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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA ARTE


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
MESTRADO PROFISSIONAL EM ARTES

WALTER DA SILVA ALMEIDA

GROOVES DO PARÁ: Transcrições, adaptações e variações para a bateria


dos ritmos Carimbó, Samba de Cacete e Lundu Marajoara.

BELÉM – PARÁ
Setembro/2020
WALTER DA SILVA ALMEIDA

GROOVES DO PARÁ: Transcrições, adaptações e variações para a bateria


dos ritmos Carimbó, Samba de Cacete e Lundu Marajoara.

Artigo e criação de produto didático apresentado para a


obtenção do título de mestre em Artes ao Programa de Pós-
Graduação stricto sensu em Artes, Mestrado Profissional em
rede da Universidade Federal do Pará (UFPA) e
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC),
reconhecido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (CAPES) do Ministério da
Educação.
Orientador: Prof. Dr. Áureo Déo DeFreitas Jr.

Co-Orientador: Prof. Dr. Vanildo Palheta Monteiro

Linha de Pesquisa:
Processos de ensino, aprendizagem e criação em artes.

BELÉM – PARÁ
Setembro/2020
1

GROOVES DO PARÁ: Transcrições, adaptações e variações para a bateria


dos ritmos Carimbó, Samba de Cacete e Lundu Marajoara.

Walter da Silva Almeida

Resumo: Neste artigo, objetivou-se descrever o percurso que norteou a criação de um produto
didático com informações contextualizadas sobre o processo de transcrições, adaptações e variações
para a bateria de levadas oriundas de grupos ativos do Carimbó de Vigia, do Samba de Cacete de
Cametá e do Lundu Marajoara de Soure, visando contribuir prioritariamente para com a formação de
alunos de bateria no Curso Técnico em Instrumento Musical da Escola de Música da Universidade
Federal do Pará. Para a elaboração do artigo e do produto, elegeu-se como principais referências
Matos (2004), Barsalini (2009,2014), Monteiro (2015), Monteiro (2016) Ferreira (2016) e Palmeira
(2017). A pesquisa desenvolveu-se por meio de uma abordagem qualitativa e, como ferramentas
metodológicas, apropriou-se de revisão bibliográfica, pesquisa de campo, entrevistas
semiestruturadas, registros em áudio e em vídeo, laboratórios experimentais − presenciais e on-line −
e, laboratório de gravação presencial, que deram suporte aos resultados alcançados e descritos, a
saber: transcrições, adaptações e variações acompanhadas de análises musicológicas das levadas e
dos grooves investigados que deram origem ao produto intitulado: “Grooves do Pará e-book”

PALAVRAS – CHAVE: Bateria, Grooves do Pará, Carimbó, Samba de Cacete, Lundu Marajoara.

Abstract: This paper aimed to describe the path that guided the creation of an educational product,
through contextualized information about the process of transcriptions, adaptations and rhythmic re-
creations of some drums pieces from Vigia’s Carimbó, Cametá’s Samba de Cacete and Soure’s
Lundu Marajoara, to be part of the training of Drums students of the Technical Course in Musical
Instrument of Federal University of Pará’s Music School. For its development, the main references
used were Matos (2004), Barsalini (2009, 2014), Monteiro (2015), Monteiro (2016) Ferreira (2016) and
Palmeira (2017). The research was developed through a qualitative approach and had as
methodological tools bibliographic review, field research, semi-structured interviews, experimental
laboratories - face-to-face and online ones - and face-to-face recording laboratory, which supported
the results achieved and described, namely: transcriptions, adaptations and variations accompanied
by musicological analyzes of the levadas and investigated grooves that gave rise to the product
entitled: “Grooves do Pará e-book”

KEYWORDS: Drums, Pará’s Grooves, Carimbó, Samba de Cacete, Lundu Marajoara.

INTRODUÇÃO

Desde que iniciei meus estudos em bateria, no Conservatório Estadual


Carlos Gomes e ingressei no curso de Licenciatura Plena em Educação Artística
com Habilitação em Música pela UFPA, no ano 2000, venho me interessando por
entender como um baterista deve atuar frente ao repertório regional paraense.
2

Recordo-me inclusive que, em meados daquele ano, ao ingressar no


mercado de trabalho como sideman1, fazendo participações em diversos grupos
musicais locais, sentia-me desprovido de informações e de experiências que me
dessem embasamento técnico-musical para uma performance mais consistente no
tocante ao repertório paraense2.
Em 2003, ano em que ingressei como baterista da Banda de Música da 8ª
Região Militar – Exército Brasileiro, constatei também a inexistência de partituras
específicas sobre os ritmos paraenses para a bateria, uma vez que constantemente
nas grades de partituras dos arranjos de Carimbó apresentados não havia bateria.
Assim, com o intuito de encontrar informações musicológicas a esse
respeito, procurei indagar meu professor de bateria na época, Mariano Primo3, sobre
onde e como poderia encontrar materiais didáticos direcionados à bateria nos ritmos
paraenses. Em resposta a este questionamento, o referido professor informou-me
desconhecer qualquer material escrito, no entanto, mostrou-me na prática como era
a sua forma de execução, alegando que esse tipo de ritmo era aprendido e
repassado aos interessados, na época, apenas oralmente.
Fato semelhante ao ocorrido na Banda do Exército ocorreu também durante
minha permanência nos anos de 2005 e 2006 no Curso Técnico em Instrumentista
de Bandas – Big Band – da Escola de Música da Universidade Federal do Pará –
EMUFPA, pois não recebia comumente partituras escritas para a bateria acerca dos
ritmos paraenses e, quando as recebia, geralmente constavam apenas contagens
de compasso com a indicação do nome do ritmo.
Com a pretensão de preencher de alguma forma a lacuna quanto à
exiguidade de materiais específicos, nos anos de 2008 e 2009, ao ministrar a oficina
de bateria na EMUFPA, codifiquei pela primeira vez em partituras algumas células
rítmicas do ritmo Carimbó a partir do que aprendera anteriormente com meu
professor e em minhas experiências profissionais. De 2013 a 2016, já baterista

1
Um sideman que traduzido significa ajudante, é um músico profissional contratado para executar ou
gravar com um grupo do qual ele ou ela não é um membro fixo.
2
Nessa época, o ritmo predominante era o carimbó gravado por bandas conhecidas em Belém,
dentre elas, Banda Fruta Quente, Banda Nova, Banda Warilou e, sobretudo, as gravações e releituras
do cantor Pinduca.
3
Baterista formado na primeira turma do curso técnico em percussão do Conservatório Estadual
Carlos Gomes no início década de 90, pelo professor paulista Luis Roberto Cioce Sampaio. Mariano
é integrante atual da Amazônia Jazz Band, atua como professor há mais de 20 anos, tendo
contribuído na formação profissional de bateristas importantes no cenário musical paraense, tais
como: Tiago Belém, Walter Almeida e Kaká Rodrigues.
3

concursado da Banda de Música da Guarda Municipal de Belém, investiguei um


pouco mais sobre os ritmos paraenses adaptados à bateria, por meio de diálogos
com diversos bateristas de Belém. Contudo, foi somente a partir de abril de 2016,
quando ingressei como professor efetivo de bateria na modalidade EBTT, Ensino
Básico, Técnico e Tecnológico na EMUFPA, somando-se à minha participação como
colaborador no Projeto de Pesquisa intitulado “A percussão nos ritmos paraenses”,
coordenado pelo Prof. Dr. Vanildo Palheta Monteiro, que me propus efetivamente a
produzir algum material acerca da adaptação dos referidos ritmos para a bateria.
Um dos questionamentos mais inquietantes surgiu no início do ano letivo de
2018, em uma aula na disciplina prática de conjunto, na EMUFPA, quando, ao
ensaiar a música Dança do Carimbó4, o discente de bateria André Oliveira
questionou-me o porquê de existirem tantos livros didáticos para a bateria sobre
jazz, samba, bossa nova, rock and roll, afro cubanos, ritmos nordestinos, entre
outros e, não existirem materiais com a mesma finalidade em relação aos “nossos
ritmos”. Essa mesma pergunta já me fazia há tempos. Outro discente baterista,
Lucas Viana, complementou: “Oh professor, o senhor bem que poderia fazer isso
por nós, sei lá, escreve um livro só de grooves5 do Pará!”
Ao refletir acerca de todas essas experiências somadas às necessidades
de meus alunos, foi que, ao me submeter ao processo seletivo para o Mestrado
Profissional em Artes UDESC/UFPA em abril de 2018, contemplei a possibilidade
de desenvolver um projeto de pesquisa que me proporcionasse suprir, em certa
medida, a lacuna existente quanto à baixa produção de materiais específicos.
Fui aprovado e ingressei no referido programa de mestrado em agosto de
2018, período que coincidiu com a minha atuação como orientador do discente de
bateria supramencionado, André Oliveira, na disciplina “Projetos e Produtos
Musicais II”. O trabalho deste aluno, “CARIMBÓ ESTILIZADO – palestra acerca dos
grooves de carimbó aplicados à bateria”, integrou-se a esta pesquisa de Mestrado
4
Música gravada pela Banda Nova no CD - O Novo Swing do Brasil Vol.1.
5
Groove é um termo comum entre os bateristas em todo o mundo que significa levada ou condução
rítmica. Outro conceito muito interessante e que também se encaixa aqui, ou, provavelmente em
qualquer contexto envolvendo música popular, é o de Berendt e Huesmann (2014), que afirmam
tratar de uma estrutura, na qual modelos rítmicos, também conhecidos como “patterns” (padrões) das
vozes se cruzam e se interpenetram causando um efeito de espontaneidade, autocondução, ou
mesmo ausência de esforço, cujas repetições proporcionam uma espécie de autopropulsão rítmica.
Nesse sentido, cabe também identificar o referido termo como similar a “ostinato”, mais usado em
música erudita para significar a repetição de um padrão melódico ou rítmico. Além dos referidos
significados, todas as vezes que o referido termo aparecer nesse trabalho, entenda-se como qualquer
ritmo adaptado e/ou escrito para a bateria.
4

com o intuito de emular os futuros laboratórios de variações rítmicas. Realizaram-se


oito laboratórios com duração de duas horas cada, com quatro alunos de bateria a
fim de registrarmos em partituras quais eram os grooves mais utilizados nas
gravações de carimbó da década de 70 até os dias atuais. Após diversas audições,
foram identificados e transcritos três grooves, sendo que o predominante na maior
parte dos áudios e vídeos analisados foi representado, com a transcrição a seguir:

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Portanto, após esta constatação, em um dos laboratórios, o discente José


Maria Jr disse:

[...] Professor, por que é que esse groove que nós encontramos na maioria
das gravações não se parece com o Carimbó, quero dizer [...] o Sr sabe
né? que a gente ouve nos curimbós [...] se você ouvir a bateria com
atenção, vai ver que não tem nada a ver com o Carimbó, digo o Carimbó
mesmo [...] é alguma coisa tentando ser Carimbó, mas não é Carimbó
mesmo! [...] você sabe o que é né professor? a batida do curimbó, aquela!
[...] tu - tum – tu – tu – tum – tu – tu – tum [...]. [Sic]

Ficou subentendido que o aluno referiu-se à célula rítmica denominada


“síncope característica”, que é a união de três figuras musicais (semicolcheia +
colcheia + semicolcheia), a ser abordada mais adiante.
A partir de então, cada vez mais imerso na investigação sobre os “grooves”,
já próximo ao término do semestre e da disciplina TCC 1, resolvi realizar, em junho
de 2019, um evento acadêmico na EMUFPA denominado Grooves do Pará, evento
em que houve masterclasses, apresentações artísticas e mesa-redonda, com vistas
a diálogos sobre a temática em questão no meio baterístico6 de Belém.
Foi um evento acadêmico que reuniu mais de 100 integrantes, inclusos
todos os alunos de bateria da EMUFPA, de outras instituições e, bateristas e
percussionistas autodidatas, fato que evidenciou dois principais anseios: (i)
aprender sobre os ritmos paraenses e suas adaptações para a bateria e (ii)

6
Expressão usada comumente para se referir a qualquer assunto que seja inerente aos bateristas ou
à bateria.
5

sistematizar e aprofundar esses conhecimentos na formação escolar. Pretensões


que confirmam a relevância desta pesquisa.

Figura 1 Figura 2

Fonte – Acervo do Autor (2019). Fonte – Acervo do Autor (2019).

Em uma das atividades previstas, a saber, uma roda de conversas,


ilustradas nas figuras 1 e 2, entre bateristas convidados (Figura 1, p.5 componentes
da mesa da esquerda para a direita: Charles Matos 7, Edvaldo Cavalcante8, João
Neves9, e Mariano Primo10) e inscritos no evento (Figura 2, p.5 alunos da EMUFPA
e demais participantes), debateu-se sobre o principal problema desta pesquisa: a
escassez de trabalhos sobre os ritmos paraenses adaptados para a bateria.
Algumas questões foram apontadas e ratificaram a necessidade de
delimitação da referida temática e de se definir a dimensão e a profundidade acerca
do conteúdo a ser abordado no curso técnico profissionalizante da
EMUFPA/Bateria, corroborando com o principal questionamento desta pesquisa:
Como suprir, em certa medida, a lacuna existente sobre ritmos paraenses
adaptados para a bateria, com um produto que se aplique à formação técnica
profissionalizante de bateristas em Belém? Os outros questionamentos foram: 1)
Onde pesquisar sobre os ritmos paraenses?; 2) Como e o que escrever sobre

7
Autor do Livro “Batuques Amazônicos”, livro didático versando integralmente sobre adaptações para
a bateria de ritmos paraenses.
8
Um dos bateristas performer mais experientes do cenário paraense. Já tocou com Fafá de Belém,
Leila Pinheiro, Pinduca, Nilson Chaves, Nazaré Pereira, Lia Sophia, Fagner, Ivan Lins, Aline Barros,
Jeff Gardner, entre outros.
9
Baterista paraense de longa experiência no cenário artístico. Integrou os grupos “Álvaro Ribeiro
Trio”, “Gema" e "Mini Paulo Quarteto”. Atuou com artistas como Nilson Chaves, Sebastião Tapajós,
Fafá de Belém e Cauby Peixoto.
10
Baterista mencionado (nota de rodapé 3).
6

esses ritmos?; 3) A oralidade seria suficiente para a compreensão desses ritmos?;


4) As transcrições seriam suficientes para a compreensão desses ritmos?; 5) Quais
materiais existem abordando a rítmica paraense adaptada à bateria e como eles
podem contribuir neste trabalho?; e 6) Quais ritmos paraenses seriam interessantes
constarem no produto a ser integrado à bibliografia do Curso Técnico em
Instrumento Musical – CTIM de Bateria da EMUFPA?
Inspirado por todos esses fatos e questionamentos, e na perspectiva de
tentar responder a essas questões norteadoras, avancei na pesquisa, que teve
como objetivo geral elaborar o produto arte-didático intitulado “GROOVES DO
PARÁ”, com informações contextualizadas sobre o processo das transcrições da
percussão, adaptações e variações rítmicas transcritas para a bateria das levadas 11
oriundas dos grupos ativos do Carimbó de Vigia, do Samba de Cacete de Cametá e
do Lundu Marajoara de Soure, e como objetivos específicos: 1) Suprir em certa
medida, a lacuna existente quanto à exiguidade de materiais acerca de adaptação
de ritmos paraenses para a bateria; 2) Otimizar a formação profissionalizante dos
alunos do CTIM − Bateria da EMUFPA; 3) Atender músicos em geral interessados
na temática da pesquisa.
Acerca dos ritmos, vale informar que a escolha se deu após enquetes
realizadas ao longo de anos de investigações informais e, em especial, aos
participantes do evento GROOVES DO PARÁ/2019, os quais indicaram os três
ritmos abordados nessa pesquisa como os que se têm mais interesse no
aprendizado em questão. Adicionado a esse fato, mesmo sabendo que existem
outros diversos ritmos no Estado do Pará, entendi que em se tratando de um
material que será utilizado prioritariamente na complementação de uma formação
técnica e também por esta pesquisa ter se emoldurado no padrão deste programa
de Mestrado Profissional, a saber, a compilação de um Artigo + Produto, a escolha
dos três ritmos oriundos de três municípios seria suficiente.
Além disso, acerca da escolha específica dos municípios, explico: dentre os
mais de 40 municípios onde incidem o Carimbó no Pará (IPHAN, 2014, p. 72),
Matos (2004), sendo o autor da obra mais antiga e precursora no tocante a

11
Levada é um termo comum usado entre os percussionistas populares para designar um padrão
rítmico. Em algumas regiões do interior do Pará, utilizam-se também outras expressões tais como
“batida” ou mesmo, ritmo. Neste trabalho, todas as vezes que aparecer o termo “levada”, este
indicará um determinado padrão rítmico executado por instrumentos de percussão, tocados
individualmente ou simultaneamente.
7

adaptações de ritmos paraenses para a bateria, o fez inicialmente no município de


Vigia – PA, transcrevendo e adaptando “uma” levada oriunda de apenas um grupo
em atividade na época, portanto, com o intuito de dar sequência a esta
investigação, optei pelo mesmo município a fim de encontrar outros grupos ativos.
Quanto à escolha pelo município de Cametá, incialmente foi com o
propósito de, previamente, investigar o “Siriá”, que é oriundo do referido município,
então, em campo, descobriu-se que o “Siriá”, ritmo que, segundo informantes, fora
criado por “Mestre Cupijó”, nada mais é do que uma cantiga12 do repertório de uma
manifestação que, por sua vez, dá nome ao ritmo “Samba de Cacete”.
Para a investigação sobre o Lundu Marajoara, Soure foi o munícipio
escolhido por ser conhecido como a “capital ou pérola” 13 do Marajó e por possuir o
grupo ativo mais antigo14 em atividade no referido município, razão pela qual talvez
se pudesse obter informações mais consistentes e relevantes em diversos
aspectos.
De início, este produto foi pensado para atender especificamente aos alunos
de bateria do CTIM da EMUFPA. Todavia, no decorrer da pesquisa, percebi que o
material poderia servir também como referência e fonte de consulta para outros
bateristas e outros músicos interessados na temática.
Nesse sentido, após realizar um levantamento bibliográfico, percebi que as
investigações acerca da bateria nos ritmos paraenses ainda se encontram em fase
embrionária, apesar da projeção do Carimbó Urbano, no qual a bateria está inserida
desde a década de 50 (MESQUITA, 2014), até sua expansão midiática atual.
Vale informar que a presente pesquisa é qualitativa, pois os pressupostos
teóricos adotados estão intrinsecamente ligados à ideia de que considera a
realidade como uma instância em interação dialética com o sujeito e não apenas
com o fenômeno por si (FREIRE, 2010). Conceito que me impulsionou a estar
sempre atento aos agentes envolvidos na pesquisa e a ouvi-los de forma minuciosa
e criteriosa, pois percebi, em campo, que as peculiaridades musicais de cada

12
Cantiga, segundo informantes, são canções do repertório do Samba de Cacete, que são entoadas
durante uma festividade em que se comemora, por exemplo, o período de colheita ou mesmo plantio
de uma safra de determinado alimento, podendo também se relacionar com dias comemorativos e
honrarias a “santos” católicos.
13
Informação encontrada no site da prefeitura do município, disponível em
<https://www.soure.pa.gov.br/o-municipio/sobre-o-municipio/>, Acesso em: 15 Jul. 2019.
14
O Grupo de Tradições Marajoara "Cruzeirinho" foi fundado em 22 de agosto de 1987, dia do
folclore em Soure ilha de Marajó, Pará, disponível em
<https://www.facebook.com/grupocruzeirinhooficial/>, acesso em: 16 Jul.2019.
8

manifestação se relacionam intrinsecamente com a interpretação pessoal ou de


cada grupo inserido no contexto que o cerca.
A partir daqui, este artigo se dispõe organizado em três partes, a saber:
A primeira – ENTRE LIVROS E PESQUISAS – apresenta uma
análise/reflexão acerca da literatura investigada sobre adaptações de ritmos
brasileiros para a bateria, sobretudo os voltados à rítmica paraense, bem como os
critérios de transcrição musical destes, e no que eles contribuíram para a segunda
parte.
A segunda – TRANSCRIÇÕES E ADAPTAÇÕES – compreende a
elaboração das transcrições da percussão seguidas de análise descritiva, bem como
de adaptações e transcrições para a bateria (grooves) das levadas de Carimbó, de
Samba de Cacete e de Lundu Marajoara, encontradas em grupos ativos nos
municípios paraenses de Vigia, Cametá e Soure respectivamente, processo que
sustenta a terceira parte.
A terceira – VARIAÇÕES E PRODUTO – trata-se do processo que originou
a criação de 35 variações (grooves) a partir das 7 adaptações (grooves), resultantes
de observações, análises, experimentações individuais e coletivas, proposições, e
de alguns critérios oriundos de reflexões, referenciais teóricos, questionários,
laboratórios on-line15 e, laboratório de gravação realizados com alunos ingressos e
egressos do CTIM – BATERIA – EMUFPA e um baterista profissional local,
contribuindo desta feita para a elaboração do produto final desta pesquisa −
Grooves do Pará e-book.

ENTRE LIVROS E PESQUISAS


Na maioria dos livros didáticos de bateria em que se abordam ritmos
brasileiros adaptados da percussão, a exemplo de Rocha (2007) e Bolão (2010) –
livros didáticos que inclusive fazem parte da bibliografia do CTIM com habilitação em
bateria da EMUFPA, os autores dispõem sequencialmente os conteúdos descritos, a
seguir: a) dados históricos dos ritmos abordados; b) a organologia instrumental; c)
bula de sinais; d) transcrições da percussão com suas adaptações para a bateria; e)
variações criadas a partir das adaptações, segundo a percepção e criatividade do

15
A coleta de dados para esta fase da pesquisa estava prevista para ocorrer, em sua maior parte na
modalidade presencial, todavia, em face do isolamento social ante a Pandemia do Covid-19, teve que
ser adaptada para atividades a distância, via internet.
9

autor. Nesse sentido, optou-se nesta pesquisa, por este modelo conteudístico, por
entendermos ser este, suficiente à aplicação teórica e prática para com os alunos
em nível de profissionalização técnica.
Semelhantemente, Matos (2004), ainda que não apresente a organologia
instrumental e a bula de sinais, serviu-nos como referência por ser a primeira
publicação integral acerca de adaptações para a bateria de ritmos paraenses,
publicação de conteúdo inédito e, além disso, com muitas variações rítmicas criadas
pelo autor, com o intuito de, além de incialmente registrar em partituras as levadas
da percussão e adaptá-las para a bateria, expôs suas ideias de variações a partir
das adaptações oriundas de observação e registro da performance da percussão
encontrada em campo, caminho metodológico norteador da presente pesquisa.
Monteiro (2015) registra diversos ritmos amazônicos, bem como suas
adaptações para a bateria, dentre eles, o Carimbó de Marapanim-PA. Apresenta
informações contextualizadas, descrição organológica dos instrumentos de
percussão, notas técnicas de execução das partituras da percussão e bateria, o que
contribui para o enriquecimento de registros via percepção em campo da percussão
e enumera novas ideias estéticas para a adaptação à bateria denominadas pelo
autor de “sugestões de levadas”, classificando-as em A) Levadas com percussão, ou
seja, grooves simples, denominados pelo referido autor de “levada mais reta”
sinalizando que neste caso, deve-se usar quando a bateria atua juntamente com a
percussão, e B) Levadas sem percussão, isto é, grooves para serem tocados pela
bateria sem a presença da percussão, nesse caso, tentando, assumir a função da
percussão, sendo esta, a mesma ferramenta metodológica a ser utilizada para a
composição dos primeiros grooves oriundos das levadas da percussão, parte dois
deste artigo, denominada “Transcrições e Adaptações.”
Ferreira (2016) realiza uma descrição contextualizada da manifestação da
Marujada de São Benedito, bem como “traduções para a bateria e percussão
corporal”. Faz uma descrição analítica de caráter etnográfico, pois teve como alvo
contemplar alunos da educação básica, técnica e temas transversais da cultura afro-
brasileira e indígena. Trabalho que ratifica a necessidade de se produzir materiais
escritos com essa abordagem com vistas à valorização de riquezas rítmicas
paraenses até então pouco exploradas na academia.
10

Fora do Pará, dentre as pesquisas acadêmicas existentes sobre a


adaptação de ritmos brasileiros para a bateria que tiveram como foco principal
transcrições e adaptações analíticas das levadas oriundas dos instrumentos de
percussão, destaca-se Barsalini (2009, 2014), mestrado e doutoramento
respectivamente. Neste último, o autor retrata, em sua visão, a função e, por
consequência, o significado da bateria na música brasileira:

Em sua trajetória na música brasileira [...] a bateria alternou períodos nos


quais dividiu a tarefa de estabelecer o ritmo junto a pandeiros, tamborins,
surdos, ganzás, etc., passando por contextos em que, substituindo todo
esse instrumental, assumiu total autonomia na realização das funções
percussivas. Nessa alternância, a presença da bateria trouxe sempre a
representação de um ideal de modernização. (BARSALINI, 2014, p. 228).

Poderíamos certamente substituir as palavras “pandeiros, tamborins e


surdos” do excerto acima, por “maracas, cacetes e curimbós”, por exemplo, se na
história da música paraense isso houvesse ocorrido de forma explícita. Contudo,
ainda que por ora não se possa afirmar esta similaridade na alternância funcional
rítmica e histórica entre a bateria e a percussão paraense, o que nos proporcionaria
transcrever e analisar o que já estaria posto, a ideia de revezamento funcional,
adotada e supramencionada tanto por Monteiro (2015) quanto por Barsalini (2014),
indica, no mínimo, dois critérios funcionais a serem utilizados neste trabalho para a
criação das variações oriundas das adaptações a serem vistas mais adiante.
Similarmente, Leppaus (2019) afirma que, por não identificar em suas
pesquisas, trabalhos acadêmicos e/ou produção bibliográfica profissional que trate
ou se aprofunde sobre o processo de adaptação para a bateria de ritmos brasileiros,
optou por criar sua própria metodologia com vários critérios e observações, dentre
os quais, destaca-se e, é relevante para o nosso trabalho, a tentativa de reproduzir
na bateria, as levadas dos instrumentos de percussão, como que assumindo a
função destes, como o aspecto primordial no processo de adaptação.
Na dissertação de mestrado de Rafael Palmeira (2017), intitulada
“Adaptações dos ritmos do candomblé Ketu na Bateria”, o referido autor apresenta
análises descritivas e acuradas das transcrições e adaptações dos ritmos oriundos
da percussão, bem como um modelo estrutural (Memorial – Artigo – Produto) que
serviu como importante modelo para a organização e construção deste artigo e
produto. Vale ressaltar que o referido autor evidencia em seu produto uma proposta
11

didática de absorção progressiva dos grooves criados para a bateria, inserindo no


livro-método, exercícios preparatórios para este fim, os quais serviram de modelo ao
produto final – E-Book – desse trabalho.
Em suma, a observação desses materiais revela a bateria como alvo
principal de estudo, a transcrição da percussão como matéria prima para as
adaptações e um panorama de livros didáticos e pesquisas acadêmicas que têm
como foco principal adaptações para a bateria de ritmos oriundos da percussão.
Nesse sentido, cabe ainda fortalecer o significado e a importância que as
transcrições e a adaptações possuem neste trabalho, haja vista se entender

A transcrição musical como um longo processo de citação de materiais, no


qual o mediador do processo, seja um tradutor (no caso da poesia ou
literatura) ou compositor, remete-se constantemente ao original, sem perder
de vista o novo código para o qual ele verte a obra em questão [...] no qual
o compositor se baseia em uma obra preexistente (e que lhe serve de ponto
de referência bastante forte ao qual se remete), deixando suas próprias
marcas estilísticas no material transcrito. (BOTA, 2008, p. 1).

Ou seja, a transcrição da percussão foi realizada como parte fundamental


neste processo inicial de adaptação para a bateria, que acompanhada dos relatos
contextualizados da pesquisa de campo e das análises musicais, coadunam-se com
a afirmativa de Cardoso (2006): [...] “um texto descritivo deve acompanhar a
transcrição, não como um simples complemento, mas como parte integrante da
própria transcrição”. (CARDOSO, 2006, p.72).

TRANSCRIÇÕES E ADAPTAÇÕES
As adaptações das levadas de Carimbó de Vigia, do Samba de Cacete de
Cametá e do Lundu Marajoara de Soure foram realizadas a partir da experiência
deste pesquisador nas localidades e do registro feito em campo com gravações em
áudio e vídeo. Em face disso, a percepção das manifestações está centrada na
transcrição e análise musical como ferramentas metodológicas essenciais, em que a
observação da percussão somada à descrição dos elementos rítmicos foi
potencializada por meio da interação entre o pesquisador e os agentes dessas
manifestações, viabilizando desta feita adaptações com verossimilhança das
levadas.
12

Isto posto, para todas as transcrições feitas da percussão, o primeiro passo,


em campo, foi a imersão nos ritmos a fim de interagir com os tocadores dos grupos
investigados em suas respectivas localidades. Em cada contato, procurou-se
compreender a performance musical não somente ouvindo e entrevistando, mas
sobretudo buscando ter uma experiência musical, a fim de descrever o processo,
conforme apontado por Freire (2010):

O ponto de partida é a experiência musical, seja através da interpretação ou


da audição (de outro intérprete, ao vivo ou gravada). A partir dessa escuta
inicial, começa-se a aprofundar a experiência com novas escutas, a partir
das quais começam a emergir, segundo a percepção do ouvinte, os
elementos principais que irão conduzir à descrição da forma, analisada
através da experiência musical. (FREIRE 2010, p. 39).

Com base nesses argumentos, a experiência musical em campo foi o ponto


inicial para as transcrições das levadas da percussão, que sucedidas de exaustivas
audições, tornaram-se referências significativas para as adaptações. Sendo assim, a
seguir, dispõem-se as transcrições e adaptações analisadas, adicionadas de
informações contextualizadas e alguns relatos oriundos de entrevistas.

Carimbó – Vigia
O Carimbó em âmbito musical geral apresenta um ritmo sincopado e possui
formação instrumental essencialmente percussiva, contendo maracas, matracas,
xeque-xeques, chocalhos, pandeiros, rufos e tambores, acompanhados geralmente
por banjo e instrumentos de sopro.
O tambor carimbó16 também denominado curimbó17 é um elemento
indispensável que denominou a manifestação, estando presente em todas as
regiões de sua incidência. Vicente Chermont de Miranda (1906) em “glossário
paraense” descreve o instrumento musical carimbó como:

Tambor de origem africana [...] Feito de um tronco, internamente escavado,


de cerca de um metro de comprimento por 30 cm de diâmetro. Sobre uma

16
O termo carimbó nasceu da denominação dos tambores fabricados de troncos de árvores
escavadas, com uma das extremidades coberta de pele de animal silvestre, que medem
aproximadamente 1 metro de comprimento e variam entre 35 e 65 centímetros de diâmetro,
chamados de curimbó. Os conjuntos musicais utilizam de 2 a 3 curimbós, os mais longos para os
sons agudos e o mais largo para os graves (FIGUEIREDO e BÓGEA, 2015, p.83,84).
17
Monteiro (2016) dentre diversas significações descritas em sua tese, cita a expressão de origem
tupi, curi, significando “pau oco” e m‘bó, pau “escavado ou furado”.
13

das aberturas se aplica um couro descabelado de veado, bem teso. O


tocador senta-se sobre o tronco e bate no couro com uma cadência típica,
servindo-lhe de baquetas as próprias mãos. (CHERMONT, 1906, p.23).

Genericamente, em âmbito cultural, o Carimbó tem notada importância, por


ter sido reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro18 em setembro de
2014. Segundo registros do IPHAN (2014), o Carimbó incide em 40 municípios
paraenses, denotando assim, uma diversidade de “carimbós” existentes. Dada a
essa diversidade, a fim de realizar um recorte geográfico, optou-se neste trabalho
pelo município de Vigia de Nazaré-PA19.
Nesse município, a pesquisa de campo foi realizada nos meses de julho e
agosto de 2019, período em que foram encontrados três grupos ativos, a saber:
Grupo Beija-Flor, Grupo Canarinhos e Grupo Os Manos. Neste último, observaram-
se duas formações de percussionistas em dias distintos, sendo que a segunda
formação, denominou-se “Os Manos 2”, por conta disso, foram registradas em áudio
e vídeo, ao todo, quatro levadas diferentes, bem como quatro grooves adaptados
para a bateria. O grupo Beija-Flor é atualmente liderado pelo Mestre Lico, filho do
falecido Mestre Lucinho. Lico nos contou um pouco sobre a história do grupo:

Meu pai, mestre Lucinho, era filho de Leôncio Silva Martins e Emília Etelvina
Palheta, conhecida por dona Neca, descendente de pais escravos [...]
Papai, quando rapaz aprendeu a bater o tambor [...] Dona Neca, minha avó
participava de “rodas de carimbó” [...] então em Vigia, papai mandou retirar
o pau e construiu dois tambores, ensinou seu primo-irmão Joaquim
Nascimento Palheta a bater o tambor e seu outro primo-irmão Domingos
Nascimento Palheta sacudia a maraca. Então, passaram a tocar o carimbó.
Após, construiu outro tambor. Lucinho convidou Delcides Souza de Jesus,
Raulzinho, o irmão Vavazão e o Filho “Gelo” para fundar um grupo de
carimbó Beija-Flor em agosto de 1969. [Sic] (informação verbal)20

Nesse grupo, no tocante à percussão, observou-se a seguinte configuração


instrumental: três curimbós (Figura 3, p.14), o grave, nominado “base” (ao centro), o
médio nominado de “repinique” (à direita) e o agudo nominado “requinta” (esquerda);
um par de maracas (Figura 4, p.14).
18
<http://portal.iphan.gov.br/pagina/detalhes/1052>, Acesso em: 15 de Dezembro de 2019.
19
Localização: Localizado na área intermediária e imediata de Castanhal, na Região de Integração do
Guamá e Polo Turístico Amazônia Atlântica. Distância da capital (km): 101 km via trajeto rodoviário e
77 km em linha reta. Área total do município (km2): 539,079. População total (nº hab.): Segundo o
Censo 2010, são 47.889 pessoas e pela estimativa de 2017 são 52.216 pessoas com densidade de
88,83 hab/km. Municípios limítrofes. (SETUR, 2017).
20
Entrevista concedida e autorizada por Elielson Antônio Souza Martins – Mestre Lico [Jul. 2019].
Entrevistador: Walter da Silva Almeida. Vigia, 2019. 1 arquivo. mpg (51min.).
14

Figura 3 - curimbós Figura 4 - maracas

Fonte: Acervo do Autor, 2019. Fonte: Acervo do Autor, 2019.

Para melhor compreender a transcrição, foi criada a seguinte bula (figura 5,


p.14)21:

Figura 5 - Bula dos sinais utilizados na transcrição dos instrumentos de percussão

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

21
Essa bula será usada para todas transcrições das levadas de percussão dos grupos de Carimbó e
Lundu Marajoara registradas nesta pesquisa.
15

Transcrição 1 – Levada de Carimbó do Grupo Beija-Flor de Vigia – PA

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Nesta transcrição 1 (p.15), tanto a maraca base quanto a rítmica, de som


similarmente agudo, apresentam as acentuações constantes nos contratempos,
contrastando com as acentuações nas cabeças dos tempos dos Curimbós,
produzindo, dessa forma, uma sensação de pergunta e resposta, e como afirma
Francis (1987), ao mesmo tempo sobrepõe tensão e relaxamento no ritmo, o que
podemos denominar de “balanço”, tradução para uma expressão característica e
muito comum em música popular − swing, que dá uma sensação de movimento
circular, conforme a figura 6 (p.15) a seguir:

Figura 6 – análise: maraca base x curimbó requinta

Fonte: Elaboração do Autor, 2019


16

Além disso, este balanço é otimizado por outra sonoridade presente que é
produzida pela movimentação das esferas ou sementes dentro das maracas. Esta
sonoridade é como um movimento de arrasto, em que as esferas ou sementes se
movimentam com certo atraso em relação às notas reais grafadas na partitura,
porém este todo sonoro representa nessa e nas demais levadas de Carimbó,
observadas em campo, a função de

Pulsação elementar: é a pulsação contínua de valores de tempo mínimos.


Este timing é concretizado acusticamente ou através de movimentos,
significando a menor distância entre impactos sonoros e/ou de movimentos;
[...] Na prática esta acentuação se dá, por exemplo, na execução de um
padrão de chocalho na bateria de samba que preenche as pulsações
elementares ininterruptamente, [...] pulsação elementar como “metronome
sense”. (PINTO, 2001, p. 239).

Ainda sobre as maracas, vale acrescentar que, enquanto a maraca base


cumpre a função correspondente ao seu nome, isto é, manter um padrão constante
(base), servindo como sustentação e manutenção do andamento, a maraca rítmica,
por sua vez, executa variações improvisadas como se pode observar na transcrição
do último compasso da levada (Transcrição 1, p.15).
Observou-se em campo que existem outras variações improvisadas que os
tocadores da maraca rítmica executam. Então, depreende-se de sua nomenclatura o
sentido de “rítmica” como a que incrementa o ritmo de forma improvisada.
Quanto aos curimbós, o base, por ser o mais grave e ser batido em todas as
semicolcheias com a técnica de mão que produz som aberto, possui uma
sonoridade expansiva por conta das notas que soam como ligadas, que combinadas
com as acentuações constantes nas 1ª e 4ª semicolcheias de cada tempo, dão a
impressão de marcação que se assemelha ao surdo de samba adaptado ao bumbo
da bateria. Ressalta-se que os 3º e 4º compassos representam também uma
espécie de improviso que apenas ocorre, segundo Mestre Lico, “quando o ritmo
esquenta, ou quando vai passar pra outra parte” (informação verbal)22, referindo-se à
passagem, por exemplo, de uma estrofe para o refrão ou mesmo de uma música
para outra.

22
Entrevista concedida e autorizada por Elielson Antônio Souza Martins – Mestre Lico [Jul. 2019].
Entrevistador: Walter da Silva Almeida. Vigia, 2019. 1 arquivo. mpg (51min.).
17

Já na execução do repinique (tambor médio que fica entre o base e o


requinta, e, segundo os tocadores, faz um certo “repinicado”), fica evidente a célula
rítmica conhecida como síncope característica (figura 7, p.17), pois todos os
contratempos são preenchidos por notas com a dinâmica inferior as demais, logo, os
toques mais fortes ficam nas 1ª, 2ª e 4ª semicolcheias, como que se estivesse
tocando-a:
Figura 7 – síncope característica

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Esta célula é uma das principais constatações da presença negra no


Carimbó, podendo se assemelhar com outros diversos gêneros brasileiros, conforme
afirma Monteiro (2016):

[...] a “síncope característica”, tal qual verificada nos primeiros gêneros


populares brasileiros - modinhas, lundu e tango/choro, tratados por
Cançado (2000); no samba, abordado por Mukuna (2006); e, no maxixe,
constatado por Andrade (1989), pode ser encontrada, dentre outras
manifestações brasileiras, no Ritmo do Carimbó. (MONTEIRO, 2016,
p.197,198).

Por fim, a requinta, cuja nomenclatura, segundo Mestre Lico, foi dada pelos
“mestres mais antigos” em analogia à clarineta. Esse curimbó, além de evidenciar
também a síncope característica, apresenta uma sonoridade que reforça, na levada,
o swing, anteriormente mencionado na relação maracas x tambores, pois este, por si
mesmo contrasta os toques abertos na 1ª semicolcheia de cada tempo com os
toques fechados, com som de tapa nos contratempos.
Após realizar a transcrição e análise descrita anteriormente, com vistas à
adaptação, elencaram-se três aspectos musicais substanciais para a manutenção do
caráter identitário dessa levada: o swing (relação maraca base x curimbó requinta), a
similaridade com o samba (curimbó base) e a presença da síncope característica
(repinique).
Além disso, é importante salientar dois aspectos nessa fase da pesquisa: o
primeiro, é que a transcrição, bem como a adaptação foram pautadas na visão,
18

compreensão, interpretação deste pesquisador, que, por sua vez, marca uma
identidade aos símbolos gráficos e sua significação relacionada à sonoridade
observada em campo; o segundo, é que da mesma maneira em que se buscou
verossimilhança entre o que se observou na performance da percussão e seu
registro em partituras, buscou-se adaptar para a bateria intentando projetar na
mesma similaridades quanto à rítmica da levada.
Para a notação a ser utilizada em todas as adaptações e variações para a
bateria desenvolvidas nesta pesquisa, foi elaborada a seguinte bula:

Figura 8 - Bula sinais dos utilizados para as transcrições para a bateria

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Adaptação 1 – Groove Beija-Flor

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

A intenção neste groove (Adaptação 1, p.18), assim como nos próximos seis
grooves, é traduzir do idioma percussivo para o idioma baterístico a estrutura rítmica
que se considera elementar na levada desse e dos demais grupos.
O bumbo é similar à levada do curimbó base, que se parece com um bumbo
de samba. O surdo representa ao mesmo tempo a síncope característica do curimbó
19

repinique e o contratempo do curimbó requinta, este último reforçado pelo chimbal


com o pé. O tom1 representa ao mesmo tempo a síncope característica do curimbó
repinique e o acento nas cabeças dos tempos do curimbó requinta. Quanto às ideias
rítmicas de variações do curimbó base nos 3º e 4º compassos e da maraca rítmica,
no 4º compasso, optou-se por tomá-las como uma possível referência para a fase
das variações.
O grupo Os manos é liderado pelo batedor23, historiador e escritor vigiense,
Paulo Cordeiro24, mais conhecido como “Prof. Paulo”, que juntamente com o
fotógrafo e também batedor do grupo, Amazo Alcântara, nos concederam entrevista,
fornecendo-nos informações históricas, sociais e musicológicas do Carimbó
vigiense, um breve histórico do grupo, bem como, posteriormente, foi possível ouvi-
los tocar e filmar a performance do grupo em duas ocasiões e formações distintas.
Quando inquiridos sobre a história do grupo, merecem destaque as afirmativas dos
entrevistados25:
Prof. Paulo: [...] a igreja é uma das que junto com o código de postura de
1974, proibiu o Carimbó de participar das festividades, contudo, o curioso é
que nesse mesmo período, acontece o primeiro festival de Carimbó de
Vigia, de lá pra cá, mesmo com todo o descaso, não parou mais [...] [Sic]

Amazo: Muita gente vem aqui pesquisar sobre o Carimbó, mais sobre a
história, legal, vocês vieram pesquisar sobre a música, isso nos impulsiona
a acreditar que nossa música tem raiz e é boa [...] [Sic]

Prof. Paulo: Bem, quanto à origem do Carimbó, é cultura, né? Não tem uma
certidão de nascimento, porém o nosso grupo é novo, foi fundado no dia
dois de Julho de 2017, o nosso foco é o Carimbó, né? Somos um grupo
tradicional de pau e corda, mas sabemos que outros instrumentos como a
bateria estão aí desde o Pinduca, né? E que bom que vocês querem
ampliar o conhecimento vindo aqui com a gente [...]. [Sic]

A afirmativa torna-se relevante, uma vez que, em face da discriminação


relatada, os entrevistados mostraram-se dispostos a colaborar com a pesquisa a fim
de que se valorize e fortaleça o Carimbó enquanto manifestação, promovendo-o e
expandindo seu campo de conhecimento, nesse caso, pelo enfoque rítmico,

23
Termo comumente usado nos grupos de Carimbó para denominar o percussionista do tambor
curimbó/Carimbó.
24
Vigiense, nascido em 06 de abril de 1964, é graduado em Licenciatura e Bacharelado em História
pela ESMAC. Especialista em Saberes Africanos e Afro-brasileiros na Amazônia pela UFPA.
Publicou vários artigos nos jornais de Vigia. É sócio da Sociedade Literária e Beneficente “Cinco de
Agosto; Membro da Academia de Imprensa de Belém e da Academia Curuçaense de Letras, Artes e
Ciências.
25
Entrevista concedida e autorizada por Paulo Cordeiro e Amazo Alcântara [Ago. 2019]. Entrevistador
Walter da Silva Almeida. Vigia, 2019. 1 arquivo. mpg (35 min.).
20

percussivo e baterístico, sem qualquer resistência, quanto à modernização, talvez


por entender a necessidade da pesquisa e o benefício que poderá trazer à
valorização da manifestação.
Quanto aos aspectos musicológicos, em especial os percussivos, alvo
substancial de investigação nesta pesquisa, seguem algumas colocações dos
entrevistados26:
Prof. Paulo: É interessante que nas minhas entrevistas com um dos
senhores lá do cacau – Tauaparazimba – que ao que tudo indica, foi o
primeiro grupo de Carimbó da Vigia. Tauapará era a fazenda de cacau do
outro lado do rio, numa comunidade quilombola que tem lá, Zimba era o
nome que os escravos davam pro ritmo do Carimbó [...] Eles tinham quatro
tambores, que eles amarrravu, isquentavu o coro, quando afroxava [...] Hoje
na Vigia, você tem três tambores, nos outros grupos, também têm três
tambores.[Sic]

Amazo: A gente tem o tambor de base que é o Marcação, esse não varia,
tem o repinique, que é o do meio que faz o repinicado e tem a requinta, só
que essa requinta, que é o tambor menor, ela fica livre, ela marca, ela
improvisa, ela dá a virada chamando já a outra música, mas as vezes a
gente toca com dois, daí o repinique pode virar requinta [Sic]

Nesse grupo, no tocante à percussão, observaram-se duas configurações


instrumentais, sendo a primeira – para a denominação “Os Manos” – três curimbós,
o grave nominado marcação – verde à esquerda (figura 10, p.20), o médio nominado
repinique – vermelho à direita (figura 10, p.20) e maracas (figura 11, p.20), faltando o
curimbó requinta, que neste dia estava em outra localidade e a outra configuração,
com outra formação de tocadores, foi a mesma utilizada pelo Grupo Beija-Flor, pois
emprestaram o material deste, já que tocaram no mesmo dia e local, denominada
“Os Manos 2”, e nesta formação, nominaram o curimbó grave de marcação.

Figura 9 - curimbós Figura 10 – maracas

Fonte: Acervo do Autor, 2019. Fonte: Acervo do Autor, 2019.

26
Entrevista concedida e autorizada por Paulo Cordeiro e Amazo Alcântara [Ago. 2019]. Entrevistador
Walter da Silva Almeida. Vigia, 2019. 1 arquivo. mpg (35 min.).
21

Transcrição 2 – Levada de Carimbó do Grupo Os Manos de Vigia – PA

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Nesta levada (transcrição 2, p.21), é interessante observar que foram


encontradas características rítmicas similares às encontradas na levada grupo Beija-
Flor, como o swing, na relação dos tambores com as maracas e a pulsação
elementar – timing – proporcionado pelas maracas (FRANCIS, 1987 e PINTO,
2001), contudo, algumas peculiaridades merecem destaque nessa análise.
A rítmica apresentada pelo curimbó requinta, ao iniciar os dois primeiros
compassos com toques fechados, e os dois últimos compassos com a síncope
característica, transmite um diálogo, pergunta e resposta, pergunta nos 1º e 2º
compassos e resposta nos 3º e 4º compassos.
Ainda sobre o curimbó requinta, o desenho rítmico no 2º compasso é quase
idêntico ao do 1º compasso, a diferença está apenas na última semicolcheia do 2º
tempo do 2º compasso, que, ao anteceder a primeira semicolcheia do próximo
compasso, na mesma região do tambor e, com a mesma sonoridade − som aberto –
intenciona uma espécie de chamada para a resposta rítmica dos 2º e 3º compassos.
O curimbó repinique tocado em ostinato com as três primeiras semicolcheias
com som aberto, e a última com o som fechado, possui muita similaridade com
22

padrões da caixa de escolas de samba, provavelmente oriunda da influência negra


na rítmica do Carimbó vigiense.
Nessa levada (transcrição 2, p.21), a síncope característica aparece de
forma explícita no curimbó requinta (tempo 1 do 3º e 4º compassos) e de forma
implícita na combinação sonora formada pelas 1ª e 2ª semicolcheias do curimbó
repinique quando adicionadas da 4ª semicolcheia do curimbó requinta, nos primeiros
tempos do 1º e 2º compassos e de igual forma, no 2º tempo do 2º compasso.

Adaptação 2 – Groove Os Manos

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Nesse groove, (Adaptação 2, p. 22), o bumbo representa o curimbó base,


que adicionado do contratempo no chimbal com o pé, representando os acentos das
maracas (base e rítmica) soa exatamente como um bumbo de samba na bateria.
O surdo na bateria representa o ritmo em 4 semicolcheias do curimbó
repinique, que por ser tocado com apenas uma das mãos, não alterna nesse caso a
manulação, como tocado com as duas mãos no curimbó. Além disso, as últimas
semicolcheias de todos os tempos, tanto do curimbó repinique quanto do curimbó
base (transcrição 2, p.21) foram adaptados para o surdo com acento nas quartas
semicolcheias que, quando executado paralelamente com o bumbo ou com o bumbo
e com o tom 1, produzem sonoridade semelhante ao curimbó com o som de tapa
(Adaptação 2, p. 22).
O tom 1 representa o padrão rítmico do curimbó requinta, que repete a
mesma ideia de pergunta e resposta e que de igual modo, e parece muito com uma
espécie de samba no estilo partido alto, o que reforça a similaridade desse groove
com o samba em âmbito geral. Isto se deve, segundo relatos dos integrantes deste
grupo, ao fato de que a rítmica do Carimbó de Vigia teve origem nos quilombos de
negros que trouxeram essa cultura musical e percussiva da África.
23

Transcrição 3 – Levada de Carimbó do Grupo Os Manos 2 de Vigia – PA

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Nesta transcrição 3 (página 23), correspondente à segunda formação ativa


do respectivo grupo − Os Manos 2 − percebe-se que, talvez por haver no dia
apenas um tocador para as maracas, que o mesmo executa uma rítmica em que
alterna ora tocando como maraca base (compassos 1, 2 e 3), ora como maraca
rítmica (compasso 4).
Quanto aos curimbós repinique e repique, tocam quase que em uníssono,
exceto pela diferença entre as regiões percutidas nas peles dos curimbós, o tempo
todo com som aberto, evidenciando a síncope característica nos primeiros tempos
de todos os compassos. Já a rítmica do curimbó marcação, denominado também de
curimbó base e é o mais grave, é idêntica à executada pela formação 1 – Os Manos
– provavelmente por ser o mesmo batedor, nas duas formações.

Adaptação 3 – Groove Os Manos 2

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.


24

Neste groove (Adaptação 3, p.23), o tom 1 representa ao mesmo tempo, os


curimbós requinta e repinique já que na levada eles executam quase um uníssono
rítmico. O surdo foi usado para configurar o curimbó marcação, que nesse grupo
representa o curimbó mais grave, que dentro de uma lógica timbrística deveria ser
representado pelo bumbo da bateria, contudo, dessa vez, na intenção de simular o
toque fechado com som de tapa das quartas semicolcheias do curimbó marcação,
este pesquisador resolveu usar o surdo, para simular as referidas notas por meio da
técnica de “rim shot27”, proporcionando assim maior similaridade.
O bumbo, sendo o tambor mais grave e de produção de maior volume,
representa a marcação das cabeças dos tempos de todos os curimbós soando
juntos. Já chimbal com o pé representa os contratempos acentuados pelas maracas,
característica, até aqui, percebida como indissociável ao Carimbó.
O Grupo Os Canarinhos atualmente é liderado por Valdemir Sousa Santos,
conhecido em Vigia por “Mestre Pêqui”, que não pôde dar entrevista, pois durante
esta pesquisa de campo encontrava-se enfermo. Todavia, seu neto, Gleydson
Gomes, conhecido como “Roca”, cantor e batedor, juntamente com Amazo
Alcântara, também batedor de curimbó nesse grupo, falaram um pouco sobre a
história, bem como sobre características musicais, e no decorrer da entrevista
tocaram levadas de Carimbó, as quais foram registradas em áudio e em vídeo.
Quando indagados sobre a história do grupo, Roca e Amazo explanaram
(informação verbal)28:

Roca: “É na verdade o grupo é lá do Riozinho, uma localidade aqui de Vigia,


o meu avô é de lá, o mestre, o nosso mestre de Carimbó, aí ele começô lá
[...] na verdade cumeçô da tia dele, a Anacleta, tia avó, e dessa tia ele
começo a tocá e formô o grupo lá no interior. [Sic]

Amazo: ela era considerada uma das tias do Carimbó [...] eram várias tias,
tia Pê, Anacleta, tia Luiza Fragata, elas faziam as festas nos terreiros. [Sic]

Roca: hoje nosso grupo é praticamente formado por família [...] meu avô
toca o banjo, eu toco e canto, minha mãe canta e agora meu filho também
nas maraca [...] nosso grupo tem 46 anos. [Sic]

27
Rim Shot, que traduzido significa “tiro de aro” é uma técnica que consiste em golpear qualquer
tambor, na pele e no aro simultaneamente, produzindo um som fechado, seco e estalado como que o
som de um “tiro”.
28
Entrevista concedida e autorizada por Gleydson Gomes e Amazo Alcântara [Ago. 2019].
Entrevistadores Walter da Silva Almeida e Vanildo Palheta Monteiro. Vigia, 2019. 1 arquivo. mpg (27
min.).
25

Ao iniciarmos a entrevista, Roca, sentado, segurava um tambor, parecido a


um tantã (figura12, p.25 à direita), por cima da perna esquerda, como se fosse tocar
um pagode ou samba. Então, após o breve histórico, quando indagado sobre esta
suposta adaptação, relatou:

Então, antes né?, era um tambor menor que esse né? (apontando para o
curimbó repique), e eles faziam essa jogada de um tipo de virada que era
mais ou menos assim (tocou um pouco) [...] esse gingado com som bem
agudo, a gente já adaptou esse aqui [...] anteriormente eu era do tambor de
centro, só que ficava ruim porque eu me dediquei a cantar, aí se tornava
ruim eu cantar e tocar acocado por cima do tambor [...] aí foi essa
adaptação, surgiu daí, eu me senti mais à vontade com o tambor na coxa,
daí criou um ritmo diferente né? ficou mais ritmado [...] é mais que justo o
banjo puxar a música, mas eu adaptei isso também, chamo na requinta,
quer ver? (iniciaram a execução da levada por completo). [Sic] (Informação
verbal)29

Quanto à percussão, similar aos demais grupos, foi observada a seguinte


configuração: três curimbós, o grave − “tambor de centro” (figura 11, p.25 à
esquerda), o médio − “curimbó repique” (figura 11, p.25 ao centro) e o agudo
“curimbó requinta” (figura 11, p.25 à direita) e (figura 12, p.25) e um par de maracas
(figura 11, p.25, aos pés dos curimbós).

Figura 11 - curimbós e maracas Figura 12 - curimbó requinta

Fonte: Acervo do Autor, 2019. Fonte: Acervo do Autor, 2019.

29
Entrevista concedida e autorizada por Gleison Gomes e Amazo Alcântara [Ago. 2019].
Entrevistadores Walter da Silva Almeida e Vanildo Palheta Monteiro, Vigia, 2019. 1 arquivo. mpg (27
min.).
26

Transcrição 4 – Levada de Carimbó do Grupo Os Canarinhos de Vigia – PA

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Nessa levada, a execução rítmica das maracas é idêntica à do grupo Beija-


Flor, o curimbó requinta, talvez, por ter sido adaptado para se tocar sobre a coxa,
assim como um tantã (figura 12, p.25) − sua rítmica se pareça a um samba partido-
alto tal qual a rítmica, por exemplo, apresentada pelo curimbó requinta na levada do
grupo Os manos.
É provável que isso se deva também à forte influência negra das rodas de
batuques30 africanos no Pará, daí a similaridade com o samba no Carimbó, pois,
como cita Salles e Salles (1969, p. 262-263), o Carimbó é um tipo genérico de
Samba Rural, fazendo este menção à similaridade rítmica e, claro, à regionalidade.
Perceptível também é a relação de pergunta e resposta na rítmica do
curimbó requinta, entendidos do seguinte modo: 1º compasso (pergunta), 2º
compasso (resposta), 3º compasso (pergunta), 4º compasso (resposta), sendo esta
última a chamada para a retomada da levada.
Quanto ao curimbó repique, é nítida a manutenção da “síncope
característica” nos toques abertos, que combinados com os toques fechados nos
contratempos reforçados pelos acentos das maracas, garantem o swing da levada.

30
Salles e Salles (1969) define de modo geral, o termo “batuque”, como de uso comum e recorrente
na Amazônia, para nominar uma “dança negra”, acompanhada de tambor – podendo ser ou não
religiosa. Além disso, o referido autor deixa claro que este termo possivelmente deu origem à grande
variedade de Carimbós existentes no Pará (SALLES e SALLES, 1969, p. 278).
27

Adaptação 4 – Groove Os Canarinhos

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Neste groove (adaptação 4, p.27), assim como nos demais grooves de


Carimbó, os acentos das maracas foram adaptados para o chimbal com o pé, o
curimbó requinta foi adaptado para o tom 1, o curimbó repinique foi adaptado para o
surdo, e o tambor de centro foi adaptado para o bumbo, executando somente as
primeiras notas nas “cabeças” dos tempo a fim de que o groove não ficasse muito
pesado quanto ao excesso de encontros paralelos de tambores graves da bateria.
Interessante observar que o bumbo, o chimbal com o pé e o surdo marcam
um ostinato, enquanto que o tom 1, adaptado do curimbó requinta, possui a mesma
relação de pergunta e resposta apresentada por este, tambor já descrita na análise
da levada (transcrição 4): 1º compasso (pergunta), 2º compasso (resposta), 3º
compasso (pergunta), 4º compasso (resposta), sendo esta última a chamada para a
retomada da levada.

Samba de Cacete - Cametá


A pesquisa de campo realizada em Cametá 31, nos dias 29 e 30 de agosto de
2019, teve como premissa a investigação acerca do Samba de Cacete, ritmo
integrante da manifestação ou dança conhecida em Belém como Siriá, todavia existe
uma contra afirmativa a esse respeito.
Vicente Salles afirmou na obra Sociedades de Euterpe (1985) que o
surgimento das bandas do interior, militares e civis estava intimamente ligado aos
grupos locais que também cultivavam os gêneros folclóricos. Um exemplo
representativo foi o do Mestre Cupijó, que atuou como artista de bandas do

31
O município de Cametá está localizado na mesorregião do Nordeste Paraense e na microrregião
de Cametá [...] limitando-se ao Norte com Limoeiro do Ajuru, ao Sul com Mocajuba, ao Leste Igarapé-
Miri e a Oeste com Oeiras do Pará. O Município apresenta uma área territorial de 3.122km2 [...] De
acordo com o Censo Demográfico de 2010 (IBGE), a população total do município de Cametá é de
120.896 habitantes, apresentando 52.838 residentes na zona urbana e 68.058 residentes na zona
rural.
28

município de Cametá, como representante do gênero folclórico Siriá, bem como de


sua eclosão fonográfica. Contudo, em entrevista concedida a este pesquisador,
Dmitryus Braga, pesquisador e secretário de cultura de Cametá, foi categórico em
afirmar que o “Siriá foi uma invenção mercadológica do Mestre Cupijó”32, informação
que corrobora com a de D’Albuquerque (2016):

Em Cametá existe uma polêmica sobre o Siriá. A situação se inicia na


década de 1970, quando o Mestre Cupijó resolveu gravar um LP contendo
sequencias de músicas do Samba de Cacete, entre elas, o “Siriá”. No ato foi
utilizado um instrumental distinto dos das rodas de Samba de Cacete,
como: guitarra, baixo, bateria e instrumentos de sopro. Fazendo uso dessa
configuração instrumental, o mestre então afirma ter criado o ritmo do Siriá.
Segundo Dmitryus Braga, isso se deu com o intuito de explorar o potencial
musical do município, considerando o destaque do Carimbó na época
(D’ALBUQUERQUE, 2016, p. 45).

Ainda sobre isso, Dmitryus confirma a questão, ao declarar que:

[...] O mestre Cupijó, na intenção de ver o nome dele e de sua banda ter
sucesso no cenário comercial da música paraense, selecionou várias
cantigas do repertório das rodas de Samba de Cacete oriundas das
comunidades quilombolas, Maçariquinho, Mineiro Pau e Siriá [...] Ao invés
de colocar no CD “Samba de Cacete”, que ia ficar muito grande, ele botou
Siriá. [sic] (Informação verbal)33

Para elucidar ainda mais, o professor Manoel Valente 34 complementa com a


afirmativa de que “O Siriá do Cupijó é uma mistura”, referindo-se ao fato de este
ritmo parecer ora com Carimbó, ora com outros ritmos. “As letras são do Samba de
Cacete, agora o ritmo não tem nada a ver com o Samba de Cacete, se você quiser
ver o Samba de Cacete mesmo, amanhã levo você em uma comunidade, você
quer?” (Informação verbal)35.
Portanto, no dia 30 de agosto, de manhã cedo, partimos para a Comunidade
Quilombola denominada Porto Alegre, a 48 km de Cametá.

32
Entrevista concedida e autorizada por Dmitryus Braga [Ago. 2019]. Entrevistador: Walter da Silva
Almeida. Cametá,2019. 1 arquivo. Mpg (52min.).
33
Entrevista concedida e autorizada por Dmitryus Braga [Ago. 2019]. Entrevistador: Walter da Silva
Almeida. Cametá,2019. 1 arquivo. Mpg (52min.).
34
Professor de História na rede municipal de Cametá, trabalha há mais de 15 anos como pesquisador
nas área de etnomusicologia, história oral, cultura e religiosidade em comunidades quilombolas e
ribeirinhas da Amazônia Tocantina.
35
Entrevista concedida e autorizada por Manoel Valente [Ago. 2019]. Entrevistador: Walter da Silva
Almeida. Cametá, 2019. 1 arquivo. Mpg (57 min.).
29

Ao chegarmos, conhecemos a localidade, alguns de seus moradores e


batedores de Samba de Cacete, entre estes, Sr. Eugênio e Sr. Assis Gonçalves, os
quais, após o almoço, convocaram mais dois tocadores para, juntamente com
Manoel Valente, bater o ritmo do Samba de Cacete. Antes de baterem o ritmo,
Manoel Valente relatou-nos mais um pouco sobre a manifestação Samba de Cacete:

Isso aqui iniciou com uma prática costumeira ainda no período da


escravidão, portanto nessa época as cantigas eram mais melancólicas
devido ao caráter saudosista do negro em relação a sua terra natal [...] Igual
como nas colheitas de algodão nos Estados Unidos, entende professor?
[Sic] (Informação verbal)36

Então, em meio à conversa, Valente começou a entoar a cantiga Siriá. Os


batedores iniciaram o acompanhamento com um ritmo totalmente novo aos ouvidos,
provocando uma sensação estética prazerosíssima e inesquecível.
A configuração instrumental utilizada nessa performance musical, observada
em campo, resumiu-se em três instrumentos de percussão: dois tamboros (um grave
denominado maior ou Tamboro 2 e um agudo denominado menor ou Tamboro1,
p.29) e um par de cacetes. Os cacetes ou cacetinhos (figura 14, p.29) são dois
bastões de madeira, geralmente feitos de aracapurí. A sua execução se dá da
seguinte forma: O tocador senta-se no corpo de um dos tamboros e percute com os
cacetes no corpo do outro tamboro.

Figura 13 – tamboro maior e menor Figura 14: par de cacetes

Fonte: Acervo do autor, 2019. Fonte: Acervo do autor, 2019.

36
Entrevista concedida e autorizada por Dmitryus Braga [Ago. 2019]. Entrevistador: Walter da Silva
Almeida. Cametá,2019. 1 arquivo. Mpg (52min.).
30

Os tamboros são muito semelhantes aos curimbós usados no Carimbó,


contudo, por serem mais estreitos, variando de 15cm a 20cm de diâmetro, produzem
um som mais agudo que os curimbós. Os cacetes soam como baquetas nos aros ou
nos cascos dos tambores da bateria. Vale ressaltar que, na transcrição a seguir, foi
inclusa a melodia do refrão da cantiga Siriá em caráter excepcional e ilustrativo.
Para a (transcrição 5, p.30), foi criada a seguinte bula (figura 15, p.30):

Figura 15 - Bula utilizada para a transcrição da percussão do Samba de Cacete

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Transcrição 5 - Levada de Samba de Cacete da Comunidade P. Alegre de Cametá.

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.


31

Nessa manifestação, em especial, provavelmente por conta da falta de


familiaridade prévia com a rítmica, e também por detalhes sonoros de peculiaridade
ímpar, diferente do que ocorreu com o Carimbó e com o Lundu Marajoara,
percebeu-se a necessidade imprescindível de mais escutas prévias à transcrição a
fim de que se chegasse a esse resultado.
Green (2001) afirma que a maior parte da transmissão de conhecimentos na
música popular se dá pelas práticas aurais, processos de enculturação, imersão nas
práticas musicais atreladas aos contextos sociais e “tocar, compor e ouvir” são
alguns dos caminhos que os músicos populares percorrem na trajetória do seu
aprendizado.
Entende-se que essas três formas de vivência musical envolvem
conhecimentos em comum, que estão imbricados e, quando auxiliados por reflexões
e análises musicais contextualizadas, tendem a otimizar a compreensão, além de
sistematizar ferramentas de aprendizagem práticas e sinalizar, portanto, uma
completude de conhecimentos.
Logo, as informações históricas que são adicionadas no decorrer da
pesquisa e da análise das partituras tendem a aproximar as realidades: a da
manifestação observada em campo e a do aluno que se quer alcançar em sala de
aula.
Quanto à levada, detectaram-se três aspectos musicais preponderantes: o
compasso binário simples, anteriormente mencionado, a presença da síncope
característica – evidenciada nas 2ª semicolcheias acentuadas pelos cacetes – e a
frase, composta por vários motivos, o que nos dá a impressão inicial de uma levada
improvisada, contudo, como se repete com frequência a cada quatro compassos,
confirma um padrão.
No que tange à atuação de cada instrumento, observou-se também que o
tamboro 1 (menor) e o tamboro 2 (maior) possuem em suas execuções a célula
rítmica composta por colcheia e duas semicolcheias, denotando assim um padrão
semelhante entre os dois tamboros. Devido ao uso acentuado de ornamentos
(variantes) nas performances, o tamboro 1 tem a função de repinicar, enquanto o
tamboro 2 assume a função de reforçar a levada peculiar do samba de cacete,
utilizando-se nas conclusões no quarto compasso, uma espécie de virada para o
reinício da levada (transcrição 5, p.31 e figura 16, p.32), ou seja, esfrega um de seus
32

calcanhares, do centro para a borda, no rosto 37 do tamboro com um movimento que


soa como um glissando, expressão musical que, segundo o Dicionário Grove38 de
Música, “é um efeito deslizante”, e no Samba de Cacete – tamboro − acontece
conforme ilustração a seguir:

Figura 16 - Movimentos do calcanhar no rosto do tamboro

Fonte: D’Albuquerque, 2016.

Valente39 afirma que “Samba de Cacete sem Cacete não é samba”.


Partindo-se dessa afirmativa associada com o que se ouviu em Porto Alegre, os
cacetes funcionam como parte principal nesse ritmo. Eles são responsáveis pelo
senso rítmico base; são responsáveis por conduzir e também por alterar o
andamento, quando necessário.
Os cacetes apresentam duas funções: a primeira visa a manter e controlar o
pulso mediante a constante subdivisão em semicolcheias, enquanto a segunda
objetiva reforçar a síncope característica por conta da constante acentuação nas
segundas semicolcheias das células rítmicas compostas por 4 (quatro)
semicolcheias (transcrição 5, p.30).

37
Para os tocadores de Cametá rosto do tambor é o mesmo que pele ou membrana.
38
GROVES, Dicionário de Música, 1994, p.357.
39
Vide nota 33.
33

Adaptação 5 – Groove Samba de Cacete

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Esta adaptação (adaptação 5, p.33), o Tamboro 2 é substituto pela


combinação de bumbo (1ª e 4ª semicolcheias) e chimbal (contratempos), subdivisão
rítmica mais usada nos grooves de samba, exceto no segundo tempo do segundo
compasso, em que o bumbo evidenciou a síncope característica muito usada no
Carimbó.
Os cacetes foram adaptados nos aros da caixa, bem como suas
apogiaturas, os flams40. Do tamboro 1, foram aproveitadas as três fusas no 2º tempo
do 2º compasso que soam como um triplets41 (as 3 primeiras) e como um drag42 (as
2 últimas). O glissando do calcanhar feito no tamboro 2 foi adaptado para o tom 2,
no qual propositalmente o aro de caixa é retirado (2º tempo do último compasso) a
fim de que, enquanto uma das mãos aperta a baqueta esfregando a pele do tom do
centro para a borda, a outra percute com a baqueta as 8 fusas, produzindo uma
sonoridade muito parecida com a que foi percebida em Cametá.

Lundu Marajoara - Soure


O termo lundu ou lundum, de acordo com o livro “Vocábulo Crioulo”, de
Vicente Salles (2003), aponta o ritmo como um tipo de samba de roda, dançado e
entoado em todo o Brasil. Com o passar dos anos, passou por adaptações locais.
No Estado do Pará, sua maior incidência é na ilha do Marajó.
Na pesquisa de campo realizada em Soure43, na ilha do Marajó, que ocorreu
em setembro de 2019, realizou-se registros de dois grupos em atividade: Grupo de
tradições Marajoaras Cruzeirinho, grupo com mais de 30 anos de fundação, liderado

40
Termo onomatopaico utilizado em percussão e bateria para apogiatura simples.
41
Termo utilizado em instrumento em percussão e bateria para agrupamentos de três notas.
42
Termo onomatopaico utilizado em instrumentos de percussão em geral, para apogiatura dupla.
43
O município de Soure está localizado na foz do rio Amazonas, na costa oriental do arquipélago do
Marajó, e é banhado pelo rio Paracauari [...] A área de Soure corresponde hoje a 3.513km²,
distanciando-se de Belém, cerca de 87km em linha reta e 94km em linha fluvial.
34

por sua coordenadora e fundadora, Maria Amélia Barbosa, conhecida por “Tia
Amélia” e Grupo Tambores do Pacoval, grupo mais recente, porém, de relevância na
cidade.
Tia Amélia relatou com profundo pesar que, nas principais festas do
município, não se toca mais o Carimbó e muito menos o Lundu. Segundo ela
acredita, se permanecer o descaso, a manifestação pode acabar, ou ninguém não
saberá contar nada sobre o Lundu Marajoara.
Dada a essa questão, iniciou-se um diálogo, e este pesquisador demonstrou
interesse pelo registro e pela difusão do ritmo, além de deixar claro o objetivo
principal da pesquisa e a quem ela se destina. Dona Amélia não hesitou e colocou-
se à disposição para contribuir, bem como o seu grupo, cujos participantes nos
permitiram realizar gravações, entrevistas, o que possibilitou a transcrição da levada
e de algumas informações históricas e musicais que tendem a enriquecer o
conteúdo dessa pesquisa. Acerca das questões rítmicas, em uma das entrevistas,
Tia Amélia relata:

[...] Nós somos um grupo de tradição que foi herdando a forma de tocar de
uma galera de mestres, o nosso ritmo é cadenciado, se acelerar, os
dançarinos logo reclamam, nós não acelera [...] o dos outros grupos é mais
acelerado porque eles são parafolclóricos, vieram de Belém e trouxeram o
ritmo acelerado de lá, o nosso é de raiz, eles são uma mistura de ritmos [...]
nunca veio nenhum baterista aqui [...] quando eles tocam os ritmos
paraenses, ah! eles tocam na levada do Pinduca né? Banda Nova, o ritmo
das rádios, agora da Dona Onete [...] Lundu Marajoara? Acho que nunca vi
com bateria. [Sic] (Informação verbal)44

Interessante a fala sobre a manutenção do andamento, pois é comum


encontrarmos, durante a performance de músicos inexperientes, grandes oscilações
de andamento. Com esta fala, Tia Amélia denota a experiência de seus músicos, e a
importância da manutenção do andamento lento para a caracterização do Lundu
Marajoara.
Além disso, depreende-se da fala da Tia Amélia, que devido à antiguidade
do grupo e sua relação com os tidos “mestres”, existe uma suposta “originalidade”.
Apesar de não ser esta a intenção comprobatória desta pesquisa, percebeu-se
durante a entrevista, um afã de que, com o registro dessas informações, poder-se-ia,

44
Entrevista concedida e autorizada por Maria Amélia Barbosa Ribeiro [Set. 2019]. Entrevistadores:
Walter da Silva Almeida e Vanildo Palheta Monteiro. Soure, 2019. 1 arquivo. Mp4 (14 min.).
35

de alguma forma, divulgar o trabalho do grupo em questão, sobretudo, conectado ao


que eles consideram como o Lundu Marajoara “mais autêntico”.
O instrumental percussivo utilizado é formado neste grupo por três tambores
(figura 17, p.35) − o grave nominado curimbó marcação (ao centro), o médio,
nominado curimbó ritmo (à esquerda) e o agudo, nominado curimbó repique (à
direita) e pelas maracas (figura 18, p.35) e xeque-xeque, à esquerda e à direita,
respectivamente. Os curimbós, diferentemente dos encontrados em Vigia e em
Cametá, são revestidos com pele de cobra que proporcionam uma sonoridade mais
“expansiva” (prolongada) e, ao mesmo tempo aveludada, isto é, menos estridente
que nos curimbós revestidos de pele de veado ou de boi.

Figura 17 - curimbós Figura 18 – maracas e xeque-xeque

Fonte: Acervo do Autor, 2019. Fonte: Acervo do Autor, 2019.

Na transcrição 6 (página 36), deve-se tomar como referência a mesma bula


de notação para o Carimbó de Vigia (figura. 5, p.14), exceto e, excepcionalmente o
símbolo “(x)”, que no pentagrama central, referente aos curimbós repique e ritmo,
indica notas fantasmas45 tocadas suavemente com as pontas dos dedos.

45
Ver bula da notação para a Bateria (página18).
36

Transcrição 6 – Levada de Lundu Marajoara do Grupo Cruzeirinho de Soure-PA

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Similar ao Samba de Cacete, o andamento é lento em 50 bpm46, o


compasso é binário e existe a presença marcante da síncope característica.
Acerca da performance da percussão, observou-se que as maracas e o
xeque-xeque trabalham em uníssono executando a síncope característica em
ostinato, que além de auxiliarem a manutenção do andamento, representam uma
marca peculiar na levada deste grupo, das demais execuções e partituras de Lundu
pesquisadas em outras regiões do Brasil.
A respeito disso, Lima (2010, p. 200) afirma que “na música africana há uma
infindade de padrões, mas alguns se relacionam mais proximamente com os Lundus
dos séculos XVIII e XIX”, sabendo que um destes padrões é a combinação da
síncope característica seguida de duas colcheias, portanto diferente da levada neste
grupo em que a síncope característica encontra-se em ostinato (transcrição 6).
Quanto ao segundo pentagrama (curimbós repique e ritmo), por executarem
também o mesmo desenho rítmico, estão representados em apenas um
pentagrama.
A execução destes dois tambores mescla toques abertos suaves, com
toques bastante suaves percutidos com as pontas dos dedos representados com
notas fantasmas47, alternando os toques abertos nas regiões intermediária e
próxima à borda da membrana dos tambores. Quando tudo isso se justapõe com as

46
Batidas por minuto.
47
Ver bula da notação para a Bateria (figura 8).
37

maracas, xeque-xeques e com o curimbó marcação (3ºpentagrama) transmite


nitidamente a ideia de um pandeiro em um samba-canção. É provável que isto se
deva porque

O contexto histórico que marca o surgimento do Lundu Marajoara na


Amazônia paraense, remonta ao final do século XIX e início do século XX
[...] Essa dança foi censurada pela igreja e proibida pelo Estado brasileiro,
por ser de origem negra e, devido ao movimentnto de extase corporal, foi
esteriotipada imoral [...] Com o passar dos tempos, a dança do lundu
passou a ser praticada nos salões de elite, como lundu-canção. (COSTA,
2016, p.31).

Vale também dizer que essa levada (transcrição 6, p.36) é definida pelos
dois primeiros compassos em ostinato até que executam uma virada48, com a
quiátera de tercinas de colcheias acentuadas no 3º compassos, sendo esta virada
uma preparação para a repetição da levada.

Adaptação 6 – Groove Lundu Cruzeirinho

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Nessa adaptação (adaptação 6, p.37), a voz mais alta, representando a


camada aguda da levada, ou seja, maracas e xeque-xeque, foi adaptada para o
chimbal com o pé. O curimbó marcação, que é o mais grave, foi adaptado para o
bumbo, tambor mais grave da bateria. E os demais curimbós – repique e ritmo – que
tocam em uníssono, foram adaptados da seguinte forma: parte grave e aguda dos
toques adaptadas para o tom 2 e para tom 1, respectivamente, e as notas fantasmas
dos curimbós foram adaptadas para a caixa da bateria.
A associação da síncope no chimbal, com o bumbo e tom – tons nas 1ª e 4ª
semicolcheias em andamento lento, às suaves notas fantasmas nas 2ª e 3ª

48
Virada é um termo comumente usado por bateristas e percussionistas. Significa tocar um trecho
rítmico, geralmente de um a dois compassos, que pode ser pré-definido, padronizado ou improvisado,
com vistas a sinalizar a passagem de uma parte para outra da música, a repetição da mesma, ou a
passagem de uma música para a outra.
38

semicolcheias denota similaridade com o samba-canção transcrito e descrito no livro


de bateria “O Batuque é um Privilégio”: “Derivado do samba, o samba-canção se
caracteriza pelo andamento dolente e por ser carregado de romantismo na melodia
e na poesia” (BOLÃO, 2010, p.96).
O grupo Tambores do Pacoval, segundo Madson da Silva Conceição,
batedor e cantor do grupo, surgiu no ano de 2009, após uma oficina de percussão
promovida em Soure, pelo percussionista paraense Flávio Gama. Madson forneceu
algumas informações histórico-musicais do grupo em questão:

[...] Eu tô aqui desde o início do grupo que nasceu há 10 anos atrás, eu


canto, faço backing pro Mestre Diquinho que toca violão e canta, é o nosso
compositor também [...] bato tambor que é o principal do ritmo, toco maraca
também [...] Aqui nóis aprende olhando, vendo os mestres, nóis copia eles e
com o tempo vai aperfeiçoando o som, a batida [...]nosso Lundu Marajoara
é lento, mas é diferente do Cruzeirinho, um pouco, mas diferente, o nosso
Mestre, o Diquinho, era de lá e daqui, não temos rixa, mas agora ele é
daqui, mas o nosso ritmo é do nosso jeito [...] nosso curimbó é feito de
cupiúba e pele de veado, o som é porrada seca! vamo tocar um pouco pra
vocês, ei menino!, ei! Vem cá, vamo tocá pros professô [...]. [Sic]
(informação verbal)49

Ficou claro na afirmativa de Madson que o ritmo está ligado a tudo que
circunda o tambor, a sonoridade associada ao tipo de material usado na confecção
dos curimbós, bem como a forma de tocar oriunda dos mestres e o andamento, além
de identificar implicitamente uma diferença rítmica em relação ao Cruzeirinho,
usando a expressão “nosso jeito”, que se confirmou quando da escuta e transcrição
nossa, aliado a isso, a configuração instrumental percussiva é semelhante a dos
demais grupos já investigados até aqui, possuindo três tambores: o grave nominado
curimbó marcação (ao centro), o médio, nominado curimbó médio (abaixo) e o
agudo, nominado curimbó repique (acima) – (figura 19, p.39) e as maracas (figura
20, p.39).

49
Entrevista concedida e autorizada por Madson da Silva Conceição [Set. 2019]. Entrevistadores:
Walter da Silva Almeida e Vanildo Palheta Monteiro.Soure,2019. 1 arquivo. Mp4 (18 min.).
39

Figura 19 - curimbós Figura 20 - maracas

Fonte: Acervo do Autor, 2019. Fonte: Acervo do Autor, 2019.

Transcrição 7- Levada de Lundu Marajoara - Tambores do Pacoval de Soure-PA

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Diferente do que se ouviu no Grupo Cruzeirinho, a síncope característica


nessa levada (transcrição 7, p.39), não se repete em todos dos compassos, além de
ser seguida de duas colcheias ou de uma semicolcheia ligada a duas fusas, nesse
caso, executadas pelo curimbó repique, que são uma espécie de chamada para o
acento que os demais instrumentos executam no contratempo do segundo
compasso, característica mais comum aos demais Lundus encontrados em outras
regiões do Pará e do Brasil50, inclusive em grupos de Belém51.

50
Disponível em: < http://projetos.eeffto.ufmg.br/sarandeiros/?p=1191> Aceso em: 15 novembro 2019.
51
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ug7A9saqse0> Aceso em: 15 novembro 2019.
40

Essa levada, no geral, não fossem a variação do curimbó requinta e as notas


fantasmas do curimbó marcação, seria toda em uníssono rítmico, ainda assim, a
sensação que se tem, ao ouvir a levada ou mesmo ao analisar a partitura, é a de um
bloco rítmico vertical, tornando-se uma levada um pouco mais “pesada” do que a do
Grupo Cruzeirinho. Esta reflexão não busca por juízo de valores, mas sim, dar
embasamento de interpretação musical para o leitor, performer, bem como para a
adaptação para a bateria a seguir:

Adaptação 7 – Groove Lundu Pacoval

Fonte: Elaboração do Autor, 2019.

Nesse groove (adaptação 7, p.40), as maracas foram adaptadas para o


chimbal com o pé, o curimbó repique (agudo) foi adaptado para tom 1, sendo que a
preparação (semicolcheia + 2 fusas) e acento com som de tapa, foi adaptada para a
caixa, substituindo o som de tapa pelo “rim shot”.
O curimbó médio foi adaptado para o surdo, o curimbó base (grave) foi
adaptado para o bumbo, contudo, por uma questão de exequibilidade, as notas
fantasmas deste curimbó subiram para a o tom 2 para ser executado pela mesma
mão que deverá tocar o tom 1, sendo que a última nota fantasma do curimbó base,
também por uma questão orgânica, foi adaptada para o surdo. Para tocar este
groove, o baterista precisa estar atento a estes detalhes para não ficar condicionado
a seguir a mesma linha de raciocínio das demais adaptações, em que há uma
relação mais lógica entre a altura dos instrumentos de percussão com as peças da
bateria.
Paralelamente ao processo de realização das transcrições e adaptações, os
grooves foram sendo apresentados no decorrer do 2º semestre de 2019 aos alunos
do CTIM da EMUFPA, nas disciplinas Bateria II (figura 21, p.41) e Bateria IV (Figura
22, p.41), cuja aplicabilidade percebida mediante a aceitação dos alunos se deve à
exequibilidade técnica, sonoridade agradável e ao caráter estético inovador,
41

reverberando positivamente nas atividades de performance baterística.

Figura 21 – Bateria II Figura 22 – Prática de Conjunto IV

Fonte: Acervo do Autor, 2019. Fonte: Acervo do Autor, 2019.

VARIAÇÕES E PRODUTO
As transcrições, as adaptações e as experimentações realizadas nesta
pesquisa lançaram luzes para a construção das variações, as quais são parte
integrante do produto final que compõe este trabalho. Assim sendo, foram realizadas
as seguintes ações:
1- Questionário on-line via aplicativo, Google Forms52;
2- Sessão de aulas síncronas e assíncronas via os aplicativos Whatsapp,
Google Meet e Zoom, para esclarecimentos técnicos acerca dos grooves;
3- Laboratório de gravação em estúdio. Participaram destas ações 12
alunos, sendo 06 alunos ativos do 1º e 2º anos e, 06 alunos egressos
das turmas 2017 e 2018 do CTIM – Bateria – EMUFPA.
Após estas ações, decidiu-se que o produto teria como base para a sua
criação os seguintes critérios:
1. Ter como foco, os alunos do CTIM – Bateria − da EMUFPA e outros
bateristas e percussionistas que possuam nível técnico de execução e
leitura de partitura compatíveis com a produção pretendida no E-book;
2. Criar 5 (cinco) variações/grooves para cada uma das 7 (sete)
adaptações/grooves realizadas para a bateria, dispostas na mesma
sequência de apresentação dos grupos descritos na parte 2 deste artigo

52
O Google Forms é um serviço gratuito para criar formulários on-line. Nele, o usuário pode realizar
pesquisas de múltipla escolha, criar questões discursivas, solicitar avaliações entre outras opções. A
ferramenta é ideal para quem precisa solicitar feedback sobre algo.
42

(Beija-Flor, Os Manos, Os manos 2, Os Canarinhos, Samba de Cacete,


Lundu Cruzeirinho e Lundu Pacoval);
3. Explorar variações timbrísticas na bateria sem perder de vista o swing53
dos grooves iniciais, adaptados da percussão de cada grupo registrado;
4. Adicionar ao produto, as partituras das levadas da percussão juntamente
com a dos grooves – adaptações e variações, com suas respectivas
manulações54, baseadas nas análises, experimentações e sugestões dos
alunos;
5. Gravar em estúdio, todos os grooves – adaptações e variações – para
serem inseridos no E-book em formato mp3, como uma forma de otimizar
a compreensão dos grooves;
6. Criar um visual original e didático para o produto;
7. Criar as variações, pelo processo de experimentação em uma relação
dialética entre pesquisador e alunos.
Destarte, surge o escopo inicial de “Grooves do Pará – E-book”. Descrever-
se-á, então, o processo criativo, levando em conta a ordem de produção do material.
O primeiro passo dado foi arguir aos alunos questões via Google Forms.
Foram inseridas ao questionário Google Forms: a) a legenda da bateria; b)
as partituras dos 7 grooves, a saber: Beija-Flor, Os manos, Os Manos 2, Os
Canarinhos, Samba de Cacete, Lundu Cruzeirinho e Lundu Pacoval; c) uma
pergunta: Para você, tudo certo com essa legenda, está compreensível? e d) uma
atividade a ser realizada nos 7 grooves com a seguinte indicação: Baseado na
legenda supracitada, estude o groove até tocá-lo no andamento sugerido, em
seguida, faça suas observações, destacando aspectos técnicos e sugestionando
melhorias, caso acredite ser pertinente.
Quanto à pergunta acerca da legenda, houve unanimidade na resposta,
todos a compreenderam com exatidão; quanto à atividade as observações tiveram
alguns pontos em comum.
O groove “Beija-Flor” (p.19 do E-book), os alunos relataram conseguir

53
Aqui, toma-se como referência o conceito de Monteiro (2016) ao identificar swing como as
“verdadeiras nuanças” do fraseado rítmico, características pertinentes a uma manifestação ou grupo
específico.
54
Manulação é um termo comum usado por bateristas e percussionistas que significa uma indicação
para a sequência ordenada das mãos (direita e/ou esquerda) a ser utilizada ora para facilitar a
execução, ora para definir a sonoridade, ou o swing da levada ou do groove.
43

executá-lo, porém com algumas dificuldades técnicas como tocar o rim shot no
surdo, sincronizar os acentos da mão esquerda no tom 1 com os rim shots da mão
direita no surdo. Todavia, disseram que o elemento facilitador no groove foi a rítmica
dos pés (bumbo e chimbal com o pé), pelo fato de ser idêntica à condução de samba
mais comumente tocada por eles. Nesse sentido, para a criação das variações, a fim
de manter o swing característico do groove oriundo da levada da percussão, foram
mantidos os pés inalterados, exceto nas variações 4 e 5, em que foram adicionados,
chimbal nas cabeças dos tempos e abertura de chimbal no contratempo. Quanto às
mãos, manteve-se a síncope característica no tom 1 (mão esquerda) variando
suavemente o ritmo na mão direita, tirando as 2ª (segundas) semicolcheias nas
variações 1 a 5, bem como houve a utilização de outras peças da bateria: caixa, tom
2 e prato de condução (p.21 - 25 do E-book).
Em resposta ao groove “Os Manos” (p.26 do E-book), a maioria dos alunos
relatou conseguir tocar, porém com maior dificuldade em executá-lo do que o groove
Beija-Flor. Dentre as colocações, destacou-se a dificuldade em manter as 4(quatro)
semicolcheias por tempo no surdo com a mão direita, sobretudo por conta do acento
na 4ª (quarta) semicolcheia de cada tempo. Outra observação se deu quanto à
dificuldade de coordenar o ostinato de 4(quatro semicolcheias), por tempo no surdo
(mão direita) com a execução dos acentos, dos rim shots e das notas fantasmas no
tom 1 (mão esquerda).
Nesse caso percebi que poderia mudar a posição e a distribuição das notas
das mãos sem alterar estruturalmente o groove, isto é, mantendo seu swing
característico. Após diversas experimentações, resolvi utilizar a técnica linear55
criando para as mãos um ostinato de semicolcheias distribuídas sequencialmente
nas peças surdo, tom 1, surdo, tom 1, mantendo os acentos, os rim shots e as notas
fantasmas no mesmo lugar (p.28 do E-book).
A mesma estrutura foi mantida na variação 2 (p.30 do E-book), porém com a
seguinte alteração: substituíram-se as primeiras semicolcheias (surdo com rim shots)
dos tempos 1(um) do primeiro e segundo compassos pela caixa com rim shots, o
que causou uma mudança timbrística, reforçando a função de pergunta nesse
groove.
Na variação 3 (p.31 do E-book), resolveu-se experimentar uma possibilidade
55
A técnica linear consiste em tocar as peças da bateria sem fazer uso de paralelismos verticais, ou
seja, toca-se uma peça de cada vez.
44

de o groove ficar mais baterístico56. Foi aproveitado somente o ritmo do tom 1


oriundo da adaptação inicial (p.26 do E-book), deslocando-o para o tom 2 com a
mão esquerda. Na mão direita, a condução que no groove inicial era no surdo,
passou para o prato de condução e retirou-se de todos os tempos a 2ª segunda
semicolcheia, transformando a célula (de 4 semicolcheias) em síncope
característica. Nos pés, manteve-se o chimbal no contratempo, retirando as
semicolcheias do bumbo, fazendo com que o groove soasse com considerável
leveza.
Na variação 4 (p.32 do E-book), transferiu-se a função de base rítmica do
bumbo (1ª e 4ª semicolcheias) e do chimbal fechado com o pé no contratempo, para
o tom 2 e chimbal aberto com a mão respectivamente. O bumbo permaneceu nas
cabeças dos tempos para reforçar o pulso. Quanto aos acentos, estes foram
retirados dos tempos 2 (dois) dos dois primeiros compassos, para melhorar a
organicidade do groove, e reforçar ainda mais a relação de pergunta (1º e 2º
compassos) e resposta (3º e 4º compassos).
Na variação 5 (p.33 do E-book), tornou-se a utilizar os pedais de samba,
idênticos aos do groove inicial, porém, voltando com a ideia de groove baterístico,
em que a acentuação de todos os contratempos do groove foi reforçada com a
execução da cúpula do prato de condução. Agora, no lugar dos rim shots que
acentuavam os tambores, foram usados toques tradicionais57 de caixa, mantendo
dessa forma a função de pergunta e resposta no groove.
Em relação aos Manos 2 (p.35 do E-book), a maioria dos alunos relatou que
a maior dificuldade encontrada foi manter no tom 1 a síncope característica no 1º
tempo com uma colcheia ligada a duas semicolcheias no 2º tempo, o que exige, de
fato, resistência, flexibilidade de punho e emprego de pinça58 e mola59.
Na variação 1(p.37 do E-book), o ritmo do tom 1 (mão esquerda) foi
transferido para o surdo (mão direita) com exceção da penúltima semicolcheia que
foi deslocada para o bumbo e o ritmo do surdo para tom 1, facilitando assim a
execução técnica, além de manter o swing do groove.

56
A partir daqui, todas as vezes que aparecer o referente termo, entenda-se com a performance
tradicional da bateria – bumbo, caixa e chimbal ou bumbo, caixa e prato de condução.
57
Caixa percutida no centro da pele, com as pontas das baquetas.
58
A pinça é uma forma de segurar a baqueta, tendo como pontos de apoio, o dedo polegar e as
falanges, média e da extremidade do dedo indicador.
59
A mola é o apoio realizado com o movimento de flexão dos dedos médio, anular e mínimo.
45

Na variação 2 (p.38 do E-book), retornou-se com a síncope característica


para o tom 1(tocado com a mão esquerda) no primeiro tempo. No segundo tempo,
escreveu-se uma colcheia pontuada ligada a uma semicolcheia, e passou-se para o
surdo a célula formada por uma colcheia e duas semicolcheias. Os rim shots
voltaram para o surdo, tornando-se mais fáceis de serem executados com a mão
direita, no entanto, para garantir a fluidez do groove, sentiu-se a necessidade de
diminuição do andamento em 10 bpm para evidenciar a diferença entre as
sonoridades da penúltima e da última semicolcheia no surdo.
Na variação 3 (p.39 do E-book.), utilizou-se o mesmo ritmo do tom 1 e do
surdo oriundos do groove inicial (p.35 do E-book) adicionando ao tom 1, rim shots
nas últimas semicolcheias nos dois tempos do groove. O ritmo utilizado para os pés
é similar ao do groove inicial (p.35 do E-book), exceto pela exclusão da penúltima
semicolcheia do bumbo no tempo 2, por conta disso, este groove se tornou mais
fluido que o anterior, logo foi possível elevar o andamento para 114bpm.
Na variação 4 (p.40 do E-book), diferentemente dos demais grooves,
utilizou-se a síncope característica em ostinato no tom 1 (mão esquerda), manteve-
se o surdo (mão direita) idêntico ao da variação 2, e o bumbo permaneceu similar ao
da variação 3, diferindo apenas por conta da abertura do chimbal com o pé nos
contratempos, o que aumentou consideravelmente o swing do groove, mantido em
114 bpm.
Na variação 5 (p.41 do E-book.) a síncope característica em ostinato foi
transferida do tom 1 para o prato de condução, o ritmo utilizado no tom 1 foi o
mesmo da variação 2 (p.38 do e-book), o bumbo foi colocado em paralelo com a
primeira e com a última semicolcheia do tom1 e manteve-se o chimbal com o pé
idêntico ao da variação 4 (p.40 do E-book). Com as ações supramencionadas foi
possível manter o swing do groove, tornando-o mais baterístico dentre as
variações/grooves criadas do grupo Os Manos 2.
Em relação à performance do groove Os Canarinhos (p. 42 do E-book), a
maior dificuldade relatada pelos alunos, foi a alternância rítmica entre os tempos
1(um) e 2 (dois) dos três primeiros compassos do groove, sobretudo por não
conseguirem coordenar com fluidez a síncope característica no surdo (mão direita)
com as duas colcheias no tom 1 (mão esquerda). Nesse momento, percebeu-se
que, para cada groove, deveria ser criada uma sequência de aprendizagem, na qual
46

se aprenderia o groove fragmentado de forma gradual até sua devida assimilação.


Na variação 1 (p.44 do E-book), o ritmo do tom1(mão esquerda) juntamente
com os rim shots foram transferidos para o surdo (mão direita), e o ritmo em ostinato
de síncopes características foram transferidos do surdo para o tom 1. Por fim,
ficaram inalterados o bumbo e o chimbal fechado com o pé.
Na variação 2 (p.46 do E-book.) usou-se o mesmo ritmo do groove inicial
(p.42 do E-book) substituindo os rim shots do tom 1 por toques tradicionais de caixa.
Observou-se que essa mudança ocasionou uma movimentação incomum entre tom
1 e caixa tocados com a mão esquerda, exigindo um estudo específico para essa
movimentação, e suscitando mais uma vez a necessidade de um aprendizado
fragmentado e gradual dos grooves.
Na variação 3 (p.47 do E-book.), usou-se o mesmo ritmo da variação 2 (p.46
do E-book) apenas invertendo as mãos.
Somente na variação 4 (p.49 do E-book), foi que se realizou uma mudança
estrutural, ao se inserir um ostinato de síncope característica distribuído na seguinte
disposição: semicolcheia (bumbo) + colcheia (surdo) + semicolcheia (surdo).
Mantiveram-se idênticos aos do groove inicial (p. 42 do E-book) o chimbal fechado
com o pé e o tom 1 (mão esquerda).
Na variação 5 (p.50 do E-book), a fim de deixar o groove mais baterístico
transferiu-se o ostinato de síncope característica para o prato de condução e
utilizou-se o ritmo nos tons e na caixa idênticos aos da variação 2 (p.46 do E-book).
O ritmo dos pés estão dispostos em um ostinato de colcheia (bumbo) +
semicolcheia(chimbal) + semicolcheia (bumbo).
Quanto ao groove Samba de Cacete (p.52 do E-book), a maioria dos alunos,
disse ter conseguido tocá-lo com facilidade, exceto dois alunos que não entenderam
os flams e o glissando. Por esta razão, criou-se uma nota técnica (Figura 3 e 4, p. 17
do E-book) a fim de dirimir quaisquer dúvidas acerca da forma de execução do flam
e do glissando nessa manifestação.
Na variação 1 (p.54 do E-book), a única alteração em relação ao groove
inicial (p.52 do E-book) foi substituir o chimbal fechado com o pé no contratempo,
por um ostinato de síncope característica no chimbal fechado com o pé, em que a
colcheia da síncope reforçou a acentuação dos flams no aro da caixa, que por sua
vez é uma característica peculiar nesse groove.
47

Na variação 2 (p.55 do E-book), as mãos permanecem inalteradas, o


chimbal fechado com o pé passa a marcar tempo e contratempo em colcheias e a
síncope característica foi colocada no bumbo.
Na variação 3 (p.56 do E-book.), transferiram-se as semicolcheias e fusas
tocadas no aro da caixa para o chimbal fechado com a mão e substituíram-se o flam
no aro da caixa (Figura 3, p.17 do E-book) pelo flam que parte do aro do tom 1 para
o aro da caixa. O glissando que antes era a mão esquerda friccionando a pele do
tom 2 e mão direita percutindo oito fusas na pele deste mesmo tom, agora, passa a
ser mais agudo e evidente, com o rim shot cross stick60. O bumbo permaneceu
idêntico ao do groove inicial (p.52 do E-book).
Na variação 4 (p.58 do E-book), transferiram-se as semicolcheias no aro da
caixa para o prato de condução. Utilizaram-se o bumbo e o chimbal fechado com o
pé do groove inicial (p.52 do E-book). Substituíram-se os flams no aro da caixa por
buzz rolls61, e os rim shot cross stick do tom 2 para o tom 1, ficando este rim shot
ainda mais agudo e evidente.
Na variação 5 (p.59 do E-book), a condução rítmica em semicolcheias,
permanece no prato de condução. Criou-se uma alternância entre o flam que parte
do aro de tom 1 para o aro da caixa nos tempos 1(um) e o buzz roll na caixa nos
tempos 2 (dois), ambos situados no 1º e 3º compassos. Nos pés, ora a síncope
característica está no chimbal fechado com o pé – tempo 1(um) dos quatro
compassos, e ora no bumbo no segundo tempo dos 1º e 3º compassos. A rítmica
das mãos no segundo tempo dos compassos 2 e 4 foi reforçada pelos pés (bumbo e
chimbal fechado com o pé) com um grupo de 4 semicolcheias paralelas.
Sobre o groove Lundu Cruzeirinho (p.61 do E-book), os alunos declararam
que a maior dificuldade encontrada na execução do groove foi a síncope
característica no chimbal fechado com o pé, para qual sugestionaram que houvesse
um estudo isolado desta célula para depois ir adicionando a ela as outras partes do
groove. Essa observação somada a outras anteriormente realizadas diante da
dificuldade de execução de alguns outros grooves implicou decidir definitivamente

60
Termo conhecido pelos estudantes de bateria e percussão, que significa percutir fortemente o
corpo de uma baqueta que esteja com a ponta friccionada sobre a pele de um tambor ou caixa, com o
corpo da outra baqueta.
61
O buzz roll conhecido também como multiple bounce roll que traduzido é: rolo de salto múltiplo, é
um rudimento percussivo em que se deve pressionar a(s) ponta(s) da(s) baqueta(s) contra a
superfície da pele do tambor, fazendo-a saltar velozmente e múltiplas vezes. Também conhecido
como rulo de pressão.
48

por desenvolver e inserir no E-book o tópico “Aprendendo o Groove”, que é uma


sequência de aprendizagem gradativa, na qual o mesmo é fragmentado em
exercícios de aprendizagem que variam de 3 a 14 exercícios a depender da
necessidade identificada por este pesquisador em cada groove.
Na Variação 1 (p.63 do E-book), acrescentou-se apenas um rudimento –
flam – suavizando dessa forma o groove com a divisão do ponto exclusivo de ataque
da baqueta no tom 1, dividindo esse ponto de ataque em duas partes: a primeira no
rudimento parte do tom 2; e a segunda, a nota real propriamente dita – semicolcheia
– do tom 1.
Na variação 2 (p.64 do E-book), mantiveram-se os flams nas cabeças dos
tempos, porém, ora partindo do surdo para o tom 1, ora o inverso, do tom 1 para o
surdo, gerando a ideia de pergunta e resposta dentro de cada compasso.
Na variação 3 (p.65 do E-book), colocaram-se os flams partindo da caixa
para o surdo nas 4ª semicolcheias e, da caixa para o tom 1 nas cabeças dos tempos
que, somadas às 2ª e 3ª semicolcheias em “notas fantasma” na caixa, e isto
proporcionou, neste groove, tanto a condução em ostinato na caixa quanto a
manutenção do swing do groove.
Na variação 4 (p.66 do E-book), utilizou-se o ritmo das mãos da variação 3
(p.65 do E-book) e alterou-se apenas o ritmo no chimbal fechado com o pé, que
passou a tocar as 2ª e 3ª semicolcheias dos tempos.
Na variação 5, optou-se por deixar o groove mais baterístico, colocando uma
condução em oito fusas por tempo no prato de condução, que em andamento 50
bpm, soaram muito bem. Mantiveram-se os pés idênticos aos da variação 4 (p.66 do
E-book), mas o diferencial está no buzz roll na caixa, que deu ao groove, um padrão
estético inovador.
Sobre o groove Lundu Pacoval (p.68 do E-book), os discentes foram
unânimes em relatar que não encontraram dificuldades em sua execução.
Na intenção de suavizar o groove, mantiveram-se, na variação 1 (p.70 do E-
book), os pés inalterados, porém, nos tempos 1(um) – síncope característica – e, na
cabeça do tempo 2(dois) do 1º compasso, manteve-se somente o surdo em
paralelismo com os pés, passando as notas fantasmas para o tom 1, sem alterar o
contratempo do tempo 2(dois) acentuado idêntico ao groove inicial. No tempo 1(um)
do 2º compasso, inseriu-se o tom 1 em paralelismo com os pés (bumbo e chimbal),
49

finalizando o groove com a sequência: fusa (surdo) + fusa (caixa) + colcheia (caixa
com rim shot).
Criou-se a variação 2 (p.71 do E-book) verossímil à variação 1, apenas
invertendo as posições do tom 1 e do surdo no groove.
A variação 3 (p.72 do E-book) foi mantida quase idêntica ao groove inicial.
Com uma pequena mudança, retirou-se o chimbal fechado com o pé da segunda
nota da síncope característica e das cabeças dos tempos 2 dos dois compassos do
groove.
Na variação 4 (p.73 do E-book), manteve-se a mesma estrutura da variação
2, apenas mudando a nota fantasma para o tom 2 e acrescentando novamente a
nota fantasma no surdo ao final do groove – última semicolcheia.
Na variação 5 (p.73 do E-book), criou-se o groove mais baterístico desse
Lundu. Distribuiu-se a primeira síncope característica no 1º tempo do 1º compasso
da seguinte forma: semicolcheia (tom 1) + colcheia (tom 2) + semicolcheia (surdo),
criando uma melodia descendente, que finaliza na cabeça do 2º tempo seguidas de
um surdo na cabeça do tempo 2 ligado a uma caixa (contratempo). No segundo
compasso, o movimento é ascendente, sendo síncope característica distribuída na
sequência a seguir: 1ª semicolcheia (surdo) + 2ª semicolcheia (tom 2) + 4ª
semicolcheia (tom 1), finalizando o groove com um rulo62 de 5 toques ligados a duas
fusas, sendo a última acentuada. Outra mudança nessa variação/groove foi inserir
um ostinato de chimbal com o pé fechado no tempo + chimbal com o pé aberto no
contratempo.
Concluída a 1ª ação, as partituras dos grooves foram enviados aos alunos
via WhatsApp para que os mesmos pudessem praticá-los. Após isso, iniciou-se a 2ª
etapa proposta, em que foram realizadas aulas remotas de forma síncrona e
assíncrona para dirimir todas as dúvidas técnicas que surgiram acerca dos grooves.
Convém ressaltar que, nessa etapa, mediante os diálogos entre pesquisador
e alunos, foram criadas algumas ferramentas didáticas em prol do aprendizado dos
grooves, tais como: nota técnica (p.17 do E-book), informações técnicas
complementares (p.18 do E-book), analogia em cores para melhor compreensão das
adaptações iniciais para a bateria oriunda de cada conjunto instrumental percussivo
(p.19, 26, 35, 42, 52, 61 e 68 do E-book), e uma sequência de aprendizagem −
62
Rulo é um rudimento sequencial de toques duplos ou múltiplos, geralmente finalizado com um
toque simples.
50

“Aprendendo o Groove”, esta, já mencionada anteriormente.


Como 3ª e última ação, realizou-se um laboratório de gravação com os
alunos, a fim de comprovar a exequibilidade performática dos grooves criados.
Foram dois dias de gravação com a participação de 5 (cinco) alunos voluntários,
este pesquisador e um diretor de gravação, o baterista renomado “Tiago Belém”.
A distribuição para a gravação seguiu o esquema, como se visualiza na
Figura 23:

Figura 23 – Distribuição para a gravação

. Fonte: Elaboração do Autor, 2020.

Para fins de comprovação e registro, segue a Figura 24, composta por


registros fotográficos do laboratório de gravação:

Figura 24 – Laboratório de gravação

Fonte: Acervo e elaboração do Autor, 2020.

Desta feita, o produto final – GROOVES DO PARÁ e-book, criado nesta


pesquisa, contém 7(sete) transcrições para a percussão, sendo 4 (quatro) do
Carimbó de Vigia, 1(uma) do Samba de Cacete de Cametá e 2 (duas) do Lundu
Marajoara de Soure, bem como 7 (sete) grooves (adaptações iniciais) oriundos da
percussão. Para cada adaptação foram criados 5 (cinco) grooves (variações),
portanto, 35 (trinta e cinco) novos grooves pautados nas adaptações iniciais que
totalizam 42 (quarenta e dois) grooves.
Além disso, constam no E-book depoimentos de quatro bateristas
51

paraenses, um baterista manauara, todos pesquisadores dos ritmos paraenses, e


um aluno representando os discentes do CTIM de ateria da EMUFPA.
Quanto aos elementos didáticos, citam-se: sumário, bulas para a percussão,
legenda para a bateria, nota técnica, informações técnicas complementares,
ilustração da percussão e da bateria em cores, sessão “Aprendendo o Groove” e 42
(quarenta e duas) faixas de áudios em Mp3 em ícones clicáveis e, por fim, a
organização em cores específicas para cada ritmo por grupo investigado. Em
exemplo, a Figura 24 (p.01, p.19, p.26 e p.42 do E-book), a seguir:

Figura 24 – Capa e pág. Iniciais – Beija-Flor, Os Manos, Os Canarinhos

. Fonte: Elaboração do Autor, 2020.

Elaboração: Acervo do Autor, 2020.

Por fim, além dos resultados didáticos, performáticos e práticos alcançados


até aqui, soube que alguns alunos já estão desenvolvendo trabalhos artísticos
usando como referência os estudos realizados sobre os grooves oriundos nessa
pesquisa acadêmica. Para testificar tal afirmação, segue como exemplo o vídeo
com a participação da aluna Rayssa dos Santos Macêdo, egressa do CTIM – Bateria
– EMUFPA, acompanhando com o groove “Os Manos 2” o professor, artista e
compositor José Maria Bezerra (UFPA) durante a execução da música de autoria
deste “Numa manhã de Sol de Setembro” (Disponível em
<https://www.instragram.com/p/CFSnMdMhjQe/>. Acesso em 20 de set. de 2020).
52

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa se justificou desde o momento em que se confirmou,
sobretudo durante o percurso acadêmico, que minha inquietação de longas datas
acerca da carência de materiais didáticos voltados para os ritmos paraenses na
bateria também era uma inquietação de meus alunos e de outros bateristas e
percussionistas de nossa região. Poucos pesquisadores já se aventuraram em
adaptar ritmos paraenses à bateria, por conta disso e pelo fato de ser professor em
uma instituição de ensino profissionalizante, fui impelido a suprir, em certa medida,
esta escassez de materiais com perfil conteudístico.
Elaborar o produto “GROOVES DO PARÁ e-book”, com informações
contextualizadas no artigo sobre o processo das transcrições da percussão,
adaptações e variações para a bateria das levadas do Carimbó de Vigia, do Samba
de Cacete de Cametá e do Lundu Marajoara de Soure, foi possível graças à
colaboração de um grande grupo de pessoas mencionadas tanto no artigo quanto no
produto final desta pesquisa.
Ao dialogar com os alunos e com bateristas paraenses profissionais durante
o processo de construção do e-book, percebeu-se que além do objetivo geral
proposto, os objetivos específicos também foram sendo atendidos de acordo com a
produção em andamento.
Dada a escassez quanto à produção científica de trabalhos sobre ritmos
paraenses adaptados para a bateria, não sabia de início, se a pesquisa bibliográfica,
a pesquisa de campo e as transcrições seriam suficientes para a produção do
material a ser desenvolvido.
O fato é que por conta dos resultados alcançados até aqui, foi possível, em
certa medida, ainda que não saibamos o quanto, suprir a lacuna existente quanto à
exiguidade de materiais acerca de adaptação de ritmos paraenses para a bateria,
otimizar a formação profissionalizante dos alunos do CTIM − Bateria da EMUFPA e,
atender a músicos em geral interessados de forma direta ou indireta na temática
desta pesquisa.
Quanto às referências sobre ritmos brasileiros adaptados para a bateria,
foram elencados os seguintes autores: Matos (2004); Rocha (2007); Bolão (2010);
Monteiro (2015); Barsalini (2009,2014); Ferreira (2016); Palmeira (2017); Leppaus
(2019). Em relação às questões musicológicas oriundas da percussão com reflexos
53

para a bateria, a principal referência foi Monteiro (2016). Todos sinalizaram ideias
para os conteúdos musicais a serem investigados e inseridos no artigo e no produto
final.
Cabe ressaltar que ir a campo, a locais desconhecidos, para coletar os
dados, não é tarefa fácil. Viajar, durante o período letivo, é um tanto quanto
desafiador dado ao curto tempo disponível. Além disso, houve a triste ocorrência da
Pandemia do vírus COVID-19, que prejudicou esta pesquisa quanto a sua execução
no tempo normal, além de ter forçado a mudar a metodologia para parte da coleta de
dados – fase 3 (variações e produto) - que deveria ser realizada de forma presencial
e coletiva com os alunos do CTIM – Bateria – EMUFPA, logo inviabilizando também
um maior aprofundamento em algumas questões musicológicas que provavelmente
teriam maior densidade e amplitude.
Com tudo isso, a conclusão é que este trabalho GROOVES DO PARÁ e-
book cumpre com as exigências solicitadas por este programa de Mestrado
Profissional – ProfArtes - na linha de pesquisa “Processo de Ensino e Criação em
Artes”, bem como seus desdobramentos midiáticos, por se tratar de um livro digital.
As análises musicológicas e o produto – e-book que acompanha a produção
final desta pesquisa são respostas acerca do “o quê” e “como” ensinar ritmos
paraenses na bateria. Sendo uma pesquisa que nasce em uma escola
profissionalizante em Belém do Pará, acredita-se que ela possa, por conta de seus
resultados, ser útil e relevante para outras instituições de ensino, no mesmo ou em
outros níveis acadêmicos.
Porém, tem-se consciência da limitação deste trabalho, há ainda muito a ser
feito, pois o Pará é muito grande e existem muitas levadas e grooves a serem
investigados e registrados. Acredita-se, portanto, que dar continuidade nas
investigações acerca dos grooves será por longos anos uma missão a fim de que
muitos outros trabalhos possam emergir direta ou indiretamente e sejam
beneficiados com este viés de conhecimento, tão necessário e importante a nossa
música.
54

REFERÊNCIAS
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desenvolvimento de padrões de samba na bateria. Campinas, 2009. 172f.
Dissertação (Mestrado em Música). Universidade Estadual de Campinas UNICAMP,
2009.

__________________. Modos de execução da Bateria no Samba. 2014. 264f. Tese


(Doutorado em música) - Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP,
Campinas, 2014.

BERENDT, Joachim E., HUESMANN, Günter (Rev.). O Livro do Jazz: de Nova


Orleans ao século XXI. Tradução de Rainer Patriota e Daniel Oliveira Pucciarelli.
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BÓGEA, E., FIGUEIREDO, S.L, Hibridismo cultural e atualização da cultura: O


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BOLÃO, Oscar, Batuque é um privilégio: a percussão na música do Rio de Janeiro


para músicos, arranjadores e compositores - São Paulo: Irmãos Vitale, 2010. 168p.

BOTA, João Victor. A Transcrição Musical como Processo Criativo. 2008. 99f.
Dissertação (Mestrado em Música) Universidade Estadual de Campinas –
UNICAMP, Campinas, 2008.

CARDOSO. Ângelo N. A linguagem dos Tambores. 2006. 245f. Tese (Doutorado em


Etnomusicologia) Universidade Federal da Bahia – UFBA, Salvador, 2006.

CHERMONT, de Miranda, V. Glossário paraense, ou, Coleção de vocábulos


peculiares à Amazônia e especialmente à ilha de Marajó. Belém: Livraria
Maranhense, 1906.

COSTA. Ivone Gaia Maués (org.). Sons e ritmos africanos na Amazônia. Belo
Horizonte: Historiarte, 2016.

D’ALBUQUERQUE, André Wilkes Louzada. Samba de Cacete da Comunidade de


Vacaria, em Cametá-Pa. 2016. 80 fls. Trabalho de Conclusão de Curso –
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