Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
MAIO 2021
Homeschooling no Brasil: fatos, dados e mitos
Jônatas Dias Lima
1ª edição – maio 2021, Copyright © ID Editora.
Autor
Jônatas Dias Lima
Edição e organização
Francisco Augusto Garcia
Revisão
Edilaine Alberton Lima e Pedro Paulo Teófilo Magalhães de Hollanda
Revisão técnica
Fausto M. Tiemann
Capa e diagramação
Jorge Carlos
ID Editora Ltda
Florianópolis, SC
https://ideditorial.com | info@ideditorial.com
FICHA CATALOGRÁFICA
ISBN 978-65-991064-5-3
21-64609 CDD-371.0420981
Índices para catálogo sistemático:
Distribuição:
CEDET ¬ Centro de Desenvolvimento Profissional e Tecnológico
Av. Comendador Aladino Selmi, 4682 ¬ Condomínio GR2, galpão 8
CEP: 13069-096 ¬ Vila San Martin, Campinas-SP
Telefones: (19) 3249-0580 / 3327-2257
E-mail: livros@cedet.com.br
Sumário
Prefácio................................................................................................................. 7
Introdução.......................................................................................................... 11
Por falta de lei, o Estado não sabe nada sobre o ensino domiciliar
brasileiro............................................................................................................. 79
T
odo mundo é a favor da educação. Não há ninguém, rico
ou pobre, que não reconheça a necessidade de buscar esse
bem para si, mesmo que às vezes em situação contingente,
e para os seus filhos. A Constituição Federal traz logo nos seus
primeiros artigos a função da educação como um direito social,
e o artigo 227 dá o contorno de como se efetivará esse direito: “É
dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida,
à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar
e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negli-
gência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
Fica evidente o princípio da subsidiariedade nas responsabilidades
da educação dos filhos e explícita uma ordem que deve ser respei-
tada: primeiro, a família.
A família é base da sociedade e merece especial proteção do
Estado. É na família que se vive a educação de maneira integral,
em todas as suas dimensões: racional, social, emocional, física
e transcendente, e só a família tem laços perenes e de amor, de
amor abnegado, de uma entrega total em busca do melhor para
os seus. Mesmo as boas escolas não pretendem, nem poderiam,
substituir a família nesses aspectos do desenvolvimento humano
da criança. Cabe à família, sempre, esse papel, a partir de um olhar
único, personalizado, para um ser irrepetível. Cada criança é única
HOMESCHOOLING NO BRASIL
8
JÔNATAS DIAS LIMA
9
Introdução
A
decisão do STF no julgamento sobre a constituciona-
lidade do ensino domiciliar, ocorrido em 2018, afetou
de forma intensa a vida das famílias brasileiras que já
haviam aderido à modalidade. Embora não houvesse lei específica,
a situação do homeschooling no país antes do julgamento não era
clara e havia interpretações plausíveis para concluir que o texto
da Constituição, lido em conjunto com acordos internacionais
sobre direitos humanos dos quais o Brasil é signatário, permitiria
a prática. Isso, somado ao descontentamento das famílias com a
baixa qualidade da rede pública de ensino, aos preços moralmente
questionáveis das escolas privadas e vários outros fatores, levou
ao crescimento do interesse por essa forma de educação. Assim,
surgiram milhares de adeptos no Brasil.
No entanto, com o julgamento em plenário por parte do Supremo,
e principalmente após a publicação do acórdão referente ao mesmo,
o que ocorreu em março de 2019, a situação do ensino domiciliar
no Brasil ficou clara. Os ministros decidiram que a modalidade é
compatível com a Constituição, sob determinadas condições. A mais
importante delas é a de que haja lei que a regulamente.
Não foi o resultado esperado pelos defensores do homeschooling
na ocasião, mas podia ter sido pior. O STF poderia ter destruído
qualquer esperança para as famílias adeptas da educação em casa
naquele julgamento, afirmando que o ensino domiciliar é incons-
titucional, mas não o fez. Escolheu passar a bola para o Legislativo,
HOMESCHOOLING NO BRASIL
12
JÔNATAS DIAS LIMA
13
O homeschooling não
tem cor ideológica
Jornal Gazeta do Povo, 20 de maio de 2020.
Q
uem se aventura a debater sobre ensino domiciliar (homes-
chooling) no Brasil precisa estar disposto, primeiro, a
gastar muito de suas energias revelando a fragilidade de
mitos repetidos à exaustão, e quase sempre desprovidos de razoabi-
lidade. A meu ver, um dos que mais atrapalham a aprovação de uma
lei que regulamente a modalidade é a falsa crença de que educar os
filhos em casa é coisa da “direita religiosa conservadora”. Se isso foi
verdade um dia, há décadas deixou de ser e é fácil provar.
Antes, contudo, convém ser compreensivo com quem acredi-
tou nessa fábula por nunca ter tomado conhecimento do assunto
antes da chegada do governo Bolsonaro. O volume de conteúdo
disponível para pesquisa sobre o homeschooling no Brasil só cresceu
nos últimos anos. Antes, era de uma escassez e superficialidade
espantosas. Quando o atual governo – o primeiro de direita desde a
redemocratização – incluiu entre suas metas a aprovação do ensino
domiciliar, o ato foi o suficiente para uma multidão de leigos no
assunto decretarem que isso só podia ser coisa dessa gente que
acabou de chegar ao poder.
HOMESCHOOLING NO BRASIL
16
JÔNATAS DIAS LIMA
17
É a tecnologia – e não a religião
– o que está impulsionando
o ensino domiciliar
Jornal Gazeta do Povo, 13 de junho de 2020.
O
que ocorre no Brasil e no mundo durante a pandemia
da COVID-19 não é exatamente homeschooling, já que
a quarentena foi imposta a todas as famílias, inclusive
àquelas que preferem o ensino escolar. Trata-se de um improviso,
recebido como incômodo para alguns, mas também como uma
grata surpresa para outros. Entre estes, muitos provavelmente viam
o ensino domiciliar como uma excentricidade, coisa de religiosos
fanáticos, como no mito já desmascarado em outro artigo. No
entanto, estão descobrindo – ainda que involuntariamente – que
educar os filhos em casa é possível, funciona e que a educação
personalizada de verdade pode gerar resultados inalcançáveis em
outros ambientes. Estão descobrindo ainda que o grande motivador
por trás do crescimento do ensino domiciliar no mundo não é um
suposto desejo religioso de isolar os filhos da sociedade, mas sim
as facilidades oferecidas pelas novas tecnologias de aprendizagem,
pois elas funcionam e muito bem.
HOMESCHOOLING NO BRASIL
20
JÔNATAS DIAS LIMA
21
O que o homeschooling tem a ver
com a entrada do Brasil na OCDE?
D
esde janeiro de 2020, quando Donald Trump tornou
explícito o apoio dos Estados Unidos à entrada prio-
ritária do Brasil na Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), os sinais de que a conquista
dessa vaga está próxima são cada vez mais evidentes. Na já famosa
reunião ministerial de 22 de abril daquele ano, cujo registro em vídeo
foi divulgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro da
Casa Civil, general Braga Netto, chegou a dizer que “já nos consi-
deram na OCDE”, em referência às autoridades da organização. No
entanto, naquela mesma ocasião, houve outra fala sobre o mesmo
assunto que trouxe a público uma informação ainda mais surpre-
endente para muitos: 84% dos países que integram a OCDE tem
ensino domiciliar legalizado, lembrou a ministra Damares Alves.
O dado está correto e surpreende porque, no Brasil, o desconhe-
cimento sobre homeschooling ainda é tão grande que são poucos os
que prestam atenção ao valor que a instituição dá à modalidade.
Quando se trata de avaliar os benefícios econômicos da adesão à
OCDE, a aprovação é quase uma unanimidade entre os analistas, e
HOMESCHOOLING NO BRASIL
24
JÔNATAS DIAS LIMA
25
Para praticar homeschooling
em paz, eles venderam
tudo e deixaram o Brasil
Jornal Gazeta do Povo, 20 de junho de 2020.
N
o mundo todo, há séculos, as guerras, a miséria, o desem-
prego e as epidemias mortais figuram entre as principais
causas que levam cidadãos comuns a abandonarem seus
países de origem, junto de suas famílias, em busca de uma vida
melhor. No Brasil, contudo, há outro motivo. Um que iguala nosso
país aos regimes mais desumanos do planeta, que deveria tirar o
sono e encher de vergonha nossas principais autoridades. No Brasil,
pessoas de bem fogem do país para poder educar os filhos em paz.
A família de Fátima entra nessa lamentável estatística, cuja conta
jamais foi feita, dado o grau de descaso que são obrigados a suportar
os pais que escolhem o ensino domiciliar como modalidade. Mãe
de três filhos, ela e o marido cansaram de ser tratados com desprezo
por agentes públicos insensatos, venderam tudo o que tinham no
Brasil e foram embora para Portugal, na esperança de poder usufruir
da liberdade educacional que nosso país ainda rechaça.
HOMESCHOOLING NO BRASIL
28
JÔNATAS DIAS LIMA
29
Ensino domiciliar não
é política pública
Jornal Gazeta do Povo, 4 de julho de 2020.
N
a exaustiva tarefa de desmontar mitos sobre ensino
domiciliar que são reproduzidos em escala industrial
nas redes sociais, um dos que aparecem com espantosa
frequência é aquele que não questiona o mérito da causa, mas sim
seu lugar numa hipotética lista de prioridades com as quais o país
devia se preocupar. “Homeschooling não é prioridade” costuma
ser o mantra invocado por aqueles que escolhem esse discurso, na
esperança de parecerem equilibrados. É preciso admitir que ele soa
até compreensível para os mais desatentos, mas a verdade é que o
argumento não resiste a uma análise séria, pois parte de uma premissa
muito falsa, que é aquela que considera o ensino domiciliar como
mais uma política pública educacional em meio a tantas outras,
como num cardápio de opções.
Quando alguém invoca tal sentença, é quase infalível apostar que
logo em seguida virão exemplos de políticas públicas com os quais o
governo, o Congresso, a sociedade e até as famílias deviam se preo-
cupar “primeiro”. Na lista estarão reivindicações de melhores salários
para os professores, de melhor distribuição dos recursos federais, de
HOMESCHOOLING NO BRASIL
32
JÔNATAS DIAS LIMA
33
EUA têm leis de homeschooling
para todos os gostos.
Funcionariam no Brasil?
Jornal Gazeta do Povo, 12 de julho de 2020.
U
m dos erros mais graves que se pode cometer na luta
por uma lei que regulamente o ensino domiciliar no
Brasil é o apego excessivo a um único texto, ao ponto
de comprometer a própria existência de uma lei. Infelizmente, não
é difícil encontrar quem até aceita se engajar na ação política junto
a deputados, vereadores e poder executivo, mas retira o apoio se
determinado projeto de lei não atender integralmente às expectativas
criadas. Se a projeção do que está em sua mente não se concretiza,
acaba caindo na insensatez de proclamar que “se for assim, melhor
sem lei”, sentença esta que carrega em si muito mais rancor do
que razoabilidade.
Para não sucumbir a essa tentação, um bom antídoto é conhecer
um pouco mais sobre a grande diversidade de legislações sobre
homeschooling em vigência no mundo. Embora até se possa falar
num conceito universal e amplo do que seja ensino domiciliar, a
forma como se dá o direito a essa modalidade, e como cada lei
HOMESCHOOLING NO BRASIL
local a define, varia muito. Não faz sentido, portanto, implicar com
leis mais rigorosas, acusando-as de não representar o “verdadeiro”
homeschooling, pois este sim é um conceito tremendamente subjetivo.
Tendo em vista que comparar leis de diferentes países é um traba-
lho árduo, com grande risco de erros interpretativos ou de tradução,
aos interessados nessa empreitada um bom caminho é começar por
uma única nação estrangeira, os Estados Unidos, onde a modalidade
é legalizada em todo o território, embora coexistam dezenas de
variações legislativas, desde as mais liberais até as mais restritivas.
Tomemos como primeiro exemplo o estado do Texas, cuja lei
é frequentemente apontada como ideal pelos pais mais resistentes
à participação do Estado na educação dos filhos. Na prática, o
governo do Texas não mantém nenhum controle sobre as famílias
praticantes de ensino domiciliar. Não há avaliações periódicas, nem
exigência de formação acadêmica dos pais e nem sequer um registro
centralizado de quais famílias adotam a modalidade. O máximo de
orientação estatal é a de que as crianças aprendam a ler, escrever,
expressar-se bem e calcular. É preciso também que haja um currículo
a ser seguido, mas esse é de livre escolha dos pais.
Condições semelhantes são encontradas nos estados de Oklahoma,
Idaho, Missouri, Illinois, Indiana, Michigan, Connecticut, New Jersey
e Alaska. É muito importante destacar, contudo, que esse tipo de
homeschooling se enquadra nas formas que o Supremo Tribunal
Federal considerou incompatíveis com a Constituição brasileira.
No acórdão publicado em março de 2019, referente ao julgamento
sobre a modalidade ocorrido em 2018, é destacada como obrigatória
a “solidariedade entre a família e o Estado” na educação das crian-
ças, adolescentes e jovens, o que envolve a “supervisão, avaliação e
fiscalização pelo Poder Público”.
36
JÔNATAS DIAS LIMA
37
podem ser tanto as oferecidas pelo governo, como desenvolvidas
por professores particulares credenciados para tal fim. As opções
de tutoria ou de parceria com escolas privadas que não exigem
frequência também são válidas.
Condições semelhantes às da Flórida são oferecidas por Virgínia,
Tennessee, Colorado, Havaí e outros quinze estados.
Por fim, há lugares onde o nível de exigências é tão alto que o
direito de educar em casa fica bastante restrito. É o caso de Nova
York, onde além de informar ao governo sobre a opção, manter
um portfólio e submeter o estudante a testes anuais, é obrigatória
a apresentação de um plano pedagógico, também anual, além do
envio de relatórios trimestrais sobre o desenvolvimento da criança.
É previsto ainda que o estudante cumpra uma carga horária espe-
cífica e que ao menos um dos pais tenha ensino superior completo.
Consta ainda a possibilidade de inspeção em domicílio por parte
de fiscais do Estado.
Como podem ver, no país com o maior número de homeschoolers
em todo o mundo há opções de lei para todos os gostos, desde as
mais permissivas até as mais rigorosas. Nenhuma delas, contudo,
é pior do que a situação do Brasil, onde não há lei alguma que legi-
time a prática e, por consequência, todas as famílias que adotam
o ensino domiciliar são tratadas como infratoras, sujeitas às mais
injustas perseguições.
O Brasil precisa de uma lei que regulamente o ensino domiciliar
e isso é urgente.
Homeschooling: mais um tema
no qual o Chile supera o Brasil
Jornal Gazeta do Povo, 8 de agosto de 2020.
A
pesar da almejada liderança continental que o Brasil
poderia assumir na América Latina devido ao seu
tamanho e recursos naturais, temos um vizinho que nos
supera em quase tudo o que importa para um governo. Segundo os
dados mais recentes disponíveis, o Chile tem índice de desenvolvi-
mento humano (IDH) de 0,847, posicionando-se pouco acima da
Hungria (0,845) e bem acima do Brasil (0,761). Os chilenos também
vencem com folga na comparação do PIB per capita e obtêm melhores
resultados no PISA, exame que mede o desempenho dos estudantes
em leitura, matemática e ciências. A prova, aliás, é promovida pela
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), grupo no qual o Brasil tenta ser aceito há anos, e no qual
o Chile já está desde 2010.
Relacionada a essa conquista está a situação do homeschooling
naquele país. Desde 1980, o ensino domiciliar é um direito garan-
tido pela própria Constituição. No artigo 19, inciso 10, é dito que
“os pais têm o direito preferencial e o dever de educar seus filhos.
Corresponderá ao Estado outorgar especial proteção ao exercício
HOMESCHOOLING NO BRASIL
40
JÔNATAS DIAS LIMA
41
Como funciona o ensino
domiciliar em Portugal
Jornal Gazeta do Povo, 17 de outubro de 2020.
O
idioma em comum e as facilidades migratórias propor-
cionadas por acordos bilaterais tornam Portugal um dos
destinos mais procurados por brasileiros que querem
deixar o país. No entanto, o fato do ensino domiciliar ser legalizado
por lá é o que deixa o país europeu ainda mais atraente para as
famílias adeptas da modalidade. Educar os filhos em casa jamais foi
uma prática proibida em terras lusitanas, mas, recentemente, como
parte de uma ampla reforma educacional, o homeschooling português
ganhou uma série de normas. Aos que estão cansados da omissão
dos parlamentares brasileiros em aprovar uma lei que legitime essa
forma de educação em nosso país, e têm disposição para encarar as
dificuldades de uma mudança para o exterior, é importante conhecer
as novas regras que entraram em vigor em 2019.
Ler na íntegra o documento que rege o funcionamento da moda-
lidade é o primeiro passo. Trata-se da Portaria 69/2019, um longo
texto que revela logo de início que, na concepção portuguesa, a
educação em casa é dividida em duas opções: o ensino doméstico,
ministrado pelos próprios familiares ou por alguém que more junto
HOMESCHOOLING NO BRASIL
44
JÔNATAS DIAS LIMA
45
O que Nelson Mandela tem
a ver com o homeschooling
na África do Sul
Jornal Gazeta do Povo, 22 de agosto de 2020.
A
história da legalização do ensino domiciliar na África
do Sul precisa ser mais conhecida, especialmente pela
esquerda brasileira, pois explicita de forma muito intensa
e simbólica o fato de que a pauta pertence ao campo dos direi-
tos humanos. A lei que deu às famílias daquela nação a possibi-
lidade de educar seus filhos em casa foi apoiada e sancionada em
1996 por Nelson Mandela, um ícone mundial da luta contra o
racismo, que completava na ocasião dois anos como o primeiro
presidente negro do país.
No início da década de 90, a África do Sul estava em plena ebulição
social, com uma crescente revolta popular contra o regime segre-
gacionista do apartheid, que dava à minoria branca significativos
privilégios em relação aos negros, provocando frequentes situações
de violência. A questão da igualdade racial, é claro, era o principal
item nas reivindicações por mais respeito aos direitos humanos,
mas não o único. Vários temas humanitários foram abraçados pelos
HOMESCHOOLING NO BRASIL
48
JÔNATAS DIAS LIMA
49
A expansão do homeschooling
na Rússia de Vladimir Putin
Jornal Gazeta do Povo, 28 de novembro de 2020.
C
omo todo país que consegue superar o pesadelo do comu-
nismo, a Rússia experimenta e expande o florescer de
realidades impensáveis em seu território décadas atrás. A
liberdade de poder escolher a melhor forma de educar os próprios
filhos é uma dessas novidades que têm conquistado o coração da
população, em escala crescente. Com cerca de 120 mil estudantes
na modalidade de educação domiciliar, o país já detém o posto de
nação europeia com o maior número de alunos educados em casa.
A legitimação do direito ao homeschooling ocorreu em 2012,
como parte de uma ampla reforma educacional que deixou para
trás muito da herança soviética ainda vigente nas escolas. A lei foi
sancionada em 29 de dezembro daquele ano pelo presidente Vladi-
mir Putin, chama a modalidade de “educação familiar” e estabelece,
em seu artigo 44, que os pais ou responsáveis pelas crianças têm o
direito primário de educar e criar seus filhos, antes de qualquer outra
pessoa, cabendo também à família escolher a forma de educação
até a conclusão do ensino médio.
HOMESCHOOLING NO BRASIL
52
JÔNATAS DIAS LIMA
53
O homeschooling pode
mesmo provocar a
falência de escolas e o
desemprego de professores?
Jornal Gazeta do Povo, 18 de julho de 2020.
O
risco de falência das escolas privadas, com o consequente
desemprego em massa dos professores, costuma ser o
cenário apocalíptico usado para assustar parlamentares
que pouco ou nada sabem sobre ensino domiciliar. Esse filme de
terror, contudo, não resiste a dois minutos de conversa honesta e
estatística. Em nenhum dos mais de 60 países onde o homeschoo-
ling é legalizado houve qualquer consequência catastrófica para os
trabalhadores ou empresários do setor educacional, pois o ensino
domiciliar, com ou sem lei, sempre é a opção de uma minoria que,
embora importantíssima para os que se importam com direitos
humanos, é irrelevante para cálculos financeiros.
A fim de desmontar mais esse mito fabricado para fins difama-
tórios, vamos aos números. Os Estados Unidos são hoje o país com
a maior quantidade de estudantes na modalidade de ensino domi-
ciliar, chegando a 2,3 milhões, segundo dados de 2017. O número
HOMESCHOOLING NO BRASIL
56
JÔNATAS DIAS LIMA
57
É possível conciliar uma lei do
homeschooling e a proteção
das crianças mais vulneráveis?
Jornal Gazeta do Povo, 25 de julho de 2020.
N
os debates sobre ensino domiciliar, há uma parcela dos
que se opõem à legalização que merecem receber mais
atenção por parte dos defensores da modalidade, não
por estarem certos – não estão – mas sim porque o fundamento de
sua posição é, de fato, nobre, embora a falta de informação sobre a
realidade do homeschooling os leve a conclusões equivocadas. Essas
pessoas normalmente são vinculadas a ações sociais em comuni-
dades carentes e, ao ouvirem falar de crianças que não vão à escola
diariamente, só conseguem pensar no pior. Para quem pratica ou
estuda o ensino domiciliar, a fragilidade desse raciocínio é evidente,
mas para quem nada sabe sobre a modalidade, e é acostumado a
lidar com aquilo de pior que a miséria gera, a tragédia tende a ser
uma previsão automática ao reduzirem o assunto à sentença “criança
fora da escola”.
Tais críticos, cujo espírito de caridade é admirável, estão certos
ao apontar que a escola tradicional, apesar de todos os seus defeitos,
HOMESCHOOLING NO BRASIL
60
JÔNATAS DIAS LIMA
61
Do PT a Bolsonaro: 15 projetos
de lei sobre homeschooling que
já passaram pelo Congresso
Jornal Gazeta do Povo, 1º de agosto de 2020.
N
a última semana de julho, algo inédito ocorreu na
longa história da luta pela legalização do homeschoo-
ling no Brasil. O Poder Executivo, por meio do líder do
governo na Câmara dos Deputados, deputado Vitor Hugo (PSL-
GO), apresentou um requerimento de urgência para o projeto de
lei 2401/2019. Trata-se da proposta de regulamentação do ensino
domiciliar desenvolvida pelo próprio governo Bolsonaro e enviada
ao Congresso Nacional em 2019. Se o requerimento for aprovado,
o projeto ganha tramitação mais célere, indo direto para o plenário
da Casa, sem a necessidade de passar pelo vagaroso caminho das
comissões que, aliás, sequer foram instaladas em 2020, devido à
pandemia do coronavírus.
É a primeira vez que um governo dá tal importância ao tema,
que tramita na casa há 26 anos. Se o tempo percorrido surpreende
alguns, o número de propostas, bem como o perfil de seus autores,
costuma resultar em surpresa ainda maior. Ao menos 15 projetos de
HOMESCHOOLING NO BRASIL
64
JÔNATAS DIAS LIMA
Embora antigo, o texto tramita até hoje já que Portela foi reeleito
deputado duas vezes seguidas e pediu o desarquivamento do projeto
a cada início de novo mandato. O PL 3179/2012, aliás, é a proposta
que encabeça a comissão especial criada pelo presidente da Câmara,
Rodrigo Maia, em dezembro de 2019, com o objetivo de analisar
todos os projetos sobre ensino domiciliar na Casa. A instalação da
comissão, porém, nunca chegou a acontecer.
Ao 3179/2012 foram apensados todos os projetos que vieram
em seguida relacionados ao tema do homeschooling. É o caso do
PL 3261/2015, de autoria do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-
SP), o PL 10185/2018, do deputado Alan Rick (DEM-AC), o PL
5852/2019, do deputado Pastor Eurico (PATRI-PE), o PL 3262/2019
da deputada Chris Tonietto (PSL-RJ), o PL 6188/2019, do deputado
Geninho Zuliani (DEM-SP) e até mesmo a proposta do Poder
Executivo, que é o texto para o qual foi solicitada a tramitação em
regime de urgência.
Convém mencionar ainda os dois projetos cuja tramitação teve
início no Senado, e não na Câmara. Ambos são de autoria do atual
líder do governo na Casa, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-
PE), e, embora os dois tratem de ensino domiciliar, têm textos e
objetivos distintos. O primeiro é o PLS 490/2017, que estabelece a
regulamentação propriamente dita e está na Comissão de Direitos
Humanos, sob relatoria da senadora Soraya Thronicke (PSL-MS). O
outro é o PLS 28/2018, que explicita no Código Penal que o ensino
domiciliar não caracteriza abandono intelectual. Este aguarda desig-
nação de relator na Comissão de Constituição e Justiça da Casa.
Diante do volume de propostas, da frequência crescente com que
foram apresentados, da conscientização dos parlamentares sobre
a injusta perseguição contra famílias educadoras e da relevância
que o tema ganhou neste período de pandemia, pode-se dizer com
65
tranquilidade que nunca houve momento mais propício e maduro
para a aprovação de uma lei do homeschooling como agora.
Estabelecer a urgência para o 2401/2019 é o primeiro passo
para colocar fim na persistente e triste omissão do Poder Legisla-
tivo acerca do tema.
Os argumentos contra o
homeschooling não justificam
rejeição à existência de lei
Jornal Gazeta do Povo, 15 de agosto de 2020.
E
m qualquer debate, audiência pública, entrevista ou semi-
nário, são sempre dois os argumentos mais frequentes dos
críticos à legalização do homeschooling para justificarem sua
posição. A suposta falta de socialização à qual estariam submetidos
os estudantes dessa modalidade e os riscos às crianças e adolescen-
tes mais vulneráveis, já que, para elas, a escola não seria apenas um
ambiente de aprendizagem, mas também de proteção social.
Por mais discutíveis que sejam os pontos levantados, penso que
os defensores do ensino domiciliar deveriam chamar a atenção para
outro aspecto, mais amplo, antes de refutá-los. À luz da razão, os dois
argumentos, por si mesmos, são incapazes de explicar o rechaço total
a uma legislação sobre o tema. Esse é um fato que precisa ser mais
exposto. No máximo, justificam o debate sobre o nível de restrições
que a lei brasileira sobre o tema deveria adotar. Aliás, essa sim é a
conversa sobre homeschooling na qual lados distintos, porém com
motivações honestas, poderiam chegar a um consenso.
HOMESCHOOLING NO BRASIL
68
JÔNATAS DIAS LIMA
69
Os gênios educados em casa
são a melhor propaganda
para o ensino domiciliar
Jornal Gazeta do Povo, 31 de outubro de 2020.
A
o buscar pelo termo “ensino domiciliar” nas redes sociais,
o que não falta são piadinhas maldosas de críticos sobre
a suposta incapacidade dos pais – quaisquer pais – de
ensinarem em casa, bem como memes de crianças, supostamente
educadas por suas famílias, que escrevem mal ou não sabem calcular.
Na grande maioria das vezes, tudo não passa de humor escrachado
para propagar a mentira de que o homeschooling não gera bons
resultados de aprendizagem. É claro que os divulgadores dessas
bobagens normalmente apelam para vídeos de contexto desconhe-
cido, sem dar absolutamente nenhuma garantia de que a família em
questão realmente é adepta da modalidade. Afinal, se fossem buscar
na realidade a matéria-prima para seu sarcasmo, ela os deixaria
completamente frustrados.
O mundo e a história estão repletos de gênios que foram educa-
dos em casa, pelos pais ou por professores contratados pelas famí-
lias. Alguns jamais frequentaram uma escola regular até chegar à
HOMESCHOOLING NO BRASIL
72
JÔNATAS DIAS LIMA
73
professor de ciência da computação no MIT (Massachusetts Insti-
tute of Technology), nos Estados Unidos. Ele passou a infância
viajando por toda a América do Norte com seu pai, um escultor e
matemático por quem foi educado na modalidade de homeschoo-
ling até entrar na universidade, aos 12 anos. Concluiu a graduação
dois anos depois, aos 14. Aos 20, recebeu seu primeiro diploma de
doutorado. Atualmente, acumula dezenas de prêmios concedidos
por instituições do Canadá e dos Estados Unidos.
Encerro a lista por aqui para não deixá-la extensa demais, mas
claro que não esgotei os exemplos que poderiam ser dados. Agora,
contudo, o leitor tem uma opção a mais do que fazer quando se
deparar com piadas infundadas sobre homeschooling nas redes
sociais: mostre esse artigo para o autor da insensatez e ajude-o a
sair do poço de ignorância no qual se encontra.
Campeões e artistas:
quando o ensino domiciliar
favorece o talento
Jornal Gazeta do Povo, 7 de setembro de 2020.
N
o artigo anterior, conhecemos alguns exemplos de verda-
deiros gênios, como intelectuais, cientistas e invento-
res, que fizeram a diferença em suas áreas de atuação
e foram alunos de homeschooling na infância ou adolescência. É
claro, contudo, que nem todo estudante é fascinado pelo mundo da
ciência, o que não os torna de forma alguma alunos inferiores. Esse
é outro aspecto do ensino domiciliar que merece destaque. Sem a
típica preocupação das escolas tradicionais em nivelar toda uma
turma mirando nos mesmos resultados, o homeschooling oferece
um terreno mais fértil para que talentos individuais floresçam e se
desenvolvam com muito mais liberdade e apoio. É por isso que há
tantos exemplos de atletas e artistas que foram educados em casa.
O caso de Maria Sharapova, o fenômeno russo do tênis, encaixa-
-se com perfeição na situação descrita. O gosto pelo esporte surgiu
cedo e aos 9 anos a atleta já frequentava uma das mais prestigiadas
academias esportivas dos Estados Unidos. Nesse período ela ainda
HOMESCHOOLING NO BRASIL
76
JÔNATAS DIAS LIMA
77
Por falta de lei, o Estado não
sabe nada sobre o ensino
domiciliar brasileiro
Jornal Gazeta do Povo, 5 de setembro de 2020.
Q
uantas famílias são adeptas do ensino domiciliar no
Brasil? Essa com certeza é a pergunta mais frequente em
qualquer reunião com autoridades e parlamentares que
se deparam com o tema pela primeira vez. A resposta, contudo, é
de uma inexatidão frustrante para todos os envolvidos na questão,
desde as entidades que gostariam de ajudar o maior número possível
de famílias educadoras até aqueles opositores que querem criticar
a modalidade com mais fundamento. Hoje, tudo o que temos são
estimativas. Não há nenhum número oficial obtido por levantamento
do Poder Público, e isso é culpa da ausência de lei.
Atualmente, o ensino domiciliar no Brasil é um fato social óbvio,
com milhares de adeptos. Há comunidades de famílias que promo-
vem eventos, produzem material didático, formalizam associações
e atuam junto às casas legislativas, pedindo urgência na regulamen-
tação. Há ainda personalidades que atuam no campo cultural, agre-
gando multidões de seguidores nas redes sociais e compartilhando
HOMESCHOOLING NO BRASIL
80
JÔNATAS DIAS LIMA
81
Famílias homeschoolers:
a minoria desprezada por
defensores de minorias
Jornal Gazeta do Povo, 12 de setembro de 2020.
C
onforme mostrado estatisticamente em artigo anterior,
as famílias adeptas do ensino domiciliar são minoria
em qualquer país do mundo, inclusive naqueles onde a
modalidade é permitida há décadas. Há, portanto, evidências mensu-
ráveis para se afirmar que educar os filhos em casa, sem levá-los
diariamente para uma escola, é sempre a opção de poucos. Esse fato,
somado à perseguição que enfrentam, à falta de apoio do Estado e
ao preconceito contra o qual lutam, torna possível enquadrar com
perfeição essa parcela da sociedade no já clássico conceito de minoria
social. Apesar disso, constata-se com facilidade que poucos grupos
são tão desprezados – e às vezes odiados – por supostos defensores
de minorias como o das famílias homeschoolers.
Parte dessa contradição pode ser explicada pela crença em este-
reótipos ideológicos desprovidos de sólido fundamento. Para a
militância progressista mais dependente de aceitação no meio em
que escolheu atuar, homeschooling é pauta conservadora, portanto
HOMESCHOOLING NO BRASIL
84
JÔNATAS DIAS LIMA
85
No caso do homeschooling,
regulamentação é liberdade
Jornal Gazeta do Povo, 19 de setembro de 2020.
F
requentemente, aqui neste espaço ou nas redes sociais,
após a publicação de algum artigo no qual eu defenda a
urgência da regulamentação do homeschooling, surgem
manifestações contrárias, mas não apenas de críticos do ensino
domiciliar. Algumas famílias já adeptas da modalidade e outros
entusiastas que se apresentam como libertários repudiam a inicia-
tiva, pois consideram que isso seria “mais Estado” e que uma lei
colocaria “amarras” na liberdade das famílias. Apesar da clara boa
intenção, os dois grupos estão, na verdade, atrasados no debate.
Tais argumentos seriam consideráveis dois anos atrás, antes do
julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), mas desde que a
Corte falou, tudo mudou.
Antes do julgamento de 2018, fazia sentido falar em limbo jurídico
e cogitar que a prática não dependia de lei específica para ser aceita
como legítima, pois o que havia era uma disputa de interpretações
envolvendo o texto da Constituição, a Lei de Diretrizes e Bases, o
Estatuto da Criança e do Adolescente e tratados internacionais assi-
nados pelo Brasil. Os casos de famílias educadoras que chegavam à
HOMESCHOOLING NO BRASIL
88
JÔNATAS DIAS LIMA
89
Esquerda a favor do
homeschooling? Ela existe e é
mais comum do que parece
Jornal Gazeta do Povo, 10 de outubro de 2020.
T
odos que se interessam por ensino domiciliar (homescho-
oling), ainda que não o pratiquem, em algum momento
assistiram ou assistirão ao filme Capitão Fantástico (2016),
estrelado por Viggo Mortensen – o Aragorn de O Senhor dos Anéis – e
que retrata a história de um casal que decidiu se afastar da sociedade
e criar sua família no meio da mata. Tiveram seis filhos e nenhum
deles foi para a escola – foram educados pelos próprios pais. Mesmo
assim, receberam uma educação superior à oferecida em muitas
escolas, como o filme faz questão de destacar em várias cenas.
Quem para por aí na sinopse pode acabar supondo que se trata de
uma obra conservadora – afinal, trata-se de uma família numerosa
adepta do ensino domiciliar –, mas estaria completamente errado.
A família se afasta da sociedade por considerar que o modo de vida
capitalista é nocivo. O autor preferido do pai é Noam Chomsky,
filósofo socialista a quem celebram em substituição ao Natal. O
cristianismo, aliás, é alvo frequente de sarcasmo e o filho mais velho,
HOMESCHOOLING NO BRASIL
92
JÔNATAS DIAS LIMA
93
Por que a pandemia fez o
interesse por homeschooling
crescer tanto no mundo todo
Jornal Gazeta do Povo, 24 de outubro de 2020.
M
uito já foi escrito na imprensa nacional e internacional
sobre as consequências permanentes que a pandemia
deixará no mundo, como a massiva adesão de empre-
sas ao home office e o hábito de fazer videoconferências. No que
diz respeito ao homeschooling, contudo, só agora começam a surgir
dados mensuráveis de como cresceu o interesse das famílias por
educar em casa. Infelizmente, essas informações não são do Brasil,
pois, conforme aprofundei em artigo anterior, graças à ausência de
lei, o Estado brasileiro padece de uma ignorância quase completa
sobre esse fato social em seu próprio território.
Os dados mais precisos, como sempre, vêm dos Estados Unidos,
onde a modalidade é legalizada há 48 anos e onde coexistem dezenas
de legislações diferentes sobre a mesmo tema, variando de estado
para estado. De acordo com o National Home Educators Research
Institute (NHERI), uma das principais entidades de pesquisa relacio-
nadas ao homeschooling no país, o aumento nos pedidos de registro
HOMESCHOOLING NO BRASIL
96
JÔNATAS DIAS LIMA
97
Lei do homeschooling
ajudaria a resolver impasse
da volta às aulas
Jornal Gazeta do Povo, 27 de fevereiro de 2021.
C
omo era previsível, a tentativa de retorno às aulas presen-
ciais em todo o Brasil está longe de ocorrer com segurança
e tranquilidade. Alguns estados e municípios chegaram a
retomar as atividades escolares, mas tiveram que cancelar a medida
dias depois por causa de decisões judiciais ou, mais recentemente,
por causa da explosão de novos casos de Covid-19 registrados após
o Carnaval. Com essa constatação não quero tomar partido nesse
debate, mas sim apontar para um fator esquecido por quase todas
as autoridades envolvidas e que, se não daria fim ao problema, com
certeza amenizaria a angústia dos pais que temem pela contami-
nação dos filhos.
Se a educação domiciliar estivesse legalizada em todo o país, esta
seria a escolha óbvia de muitos pais e mães dispostos a fazer tudo
que for preciso para proteger suas crianças da doença, o que inclui
abrir mão de uma renda para dar conta do acompanhamento. Para
HOMESCHOOLING NO BRASIL
100
JÔNATAS DIAS LIMA
101
O bom momento político
para aprovação do
ensino domiciliar
Jornal Gazeta do Povo, 26 de setembro de 2020.
N
ão existe uma fórmula infalível capaz de prever quando
e se uma proposta sobre homeschooling será aprovada
pelo Congresso Nacional, mas, na grande maioria das
votações bem-sucedidas, alguns elementos políticos estão sempre
lá. É por isso que qualquer analista atento e honesto que se dê ao
trabalho de investigar as chances de sucesso da regulamentação do
ensino domiciliar no Brasil, hoje, dará uma resposta otimista às
famílias que aguardam pela lei com tanta ansiedade.
Vários desses elementos reveladores puderam ser constatados
no Simpósio Online sobre Ensino Domiciliar ocorrido na última
terça-feira (22) na Câmara dos Deputados. Promovido pela Frente
Parlamentar em Defesa do Homeschooling, o evento deu voz, prin-
cipalmente, aos parlamentares, e com isso expôs o consenso em
torno da urgência do tema na Casa.
Fator essencial para a celeridade na tramitação de matérias que
dependem do plenário é a anuência de líderes partidários. No simpó-
HOMESCHOOLING NO BRASIL
104
JÔNATAS DIAS LIMA
105
Por que o Distrito Federal
aprovou a educação domiciliar
Jornal Gazeta do Povo, 05 de dezembro de 2020.
O
dia 1º de dezembro de 2020 já faz parte da história da
educação domiciliar no Brasil. É a data em que, pela
primeira vez, o parlamento de uma unidade da federação
aprovou o direito das famílias de serem protagonistas na educação
formal de seus filhos, educando-os em casa, sem a obrigação de
frequência diária a uma escola, da mesma forma como ocorre na
maior parte dos países desenvolvidos do mundo.
É bem verdade que a lei ainda precisa ser sancionada pelo gover-
nador Ibaneis Rocha1, mas, diante do fato de que um dos três projetos
que deram origem ao texto final partiu justamente do Poder Execu-
tivo, assinado pelo ex-secretário de educação, João Pedro Ferraz, é
altamente improvável que o próprio Poder Executivo vete a proposta.
Na condição de cofundador da Associação de Famílias Educa-
doras do Distrito Federal (FAMEDUC-DF), tive a oportunidade e a
missão de acompanhar a tramitação da pauta na Câmara Legislativa
do Distrito Federal desde o início. Foi uma luta longa, árdua, repleta
de frustrações, obstáculos e inimigos, mas, por fim, graças a uma rede
de famílias e apoiadores muito determinados, venceu o bom senso.
HOMESCHOOLING NO BRASIL
108
JÔNATAS DIAS LIMA
109
HOMESCHOOLING NO BRASIL
por uma lei, muitas dessas famílias adorariam matricular seus filhos
em atividades extraclasse, como judô, balé e outras comumente
oferecidas apenas aos alunos regulares das instituições privadas e
que, agora, podem ser abertas também aos optantes pelo ensino
domiciliar no DF.
Algo parecido se pode dizer sobre novas oportunidades profis-
sionais para os professores. Entre as famílias educadoras de classe
média, um motivador comum para a opção de educar em casa é a
falta de alternativas entre uma escola pública na qual não confiam,
por variados fatores, e escolas privadas muito caras. Esses pais, em
especial aqueles com três ou mais filhos, não têm condições de pagar
R$ 2 mil de mensalidade para cada um, mas certamente estariam
dispostos a pagar valores bem maiores do que os de mercado pela
hora-aula de um bom professor que dê aulas aos seus filhos em casa.
Portanto, a mentira de que o homeschooling provocaria o desem-
prego dos professores não resiste nem a um minuto de reflexão
sincera. Felizmente, os deputados distritais perceberam a fragi-
lidade dessa tese.
Não poderia terminar este artigo sem registrar, publicamente,
minha gratidão ao deputado distrital João Cardoso, o primeiro a
abraçar a causa e apresentar um projeto de lei, a pedido das famí-
lias brasilienses, e à deputada distrital Júlia Lucy, que não apenas
é autora de outro projeto sobre o tema, como também foi a prin-
cipal articuladora junto ao governo do Distrito Federal para que
o mesmo entrasse no debate, apresentando sua própria proposta
de regulamentação.
Esses dois parlamentares não se importaram com o fato de que
as famílias educadoras, por serem uma minoria, jamais poderiam
lhes trazer um volume relevante de votos, nem dispunham de muitos
recursos, como os grandes conglomerados educacionais, e nem
110
JÔNATAS DIAS LIMA
111