidade dessa faixa etária. Objetivo: Estudar a associação do risco nutricional e desfechos clínicos em
desfecho clínico. idosos internados em unidade de clínica médica em hospital privado do Rio de Janeiro. Materiais e métodos:
Estudo longitudinal prospectivo, com 116 pacientes idosos. Nas primeiras 72 horas após a admissão hospitalar foi
aplicado o questionário Triagem de Risco Nutricional (NRS-2002), coletados dados antropométricos, como peso e
altura e diagnóstico clínico, e dados de desfechos clínicos no final da internação (óbito, infecção e tempo de inter-
nação). Os dados foram avaliados em programa estatístico SPSS e foi considerada significância <5%. Resultados:
Verificou-se que 39,6% dos pacientes apresentaram risco nutricional no momento da admissão hospitalar. Os paci-
entes em risco nutricional eram mais idosos, apresentaram índice de massa corporal (IMC) menor (p <0,05) e
chance três vezes maior de óbito. Os pacientes que ficaram internados por tempo prolongado (>13 dias) apresentam
chance três vezes maior de desenvolver infecção e ir a óbito. Conclusão: Os pacientes em risco nutricional tiveram
maior risco de complicações e maior tempo de internação, infecção e óbito.

Nutritional risk in hospitalized elderly people


as a determinant of clinical outcomes
A BS T RACT
Keywords Introduction: Malnutrition affects the patient’s clinical conditions, and increases the risk of complications in elderly people,
Elderly, this is also responsible for the increase in the hospital stay length and mortality rate in this age group. Objective: To study
nutritional risk, the association between nutritional risk and clinical outcomes in elderly patients hospitalized at a medicine unit at a private
clinical outcomes. hospital in Rio de Janeiro. Materials and methods: A prospective study with 116 elderly patients. In the first 72 hours after
hospital admission the Nutritional Risk Screening (NRS-2002) was applied, and anthropometric data such as weight and
height and clinical diagnosis was collected; at the end of hospitalization, clinical outcomes (death, infection and length of stay)
were also collected. Data was analyzed by SPSS and significance was considered less than 5%. Results: It was found that 39.6%
of the patients were at nutritional risks in admission time. Patients at nutritional risk were older, had a body mass index (BMI)
lower (p <0.05) and with a chance of death three times higher. Patients who were hospitalized longer periods (>13 days) have
had a chance of developing infection or of dying three times higher. Conclusion: Patients at nutritional risks had a higher risk
of complications such as longer hospitalization, infection and death.

a
Pós-graduada em terapia nutricional, Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Redação do conteúdo intelectual, coleta dos dados.
b
Professora assistente de nutrição clínica, UERJ. Concepção e delineamento do estudo, análise e interpretação dos dados, revisão crítica rele-
vante do conteúdo intelectual do manuscrito e aprovação final da versão a ser publicada.
c
Professora adjunta de nutrição clínica, UERJ. Concepção e delineamento do estudo, análise e interpretação dos dados, revisão crítica relevante
do conteúdo intelectual do manuscrito e aprovação final da versão a ser publicada.

Dados para correspondência


Annie S. Bello – Rua São Francisco Xavier, 524, Pavilhão João Lyra Filho, 12o andar.
Tel.: (21) 2334-0722. E-mail: idacm@uol.com.br
Risco nutricional e desfechos clínicos | 33

Introdução de desfecho (mortalidade, tempo de internação e taxas


A desnutrição é um grave problema de saúde pelo alto de infecção). Os idosos foram estratificados pela idade e
custo e pela alta taxa de mortalidade. Cerca de 30% a foi utilizada a classificação de idoso jovem (60-69 anos),
50% dos pacientes hospitalizados estão desnutridos.1-3 idoso (70-85 anos) e muito idoso (>85 anos).8
Os idosos estão em maior risco de desnutrição devido A NRS-2002 (Nutrition Risk Screening 2002) foi
ao declínio na função fisiológica, redução de massa utilizada para avaliação do risco nutricional, sendo
magra e da taxa metabólica basal, alterações sensoriais, composta de questões sobre peso corporal, altura, índice
problemas cardíacos e respiratórios, maior frequência de de massa corporal (IMC), perda de peso não intencional
internações, infecções e úlceras por pressão.4 em três meses, apetite, habilidade de ingestão e absorção
Diferentes ferramentas podem ser utilizadas para de alimentos, e fator de estresse da doença.9
identificar o diagnóstico nutricional, como medidas Indicadores antropométricos foram mensurados.
antropométricas, clínicas, dietéticas e também questio- Peso e altura foram utilizados para cálculo do IMC e
nários de triagem nutricional, que devem ser realizados do percentual de perda de peso, de acordo com a clas-
na admissão.5,6 A NRS-2002 é um exemplo de questio- sificação da OMS.10 O IMC foi classificado de acordo
nário de triagem nutricional que tem como fator de risco com Lipschitz11 em: IMC <22 kg/m2 como desnutrição,
adicional a idade superior a 70 anos.7 IMC 22-27 kg/m2 como normal e IMC >27 kg/m2 como
Identificar idosos hospitalizados desnutridos ou em sobrepeso. Inicialmente, foi realizada a análise descri-
risco de desnutrição é parte integrante e fundamental tiva pelo cálculo de média, desvio-padrão e proporção.
da assistência, a fim de intervir precocemente indu- Foram realizados os testes de qui-quadrado, Mann
zindo ao incremento do processo curativo e à economia Whitney e Kruskal-Wallis, e o nível de significância
de recursos pela instituição. Porém, poucos trabalhos para todos os testes estatísticos foi de 5%. O software
estudam a influência do estado nutricional de idosos utilizado foi o Statistical Package for the Social Science
como determinante na morbidade e mortalidade. Com (SPSS) versão 17.
isso, o objetivo do trabalho foi compreender a associação
do estado nutricional com os desfechos clínicos como R esu ltados
infecção, tempo de internação e óbito. Foram estudados 116 pacientes, sendo 40,5% do sexo
masculino. A idade média foi de 78 anos, sendo 84,3% com
Materiais e M é todos mais de 70 anos e 30,2% na faixa de muito idosos (Tabela
Este estudo inclui pacientes idosos internados nas 1). As causas mais comuns de hospitalização foram as
unidades de clínica médica de um hospital da rede doenças cardíacas (19%), seguidas das doenças urológicas
particular do Rio de Janeiro. Este trabalho, de acordo (14,7%) e pulmonares (13,8%), sendo que 58,6% desses
com a Resolução no196/1996 do Ministério da Saúde, pacientes eram hipertensos e 25% tinham diabetes.
foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Quando o IMC foi utilizado para diagnóstico nutri-
(COEP, protocolo 7.3.2011), e todos os participantes cional verificamos que 26,7% eram desnutridos e, pela
do estudo foram esclarecidos sobre o seu objetivo e triagem (NRS-2002), 39,6% dos pacientes apresentaram
assinaram o termo de consentimento livre e escla- risco nutricional no momento da admissão hospitalar.
recido. Houve cumprimento dos princípios éticos Verificou-se que 11 dos 31 idosos desnutridos
contidos na Declaração de Helsinque (2000), além iniciaram terapia nutricional, enquanto 20 não
do atendimento à legislação do Brasil. iniciaram nenhum tipo de terapia nutricional. Ao
Os critérios de inclusão foram: idade maior ou serem estratificados pelo risco nutricional (NRS-
igual a 60 anos, ambos os sexos e avaliação nas 2002), verificamos que, dos 46 pacientes em risco,
primeiras 72 horas de internação hospitalar. Foram aproximadamente a metade recebeu TN e, entre os
excluídos do estudo gestantes e pacientes internados que não estavam em risco, apenas 10%. Porém, inde-
nas unidades de terapia intensiva e coronariana, em pendentemente da técnica utilizada para identificar
terapia nutricional parenteral, pacientes que apre- populações de risco (IMC ou NRS-2002), a prescrição
sentaram tempo maior de hospitalização (maior que de TN foi insatisfatória, tanto nos pacientes desnu-
3 meses), pacientes com doença mental e/ou com tridos (64,5% ficaram sem TN) quanto naqueles em
déficit cognitivo que impossibilitasse a compreensão risco nutricional (56% ficaram sem TN).
acerca dos questionamentos e cujo acompanhante não A Tabela 2 mostra uma análise descritiva e compa-
foi capaz de responder a eles. rativa entre idade, tempo de internação, IMC e tempo
Este estudo longitudinal prospectivo foi realizado em em TN nos idosos com ou sem risco nutricional. Os
2012 com a população de 116 pacientes. Os dados foram pacientes em risco nutricional apresentam maior
coletados na admissão usando um protocolo nutri- tempo de internação (14 dias x 9 dias, p <0,05), maior
cional previamente definido. Foram obtidos de pron- tempo de terapia nutricional e menor IMC, além de
tuários médicos: dados clínicos, diagnóstico e variáveis serem mais idosos.
34 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Tabela 1  Características da população de acordo com as variáveis Figura 1  Risco nutricional e realização de terapia nutricional segundo
estudadas a classificação de idosos
Dados avaliados Valores obtidos

Sexo masculino, n (%) 47 (40,5) 100%

Características Idade, m (+DP) 78,6 (9,4)


80%
IMC, m (±DP) 24,7 (4,61)

Jovem idoso, n (%) 18 (15,5) 60%


Classificação dos idosos Idoso, n (%) 63 (54,3)
40%
Muito idoso, n (%) 35 (30,2)

Desnutridos, n (%) 60,00


20%
Estado Eutróficos, n (%) 57 (49,1)

Sobrepeso, n (%) 28 (24,1) %


Sem RN RN Sem TN TN
Risco nutricional 46 (39,6)
Jovem idoso Idoso Muito idoso
Triagem nutricional
Diabéticos (%) 29 (25)

Hipertensos (%) 68 (58,6)


RN risco nutricional; TN terapia nutricional
Cardíacas, n (%) 22 (19)

Comorbidades Urológicas, n (%) 17 (14,7)

Pulmonares, n (%) 16 (13,8) Dentre os fatores de risco associados ao maior tempo de


TGI, n (%) 11 (9,5) internação pode-se destacar o risco nutricional (14,5 ± 17,6
Ortopédicas, n (%) 13 (11,2) dias × 9,2 ± 7,7 dias) e também os pacientes que foram a óbito
Oncológicas, n (%) 11 (9,5) (22,6 ± 25,4 × 9,1 ± 7,3 dias). Gênero, doenças e infecção não
Patologias Neurológicas, n (%) 21 (4,3)
foram associados ao maior tempo de internação (Tabela 3).
Outras, n (%) 21 (18,1)

Sem TN, n (%) 89 (76,7)


Tabela 3  Comparação do tempo de internação em relação ao sexo
TN VO, n (%) 12 (10,3) idade, doença, IMC, tipo de TN, risco nutricional, infecção e óbito
TNE, n (%) 9 (7,8) Tempo de internação (dias)
Terapia nutricional
TNE + VO, n (%) 6 (5,2) Variáveis
n Média ± DP p
Infecção, n (%) 43 (37,7)
Feminino 69 12,65 ± 15,2
Óbito, n (%) 18 (15,5) Gênero p >0,05a
Masculino 47 9,3 ± 7,7
Desfechos Tempo de internação,
11,23 (12,79) Cardíacas 22 12,3 ± 18,9
dias
Urológicas 17 12,6 ± 16,5
Os valores são em porcentagens de indivíduos ou médias/média ± DP; n: número
Pulmonares 16 14,8 ± 15,5
TGI 11 5,3 ± 3,7
Tabela 2  Comparação entre idade, tempo de internação, IMC e tempo Doenças p >0,05b
em TN nos idosos com ou sem risco nutricional Ortopédicas 13 10,2 ± 7,7

Sem risco Oncológicas 11 10,1 ± 7,3


Dados avaliados
nutricional Neurológicas 5 15,0 ± 9,5
Média DP Média DP
Outras 21 9,8 ± 6,1
Idade 80,80 ± 7,67 77,16 ± 9,62 *
Desnutridos 31 13,00 ± 17,9
Tempo de internação 14,52 ± 17,56 9,07 ± 7,72 * IMC
Eutróficos 57 9,5 ± 7,8 p >0,05b
(kg/m2)
IMC 22,10 ± 3,99 26,36 ± 4,22 *
Sobrepeso 28 12,9 ± 14,2
Tempo TN 6,17 ± 16,14 1,20 ± 4,97 *
Risco Não 70 9,1 ± 7,7
p <0,01a
IMC: índice de massa corporal; TN: terapia nutricional; t student *p <0,05 nutricional Sim 46 14,5 ± 17,6
Não 89 7,9 ± 6,1
A Figura 1 confirma tal associação, mostrando TN
Sim 27 22,1 ± 20,9
p <0,01b

que, quando a população foi estratificada pela idade, Não 73 8,3 ± 6,5
os percentuais de risco nutricional foram: 50% muito Infecção p >0,05a
Sim 43 16,2 ± 18,3
idosos, 40% idosos e 10% idosos jovens. Consequen-
Não 98 9,1 ± 7,3
temente, o emprego de terapia nutricional foi mais Óbito p <0,01a
Sim 18 22,6 ± 25,4
frequente nos muito idosos (46%) quando comparados
aos idosos jovens (0%) e idosos (20%). TGI: trato gastrointestinal; TN: terapia nutricional; a Mann Whitney; b Kruskal-Wallis Test
Risco nutricional e desfechos clínicos | 35

Tabela 4  Associação do tempo de internação com desfechos clínicos


TI <13 TI >13 OR IC P S/RN C/RN OR IC

Infecção 31% 55,2% 2,74 (1,57-6,47) * 31,4% 45,7% 1,83 (0,85-3,95)

Óbito 11,5% 27,6% 2,93 (1,03-8,36) * 10,0% 23,9% 2,83 (1,01-7,95)

Qui-quadrado * P <0,05; TI: tempo de internação; OR: ODD RATIO; S/RN: sem risco nutricional; C/RN: com risco nutricional

A Tabela 4 mostra que há associação entre tempo Nosso trabalho mostrou que o envelhecimento é
de internação prolongado e desfechos clínicos como um importante fator de risco nutricional, mas ainda há
infecção e óbito. Os pacientes que ficaram internados baixa implementação de terapia nutricional. Um estudo
por tempo prolongado (>13 dias) apresentam risco três prospectivo com 250 pacientes idosos mostrou que 39%
vezes maior de desenvolver infecção e ir a óbito. Os foram considerados em risco elevado de desnutrição e
pacientes em risco nutricional no momento da admissão que apenas 13% receberam alguma forma de suporte
hospitalar apresentaram risco três vezes maior de óbito. nutricional, concluindo que a terapia nutricional é pouco
utilizada.19 Incalzi et al.20 concluem que o suporte nutri-
Discuss ão cional deve ser um componente-chave da assistência
A desnutrição hospitalar é foco de muitos trabalhos nos hospitalar em pacientes geriátricos.21
últimos anos. Sua prevalência varia entre 30% e 50% dos Componentes da NRS-2002 são preditores indepen-
pacientes hospitalizados, estando relacionada ao tipo de dentes de pior prognóstico clínico; pacientes em risco
avaliação nutricional e região.1-3,12 apresentam mais complicações, aumento da mortalidade
Neste estudo, 39,6% apresentavam risco nutricional e tempo de internação maior.2 Em nosso trabalho, 50%
pela NRS 2002, ao passo que 26,7% eram desnutridos dos pacientes idosos admitidos no período encontravam-
pelo IMC no momento da admissão hospitalar. Os nossos se em risco nutricional, sendo que os mais idosos apre-
dados concordam com outros estudos em que a preva- sentaram tempo de internação e terapia nutricional mais
lência de desnutrição/risco nutricional foi de 30%.13,14 prolongada. Conforme os resultados referentes ao IMC
Em estudo com pacientes idosos, realizado em um relacionados ao risco nutricional, podemos observar
hospital universitário do Reino Unido, observou-se que, que esses pacientes apresentaram IMC ainda dentro da
dos 150 pacientes avaliados, 58% estavam em risco nutri- normalidade para idosos, o que sugere que a NRS-2002
cional.15 Outro estudo de coorte em sete hospitais suíços, é capaz de prever melhor a probabilidade de desfechos
realizado em um período de 3 anos, mostrou que 18,2%, clínicos já no momento da internação.
dos 32.837 pacientes avaliados utilizando a NRS-2002 como Quando avaliamos os resultados da terapia nutri-
ferramenta de triagem nutricional estavam em risco nutri- cional instituída no grupo dos pacientes muito idosos
cional, sendo que 28% desses pacientes apresentavam idade comparado ao grupo do idoso jovem e do idoso, vimos
superior a 85 anos, concluindo que 1 em cada 5 pacientes que a utilização do escore de risco foi superior ao IMC
estava desnutrido ou em risco de desnutrição.16 no que corresponde à identificação dos pacientes em
Existem evidências de que apenas pequena porcen- risco e em relação à implementação de terapia nutri-
tagem de pacientes desnutridos recebe suporte nutri- cional, podendo-se concluir que o IMC parece não ser
cional.17 Nossos resultados demonstram que mais suficiente para iniciar a terapia nutricional.
da metade dos pacientes desnutridos ou em risco de Dados do estudo de Corish, Flood, Kennedy,22
desnutrição não recebeu terapia nutricional, o que pode utilizando duas ferramentas de triagem nutricional,
agravar o estado nutricional dos idosos hospitalizados. mostraram que dos 359 pacientes selecionados a
No entanto, no grupo muito idoso, 46% receberam NRS-2002 identificou que 46% estavam em risco nutri-
algum tipo de terapia nutricional. cional no momento da admissão hospitalar.
Nossos dados foram semelhantes aos do Inquérito O risco nutricional elevado nos idosos está relacio-
Brasileiro de Avaliaçäo Nutricional Hospitalar (Ibra- nado aos fatores inerentes associados ao envelhecimento,
nutri), com 4.000 pacientes hospitalizados em unidades como deterioração ou fragilidade do estado nutricional,
exclusivamente públicas, distribuídas em todo o terri- perda de massa e função muscular (sarcopenia), mesmo
tório nacional no ano de 1996. Esse documento apre- apresentando peso corporal constante, qualidade de vida
sentou 52,8% de desnutrição na população idosa, sendo comprometida e risco aumentado de morbidade e morta-
que apenas 10,1% receberam nutrição enteral, ou seja, lidade.23 O método de triagem utilizado já classifica esses
pequena parte desses pacientes estava sendo tratada, pacientes como de risco, acrescentando um ponto para
sugerindo que a desnutrição até aquele momento ainda maiores de 70 anos de idade, mostrando a característica
não era abordada de forma enfática e determinante para dos pacientes atendidos e a importância dos cuidados
o desfecho do tratamento clínico hospitalar.18 nutricionais relacionados a essa faixa etária.
36 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Observamos que os pacientes em risco nutricional estavam Estudos anteriores mostram que a desnutrição contribui
na faixa etária correspondente ao idoso médio (média de 80 para uma cascata de eventos que comprometem o sistema
anos) e que o tempo médio de internação hospitalar foi de imunológico e aumentam a suscetibilidade para doenças infec-
14 dias. Em estudo prospectivo realizado por SullIvan, Sun, ciosas, recomendando a intervenção precoce e a escolha dos
Walls,24 a população tinha em média 74 anos e o tempo médio nutrientes essenciais como prevenção dessas complicações.30
de permanência hospitalar foi de 8 dias (utilizando-se um inter- Nosso estudo demonstrou que aqueles em risco
valo interquartil de 5-13 dias). Apesar de não estratificar a popu- nutricional na admissão hospitalar apresentam chance
lação quanto ao risco nutricional, os resultados apresentados três vezes maior de ir a óbito. Estudo realizado com 150
foram semelhantes aos encontrados neste trabalho para aqueles pacientes com média de idade de 85 anos mostrou que
pacientes sem risco nutricional, nos quais o tempo de inter- 58% desses pacientes estavam em risco de desnutrição
nação foi de 9 dias. Pacientes nessa faixa etária também apre- e apresentaram maior mortalidade intra-hospitalar e
sentaram IMC menor e tempo de internação mais prolongado. pós-alta (p <0,01), além de maior tempo de internação
Complicações secundárias à desnutrição podem aumentar (p = 0,02) comparados àqueles com baixo risco.15
diretamente o tempo de internação, assim como idosos subnu- Apesar dos resultados encontrados, deve-se levar em
tridos apresentam maior tempo de internação.17,18,24,25 consideração o fato de que o número reduzido de pacientes,
Brantervick et al.26 avaliaram 244 idosos, e a maioria assim como o tempo de coleta de dados, foi menor se
dos pacientes encontrava-se na faixa etária acima dos comparado a outros estudos. Cabe ressaltar que este estudo
70 anos; destes, 51,6% estavam em risco de desnutrição foi realizado em unidade hospitalar de caráter privado,
segundo os critérios do IMC (<22 kg/m2). situado no município do Rio de Janeiro, considerando-se
A desnutrição hospitalar é uma consequência de que o perfil socioeconômico e cultural esperado para esta
vários fatores de risco, dos quais a doença por si só é amostragem de pacientes é diferenciado da maioria dos
um dos mais importantes. Outros fatores, como idade trabalhos descritos na literatura quanto aos fatores favorá-
e tempo de internação, também têm impacto negativo veis para a conservação do estado nutricional.
sobre o estado nutricional.2 Dados da Pesquisa Nacional Este estudo levanta questões referentes à NRS-2002 como
de Infecções Hospitalares (nos Estados Unidos) melhor preditor de desfechos clínicos comparada ao IMC,
mostraram que 54% de todas as infecções nosocomiais ao tempo de internação associado à idade e ao estado nutri-
ocorreram em pessoas com 65 anos ou mais.27 cional do paciente idoso no momento da internação hospi-
Segundo os resultados obtidos, observamos que talar. Apesar dos conhecimentos existentes, a terapia nutri-
pacientes classificados como desnutridos ou com sobre- cional ainda é utilizada insatisfatoriamente nessa faixa etária.
peso apresentaram tempo de internação semelhante. São necessários mais estudos que comprovem a
O IMC prevê risco nutricional, tanto nos desnutridos eficácia da terapêutica nutricional, assim como a identi-
como nos obesos. As comorbidades preexistentes em ficação do risco nutricional em hospitais privados, já que
pacientes idosos, particularmente nos que apresentam muitos trabalhos não utilizam a NRS-2002 como ferra-
sobrepeso, podem ser a explicação para o aumento no menta de triagem para indivíduos idosos.
tempo de internação desses pacientes.5 Acreditamos que a triagem nutricional seja um método
Devido ao aumento da morbidade, pacientes desnu- de trabalho simples, de fácil aplicação e baixo custo, com
tridos experimentam tratamento mais longo e maior eficiência para predizer desfechos clínicos em pacientes
tempo de internação. Em dois estudos realizados em idosos hospitalizados e identificar precocemente indivíduos
hospitais universitários de Genebra e Berlim, com 1.270 com problemas nutricionais ou aqueles em risco nutricional
pacientes, ficou demonstrada estreita relação entre o que necessitem de suporte nutricional adequado.
grau de desnutrição e o tempo de internação, e que o
baixo peso tem sido descrito como preditor indepen- Agradecimentos
dente em relação à sobrevida de idosos hospitalizados.28 Ao Instituto de Pós-graduação de Nutrição da Universi-
Em nosso estudo verificamos que aqueles que dade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) pelas sugestões e
apresentaram tempo de internação mais prolongado orientações e ao Hospital Adventista Silvestre pela opor-
tiveram 3 vezes mais chance de desenvolver infecção e tunidade na realização deste trabalho.
ir a óbito. Sugerimos que isso possa estar relacionado
à presença de doenças neurológicas, doenças respira- C O N C L U S ÃO
tórias, desorientação, disfagia e risco de broncoaspi- Em nosso estudo verificamos que aqueles que apresen-
ração, o que pode estar agravado nos pacientes que já taram tempo de internação mais prolongado tiveram três
se encontram desnutridos no momento da admissão vezes mais chance de desenvolver infecção e ir a óbito.
hospitalar. Paillaud et al.29 avaliaram nutricional-
mente, na admissão hospitalar, 185 pacientes idosos C onflitos de interesse
com idade média de 81 anos e verificaram que a inci- As autoras declaram não possuir nenhum conflito
dência de infecção nesses pacientes foi de 59%. de interesse.
Risco nutricional e desfechos clínicos | 37

R eferências
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Artigo originalGERIATRIA & GERONTOLOGIA
38 | REVISTA

Perfil do idoso com AIDS no Brasil

Juliano Brustolina, Thais Elisa Lunardib,


Naiara Maeli Michelsb

R es umo
Palavras‑chave Objetivos: Verificar o perfil dos pacientes idosos por meio das variáveis como sexo, cor, escolaridade e idade,
Idoso, notificados com AIDS na região sul do Brasil e na cidade de Chapecó, no período de 1980 a 2009, que adquiriram
síndrome de AIDS por via sexual. Metodologia: Trata-se de estudo observacional, descritivo e transversal cujos dados foram
imunodeficiência obtidos pelo Datasus e dispostos em planilhas do programa Excel, onde foi feito um cruzamento com tais dados.
adquirida, Resultados: Durante o período entre 1980 e 2009 observou-se aumento dos diagnósticos de AIDS em idosos na
transmissão de região estudada, sendo que aqueles que apresentaram maior prevalência de contágio são homens, heterossexuais,
doença infecciosa. brancos, da faixa etária entre 60 e 69 anos e de escolaridade entre 1 e 3 anos (baixa escolaridade). Esse mesmo
comportamento se repete na cidade de Chapecó, entretanto somente foi observado idoso contaminado por AIDS a
partir de 1995, e durante o período entre 2005 e 2009 a categoria de escolaridade com maior prevalência foi de 4 a 7
anos, seguida de 8 a 11 anos. Ainda nesse período houve maior prevalência de idosos com idade entre 70 e 79 anos.
Conclusão: A transmissão sexual do vírus da imunodeficiência humana (HIV) na população idosa da região sul do
Brasil e em Chapecó teve aumento no número de diagnósticos no período estudado, principalmente em indivíduos
masculinos, heterossexuais, de cor branca, entre 60 e 69 anos e de baixa escolaridade.

Profile of elderly people


with AIDS in Brazil
A BS T RACT
Keywords Objectives: Checking the profile of elderly patients with AIDS through some variable such as gender, race, educa-
Elderly, acquired tion level and age, reported in southern Brazil and in Chapecó in the period from 1980 to 2009, who acquired AIDS
immunodeficiency through sexual transmission. Methods: This was an observational, descriptive and cross study, whose data were
syndrome, obtained by consulting the Datasus, and then arranged in sheets through the operational program Excel, and a
infectious disease cross was made with this data. Results: During the period between 1980 and 2009 there was an increase in AIDS
transmission. diagnoses in elderly people in the studied region, and that those who had a higher prevalence of infection were men,
heterosexuals, whites, aged between 60 and 69 years old and education level between 1 and 3 years (low education).
This same behavior was repeated in Chapecó however, there were only elderly people contaminated by AIDS in 1995
and in the period between 2005 and 2009, the education level with the highest prevalence was 4-7 years followed
by 8 to 11 years, although in this period there was a higher prevalence of elderly people between aged 70 and 79
years old. Conclusions: The sexual transmission of human immunodeficiency virus (HIV), in elderly population
in southern Brazil and Chapecó, had an increase in the number of diagnoses during the studied period, especially in
the males, heterosexual, white, between 60 and 69 years old and low education level.

a
Médico, professor da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó). Participou da elaboração do trabalho como orientador e autor.
b
Aluna do 12o período do curso de Medicina da Unochapecó.

Dados para correspondência


Thais Elisa Lunardi – Rua Rio Grande, 1.035/301, Xaxim-SC.
Tels.: (49) 9976-0602, (49) 8868-3698. E-mail: thaisl@unochapeco.edu.br
Perfil do idoso com AIDS | 39

Introdução A análise dos dados foi realizada por meio de


Alguns autores defendem que as pessoas com mais de planilhas no programa Microsoft Office Excel,
50 anos de idade são afetadas pela síndrome da imuno- com o uso de coeficientes calculados com base nos
deficiência adquirida (AIDS) de forma semelhante às dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-
pessoas jovens.¹ Dessa forma, a AIDS deixou de ser uma tística (IBGE). As variáveis gênero, idade, distri-
doença de segmentos populacionais sob particular risco buição dos pacientes soropositivos idosos, casos
e disseminou-se para a população em geral. por transmissão sexual em idosos e casos novos
Recentemente, tem-se observado aumento no notificados na mesma população, entre 1980 e 2009,
número de casos, tanto na população feminina quanto na foram descritas em forma de coeficientes calcu-
masculina, com idades superiores a 59 anos, o que pode lados a partir da fórmula: coeficiente = (n/média
ser o indício de uma nova característica da epidemia.² do N) x 105, em que “N” é a população da variável
Isso se torna um problema, tendo em vista que a de interesse, segundo o censo do período refe-
conscientização sobre a AIDS entre os idosos é menor rido, enquanto “n” é a população acometida pelo
se comparada àquela prestada à população jovem e HIV referente a determinada variável de interesse,
adulta.³ Acredita-se que essa falta de conscientização, segundo o Datasus. Já as variáveis escolaridade e
associada ao prolongamento da vida e à manutenção sexualidade, referentes aos pacientes soropositivos
da atividade sexual por um período maior, além de idosos, foram dispostas em forma de porcentagem.
maior sobrevida dos pacientes soropositivos, pode
exercer influência no aumento da prevalência de AIDS R esu ltados
na população idosa.4 A AIDS, agora em sua terceira Foi possível verificar que, de 1980 até 2009, houve
década, dispõe de uma série de recursos destinados aumento progressivo no número de casos de idosos diag-
a populações de “alto risco” (homossexuais, usuários nosticados com AIDS, que adquiriram o HIV por via de
de drogas injetáveis, jovens com comportamento de transmissão sexual, na região sul do Brasil, incluindo a
risco), contudo ainda há uma parcela da população, os cidade de Chapecó, no Estado de Santa Catarina.
idosos, que está sendo ignorada e/ou tratada como se A região sul apresentou coeficiente de 3,48
fosse imune ao vírus HIV.5 casos/105 habitantes, correspondendo à segunda
Sendo assim, este artigo tem como objetivo descrever região brasileira de maior coeficiente. Chapecó teve
o perfil do idoso acometido pela AIDS entre os anos de coeficiente de 0,82 caso/105 habitantes, durante o
1980 a 2009, na região sul do Brasil e em Chapecó. período de 1995 a 1999.
Além disso, é a região que ascende de forma expres-
Metodologia siva e que, a partir do ano 2000 até 2009, possui o maior
Trata-se de estudo observacional, descritivo e trans- número de novos diagnósticos de idosos com AIDS.
versal cujos dados foram obtidos por meio de consulta Seguindo a evolução da região sul, o diagnóstico
às seguintes bases de dados: Sistema de Informações de de AIDS em idosos na cidade de Chapecó cresce
Agravos de Notificação (Sinan), Sistema de Controle de continuamente a partir do período correspondente
Exames Laboratoriais da Rede Nacional de Contagem de ao ano de 1995. Até então, nenhum caso de AIDS
Linfócitos CD4+/CD8 e Carga Viral (Siscel) e Sistema de tinha sido diagnosticado em idosos na cidade. No
Informações de Mortalidade (SIM), disponibilizados pelo período de 2005 a 2009, atingiu um coeficiente de
Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde 4,2 casos/105 habitantes.
(Datasus), considerando as seguintes variáveis: período Em relação ao gênero de acometimento, foi obser-
entre 1980 e 2009; idade do paciente; sexo; cor; escola- vado que, de 1980 até 2009, o coeficiente de mulheres
ridade; via de transmissão do HIV e ano de diagnóstico. e homens idosos infectados pelo vírus HIV por via de
Foram incluídos pacientes com 60 anos ou mais que transmissão sexual e que apresentam a síndrome da
tenham sido notificados com AIDS, cujo contágio com o imunodeficiência adquirida vem aumentando, tanto na
HIV tenha sido por via sexual, entre os anos de 1980 e região sul quanto na cidade de Chapecó.
2009, na região sul do Brasil. Foram excluídos pacientes A cor dos pacientes idosos com AIDS diagnos-
com menos de 60 anos, cujo diagnóstico de AIDS tenha ticados no período de 1980 a 1999 foi ignorada,
sido feito anteriormente a 1980 ou posteriormente a 2009, segundo o Datasus. Sendo assim, após esse período,
pacientes que foram infectados por vias de transmissão foi concluído que a porcentagem de diagnósticos
não sexuais ou em outras regiões brasileiras. em pacientes idosos da cor branca vem aumentando
Os dados foram coletados no período que e apresentando a maior parte dos diagnósticos, no
compreende o segundo semestre de 2010 e primeiro período de 2000 a 2004, correspondendo a 68,64% na
semestre de 2011. Por se tratar de um banco de região sul, e 80% na cidade de Chapecó. Já durante o
domínio público, não foi necessário submeter o período de 2005 a 2009, a porcentagem da cor branca
projeto ao Comitê de Ética em Pesquisa. na região sul foi de 80%, e de 100% (n = 8) em Chapecó.
40 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Tabela 1  Coeficientes da região sul do Brasil relativos aos idosos acometidos por AIDS durante o período de 1980 a 2009
Período 1980-1984 1985-1989 1990-1994 1995-1999 2000-2004 2005-2009
Pacientes com 60 anos ou mais 0 1,19 8,9 22,37 39,05 56,73
Pacientes ≥60 anos com transmissão sexual 0 0,73 6,7 17,39 25,88 32,9
Homens ≥60 anos 0 0,86 12,29 24,02 31,53 38,18
Mulheres ≥60 anos 0 0,61 2,11 11,9 21,33 28,65
Pacientes com transmissão sexual entre 60 e 69 anos 0 0,96 9,66 23,76 36,12 48,22
Pacientes com transmissão sexual entre 70 e 69 anos 0 0,45 2,75 10,14 15,51 16,84
Pacientes com transmissão sexual com 80 anos ou mais 0 0 0 0,98 1,88 3,91

Tabela 2  Coeficientes da cidade de Chapecó relativos aos idosos acometidos por AIDS durante o período de 1980 a 2009
Período 1980-1984 1985-1989 1990-1994 1995-1999 2000-2004 2005-2009
Pacientes com 60 anos ou mais 0 0 0 4,13 23,82 28,87
Pacientes ≥60 anos com transmissão sexual 0 0 0 4,13 17,01 21
Homens ≥60 anos 0 0 0 8,78 22,03 28,51
Mulheres ≥60 anos 0 0 0 0 12,68 14,59
Pacientes com transmissão sexual entre 60 e 69 anos 0 0 0 6,72 23,03 22,69
Pacientes com transmissão sexual entre 70 e 69 anos 0 0 0 0 11,1 25,86
Pacientes com transmissão sexual com 80 anos ou mais 0 0 0 0 0 0

Em relação à sexualidade dos idosos diagnosticados AIDS em idosos como sendo em pacientes bissexuais,
com AIDS, pode-se observar que, de modo geral, ocorreu enquanto no período de 2005 a 2009, 100% (n = 8) dos
aumento dos diagnósticos na população heterossexual idosa diagnósticos foram de heterossexuais.
em relação à população homossexual e bissexual da mesma Em relação à escolaridade, ao longo de todo o período os
faixa etária após 1990. Também é possível verificar que a idosos acometidos por AIDS apresentam, em sua maioria,
porcentagem referente à sexualidade tende a ter um padrão escolaridade de 1 a 3 anos seguida da categoria de 4 a 7
de distribuição mais sólido a partir de 1995, quando há anos de escolaridade. Os pertencentes à categoria “igno-
predomínio de heterossexuais e redução do número de casos rados”, ou seja, aqueles que não se encaixam em nenhuma
de homossexuais e bissexuais idosos infectados pelo HIV. das demais categorias, representam uma porcentagem
A região sul apresentou, no período de 2005 a 2009, significativa em todos os períodos. Concluindo, quanto
mais de 80% dos pacientes idosos diagnosticados com menor a escolaridade dos idosos, maior a frequência de
AIDS como sendo heterossexuais. Em Chapecó, entre casos de AIDS nesse grupo, na região sul, durante todo o
1995 e 1999, atingiu 100% (n = 1) dos diagnósticos de período de 1980 a 2009 (Tabela 4).

Tabela 3  Escolaridade dos pacientes idosos com AIDS acometidos por via sexual na região sul no período de 1980 a 2009 (N = 2010)
12 anos ou mais
Período Nenhuma (%) 1 a 3 anos (%) 4 a 7 anos (%) 8 a 11 anos (%) Ignorados (%) N
(%)
1980-1984 0 0 0 0 0 0 0
1985-1989 0 18,18 9,09 0 9,09 63,63 11
1990-1994 3,44 18,96 18,10 12,06 16,37 31,03 116
1995-1999 11,40 30,40 21,34 10,52 9,35 16,95 342
2000-2004 12,64 33,66 23,31 10,01 6,40 13,95 609
2005-2009 8,15 23,17 32,61 16,30 5,47 14,27 932

Fonte: Datasus, 2011

Tabela 4  Escolaridade dos pacientes idosos com AIDS acometidos por via sexual na cidade de Chapecó no período de 1980 a 2009 (N = 14)
12 anos ou mais
Período Nenhuma (%) 1 a 3 anos (%) 4 a 7 anos (%) 8 a 11 anos (%) (%) Ignorados (%) N
1980-1984 0 0 0 0 0 0 0
1985-1989 0 0 0 0 0 0 0
1990-1994 0 0 0 0 0 0 0
1995-1999 0 100 0 0 0 0 1
2000-2004 20 60 0 0 20 0 5
2005-2009 12,50 0 62,50 25 0 0 8

Fonte: Datasus, 2011


Perfil do idoso com AIDS | 41

Figura 1  Formas de transmissão do vírus da imunodeficiência humana


Em relação à mesma variável na cidade de Chapecó, (HVI) na região sul, entre os idosos, durante o período de 1980 a 2009
foi visto que, como já citado, durante o período de
1980 a 1995 não havia pacientes idosos acometidos 100%
por AIDS. Então, durante o período de 2000 a 2004,
90%
houve predominância de indivíduos com escolari-
dade de 1 a 3 anos, frequências iguais entre pacientes 80%
com 12 anos ou mais de escolaridade e pacientes com 70%
nenhuma escolaridade, sendo as demais categorias 60%
nulas nesse período (Tabela 4).
50%
Quanto à idade dos idosos, observou-se que, durante
o período de 1980 a 1984, não há acometimento por 40%
AIDS nessa população. Já ao longo de todo o período 30%
observa-se predominância de pacientes com idade entre 20%
60 e 69 anos, seguida de pacientes com 70 a 79 anos e,
10%
por último, compondo o grupo de menor prevalência, os
pacientes com 80 anos ou mais. 0%
1980-1984 1985-1989 1990-1994 1995-1999
Nessa mesma variável na cidade de Chapecó, no
período de 1980 a 1984, não há idosos acometidos por Transmissão sexual Ignorado
AIDS. Já durante o período de 1995 a 1999, observa- Transmissão vertical, usuários de drogas
se prevalência isolada de pacientes com idade entre injetáveis, hemofílicos e acidente com
material contaminado
60 e 69 anos. No período de 2000 a 2009, há acome-
timento, também, de pacientes com idade entre 70
e 79 anos, porém sem infecção de pacientes com 80
anos ou mais. Durante o período entre 2000 e 2004,
há predominância de pacientes com idade entre 60 e Pode-se citar que essa amplificação de diagnósticos de
69 anos, e no período entre 2005 e 2009 há prevalência AIDS na terceira idade ocorreria devido ao aumento popu-
maior em pacientes com idade entre 70 e 79 anos. lacional dessa faixa etária, que atualmente tem crescimento
Os pacientes idosos com AIDS, de 80 anos ou mais, três vezes maior do que a população adulta jovem. Contudo,
formam a categoria de menor prevalência. verificou-se que, além da ascensão do número absoluto de
Outra variável estudada foi quanto à forma de novos casos, houve aumento do coeficiente de incidência
contágio dos pacientes com o vírus da imunodeficiência de AIDS nessa população, tornando assim a doença, nesse
humana entre os idosos na região sul. Em relação a ela, grupo específico, relevante no âmbito epidemiológico.6
foi observado que, durante o período de 1980 a 1984, O aumento desse coeficiente se dá em decorrência
não há pacientes soropositivos. No período seguinte, das notificações tardias, de poucas pesquisas na área e
observa-se prevalência maior por transmissão sexual das confusões no diagnóstico clínico.3 Entretanto, esse
seguida de forma ignorada, ou seja, durante a notifi- aumento decorre da visão errônea que a sociedade, os
cação não foi verificada a forma de contágio do HIV; por cuidadores de saúde e os próprios idosos tem, pela qual
último, encontra-se prevalência menor de transmissão a possibilidade de uma pessoa idosa ser sexualmente
vertical, hemofílicos, acidentes por materiais contami- ativa e/ou infectada pelo HIV é nula, deixando os idosos
nados e usuários de drogas injetáveis (UDI). desassistidos e mais suscetíveis a essa infecção.7
Com relação à forma de transmissão em Chapecó, foi O aumento da sobrevida e da melhor qualidade de vida
observado que, de 1980 a 1994, não há pacientes idosos dos pacientes idosos contribuiu de forma primária para o
soropositivos. Nos períodos seguintes ocorre predomi- aumento da prevalência da AIDS na terceira idade, uma
nância da forma de transmissão sexual sobre as demais vez que haverá maior acúmulo de pacientes infectados, em
formas, sendo que ela corresponde a 100% no período decorrência da diminuição da letalidade em anos de vida.
entre 1995 e 1999. Não se observa transmissão por UDI, Contudo, afirma-se que os mesmos fatores contribuíram de
transmissão vertical, hemofílicos ou acidente com mate- forma secundária para o aumento da incidência de AIDS
riais contaminados, ao longo de todo o período. entre os mais velhos, uma vez que, sendo a transmissão
sexual a principal via de contágio com o HIV, quanto maior
Discuss ão a sobrevida do paciente HIV soropositivo e a vida sexual
Para a obtenção dos dados deste estudo, optou-se ativa deste, maior será a probabilidade de transmissão do
pela utilização da fonte de informação Datasus, por vírus para um indivíduo até então saudável.8
ser um banco de dados de fácil manipulação, livre Os idosos com AIDS que se expuseram ao HIV de outra
acesso e que está ao alcance de qualquer gestor e/ou forma que não a sexual apresentaram decréscimo na taxa
profissional de saúde. de incidência. Porém, a categoria dos “ignorados”, que teve
42 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

aumento considerável, impede que seja traçado um perfil no Brasil, a escolaridade entre 1 e 3 anos era a mais preva-
mais consistente quanto à forma de exposição ao vírus. lente, confirmando desse modo a maioria dos resultados
Ainda em relação à categoria de exposição, mesmo obtidos no presente estudo.12
que menos expressiva, o uso de drogas injetáveis chama a Quando a análise é relacionada à variável cor, temos que
atenção entre os idosos. Os cuidadores da saúde, por sua lembrar que o Brasil é um país com grande miscigenação e
vez, geralmente não investigam o uso de drogas nesse que os pacientes são enquadrados na categoria a que supos-
grupo, supondo assim, erroneamente, que os mais velhos tamente pertencem. Portanto, é válido lembrar que traçar
não são passíveis de tal comportamento no presente nem um perfil epidemiológico consistente, tanto referente à
o foram no passado, fazendo com que a pesquisa sobre o raça como à cor, no Brasil, e por intermédio dos bancos de
uso de drogas injetáveis não constitua um fato relevante dados já existentes, é um trabalho que ainda não é possível
para o momento da consulta.1 realizar, devido à precariedade de informações e ao grande
A transmissão sexual é a forma de contágio predomi- número de casos ignorados quanto a essas variáveis.2,4,12,13
nante entre os idosos com AIDS,2,8,9 sendo a predominância
da transmissão sexual sobre as demais formas de trans- C oncl u s ão
missão do HIV observada no presente estudo. A partir de Portanto, com esse estudo concluiu-se que o número de
1995 ocorreu em todas as regiões uma heterossexualização idosos com AIDS está crescendo na região sul. O perfil
da epidemia de AIDS nos idosos, sendo que a prevalência mais prevalente do idoso acometido é do sexo masculino,
da categoria de exposição de heterossexuais correspondeu branco, entre 60 e 69 anos, heterossexual, com escolaridade
sempre a um valor superior a 60% dos diagnósticos totais entre 1 e 3 anos, acometido pelo vírus da imunodeficiência
nessa faixa etária. A transmissão heterossexual constitui a humana pela via sexual. O estudo também demonstrou
principal fonte de contaminação do HIV entre os idosos, que, apesar de o sexo masculino ainda representar a maior
ainda que a transmissão entre indivíduos homossexuais ou parte dos diagnósticos, o sexo feminino está cada vez mais
bissexuais permaneça relevante no âmbito epidemiológico.4 sendo acometido pelo HIV e, portanto, fazendo com que a
A incidência de AIDS nas mulheres idosas, nos últimos AIDS passe de infecção substancialmente masculina para
anos, continua a subir, demonstrando que a feminização da uma patologia que acomete também a população feminina.
epidemia é bastante visível nessa faixa etária.3 No período A cidade de Chapecó, apesar de pertencer à região
entre 1995 e 2005, a relação entre os sexos diminuiu, de 3 sul, apresenta menor prevalência de idosos com AIDS
homens diagnosticados para 1 mulher diagnosticada, para que a prevalência encontrada nessa região. Difere ainda
1,5 homem diagnosticado para cada mulher.10 A feminização da região sul por apresentar maior prevalência de idosos
da epidemia ocorre devido ao fato de que os idosos tendem a acometidos por AIDS, com escolaridade entre 8 e 11
ver os preservativos como uma medida contraceptiva e não anos e idade entre 70 e 79 anos durante o último período,
preventiva, de modo que as mulheres que já ultrapassaram a apesar de apresentar maior prevalência global de idade
idade fértil não insistem mais em seu uso, uma vez que elas entre 60 e 69 anos e escolaridade de 1 a 3 anos.
também sofrem as mudanças físicas da idade e possuem
maior vulnerabilidade para se infectarem com o HIV.11 C onflito de interesse
Em relação à escolaridade nos pacientes com idade Os autores declaram não possuir nenhum conflito de
superior ou igual a 50 anos, diagnosticados com AIDS, interesse.

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Artigo
O conhecimento de HIV/AIDS original
em idosos | 43

conhecimento de HIV/AIDS
em um grupo de idosos na
cidade de Criciúma – SC/Brasil

Kristian Madeiraa, Priscyla Waleska Targino de


Azevedo Simõesb, Matheus Cipriano Vidal Heluanyc,
Claudia Cipriano Vidal Heluanyd , Maria Caroline Seraphim Mello

Res umo
Palavras‑chave Introdução: A infecção pelo HIV constitui um fenômeno mudial, extremamente prevalente na população, sendo atualmente
HIV, idosos, considerada uma pandemia. Diante do aumento da prevalência dessa infecção na população idosa, pode-se assumir um aumento
prevenção. da atividade sexual nesse grupo, sendo essencial o conhecimento sobre ela nessa população. Objetivos: conhecer o grau de
conhecimento sobre HIV/AIDS em um grupo de idosos, na cidade de Criciúma/SC no primeiro semestre de 2013, incluindo
conceitos básicos, transmissão e prevenção. Metodologia: Estudo observacional, transversal, descritivo, com abordagem
predominantemente quantitativa, utilizando como área de estudo postos de saúde dos bairros da cidade de Criciúma/SC, sendo
estes os locais onde acontecem as reuniões dos grupos de idosos. A amostra foi composta por todos os indivíduos idosos que
estiveram presentes nos grupos de idosos, nos dias em que foram aplicados os questionários e preencheram os critérios de inclusão.
Resultados: A população estudada foi composta predominantemente por mulheres, sendo 90,4%. O grau de alfabetização mais
comum foi de 1 a 3 anos de estudo (43,2%). Em relação à transmissão, 33% da população acreditava que ocorria por meio da picada
de mosquito. Quase metade dos entrevistados, 47,7% pensava que a pessoa com o vírus da AIDS sempre apresenta os sintomas
da doença. Apenas 12% dos entrevistados com vida sexual ativa afirmou fazer uso de preservativos durante o intercurso sexual.
Conclusão: Embora a população estudada já tenha tido contato com informações sobre a doença, nota-se o desconhecimento de
aspectos básicos importantes para a prevenção, demonstrando a necessidade de ações corretivas neste sentido.

The knowledge of HIV/AIDS by a group of elderly


people at Criciúma-SC/Brazil
ABS T RACT
Keywords Introduction: HIV infection is a global phenomenon, extremely prevalent worldwide and it is currently considered a
HIV, elderly, pandemic. Since the prevalence of this infection in elderly population has increased, it may be assumed an increase of sexual
prevention. activity in this population, so it is essential the knowledge about it in this population. Objectives: To determine the degree
of knowledge about HIV/AIDS in a group of elderly people in Criciúma, Santa Catarina, Brazil, in the first semester of 2013,
which included basic concepts, transmission and prevention. Methodology: The study was a cross-sectional observational,
descriptive, predominantly with a quantitative approach, using as a study area a health center at Criciúma/SC neighborhood,
where the elderly people’s meetings took place. The sample was composed by elderly individuals who attended the elderlies’
meeting during the days that the questionnaires were applied and that fulfilled the inclusion criteria. Results: The study
population was composed predominantly by women, constituting 90.4%. The education level most common was 1-3 years
of education (43.2%). Regarding the transmission, 33% of the population believed that transmission occurred through a
mosquito bite. Nearly half of the interviewees, 47.7% thought that the person with the AIDS virus always shows symptoms
of the disease. Only 12% of sexually active interviewees answered affirmatively wearing condoms during sexual intercourse.
Conclusion: Although the population has already been in touch with informations about this disease, it is notable the not
knowing of basic aspects important to the prevention, demonstrating the need for a corrective action in this way.

a
Doutorando em Ciências da Saúde, Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc). Professor de Bioestatística do Departamento de Medi-
cina da Unesc. Pesquisador do Laboratório de Epidemiologia da Unesc.
b
Doutoranda em Ciências da Saúde, Unesc. Professora de Informática Médica da Unesc.
c
Graduando em Medicina, Unesc.
d
Médica geriatra. Mestre em Ciências da Saúde. Professora da Unesc.

Dados para correspondência


Claudia Cipriano Vidal Heluany – Curso de Medicina – Universidade do Extremo Sul Catarinense. Av. Universitária, 1105, Bairro Universi-
tário, Criciúma – SC. CEP 88806-000.
E-mail: heluanyc@terra.com.br
44 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Introdução que frequentavam os grupos de idosos dos bairros sele-


A população brasileira, conforme o Censo Demográfico cionados aleatoriamente para o projeto.
de 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística Como critério de inclusão do presente estudo tivemos
(IBGE), atingiu 190.755.799 habitantes, com 84,4% da todos os indivíduos com idade igual ou acima de 60 anos
população definida como urbana.1 presentes aos encontros de grupos de idosos nos dias
Considerando-se o aumento da população idosa, marcados para aplicar os questionários. Foram excluídos
tanto nos países desenvolvidos como nos que estão em os indivíduos acima de 60 anos que faltaram ao encontro
desenvolvimento, é importante se preocupar com a velo- do grupo de idosos nos dias marcados para aplicação
cidade em que se processa o aumento do número de dos questionários, aqueles que recusaram a participação
idosos na sociedade brasileira e as consequências que voluntária na coleta dos dados e os que se recusaram a
esse fenômeno acarreta.2 Em nosso país, o número de assinar o termo de consentimento livre e esclarecido.
pessoas com mais de 60 anos passou de 3 milhões em Foram utilizados como área de estudo alguns dos
1960, para 7 milhões em 1975 e 14 milhões em 2002, postos de saúde da cidade de Criciúma, que possuem
estimando-se que alcançará 32 milhões em 2020.3 grupo de idosos credenciados pela Associação Feminina
Por haver mudanças na composição populacional, de Assistência Social de Criciúma, Afasc, sendo esses os
inicia-se uma série de consequências sociais, culturais e locais onde acontecem as reuniões dos grupos de idosos.
epidemiológicas que permitem, com o maior acesso às Os bairros inclusos foram: São Defende, Nova Esperança,
informações, modificações comportamentais, como maior Santa Luzia, Boa Vista, Tereza Cristina, Mina União,
conscientização e esclarecimento entre a população da São Cristóvão, Vila Macarini, Colonial, Metropol, São
terceira idade. Entre as modificações pode-se citar a desmis- Marcos, Pinheirinho, Operária Nova, Santa Bárbara, Ana
tificação de que sexualidade não interessa aos idosos.2 Maria, Vida Nova, Renascer, Vila Rica, Demboski, Prós-
Porém, pouco se sabe sobre o comportamento sexual e a pera, Nossa Senhora da Salete, Comerciário, Mina Brasil,
função sexual dos indivíduos idosos na atualidade.4 Vila do Toco, Vila Manaus, São João, Quarta Linha, Santo
Em virtude da censura à terceira idade, esses indiví- Antônio, São Luís, Linha Batista, Brasília, Rio Maina,
duos podem estar mais suscetíveis à prática sexual despro- Santo André, Vila Miguel, Centro, Lote 6, Mina do Mato,
tegida, estando expostos a uma série de doenças sexual- Morro Estêvão, Pedro Zanivan, Mãe Luzia, Mineira
mente transmissíveis. Dentre elas destaca-se a síndrome Velha, Mineira Nova, São Francisco, Michel, Laranjinha,
da imunodeficiência adquirida (AIDS), sendo que, no Universitário, Santa Augusta e Jardim Angélica.
Brasil, os casos dessa infecção em maiores de 60 anos Para a coleta de dados, utilizou-se um questionário
acontecem predominantemente por transmissão sexual.5 autoaplicável, anônimo e desenvolvido a partir de uma
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), desde adaptação do instrumento proposto por Lazzarotto et al.,8
o início da epidemia, mais de 60 milhões de pessoas foram com questões relacionadas a conhecimentos básicos sobre
infectadas com o vírus HIV e cerca de 30 milhões de pessoas transmissão, prevenção e tratamento do vírus da AIDS.
morreram de AIDS. Em 2010, havia uma estimativa de 34 Os questionários foram aplicados após o preenchimento
milhões de pessoas vivendo com o HIV, 2,7 milhões de novas do termo de consentimento livre e esclarecido, nos dias
infecções e 1,8 milhão de mortes relacionadas à AIDS.6 das reuniões dos grupos de idosos, em datas diferentes em
No Brasil, a epidemia de infecção pelo HIV e da cada grupo, entre abril e junho de 2013, por uma equipe
AIDS na primeira década (anos 1980) era restrita basi- de voluntários, a maioria composta por assistentes sociais,
camente às regiões metropolitanas da região Sudeste e treinados pela pesquisadora e sua orientadora, em uma
aos homossexuais, aos hemofílicos, aos que recebiam aula na qual foram expostos a importância da pesquisa, o
transfusão sanguínea e aos usuários de drogas injetá- caráter individual de cada questionário e a não influência
veis. Nos últimos anos, essa epidemia vem aumentando pessoal dos voluntários na resposta do idoso. Aqueles que
expressivamente entre as mulheres, como recorrência da não souberam ou não puderam ler e escrever adequada-
transmissão heterossexual, que atualmente é a principal mente e quiseram participar da pesquisa responderam às
modalidade de exposição ao HIV.7 perguntas aos entrevistadores, que anotaram as respostas.
Diante da magnitude dessa doença, o trabalho tem A variável dependente deste estudo foi definida como
como base abordar o grau de conhecimento sobre HIV/ conhecimento sobre HIV/AIDS; em contrapartida, as
AIDS em um grupo de idosos na cidade de Criciúma (SC). variáveis independentes elencam-se em idade, gênero,
grau de escolaridade, nível socioeconômico, religião e
Métodos presença de parceiro fixo.
Foi realizado estudo observacional, transversal, descritivo, Após a coleta dos dados foi organizado um banco
com abordagem predominantemente quantitativa, apro- de dados no software IBM Stastistical Package for the
vado pelo Comitê de Ética da Universidade do Extremo Social Sciencies (SPSS), versão 20.0, onde foram obtidas
Sul Catarinense sob o Protocolo no 341.186/2013. as frequências das variáveis qualitativas que compõem o
A população deste estudo foi composta pelos idosos questionário aplicado e calculadas as estatísticas descri-
O conhecimento de HIV/AIDS em idosos | 45

tivas (média e desvio-padrão) da idade dos idosos, além Tabela 1  Características da população amostral estudada
da análise estatística, que foi realizada com nível de Variáveis
Média ± desvio-padrão ou n (%)
n = 578
significância a = 0,05 e confiança de 95%.
Idade (anos) 71,41 ± 6,46
A investigação da distribuição da variável idade,
Sexo
quanto à normalidade, entre as categorias das variá-
Feminino 520 (90,4)
veis qualitativas que compõem o questionário, como o
conhecimento sobre HIV/AIDS, foi realizada a partir da Masculino 55 (9,6)

aplicação do teste de Shapiro-Wilk. Escolaridade

A existência de associação entre variáveis qualita- Nenhuma 50 (8,7)

tivas, como gênero e escolaridade, entre as categorias 1 a 3 anos de estudo 247 (43,2)

das variáveis relacionadas ao conhecimento sobre HIV/ 4 a 7 anos de estudo 205 (35,8)
AIDS, foi investigada por meio da aplicação do teste qui- 8 a 11 anos de estudo 53 (9,3)
quadrado de associação ou independência. 12 ou mais anos de estudo 17 (3,0)
A comparação da média de idade entre as catego- Religião
rias das variáveis qualitativas politômicas, como o grau Católica 510 (92,2)
de conhecimento sobre HIV/AIDS, foi realizada pela Evangélica 34 (6,1)
aplicação da análise de variância ANOVA de uma via, Espírita 7 (1,3)
seguida do post hoc, teste de Tukey, quando houve distri- Outra 2 (0,4)
buição normal, e pelo teste H de Kruskall-Wallis, seguido Renda mensal
do teste post hoc de Dunn, quando não se percebeu Até 1 salário mínimo 217 (38,5)
aderência dos dados a uma distribuição gaussiana.
De 1 a 3 salários mínimos 306 (54,4)
De 4 a 6 salários mínimos 35 (6,2)
Resultados
De 7 a 8 salários mínimos 3 (0,5)
A amostra estudada foi composta por 578 pessoas, que
De 9 a 10 salários mínimos 2 (0,4)
preencheram os critérios de inclusão e exclusão, sendo
Mais de 10 salários mínimos 0 (0,0)
a maior parte mulheres, 90,4%, contra 9,6% de homens.
Possui parceiro
Em relação ao estado civil dos idosos, 41,1% possuíam
companheiro(a). A maior parte dos indivíduos entrevis- Sim 235 (41,1)

tados tinha 1 a 3 anos de estudo, correspondendo a 43,2%. Não 337 (58,4)

A idade dos entrevistados variou de 60 a 90 anos, sendo Realizou o teste de AIDS algum dia

que a idade média observada foi de 71,4 anos (±6,46). O Sim 138 (24,0)
perfil descritivo encontra-se disponível na Tabela 1. Não 436 (76,0)
Em relação ao conhecimento básico e à doença, Usa preservativo nas relações
81,5% afirmaram que o HIV é o vírus causador da AIDS, Sim 36 (12,0)
47,7% acreditam que a AIDS sempre apresenta sintomas Não 263 (87,9)
evidentes, e a maioria (88,7%) dos entrevistados afirma Não pratica atividade sexual 273 (47,7)
que a AIDS tem tratamento. Além disso, 76% acreditam Conhece alguém HIV positivo
que não exista cura e 28,2% não souberam responder Sim 301 (52,2)
sobre a existência de uma vacina para a AIDS (Tabela 2). Não 276 (47,8)
Dentre os critérios de transmissão, 33,0% dos entre-
vistados creem que a doença possa ser transmitida pela
picada de mosquito, 17,5% pensam que possa haver Ao correlacionar o grau de conhecimento dos entrevis-
transmissão pelo beijo no rosto, beber no mesmo copo tados com a sua escolaridade, em grande parte das variáveis,
e tomar chimarrão, 15,1% presumem que o uso de sabo- notou-se associação positiva e diretamente proporcional; a
netes, toalhas e assentos sanitários transmite a doença, e maioria dos entrevistados com alta escolaridade respondeu
11,1% dos entrevistados consideram a AIDS um castigo corretamente sobre a identificação do HIV por meio de
de Deus para quem cometeu algum pecado (Tabela 3). exame de sangue (p = 0,045); possibilidade de cura para a
Sobre a prevenção, notou-se que a maioria dos entre- AIDS (p = 0,015); transmissão pelo contato com sabonetes,
vistados, 81,1%, julga a população idosa suscetível à toalhas e assentos sanitários (p <0,001); AIDS como castigo
AIDS, e 79,3% afirmam que ela não é uma doença exclu- de Deus (p = 0,004); possibilidade de uso de preservativos
siva de homossexuais masculinos, prostitutas e usuários por idosos (p <0,001); AIDS como doença exclusiva de
de drogas. Grande parte (83,2%) sabe que os idosos homossexuais masculinos, prostitutas e usuários de drogas
podem usar preservativos sem problemas, porém apenas (p = 0,002). Dentre aqueles com pouca ou nenhuma esco-
uma pequena parte daqueles que mantêm atividade laridade, percebeu-se: menor conhecimento sobre o HIV
sexual usa preservativo (Tabelas 1 a 4). ser o causador da AIDS (p <0,001); presença de sintomas
46 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

evidentes sempre que ocorre a infecção (p <0,001); trans- forma de prevenção da doença, seringas como meios de
missão por meio de abraço, beijo no rosto, beber no mesmo transmissão, ser doença exclusiva de jovens, existência
copo e tomar chimarrão (p = 0,049); existência de cami- de tratamento e necessidade de vários parceiros para
sinha feminina (p = 0,036); existência de vacina para a contrair AIDS, que não demonstraram diferença estatis-
AIDS (p = 0,001); 50% dos entrevistados que não possuem ticamente significativa na análise (Tabelas 2, 3 e 4).
escolaridade afirmam que há transmissão a partir da picada Ao comparar o grau de conhecimento com o gênero
de mosquito (p <0,001) (Tabelas 2, 3 e 4). dos entrevistados, não houve significância estatística,
Embora se perceba uma associação entre o grau com exceção da variável que questionava a transmissão
de escolaridade dos entrevistados e o conhecimento, por abraço, beijo no rosto, beber no mesmo copo e tomar
também existem variáveis que independem da escola- chimarrão (p <0,001), sendo que 34,5% dos homens e 15,4%
ridade, como, por exemplo, uso de preservativo como das mulheres concordavam com essa informação (Tabela 3).

Tabela 2  Resultado do questionário aplicado sobre conhecimento básico da doença em relação à escolaridade e ao gênero
HIV é o Sintomas sempre O vírus é identificado Existe tratamento Existe cura Existe vacina
causador da AIDS são evidentes por exame de sangue para AIDS para AIDS para AIDS
V F NS V F NS V F NS V F NS V F NS V F NS
471 16 91 273 182 117 504 22 51 512 30 35 68 440 69 111 304 163
Total
(81,5) (2,6) (15,7) (47,7) (31,8) (20,5) (87,3) (3,80) (8,80) (88,7) (5,20) (6,10) (11,8) (76,3) (12,0) (19,2) (52,6) (28,2)
Escolaridade (p <0,001) (p <0,001) (p = 0,045) (p = 0,108) (p = 0,015) (p = 0,001)
32 01 17 23 09 16 39 02 09 40 04 06 14 29 07 14 22 14
Nenhuma
(64,0) (2,00) (34,0) (47,9) (18,8) (33,3) (78,0) (4,00) (18,0) (80,0) (8,00) (12,0) (28,0) (58,0) (14,0) (28,0) (44,0) (28,0)
190 09 48 134 53 60 210 08 28 212 15 20 31 184 31 47 110 90
1 a 3 anos
(76,9) (3,60) (19,4) (54,3) (21,5) (24,3) (85,4) (3,30) (11,4) (85,8) (6,10) (8,10) (12,6) (74,8) (12,6) (19,0) (44,5) (36,4)
178 04 23 86 82 35 186 07 12 188 09 07 17 165 23 38 121 46
4 a 7 anos
(86,8) (2,00) (11,2) (42,4) (40,4) (17,2) (90,7) (3,40) (5,90) (92,2) (4,40) (3,40) (8,30) (80,5) (11,2) (18,5) (59,0) (22,4)
50 02 01 21 27 03 49 03 01 51 01 01 04 43 06 11 33 09
8 a 11 anos
(94,3) (3,80) (1,90) (41,2) (52,9) (5,90) (92,5) (5,70) (1,90) (96,2) (1,90) (1,90) (7,50) (81,1) (11,3) (20,8) (62,3) (17,0)
16 00 0,1 16 00 01 17 00 00 16 00 01 01 15 01 01 14 02
>12 anos
(94,1) (0,00) (5,90) (94,1) (0,00) (5,90) (100) (0,00) (0,00) (94,1) (0,00) (5,90) (5,90) (88,2) (5,90) (5,90) (82,4) (11,8)
Gênero (p = 0,224) (p = 0,674) (p = 0,715) (p = 0,308) (p = 0,799) (p = 0,058)
420 16 84 244 165 106 452 21 46 461 25 33 63 394 62 101 266 153
Feminino
(80,8) (3,10) (16,2) (47,4) (32,0) (20,6) (87,1) (4,00) (8,90) (88,7) (5,20) (6,10) (12,1) (75,9) (11,9) (19,2) (52,6) (28,2)
49 00 06 29 15 10 49 01 05 48 05 02 05 43 07 09 37 09
Masculino
(89,1) (0,00) (10,1) (53,7) (27,8) (18,5) (89,1) (1,80) (9,10) (87,3) (9,10) (3,60) (9,10) (78,2) (12,7) (16,4) (67,3) (16,4)

V: verdadeiro; F: falso; NS: não sei.

Tabela 3  Resultados do questionário sobre transmissão da doença em relação à escolaridade e ao gênero


Ocorre transmissão Transmissão por abraço,
Uso da mesma seringa
por meio de sabonetes, beijo no rosto, beber no A picada de mosquito AIDS é um castigo de
por diversas pessoas
toalhas e assentos mesmo copo pode transmitir a doença Deus para quem pecou
transmite a doença
sanitários e tomar chimarrão
V F NS V F NS V F NS V F NS V F NS
87 415 76 101 418 59 191 251 136 540 15 21 64 471 41
Total
(15,1) (71,8) (13,1) (17,5) (72,3) (10,2) (33,0) (43,4) (23,5) (93,8) (2,60) (3,60) (11,1) (81,8) (7,10)
Escolaridade (p = 0,010) (p = 0,049) (p <0,001) (p = 0,461) (p = 0,004)
11 26 13 09 33 08 25 14 11 45 02 03 13 31 05
Nenhuma
(22,0) (52,0) (26,0) (18,0) (66,0) (16,0) (50,0) (28,0) (22,0) (90,0) (4,00) (6,00) (26,5) (63,3) (10,2)
37 174 36 55 166 26 78 92 77 277 07 13 28 197 21
1 a 3 anos
(15,0) (70,4) (14,6) (22,3) (67,2) (10,5) (31,6) (37,2) (31,12) (91,9) (2,80) (5,30) (11,4) (80,1) (8,50)
30 154 21 27 158 20 57 107 41 195 06 04 20 172 13
4 a 7 anos
(14,6) (75,1) (10,2) (13,2) (77,1) (9,80) (27,8) (52,2) (20,0) (95,1) (2,90) (2,00) (9,80) (83,9) (6,30)
06 41 06 06 43 04 24 25 04 51 00 01 03 49 01
8 a 11 anos
(11,3) (77,4) (11,3) (11,3) (81,1) (7,50) (45,3) (47,2) (7,50) (98,1) (0,00) (1,90) (5,70) (92,5) (1,90)
00 17 00 00 16 01 03 12 02 16 00 00 00 17 00
>12 anos
(0,00) (100) (0,00) (0,00) (94,1) (5,90) (17,6) (70,6) (11,8) (100) (0,00) (0,00) (0,00) (100) (0,00)
Gênero (p = 0,206) (p = 0,001) (p = 0,343) (p = 0,075) (p = 0,093)
75 379 66 80 387 53 171 222 127 488 11 19 54 429 35
Feminino
(14,4) (72,9) (12,7) (15,4) (74,4) (10,2) (32,9) (42,7) (24,4) (94,2) (2,10) (3,60) (10,4) (82,8) (6,80)
12 34 09 19 30 06 18 28 09 49 04 02 10 39 06
Masculino
(21,8) (61,8) (16,4) (34,5) (54,5) (10,9) (32,7) (50,9) (16,4) (89,0) (7,20) (3,60) (18,2) (70,9) (10,9)

V: verdadeiro; F: falso; NS: não sei.


O conhecimento de HIV/AIDS em idosos | 47

Tabela 4  Resultados do questionário sobre prevenção da doença em relação à escolaridade e ao gênero


Doença exclusiva
Há uma camisinha Doença de jovens, de homossexuais Os idosos podem É necessário ter
O uso de camisinha
específica para não acomete os masculinos, usar preservativos vários parceiros para
impede a transmissão
mulheres idosos prostitutas e usuários sem problemas pegar a doença
de drogas
V F NS V F NS V F NS V F NS V F NS V F NS
453 72 52 470 12 96 68 469 41 73 457 46 480 29 68 136 393 49
Total
(78,5) (12,5) (9,00) (81,3) (2,10) (16,6) (11,8) (81,1) (7,10) (12,7) (79,3) (8,00) (83,2) (5,00) (11,8) (23,5) (68,0) (8,50)
Escolaridade (p = 0,335) (p = 0,036) (p = 0,054) (p = 0,002) (p <0,001) (p <0,499)
36 07 07 34 00 16 10 32 08 10 29 11 32 8 10 15 28 07
Nenhuma
(72,0) (14,0) (14,0) (68,0) (0,00) (32,0) (20,0) (64,0) (16,0) (20,0) (58,0) (22,0) (64,0) (16,0) (20,0) (30,0) (56,0) (14,0)
187 32 27 195 08 44 29 197 21 30 193 23 193 13 41 59 167 21
1 a 3 anos
(76,0) (13,0) (11,0) (78,9) (3,20) (17,8) (11,7) (79,8) (8,50) (12,2) (78,5) (9,30) (78,1) (5,30) (16,6) (23,9) (67,6) (8,50)
165 26 14 173 03 29 21 174 10 25 170 10 182 06 16 45 142 18
4 a 7 anos
(80,5) (12,7) (6,80) (84,4) (1,50) (14,1) (10,2) (84,9) (4,90) (12,2) (82,9) (4,40) (89,2) (2,90) (7,80) (22,0) (69,3) (8,80)
46 04 03 47 01 05 06 45 02 05 46 02 51 01 01 12 39 02
8 a 11 anos
(86,8) (7,50) (5,70) (88,7) (1,90) (9,40) (11,3) (84,9) (3,80) (9,4) (86,8) (3,80) (96,2) (5,90) (5,90) (22,6) (73,6) (3,80)
16 01 00 16 00 01 02 15 00 02 15 00 17 00 00 04 13 00
>12 anos
(94,1) (5,90) (0,00) (94,1) (0,00) (5,90) (11,8) (88,2) (0,00) (11,8) (88,2) (0,00) (100) (0,00) (0,00) (23,5) (76,5) (0,00)
Gênero (p = 0,172) (p = 0,699) (p = 0,427) (p = 0,704) (p = 0,024) (p = 0,352)
407 62 50 424 10 86 59 425 36 65 413 40 435 22 62 120 353 47
Feminino
(78,4) (11,9) (9,60) (81,5) (1,90) (16,5) (11,3) (81,7) (6,90) (12,5) (79,7 (7,70) (83,8) (4,20) (11,9) (23,1) (67,9) (9,00)
43 10 02 44 02 09 09 41 05 07 42 06 42 07 06 15 38 02
Masculino
(78,2) (18,2) (3,60) (80,0) (3,60) (16,4) (16,4) (74,5) (9,10) (12,7) (76,4) (10,9) (76,4) (12,7) (10,9) (27,3) (69,1) (3,60)

V: verdadeiro; F: falso; NS: não sei.

Notou-se que a maioria das variáveis teve associação Sinos,8 onde a maioria conhecia a causa e o meio diagnóstico.
significativa com a idade do entrevistado, sendo que os Sabe-se que o intervalo entre a infecção aguda pelo
entrevistados mais jovens tendem a ter mais conhecimento HIV e a AIDS varia muito, podendo apresentar-se como
e respostas objetivas às questões sobre a doença do que doença silenciosa por um tempo médio de 10 anos;9 no
os mais idosos. Isso se provou significativo em relação à entanto, em nosso estudo, a maioria dos entrevistados,
transmissão por meio de sabonetes, toalhas, assentos sani- assim como no trabalho de Lazzarotto et al.,8 acredita
tários (p <0,001) e à transmissão pela picada de mosquito que a pessoa com o vírus da AIDS sempre apresenta os
(p <0,001), ponto em que os entrevistados mais idosos sintomas da doença. Isso pode gerar aumento do risco
possuem dúvida sobre a questão, enquanto os mais jovens de infecção porque, quando se acredita que os pacientes
refutam essa possibilidade. Nas questões sobre a exis- sempre têm sintomas, cria-se uma falsa sensação de segu-
tência de camisinha feminina (p = 0,002), doença restrita a rança com a prática de relações sexuais sem proteção.
homossexuais masculinos, prostitutas, usuários de drogas Os trabalhos realizados no Rio Grande do Sul,8 Goiás10
(p = 0,030), doença exclusiva de jovens (p = 0,013), os e Recife11 demonstraram bom conhecimento dos idosos
pesquisados mais novos tendem a acreditar que o indivíduo sobre formas de transmissão, característica também eviden-
com o vírus da AIDS pode não ter os sintomas da doença ciada sobre algumas formas de transmissão de nossa casuís-
aparente, enquanto os indivíduos mais velhos acreditam tica, sendo que grande parte entende que não ocorre trans-
que a pessoa infectada pelo vírus sempre terá manifestações missão por meio de sabonetes, toalhas, assentos sanitários,
clínicas da doença (p <0,001). Quanto à possibilidade de e também sabe da inexistência de transmissão por meio
cura (p = 0,005), possibilidade de os idosos fazerem uso de de abraço, beijo no rosto, beber no mesmo copo e tomar
preservativos (p <0,001), existência de vacina para AIDS (p chimarrão. Porém, considerável parte (33%) dos idosos
<0,001) e que o vírus HIV seja o causador da AIDS, quanto entrevistados acredita que a picada de mosquito seja uma
maior a idade, menos certeza os entrevistados tiveram forma de transmissão, apresentando proporção notavel-
sobre a causa da AIDS (p <0,001). Os dados supracitados mente menor que no estudo realizado em Anápolis.10 Essa
encontram-se disponíveis nas Tabelas 2, 3 e 4. diferença significativa pode ser explicada pela menor renda
familiar, menor número de idosos entrevistados e locali-
Discussão zação regional do segundo trabalho.10 Entretanto, sabe-se
O objetivo principal deste estudo foi determinar o conheci- que os mosquitos não transmitem a doença; os resultados
mento sobre HIV/AIDS em grupos de idosos na cidade de de experimentos indicam que, quando um inseto pica uma
Criciúma. Observa-se que, no domínio conceito, 81,5% dos pessoa, ele não injeta seu próprio sangue ou de uma pessoa
entrevistados sabem que o HIV é o vírus causador da AIDS previamente picada na próxima pessoa.12 Seria importante
e 87,3% compreendem que ele é identificado por meio de que os idosos dominassem essa informação.
exame de sangue, semelhante ao estudo realizado no Vale dos Os resultados mostram que mais da metade dos pesqui-
48 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

sados tem vida sexual ativa, porém apenas pequena parcela que concorda com um estudo realizado em Pernambuco.11
afirma fazer uso de preservativos, apesar de a grande Dessa forma, pode-se inferir que a educação prepara as
maioria saber que o uso de camisinhas nas relações impede pessoas para a vida social e profissional, tendo em vista que
a transmissão do HIV e que os idosos podem usar preserva- a baixa escolaridade tende a tornar os indivíduos sem auto-
tivos sem problemas. Talvez isso se deva a algumas razões, nomia para buscar instruções mais complexas e até mesmo
como explica o trabalho realizado em Passo Fundo,13 entender a mensagem que lhes é oferecida.17
segundo o qual algumas idosas afirmam que os parceiros Nosso estudo demonstrou associação entre o conheci-
não aceitam usar por ser desconfortável, outros por ser mento da AIDS e a variável faixa etária, sendo que o mesmo
difícil de vestir e que eles têm medo da disfunção erétil se mostrou associado de forma inversa à idade, mesmo
durante esse momento. No trabalho de Stacy et al.,4 apro- resultado encontrado em um estudo realizado no Reino
ximadamente metade dos entrevistados que eram ativos Unido.18 Isso talvez implique maior taxa de exposição às
sexualmente relatou ter pelo menos um problema durante situações de risco por parte dos indivíduos mais idosos.
o intercurso. Para as mulheres, os mais prevalentes foram Dessa forma, chega-se à conclusão da relevância deste
pouco desejo, perda de lubrificação vaginal e incapacidade trabalho, pois mostra a suscetibilidade dos idosos a essa
de chegar ao orgasmo. Entre os homens, o mais prevalente doença, pela desvalorização da importância do uso de
foi a disfunção erétil. O estudo feito em São Leopoldo,14 preservativos pelos entrevistados, pela falsa ideia de alguns
que abordou o uso de preservativos em mulheres com vida sobre uma doença exclusiva de homossexuais masculinos
sexual ativa, mostrou associação linear direta com a idade e pela falta de domínio sobre sua forma de apresentação
(p <0,0001), ou seja, à proporção que as mulheres iam enve- clínica, tendo em vista que a infecção nos idosos progride
lhecendo, aumentava a não utilização de preservativos. mais rapidamente, com maior morbidade e letalidade.
Sabendo que, atualmente, no Brasil e nos países em Torna-se importante a implementação de programas
desenvolvimento, a via de transmissão heterossexual de educação em saúde pública que sejam voltados para
constitui a mais importante característica da dinâmica essa população, por equipes treinadas e familiarizadas
da epidemia,15,16 12,7% dos entrevistados ainda consi- com os idosos, para que eles se sintam à vontade para
deram a AIDS uma doença que ocorre somente em tirar suas principais dúvidas em relação à AIDS e/ou
homossexuais masculinos, prostitutas e usuários de outras doenças sexualmente transmissíveis, de forma a
drogas, o que condiz com os entrevistados no estudo de caracterizar a importância nas medidas de prevenção e
Batista et al.11 Associando-se essa informação com a difi- transmissão, principalmente.
culdade encontrada no uso de preservativos, observa-se
uma população muito exposta ao risco de contaminação. CONCLUSÃO
Os idosos podem contrair o HIV, e grande parte dos Embora a população estudada já tenha tido contato com
entrevistados sabe disso, porém acredita-se que exista informações sobre a doença, nota-se o desconhecimento
uma desvalorização por parte de profissionais de saúde e de aspectos básicos importantes para a prevenção, demons-
familiares, que não consideram que essa população tenha trando a necessidade de ações corretivas nesse sentido.
vida sexual ativa, deixando a população idosa ainda mais
vulnerável às doenças que podem ser contraídas durante Agradecimentos
um intercurso sexual desprotegido. Nossos agradecimentos pela colaboração da coorde-
Em nosso meio, existem poucos estudos que comparem nação e funcionários responsáveis pelos grupos de
o grau de conhecimento sobre HIV nos idosos com a esco- terceira idade da Afasc Criciúma.
laridade dos mesmos. Em nosso estudo viu-se que a maioria
das variáveis teve associação positiva com o grau de esco- Conflito de interesse
laridade (p <0,001). À medida que os anos de estudo vão Os autores declaram não possuir nenhum conflito de
aumentando, a dúvida e a proporção de erros diminuíram, o interesse na sua realização e publicação.

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Artigo originalGERIATRIA & GERONTOLOGIA
50 | REVISTA Artigo original

Mortalidade por tuberculose pulmonar


e síndrome de imunodeficiência
adquirida no idoso: há diferenças?

Luciana Paganini Piazzollaa, Francisca M. Scoralickb,


João Barberino Santosc, Liana Lauria-Piresd

R es umo
Palavras‑chave Introdução: A tuberculose pulmonar representa um problema sanitário mundial, especialmente quando associada à infecção
Tuberculose pelo HIV. Prevalente em idosos cujo diagnóstico tardio decorre da pobreza clínica, notificam-se, no Brasil, cerca de 6 mil óbitos
pulmonar, AIDS, anuais. A coinfecção Mycobacterium tuberculosis e HIV aumenta em 10% o risco anual da tuberculose. Métodos: Foram
idoso, coeficiente coletados dados do Datasus e Sinan de 2004 a 2010, comparando-se a taxa de mortalidade por tuberculose em indivíduos idosos
de mortalidade. e não idosos, na ausência e presença do HIV. Resultados: Os coeficientes de mortalidade por tuberculose pulmonar em pa-
cientes acima de 60 anos, na ausência de AIDS/HIV, demonstram expressivo aumento quando comparados com os coeficientes
obtidos de pacientes de 20 a 59 anos sem AIDS/HIV. Esses resultados contrastam com índices mais baixos, em pacientes sem
AIDS/HIV para a faixa etária de 20 a 59 anos, nos quais a elevação anual dos índices foi menos elevada. Comparando-se os
coeficientes de mortalidade por tuberculose pulmonar em pacientes acima de 60 anos com ou sem AIDS/HIV, verifica-se que
os coeficientes de mortalidade em pacientes sem AIDS/HIV são sempre mais elevados que naqueles com a coinfecção. O estudo
sugere que, nos últimos 7 anos, houve aumento da mortalidade por tuberculose pulmonar em idosos com 60 anos ou mais,
comparando-se com indivíduos mais jovens. Conclusão: O aumento do coeficiente de mortalidade por tuberculose pulmonar
em idosos poderia justificar a necessidade de políticas de saúde preventivas em pacientes acima de 60 anos.

mortality by pulmonary tuberculosis and acquired immunodeficiency


syndrome, are there differences?

Abstract
Keywords Introduction: Pulmonary tuberculosis (TB) is a global health problem, especially when associated with HIV infection.
Pulmonary TB is prevalent in older adults whose late diagnosis occurs because of poor clinical manifestation. In Brazil, approximately
tuberculosis, 6,000 deaths from TB are reported annually. Coinfection with Mycobacterium tuberculosis and HIV increases by 10% the
acquired annual risk of tuberculosis. Methods: we collected data from Datasus (Department of the Brazilian Unified Health System)
immunodeficiency and Sinan (Information System for Notifiable Diseases) covering a period from 2004 to 2010 in order to compare the death
syndrome, aged, rate from tuberculosis in individuals with and without HIV. Results: There was an increase in the mortality rate from TB in
mortality rate. older adults without HIV compared to adults from 20 to 59 years old. Comparing the mortality rate from TB in older adults
with and without HIV we found that the mortality rate is higher in those without HIV. In the period from 2004 to 2010 there
was an increase in the mortality rate from TB in older adults comparing to younger adults. Conclusion: The increase in
the mortality rate from TB in older adults may warrant the need for preventive health policies for patients over 60 years old.

a
Médica geriatra, Mestre em Ciências Médicas, Universidade de Brasília (UnB), Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Ciências Médicas da
UnB. Desenho do estudo, coleção de dados, análise e preparação do manuscrito.
b
Médica geriatra, Mestranda do Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde da UnB. Análise e preparação do manuscrito.
c
Médico infectologista, Mestre em Medicina Tropical, Doutor em Medicina Tropical, Coordenador da disciplina doenças infecciosas e parasitárias da
UnB. Análise e preparação do manuscrito.
d
Médica infectologista, Mestre em Medicina Tropical, Doutora em Patologia Molecular pela UnB, Coordenadora da disciplina semiologia médica da
Universidade Católica de Brasília. Análise e preparação do manuscrito.

Dados para correspondência


Luciana Paganini Piazzolla – SQN 108 bloco J, apto. 601, CEP 70744100. Asa Norte. Brasília-DF.
Tel./fax: (61) 3274-0146. E-mail: luciana.piazzolla@yahoo.com.br
Tuberculose e AIDS no idoso: há diferenças? | 51

Introdução faixa etária de idosos acima de 60 anos, idade padronizada


A tuberculose pulmonar ainda constitui um problema pelas Organização das Nações Unidas.
sanitário mundial, principalmente por motivos relacio- Os dados foram coletados utilizando-se a base de
nados à pobreza e à infecção pelo vírus da imunodefi- dados do Datasus (Departamento de Informática do
ciência humana (HIV). Tem alta prevalência na Índia, Sistema Único de Saúde) e Sinan (Sistema de Informação
África e sul da Ásia. As populações mais acometidas de Agravos de Notificação). O Sinan é alimentado, prin-
vivem em condições de extrema pobreza, incluindo cipalmente, pela notificação e investigação de casos
idosos, moradores de instituições psiquiátricas, usuários de doenças e agravos que constam da lista nacional de
de drogas e álcool, além de pacientes imunodeprimidos.1 doenças de notificação.
No Brasil, segundo dados do Sistema de Informação Na coleta dos dados secundários, os critérios de inclusão
de Agravos de Notificação (Sinan/MS), são notificados foram os casos confirmados de tuberculose pulmonar com
anualmente 85 mil casos novos de tuberculose, com ou sem HIV, em todas as unidades federativas, regiões e
cerca de 6 mil óbitos por ano devido à doença.2 municípios do Brasil, entre 2004 e 2010. Foram levantados
Como resultado do aumento do envelhecimento popu- os casos de óbito por tuberculose pulmonar no mesmo
lacional e da queda do risco de infecção na comunidade, a período. No sistema Datasus, coletaram-se dados perti-
tuberculose tende a aumentar na faixa etária de idosos. A nentes à população exposta ao risco no período estudado.
taxa de mortalidade nesse grupo devido à bacilose é 6 vezes Foram analisadas as seguintes variáveis: faixa etária e
maior que em outras faixas etárias. Manifestações clínicas coeficiente de mortalidade por causa.7 O coeficiente de
sugestivas, como febre, suores noturnos, destruição tecidual, mortalidade foi calculado utilizando-se a divisão de número
cavitações, hemoptise, escarro e tosse, são menos frequentes de óbitos por determinada doença em dado local e período,
ou menos intensas, o que retarda ou dificulta o diagnóstico.3 constando no denominador a população exposta ao risco
Na África, a partir dos anos 1980, nota-se elevação de morrer por essa mesma causa multiplicado por 10n.
da prevalência da tuberculose, atribuída ao aumento da
incidência de infecção por HIV,4 importante fator de risco R esu ltados
para aquisição de diversas formas da tuberculose. Em Os registros dos coeficientes de mortalidade por tubercu-
pessoas coinfectadas com Mycobacterium tuberculosis e o lose pulmonar em pacientes acima de 60 anos, na ausência
vírus HIV, o risco anual de desenvolvimento da tubercu- de AIDS/HIV, analisados de 2004 a 2010, demonstram
lose é de 10%.5 Embora o HIV seja considerado fator de expressivo aumento quando comparados com os coefi-
risco epidemiológico, outras situações concorrem como cientes obtidos de pacientes de 20 a 59 anos sem AIDS/
comorbidades predisponentes ao risco potencial para o HIV (Figura 1). Verifica-se coeficiente de mortalidade
desenvolvimento da infecção/doença retrovírica: doenças zero, em 2004, ascendendo em 2006 e estabilizando-se em
crônicas, uso de imunossupressores, desnutrição, doenças torno de 0,6 em 2007 e 2008. Após o aumento em 2009,
respiratórias causadas pelo tabaco, entre outras.3 notou-se tendência de queda em 2010. Esses resultados
Campanhas de vacinação com BCG e a melhoria das contrastam com índices mais baixos, em pacientes sem
condições socioeconômicas reduziram a incidência de AIDS/HIV para a faixa etária de 20 a 59 anos, nos quais a
tuberculose em crianças, contudo muitos idosos foram elevação anual dos índices foi menos elevada.
infectados quando essa doença era altamente prevalente
entre os jovens, induzindo uma apresentação mais grave
na idade avançada, por reativação endógena de lesões Figura 1  Coeficientes de mortalidade por tuberculose pulmonar, por ano
antigas e alterações imunológicas predisponentes.6 e faixa etária, em pacientes sem AIDS ou HIV (coeficiente x 100.000)
Em 2003, iniciou-se a campanha de prevenção e
combate à tuberculose pelo Ministério da Saúde, para 1

tentar deter o avanço da tuberculose no Brasil.2 0,9


0,8
O objetivo deste estudo foi comparar a taxa de morta-
0,7
lidade em indivíduos com e sem HIV, comparando-se
0,6
duas faixas etárias diferentes, no sentido de investigar
0,5
em qual segmento etário da população há maior neces- 0,4
sidade de ampliação das políticas de saúde preventivas 0,3
e otimização do diagnóstico de tuberculose pulmonar, 0,2
aliada ou não à prevenção da AIDS. 0,1
0
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Métodos
O estudo foi descritivo. Estudou-se o coeficiente de morta- 20 a 59 anos ou mais sem AIDS ou HIV

lidade por tuberculose pulmonar em indivíduos com e 60 anos ou mais sem AIDS ou HIV

sem HIV, na faixa etária de 20 a 59 anos, em comparação à


52 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Comparando-se os coeficientes de mortalidade por De interesse, este estudo mostrou que o coefi-
tuberculose pulmonar em pacientes acima de 60 anos ciente de mortalidade por tuberculose, em idosos, é
com ou sem AIDS/HIV, verifica-se que os coeficientes maior naqueles sem AIDS ou HIV. Embora haja maior
de mortalidade em pacientes sem AIDS/HIV são sempre aumento de mortalidade em idosos do que em jovens,
mais elevados que naqueles com a coinfecção. Assim, em o coeficiente de mortalidade por tuberculose pulmonar
2006, o coeficiente de mortalidade em pacientes acima em indivíduos de 60 anos é baixo, o que pode sugerir
de 60 anos sem AIDS/HIV foi 0,40, enquanto, no mesmo subdiagnósticos ou subnotificações.
ano, naqueles com AIDS/HIV o coeficiente correspondeu A prevalência de AIDS tem sido mais bem docu-
a 0,05, o que indica, observando a Figura 2, aumento de mentada entre os jovens do que em idosos pela Organi-
oito vezes. Esse perfil se mantém nos anos subsequentes, zação Mundial da Saúde (OMS), o que dificulta o enten-
confirmando índices de mortalidade sempre mais dimento da expressão epidemiológica e o impacto da
elevados em idosos sem AIDS/HIV (Figura 2). AIDS em idosos.8
Em 2007, o Programa Conjunto das Nações Unidas
sobre HIV/AIDS, mostrou que existem no mundo
Figura 2 Coeficientes de mortalidade por tuberculose pulmonar em pacientes aproximadamente 33 milhões de pessoas com HIV/
com 60 anos ou mais, considerando a presença ou ausência de AIDS ou HIV AIDS, e cerca de 2,8 milhões têm 50 anos ou mais. No
Brasil, os casos de AIDS em pessoas acima dos 60 anos
1,2 dobraram em 1997, passando de 497 para 1.263 casos
0,91
1
0,69 novos.9 A partir de 2007, os coeficientes de mortali-
0,8 0,75
0,6
0,70
dade, coletados de tuberculose pulmonar no Brasil,
0,4 0,40 foram ascendentes, o que pode indicar maior atenção
0,07 0,12
0,2
0
0,01 0,05 0,09 0,07 da equipe de saúde na notificação de casos de HIV/
0
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 AIDS e comorbidades, como a tuberculose.
Neste estudo, não houve aumento expressivo do
60 anos ou mais sem AIDS ou HIV
coeficiente de mortalidade por tuberculose pulmonar
60 anos ou mais com AIDS ou HIV
nos idosos com AIDS ou HIV. Isso pode ser explicado
pelo fato de os dados serem secundários ou, talvez,
pela expressão patológica no idoso guardar diferenças
comparativamente ao jovem, embora o número de
D iscuss ão pacientes idosos com AIDS esteja em ascensão.
O estudo sugere que, nos últimos 7 anos, houve aumento Com dados crescentes, os casos de AIDS/HIV
da mortalidade por tuberculose pulmonar nos idosos aparecem concomitantemente a doenças imunomo-
com 60 anos ou mais, comparando-se com indivíduos de duladas, como a tuberculose. O diagnóstico precoce
20 a 59 anos. Esse fato pode ser explicado pelas dificul- para infecção do HIV entre os idosos continua
dades e retardo no diagnóstico, pelas diferentes e pouco sendo um dos grandes desafios abordados em
comuns apresentações clínicas, pelo envelhecimento inúmeras pesquisas. A precocidade do diagnóstico
populacional e situações acrescidas das deficiências é uma oportunidade de interromper a transmissão
sensoriais e cognitivas nessa faixa etária, o que prejudica viral e iniciar o tratamento retroviral, acarretando
a caracterização dos sintomas.6 Isso reflete que as estra- melhora da morbidade e diminuição da mortalidade
tégias para prevenção alertando apenas para os sintomas de pacientes infectados. 10 O atraso no diagnóstico
como tosse e expectoração podem ser ineficazes nessa do HIV no idoso implica situação imunológica mais
faixa etária. Dessa maneira, sugere-se que as políticas de precária no início do tratamento, contribuindo para
saúde relacionadas à forma pulmonar da tuberculose, no o aparecimento de doenças oportunistas. Além
idoso, devem ser ampliadas. disso, o sistema imunológico senescente dificulta a
Dados da literatura indicam que a mortalidade em resposta imunológica ao tratamento antirretroviral
pacientes idosos acima de 60 anos de idade é conside- de alta potência. 6,10
ravelmente mais elevada que em pacientes jovens, atin- Embora os dados deste estudo demonstrem que a
gindo percentuais em torno de 30%.6 Situação semelhante mortalidade de pacientes acima de 60 anos com AIDS e
ocorreu com a mortalidade por tuberculose, de acordo tuberculose pulmonar não seja expressiva, estratégias de
com os dados secundários analisados na literatura.8 manejo clínico e prevenção para o controle da tuberculose
A análise de óbitos por tuberculose ocorridos no e outros programas de saúde pública são essenciais para
período de 1980 a 2004 mostrou maior frequência da reduzir os casos de tuberculose. A utilização de modelos
forma pulmonar, em todos os grupos etários.8 Essas infor- preventivos deve contemplar as diferentes características
mações demonstram a contribuição da forma pulmonar de manifestação nas diferentes faixas etárias e capacitação
nos coeficientes de mortalidade há mais de três décadas. técnica da equipe de saúde para reconhecê-las.3
Tuberculose e AIDS no idoso: há diferenças? | 53

C onclus ão dados secundários. Não objetiva análise de efetividade


Este estudo sugere maior mortalidade por tubercu- da Campanha de Combate à Tuberculose, mas visa à
lose pulmonar em idosos comparados à faixa etária mais apreciação nas diferentes faixas etárias.
jovem, o que justifica campanhas especificamente direcio-
nadas de combate à doença em pacientes acima de 60 anos C onflito de interesse
com treinamento adequado das equipes de saúde para o Quanto aos aspectos éticos, não há conflitos de interesse
diagnóstico e o tratamento efetivo em idosos. pessoais ou potenciais conflitos. Não há envolvimento
O estudo tem limitações por ser descritivo e utilizar financeiro de outras entidades.

R eferências
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treatment. BMJ. 2006; 332(7551):1194-1197. optimal management. Drugs Aging. 1996; 8(6):436-444.
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Artigo originalGERIATRIA & GERONTOLOGIA
54 | REVISTA

Efeito do treinamento resistido


ondulatório sobre a aptidão funcional
de idosos com diabetes do tipo 2

Gilberto Monteiro dos Santosa, Fabio Tanil Montrezola,


Luciana Santos Souza Paulib, Emilson Colantonioa,
Ricardo José Gomesc, Bárbara de Almeida Rodriguesb,
Rodolfo Marinhod, José Rodrigo Paulib,d

R es umo
Palavras‑chave Objetivo: Verificar os efeitos de um programa de treinamento resistido ondulatório supervisionado, sobre variáveis antropométricas
Idoso, diabetes, e da aptidão funcional em idosos com diabetes do tipo 2. Material e métodos: Participaram do estudo 51 idosos de ambos os
treinamento gêneros, na faixa etária de 60 a 85 anos, com diagnóstico de diabetes do tipo 2. Foram avaliados o índice de massa corporal (IMC),
resistido, aptidão a medida do perímetro da cintura (PC) e o perímetro do quadril (PQ) conforme orientação prévia. Além disso, com as medidas
funcional. do PC e PQ, pôde ser calculada a relação cintura-quadril (RCQ). A aptidão funcional foi avaliada por meio de uma bateria de testes
direcionados à avaliação motora de idosos, que foi composta por cinco testes singulares: sentar e alcançar no banco de Wells;
resistência de força de membros superiores; agilidade e equilíbrio dinâmico; sentar e levantar; equilíbrio unipodal; ergoespirometria
em esteira ergométrica. Resultados: O treinamento físico não induziu alterações nos parâmetros antropométricos, mas
melhorou o desempenho no teste de sentar e levantar, agilidade e equilíbrio dinâmico. Para as demais capacidades físicas testadas
(flexibilidade, equilíbrio e capacidade aeróbia), as 16 semanas de período de intervenção não se mostraram capazes de induzir
mudanças significativas nos idosos com diabetes. Conclusão: O treinamento resistido ondulatório teve efeito positivo sobre a
aptidão funcional de idosos com diabetes do tipo 2, com efeitos mais pronunciados nos membros inferiores.

Effect of undulatory resistance training on functional


fitness in elderly type 2 diabetic patients

Abstract
Keywords Objective: Investigation of effects of supervised resistance training program on functional fitness in elderly type 2 diabetic
Elderly, diabetic, patients. Material and methods: The study included 51 patients from both genders, aged between 60 and 80 years old,
resistance diagnosed with type 2 diabetes. Measurement of body mass index (IMC), waist circumference (PC) and hip circumference
training, (PQ) was evaluated according to previous guidance. Moreover, with measures to PC and PQ waist-hip ratio (WHR) could be
functional fitness. calculated. Functional fitness was assessed by some tests to achieve motor evaluation of these elderly people, the tests were five:
sit and reach test with the Wells’ bank, strength endurance of the arms, agility and dynamic balance, sitting-rising, single-foot
balance, and ergospirometry on treadmil. Results: The exercise training did not induce changes in anthropometric parameters,
but improved performance in the sitting-rising test and agility and dynamic balance test. Considering other physical abilities
tested (flexibility, balance and aerobic capacity) the sixteen weeks of training were not able to induce significant changes in the
diabetic elderly people. Conclusion: The ondulatory resistance training has a positive effect to functional fitness in elderly
type 2 diabetic patients, with a higher pronounced effect in the lower limbs.

a
Pós-graduação interdisciplinar em Ciências da Saúde, Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Santos.
b
Pós-graduação em Ciências da Nutrição e do Esporte e Metabolismo, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Limeira.
c
Pós-graduação interdisciplinar em Ciências da Saúde, Unifesp, Santos.
d
Pós-graduação em Ciências da Motricidade, Universidade Estadual Paulista (Unesp), Rio Claro.

Dados para correspondência


José Rodrigo Pauli
FCA, Unicamp, Rua Pedro Zaccaria, 1300, Jd. Sta Luiza, CEP: 13484-350, Limeira – SP.
Tels.: (19) 3701-6728/6729. E-mail: rodrigopaulifca@gmail.com
Treinamento resistido, aptidão funcional e diabetes | 55

Introdução fissional de qualidade de vida, no setor de medicina preventiva


Está bem estabelecido que o exercício aeróbico é capaz de da Unimed de Santos (SP). Em seguida, os indivíduos foram
reduzir o risco de desenvolver diabetes melito (DM) tipo 2, divididos aleatoriamente em dois grupos: 1) grupo de idosos
como também auxiliar no controle da glicemia, sendo ainda com diabetes não treinados (IDNT, n = 20), sendo 6 mulheres
importante para atenuar as complicações derivadas do DM e 14 homens; e 2) grupo de idosos com diabetes treinados
tipo 1 e DM tipo 2.1 No entanto, é menos evidenciado o fato (IDT, n = 31), sendo 26 mulheres e 5 homens. Esse critério de
de o treinamento resistido ter benefícios significativos no divisão dos grupos foi estabelecido por ordem de inscrição no
diabetes, independentemente de sua forma de manifestação. programa, sendo atendidos, no máximo, 35 pacientes por ano.
Contudo, atualmente, a prescrição de exercícios resistidos é O estudo foi realizado de acordo com os princípios da decla-
recomendada tanto pelo Colégio Americano de Medicina do ração de Helsinque, sendo previamente submetido e aprovado
Esporte quanto pela Associação Americana de Diabetes.1-3 pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) da Unifesp (no 524/11).
A prescrição do exercício resistido tem sido de funda- Os voluntários assinaram um termo de consentimento livre
mental importância para a manutenção da aptidão funcional esclarecido antes de iniciar o programa de treinamento físico.
e a vida ativa do idoso. Isso se deve ao fato de o envelheci-
mento estar associado com perda, tanto de massa muscular Triagem e critérios de inclusão e exclusão
quanto da qualidade funcional do músculo esquelético.4,5 Os critérios estabelecidos para ingresso no estudo
O processo de sarcopenia que acontece no envelhecimento foram definidos de acordo com as diretrizes da Asso-
aumenta o risco de desenvolvimento de resistência à insu- ciação Americana de Diabetes,11 devendo os indivíduos
lina e DM tipo 2. A etiologia da sarcopenia envolve diversos pertencer à faixa de idade entre 60 e 85 anos. Fizeram
fatores, como perda de motoneurônios e apoptose celular, e, parte do estudo pacientes com diabetes do tipo 2 com o
como consequência, o número de fibras consideravelmente uso de hipoglicemiantes e não dependentes de insulina.
diminui.4,5 A maior parte das mudanças está associada com Os critérios de exclusão adotados foram: limitações
o avançar da idade, e o exercício físico resistido pode modi- ou doenças do aparelho locomotor e/ou cardiovascular;
ficar esse processo ou ao menos atenuá-lo. uso abusivo de álcool e/ou drogas; e distúrbios crônicos
Recentes evidências científicas são concisas em mostrar do diabetes, como neuropatia autonômica, nefropatia e
que o treinamento resistido pode prevenir o declínio na massa retinopatia. Aqueles com frequência <85% ou três ausên-
muscular relacionada à idade e, o que é melhor, pode manter a cias seguidas também foram excluídos. Não atingiram
plasticidade e a capacidade de hipertrofia, mesmo nos estágios esses critérios 20 indivíduos, permanecendo 51 idosos
mais avançados de velhice.6, 7 Portanto, o treinamento resistido com diabetes como previamente informado. A evasão
pode ser determinante em retardar o processo de sarcopenia, foi maior no grupo IDNT, com maior número sendo de
promovendo maior síntese proteica, com efeitos capazes de mulheres, explicando o baixo número do gênero femi-
prover manutenção e até mesmo o aumento da massa muscular, nino para esse grupo em relação ao grupo IDT.
melhora da aptidão funcional e da função metabólica em pessoas
idosas e diabéticas.8,9 Isso propicia maior autonomia e indepen- Avaliação do nível de atividade física habitual
dência nas atividades da vida diária, afastando essas pessoas do O instrumento utilizado para avaliar o nível de atividade
sedentarismo. Dentre os tipos de intervenção, o treinamento física foi o questionário IPAQ (International Physical
resistido ondulatório tem sido proposto como estratégia para o Activity Questionnaire) versão 8, forma longa.12
ganho de força.10 No entanto, investigações a respeito dos efeitos
do exercício resistido, especialmente de característica ondula- Avaliações antropométricas e de composição
tória, sobre variáveis antropométricas e de aptidão funcional em corporal
indivíduos com diabetes, são escassas na literatura. A massa corporal e a estatura foram avaliadas utilizando-
Diante desses achados, o presente estudo teve como se balança digital (Filizola®) e estadiômetro fixo na parede
objetivo investigar os efeitos de um programa multiprofis- (modelo Sanny®). Em seguida foi calculado o índice de
sional de qualidade de vida, durante 16 semanas, que incluiu massa corporal – IMC: massa corporal/estatura2 (kg/m).
orientações gerais de saúde e um programa de treinamento Foram avaliados também a medida do perímetro da
resistido ondulatório sobre parâmetros antropométricos e cintura (PC) e o perímetro do quadril (PQ), conforme
de aptidão funcional geral de idosos com diabetes do tipo 2. orientação prévia.13 Com as medidas do PC e PQ pôde
ser calculada a relação cintura-quadril (RCQ), sendo
Materiais e m é todos todas as avaliações feitas por um único avaliador.
Amostra
A seleção da amostra ocorreu por meio de triagem prévia reali- Avaliação da glicemia capilar de jejum
zada por médico endocrinologista. Foram avaliados 73 indiví- Foi coletada uma gota de sangue suficiente para análise
duos, porém, obedecendo aos critérios de inclusão, permane- em glicosímetro portátil (Accucheck-Roche®). O horário
ceram até o final do experimento 51 com diabetes de ambos os da coleta foi entre 7 e 8 h, com jejum prévio de 12 h,
gêneros, com idades de 60 a 85 anos, do programa multipro- sendo o procedimento realizado por enfermeira.
56 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Avaliação da aptidão funcional minal e a lombar, pois elas são essenciais na estabilização e
A aptidão funcional foi avaliada por cinco testes motores: no equilíbrio de muitos movimentos. Os equipamentos utili-
1) sentar e alcançar em banco de Wells; 2) equilíbrio e agili- zados foram da marca Nakagin (São Paulo, Brasil). O grupo
dade dinâmica; 3) resistência de força de membros supe- IDNT não recebeu nenhuma intervenção e foi orientado a
riores;14,15 4) equilíbrio unipodal;14 e 5) sentar e levantar.15 não alterar seus hábitos de vida nesse período experimental.

Avaliação da aptidão cardiorrespiratória Estatística


Foi realizado um teste ergoespirométrico de cargas Foram calculadas as médias e os desvios-padrão. Para
crescentes, obtendo-se valores do consumo de oxigênio comparar o comportamento dos grupos IDNT e IDT ao longo
pico (VO2pico). Foi utilizado o sistema de análise de do tempo, segundo cada variável de interesse, foi empregado
gases VO2000® (MedGraphics VO2000 System®, Estados o modelo de análise de variância com medidas repetidas. Foi
Unidos) e uma esteira rolante (modelo Inbrasport ATL®, adotado o nível de significância de 5% (p <0,05).
Brasil), adotando o protocolo de Bruce adaptado.16 O
teste iniciou com aquecimento na esteira em veloci- Resultados
dade inicial de 2,7 km/h e inclinação de 10% durante 3 As variáveis antropométricas avaliadas obtiveram distribuição
minutos. Em seguida ocorreram incrementos de 1 km/h paramétrica para ambos os grupos (idade, massa corporal,
e 2% de inclinação a cada 3 minutos até a exaustão. estatura e índice de massa corporal – IMC). O IMC indica
que os participantes estavam na faixa considerada de sobre-
Programa de treinamento resistido ondulatório peso e obesidade, não havendo alterações no início e no final
Inicialmente, foi realizado teste de carga máxima (1 RM), do experimento. Os dados referentes ao perímetro da cintura
conforme descrito por Da Silva et al., em 2005.17 Em e relação cintura/quadril mostram que ambos os grupos
seguida, os idosos com diabetes foram submetidos a exer- estavam sob risco aumentado para doenças cardiovascu-
cícios de força em equipamentos de musculação ou pesos lares. Não foram observadas mudanças nessas variáveis pré/
livres, de duração de 50 minutos, com frequência de três pós-programa de treinamento físico com pesos. A glicemia
vezes por semana (segunda, quarta e sexta-feira), durante capilar de jejum demonstrou que todos os indivíduos apre-
16 semanas. Na primeira e na segunda semana, com respec- sentaram níveis glicêmicos alterados, característicos de indiví-
tivas cargas de trabalho (50% e 70% de 1 RM), foi realizada duos com diabetes do tipo 2 no início do programa. Por fim,
uma série para cada exercício. Na terceira semana ocorreu verificou-se que os grupos eram paramétricos quanto ao nível
aumento progressivo no número de séries, sendo realizadas de atividade física mensurado pelo IPAQ (Tabela 1).
uma (segunda-feira), duas (quarta-feira) e três séries (sexta- Os resultados dos testes motores estão dispostos na
feira) em cada exercício, com 50% de 1 RM, sendo que esse Tabela 2. Nota-se que o grupo IDT apresentou melhora
número de séries se manteve até o final do treinamento. significativa para condição pré/pós-período experimental
O protocolo consistiu na alteração semanal da carga, no teste de sentar e levantar, fato que não aconteceu para o
dividido em semana de cargas moderadas (50% de 1 RM) e grupo IDNT. Para o teste de agilidade e equilíbrio dinâmico,
semana de cargas altas (70% de 1 RM). O intervalo entre as o grupo IDT teve melhor desempenho na condição pós-
séries foi de 1 minuto para as semanas com cargas moderadas treinamento quando comparado ao mesmo tempo do grupo
e de 2 minutos para as semanas com cargas altas. O reajuste IDNT. No teste de resistência de membros superiores, não
da carga aconteceu quando o sujeito atingia o número de houve diferença no grupo treinado quando comparado às
repetições na ordem crescente de oito para 12 no treino na condições pré/pós-treinamento. O treinamento físico resis-
intensidade de 50% de 1 RM e de 12 para 15 no treino a 70% tido não se mostrou efetivo para os testes de flexibilidade e
de 1 RM. Portanto, o treinamento tinha característica ondu- equilíbrio unipodal. O teste ergoespirométrico mostra que
latória quanto à intensidade, zona de repetição e intervalo os valores de VO2pico absoluto e relativo não foram diferentes
de recuperação, e respeitou as recomendações do Colégio entre os grupos IDNT e IDT, bem como o treinamento resis-
Americano de Medicina do Esporte quanto ao exercício tido não modificou a potência aeróbia máxima (Tabela 2).
físico para pessoas com DM tipo 2.1 Na oitava semana foi
realizado um novo teste de 1 RM, com o mesmo avaliador, D isc u ssão
com o objetivo de verificar se a condução da intensidade do No presente estudo, observou-se que tanto os indivíduos com
protocolo estava coesa para todos do grupo experimental. diabetes submetidos ao programa de treinamento resistido
Os exercícios realizados foram: 1) extensão de joelho ondulatório quanto aqueles que permaneceram sedentários
sentado; 2) flexão dos joelhos deitado; 3) supino sentado, no período experimental eram irregularmente ativos (Tabela
máquina; 4) remada sentado; 5) bíceps pulley; 6) tríceps 1). Isso demonstra que ambos os grupos apresentavam estilo
pulley; 7) desenvolvimento sentado com halteres; 8) de vida sedentário, que não incluía exercícios físicos supervi-
flexão plantar em pé; 9) abdominal parcial; e 10) extensão sionados. Essa condição se refletiu nos parâmetros antropo-
lombar. Foram executados nessa ordem de apresentação. métricos, como o IMC, que se situou na faixa considerada de
Foram realizados também exercícios para a região abdo- sobrepeso e obesidade, e no perímetro da cintura e relação
Treinamento resistido, aptidão funcional e diabetes | 57

Tabela 1  Características antropométricas, glicemia de jejum e nível de atividade física dos indivíduos com diabetes não treinados e treinados do estudo
IDNT IDT
Grupos/Variáveis
Pré Pós Pré Pós
Idade (anos) 66,30 ± 4,74 ND 66,87 ± 5,36 ND
Massa corporal (Kg) 77,04 ± 8,45 78,06 ± 5,32 75,85 ± 15,80 75,24 ± 13,26
Estatura (cm) 1,63 ± 0,06 1,63 ± 0,06 1,58 ± 0,07 1,58 ± 0,07
IMC (Kg/m) 29,33 ± 2,94 30,19 ± 5,73 30,19 ± 5,73 30,17 ± 15,75
Perímetro da cintura 90,92 ± 10,78 90,72 ± 11,12 96,53 ± 14,10 96,43 ± 13,98
Relação cintura-quadril 0,93 ± 0,09 0,94 ± 0,06 0,97 ± 0,04 0,97 ± 0,03
Glicemia (mg/dL) 153,28 ± 26,71 ND 159,85 ± 39,95 ND
IPAQ 11,85 ± 1,39 ND 12,13 ± 1,45 ND

IMC: índice de massa corporal; IPAQ: nível de atividade física; ND, não determinado. Dados expressos como média ± desvio-padrão.

Tabela 2 Aptidão funcional e cardiorrespiratória dos participantes do estudo


Grupo Idoso com Diabetes Não Treinado – IDNT (n=20) Grupo Idoso com Diabetes Treinado – IDT (n=30)
Grupos/Variáveis
Pré Pós Pré Pós
Flexibilidade (cm) 12,25 ± 8,91 13,80 ±9,99 14,18 ± 7,55 15,93 ± 8,56
Agilidade e equilíbrio dinâmico (s) 26,65 ± 3,75a 25,10 ± 3,82b 24,00 ±5,07c 20,72 ± 4,50
Sentar e levantar (nº de vezes em 30s) 12,30 ± 2,95 a,d
13,65 ± 3,93 b,e
21,30 ± 5,71 c
26,10 ± 8,50
Equilíbrio unipodal (s) 24,05 ± 8,22 23,85 ± 7,02 20,20 ± 11,10 21,33 ± 9,74
Resistência de força de membro
14,89 ± 3,85a,d 15,36 ± 2,94b,e 23,75 ± 5,86 26,08 ± 5,74
superior (nº de vezes em 30s)
VO2pico absoluto (l/min) 1,62 ± 0,36 1,62 ± 0,37 1,61 ± 0,38 1,60 ± 0,34
VO2pico relativo (ml/kg/min) 22,74 ± 5,29 22,55 ± 5,23 21,59 ± 4,17 22,15 ± 4,30

Dados expressos como média ± desvio-padrão; a IDNT ≠ IDT pós; b IDNT ≠ IDT pós; c IDT pré ≠ IDT pós; d IDNT pré ≠ IDT pré. e IDNT pós ≠ IDT pré; nas letras a, b, d, e, o nível de
significância adotado foi de p <0,001; para a letra c, foi p <0,05.

cintura-quadril, em que ambos os grupos estavam sob risco fisicamente inativo poderá favorecer maior declínio dessa
aumentado para doenças cardiovasculares. A glicemia de capacidade relacionada ao envelhecimento ou doenças croni-
jejum também se mostrou alterada, sendo os valores caracte- codegenerativas não transmissíveis, como o diabetes melito.
rísticos de indivíduos com diabetes do tipo 2. Ao término do No presente trabalho, os resultados mostraram que os
treinamento resistido ondulatório, não houve mudanças nas idosos com diabetes submetidos a treinamento resistido
variáveis antropométricas estudadas, sendo esse um indicativo ondulatório tiveram aumento significativo nos testes de
de que talvez seja necessário adicionar outras atividades físicas sentar e levantar, e de agilidade e equilíbrio dinâmico, se
no cotidiano dessas pessoas para que aumentem o gasto ener- comparados àqueles voluntários que não participaram do
gético diário e modifiquem seus hábitos alimentares, tendo em programa de treinamento. Porém, quando foram avaliados os
vista que ao menos no período estabelecido de intervenção o resultados dos demais testes motores, não foram observadas
programa de treinamento proposto não foi capaz de induzir mudanças entre o grupo treinado e seus pares que permane-
mudanças nessas variáveis. Além disso, identifica-se que houve ceram inativos ao final do período experimental. Esses dados
maior adesão de participantes do gênero feminino, fato confir- são indicativos de que, para a melhora de algumas capaci-
mado pela literatura,18 que refere maior controle da saúde, bem dades, talvez seja necessário treinamento específico para elas.
como prática de exercício físico por parte das mulheres. Um estudo que investigou a aptidão física de idosos com
Com relação à aptidão funcional dos participantes (Tabela e sem diabetes do tipo 2 por meio da bateria de testes Eurofit
2), observou-se que os exercícios com pesos podem ser uma mostrou que a capacidade de caminhar no teste de 6 minutos
estratégia eficaz para a obtenção de melhoras em algumas e o VO2máx foram menores no primeiro grupo. Adicio-
das capacidades físicas e aptidão funcional geral, e isso pode nalmente, os indivíduos com diabetes tiveram menores
ter efeito ainda mais relevante levando-se em consideração valores obtidos para o teste de equilíbrio e preensão manual
que, com o envelhecimento, e marcadamente com o diabetes quando comparados aos sem diabetes.21 Em nosso estudo,
melito, há um decréscimo na aptidão funcional do indi- não verificamos diferenças significativas na aptidão motora
víduo.19,20 Essas informações da literatura científica permitem inicial entre os grupos, o que se deve, provavelmente, ao fato
sugerir que a permanência em um programa de exercícios de ambos os grupos serem constituídos por pessoas com
físicos supervisionado é importante na manutenção dos níveis diabetes. Contudo, ao final das 16 semanas de participação
de força nos anos seguintes, enquanto a execução de apenas no programa de exercícios com pesos, os resultados obtidos
atividades da vida diária ou manutenção de um estilo de vida no teste de agilidade e equilíbrio dinâmico foram positiva-
58 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

mente modificados no grupo treinado quando comparado importantes adaptações cardiovasculares, diminuindo a
à condição pré/pós-treinamento. Sabidamente, o ganho de frequência cardíaca de repouso e aumentando os valores
força possui relações com o desempenho de outras capa- de VO2máx.27 Macedo et al.28 mostraram que mulheres nas
cidades, como, por exemplo, agilidade e velocidade, sendo faixas etárias de 60-69 e de 70-81, participantes regulares
que mulheres ativas na terceira idade, as quais possuíam de atividade física, apresentaram maiores índices de VO2máx
melhores níveis de força, apresentaram melhores níveis de quando comparadas com mulheres fisicamente inativas e
agilidade de membros inferiores quando comparadas às da mesma faixa etária. Dessa forma, apesar de inevitável
mulheres sedentárias de mesma faixa etária.22 declínio na potência aeróbica, com o envelhecimento esse
Para o teste de resistência de força de membros supe- declínio pode ser menor nos idosos treinados. Em nosso
riores, não houve diferença entre os grupos, embora tenha estudo, não se observaram mudanças no VO2pico avaliado
sido observada tendência para a melhora no desempenho pelo teste ergoespirométrico de cargas crescentes no grupo
no grupo de idosos com diabetes treinados. Em virtude da treinado antes e após o treinamento resistido, sugerindo
inclusão do exercício de bíceps pulley no treinamento resis- que, para indivíduos idosos com diabetes, talvez seja neces-
tido, eram esperados resultados mais satisfatórios para o teste sário tempo maior de prática ou treinamento específico
de resistência de membros superiores devido às semelhanças para modificar positivamente essa capacidade física.
na execução, tendo em vista que para ambos são realizados A flexibilidade avaliada nos idosos pelo teste de sentar e
os mesmos movimentos: a flexão de cotovelo e a ativação dos alcançar também não se modificou após o programa de trei-
músculos bíceps braquial, braquial e braquiorradial. namento resistido proposto. A mudança não ocorrida para
Possivelmente, as explicações para as modificações no esse tipo de teste, antes e após o período de treinamento, pode
desempenho dos testes motores relacionados à parte infe- estar associada à limitação do excesso de gordura acumulada
rior do corpo (sentar e levantar, e agilidade e equilíbrio dinâ- na região abdominal, tipicamente presente em indivíduos
mico), e não no teste relacionado à parte superior do corpo com diabetes do tipo 2. Entretanto, o declínio de tal capaci-
(resistência de força de membros superiores no grupo de dade física pode ocorrer em diferentes taxas com o avanço da
idosos com diabetes treinados), podem estar relacionadas a idade, havendo grande variabilidade interindividual, como já
dois fatores: 1) via de regra, com o envelhecimento, ocorre observado por trabalhos anteriores de Ueno et al.29 Isso faz
menor declínio de força dos membros superiores, quando com que indivíduos na mesma faixa etária possam apresentar
comparados com os membros inferiores;23 2) existem estudos grau de flexibilidade do quadril diferente e, talvez, para os
mostrando que pessoas que realizavam as atividades domés- sujeitos do grupo idoso com diabetes que não foram subme-
ticas do dia a dia independentemente, as quais muitas vezes tidos ao treinamento resistido, o período de 16 semanas ainda
requerem resistência de força de membros superiores (limpar não tenha sido suficiente para promover significantes declí-
a casa, lavar roupa, carregar sacolas de compras etc.), podem nios e, portanto, no caso da flexibilidade, apenas os exercícios
prevenir o declínio nessa capacidade física.24,25 Assim sendo, com pesos não tenham sido suficientes para o aumento do
o treinamento físico aplicado foi eficiente em promover nível de tal componente da aptidão funcional.
melhora funcional dos membros inferiores, e talvez seja No entanto, se o processo natural de envelhecimento
necessário um tempo maior de prática para a obtenção de leva a um declínio funcional do idoso, como mostram os
mudanças na aptidão motora dos membros superiores ou estudos de Demura et al.30 e de Pauli et al.,19 o simples fato
mudanças nas características do programa de treino. de ter havido manutenção ou tendência para melhora dos
Tal interpretação é coerente com os achados de Hughes níveis dos componentes da aptidão funcional ao longo do
et al.,26 que, por meio de estudo longitudinal, verificaram a período de intervenção já representa um saldo positivo
influência da massa muscular na força em 120 indivíduos. para a aptidão funcional do idoso com diabetes. Principal-
Os participantes foram examinados inicialmente com mente levando-se em consideração que os participantes
a idade entre 46 e 78 anos. Depois de passados 9,7 ± 1,1 se encontram em uma faixa de idade na qual o declínio
anos, as 68 mulheres e os 52 homens foram reavaliados. A da aptidão funcional deve ser maior nos próximos anos,
proporção de declínio em força isométrica foi, em média, mantendo-se a inatividade e o descontrole do diabetes.
14% por década para os extensores do joelho e 16% por Assim, manter-se fisicamente ativo pode atenuar esse
década para os flexores do joelho em homens e mulheres. decréscimo nos idosos com diabetes fisicamente ativos nos
As mulheres demonstraram proporção menor no declínio próximos anos. Tal tentativa de analogia pode ser reforçada
da força muscular para os extensores e flexores do coto- pelo estudo de Cimbiz e Cakir,20 que comparou a aptidão
velo (2% por década) em relação ao declínio apresentado funcional de pacientes com diabetes do tipo 2 com ausência
pelos homens (12% por década). ou presença de neuropatia, verificando maior declínio
Além disso, a perda de massa muscular exerce papel nos indivíduos com o distúrbio, o qual está classicamente
importante na diminuição do consumo máximo de associado com o período de instalação e o não controle da
oxigênio (VO2máx) com a idade. Antoniazzi et al. demons- hiperglicemia. Ao contrário, o exercício físico resistido pode
traram que o ganho de força muscular com treinamento aumentar a aptidão funcional em médio e longo prazo e frear
de força proporcionou melhor resistência ao esforço e o desenvolvimento das comorbidades associadas ao diabetes.
Treinamento resistido, aptidão funcional e diabetes | 59

Corroborando isso, uma pesquisa que procurou avaliar ganhos sobre a aptidão funcional, sendo os efeitos mais signi-
a aptidão funcional geral na senescência em um período ficativos em membros inferiores, sobretudo no teste de sentar
de 12 anos mostrou que idosos que se mantiveram fisi- e levantar, e agilidade e equilíbrio dinâmico, em idosos com
camente ativos por mais de uma década apresentaram diabetes irregularmente ativos. As capacidades de flexibilidade
melhor desempenho em testes motores semelhantes aos e aptidão aeróbia não se modificaram com o treinamento
aplicados no presente estudo quando comparados aos seus realizado no período de 16 semanas, sugerindo que, para a
pares que permaneceram sem participar de programas de obtenção de alterações significativas, talvez seja necessário
exercícios físicos supervisionados no mesmo período.19 tempo maior de prática ou adição de atividades específicas a
essas capacidades motoras no programa de treinamento.
C onclus ão
Protocolo específico de treinamento resistido de característica C onflito de interesse
ondulatória quanto à intensidade, zona de repetição e intervalo Os autores deste trabalho declaram não possuir qualquer
de recuperação é eficiente para proporcionar significativos conflito de interesses.

R eferências
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Artigo originalGERIATRIA & GERONTOLOGIA
60 | REVISTA

Sugestões de tratamento na
doença de Parkinson: intervenções
psicomotoras com videogame

José Eduardo Martinellia, Luciana Maria Pires Santosa,


Flávia Ogava Aramakia,José Maria Montielb
Juliana Francisca Cecatoa

R es umo
Palavras‑chave Objetivos: Avaliar aspectos cognitivos e motores em idosos com doença de Parkinson (DP) antes e após treinamento
Idoso, terapia por meio de 6 jogos de videogame. Métodos: Estudo com 9 sujeitos, de ambos os sexos. Passaram por anamnese clínica
de exposição à detalhada e foram submetidos a 7 sessões de treinamento por meio dos jogos: Cabeceio, Ski Slalom, Table Tilt Plus,
realidade virtual, Snowball Fight, Balance Bubble Plus e Big Top Juggling. Foi utilizada a análise estatística de Wilcoxon a fim de com-
doença de
parar o desempenho dos participantes na primeira e sétima sessões. Resultados: Os resultados mostraram melhora de
Parkinson, jogos
funções motoras e cognitivas. Os jogos do Cabeceio (Z = -2,207; p = 0,027), Snowball Fight (Z = -2692; p = 0,007), Table
de vídeo.
Tilt Plus (Z = -2,428; p = 0,015), Balance Bubble Plus (Z = -2,547; p = 0,011) e Big Top Juggling (Z = -2,549; p = 0,011)
mostraram diferenças estatisticamente significativas entre as sessões. Conclusão: Pode-se concluir que o treinamento
com jogos virtuais mostrou-se importante na melhora motora e cognitiva dos pacientes desta pesquisa. Sugere-se o trei-
namento com jogos virtuais que envolvam dupla tarefa, mais uma possibilidade de tratamento.

Treatment suggestions for Parkinson’s disease: psychomotor


interventions with video game

abstract
Keywords Objectives: To evaluate cognitive and motor skills of elderly with Parkinson disease who had been submitted to video
Elderly, virtual game training, including six different activities. Method: Longitudinal study involving nine subjects with Parkinson dis-
reality exposure ease of both genres. After having their detailed clinical anamneses taken, they were submitted to seven training sessions
therapy, video using the following games on the console Nintendo Wii – Wii Fit Plus: Soccer, Ski Slalom, Table Tilt Plus, Snowball Fight,
game, Parkinson
Balance Bubble Plus and Big Top Juggling. To compare the performance of the participating individuals during the first
disease.
and last sessions, the Wilcoxon test was chosen as the statistical analysis tool. Results: Results showed improvement in
the cognitive and motor skills. Most games showed statistically significant differences between the first and last sessions:
Soccer (Z = -2.207; p = 0.027), Snowball Fight (Z = -2.692; p = 0.007), Table Tilt Plus (Z = -2.428; p = 0.015), Balance
Bubble Plus (Z = -2.547; p = 0.011) e Big Top Juggling (Z = -2.549; p = 0.011). Conclusion: The training using video
game proved to be relevant for improving cognitive and motor skills of the subjects. Once conventional games exercises
can have limited results in improving those skills, it is desirable to test video games stimulating double task activities to
better offer a new type of treatment.

a
Faculdade de Medicina de Jundiaí.
b
Centro Universitário Fundação Instituto de Ensino para Osasco (Fieo).

Dados para correspondência


José Eduardo Martinelli
Endereço: Rua Prudente de Moraes, 111. Vl Argos. Jundiaí, SP - CEP: 13201-004.
E-mail: cecatojuliana@hotmail.com
Videogame e tratamento para Parkinson | 61

Introdução perilesionais ou contralesionais, características que são


A doença de Parkinson (DP) é uma patologia neurodege- dificilmente atingíveis no mundo real.10,11
nerativa, em que ocorre morte de neurônios localizados Devido ao crescente número de idosos acometidos
na substância negra e comprometimento da produção de por doenças neurodegenerativas e à importância de
dopamina.1 O resultado dessa deficiência de dopamina é a novos tratamentos que exijam o trabalho de dupla tarefa
comunicação deficitária no circuito neurológico, gerando em pacientes com doença de Parkinson, este artigo teve
sinais e sintomas como comprometimento motor, tão mar- como objetivo avaliar aspectos cognitivos e motores em
cantes na DP. Podem-se citar como comprometimentos ca- idosos com essa patologia e que receberam treinamento
racterísticos bradicinesia e hipocinesia (déficit na marcha),
congelamento, rigidez, instabilidade postural, tremor quan-
por meio de seis jogos de videogame Nintendo Wii . ®
do o paciente está em repouso, dentre outros.1-4 M é todos
Somadas ao comprometimento motor, existem alte- Estudo realizado entre abril de 2012 e janeiro de 2013,
rações nas funções cognitivas caracterizadas pela inca- pelo qual foram avaliados nove idosos, de ambos os se-
pacidade de tomar decisões e de controle da atenção, xos, com mais de 60 anos de idade e que receberam diag-
desempenho em tarefas duplas, além de alterações psico- nóstico de doença de Parkinson. Esta pesquisa foi apro-
lógicas como desmotivação e depressão.1-4 Redmond vada pelo Comitê de Ética da Faculdade de Medicina de
et al.2 e Rochester et al.3 descrevem a importância das Jundiaí, com o parecer 54/11. Os participantes passaram
alterações cognitivas durante o processo de investigação por anamnese clínica detalhada e avaliação neuropsi-
clínica do paciente, principalmente pelo fato de que o cológica por meio do Cambrigde Cognitive Assessment
declínio cognitivo contribui para a piora do quadro (CAMCOG),12 miniexame do estado mental (MEEM),13
clínico do paciente com DP. teste de fluência verbal,14 teste do desenho do relógio pe-
Muitos trabalhos têm sido publicados levando em las escalas de Mendez et al.15 e Shulman et al.16 Além dis-
consideração a relação entre marcha e cognição.5 A marcha so, foram aplicados instrumentos que avaliavam os sin-
é uma complexa função do comportamento motor que tomas depressivos, por meio da escala de depressão geri-
está ligada a processos mentais superiores, e sua execução átrica (EDG),17 e o questionário de atividades funcionais
ocorre por meio de funções cognitivas específicas, ou seja, de Pfeffer (QAFP)18 foi utilizado para avaliar o grau de
a cognição influencia a marcha e esse processo é deno- comprometimento em executar atividades do cotidiano.
minado dual task (dupla tarefa).6,7 Em um estudo recente Após a anamnese clínica com o geriatra, os idosos
conduzido por Santos et al.,8 com 24 pacientes com passaram pelos testes neuropsicológicos e, em seguida, se
doença de Parkinson, avaliando as funções cognitivas por iniciaram as sessões com o videogame. As intervenções
meio dos testes miniexame do estado mental (MEEM) e ocorreram com o uso do Nintendo Wii, realizadas duas
fluência verbal, verificou-se déficit na linguagem nas habi- vezes por semana, com duração de 40 minutos. Foram
lidades visuoespaciais e na atenção dos participantes. realizadas 7 sessões. Em relação ao tipo de jogos, foram
Levando em consideração o tratamento fisiotera- selecionados o Cabeceio (Soccer Head), que exige deslo-
pêutico convencional, o programa de exercícios não camentos laterais e controle inibitório, o Ski Slalom, que
faz relação com as funções cognitivas (dupla tarefa), o exige deslocamentos laterais, sendo predominantes os
que limita a reabilitação dessa relação.6,9 Para melhor movimentos laterais, o Snowball Fight, que exige desloca-
reabilitar as funções cognitivas e motoras de pacientes mentos laterais com os pés e, concomitantemente, movi-
com DP, Bruin et al.9 sugerem intervenções baseadas mentos com um dos braços, o Table Til Plus, que exige
em realidade virtual (videogame), pela qual se observa controle do centro de gravidade, com deslocamentos em
significativa melhora nas habilidades psicomotoras. todas as direções do eixo do paciente (frente, atrás, direi-
É notório que a intervenção por meio do videogame ta e esquerda), o Balance Bubble Plus, que exige desloca-
permite que o paciente interaja em ambiente tridimen- mento com tempo de velocidade de processamento, e o
sional, em tempo real e natural, objetivando um meio de Big Top Juggling, que, além do deslocamento lateral com as
intervenção que envolva as funções cognitivas e motoras pernas, exige atenção, controle inibitório e movimentação
ao mesmo tempo. Os exercícios desafiadores do video- com as mãos em movimentos alternados, de acordo com
game permitem ainda maior engajamento na execução o estímulo apresentado pelo videogame (Tabela 1).
das tarefas virtuais, apresentando a possibilidade de O grupo de pesquisa consta de geriatra, psicólogos, fi-
repetir os mesmos exercícios (movimentos) de maneira sioterapeuta, gerontóloga e engenheira. A avaliação clínica
gradual e acompanhar a evolução terapêutica por meio e os critérios para doença de Parkinson foram feitos pelo
dos escores pontuados no final de cada jogo. Em outras geriatra da instituição. Os testes neuropsicológicos foram
palavras, o videogame proporciona condições de reorga- realizados pelos psicólogos. Os treinamentos foram feitos
nização funcional dos sistemas motores e pré-motores, pela fisioterapeuta, acompanhada dos psicólogos e geron-
por meio da estimulação das áreas motoras não lesadas tóloga. A seleção dos jogos do Nintendo Wii foi feita pela
ou pelo recrutamento de redes neuronais alternativas, engenheira da pesquisa, buscando-se encontrar aqueles
62 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

que mais trabalhassem os movimentos de lateralidade, no teste do desenho do relógio pela escala de Mendez
equilíbrio, dupla tarefa, entre outros que contemplassem igual a 18 pontos e 4,5 por Shulman. Acerca da pontuação
as exigências corporais e cognitivas de pessoas idosas. na EDG (GDS-15), verifica-se média de 8,5 (mínimo =
Para analisar o desempenho dos pacientes nos jogos 0; máximo = 14; dp = 5,97). Na escala funcional (QAFP),
de videogame, na primeira e na sétima sessão, foi utili- a média encontrada foi de 7 pontos.
zado o programa SPSS (15.0). Foram realizadas análises A Tabela 2 descreve médias, valores mínimos,
descritivas quanto a idade, gênero e escolaridade por máximos e desvio-padrão (dp) nos jogos do video-
meio de médias, valores mínimos, máximos e desvio- game. Observam-se médias maiores na sessão 7 quando
-padrão. Para a análise comparativa entre os jogos na comparada à primeira sessão, com exceção do jogo Ski
primeira e sétima sessão, foi utilizado o teste Wilcoxon, Slalom, em que as médias observadas na primeira e
para avaliar a hipótese unilateral (H0 > H1), em que H0 sétima sessão são semelhantes.
representa a sessão 7 e H1 corresponde à primeira sessão. As análises comparativas realizadas por meio do teste
Wilcoxon (Tabela 3) evidenciam valores negativos e esta-
Resultados tisticamente significativos nos jogos Cabeceio (Z = -2,207;
A amostra foi composta por nove idosos, que apresentavam p = 0,027), Snowball Fight (Z = -2,2692; p = 0,007), Table
média de idade de 71,25 anos (mínimo = 60; máximo = 85; Tilt Plus (Z = -2,428; p = 0,015), Balance Bubble Plus (Z =
desvio-padrão [dp] = 10,4), sendo três (33,33%) do sexo -2,547; p = 0,011) e Big Top Juggling (Z = -2,549; p = 0,011).
feminino e seis (66,67%) do sexo masculino. A grande O jogo Ski Slalom não evidenciou diferenças estatistica-
maioria dos participantes tinha alta escolaridade, três mente significativas (Z = -0,533; p = 0,594). Pode-se inferir
(33,33%) idosos com nível superior completo, cinco idosos com os resultados apresentados que, após a sétima sessão,
(55,56%) entre 8 e 11 anos de estudo e apenas uma partici- os pacientes apresentaram melhoras nos escores dos jogos
pante com escolaridade entre 1 e 4 anos (11,11%). O tempo utilizados para melhorar o equilíbrio e a dupla tarefa.
de doença encontrada na amostra foi igual a 6,5 anos. Apenas o Ski Slalom, que trabalha a lateralidade e
Em relação aos testes cognitivos, pode-se observar foi escolhido por trabalhar os movimentos laterais dos
que a média no MEEM foi igual a 26, no teste de fluência membros inferiores, não mostrou ser um jogo significa-
verbal foi de 15 pontos, no CAMCOG foi de 82 pontos, tivo para o grupo estudado.

Tabela 1 Jogos de videogame selecionados para a pesquisa


Jogos Descrição Escore

Cabeceio (Soccer Head) Deslocamentos laterais e controle inibitório, sendo predominantes os movimentos frontais Soma do total de acertos

Ski Slalom Deslocamentos laterais, sendo predominantes os movimentos laterais Tempo de execução

Snowball Fight Deslocamentos laterais com os pés e concomitantemente movimentos com um dos braços Soma do total de acertos

Controle do centro de gravidade com deslocamentos em todas as direções do eixo do pacientes


Table Til Plus Soma do total de acertos
(frente, atrás, direita e esquerda)

Balance Bubble Plus Deslocamento com tempo de velocidade de processamento Soma do total de acertos

Deslocamento lateral com as pernas, exige ainda atenção, controle inibitório e movimentação com
Big Top Juggling Soma do total de acertos
as mãos em movimentos alternados de acordo com o estímulo apresentado pelo videogame

Tabela 2  Análises descritivas (médias, mínimo, máximo e desvio-padrão) entre as sessões nos jogos de videogame
Sessão 1 Sessão 7
Jogos
Média Média
Mín-Máx (dp) Mín-Máx (dp)

7 14,83
Cabeceio (Soccer Head)
2-15 (±4,98) 4-20 (±5,84)
95,56 95,56
Ski Slalom
63-117 (±17,28) 37-244 (±60,43)
4,44 7,22
Snowball Fight
1-10 (±3,09) 2-11 (±2,77)
12,22 24,44
Table Til Plus
10-20 (±4,41) 10-30 (±8,82)
200,56 418,89
Balance Bubble Plus
33-599 (±187,95) 152-752 (±269,91)
16,67 92,67
Big Top Juggling
1-95 (±30,14) 2-471 (±147,98)
Videogame e tratamento para Parkinson | 63

Tabela 3  Análises comparativas por meio do teste Wilcoxon, testando a hipótese H0 > H1
Hipótese H0 > H1 Z p

Cabeceio (Soccer Head) -2,207 a


0,027
Ski Slalom -0,533b 0,594
Snowball Fight -2,692 a
0,007
Table Til Plus -2,428a 0,015
Balance Bubble Plus -2,547a 0,011
Big Top Juggling -2,549 a
0,011
a
Sessão 7 > sessão 1; b Sessão 7 < sessão1

Discuss ão primeira e sétima sessão foram Table Til Plus, Balance


O objetivo deste estudo foi avaliar os aspectos cogni- Bubble Plus e Big Top Juggling. Esses jogos envolvem con-
tivos e motores em idosos com diagnóstico de doença trole dinâmico em que se exigia deslocamento do centro
de Parkinson por meio de treinamento com videoga- de gravidade dos participantes, tanto lateral quanto para
me. Vale ressaltar que a perda cognitiva também é um a frente e para trás, e controle de equilíbrio, e o Big Top
dos sintomas que podem acometer o paciente,19-22 o que Juggling envolvia coordenação entre membros inferiores
pode ser comprovado nesta pesquisa, em que a média do e superiores. Suarez et al.24 e Yang et al.26 afirmam a im-
ponto de corte dos participantes no MEEM foi abaixo portância de exercícios para o equilíbrio dos pacientes
do esperado para alta escolaridade. Contudo, a melhora com DP e ratificam a importância de jogos que contri-
nos escores dos jogos pode ser atribuída também a uma buam para a melhora desse comprometimento. Além
melhora cognitiva, já que implicava aprendizagem, por de envolver estimulação motora, os jogos também fazem
meio de repetições dos jogos, particularmente daqueles referência à estimulação e ao treinamento cognitivo, e o
que exigiam exercícios de dupla tarefa. Snowball Fight e o Big Top Juggling foram selecionados
Pavão et al.22, De Dreu et al.23 e Suarez et al.24 argu- pela importância no treinamento de dupla tarefa.
mentam que, em pacientes com DP, o que contribui para
a aquisição de novas informações são justamente tarefas C oncl u s ão
cognitivomotoras, por oferecerem maior estimulação visu- Pode-se concluir que o treinamento com jogos virtuais
al, auditiva e proprioceptivas capazes de armazenar e in- mostrou-se importante na melhora motora e cogniti-
ferir sobre o conhecimento implícito. Outra hipótese que va dos pacientes desta pesquisa. Tendo em vista que os
corrobora a melhora nas tarefas cognitivomotoras nesta exercícios convencionais apresentam limitações em seu
pesquisa é o fato de os exercícios visuais no formato de desempenho, sugere-se concomitante ao tratamento far-
“avatares” – ou seja, o próprio paciente sendo o persona- macológico para pacientes com doença de Parkinson o
gem principal dentro do jogo – serem considerados aspec- treinamento com jogos virtuais que envolvam dupla ta-
tos facilitadores da aprendizagem.25 Mendes25 afirma que o refa. Espera-se, com esta pesquisa, contribuir com a área
uso de “avatares” faz efeito sobre a memória operacional e de geriatria e gerontologia em mais uma possibilidade de
a memória motora devido à estimulação de áreas cerebrais melhorar a qualidade de vida de idosos, além de ressaltar
corticais e pela estimulação dos neurônios espelhos. que são necessárias mais pesquisas na área com número
Em relação aos jogos selecionados para esta pes- maior de participantes.
quisa, verifica-se que o Ski Slalom foi o único que não
apresentou diferença significativa quando comparados C onflito de interesse
os resultados na sessão 7 e na primeira sessão. Os jogos Os autores declaram não possuir nenhum conflito de in-
que apresentaram maiores diferenças entre as médias na teresse na sua realização e publicação.

R eferências
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Artigo
Percepção de maus-tratos original
pelo idoso | 65

Percepção de maus-tratos
no domicílio pelo idoso morador
no município de Juazeiro (BA)

Maria Luiza Barros Fernandes Bezerraa,


Edinete Maria Rosab

Res umo
Palavras‑chave Objetivo: Analisar a percepção de violência pelo idoso morador de Juazeiro (BA) e como ele reage diante da situação. Métodos:
Violência O estudo, do tipo qualitativo, contou com a participação de 10 idosos na faixa etária entre 64 e 84 anos, com indícios de violência
intrafamiliar, e que frequentavam uma Unidade de Saúde da Família. A teoria bioecológica do desenvolvimento humano, de Bronfenbrenner
idoso e (1998), foi a fundamentação teórica utilizada e permitiu o estudo do idoso dentro do microssistema familiar e a sua integração
enfrentamento. dentro desse ambiente ecológico. As informações foram coletadas por meio de entrevistas com roteiro semiestruturado contendo
questões abertas. Depois de transcritas, foi efetuada a análise de conteúdo. Resultados: As formas de violência encontradas
foram: psicológica (90%), negligência (100%), financeira (50%), física (30%) e abandono (30%). A violência foi percebida nas
ações e circunstâncias vivenciadas no cotidiano como confusão, bebida, brigas, desentendimento, brutalidade, desobediência e
agressão física. A reação dos idosos diante das situações de violência apresentou-se como inexistente, de forma tímida, temerosa
e fragilizada. Alguns idosos reagiram por manifestação patológica. O apoio de familiares, amigos e religião foram as estratégias
de enfrentamento utilizadas. Conclusão: A violência é percebida pelo idoso morador de Juazeiro, porém sem reação diante da
situação. Existe a necessidade de articulação de uma rede de apoio, a fim de formar parcerias para o combate à violência.

Perception of elder abuse at home by residents


in Juazeiro city, BA

Abstract
Keywords Objective: To analyze the perception of violence by elderly residents of Juazeiro (BA) and how they react to the situation.
Domestic Methods: This qualitative study, with the participation of 10 elderly people between 64 and 84 years old, with evidence of
violence, elderly violence and attending a Family Health Unit. The bioecological theory of human development of Bronfenbrenner (1998)
and coping. was the theoretical framework used and allowed the study of the elderly within the family microsystem and its integration
within this ecological environment. The data was collected through semi-structured interviews with open questions. The
analysis was performed after the transcription of the interviews. Results: The results indicate the following forms of violence:
psychological (90%), neglect (100%), financial (50%), physical (30%) and abandon (30%). The violence was perceived in the
actions and circumstances experienced daily, such as confusion, drink, fight, disagreement, brutality, physical aggression and
disobedience. The reaction of elderly people facing situations of violence seemed as nonexistent, timid, fearful and fragile.
Some seniors responded by pathological manifestation. The support of family, friends and religion were the coping strategies
used. Conclusion: The violence is perceived by the elderly resident of Juazeiro, but they have presented no reaction to the
situation. There is a need to articulate a support network to form partnerships to combat violence.

Universidade de Brasília, UnB. Contribuição: concepção, desenho, obtenção, análise e interpretação.


a

Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).


b

Dados para correspondência


Maria Luiza Barros Fernandes Bezerra
SQN 311, Bloco E, apto. 204, Asa Norte – Brasília, DF. CEP: 70757-050.
Tels.: (61) 8221-1155/3542-3357. E-mail: barrosbr@uol.com.br
66 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

I ntroduç ão de denunciar os maus-tratos que sofrem. Geralmente,


O envelhecimento populacional brasileiro é uma realidade. eles não têm consciência da abrangência de seus direitos e
Segundo os indicadores sociais de 2012 do Instituto Brasi- apresentam medo de acusar os que cuidam deles.12,13
leiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2001 a 2011 o Para Schraiber et al.,14 tanto no plano nacional como
número de idosos com 60 anos ou mais passou de 15,5 no internacional, a violência passou a ser vista como uma
milhões para 23,5 milhões de pessoas. Espera-se que, em questão social e como um problema de saúde pública. É
2025, o Brasil seja o sexto país com mais idosos no mundo.1,2 considerada mundialmente como violação dos direitos,
O envelhecimento é, na atualidade, associado a ques- embora podendo se expressar de maneira diferente de
tões referentes à qualidade de vida, a qual está intensa- acordo com o contexto em que está inserida.15
mente relacionada com a construção social, influenciada A teoria bioecológica do desenvolvimento humano
por valores culturais e por aspectos subjetivos.3 Pode-se de Bronfenbrenner,5 fundamentação teórica utilizada,
considerar a violência como obstáculo para a quali- concebe a mudança do indivíduo e sua integração dentro
dade de vida dos indivíduos que envelhecem. Antoni e do ambiente, o que torna possível a investigação sobre a
Koller4 consideram que o ambiente ecológico e os seus velhice, que apresenta modificações na adaptação indi-
sistemas têm influência importante no desenvolvimento vidual e sobre a violência intrafamiliar com influência
e na qualidade de vida dos indivíduos porque envolvem direta no indivíduo que envelhece.
os valores sociais, as crenças culturais, as regras de Os profissionais da saúde, principalmente os que
comportamento e os preconceitos. Dentro da perspec- fazem parte de atividades em atenção primária, como a
tiva bioecológica,5 que concebe a mudança do indivíduo estratégia de Saúde da Família e Comunidade, deparam-
e sua integração dentro do ambiente, torna-se possível a se constantemente com queixas relacionadas à violência
investigação sobre a velhice, que apresenta modificações doméstica e social contra os idosos.
na adaptação individual e sobre a violência intrafamiliar, Diante do exposto, este estudo teve como obje-
com influência direta no indivíduo que envelhece. tivo investigar o fenômeno da violência contra o idoso
A definição de maus-tratos contra idosos, que vem pela análise da percepção da violência e as estraté-
sendo utilizada atualmente por consenso internacional gias de enfrentamento, ou seja, como o idoso morador
de todos os países participantes da Rede Internacional de de Juazeiro lida, qual o seu pensamento, sentimento e
Prevenção contra os Maus-tratos com Idosos (INPEA) e comportamento diante das diferentes formas de violência
endossada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que são expostas e percebidas por ele a fim de adminis-
é a da organização inglesa Action on Elder Abuse. Para trar a crise e tolerar as demandas criadas pela situação.
essa organização, os maus-tratos são “uma ação única
ou repetida, ou ainda ausência de uma ação devida, M é todos
que causa sofrimento ou angústia e que ocorre em uma A cidade de Juazeiro foi escolhida tendo em vista a falta
relação em que haja expectativa de confiança.6-8. de estudos sobre idosos no município e a consequente
Na realidade, existem muitas modalidades de violência necessidade de estudos na área. A investigação contou
contra a pessoa idosa, como psicológica, econômica, moral, com a participação de 10 idosos na faixa etária 64 a 84
sexual, podendo ainda ser atos de omissão ou de negligência. anos, residentes no Bairro São Geraldo e que frequen-
Saliba et al.9 afirmam que os idosos que vivem com a família tavam a Unidade de Saúde da Família localizada no
têm maior predisposição de ser vítimas de maus-tratos. bairro. Os idosos não possuiam déficit cognitivo, tinham
O convívio conflituoso entre gerações e as trans- indícios de violência e aceitaram fazer parte do estudo. O
formações sociais e econômicas ocorridas nos número de participantes foi determinado por saturação
últimos tempos têm aumentado a violência contra os dos dados, sendo que o grupo constituiu-se à medida
idosos. O fato de os idosos deixarem de fazer parte que as informações foram coletadas, por conveniência e
do sistema produtivo e serem vistos como estorvo não de forma probabilística.
social, sendo vítimas de exploração econômica pelos O estudo foi do tipo descritivo, qualitativo, e a teoria
familiares e receberem pensões irrisórias, aumenta bioecológica do desenvolvimento humano de Bron-
a magnitude da violência, perdendo-se o direito de febrenner5 foi utilizada como referencial teórico. Foi
envelhecer com dignidade.10,11 realizada uma entrevista com roteiro semiestruturado
A violência contra o idoso está crescendo rapida- contendo questões abertas, gravadas por meio digital e
mente, e é fato que essa velocidade impede a obtenção transcritas na íntegra. As entrevistas foram realizadas na
da tão almejada qualidade de vida nessa fase da vida. No unidade de saúde ou em visita domiciliar de acordo com
Brasil, grandes centros urbanos como São Paulo registram a disponibilidade do idoso. Prezou-se que o participante
diariamente diversos casos de violência familiar contra permanecesse sozinho durante a entrevista.
a pessoa idosa. A maioria dos casos refere-se a lesão A entrevista foi organizada em três blocos e orientada
corporal, furtos e mau uso de bens. É pertinente ressaltar por um roteiro contendo 65 perguntas. O primeiro bloco
que os idosos têm dificuldades de tomar alguma atitude foi composto por dados sociodemográficos e clínicos preen-
Percepção de maus-tratos pelo idoso | 67

Tabela 1 Dados sociodemográficos e clínicos dos idosos entrevistados (N = 10)


chidos com informações do prontuário e complementados
no momento da entrevista. O segundo bloco referiu-se às Dados clínicos e sociodemográficos F F (%)

relações familiares dos idosos. Nesses dois blocos, buscou- Sexo


se analisar o contexto em que o idoso está inserido. O Feminino 9 90
terceiro bloco continha questões referentes a diversos tipos Masculino 1 10
de violência e objetivava buscar informações acerca da iden- Idade
tificação da violência intrafamiliar, da percepção dela pelo 60-65 2 20
idoso e da reação diante das situações que considerava ser
66-75 3 30
uma violência. As entrevistas ocorreram sem intercorrências.
76-85 5 50
A análise do conteúdo seguiu a metodologia sugerida
por Bardin.16 Segundo essa autora, a análise qualitativa Estado civil

pode ser considerada como presença ou ausência de Casado(a) 4 40

uma característica de conteúdo em determinado frag- Solteiro(a) 1 10


mento de mensagem em que se está fazendo o estudo. As Viúvo(a) 3 30
informações foram organizadas em categorias e subcate- Divorciado/separado(a) 2 20
gorias, e, em consequência, obtiveram-se as conclusões Descendência
desta pesquisa pelos resultados obtidos em discussão
Não possui filhos 1 10
com a literatura relacionada ao assunto.
0-2 filhos 0 0
A primeira categoria, relacionamento familiar e pessoal,
trata das expressões verbais emitidas pelos idosos, caracte- 3-5 filhos 3 30

rizando os relacionamentos vivenciados por eles no coti- Mais de 6 filhos 6 60

diano, ou seja, no contexto em que vivem. Essa categoria No. de pessoas no domicílio
pôde ser dividida nas subcategorias: a) relacionamento Nenhum 0 0
com os familiares moradores no domicílio; b) relaciona- 1-3 5 50
mentos com familiares que não moram no mesmo domi- Mais de 4 5 50
cílio; c) relacionamento social e com amigos.
Escolaridade
A segunda categoria elencada foi a violência intrafami-
Analfabeto 6 60
liar, que aborda as expressões dos participantes em relação
Ensino Fundamental 3 30
à violência intrafamiliar vivenciada. Essa categoria foi subdi-
vidida em três subcategorias: a) tipos de violência; b) autores Ensino Médio 1 10

da violência; c) reação diante das situações de violência. Religião


Neste estudo, observaram-se as questões éticas, Católica 7 70
preconizadas pela Resolução no 196/1996 do Conselho Evangélica 2 20
Nacional de Saúde/Ministério da Saúde,17 tendo em Outra 1 10
vista que a pesquisa envolveu seres humanos. O projeto Ocupação atual
foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa em seres
Do lar 6 60
humanos do Instituto de Medicina Integral Professor
Outra 4 40
Fernando Figueira (Recife, PE). Buscando preservar a
identidade e atender às questões relativas ao anonimato, Diagnóstico para doença

os entrevistados receberam nomes fictícios. Sim 10 100

Não 0 0
R es ultados F: frequência; N: tamanho da amostra
Os dados sociodemográficos e clínicos dos participantes
da pesquisa foram organizados conforme a Tabela 1. Tabela 2  Frequência da categoria relacionamento familiar e pessoal e
Quando os participantes da pesquisa foram questio- subcategorias relacionadas a ela, dos idosos participantes da pesquisa
nados sobre sua ocupação, viu-se que 6 eram do lar, 4 (N = 10)
ainda trabalhavam e declararam as seguintes profissões: F (%) por
Categorias e subcategorias F
vendedor de frutas, lavadeira de roupas, zeladora e auxi- categoria

liar de nutrição. Foi observado que todos os idosos apre- Relacionamento familiar e pessoal 535 100
sentavam algum tipo de patologia, como hipertensão (9), Relacionamento com familiares que moram no
287 53,6
ansiedade (2), diabetes (2), artrose (2) e Parkinson (1). mesmo domicílio dos idosos

A categoria relacionamento familiar e pessoal foi Relacionamento com familiares que não moram
94 17,5
no mesmo domicílio dos idosos
demonstrada conforme a Tabela 2, e a frequência
percentual foi calculada baseando-se no número total de Relacionamento social e com amigos 154 28,9

trechos do discurso dos participantes relacionados com F: frequência; N: tamanho do grupo de participantes
68 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

a categoria. Foram 535 falas analisadas. A categoria foi avaliavam a própria saúde, foi possível perceber que o que
dividida em três subcategorias. eles consideram como problema de saúde é diferente da
Quando foram questionados sobre como era o doença crônica que possuem. Isa declarou: “(...) Eu acho que
relacionamento familiar, 5 idosos responderam que vai bem, né, porque quando tô assim com a minha pressão
o relacionamento familiar era bom e que a família era alta os meninos ficam me agoniando... eles dizem pra eu me
unida; porém, outros 5 declararam existirem brigas ou conformar (...).” Essa idosa é portadora de diabetes e hiper-
problemas. Quando foram questionados sobre como se tensão, mas ela não mencionou o diabetes, falou da hiper-
sentiam morando com os familiares, 6 relataram que se tensão e considerou estar relacionada à agitação “agonia”
sentiam bem, porém 4 declararam que se sentiam mal. vivenciada no domicílio. Já Sebastiana avaliou a saúde como:
Quando foram questionados se sentiam respeitados, “(...) as pernas doendo, problemas na cabeça, nervoso, só
a maioria (9) respondeu que sim, porém em diversas isso (...).” Essa idosa é portadora de ansiedade e de doença
falas muitos dos participantes demonstram o contrário: de Parkinson, não reconhece a doença e por isso não se trata.
“(...) só que esse rapaz eu num (sic) gostei dele porque ele Quando foram questionados se possuíam religião,
num (sic) me respeitou, chegou batendo na minha porta todos responderam positivamente, e em diversas falas
uma hora da manhã (...)” (Laura). Apesar de a maioria (80 vezes) foram encontradas palavras com simbo-
dos idosos conviver em lares com muitos moradores, logia religiosa. Quando os idosos foram questionados
quando foram questionados sobre solidão 7 respon- sobre a frequência à igreja, 70% da amostra afirmaram
deram que esse era um sentimento presente em sua vida. não frequentar igreja e os motivos foram vários: “(...)
Por outro lado, sentimentos como “carinho”, “afeto” Frequento, só num (sic) tô frequentando agora mais
e “amor” também foram encontrados em diversas porque eu num (sic) tenho tempo... com menino... e de
falas deste estudo: “(...) esse que usa drogas, comigo noite tem as novenas aqui na capelinha (...)” (Berna-
é mainha para cá, nem a mãe dele chama de mãe (...)” dete); “(...) nem católica e nem evangélica, mas não
(Sônia); “(...) eu me sinto uma pessoa muito amada frequento assim não, logo eu não posso andar, logo eu
(...)” (Joana). O sentimento de carinho foi encontrado tenho medo de cair (...)” (Helena).
em 40 trechos analisados, ou seja, em 7,4% do total de Quando os participantes deste estudo foram questio-
falas referentes à categoria. nados se participavam de grupos de idosos, apenas um
Quando os idosos foram questionados se eram idoso referiu participar e, mesmo assim, fazia tempo que
felizes, todos responderam que sim. Porém, a felicidade não comparecia. Percebeu-se que os participantes do
não foi mencionada em mais nenhum outro momento. estudo possuíam muitas amizades e achavam importante
Helena respondeu: “(...) eu me considero a mulher ter amigos, porém apenas dois idosos responderam que
mais feliz do mundo porque tenho amizade com todo participavam de atividades de lazer.
mundo e isso ninguém tira de mim (...).” Porém, tris- Quando foram interrogados se ajudavam alguém
teza e choro foram mencionados em 55 falas (10,3%) de com a renda, todos responderam positivamente. Os
trechos analisados referentes à categoria. idosos também foram questionados se a renda era sufi-
Quando questionados sobre quem realizava as ciente para viver e, apesar das dificuldades enfrentadas, a
tarefas domésticas, obtivemos resposta de que 7 dos maioria deles (7) considerava suficiente.
entrevistados realizavam todas as tarefas da casa. Em relação à violência sofrida e percebida, o estudo
Quando foram questionados sobre quem preparava elencou a segunda categoria violência intrafamiliar e,
a comida, 8 responderam que eram eles, e 2 alter- para melhor entendimento, essa categoria foi dividida
navam essa atividade com algum outro morador da em três subcategorias. Esses dados podem ser obser-
casa. Quando questionados se gostavam de preparar a vados na Tabela 3.
comida, apenas 5 responderam positivamente.
A preocupação com as pessoas que moram no domi-
cílio esteve presente em várias falas dos entrevistados: Tabela 3  Frequência da categoria “violência intrafamiliar” e
“(...) eu fico preocupado, um tempo desses mataram subcategorias relacionadas a ela, dos idosos participantes da pesquisa
um cara no curtume (...)” (Rui). Contudo, observou- (N = 10)
se a importância, atribuída pelos idosos, dos familiares F (%)
Categorias e subcategorias F por
que não moravam no mesmo domicílio, uma vez que ao categoria
serem questionados sobre quem era a pessoa mais signi-
Violência intrafamiliar 210 100
ficativa em sua vida 90% deles responderam que eram os
filhos e os parentes que não moravam com eles. Tipo de violência 121 57,6
A respeito da participação deles nas decisões da Autor 31 14,8
família, cinco idosos responderam que participavam por
Reações diante de uma situação de violência 58 27,6
opinião e ajuda.
Quando os idosos foram interrogados a respeito de como F: frequência; N: tamanho do grupo de participantes
Percepção de maus-tratos pelo idoso | 69

Pelas falas dos participantes percebe-se que diversas e ela declarou: “(...) só teve uma vez que ela me pegou,
modalidades de violência fazem parte do dia a dia dessas quase me mata (...)” “(...) ela só me deu um tapa (...)”.
pessoas. A frequência dessas modalidades pode ser A violência financeira foi detectada como uma
visualizada na Figura 1. modalidade de violência vivenciada por 50% dos idosos
entrevistados. Foram feitas perguntas sobre quem admi-
Figura 1  Frequência das formas de violência entre os idosos nistrava o dinheiro do idoso; se já tinha sido obrigado
participantes da pesquisa
a assinar procuração, se o dinheiro já tinha sido usado
para comprar objetos para outras pessoas sem o consen-
timento dele; se as pessoas que moravam na casa depen-
120%
100%
diam do dinheiro do idoso para viver e se já haviam feito
Ocorrência de violência (%)

100% 90% empréstimo em algum banco. As respostas de quatro


80% participantes evidenciaram a incidência desse tipo de
60% violência em suas diversas formas de manifestação.
50%
40% Em relação ao autor da violência, constatou-se que 17
40%
30%
familiares estavam envolvidos nas situações de violência.
20%

0%
Psicológica Negligência Financeira Abandono Física Tabela 4 Dados sociodemográficos dos autores da violência contra os
idosos entrevistados (N = 17)
Tipo de violência
Dados sociodemográficos F F (%)

Sexo
Quando os sujeitos deste estudo foram questionados
Feminino 3 17,6
sobre o que era violência percebeu-se nos relatos a criação
Masculino 14 82,4
de uma imagem relacionada ao que eles vivenciam no dia
Idade
a dia, podendo ser dado como exemplo: “(...) negócio de
confusão, negócio de briga, só vive brigando (...)” (Sebas- 5-10 2 11,8

tiana); “(...) É a bebida. A bebida traz violência. (...)” 11-30 5 29,5


(Deia); “(...) Ave Maria, é briga, eu corro disso (...)” (Rui). 31-50 7 41,1
A violência psicológica foi uma das modalidades 61-70 3 17,6
mais frequentes encontradas nos discursos dos idosos. Parentesco com a vítima
Verificou-se que em 90% dos participantes existiam falas Filho(a) 5 29,5
relacionadas a insultos, humilhação, restrição à liber-
Neto(a) 5 29,5
dade ou isolamento do convívio social que ocasionaram
Genro/nora 1 5,8
prejuízo à saúde psicológica e ao desenvolvimento pessoal.
Entre os idosos entrevistados, percebeu-se também Sobrinho(a) 3 17,6

que muitos deles eram vítimas de omissão e recusa de Cônjuge 2 11,8

cuidados necessários, como cuidados com a saúde em Irmão 1 5,8


geral, com a alimentação, com medicamentos e com a Dependência química
higiene pessoal, caracterizando situação de negligência, Álcool 9 52,9
forma específica de violência que esteve presente nos Drogas 2 11,8
relatos de 100% dos nossos participantes. Sem dependência 7 41,2
O abandono esteve presente em 30% dos relatos
Escolaridade
obtidos nas entrevistas, sendo considerado quando os
Analfabeto 2 11,8
idosos manifestavam a não prestação de socorro ou
ajuda quando precisavam, ou ainda quando narravam Ensino Fundamental 12 70,5

que ficavam sozinhos por muito tempo. Ensino Médio 3 17,6

Quanto à violência física, esteve presente nos relatos Estado civil


de 3 participantes e pode ser considerada como a forma Casado(a) 5 29,5
mais difícil de ser detectada, pois a maioria dos idosos Solteiro(a) 10 58,9
tentou escondê-la de algum modo. Pelas falas analisadas, Viúvo(a) 1 5,8
algumas expressões sobre uso de força física contra o
Divorciado/separado(a) 1 5,8
idoso puderam ser detectadas. Essa situação pode ser
Ocupação atual
demonstrada em relação a Isa; quando questionada se
Trabalha 7 41,2
a neta batia nela, falou: “(...) Não, bater ela nunca bate,
não, mas me responde (...)”; em outro momento da Não trabalha 10 58,8

entrevista foi perguntado se a neta já a havia machucado F: frequência; N: tamanho do grupo de participantes
70 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Na Tabela 4, é possível verificar dados sociodemográf- outros integrantes da família. As principais características
icos referentes aos autores da violência. da família dos entrevistados foram: insuficiência material,
A dependência química, principalmente o alcoolismo, psicológica e afetiva, principalmente entre o idoso e os
mostrou-se relevante na caracterização dos autores da autores da violência, na maioria deles usuários de álcool.
violência, pois as palavras “bebida” e “álcool” estiveram Porto e Koller18 afirmam que o carinho deve fazer parte
presentes em 32,8% das falas dos entrevistados. dos relacionamentos do idoso porque, por amor e atenção,
Em relação às reações diante de situações de violência, o idoso encontra no microssistema familiar maior signi-
verificou-se que as respostas desses idosos variaram ficado para vivenciar seus últimos anos de vida. Para os
desde não tomar nenhuma atitude até externar a situação, entrevistados, as qualidades mencionadas para classificar as
porém de forma sutil, tímida e com bastante sofrimento. pessoas mais significativas para eles foram carinho, atenção
Sebastiana, no seu discurso, mostrou fragilidade e tris- e cuidado, as quais foram pouco demonstradas nas relações
teza, mas também disposição para buscar a ajuda de amigos existentes no ambiente ecológico familiar. Um aspecto posi-
no enfrentamento da situação; assim, ela declarou: “(...) aí tivo percebido foi o fato de a maioria sentir-se participativa
fiquei nervosa (...) tem vez que eu choro (...) aí vou pra casa nas decisões familiares e de receber sempre notícias e infor-
de um e de outro (...).” Em relação a Deia, ela expressava um mações de parentes e amigos. Os idosos conseguiram se
sentimento de vergonha, sem possibilidade de conversar adaptar à falta de recursos afetivos e consideraram-se felizes.
com outras pessoas e buscava a ajuda de Deus: “(...) eu Os participantes deste trabalho frequentavam pouco
sofria com isso. Sentia vergonha, eu sentia vergonha de a igreja, não participavam de grupos, mas as relações de
contar ao povo. (...)” “(...) Rezo e entrego a Deus (...).” amizade, principalmente com vizinhos, foram mencio-
As falas de Laura e Carmem expressavam sentimentos nadas como algo importante e significativo para eles.
de tristeza e preocupação com o filho violento, muitas vezes A falta de recursos materiais e financeiros também foi
sendo motivo de choro e angústia. Em outras falas, Laura mencionada como algo normal e esperado na vida.
demonstrou uma tentativa de diálogo com o filho: “(...) chamo As principais formas de violência presentes no
ele e converso com ele, só que ele tando (sic) bêbado num (sic) ambiente intrafamiliar dos idosos foram a psicológica
me obedece, não.” Nos discursos de Helena e Sônia, a reação e a negligência, seguidas da financeira e, em menor
diante da violência foi apresentada como tentativa de fuga e a proporção, a física e o abandono. Esse resultado não
busca por familiares e parentes: “(...) quando eu tô (sic) assim, corrobora outros trabalhos que evidenciam o abuso físico
de raiva, às vezes eu vou para casa da minha filha (...)” (Sônia). como o tipo mais comum de violência contra o idoso.19
Neste trabalho, o medo do idoso em relação ao agressor e de Para os idosos de Juazeiro, a violência é percebida nas
piorar ainda mais a situação existente também foi expresso pelo ações e circunstâncias vivenciadas por eles no cotidiano
discurso de alguns participantes: “(...) ôxe, (sic) eu tenho medo como confusão, bebida, brigas, desentendimento, bruta-
dela, ela tem uma força que eu quero que a senhora veja (...)” lidade, desobediência, tristeza e agressão física.
(Isa); “(...) quando ele tá bêbado, eu tenho medo (...)” (Laura); Em relação aos autores da violência, observou-se que os
“(...) aí, pra evitar confusão com meus filhos e meus netos, eu agressores eram, na maioria das vezes, filhos da vítima, do
saio (...)” (Sônia). Alguns idosos apresentaram reações patoló- sexo masculino, dependentes financeiramente e usuários de
gicas e/ou orgânicas, ou seja, somatizaram o problema viven- drogas e álcool. Souza et al.20 e Andersson21 salientam que
ciado: “(...) a gente se preocupa, o problema de pressão que a muitos agressores de idosos apresentam problemas mentais e
gente tem é de preocupação (...)” (Bernadete). alcoolismo. A Organização Mundial da Saúde (OMS)22 afirma
Quando foram perguntados se já ouviram falar do existirem ligações diretas entre o álcool e o abuso contra os
Estatuto do idoso, 6 responderam negativamente, 2 já idosos, e relata que os agressores são pessoas financeiramente
tinham ouvido falar, mas não conheciam nada dele e 2 dependentes das vítimas e costumam ser negligentes, além de
externaram algum conhecimento. praticar violência física, psicológica e explorar a vítima finan-
ceiramente, assim como foi demonstrado nesta pesquisa.
D iscuss ão Quanto à reação dos idosos diante das situações de
A partir dos resultados pode-se concluir que a complexi- violência, apresentou-se em alguns casos como inexis-
dade que envolve o contexto ecológico familiar propor- tente ou, em outras situações, de forma tímida, temerosa
ciona aos integrantes diversas influências, que, de acordo e fragilizada. Não demonstraram atitude mais enérgica em
com o momento, podem ser consideradas positivas ou nenhum momento, e choro, tristeza e vergonha traduziram
negativas e refletir direta e indiretamente nos relaciona- os sentimentos deles diante dessas situações. Esses dados
mentos. Por meio das entrevistas, foi possível perceber corroboram os achados de Menezes,23 quando comenta que
diversos sentimentos que refletiam a qualidade dos rela- a omissão por parte dos idosos diante de uma situação de
cionamentos familiares, pessoais e sociais dos idosos violência é proveniente de insegurança, medo, proximidade,
moradores de Juazeiro, como falta de respeito, solidão, tris- afeto, amor e instinto de proteção que existe na relação com
teza e preocupação. A maioria dos participantes realizava o familiar agressor. Alguns idosos apresentaram reações
todas as tarefas domésticas da casa, para si e para todos os por manifestação patológica, somatizando a situação de
Percepção de maus-tratos pelo idoso | 71

violência vivenciada. Esse resultado é corroborado por violência e o silêncio diante dessas situações por parte da popu-
Silvestre e Costa Neto,24 que comentam que o bem-estar lação. Para isso, sugere-se uma capacitação dos profissionais
emocional e social tem maior valor que o bem-estar físico, de saúde e a articulação de uma rede de apoio aos idosos, a fim
e consideram que o profissional de saúde deve levar em de formar parcerias para o combate à violência que os atinge e
consideração a multicausalidade dos processos mórbidos. para maior conscientização a respeito dos seus direitos.
Quanto às estratégias de enfrentamento, percebe-se Campanhas de educação para a população idosa e
pelos relatos que o apoio de amigos e familiares foi a da comunidade, a respeito da divulgação do Estatuto do
estratégia utilizada pelos idosos para suportar a situação idoso e de outras políticas que favorecem esse grupo etário
de estresse e de violência. Outros participantes mencio- devem ser estimuladas, procurando incentivar as denún-
naram a religião como conforto, apoio e esperança. cias e o combate dessa forma tão cruel de violência.26
Alves25 aponta que a espiritualidade é um forte indicador
de resiliência na superação das adversidades, como capa- C oncl u s ão
cidade de encontrar significado na vida pela fé. A violência contra o idoso morador de Juazeiro existe e precisa
O estudo permitiu visualizar os fatores de risco que ser combatida. A educação dos participantes envolvidos
predispõem à ocorrência de violência no ambiente fami- nos cuidados com o idoso pode ser considerada uma forma
liar para os moradores de Juazeiro como eventos estres- adequada de intervenção e uma medida viável para enfrentar
santes, ausência de apoio, falta de afeto, preocupação, um problema tão relevante. Espera-se que este trabalho tenha
baixo nível socioeconômico e presença de alcoolismo na sensibilizado a comunidade acadêmica e a sociedade em geral
família. Porém, a união familiar, o apoio social externo no que se refere ao fenômeno da violência contra o idoso e
e o religioso podem ser considerados como fatores de sirva como impulso para despertar os pesquisadores a dar
proteção, pois serviram de suporte para o enfretamento continuidade aos estudos relacionados aos idosos de Juazeiro.
da violência e como motivação para superar as adversi-
dades decorrentes da fragilidade dos processos proximais. C onflito de interesse
A falta de conhecimento em relação à legislação a favor Os autores declaram não possuir nenhum conflito
do idoso existente nos dias atuais fortalece a ocultação da de interesse.

R eferências
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Artigo de revisão
72 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

síndrome do pé doloroso
na população idosa

Giovanna Riccitelli do Coutoa, Nathalie Fernandes Cavalcantea,


Rodrigo Sader Hecka, Marcel João Zulina, Marcos Carmelita
Siqueirab, Jorge Luiz de Carvalho Melloc

R es umo
Palavras‑chave Objetivo: Abordar as peculiaridades etiológicas e fisiopatológicas das diversas patologias que acometem os pés dos
Pé, idoso. idosos, com ênfase nos aspectos diagnósticos e terapêuticos. Método: Revisão da literatura de 1987 a 2012 sobre o
tema em questão. Resultado: Os metatarsos constituem o local mais frequente de dor, com predominância no sexo
feminino. Entre as causas mais frequentes, destacamos: fasciite plantar, hálux valgo, dedos em garra, martelo ou ma-
lho, pé cavo, pé plano, síndrome do esporão do calcâneo, tendinites, onicomicose, osteoartrose, artrite reumatoide,
crise gotosa, diabetes, entre outras. Para o diagnóstico deve-se realizar a avaliação geriátrica ampla, mas também
avaliação vascular, exame neurológico, biomecânica e avaliação dermatológica. O tratamento envolve mudança de
hábitos, fisioterapia e abordagens específicas de acordo com a causa do pé doloroso. Conclusão: Essa afecção é
frequente e passível de prevenção quando aliada a diagnóstico e tratamento adequados objetivando redução de
incapacidade e preservação de autonomia e independência.

Foot pain syndrome in


elderly people
A BS T RACT
Keywords Objective: The assessment of the feet in geriatric patient is of great importance, since it can detect problems that
Foot, elderly. could cause some disabilities in this age group. In this article, we’ll focus on diagnostic and therapeutic aspects.
Methods: Retrospective study done through a critical systematic review of the literature. Result: The metatarsals
are the most common site of pain, predominantly in females. Among the most frequent causes: plantar fasciitis,
hallux valgus, claw toes, hammer or mallet, cavus foot, flat feet, heel spur syndrome, tendinitis, onychomycosis,
osteoarthritis, rheumatoid arthritis, and acute gouty crisis, diabetes, and so on. During the diagnosis, we must do
a proper anamnesis and look for some specific points in the physical examination, such as: vascular, neurological,
biomechanical and dermatological evaluation; and complementary exams. Indexes could be used to assess the dis-
ability associated with foot pain in elderly people. The treatment consists in changing some habits, with physical
therapy, and specific approaches according to the cause of foot pain. Conclusion: From this study was possible to
conclude that this disease is often preventable and, when it is combined investigation and treatment, enabling the
improvement of patient’s quality of life.

a
Alunos do 10o semestre do curso de Medicina. Universidade São Francisco (USF), Bragança Paulista, SP.
b
Aluno do 11o semestre do curso de Medicina. Universidade Lusíadas, Santos, SP.
c
Membro titular da Sociedade Brasileira de Clínica Médica. Especialista em geriatria pela SBGG. Professor de geriatria da disciplina de
saúde coletiva da USF.

Dados para correspondência:


Jorge Luiz de Carvalho Mello – Universidade São Francisco, USF. Av. São Francisco de Assis, 218, Jd São José. CEP: 12916-900.
E-mail: jorgeluis_melo@yahoo.com.br
Pé doloroso no idoso | 73

Introdução congênita ou adquirida, como resultado de trauma ou


A avaliação dos pés constitui um grande desafio na abor- artrite generalizada. O movimento articular pode sofrer
dagem do paciente geriátrico. Embora não realizado diminuição gradual até a fusão total.
rotineiramente, o exame das estruturas desse segmento As deformidades nos dedos apresentam-se basica-
assume especial importância, uma vez que pode detectar mente de três formas: em garra, martelo ou malho. São
problemas causadores de incapacidade nessa faixa etária. todas de formas rígidas ou flexíveis. A causa mais co-
Estudos sugerem que tais transtornos acometem mum são sapatos inadequados, mas também podem ser
mais de 80% dessa população,1 de forma que a dor afeta congênitas ou secundárias a alterações neuromusculares.
20% a 30% dos idosos na comunidade2 e está associada a Alterações do arco plantar na infância não passam de
declínio funcional, alterações de equilíbrio, marcha com variação normal. A persistência de deformidade após os
instabilidade postural e aumento no risco de quedas.3 6 anos, sobretudo se acompanhada de rigidez articular,
As modificações que ocorrem podem ser decorrentes merece abordagem mais precisa. Essas deformidades ca-
de doenças sistêmicas, transtornos de marcha, maus-tra- racterizam-se por pé cavo (aumento no sentido vertical
tos ou traumatismos que afetam a integridade das unhas, do arco longitudinal, com diminuição da área de apoio
da pele, de nervos, vasos e estruturas ósseas. quase sempre secundária a alterações neuromusculares)
Neste artigo, abordaremos peculiaridades etiológi- e pé plano (queda do arco plantar longitudinal, associada
cas e fisiopatológicas das diversas patologias que aco- a valgismo do calcâneo em grau variável).
metem suas estruturas, com ênfase nos aspectos diag- Dor no calcanhar ou calcaneodínia pode ser classi-
nósticos e terapêuticos. ficada em: doenças inflamatórias sistêmicas ou localiza-
das, compressões de nervos, doenças metabólicas, infec-
Método ções, síndrome traumática e/ou uso abusivo.5
Revisão crítica da literatura, com posterior análise e sín- A síndrome do esporão do calcâneo caracteriza-se
tese das informações disponibilizadas em estudos rele- por crescimento ósseo extra, podendo se formar quando
vantes publicados, datados de 1987 a 2012, sobre a sín- a fáscia plantar exerce tração excessiva sobre o calcâneo.8
drome do pé doloroso (SPD) nos idosos. Talalgias envolvem dores localizadas no retropé,
O estudo baseou-se nas etiologias das implicações, como tendão de Aquiles, calcâneo e fáscia plantar. Esse
de forma a resumir o corpo de conhecimento e levar a quadro doloroso pode estar associado à existência de um
discussão sobre o assunto em questão. tubérculo posterossuperior do calcâneo proeminente,
assim como a processos inflamatórios das bursas.9
R es ultados Tensão excessiva sobre os tendões, levando a es-
Os metatarsos constituem o local mais frequente de dor, tiramento e lacerações, com inflamação reparadora e
sendo a porção plantar anterior a mais acometida por dor, explicam causas de dores periarticulares, as cha-
causas biomecânicas. A nítida predominância do sexo madas tendinites.10
feminino é atribuída ao uso de sapatos de salto com a Hiperpressão e atrito excessivo em áreas de proemi-
porção anterior mais fina. nência óssea podem gerar hiperqueratose, com limitação
Os “dedos em garra” resultam de queda das cabeças de deambulação, risco de ulcerações e infecções secun-
metatarsianas centrais; o coxim adiposo sob as cabeças dárias.11 Podem constituir calos rígidos e calos pouco
desloca-se para a porção mais distal, reduzindo a posi- consistentes. Os primeiros formam-se no dorso dos de-
ção dessa região. Essas alterações levam a um quadro de dos ou superfície plantar, enquanto os segundos se for-
metatarsalgia em queimação, de caráter difuso, limitan- mam entre os dedos.
do o uso de sapatos habituais.4 Imunossenescência associada ao uso de sapatos fe-
Pacientes portadores de pé pronado, com acentua- chados e úmidos, andar descalço em banheiros públi-
ção do arco longitudinal e cuja atividade envolve ficar cos e traumas fechados pode resultar em onicomicose,
em ortostatismo ou caminhar por muito tempo, podem onicólise, hiperqueratose subungueal, importantes cau-
desenvolver processo inflamatório no ponto de inserção sas de dor.12
da fáscia plantar, denominada fasciite plantar.5 Quando as unhas são curvas, suas bordas podem
Hálux valgo ou “joanete” (subluxação estática da pri- cavar para a polpa dos dedos e promover lesão de
meira articulação metatarsofalangiana) resulta de ante- partes moles, infecção e lesão granulomatosa, as cha-
pé alargado, arco transverso achatado e pé pronado, em madas unhas encravadas ou criptogênicas, com dor e
combinação com calçados inadequados.6 limitação funcional.
Hálux rígido também constitui problema comum, Onicólise, ou unhas quebradiças, também constitui
caracterizando-se por artrose da primeira articulação causa de dor, podendo resultar de onicomicose.13
metatarsofalangiana, com dor e limitação dos movimen- Osteoartrose é causa comum de dor, rigidez e ede-
tos, aumento do volume e da consistência óssea da re- ma, resultando em deformidades articulares e declínio
gião dorsal da referida articulação.7 Pode ser de etiologia funcional progressivo, com aumento no risco de quedas.
74 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Artrite reumatoide também pode gerar deformida- Avaliaç ão clí nica


des, alteração da biomecânica da marcha com acentua- Anamnese
ção de sinovite crônica e dor incapacitante.4 Questionar sobre cuidados básicos com os pés; investi-
Artrite psoriásica pode promover aumento da gação de dor; interrogatório dirigido para neuropatias
reabsorção óssea, hipotrofia de partes moles e des- (parestesias, fraqueza, alteração de marcha); interroga-
truição de falanges proximais, com alterações un- tório para doença vascular (edema, hipotermia, lesões
gueais sobrejacentes. 14 ulceradas); avaliação dirigida para marcha e relação en-
Crise gotosa aguda e tofos gotosos crônicos são cau- tre tipo de calçado e presença de sintomas; histórico de
sas comuns de dor, sobretudo em homens, obesos, com quedas e fraturas decorrentes de traumas mínimos.19
hipertensão e diabetes com elevada ingesta alcoólica.15
A constituição de úlceras vasculares, principalmente Exame físico
de origem venosa, explica-se pelas modificações da pele • Inspeção estática: Observar os pés e suas defor-
e estática dos pés. Elas geralmente atingem calcâneos, re- midades, classificando-as e correlacionando-as
giões maleolares e bordos desse segmento. com suas bases fisiopatológicas, para posterior
O diabetes desempenha papel importante nas altera- intervenção e preservação da funcionalidade;
ções tróficas por causar vasculopatias, facilitar infecções avaliação de pele e fâneros (observar lesões ci-
e pelas alterações neurológicas que provoca.16 catriciais ou ulcerosas, fissuras, edema, calosida-
Úlceras de pressão decorrentes de pressão extrínseca des, verrugas, onicomicose, hipertrofia ungueal).
aplicada sobrea pele são importantes causas de dor em • Inspeção dinâmica: Avaliar equilíbrio e marcha,
idosos com síndrome de imobilidade. avaliar discinesia pós-estática (em caso de sín-
Alterações neurológicas, como neuropatias periféri- drome de esporão do calcâneo ou fasciite plan-
cas (em especial a neuropatia diabética), síndrome pi- tar); os pacientes têm que se segurar em objetos
ramidal (espasticidade) e extrapiramidal, compressão para se apoiarem e andar na ponta dos pés para
neural, radiculopatias, podem resultar em pé doloroso.17 suportarem o peso.
O chamado “pé de Charcot”, decorrente de neuropa- • Palpação: Buscar sinais inflamatórios, como
tia, com hipotrofia de interósseos, deformidade articular edema, calor local, sensibilidade em inserção de
configurando “dedo em martelo” resultante de sublu- tendões (como na tendinite do tibial posterior),
xação da interfalangiana distal sobre a proximal, causa manobras de reprodução da dor (como inverter
instabilidade postural com aumento do risco de quedas. o pé contra resistência), palpação de articulações
Os principais aspectos fisiopatológicos e as causas e pontos dolorosos, presença de estalidos.
mais comuns de desordens nos pés do idoso estão es-
quematizados na Tabela 1. Ainda no exame físico, atentar para alguns pontos
específicos:20
• Avaliação vascular: Avaliar o grau de perfusão
Tabela 1  Etiologias da síndrome do pé doloroso nos idosos18
arterial (levar em consideração variações na
Desordens Desordens Desordens
biomecânicas dermatológicas ungueais
Pé diabético anatomia e na extensão do pulso, variando suave-
mente a pressão aplicada e percorrendo com os
Dor no calcâneo Lesões
(calcaneodínia) hiperceratóticas
Infecções fúngicas Neuropatia dedos as regiões subjacentes). A incapacidade
de palpar um pulso pode ser devida a obscure-
Disfunção no
tendão tibial
Infecções
Distrofias ungueais Ulcerações
cimento por edema ou obesidade; em 10% das
bacterianas
posterior pessoas normais, esses pulsos estão ausentes.
Doença vascular
• Exame neurológico: Avaliação do equilíbrio,
Osteoartrite Tinea pedis
periférica propriocepção, força muscular, limiar sensitivo
protetor (utilizando monofilamento de Semmes-
Deformidades
digitais
Xerose/fissura -Weinstein de 5,07). As alterações clínicas mais
comuns observadas nas extremidades inferiores
Marcha patológica Ulcerações
são: diminuição do reflexo no tendão de Aqui-
Adaptada de Fillit et al. les e da sensibilidade vibratória, força e massa
muscular diminuídas, além de atividade motora
Conhecidas as possíveis causas, é inevitável que o pro- comprometida, inclusive redução na coordena-
fissional da saúde saiba como diagnosticá-las e tratá-las. ção motora fina e na agilidade.
Deve-se basear o diagnóstico em avaliação clínica • Biomecânica: Avaliar adequação de calçados;
cuidadosa e minuciosa, além de auxílio de exames com- buscar deformidades (pé plano, pé cavo); colocar
plementares. O tratamento busca a qualidade de vida e a o pé em pronação (as articulações deverão estar
adequação à realidade de cada paciente. destravadas e frouxas); durante a marcha, ele se
Pé doloroso no idoso | 75

Tabela 2 Índice Manchester de incapacidade associada ao pé doloroso no


torna uma alavanca, devendo ser mais rígido de idoso, validado para a língua portuguesa
forma a impelir o corpo para a frente (é o propó- Durante o último mês (últimos 30 dias)
sito do pé supino). isso se aplicou a mim. Assinalar apenas um quadrado
• Avaliação dermatológica: Avaliar presença de Nunca
Sim, em
Sim, na
ou em maioria,
ulcerações, fissuras, deformidades ungueais, pre- Por causa das dores nos meus pés
nenhum
alguns
todos
dias
sença de micoses, sinais inflamatórios (edema, momento os dias

calor, rubor, dor à palpação). Eu evito caminhar fora de casa


Eu evito caminhar longas distâncias

Exames complementares Eu caminho com dificuldade


Eu caminho vagarosamente
• Rotina laboratorial: Inclui hemograma, função
Ao caminhar, eu tenho de parar e
renal e hepática, VHS, eletroforese de proteínas, descansar os pés
dosagem de vitamina B12 e ácido fólico, ácido Eu evito caminhar sobre superfícies
úrico, TSH, VDRL, anti-HIV, perfil lipídico, gli- ásperas ou irregulares, sempre
que possível
cemia de jejum. Em casos selecionados suspeitos
Eu evito ficar de pé por muito tempo
de trombofilia, realizar: dosagem de proteínas C Eu pego ônibus, metrô ou ando de
e S, antitrombina III, fator V de Leiden, mutação carro, com frequência
no gene da protrombina. Eu preciso de ajuda nas tarefas
domésticas, compras
• Avaliação radiológica: Importante para avaliar
Eu ainda faço tudo, mas com mais
fraturas, alterações osteodegenerativas, para pro- dor e desconforto
gramação de intervenções cirúrgicas visando re- Eu fico irritado quando meus
tomar a função articular, procura de lesões líticas pés doem

ou blásticas; osteomielite; corpo estranho. Eu sempre fico preocupado em relação


aos meus pés
• Eletroneuromiografia: Avaliação de neuropa- Preocupo-me em relação aos sapatos
tias em pacientes com clínica sugestiva. que preciso calçar
• Dúplex venoso e arterial de membros inferio- Eu tenho dores constantes nos pés
res: Avaliação de lesões vasculares em membros Meus pés doem mais de manhã

inferiores com repercussões nos pés. Meus pés doem mais de noite

• Biópsia de lesões ulcerosas: Avaliação etiológica Sinto dores e pontadas nos meus pés

(sobretudo diagnóstico de lesões neoplásicas). Sou incapaz de realizar o trabalho


que fazia antes
• Densitometria óssea: Diagnóstico e tratamento Eu não consigo mais realizar todas
específico de osteoporose, uma vez que pacientes as minhas atividades anteriores
portadores de deformidades nos pés são de risco Pontuação do índice: nunca ou em nenhum momento – ponto 0; sim, em alguns
potencial para quedas e fraturas. dias – ponto 1; sim, na maioria, todos os dias – ponto 2. Adaptado de Ferrari et al.21
• Cintilografia óssea: Em casos selecionados de
pacientes com suspeita de lesões metastáticas ou Tabela 3  Tratamento da síndrome do pé doloroso em idosos18,20,22
doenças osteometabólicas. Medidas gerais Medidas específicas
Avaliação fisioterápica: prescrição de
Avaliação de incapacidade associada ao pé do- Mudanças de hábitos órteses em conformidade com o tipo de
lesão para melhor funcionalidade
loroso no idoso
Adequação de calçados (pacientes com Debridamento de calosidades seguindo
Existem poucas escalas para avaliação de dor e in- área dolorosa no metatarso e calosidade princípios cirúrgicos, com o cuidado de
capacidade nos pés, por exemplo, o índice funcional plantar podem requerer modificações no não lesionar tecidos normais, evitando
calçado para melhor funcionalidade) ulcerações e infecções secundárias
dos pés (FFI), o índice funcional dos pés com descri-
Os calçados devem ser fabricados por
tores verbais (FFI5pt) e o questionário de avaliação técnicos familiarizados em inspecionar
Debridamento de tecidos desvitalizados
e antibioticoterapia de amplo espectro
de pé doloroso de Rowan (ROFPAQ). Garrow et al.1 os pés para construção adequada do
em úlceras com infecção secundárias,
calçado, promovendo alívio da dor
desenvolveram um instrumento para avaliação de nas áreas de pressão excessiva, com
sobretudo pé diabético (considerar
cultura de material das lesões)
incapacidade no pé, o índice Manchester de incapa- redistribuição plantar das pressões

cidade associada ao pé doloroso no idoso (MFPDI), Tratamento cirúrgico: considerar


condição médica geral, tipo de anestesia,
recentemente validado na língua portuguesa em uma Palmilhas ortopédicas condições da pele, avaliação dos leitos
população de idosos. O índice compõe-se de 19 itens, vasculares (venoso e arterial), suporte
psicológico do paciente
sendo a pontuação total de 0 a 38, de forma que as
Analgésicos e anti-inflamatórios (estes, Considerar em casos graves de fasciite
maiores pontuações indicam maior grau de incapaci- quando usados, sempre por curto plantar, hálux rígido, pé cavo, pé plano
dade, sendo instrumento útil na avaliação de resposta período, salvo as contraindicações);
infiltrações locais de corticoide
(osteotomia do calcâneo – transferências
tendinosas e artrodese)
à reabilitação gerontológica (Tabela 2).21
Tratamento neurocirúrgico em casos
A abordagem terapêutica da SPD envolve medidas Fisioterapia de síndrome do túnel tarsal,
gerais e específicas, esquematizadas na Tabela 3. neuroma de Morton
76 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

D iscuss ão to a essa faixa etária de pacientes, como o sintoma dor.


Envelhecer é um processo natural que caracteriza uma etapa A população idosa tende a apresentar sobreposição de
da vida do homem e dá-se por mudanças físicas, psicológicas e queixas e patologias, as quais muitas vezes passam desper-
sociais que acometem de forma particular cada indivíduo com cebidas ou não são corretamente valorizadas pelos profis-
sobrevida prolongada. É uma fase em que, ponderando sobre sionais que as amparam. Nesse grupo de moléstias pode-se
a própria existência, o indivíduo idoso conclui que alcançou incluir como etiologia ou até mesmo como resultado a SPD.
muitos objetivos, mas também sofreu muitas perdas, das quais A melhoria constante na qualidade de vida desse crescen-
a saúde destaca-se como um dos aspectos mais afetados.23 te grupo populacional tem sido bastante discutida e almejada
O envelhecimento é uma questão explorada por pesqui- pelas atuações científicas, tanto políticas como acadêmicas,
sadores, epidemiologistas e estatísticos, por meio de investi- que inevitavelmente confronta-se com a capacidade de se
gações científicas encontradas na literatura nacional e inter- locomover e viver sem o desconforto da dor ou fármacos
nacional, que revelam a projeção notória dessa população de para ela. Como evidência disso, a Organização Mundial da
idosos. No panorama mundial, bem como nos países em de- Saúde (OMS) e outros estudiosos do tema25-28 recomendam
senvolvimento, essa população aumenta significativamente, o desenvolvimento de estudos e pesquisas que subsidiem a
e o contraponto dessa realidade aponta que o suporte para tomada de decisão e dirijam as ações e prioridades no nível
essa nova condição não evolui com a mesma velocidade. das políticas públicas relativas à terceira idade.
Diante disso, a preocupação com esse novo perfil vem ge-
rando, nos últimos anos, inúmeras discussões e a realização C oncl u s õ es
de diversos estudos com o objetivo de fornecerem dados que Os problemas dos pés em idosos são frequentes e passíveis
subsidiem ações adequadas para essa parcela da população. de prevenção. Além disso, exigem atenção quanto ao cor-
Outro ponto de importante valorização é que a referi- reto diagnóstico e tratamento, objetivando redução de in-
da população requer cuidados específicos e direcionados capacidade e preservação de autonomia e independência.
às peculiaridades advindas do próprio processo de enve-
lhecimento, sem segregá-los da sociedade.24 Nesse contex- C onflito de interesse
to evidencia-se a necessidade do conhecimento e valoriza- Os autores declaram não possuir nenhum conflito de in-
ção de sintomas tão corriqueiros na rotina de atendimen- teresse na sua realização e publicação.

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Artigo
Benefícios de prebióticos, probióticos de revisão
e simbióticos | 77

Benefícios da utilização
de prebióticos, probióticos e
simbióticos em adultos e idosos

Luciana Santos Pereiraa, Luciano Rodrigues de Oliveirab,


Marina Teixeira Santosc, Talita Barbid, Ana Maria Calile

Res umo
Palavras‑chave Probióticos, prebióticos e simbióticos são chamados de alimentos funcionais (AF). A utilização deles estimula a proliferação de
Suplementos bactérias benéficas, em detrimento da proliferação de bactérias prejudiciais, reforçando os mecanismos naturais de defesa do
dietéticos, trato hospedeiro, mantendo o equilíbrio, podendo estimular diretamente a imunidade, a proteção contra patógenos e evitar a infecção por
gastrointestinal, Clostridium decorrente do uso de antibioticoterapia. É comum que os pacientes evoluam com distúrbios do trato gastrointestinal (TGI)
tempo de capazes de aumentar o tempo de internação, ocasionando outras complicações, como infecções respiratórias e úlceras por pressão. O
internação, objetivo do estudo foi identificar aspectos referentes ao uso de simbióticos, prebióticos e probióticos em adultos e/ou idosos e descrever
constipação as vantagens e desvantagens de sua utilização. Foi realizada uma revisão bibliográfica por enfermeiros de unidade semi-intensiva de
intestinal/ um hospital de grande porte da cidade de São Paulo entre os anos de 2011 e 2012. Utilizou-se como eixo norteador o questionamento:
é possível beneficiar os pacientes internados com o uso de prebióticos, probióticos e simbióticos, prevenindo assim as complicações do trato
prevenção e
gastrointestinal? Concluiu-se que diversas complicações dos pacientes internados decorrentes de alterações do TGI, como inapetência,
controle, alimentos
distúrbios hidroeletrolíticos, desidratação, suscetibilidade para a formação de úlceras por pressão, dermatites etc. podem ser evitadas
funcionais, custos
com o uso contínuo desses produtos. Essa intervenção reduziria o tempo de internação, o custo hospitalar e o tempo despendido pela
hospitalares, idoso.
equipe de enfermagem em situações preveníveis. Não ficaram claras as desvantagens quanto ao uso desses produtos.

Benefits of using prebiotics, probiotics and


synbiotics in elderly adults

Abstract
Keywords The use of probiotcs, prebiotcs and synbiotics are called functional foods. The use of them stimulate the proliferation of
Dietary beneficial bacteria, rather than the proliferation of harmful bacteria, the strengthen of the natural defense mechanisms of the
supplements; host maintaining the balance, they can directly stimulate immunity, protection against pathogens and prevention of infection
gastrointestinal by Clostridium resulted of the using of antibiotics. It is common for patients to proceed with gastrointestinal tract disorders are
able to increase the lenght of hospital stay causing other complications, such as respiratory infections and pressure ulcers. The
tract, length of aim of study was to identify aspects concerning the use of synbiotics, prebiotcs and probiotcs in adults and/or elderly people
stay, constipation/ and to describe the advantages and disadvantages of their use. A literature review was performed by nurses of a semi-intensive
control and of a large hospital in the city of São Paulo between the years 2011 and 2012. The following question was used as a guideline:
prevention, Is it possible to benefit hospitalized patients with the use of prebiotics, probiotics and synbiotics, thus preventing the
functional food, complications of the gastrointestinal tract? It was concluded that many complications of inpatients were resulted from
hospital costs, changes in the GI tract, such as anorexia, eletrolyte imbalance, dehydration, susceptibility to the formation of pressure ulcers,
elderly. dermatitis, and so on. Continued use of these products could prevent these situations, thereby reducing the length of stay,
hospital costs and time spent by nursing staff in preventable situations. It is not clear the disadvantages of using these products.

a
Enfermeira da unidade semi-intensiva do Hospital Sírio-Libanês. Tutora da residência de enfermagem em clínica médica e cirúrgica do Hospital Sírio-Libanês.
Especialista em gerenciamento dos serviços de enfermagem. Especialista em enfermagem geriátrica e gerontológica. Especialista em insuficiência respiratória.
b
Enfermeiro da unidade semi-intensiva do Hospital Sírio-Libanês. Especialista em enfermagem geriátrica e gerontológica. Especialista em
gerenciamento de serviços de enfermagem.
c
Enfermeira da unidade semi-intensiva do Hospital Sírio-Libanês. Especialista em cardiologia.
d
Enfermeira da unidade semi-intensiva do Hospital Sírio-Libanês. Especialista em pneumologia.
e
Enfermeira. Professora orientadora. Mestre, doutor e pós-doutorado pela Universidade de São Paulo (USP). Especialista em UTI pelo HCFMUSP.

Dados para correspondência:


Luciano Rodrigues de Oliveira – Rua Adma Jafet, 91, Bela Vista. São Paulo-SP. CEP: 01308-050.
E-mail: luciano.oliveira@hsl.org.br
78 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

I ntroduç ão Tabela 1 Vantagens do uso de alimentos funcionais


A microbiota intestinal é composta por grupos bac- Melhora da função gastrointestinal: aumento da taxa de
terianos que desempenham influência significativa evacuações para constipados, melhora do funcionamento do
sobre a saúde do hospedeiro, sendo necessário man- trato gastrointestinal.
tê-la equilibrada.1
O uso de probióticos, prebióticos e simbióticos é cada Melhora dos sintomas indesejáveis do trato gastrointestinal:
vez mais estudado, e seus benefícios à saúde humana melhora da qualidade das fezes, percepção de esforço reduzido para
vêm sendo divulgados. evacuar, melhora da dor e distensão abdominais, diminuição dos
A utilização de probióticos estimula a proliferação sintomas, melhora da saciedade, menos recidiva da diarreia por
de bactérias benéficas, em detrimento da proliferação C. difficile e por antibióticos.
de bactérias prejudiciais, reforçando os mecanismos
naturais de defesa do hospedeiro, mantendo o equilí- Microbiota intestinal saudável e equilibrada: alteração da
homeostase da microbiota intestinal, aumento da quantidade de
brio,2 além de atuar na prevenção de diarreia aguda, no
bactérias benéficas, microbiota saudável e equilibrada, e diminuição
tratamento de H. pylori, constipação, doença intestinal
do crescimento de patógenos, restauração intestinal, diminuição
inflamatória, alívio de alguns sintomas da síndrome do
da lesão intestinal.
intestino irritável, má absorção de lactose e na preven-
ção de infecções sistêmicas.3 São benéficos, ainda, para Redução das taxas de infecção intestinal/melhora da resposta
pacientes oncológicos e idosos.2,4 imune intestinal: redução de taxas e infecção, melhora da resposta
É comum que os pacientes evoluam com distúrbios do imune intestinal, aumento significativo de células de defesa, fagócitos
TGI capazes de aumentar o tempo de internação, ocasio- e produção de interleucinas, diminuição de agentes pró-inflamatórios.
nando outras complicações, como infecções respiratórias
e úlceras por pressão. As organizações de saúde têm bus- Prevenção de doenças do trato gastrointestinal: prevenção de
cado estratégias que conciliem a redução dos custos, a me- C. difficile, redução de efeitos carcinogênicos.
lhoria da qualidade dos serviços e a satisfação dos clientes.
Redução de custos hospitalares relacionados a complicações
O bjetivos do trato gastrointestinal: redução de custos (relacionados a
Identificar aspectos referentes ao uso de simbióticos, complicações intestinais).

prebióticos e probióticos em adultos e/ou idosos e des-


Benefícios não relacionados diretamente ao trato
crever as vantagens e desvantagens de sua utilização.
gastrointestinal: aumento da osteocalcina, aumento de proteínas
totais, diminuição de proteína C reativa e colesterol, melhora da
Métodos intolerância à lactose em paciente com intolerância.
Estudo de revisão bibliográfica realizado por enfermeiros
de unidade semi-intensiva de um hospital de grande porte
da cidade de São Paulo, entre os anos de 2011 e 2012. Tabela 2 Visão geral da população com o uso de pré, pró e
Utilizou-se como eixo norteador o questionamento: simbióticos (de acordo com estudos lidos): benefícios comprovados,
é possível beneficiar os pacientes internados com o uso de benefícios indefinidos e sem benefícios. São Paulo, 2011/2012
prebióticos, probióticos e simbióticos, prevenindo assim as Benefícios Benefícios Não houve
complicações do trato gastrointestinal? comprovados indefinidos benefícios
Foram incluídos artigos publicados em português, in- Idosos em uso de
Adultos em uso de
glês e espanhol, disponíveis no período de 2001 a 2011, Mulheres e idosos com
antibioticoterapia
amoxil (relacionado
tendo como descritores: prebiótico, probiótico e simbiótico. (relacionado ao
constipação intestinal com o desenvolvimento
desenvolvimento de
de diarreia)
diarreia)
Resultados Mulheres na
As vantagens do uso de AF foram listadas e agrupadas menopausa Adultos com colite Adultos com colite
(relacionado à causada por C. difficile ulcerativa
por semelhança de informações (Tabela 1). absorção de cálcio)
Cabe ressaltar que as desvantagens não ficaram cla- Adultos em uso de
ras, e apenas dois artigos mencionaram a rápida elimina- antibioticoterapia
Mulheres com vaginose Adultos com síndrome
ção do probiótico no organismo, enfatizando que, para (relacionado ao
bacteriana do intestino irritável
desenvolvimento de
se atingirem os benefícios, o uso deveria ser contínuo. diarreia)
Na Tabela 2 listou-se a população que fez uso de AF de Pacientes com
acordo com os benefícios comprovados, os incertos e aqueles imunidade Pacientes queimados
comprometida
que não obtiveram benefícios conforme estudos analisados.
Pacientes sob
Na Tabela 3 estão indicados os principais distúrbios gas- ventilação mecânica
trointestinais encontrados em pacientes hospitalizados e os e em uso de sonda
respectivos cuidados realizados pela equipe de enfermagem. nasoenteral
Benefícios de prebióticos, probióticos e simbióticos | 79

Tabela 3 Principais alterações do trato gastrointestinal e cuidados de enfermagem. São Paulo, 2011/2012
Principais alterações do TGI Cuidados de enfermagem

- Sinalizar e discutir com equipe médica e de nutrição necessidade de alimentos ou medicamentos laxativos
- Discutir a necessidade de uso de enema ou supositório
- Monitorar frequência, quantidade e aspecto das evacuações
- Estimular a ingestão hídrica (se não houver contraindicações)
- Rever com equipe médica se há na prescrição algum medicamento que possa ocasionar constipação e discutir
modificação do item, se possível
Constipação
- Verificar com o paciente se ele faz uso de laxativos em casa e se os mesmos estão prescritos
- Atentar para sangramentos durante evacuações
- Proporcionar privacidade no momento da evacuação
- Realizar exame físico abdominal e atentar para distensão
- Observar e registrar aceitação alimentar, presença de náuseas e/ou vômitos

- Monitorar frequência, quantidade e aspecto das evacuações


- Inspecionar a integridade cutânea na região inguinal e perianal
Incontinência intestinal - Higienizar a genitália, realizar troca de fraldas a cada evacuação (o mais breve possível)
- Utilizar cremes que evitem o surgimento de lesão de pele por contato com as fezes

- Sinalizar e discutir com equipe médica e de nutrição necessidade de alimentos ou medicamentos obstipantes
- Monitorar frequência, quantidade e aspecto das evacuações
- Inspecionar a integridade cutânea em região inguinal e perianal
- Realizar exame físico abdominal
- Higienizar a genitália a cada evacuação (o mais breve possível)
- Utilizar cremes que evitem o surgimento de lesão de pele por contato com as fezes ou tratar lesões já instaladas
- Estimular ingestão de líquidos (se não houver contraindicações)
Diarreia - Discutir com equipe médica necessidade de reposição volêmica por soluções intravenosas quando indicado
- Realizar peso diário nos casos de diarreia prolongada
- Verificar exames laboratoriais e atentar para a presença de distúrbios hidroeletrolíticos
- Atentar para sinais de desidratação (turgor de pele diminuído, pele e mucosas ressecadas, taquicardia e alteração do
nível de consciência)
- Buscar ativamente as possíveis causas da diarreia e tratamento do fator causal
- Sugerir coleta de Clostridium difficile (quando se aplicar)

Discuss ão de cólon por Clostridium difficile também é uma compli-


Os probióticos, prebióticos e simbióticos têm sido de- cação frequente da terapia antibiótica, especialmente em
finidos como microrganismos vivos que, ao serem ad- pacientes idosos.8
ministrados em doses adequadas, oferecem benefícios à Em estudo randomizado duplo-cego com 135 pacien-
saúde do homem.5 As vantagens do seu uso estão relacio- tes de diversos hospitais que estavam em antibioticoterapia,
nadas diretamente ou não ao TGI. o grupo teste recebeu 100 g/dia dos probióticos L. casei, S.
Em revisão sistemática publicada por Cochrane Li- thermophiles e L. bulgaricus no início do tratamento com
brary em 2008, a respeito do tratamento de colite causa- antibiótico e, após uma semana do seu término, houve re-
da por Clostridium difficile em adultos, foram reunidos dução da incidência de diarreia associada a antibiótico e
quatro estudos duplo-cegos. Os estudos utilizaram pro- diarreia associada a C. difficile, com o uso de probióticos.7
bióticos como adjuvantes no tratamento em associação Dos pacientes que utilizaram probióticos, 12% apre-
à antibioticoterapia-padrão – vancomicina e metroni- sentaram diarreia contra 34% do grupo placebo. Ne-
dazol. Três estudos mostravam evidências de benefícios, nhum paciente do grupo controle evoluiu com diarreia
porém devido a problemas de metodologia apenas em causada por C. difficile positivo; já no grupo placebo, 9
um se observou diferença significativa com o uso de S. pessoas (17%) a desenvolveram.
boulardii.6 Neste, participaram 124 pessoas, e o grupo Outra patologia que envolve o TGI é a síndrome do
que utilizou probiótico com antibiótico teve maior índi- intestino irritável. É uma desordem comum e de etiolo-
ce de cessação de diarreia e menos recidiva da mesma do gia desconhecida que impacta na qualidade de vida. Os
que o grupo que utilizou placebo com antibiótico.6 sintomas são diarreia, dor abdominal, flatulência, cons-
A antibioticoterapia diminui a microbiota que protege tipação, distensão abdominal e alteração na saciedade.9
o intestino, favorecendo assim o crescimento de C. diffici- Em estudo piloto duplo-cego com 24 pacientes que
le, que é uma bactéria intestinal comensal, e um dos gran- apresentavam diarreia causada por síndrome do intesti-
des causadores da diarreia grave.6 Ocorre em 5% a 25%. no irritável e que não estavam em uso de antibioticote-
É muito comum ocorrer em idosos e, normalmente, se rapia, os pacientes preencheram escalas de qualidade de
desenvolve 2 a 3 semanas após o término do antibiótico.7 vida e de sintomas, receberam placebo ou probiótico por
A colite pseudomembranosa decorrente da infecção 8 semanas e foram analisadas amostras de fezes.9
80 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Não houve diferença entre os grupos quanto aos Foram encontrados estudos que relatam a redução
sintomas, apenas na saciedade, que foi menor no grupo na intolerância à lactose e, consequentemente, de alguns
controle. Não houve mudança na microbiota das fezes, sintomas, principalmente da diarreia.1
fazendo com que o autor sugira que os efeitos benéficos Atualmente sabe-se que algumas complicações do
dos probióticos pode não estar relacionado diretamente TGI podem ser ocasionadas por neoplasias de cólon e
com a microbiota. reto. Essas neoplasias são a terceira causa mais comum
Pesquisa realizada no Chile demonstra que há efei- de câncer no mundo e, segundo o Instituto Nacional de
tos benéficos para a microbiota intestinal, desde que haja Câncer (Inca), afetam igualmente homens e mulheres.17
consumo regular de La1, resultando em aumento de po- O consumo de produtos laticínios fermentados é ca-
pulações bacterianas benéficas: lactobacilos e bifidobac- paz de inibir determinadas bactérias responsáveis pela
térias, e redução de populações maléficas.10 conversão de substâncias pré-carcinogênicas em carci-
Também são descritos estudos que avaliam a resposta nogênicas. Porém, ainda são necessários mais estudos de
imunológica, sendo que em adultos essas pesquisas são caráter intervencional em seres humanos para a poten-
direcionadas a doenças inflamatórias do intestino, como cialização da prevenção do câncer de cólon e reto.17
doença de Crohn e colite ulcerativa.11 Em pesquisa realizada com 17 pacientes com câncer
Sobre idosos, é sabido que ocorre declínio da função de cólon em tratamento quimioterápico, foi constatado
imunológica e pode ocasionar hiporresponsividade a que a diarreia foi o segundo efeito colateral mais fre-
vacinas e predisposição a doenças infecciosas e não in- quente, ocorrendo em 70,5% com o pico no sétimo dia
fecciosas.12 O envelhecimento está associado a mudanças de tratamento. Daí a importância de pesquisas que pos-
orgânicas e teciduais, e, além disso, a microbiota intes- sam indicar a melhora ou não desse sintoma com o uso
tinal difere da dos adultos, pois há no intestino maior de alimentos funcionais.18
quantidade de bactérias prejudiciais, como Clostridium De acordo com estudo realizado no Brasil, com 24
perfringens e enterobactérias do que as benéficas, como pacientes com neoplasia maligna hematológica em qui-
as bifidobactérias.12 mioterapia, não houve diferença estatisticamente signifi-
Em 2011, foi publicado um estudo com 58 idosos que cante quanto à presença de diarreia, porém o grupo que
evidenciou haver aumento em frequência de evacuações recebeu suplementação teve aumento considerável de
semanais com o uso de prebiótico. Encontrou ainda que bifidobactéria em relação ao grupo placebo, assim como
o consumo em doses baixas desse alimento aumenta os os níveis de PCR diminuídos, indicando menor nível de
níveis séricos de proteínas totais, diminui a proteína C processos inflamatórios.19
reativa e o colesterol, indicando benefícios nutricionais.13 Quando se trata do impacto na prática assistencial,
A incidência de alterações gastrointestinais em idosos enfatizamos que existem escalas aplicadas pela enfer-
hospitalizados pode ser alta. Em um estudo que avalia os magem que demonstram influência negativa da diarreia
diagnósticos de enfermagem em idosos, foi verificado quanto ao risco de lesões de pele e do tempo de atendi-
que, de 61 pacientes, 22,38% apresentaram constipação, mento prestado aos pacientes. Dentre elas, a mais utili-
e 17,91%, diarreia.14 zada no Brasil é a escala de Braden, que objetiva medir o
Os AF podem ser utilizados em instituições de risco de desenvolver úlcera por pressão (UPP), levando
longa permanência de idosos onde os pontos ressal- em consideração uma pontuação para pele exposta com
tados são o valor calórico, a boa aceitação, a melho- maior frequência à umidade, portanto pacientes com
ra no sistema imunológico, a redução de dias com menor mobilidade física e com evacuações líquidas pre-
febre, a redução de dias com diarreia, o aumento sentes possuem risco aumentado de desenvolver UPP,
de absorção de cálcio, a redução de problemas com necessitando de maiores cuidados.20
constipação, entre outros. 4 A outra é a escala Nursing Activities Score (NAS),
Em uma unidade de internação de clínica médico- que é aplicada a pacientes de alta dependência em uni-
-cirúrgica foram avaliadas, quanto ao diagnóstico de en- dades de terapia intensiva (UTI), e visa medir o tempo
fermagem, 60 mulheres com patologias diversas, sendo de assistência da equipe de enfermagem. Diversos itens
identificada taxa de 41,6% de constipação, com a idade são avaliados, mas aqui cabe ressaltar que a quantidade
média dessas mulheres de 49 anos.15 de episódios de diarreia aumenta esse escore devido à
Em estudo realizado com 378 mulheres com idades necessidade de higienização e mobilização, levando em
entre 18 e 55 anos, apresentando ou não quadro de cons- consideração que esse procedimento geralmente deve
tipação intestinal funcional, foram ofertadas 2 unidades/ ser executado por mais de um colaborador.21
dia de Activia ou uma sobremesa láctea sem probióticos Em trabalho realizado na Universidade de São Paulo apli-
(grupo controle) por período de 14 dias e, após, os gru- cou-se a escala em uma unidade de internação clínica médi-
pos foram intercruzados por mais 14 dias, concluindo-se ca, que concluiu que o paciente com alta dependência neces-
que a ingestão de simbióticos pode ser uma ferramenta sita, em média, de 12,3 h de assistência nas 24 h diárias; 75,8%
útil no gerenciamento de pacientes constipados.16 do item higiene foi direcionado a mais de 2 h de cuidados.21
Benefícios de prebióticos, probióticos e simbióticos | 81

Em resumo, os artigos reunidos demonstram que o correm de alterações do TGI, como inapetência, distúr-
uso de pré, pró e simbióticos não apresenta efeitos in- bios hidroeletrolíticos, desidratação, suscetibilidade para
desejáveis, é de baixo custo e possui boa aceitação, po- a formação de úlceras por pressão, assaduras etc. Com a
dendo ser uma alternativa conveniente no uso rotineiro administração desses produtos pode haver redução no
hospitalar devido às vantagens descritas anteriormente. tempo de internação, diminuição de custo hospitalar e
menor tempo despendido pela equipe de enfermagem
C onclus ão para executar outras atividades assistenciais.
Os AF são úteis na melhora da função e sintomas do O intuito desses levantamentos é a busca de conhe-
TGl, equilíbrio da microbiota intestinal, resposta imu- cimento científico que nos permita identificar, preve-
ne intestinal, prevenção de doenças do TGI, aumento nir e atuar juntamente com uma equipe multidiscipli-
da absorção/retenção do cálcio e magnésio, aumento da nar em quaisquer alterações do TGI, assim como nas
osteocalcina, aumento das proteínas totais e diminuição suas complicações.
da proteína C reativa, colesterol e intolerância à lactose.
Não ficaram claras as desvantagens quanto ao uso C onflito de interesse
desses produtos. Os autores declaram não possuir nenhum conflito de in-
Diversas complicações dos pacientes internados de- teresse na sua realização e publicação.

R eferências
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Artigo de revisão
82 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Ambiente físico e acessibilidade


espacial: contribuições para o
cuidado de enfermagem na
prevenção de quedas em idosos

Edmar Geraldo Ribeiroa, Sônia Maria Soaresb,


Raquel Souza Azevedoc, Márcia Maria Soaresd

R es umo
Palavras‑chave O aumento da população idosa determina importantes desafios para a manutenção da qualidade de vida e do esta-
Acessibilidade do de saúde. Um desses desafios abrange a dimensão do ambiente físico e a acessibilidade espacial aos idosos nos
espacial, idoso, cuidados de enfermagem. O objetivo deste trabalho é discutir, por meio de uma revisão narrativa da literatura, as
enfermagem implicações do ambiente físico e da concepção de acessibilidade espacial para a prevenção de quedas em idosos e
geriátrica, o papel da enfermagem. Foi realizada busca nas bases de dados Lilacs, Bireme e Medline. Foram identificadas 159
ambiente físico, publicações, selecionando-se ao final 18 publicações que atenderam aos critérios de inclusão. As quedas em idosos,
cuidados de muitas vezes, estão relacionadas com o ambiente físico e a acessibilidade espacial. O enfermeiro deve atentar para
enfermagem. esse aspecto, levando em conta a noção de acessibilidade espacial em suas visitas domiciliares, tornando-se um
agente capaz de intervir no ambiente para a prevenção de quedas em idosos.

Physical environment and spatial accessibility: contributions to


nursing care in the prevention of falls in elderly

A BS T RACT
Keywords The increasing elderly population provides significant challenges to maintaining quality of life and health status.
Spatial One of these challenges includes the dimension of the physical space and accessibility for the elderly in nursing care.
accessibility, The aim of this paper is to discuss through a narrative review of the literature, the implications of the physical envi-
elderly, geriatric ronment and the design of spatial accessibility for the prevention of falls in older adults. A search was performed in
nursing, physical the databases: Lilacs, Medline and Bireme. We identified 159 publications, selecting in the end 18 publications that
environment, met the inclusion criteria. Falls in the elderly are often related to the physical environment and spatial accessibility.
nursing care. Nurses should pay attention to this aspect, taking into account the notion of spatial accessibility in their home visits,
becoming an agent capable of intervening in the environment to prevent falls in the elderly.

a
Enfermeiro. Especialista em saúde da família. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
b
Enfermeira. Doutora em enfermagem. Professora associada, Escola de Enfermagem, UFMG.
c
Enfermeira. Mestre em enfermagem e especialista em gerontologia. Hospital das Clínicas da UFMG, Programa Mais Vida.
d
Arquiteta. Mestre em engenharia de produção e especialista em ergonomia, UFMG.

Dados para correspondência:


Edmar Geraldo Ribeiro. Escola de Enfermagem Universidade Federal de Minas Gerais. Av. Prof. Alfredo Balena, 190, Santa Efigênia.
Belo Horizonte – MG. CEP: 30130-100.
E-mail:edigribeiro@bol.com.br
Ambiente físico e acessibilidade espacial | 83

Introdução relacionadas ao ambiente inadequado. Há um conceito de ge-


Nas últimas cinco décadas, percebeu-se uma constante mu- rontologia ambiental para que essa comparação seja superada,
dança demográfica na população mundial, com destaque e os ambientes projetados especificamente para os idosos.10,11
para o crescimento da população idosa. A proporção de ido- A essência do cuidado com o ambiente para a preven-
sos aumentou de 8,8% para 11,1% entre 1998 e 2008. O gru- ção das quedas é o marco inicial na promoção da saúde
po etário de 80 anos ou mais superou os demais, alcançando do idoso, e nesse contexto o conceito de acessibilidade
cerca de 3 milhões de pessoas (quase 70%). Em 2020, o Brasil espacial deve ser incorporado na prática de trabalho do
será o sexto país do mundo em número de idosos, com um enfermeiro e demais profissionais de saúde, por um tra-
contingente superior a 30 milhões de pessoas.1-3 balho interdisciplinar.
A promoção da saúde e bem-estar social constitui a Há um amplo problema na temática de saúde do idoso
base do envelhecimento saudável e é fortemente influen- quando se discute a prevenção de quedas relacionada à aces-
ciada por fatores ambientais, econômicos e sociocultu- sibilidade espacial e ao cuidado em enfermagem. Percebe-se
rais,4-5 os quais se alteram com o envelhecimento. que há uma lacuna nas publicações científicas frente a esse
No atendimento a pessoas idosas, encontramos vários problema de pesquisa e que cada vez mais se tornam fre-
agravos à saúde, como quedas, luxações, problemas respi- quentes em idosos as quedas, que poderiam ser evitadas a
ratórios, auditivos, entre outros, relacionados ao ambiente partir do cuidado em enfermagem, na acessibilidade espacial
físico. Esse ambiente é composto por móveis em ambientes dessa população. Diante do exposto, destacamos como ques-
pequenos; iluminação inadequada; temperatura, níveis de tão central do estudo a importância do ambiente físico e do
umidade e som excessivos; escadas de difícil acesso; pisos es- conceito de acessibilidade espacial para o cuidado de enfer-
corregadios; armários e interruptores de difícil acesso; ausên- magem com o objetivo de prevenção de quedas em idosos.
cia de barras de apoio, principalmente em locais públicos.6
O conceito de acessibilidade espacial emergiu a par- M etodologia
tir de estudos que se preocupam com as condições am- Trata-se de um estudo descritivo, de revisão narrativa
bientais para a realização de tarefas cotidianas, a fim de de trabalhos científicos que estudaram a relação entre os
desenvolverem projetos arquitetônicos adequados ao cuidados de enfermagem na atenção primária à saúde,
acesso integral de diferentes indivíduos.7 na prevenção de quedas em idosos e sua associação com
A Norma Brasileira Regulamentada (NBR) 9050, de o ambiente físico e acessibilidade espacial.
2004, refere-se à acessibilidade espacial como a possibilida- O objeto deste estudo foi a análise de artigos de pes-
de e condição de alcance, percepção e entendimento para a quisa sobre acessibilidade espacial para o idoso, publi-
utilização com segurança e autonomia de edificações, espa- cados e indexados nas bases de dados virtuais conside-
ço, mobiliário, equipamento urbano e elementos.8 Porém, radas pelos centros internacionais da Literatura Latino-
o conceito é muito mais amplo, a acessibilidade espacial é -Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs),
a possibilidade de compreensão da função, da organização Biblioteca Regional de Medicina (Bireme), por meio da
e das relações espaciais que o ambiente estabelece, e a par- Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), e Medical Literatu-
ticipação das atividades que ali ocorrem, fazendo uso dos reAnalysis and Retrieval System Online (Medline).
equipamentos disponíveis com segurança e autonomia.8 Como critérios de inclusão foram aceitos estudos nas lite-
Nas visitas domiciliares realizadas no cotidiano de raturas científicas publicados nos últimos 10 anos, em idiomas
trabalho da Equipe de Saúde da Família (ESF), é muito português e inglês, que se encontravam como textos completos
importante estar atento à organização do ambiente físico disponíveis on-line e que abordavam o tema estudado.
com a finalidade de diminuir os riscos de quedas e ou- Para esse estudo, a busca das publicações foi realizada por
tros ferimentos, passíveis de mudança pela acessibilida- meio dos seguintes descritores: acessibilidade espacial, idoso,
de espacial adequada; entretanto, muitos profissionais de geriatric nursing, physical environment, nursing care. A busca
saúde não dão a devida atenção a esse aspecto.9 foi feita por meio das palavras encontradas nos títulos e resu-
Dessa forma, segundo as considerações de vários rela- mos dos artigos. Foram encontrados 159 artigos nas bases de
tos na literatura,2,6,8 o ambiente físico relacionado aos ob- dados, dos quais apenas 18 foram incluídos após leitura de tí-
jetos e às pessoas pode representar fator de risco para o ser tulo e resumo, sendo 9 em português e 9 em inglês. A seleção
humano que ali vive. Para o idoso, a questão da acessibili- dos artigos foi feita em conformidade com o tema proposto,
dade espacial é algo vital e, corroborando isso, destaca-se sendo descartados os estudos que não abordavam o objeto de
o ambiente seguro, principalmente dentro do domicílio estudo. A busca foi conduzida, no período de agosto a outu-
ou das instituições de longa permanência, caso seja insti- bro de 2012, pelos pesquisadores (Tabela 1).
tucionalizado, e no seu convívio social, possibilitando ao
idoso viver com independência, autonomia e dignidade. R esu ltados
O desconhecimento da especificidade de atenção requeri- Os resultados são apresentados sintetizados e em forma de
da pelo idoso nas ações de cuidado revela aumento cada vez quadro, segundo bibliografia principal/ano, objetivo do estu-
maior da incidência de quedas e perda da qualidade de vida do, resultados e conclusão (Tabela 2).
84 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Tabela 1  Estratégia de busca e número de artigos identificados. Belo Horizonte, 2012


Descritor utilizado Banco de dados Número de artigos encontrados Número de artigos selecionados
Acessibilidade espacial e idoso Lilacs 6 2
Acessibilidade espacial e idoso Bireme 73 7
Geriatric nursing and physical environment
Medline 80 9
and nursing care and primary care
Total 159 18

Tabela 2  Características dos artigos selecionados na busca. Belo Horizonte, 2012


Bibliografia principal/
Objetivo do estudo Resultados Conclusão
ano
Investigar a história da queda relatada por
66% de quedas em idosas no próprio domicílio. Sérias consequências físicas, psicológicas e sociais.
idosos, identificando fatores possivelmente
Fabrício SCC/2004 As causas foram principalmente relacionadas ao Prevenção proporcionará melhor qualidade de vida,
relacionados, assim como local de ocorrência,
ambiente físico (54%) autonomia e independência
causas e consequências

Estabelecer programas de prevenção de quedas


Analisar a morbimortalidade por causas externas nos
Quedas ocupam o terceiro lugar na mortalidade: voltados para a população idosa.
Gawryszewski VP/2004 indivíduos com 60 anos ou mais no Brasil, com vistas
14,0/100.000 e 48.940 internações: (56,1% do total) Tais propostas devem integrar as práticas da saúde
a subsidiar políticas de prevenção
coletiva e individual

Identificar os fatores relacionados ao diagnóstico Necessidade de medidas educativas, individuais


Todos os idosos apresentavam o diagnóstico "risco
Marin MJS/2004 de enfermagem "risco de quedas" entre 51 idosos e coletivas com a finalidade de manter o nível de
de quedas"
residentes em uma microárea saúde da população idosa

Apresentar reflexões sobre possíveis bases teóricas


Conceito de gerontologia ambiental. Foco nas Incentivo a estudos em gerontologia ambiental.
Tamassini SLV/2005 capazes de suportar intervenções para melhor ade-
necessidades do idoso e design social Ampliar a promoção e prevenção a agravos a idosos
quar o ambiente físico às necessidades de idosos

Identificar e classificar as necessidades de educação O cuidar no domicílio é uma tarefa permeada de


em saúde apresentadas pelos cuidadores de idosos, Necessidades educativas em doenças e seus agravos, desafios para o cuidador. A educação em saúde
Martins JJ/2007
baseadas na Classificação Internacional das Práticas terapia medicamentosa, dietas e exercícios físicos auxilia na superação desses desafios em relação aos
de Enfermagem em Saúde Coletiva cuidados básicos com o paciente e o ambiente

Identificar a presença de fatores intrínsecos


O fator de relato de dificuldade motora em O ambiente físico como um fator extrínseco acarreta
que predispõem a quedas em idosos moradores
Menezes RL/2008 membros inferiores foi o maior (90%), seguido o aumento das quedas devido às alterações intrínse-
em instituições de longa permanência na
de outros fatores cas já existentes
cidade de Goiânia (GO)

O ambiente físico como um importante fator no


Identificar os atributos físicos, sociais e espirituais do O ambiente físico influi no tratamento
Naderi JR/2008 tratamento. Houve corresponsabilização pela
pátio existente em um hospital de pessoas debilitadas
construção de ambientes adequados

Estimular a discussão para a necessidade de políticas


Priorizar a manutenção da capacidade funcional dos
públicas efetivas de manutenção da capacidade Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domi-
idosos, com monitoramento das condições de saúde,
Veras R/2009 funcional dos idosos, de novas estratégias de cílios indicam melhoria das condições de saúde dos
com ações preventivas e diferenciadas de saúde e
prevenção e atenção integral, e de foco inovador no idosos e distribuição de doença crônica
de educação
cuidado do idoso

Identificar os fatores sociodemográficos, clinicofun- As quedas interferem de forma negativa na vida do


Quanto maior o número de quedas, maior será a
Ricci NA/2010 cionais e psicocognitivos associados ao histórico de idoso. Com o reconhecimento desses fatores é possí-
fragilidade do idoso
quedas de idosos saudáveis vel que os profissionais possam prevenir as quedas

O som, a localização, a luz, a proximidade dos outros


Examinar as influências do ambiente 80% de quedas ocorreram no próprio quarto do e o ambiente físico estão associados com o vagar
Algase DL/2010
físico no comportamento errante residente, seguido de banheiros, corredores e sala e podem servir para informar projetos e práticas de
cuidados

Identificar aspectos do ambiente que podem otimizar O ambiente é considerado como as demandas do
Adultos mais velhos possuem relação
Mitty E/2010 e preservar a função de adultos mais velhos, em uma adulto mais velho. O ambiente pode preservar a
temporal com o seu ambiente
comunidade assistida função ou colocá-la em perigo

O gerenciamento de enfermagem inclui a Os problemas de espaços físicos e acessíveis


Tornar visíveis as dimensões materiais de
Hujala A/2011 organização do ambiente (funcionalidade/ possuem consideráveis efeitos na linha de cuidados
gerenciamento em enfermagem
organização/ estética) de pacientes

Descrever e discutir o cuidado do enfermeiro ao ido- Evidenciou-se o cuidado com base nos valores huma-
Emergiram quatro categorias: os modos de
so na Estratégia Saúde da Família (ESF), bem como nos. O enfermeiro da ESF deve incorporar o cuidado
Rocha FCV/2011 cuidado, as estratégias, as diversidades e
analisar os aspectos que facilitam ou dificultam domiciliar ao idoso, destacando-se na prevenção de
possibilidades de cuidar
esse cuidado quedas e agravos atenuantes a sua saúde

Discutir o impacto de um ambiente empobrecido Ambiente empobrecido leva ao sedentarismo e Os baixos níveis de atividades físicas e sociais levam
Volkers KM/2011
sobre a cognição de idosos institucionalizados declínio cognitivo a um impacto negativo nas funções cognitivas

Incidir sobre as diferenças em termos de satisfação


A modificação de ambientes físicos hospitalares, de
dos enfermeiros com a qualidade do atendimento
O ambiente inadequado interfere no trabalho dos casas de longa permanência e até mesmo do domi-
Barba BE/2012 das pessoas idosas e com características organizacio-
profissionais e na saúde dos idosos cílio do idoso promove autonomia e independência
nais e ambiente de trabalho em cuidados agudos e
dos pacientes em tratamentos agudos ou crônicos
configurações de cuidados de longa duração

Explorar as percepções dos membros da família e


Os membros familiares e funcionários destacaram
funcionários sobre a contribuição potencial de fato-
as instalações, o pessoal e seus fatores como Precisa-se de maior compreensão social, familiar e
Garcia LJ/012 res ambientais que influenciam nos comportamentos
importantes fatores para a construção de ambientes política na criação de ambientes seguros para idosos
disruptivos e de qualidade de vida dos residentes
ideais para idosos
idosos de uma instituição

Compreender a profundidade dos instrumentos Instrumentos de avaliação dos ambientes são Incluir maior foco na avaliação de instrumentos
Gray JÁ/2012 relacionados com o ambiente físico para determinar focados nas pessoas deficientes, não considerando relacionados ao ambiente para os idosos, sendo uma
a sua aplicabilidade para pessoas com deficiência sua idade cronológica avaliação mais específica para essa população idosa

Explorar os pontos de vista de uma casa de cuidado Relatos de funcionários frente às dificuldades Os funcionários devem ser incluídos nas decisões
Rigby J/2012 australiano e inglês e pessoal internado no ambiente de trabalhar em um ambiente inadequado sobre reforma e construção de ambientes adequados
físico e ambiente de trabalho na casa de cuidados nas casas de cuidados
Ambiente físico e acessibilidade espacial | 85

Discuss ão 12,5/100.000 para as mulheres). Diferentemente do ob-


Quedas em idosos: um problema de saúde servado no Brasil, nos Estados Unidos, no mesmo ano,
pública as quedas lideraram a mortalidade por causas externas
As quedas entre idosos merecem destaque por se torna- entre a população idosa, e os coeficientes são mais eleva-
rem um problema de saúde pública, devido à alta frequ- dos: 24,0/100.000.15,16
ência, morbidade, mortalidade e elevado custo socioeco- Em relação à morbidade, as quedas aumentam sua
nômico decorrentes das lesões provocadas e por serem importância, ocupando o primeiro lugar entre as inter-
eventos passíveis de prevenção. nações nos hospitais brasileiros. Em 2000, 48.940 pesso-
Dados do Ministério da Saúde (MS) e da Secretaria as foram hospitalizadas devido a quedas entre a popula-
de Estado da Saúde de Minas Gerais (SES/MG, 2006) re- ção de 60 anos ou mais (56,1% do total).
velam que aproximadamente 30% dos idosos caem uma Segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde de
vez por ano e, entre os idosos acima de 60 anos, as que- São Paulo (SES/SP), em 2011 foram 20,2 mil internações
das ocupam o terceiro lugar na mortalidade por causas em hospitais públicos do Estado devidas a quedas. Cerca
externas; em relação à morbidade, são responsáveis pelo de 6.000 delas foram de pessoas com mais de 60 anos.
primeiro lugar (56,1%) de internações hospitalares.12 As consequências mais comuns de quedas são o
De acordo com os dados do Sistema de Informação medo de voltar a cair, também chamado de síndrome
Médica do Ministério da Saúde, entre os anos de 1979 e pós-queda (44%), e as fraturas (64%), dentre as quais as
1995, no Brasil, cerca de 54.730 pessoas morreram devido mais frequentes são a de fêmur (62% das fraturas), se-
a quedas, sendo que 52% delas eram idosos, e a mortali- guidas pelas de rádio (12,5%), clavícula (6,25%) e outras,
dade proporcional por causas externas cresceu de 3% para como coluna, úmero, escápula, patela e nariz.17,18
4,5% entre os anos de 1984 e 1994. Em um estudo epide- A ocorrência de queda é maior em mulheres do que
miológico com idosos da comunidade residentes na cidade em homens, dado encontrado em diversos estudos. Al-
de São Paulo (SP) no ano 2000, a prevalência de quedas guns autores justificam esse dado pela idade avançada,
foi de 30%, e de quedas recorrentes, cerca de 11%. Entre frequência diminuída de atividades externas, utilização
idosos residentes em instituições de longa permanência de acentuada quantidade de drogas, uso de psicotrópicos
em outros países, essa prevalência pode subir para cerca de e diminuição de força de preensão.
60% a 75%. Estudos acerca da prevalência de quedas em O risco para quedas aumenta proporcionalmente com
idosos institucionalizados no Brasil ainda são escassos.13 o número de fatores de risco, percebendo-se então a im-
A queda é um evento que pode levar a consequências portância da enfermagem em agir preventivamente em
desastrosas, que podem ser classificadas em leves, mo- relação às quedas em idosos, procurando atuar com qua-
deradas e graves. As causas que provocam as quedas são lidade sobre a maior quantidade possível desses fatores.
múltiplas e podem ser agrupadas em fatores intrínsecos
e extrínsecos.10-13 Ambiente físico e acessibilidade espacial
Os fatores extrínsecos estão relacionados aos com- Um ambiente com acessibilidade atende diferentemente
portamentos e atividades das pessoas idosas e ao meio uma variedade de necessidades dos usuários, tornando
ambiente. Os ambientes físicos, muitas vezes, são mal possível maior autonomia e independência. Entende-se
planejados e mal construídos. Observa-se iluminação a autonomia como a capacidade do indivíduo de desfru-
insuficiente, desníveis, entre outros elementos que con- tar dos espaços e elementos espontaneamente, segundo
tribuem para as barreiras arquitetônicas, a principal cau- sua vontade, e independência como a capacidade de usu-
sa de queda em idosos, constituindo assim a acessibilida- fruir dos ambientes, sem precisar de ajuda.7
de espacial inadequada para essa população.14 A acessibilidade espacial está se tornando cada vez
Estudo realizado na cidade de Ribeirão Preto (SP), mais comum no mundo atual. Garantir a acessibilidade
em 2003, com 251 idosos atendidos na unidade de emer- para todos é uma tarefa difícil, pois deve abranger as ne-
gência de hospital universitário, verificou que 54% das cessidades espaciais de pessoas com as mais diferentes
quedas apresentaram como causa ambientes inadequa- restrições e, para garantir essa acessibilidade, deve-se
dos, como piso escorregadio (26%), atrapalhar-se com atentar para os componentes orientação e informação;
objetos no chão (22%), trombar em outras pessoas deslocamento; uso e comunicação.6-8
(11%), subir em objetos para alcançar algo (7%), queda O cuidado com as pessoas idosas e o ambiente deve
da cama (7%), problemas com degrau, o que reafirma a ser incorporado na prática profissional do enfermei-
ambiência como principal causa de quedas em idosos. ro.19,20 O ambiente físico é considerado um importante
No Brasil, no ano 2000, morreram 2.030 indivíduos fator impactante no cuidado dos idosos. Apontam-se
com mais de 60 anos por causa de quedas, ocupando o três principais questões que podem interferir no cuida-
terceiro lugar na mortalidade por causas externas, tanto do: a funcionalidade do espaço, a organização do am-
entre os homens quanto entre as mulheres, com coefi- biente e a percepção estética e emocional que o ambiente
ciente de 14,0/100.000 (15,7/100.000 para os homens e propõe para aqueles que nele residem ou trabalham.11
86 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

Cuidado de enfermagem ao idoso: implica- mas de acessibilidade espacial, e tais aspectos devem ser
ções do ambiente e da concepção de acessi- considerados toda vez que a equipe de saúde ali adentrar
bilidade espacial e propor intervenções.23-25
Como a acessibilidade espacial é de suma importância Seguem algumas recomendações da organização do
para a melhoria ou manutenção da qualidade de vida ambiente físico para o cotidiano do idoso.
do idoso, o ambiente deve ser projetado para suprir
Dormitório
suas necessidades físicas e deve estar livre de obstá-
• Espaço de 90 cm nas laterais e pés da cama para
culos, ser de fácil manutenção, para evitar acidentes, e
circulação.
respeitar as características biomecânicas e antropomé-
• Poltrona facilita calçar os sapatos.
tricas da população usuária.9,21
• Sensor de presença de luz no quarto evita que
A equipe de saúde da família, em especial o enfer-
o morador ande no escuro à noite, o que pode
meiro, deve incorporar o ambiente físico em sua ação
gerar quedas, e a instalação de controle de ilu-
do cuidado. Os fatores ambientais influenciam no com-
minação na cabeceira oferece mais segurança e
portamento que pode levar a quedas, principalmente na
controle do ambiente ao morador.
população idosa. A percepção da família e da equipe de
• Telefone na cabeceira da cama, o que permite fá-
saúde na elaboração de ambientes adequados para ido-
cil comunicação em caso de emergência.
sos, na prevenção de quedas e outros agravos, pode vir a
• Disposição de prateleiras mais baixas, evitando o
influenciar na qualidade de vida deles.22
uso de banquinhos ou cadeiras.
As necessidades de acessibilidade relacionadas ao en-
• Iluminação dentro dos armários, permitindo
velhecimento podem ser preenchidas a partir de projetos
boa visualização do conteúdo.
adequados, que analisem suas limitações e capacidades.
• Não utilização de tapetes.
Essas necessidades podem ser classificadas em três cate-
• A circulação ao redor do quarto deve ser facilita-
gorias: necessidades físicas, informativas e sociais.23
da, sem qualquer objeto no caminho.
Destaca-se o cuidado de enfermagem em relação à
• Cama: deve ter cabeceira para permitir que o
ambiência no sentido de realizar uma avaliação siste-
idoso possa se encostar; a altura deve permitir
matizada do ambiente onde o idoso convive, principal-
ficar sentado e apoiar os pés no chão, facilitando
mente em seu domicílio, e conseguir realizar adapta-
o equilíbrio; mais larga, permite maior conforto
ções cabíveis ao ambiente e às condições socioeconô-
e reduz os riscos de acidentes à noite.
micas do indivíduo.22
Nos cuidados de enfermagem a idosos, principal- Cozinha
mente na atenção básica, em especial na Estratégia de • Colocação de tampo de cozinha em dois níveis ou
Saúde da Família (ESF), o enfermeiro necessita compre- móveis, permitindo o uso por pessoas sentadas.
ender uma abordagem na concepção de acessibilidade • Colocação de tampo nos dois lados do fogão, o que
espacial. A partir dessa concepção, esse profissional con- possibilita o apoio de panelas e objetos quentes.
tribuirá com a construção de ambientes seguros e ade- • Disposição de torneira do tipo alavanca facilita
quados para a comunidade.2 o uso para pessoas de baixa estatura ou sentadas.
• Instalação de detector de fumaça e gás, que ga-
A casa ideal para o idoso: percepções do en-
rante mais segurança para pessoas com olfato
fermeiro frente à acessibilidade espacial na
reduzido.
visita domiciliar
• Espaço livre embaixo da pia, garantindo áreas de
O domicílio não apresenta as características de uma ins-
trabalho extras e que permitem o encaixe de ca-
tituição formal de saúde. É o local onde os seres huma-
deira para trabalho sentado.
nos convivem e torna propícios os cuidados individuali-
• Puxadores das portas e gavetas dos armários em
zados. Esse ambiente é permeado por diversos aspectos
modelo do tipo “D”, que permite o uso da mão toda
culturais, de significância para os seus moradores e fre-
para manejo e não somente a ponta dos dedos.
quentadores, portanto eivado de subjetividades.23
• Eletrodomésticos com altura de fácil acesso.
Em um projeto arquitetônico que vislumbre me-
lhorar as condições de moradia para idosos, peque- Sala
nas alterações podem significar grande ganho de • Previsão de iluminação extra, permitindo pontos
conforto e segurança.4,24 focais de luz para diversas atividades.
O enfermeiro na visita domiciliar se depara fre- • Janelas amplas, com peitoril mais baixo, que per-
quentemente com idosos que necessitam de cuidados mitem ao morador apreciar a paisagem mesmo
e residem em ambientes inadequados à acessibilidade sentado em cadeira ou recostado.
espacial. Esse profissional poderá perceber aspectos que • Rodapé com altura de 30 cm, pois é a altura em
permitam mudanças no domicílio, adequando-o às nor- que as rodas das cadeiras batem.
Ambiente físico e acessibilidade espacial | 87

• Sala livre de obstáculos; a mesa de centro vai se caracterizam por conversas informais orientadas por
para a lateral. um roteiro previamente estabelecido sobre as facilidades
• Utilização de objetos pessoais, como fotografias e dificuldades de acessibilidade de determinado local, re-
de familiares e lembranças de viagens, traz boas latadas pelo idoso. Por meio da utilização de instrumen-
lembranças ao idoso. tos para avaliação da acessibilidade do ponto de vista do
• Aparelhos de som e TV com controle remoto idoso, torna-se mais fácil a adequação das normas para
para evitar deslocamento do idoso. cada espaço utilizado por essa população.
Banheiro
• Torneiras e registros de pressão de alavanca, de C onsideraç õ es finais
¼ de volta ou monocomando não exigem esfor- Promover a acessibilidade espacial é fundamental para
ço para manuseio. que as pessoas, independentemente de suas habilidades
• Registros na entrada permitem regular a temperatu- e restrições, exerçam seus direitos de cidadania.
ra da água de fora do boxe, evitando escaldamento. Em função do grande crescimento da população idosa
• Portas do boxe com 80 cm de vão possibilitam a no Brasil e no mundo, é fundamental que se compreen-
entrada com cadeira higiênica e facilitam o socorro. dam suas necessidades espaciais; a concepção do ambien-
• Controle de temperatura da água do chuveiro, te físico domiciliar deve contemplar as noções de acessibi-
que evita escaldamento. lidade espacial. Nesse sentido, é importante destacar que,
• Desnível de 1,5 cm em rampa entre o piso do ba- para a atenção integral à pessoa idosa, deve-se observar as
nheiro e o boxe evita transbordamento, ao mes- normas adequadas de acessibilidade espacial.
mo tempo em que não cria barreira. Como profissionais de saúde, devemos atentar para
• Cubas de sobrepor evitam que cedam, em caso esse aspecto, levando em consideração as noções de
de apoio mais forte. acessibilidade espacial, conseguindo assim proporcionar
• Instalação de barras de apoio fixas no boxe, ao que os idosos mantenham-se autônomos e independen-
lado da bacia sanitária. tes. Para os idosos, vida saudável e qualidade de vida es-
• Piso antiderrapante. tão ligadas diretamente à manutenção ou à restauração
• Espaço interno do banheiro suficiente para cir- da independência.
culação de, no mínimo, duas pessoas: o idoso e Os cuidados de enfermagem relacionados à ambiência
o cuidador. devem ser constantes em nossa atuação profissional, visto
• Papeleira ao lado do vaso sanitário. que a promoção de acessibilidade espacial adequada seja
permanente em saúde e integrada ao nosso escopo profis-
Instrumento para avaliação da acessibilidade sional, em especial na atenção à população idosa.
do ponto de vista do idoso O enfermeiro da ESF deve incorporar em suas visitas
Com o intuito de compreender e avaliar as condições de domiciliares aos idosos uma análise crítica de sua atua-
acessibilidade espacial para os idosos deve-se utilizar ins- ção frente ao cuidado, inserindo nesse cuidado noções e
trumentos do ponto de vista dos próprios idosos, como vi- propostas corretas de acessibilidade espacial passíveis de
sitas exploratórias, passeios acompanhados e entrevistas.8,26 realização nos domicílios, conseguindo assim realizar a
As visitas exploratórias deverão ser realizadas previa- principal proposta da atenção primária à saúde: a pro-
mente pelos pesquisadores, podendo-se realizar também moção e a prevenção.
nesse momento o passeio acompanhado, que é um ins-
trumento que vai demonstrar as considerações do espa- C onflitos de interesses
ço sobre a acessibilidade pelo próprio idoso. Por fim, po- Os autores declaram não possuir nenhum conflito
de-se utilizar o método de entrevistas estruturadas, que de interesses.

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Relato de caso
Bullying | 89

Bullying na terceira idade


Melissa Agostini Lamperta, Gabriel Ferreira Tognonb,
Miguel Luiz Tonet Jr.b, Raquel de Oliveira Corbellinib,
Kelly Caroline Welterb, Renata Rossob

Res umo
Palavras‑chave Objetivo: Relatar o caso de um paciente que sofreu bullying em instituição de longa permanência. Método: As
Idoso, bullying, informações foram obtidas por meio de revisão do prontuário, entrevista com o paciente, discussão em equipe
violência. e revisão da literatura. Conclusões: O caso relatado sinaliza a importância de maior discussão sobre a violência
sofrida pelos idosos, em especial sobre o bullying como um tipo de violência pouco pesquisado nesse grupo etário.
Neste caso, o bullying teve impacto sobre o comportamento do indivíduo, aumentando o risco de isolamento social.
Observa-se a necessidade de novas pesquisas acerca do tema, com enfoque em prevenção e detecção precoce.

Bullying in elderly people


ABS T RACT
Keywords Objective: To report the case of a patient who suffered bullying in a long-term care facilities. Method:
Bullying, aged, The needed data was obtained by a medical chart review, interview with the patient, and literature review.
violence. Results: The reported case and the data reviewed bring to focus violence suffered by elderly people, espe-
cially, about the bullying that is a form of violence too little researched in elderly people. There is a need of
further researches about the topic, focusing on prevention and early detection.

a
Professora da disciplina de geriatria do curso de Medicina da Universidade de Santa Cruz do Sul.
b
Acadêmico do curso de Medicina da Universidade de Santa Cruz do Sul.

Dados para correspondência:


Melissa Agostini Lampert
Av. Independência, 2293, Bairro Universitário, CEP: 96815-900, Santa Cruz do Sul-RS – Brasil.
Telefone: (51) 3717-7300. E-mail: melissa_lampert@yahoo.com

Gabriel Ferreira Tognon


Rua José Rossini, 370, Santa Helena, CEP: 95700-000, Bento Gonçalves-RS – Brasil.
Telefone: (54) 8133-2938. E-mail: gabriel_tognon@hotmail.com
90 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

I ntroduç ão reta. Geralmente, a vítima é alguém menos poderoso do


Este relato de caso diz respeito à ocorrência de bullying que o autor, que pode ser maior, mais forte, mais velho
entre idosos moradores de uma instituição de longa ou mais novo. A intimidação repetida consolida as rela-
permanência de idosos (ILPI). O tema foi selecionado ções de poder entre agressores e vítimas: o agressor fica
porque, apesar de ser pouco abordado na literatura, gera mais forte à medida que a vítima torna-se mais vulnerá-
implicações na abordagem da saúde do idoso.1 vel, menos capaz de se defender.2,5
Os diferentes tipos de violência contra o idoso vêm
sendo observados cada vez mais nas últimas décadas, M é todo
mas não se trata de algo novo. As discussões políticas As informações contidas neste trabalho foram obtidas
acerca da violência iniciaram-se pela violência contra por meio de revisão do prontuário, entrevista com o pa-
as mulheres e contra as crianças, abrindo espaço, então, ciente e revisão da literatura.
para as discussões em relação aos idosos.1
Violência é definida como “uso intencional de força R elato de caso
física ou poder, real ou em ameaça, contra si próprio, ou- B.P., masculino, 99 anos, institucionalizado desde 2001,
tra pessoa ou contra um grupo ou comunidade, que re- foi avaliado em 27 de junho de 2011 devido à inapetên-
sulte ou tenha possibilidade de resultar em lesão, morte, cia e mudança no padrão das atividades de vida diária
dano psicológico, mau desenvolvimento ou privação”.2 (AVD), preferindo a restrição ao leito. O quadro se ini-
Pode-se classificar a violência como maus-tratos físicos ciara há duas semanas, sem evidência de nenhum pro-
(uso de força física causando lesão, ferimento, dor ou in- cesso patológico primário.
capacidade), maus-tratos psicológicos (ação de inflingir Durante a realização de avaliação geriátrica ampla
pena, dor ou angústia por meio de expressões verbais ou (AGA), o idoso relatou, espontaneamente, sofrer insul-
não verbais), abuso financeiro ou material (exploração tos por idosas que, na hora das refeições, referiam-se a
imprópria ou ilegal ou não consentida de recursos finan- ele de maneira pejorativa (“fedido” e “catinguento”) de-
ceiros ou materiais), abuso sexual (ato sexual não con- vido ao cheiro de uma pomada que utilizava. Referiu
sentido), negligência (privação da assistência necessária ainda que, por se sentir ofendido e humilhado, adquiriu
para as atividades diárias).1 A Organização Mundial da uma atitude defensiva: preferia permanecer no quarto.
Saúde (OMS, 2002) classifica a violência em tipo (auto- Verificou-se o ocorrido mediante consentimento
dirigido, interpessoal, coletivo) e natureza (física, sexual, do idoso, em contato realizado com os funcionários.
psicológica, envolvendo privação ou negligência).2 Os profissionais, além de ignorarem o que estava acon-
Esse termo, em inglês se origina de bully (“valentão”), tecendo, não identificaram os insultos como possíveis
e bullied é o termo utilizado para designar a vítima desse causas (os insultos) do quadro.
agressor.3 O bullying é uma forma de violência interpes- Assim, o idoso evitou fazer as refeições no refeitó-
soal ou coletiva de natureza física, psicológica, de pri- rio, por não acreditar que os funcionários se importa-
vação e/ou de negligência, muito estudada no ambien- riam com as ofensas nem valorizariam o fato. Após 15
te escolar. Entretanto, também pode ocorrer em outros dias da AGA, o idoso foi questionado sobre os insultos
ambientes, como famílias, locais de trabalho, asilos, pri- novamente: olhando para os funcionários de maneira
sões.4 Apesar de a ocorrência em outros ambientes, que reprovadora e autoconfiante, disse que “não tinha mais
não o escolar e em outras faixas etárias, ser citada em sido ofendido” e que “sabia que não precisaria mais se
diversos artigos, o bullying entre os idosos ainda é muito preocupar”. Atribui-se essa mudança de comportamento
pouco estudado. à confiança do idoso na equipe de saúde e ao desencora-
Existem poucos estudos sobre a violência praticada jamento das idosas, à medida que a equipe se posicionou
contra idosos e as implicações à sua saúde. A maioria dos contra os insultos, partindo-se, então, o estímulo para
estudos tem abordado a violência associada à ocorrência aumentar o poder das mesmas (bullies).
de maus-tratos de várias formas, por parte de um cui-
dador, ou seja, quando o agressor não disputa um cargo D isc u ssão
social do grupo da vítima, mas uma dominância do indi- No caso relatado, o bullying comprometeu as AVDs do
víduo e não do seu grupo. Já no bullying, essa agressão se paciente, iniciando um quadro de imobilidade, pois o
dá por diferentes status sociais (popularidade, liderança) idoso mudou seu padrão de comportamento, saindo
no mesmo grupo de pares.4 menos do seu quarto, ficando mais restrito ao leito e
O bullying é um relacionamento patológico, de afir- suprimindo refeições. Psicologicamente apresentava-se
mação de poder interpessoal por intermédio da agres- irritado, com sintomas de estresse, sentimentos de hu-
são; envolve ação física ou verbal negativa com intenções milhação e insegurança, cogitando medidas vingativas
hostis, causa sofrimento às vítimas, é repetido ao longo contra as praticantes do bullying.4,6-8
do tempo e envolve uma diferença de poder entre agres- Notou-se uma relação desigual de poder, típica em situa-
sores e vítimas, podendo ser de maneira direta ou indi- ções de bullying, com a vítima em desvantagem, sem conseguir
Bullying | 91

se defender com eficácia.2,5 Essa desigualdade foi suprimida que a sociedade vem impondo ao longo do tempo. Já
com o posicionamento da equipe em alertar os funcionários existem instrumentos específicos que visam à detecção
sobre o ocorrido, o que motivou a cessação dos insultos. precoce e predição de risco de violência contra essa po-
Por ser pouco estudado, o bullying entre idosos ainda pulação.13,14 Esses instrumentos geralmente contemplam
é de difícil elucidação. Sua prevalência em um hospital a violência associada ao cuidado, podendo não identifi-
geriátrico no Japão é de 19%9, o que, apesar de ser um car situações como o bullying.
dado de população bastante selecionada, mostra que o A possibilidade de detecção do bullying, nas suas fases
seu impacto é de grande magnitude. iniciais, permite intervenção mais precoce, diminuindo
Essa forma de violência se confunde com outras for- assim o tempo de exposição do indivíduo à violência.
mas de violência.4 A diferença é que, no bullying, essas Também instrumentos que possibilitem a estratificação
agressões têm um caráter repetitivo e sistemático e são de risco para o bullying têm a vantagem de prever sua
dirigidas a alguém visto como mais frágil, raramente ocorrência. Infelizmente, os instrumentos existentes não
conseguindo reverter ou defender-se. Podem ser psico- costumam considerar essa temática, podendo dificultar
lógicas e/ou físicas, e são alimentadas pela diferença de a elucidação do quadro de violência a que os idosos estão
poder entre o agressor e a vítima, fortalecendo-se cada expostos, além de impossibilitar a organização de abor-
vez mais à medida que um torna-se cada vez mais forte e dagens para melhor atendê-los.15
o outro cada vez mais oprimido.4 Sugere-se, portanto, a elaboração de questões ou
Os idosos estão mais propensos a sofrer maus-tratos, instrumentos específicos validados que identifiquem a
independentemente do ambiente de convívio (ILPI, do- ocorrência de bullying e que possam fazer parte da AGA.
micílio, serviços de saúde, centros de convivência), tanto Dessa forma, rotineiramente, o bullying seria incluído
por seus descendentes quanto por outros idosos ou pres- como um dos diagnósticos diferenciais potencialmente
tadores de serviço.10 Sendo assim, é de fundamental im- desencadeadores de síndromes geriátricas como a imo-
portância que instrumentos como a AGA contemplem a bilidade descrita no caso.1
suspeita, possibilitem a identificação e auxiliem no ma-
nejo do bullying contra o idoso.11,12 C onflito de interesse
A abordagem da saúde do idoso tem ganhado espaço Todos os autores alegam não possuir conflitos financei-
no cenário mundial e necessita adequar-se às demandas ros, pessoais ou outros potenciais conflitos.

R eferências
1. Freitas EVD, Py L et al. Tratado de geriatria e gerontologia. Rio de precoce da ocorrência do bullying: uma revisão de literatura. Rev
Janeiro: Guanabara Koogan. 1. 2006; 1. 1573 p. Pediatr. Jan./jun. 2008; 9(1):8-16.
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Geneva: World Health Organization; 2002. Nihon Koshu Eisei Zasshi. 1998 Jan; 45(1):56-62.
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possibilidades de intervenção. Contextos Clínicos. 2009; 2(1):59- care: hierarchical demand structuring. Rev. Saúde Pública. 2005;
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international report from the 2001/2002 survey. Health Policy Screening Test (H-S/EAST) utilizado para identificar risco de vi-
for Children and Adolescents; n.° 4. World Health Organiza- olência contra o idoso. Cad. Saúde Pública. 2008; 24(8):1801-1813.
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92 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

INSTRUÇÕES AOS AUTORES

Informações gerais Artigos de revisão: avaliação crítica sistematizada da literatura sobre


A revista Geriatria & Gerontologia – G&G é uma publicação cientí- determinado assunto, de modo a conter uma análise comparativa dos
fica trimestral da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – trabalhos na área, que discuta os limites e alcances metodológicos, per-
SBGG, cujo objetivo é veicular artigos que contribuam para a promo- mitindo indicar perspectivas de continuidade de estudos naquela linha
ção do conhecimento na área de Geriatria e Gerontologia, em suas de pesquisa e devendo conter conclusões. Devem ser descritos os pro-
diversas subáreas e interfaces. A G&G aceita submissão de artigos em cedimentos adotados para a revisão, bem como as estratégias de busca,
português, inglês e espanhol. Seu conteúdo encontra-se disponível seleção e avaliação dos artigos, esclarecendo a delimitação e limites do
em versão impressa, distribuída a todos os associados da SBGG, e em tema. Sua extensão máxima deve ser de 5 mil palavras e o número má-
versão eletrônica acessada pelo site: www.sbgg.org.br. ximo de referências bibliográficas de 50.
Comunicações breves: são artigos resumidos destinados à divulgação de
Instruções para o envio dos manuscritos resultados preliminares de pesquisa; de resultados de estudos que envol-
Os trabalhos devem ser enviados por via eletrônica (arquivo word) vem metodologia de pequena complexidade; hipóteses inéditas de rele-
para o endereço: revistasbgg@gmail.com. Antes de enviar o manus- vância na área de Geriatria e Gerontologia. Deve ter de 800 a 1.600 pa-
crito, verifique se todos os itens definidos em “Orientações para a lavras (excluindo tabelas, figuras e referências), uma tabela ou figura e no
preparação dos manuscritos” foram apontados em seu texto. O autor máximo dez referências bibliográficas. Sua apresentação deve acompanhar
receberá mensagem acusando recebimento do trabalho; caso isto não as mesmas normas exigidas para artigos originais, fazendo-se exceção aos
aconteça, deve-se entrar em contato. Concomitantemente, o autor de- resumos, que não são estruturados e devem ter até 150 palavras.
verá enviar uma declaração de que o manuscrito está sendo submetido Relatos de caso: são manuscritos relatando casos clínicos inéditos e
apenas à revista G&G, a concordância com a sessão de direitos auto- interessantes. O título deve apresentar a doença ou a peculiaridade clínica
rais, a declaração de conflito de interesses e o documento de aprovação – relato de caso. Devem observar a estrutura de resumo (150 palavras)
do comitê de ética em pesquisa. com introdução (justificativa ao leitor o motivo do relato de caso, não
se estender na descrição da «doença ou particularidade clínica»), relato
Avaliação dos manuscritos por pareceris- do caso (com descrição do paciente, resultados de exames clínicos,
tas (peer review) seguimento, diagnóstico. ATENÇÃO: Não utilizar siglas ou notas de
Os manuscritos que atenderem à política editorial e às instruções aos rodapé), discussão (comparar com dados de semelhança na literatura) e
autores serão encaminhados aos editores, que considerarão o mérito conclusão do caso. Devem conter a bibliografia consultada e não podem
científico da contribuição. Aprovados nesta fase, os manuscritos serão ter mais de 1500 palavras e 15 referências.
encaminhados para pelo menos dois revisores de reconhecida compe- Artigos especiais: são manuscritos entendidos pelos editores
tência na temática abordada. Os manuscritos aceitos poderão retomar como de especial relevância e que não se enquadram em nenhuma
aos autores para aprovação de eventuais alterações no processo de edi- das categorias citadas. Sua revisão admite critérios próprios, não
toração e normalização, de acordo com o estilo da revista. Manuscritos havendo limite de tamanho ou exigências prévias quanto às refe-
não aceitos não serão devolvidos, a menos que sejam solicitados pelos rências bibliográficas.
respectivos autores no prazo de até três meses. Os manuscritos publica-
Cartas ao editor: seção destinada à publicação de comentários, dis-
dos são de propriedade da revista, sendo proibida tanto a reprodução,
cussão ou críticas de artigos da revista. O tamanho máximo é de mil
mesmo que parcial, em outros periódicos, como a tradução para outro
palavras e até cinco referências.
idioma.
Orientações para a preparação dos manuscritos
Pesquisas envolvendo seres humanos Os manuscritos devem ser digitados em Word para Windows (inclu-
Resultados de pesquisas relacionadas a seres humanos devem ser sive tabelas); as figuras devem ser enviadas em arquivo JPG com no
acompanhados de declaração de que todos os procedimentos tenham mínimo 300 dpi de resolução.
sido aprovados pelo comitê de ética em pesquisa da instituição de ori-
gem a que se vinculam os autores ou, na falta deste, por um outro co- Devem ser apresentados na sequência:
mitê de ética em pesquisa credenciado junto a Comissão Nacional de a) título completo do trabalho, em português e inglês, com até 90
Ética em Pesquisa do Ministério da Saúde. Além disso, deverá constar, caracteres; b) título abreviado do trabalho com até 40 caracteres (in-
no último parágrafo do item Métodos, uma clara afirmação do cumpri- cluindo espaços), em português e inglês; c) nome de todos os autores
mento dos princípios éticos contidos na Declaração de Helsinki (2000), por extenso, indicando a filiação institucional de cada um; d) dados
além do atendimento à legislação específica do país no qual a pesquisa de um dos autores para correspondência, incluindo nome, endereço,
foi realizada. Os indivíduos incluídos em pesquisas devem ter assinado telefones, fax e e-mail.
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Resumo: todos os artigos submetidos deverão ter resumo em portu-
guês e em inglês (abstracts), entre 150 a 250 palavras. Para os artigos
Tipos de artigos publicados originais e comunicações breves, os resumos devem ser estrutura-
A revista G&G aceita a submissão de: dos incluindo objetivos, métodos, resultados e conclusões. Para as
Editoriais e comentários: esta seção destina-se à publicação de arti- demais categorias, o formato dos resumos pode ser o narrativo, mas
gos subscritos pelos editores ou aqueles encomendados a autoridades preferencialmente com as mesmas informações. Não devem conter
em áreas específicas, devendo ser prioritariamente relacionados a citações e abreviaturas. Destacar no mínimo três e no máximo seis
conteúdos dos artigos publicados na revista. termos de indexação, extraídos do vocabulário “Descritos em Ci-
ências d Saúde” (DeCS – www.bireme.br), quando acompanharem
Artigos originais: contribuições destinadas à divulgação de resulta- os resumos em português, e do Medical Subject Headings – MeSH
dos de pesquisas inéditas tendo em vista a relevância do tema, o al- (http://www.nlm.nih.gov/mesh/), quando acompanharem os “Abs-
cance e o conhecimento gerado para a área da pesquisa. Devem ter de tracts”. Se não forem encontrados descritores disponíveis para co-
2 mil a 4 mil palavras, excluindo ilustrações (tabelas, figuras [máximo brirem a temática do manuscrito, poderão ser indicados termos ou
de cinco]) e referências (máximo de 30). expressões de uso conhecido.
Instruções aos autores | 93

Texto: com exceção dos manuscritos apresentados como Artigos de curso de enfermagem. Ver Nutr [periódico eletrônico] 2002 [citado em
Revisão, os trabalhos deverão seguir a estrutura formal para trabalhos 2002 Jun 10]; 15(1). Disponível em www.scielo.br/rm
científicos: Introdução: deve conter revisão da literatura atualizada Textos em formato eletrônico
e pertinente ao tema, adequada a apresentação do problema, e que Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estatísticas de saú-
destaque sua relevância. Não deve ser extensa, definindo o problema de: assistência médico-sanitária. www.ibge.gov.br (Acessado em:
estudado, sintetizando sua importância e destacando as lacunas do 05/02/2004)
conhecimento (estado de arte) que serão abordados no artigo. Méto- More SS. Factors in the emergence of infectious diseases. Avail-
dos: devem conter descrição clara e sucinta dos procedimentos adota- able from URL; www.cdc.gov/ncidod/EID/eid.htm. Acesso em:
dos; universo e amostra; fonte de dados e critérios de seleção; instru- 05/06/1996.
mentos de medida, tratamento estatístico, dentre outros. Resultados:
Devem se limitar a descrever os resultados encontrados sem incluir
interpretações e comparações. Sempre que possível, os resultados
devem ser apresentados em tabelas ou figuras, elaboradas de forma Instructions for Authors
a serem autoexplicativas e com análise estatística. Discussão: deve
explorar, adequada e objetivamente, os resultados, discutidos a luz de
outras observações já registradas na literatura. É importante assinalar Background
limitações do estudo. Deve culminar com as Conclusões, indicando Geriatria & Gerontologia (Brazilian Geriatrics & Gerontology) G&G
caminhos para novas pesquisas ou implicações para a prática pro- is a quarterly scientific publication by Sociedade Brasileira de Geri-
fissional. Agradecimentos: podem ser registrados agradecimentos, atria e Gerontologia (SBGG) (Brazilian Geriatrics and Gerontology
em parágrafo não superior a três linhas, dirigidos a instituições ou Society) aiming the publication of articles on Geriatrics and Geron-
indivíduos que prestaram efetiva colaboração para o trabalho. tology, including their several subareas and interfaces. G&G accepts
article submissions in Portuguese, English, and Spanish. The print
Conflito de interesses content is available for SBGG members and the online content can be
Deve incluir relações com: a) conflitos financeiros, como empregos, accessed at: www.sbgg.org.br
vínculos profissionais, financiamentos, consultoria, propriedade,
participação em lucros ou patentes relacionados a empresas, produ- Instructions for sending the manuscript
tos comerciais ou tecnologias envolvidas no manuscrito; b) conflitos Papers should be sent by e-mail to: revistasbgg@gmail.com. Before
pessoais: relação de parentesco próximo com proprietários e empre- sending your manuscript, please check if all the items established
gadores de empresas relacionadas a produtos comerciais ou tecnolo- under “Instruction for Manuscript Sending” have been fulfilled. The
gias envolvidas no manuscrito; c) potenciais conflitos: situações ou corresponding author will receive a message acknowledging receipt
circunstâncias que poderiam ser consideradas capazes de influenciar of the manuscript. Should this do not occur up to seven working
a interpretação dos resultados. days, the author should get in touch with the journal. Concurrently,
the author should send by mail a declaration stating that the manu-
Referências bibliográficas script is being submitted only to Geriatria & Gerontologia and that
As referências devem ser listadas no final do artigo, numeradas he/she agrees with the cession of copyright.
consecutivamente, seguindo a ordem em que foram mencionadas
a primeira vez no texto, baseadas no estilo Vancouver (consultar: Manuscript evaluation by peer review
“Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Manuscripts that regard the editorial policy and the instructions for
Journals: Writing and Editing for Medical Publication” www.icmje. authors will be referred to editors who will evaluate the scientific
org). Nas referências com até seis autores, citam-se todos os autores; merit. Manuscripts will be submitted to at least two reviewers with
acima de seis autores, citam-se os seis primeiros autores, seguindo expertise in the addressed theme. Accepted manuscripts might re-
de et al. As abreviaturas dos títulos dos periódicos citados deverão turn for authors’ approval in case of changes made for editorial and
estar de acordo com o MedLine. A exatidão e a adequação das refe- standardization purposes, according to the journal style. Manuscripts
rências a trabalhos que tenham sido consultados e mencionados no not accepted will not be returned, unless they are requested by the
texto do artigo são de responsabilidade do autor. respective authors within three months. The copyright of the pub-
Livros lished manuscripts are held by the journal. Therefore, full or partial
Kane RL, Ouslander JG, Abrass IB. Essentials of clinical geriatrics 5th reproduction in other journals or translation into another language
ed. New York: McGraw Hill, 2004. is not authorized.
Capítulos de livros
Sayeg MA. Breves considerações sobre planejamento em saúde do Research involving human subjects
idoso. In: Menezes AK, editor. Caminhos do envelhecer. Rio de Ja- Articles related to research involving human subjects should indicate
neiro: Revinter/SBGG; 1994. p. 25-8 whether the procedures were followed in accordance with the ethical
standards of the responsible committee on human experimentation
Artigos de periódicos
(institutional or regional) accredited by the Comissão Nacional de
Ouslander JG. Urinary incontinence in the elderly. West J Med. 1981;
Ética em Pesquisa do Ministério da Saúde (Health Ministry National
135 (2): 482-91
Research Ethics Committee). In addition, a clear statement of com-
Dissertações e teses pliance with ethical principles outlined in the Helsinki Declaration
Marutinho AF. Alterações clínicas e eletrocardiográficas em pacien- (2000) shall appear in the last paragraph of “Methods” section, as well
tes idosos portadores de Doença de Chagas [dissertação]. São Paulo: as fulfillment of specific requirements of the nation the research was
Universidade Federal da SBGG; 2003. performed in. The subjects included in the research should have sig-
Trabalhos apresentados em congressos, simpósios, encontros, se- ned a “Free and Informed Consent Term”.
minários e outros
Peterson R, Grundman M, Thomas R, Thal L. Donepezil and vitamin Categories of manuscripts
E as treatments for mild congnitive impairment. In: Annals of the 9th G&G accepts the following submissions:
International Conference on Alzheimer’s Disease and Related Disor-
ders; 2004 July; United States, Philadelphia; 2004. Abstract 01-05-05. Original articles: Contributions aiming at the release of unpublished
research results considering the theme’s relevance, its range and the
Artigos em periódicos eletrônicos knowledge generated for research purposes. Original articles should
Boog MCF. Construção de uma proposta de ensino de nutrição para
94 | REVISTA GERIATRIA & GERONTOLOGIA

contain 2,000 to 4,000 words, excluding illustrations (tables, figures parison. Whenever possible, results should be displayed in tables or
(not exceeding 5) and references (not exceeding 30). figures designed to be self-explanatory and having statistical analysis.
Review articles: Critical and systematic evaluation of literature on Discussion: The discussion should properly and objectively explore
certain subject containing a comparative review of papers in that area, the results, discussed in the light of further observation already reg-
discussing methodological limitations and ranges, indicating further istered in literature. It Is important to point out the study limitations.
study needs for that research area, and containing conclusions. The The discussion should culminate by conclusions indicating avenues
proceedings adopted for the review, as well as search, selection, and for new research or implications for professional practice.
article evaluation strategies should be described, informing the limits
of the theme. They should not exceed 5,000 words and 50 references. Acknowledgements: Acknowledgments may be written in a no more
than 3-line paragraph towards institutes or individuals that effective-
Brief communications: These are summarized articles designed for
ly contributed to the paper.
dissemination of preliminary results, results of studies involving meth-
odology of low complexity, and new hypotheses of relevance in the
field of Geriatrics and Gerontology. They should contain 800-1600 Conflict of interest
words (excluding tables, figures and references), one table or figure Conflict of interest includes a) financial conflict such as employ-
and a maximum of ten references. Your presentation should follow ment, professional liaisons, funding, consulting, ownership, profit
the same standards of original articles, with exception of the abstracts, or patent sharing related to marketed products or technology in-
which are not structured and should contain a maximum of 150 words. volved in the manuscript; b) personal conflict: close relatedness to
owners and employers in companies connected to marketed prod-
Case Reports: These are manuscripts reporting original and inter- ucts or technology involved in the manuscript c) potential conflict:
esting clinical cases. The title should have the disease or clinical situations or circumstances that could be considered capable of in-
peculiarity — a case report. They must observe the structure of ab- fluencing the result interpretation.
stract (150 words) with introduction (an explanation to the reader
for the case report does not extend the description of “illness or References
clinical particularity”), case report (with description of the patient, Should be listed at the end of the manuscript and numbered in the
results of clinical tests, follow-up, and diagnosis — WARNING: Do order they are first mentioned in the text, following Vancouver style
not use acronyms or footnotes), discussion (comparison with simi- (v “Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical
lar data in the literature), and case outcome. They should contain a Journals Writing and Editing for Medical Publication” [http://www.
bibliography and have no more than 1500 words and 15 references. icmje org]). List all authors up to 6; if more than six, list the first 6 fol-
Letters to the editor: Section designed for publication of com- lowed by et al. The titles of journals should be abbreviated according
ments, discussion or any article reviews. They should not exceed to style used in Med-Line. Authors are responsible for the accuracy
1,000 words and 5 references. and completeness of references consulted and cited in the text.

Instructions for manuscript preparation Examples of reference style


Manuscripts should be typed in Word for Windows [(including ta- Books
bles), figures should be supplied as JPG file and a minimum of 300 Kane RL, Ouslander JG, Abrass IB. Essentials of clinical geriatrics.
dpi resolution]. Manuscripts should be prepared according to the 5th ed New York: McGraw Hill, 2004.
sequence below:
a) paper full title in Portuguese and English not exceeding 90 char- Book chapters
acters, b) paper short title not exceeding 40 characters (spaces Sayeg MA. Breves considerações sobre planejamento em saúde do
included) in Portuguese and English, c) authors’ and coauthors’ idoso. In: Menezes AK, editor. Caminhos do envelhecer. Rio de Ja-
complete name, indicating institutional affiliations for each one of neiro: Revinter/SBGG; 1994. p. 25-8
them; d) corresponding author data, including name, address, tele- Journal articles
phone and fax numbers, and e-mail. Ouslander JG. Urinary incontinence in the elderly West J Med 1981;
Abstract: All manuscripts should be submitted with an abstract in 135 (2): 482-91
Portuguese and in English having no more than 150 to 250 words. For
original articles and brief communications, abstracts should be struc- Essays and theses
tured to include objective, methods, results, and conclusions. For other Marutinho AF Alterações clínicas e eletrocardiográficas em pa-
manuscript categories, abstract models could be narrative, but rather cientes idosos portadores de Doença de Chagas [dissertação].
carrying the same information. Abstracts should not contain quota- São Paulo: Universidade Federal da SBGG; 2003.
tions and abbreviations. At least three and at most six keywords should
accompany the Abstracts being extracted from the vocabulary in De- Papers introduced in congresso, symposiums, meetings, seminars etc.
scritores em Ciências da Saúde (DeCS - www.bireme.br) when accom- Peterson R, Grundman M, Thomas R, Thai L. Donepezil and vi-
panying abstracts in Portuguese and from Medical Subject Headings – tamin E as treatments for mild cognitive impairment. In: Annals
MeSH (http //www.nlm nih gov/mesh/) when accompanying abstracts of the 9th International Conference on Alzheimer’s Disease and
in English. If no descriptor is available to cover the manuscript theme, Related Disorders; 2004 July; United States, Philadelphia; 2004.
words or expressions of known usage might be indicated. Abstract 01-05-05.
Text: except for Review Articles, papers should assume formal struc- Articles from electronic journals
ture of a scientific text. Introduction: The introduction should con- Boog MCF. Construção de uma proposta de ensino de nutrição para
tain updated literature review, being appropriate to the theme, suit- curso de enfermagem. Rev Nutr [periódico eletrônico] 2002 [citado
able to the problem introduced, and enhancing the theme relevance. em 2002 Jun 10]; 15(1). Disponível em www.scielo.br/RN
The introduction should not be extensive, but define the problem
studied, synthesizing its importance and stressing the knowledge Texts in electronic format
gaps addressed in the article. Methods: This section should have clear Institute Brasileiro de Geografia e Estatística. Estatísticas de saúde: as-
and brief description of proceedings adopted, sampling, data source sistência médico-sanitária. www.ibge.gov.br (Acessado em: 05/Fev/2004)
and selection criteria, measurement instruments, statistical analysis,
among other features. Results: This section should be limited to de- More SS. Factors in the emergence of infectious diseases. Available
scribing the results found without including interpretation and com- from URL; www.cdc.gov/ncidod/EID/eid.htm. Acesso em: Jun 5 1996.
NA DOENÇA DE PARKINSON
De agora em diante,

ACESSO1 A UM TRATAMENTO
MAIS EFICAZ NO CONTROLE DOS SINTOMAS2,
EM QUALQUER FASE3.

ICMS

12% PROLOPA 30
COMP
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68,43
200/50mg

30
COMP
R$
49,97
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1

LEVODOPA É A DROGA MAIS EFETIVA NO CONTROLE LEVODOPA PODE SER UTILIZADA NA FASE INICIAL DA DP
DOS SINTOMAS DA DP, ESPECIALMENTE RIGIDEZ TANTO EM MONOTERAPIA OU ASSOCIADA
E BRADICINESIA2,4 A OUTROS ANTIPARKINSONIANOS2,3

Referências Bibliográficas: 1. Kairos Web Brasil. Disponível em <http://brasil.kairosweb.com/revista.html> . Acesso em: Jan 2014. 2. DIAS-TOSTA, E. et al. Academia Brasileira de Neurologia (ABN). Doença de
Parkinson. Recomendações. 1a edição. São Paulo: OmniFarma, 2010. 3. FERRAZ, H.B. Tratamento da doença de Parkinson. Rev. Neurociências, v.7, n.1, p.6-12, 1999. 4. BRASIL.Ministério da Saúde. Portaria
SAS/MS nº 228, de 10/05/2010. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas – Doença de Parkinson. Diário Oficial da União, Brasilia, DF, n. 88, p42-45, 27 de maio de 2010. 5. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria
SAS/MS nº 228, de 10/05/2010. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas – Doença de Parkinson. Diário Oficial da União, Brasilia, DF, n. 88, p42-45, 27 de maio de 2010.
Contraindicações: Mulheres grávidas ou lactante; crianças ou indivíduos com menos de 25 anos; pacientes em uso de inibidores da monoaminoxidase não seletivos; pacientes com
doenças graves dos rins, coração, fígado ou glândulas endócrinas, com glaucoma de ângulo fechado ou com história anterior de algumas doenças psiquiátricas graves; pacientes
com hipersensibilidade conhecida à levodopa ou à benserazida. Interações medicamentosas: Uso concomitante com anticolinérgico trihexifenidil reduz a taxa de absorção de levodopa,
mas não a extensão; sulfato ferroso reduz a concentração plasmática máxima de levodopa em alguns pacientes; a metoclopramida aumenta a taxa de absorção de levodopa; neurolépticos,
opióides e medicamentos antihipertensivos contendo reserpina inibem a ação de EKSON; deve-se aguardar um intervalo de no mínimo de 2 semanas entre a interrupção de IMAO não seletivo e
a introdução de levodopa; levodopa pode potencializar o efeito de simpatomiméticos como epinefrina, norepinefrina, isoproterenol ou anfetamina; na associação com outro antiparkinsoniano pode
ser necessária a redução da dose de EKSON; anticolinérgicos não devem ser retirados abruptamente quando se iniciar tratamento com EKSON, pois o efeito da levodopa não é imediato.
EKSON é um medicamento. Durante seu uso, não dirija veículos ou opere máquinas, pois sua agilidade e atenção podem estar prejudicadas.
EKSON (levodopa 200 mg + cloridrato de benserazida 50 mg) comprimido. USO ORAL. USO ADULTO. Indicações: EKSON é indicado para o tratamento da doença de Parkinson. Precauções e advertências: Reações de hipersensibilidade podem ocorrer em indivíduos predispostos.
Em pacientes com glaucoma de ângulo aberto, recomenda-se medir regularmente a pressão intraocular. Depressão pode ser parte do quadro clínico em pacientes com doença de Parkinson e ainda pode ocorrer em pacientes tratados com EKSON. Recomenda-se controle
hematológico e de função hepática durante o tratamento. Em pacientes diabéticos, monitorar com regularidade a glicemia e fazer os ajustes necessários na dose de hipoglicemiantes.Se o paciente em tratamento com levodopa necessitar de anestesia geral, a
administração de EKSON deve ser continuada até a cirurgia, exceto no caso do halotano. Em anestesia geral com halotano deve-se descontinuar o uso de EKSON 12 a 48 horas antes da intervenção cirúrgica, pois flutuações da pressão arterial e/ou arritmias podem ocorrer.
O tratamento com EKSON pode ser retomado após a cirurgia, com reintrodução gradual e elevação da dose até o nível posológico anterior. EKSON não deve ser interrompido abruptamente. O uso de levodopa tem sido associado com sonolência e episódios de sono de
início repentino. No entanto a ocorrência tem sido muito raramente relatada. Pacientes devem ser informados disso e aconselhados a ter precaução quando dirigir ou operar máquinas durante o tratamento com levodopa. Potencial para dependência da droga ou abuso.
Um pequeno subgrupo de pacientes com doença de Parkinson sofrendo de distúrbio cognitivo e comportamental que pode ser diretamente atribuído ao aumento da quantidade de ingestão da medicação sem prescrição médica e ao aumento das doses requeridas para
tratar suas desabilidades motoras. Efeitos sobre a capacidade de dirigir e operar máquinas. Pacientes tratados com levodopa e que apresentam sonolência e/ou episódios de sono de início repentino devem ser advertidos para evitar dirigir ou se engajar em atividades
onde a desatenção pode colocar eles ou outros em risco de ferimento grave ou morte (p.e. operar máquinas) até que os episódios recorrentes e sonolência sejam resolvidos. Gravidez e lactação: Categoria de risco na gravidez: C. Este medicamento não deve ser utilizado
por mulheres grávidas sem orientação médica ou do cirurgião-dentista. Observa-se redução do efeito, quando EKSON é ingerido com uma refeição rica em proteínas. Reações adversas: Sangue e distúrbios do sistema linfático: anemia hemolítica, leucopenia transitória e
trombocitopenia têm sido relatados em casos raros. Distúrbios nutricionais e do metabolismo: anorexia foi relatada. Distúrbios psiquiátricos: depressão, agitação, ansiedade, insônia, alucinações, delírios e desorientação temporal podem ocorrer. Distúrbios do sistema
nervoso: casos isolados de ageusia ou disgeusia foram relatados. Em estágios tardios do tratamento, pode ocorrer discinesia (coreiformes ou atetóticos). Estes, em geral, podem ser eliminados ou tornam-se suportáveis com redução da dose. Com tratamento prolongado,
podem ocorrer flutuações da resposta terapêutica, incluindo episódios de acinesia, deterioração de final da dose e efeito “on-off”. Estes podem ser eliminados ou tornam-se suportáveis, com ajuste de dose e administração de doses individuais menores, mais
freqüentemente. Posteriormente, pode-se tentar aumentar a dose novamente, para intensificar o efeito terapêutico. Distúrbios cardíacos: arritmias cardíacas podem ocorrer ocasionalmente. Distúrbios vasculares: hipotensão ortostática pode ocorrer ocasionalmente.
Distúrbios ortostáticos, em geral, melhoram com redução da dose de EKSON. Distúrbios gastrintestinais: náusea, vômito e diarréia foram relatados com EKSON. Efeitos adversos gastrintestinais, que podem ocorrer predominantemente em estágios iniciais do tratamento,
são em grande parte controláveis com a ingestão de EKSON com alimentos ou líquidos, ou com aumento gradual da dose. Distúrbios do tecido subcutâneo e da pele: reações alérgicas como prurido e rubor podem ocorrer em casos raros. Investigações: aumento transitório
de transaminases e fosfatase alcalina pode ocorrer. Aumento de glutamiltransferase foi relatado. Elevação dos níveis sangüíneos de uréia pode ser observada com o uso de EKSON. Pode ocorrer alteração da coloração urinária, passando, em geral, a avermelhada, e
tornando-se mais escura, se guardada. Posologia: Tratamento inicial: Nos estágios iniciais da doença de Parkinson, é recomendável iniciar o tratamento com ¼ de comprimido de EKSON, três a quatro vezes ao dia. Assim que se confirmar a tolerabilidade ao esquema inicial, a dose pode
ser aumentada lentamente, de acordo com a resposta do paciente. A otimização do efeito em geral é obtida com uma dose diária de EKSON correspondente a 300 a 800 mg de levodopa + 75 - 200 mg de benserazida, dividida em 3 ou mais administrações. Podem ser necessárias 4 a 6
semanas para se atingir o efeito ideal. Se forem necessários incrementos adicionais, estes devem ser realizados em intervalos mensais. Tratamento de manutenção: A dose média de manutenção é de 1/2 comprimido (125 mg) de EKSON, 3 a 6 vezes ao dia. O número ideal de administrações
(não inferior a 3) e sua distribuição ao longo do dia devem ser tateados para um efeito ideal. SE PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO. VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA. MS - 1.0573.0443.

Material técnico-científico de distribuição exclusiva a profissionais de saúde


habilitados à prescrição e/ou dispensação de medicamentos.
Março/2014

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