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Incentivos ao “Compliance” Tributário: Uma Análise de sua Aplicação ao


Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica

Thesis · June 2019

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Renata Tauil Martins Lanz

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ

Curso de Direito

INCENTIVOS AO “COMPLIANCE” TRIBUTÁRIO: UMA ANÁLISE DE SUA


APLICAÇÃO AO IMPOSTO SOBRE A RENDA DA PESSOA JURÍDICA

RENATA TAUIL MARTINS LANZ

Rio de Janeiro

2019.1
RENATA TAUIL MARTINS LANZ

INCENTIVOS AO “COMPLIANCE” TRIBUTÁRIO: UMA ANÁLISE DE SUA


APLICAÇÃO AO IMPOSTO SOBRE A RENDA DA PESSOA JURÍDICA

Artigo Científico Jurídico apresentado à


Universidade Estácio de Sá, Curso de
Direito, como requisito parcial para
conclusão da disciplina Trabalho de
Conclusão de Curso.

Orientador: Prof. Benevenuto Silva dos


Santos

Rio de Janeiro

Campus Presidente Vargas

2019.1
2

RESUMO

O presente estudo analisou como o uso de incentivos pode ser aplicado para a obtenção de
conformidade tributária na legislação do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica. A análise deste
trabalho foi fundamentada na legislação brasileira no âmbito constitucional, tributária com especial
atenção para o imposto sobre a renda da pessoa jurídica, e também, a legislação e experiência
internacional sobre conformidade tributária. Os resultados da análise indicaram que a implantação
de incentivos à conformidade tributária é compatível com o ordenamento jurídico brasileiro e tem
potencial para melhorar a eficiência e eficácia da administração tributária.

Palavras-chave: Compliance tributário; Direito Tributário; Imposto sobre a Renda da Pessoa


Jurídica; Eficiência; Administração Pública.

SUMÁRIO

1 Introdução. 2 Desenvolvimento: 2.1 Definição de “compliance tributário”; 2.2 Análise das


especificidades da legislação do IRPJ na legislação brasileira; 2.3 Tipos de incentivos à
conformidade tributária voluntária para a Pessoa Jurídica; 2.4 Análise do Pró-conformidade. 3
Conclusão. Referências.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho pretende demonstrar a aplicabilidade do uso de


incentivos na legislação do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) com o
fim de obtenção da conformidade tributária voluntária pelas empresas.
Esta análise é essencial, pois os tributos, em especial, o Imposto sobre a
Renda da Pessoa Jurídica, têm papel relevante no custeio das políticas públicas
num Estado Democrático de Direito. Apesar da legislação contar com uma série de
sanções à não conformidade com as obrigações principais e acessórias, avolumam-
se casos de evasão e sonegação fiscal. Além disso, as Administrações Tributárias
têm recursos humanos e financeiros limitados para exercer a fiscalização. Nesse
contexto, alterações legislativas que estimulem a conformidade voluntária dos
contribuintes podem resultar em melhor arrecadação e mais eficiente alocação de
recursos na fiscalização.
Nos últimos anos uma série de iniciativas legais tem buscado facilitar e
incentivar o cumprimento das obrigações dos contribuintes com relação à tributação
sobre a renda, abrangendo simplificação de obrigações acessórias, informatização,
tratamento diferenciado conforme o porte e características do contribuinte, inclusive
com agregação de tributos, como nas iniciativas do Simples e do MEI. No dia
3

15.10.2018, a Secretaria de Receita Federal do Brasil (SRFB) divulgou a Consulta


Pública nº 04/2018 que apresenta o Programa de Estímulo à Conformidade
Tributária, chamado de “Pró-Conformidade” que segundo a Secretaria de Receita
Federal do Brasil, autarquia do Ministério da Economia, foi inspirado nas tendências
das melhores e mais modernas administrações tributárias do mundo, e tem por
objetivo a promoção de “boas práticas com o fim de evitar desvios de conduta e
fazer cumprir a legislação”1.
Para atingir o objetivo deste trabalho, de demonstrar a aplicabilidade do uso
de incentivos à conformidade tributária voluntária na legislação do IRPJ, é
necessário definir o conceito de “Compliance tributário”, identificar as especificidades
da legislação do IRPJ, incluindo as penalidades previstas no caso de não
cumprimento das obrigações tributárias, analisar os tipos de incentivos à
conformidade tributária voluntária usualmente adotados versus os sugeridos pelas
boas práticas e experiência nacional e internacional, para então, analisar a Portaria
proposta na Consulta Pública para futura instituição do Programa de Estimulo à
Conformidade Tributária, nomeado por “Pró-Conformidade”.
Esta pesquisa utiliza o método bibliográfico e busca analisar a proposta
tendo como referencial teórico a legislação constitucional brasileira, o Código
Tributário Nacional e a lei de imposto sobre a renda da pessoa jurídica, além das
recomendações internacionais da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), do Fundo Monetário Internacional (FMI), da
US Agency for International Development (USAID), do Banco Mundial, entre outros.

2 DESENVOLVIMENTO

Segundo Paulsen2 no Estado de direito democrático a receita tributária é a


principal fonte de custeio das atividades públicas. De acordo com a Constituição o
pagamento de tributos é um dever fundamental de todos os integrantes da
sociedade. O cidadão é responsável direto pela viabilização da existência e do

1 CORRÊA, A et al., Cinco aspectos do pró-conformidade - Programa de compliance da RFB reforça


a lógica do ‘paradigma do crime’. Jota. 2018. p. 1.
2 PAULSEN, L. Curso de Direito Tributário completo. 10 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019,
p.25.
4

funcionamento das instituições públicas. Esta definição também é reforçada pelo


voto do Ministro Humberto Martins do STJ no REsp 1233721 PR, j. 1º-3-2011, 2ª T:

O Direito Tributário, um dos ramos do Direito Público, tem por finalidade


precípua o interesse público, segundo o qual ao Estado é dado o direito-
dever de arrecadar tributos, com o objetivo de obter receitas para a
garantia do bem estar social.

Ademais, uma administração tributária eficaz deve ser capaz de garantir


que os indivíduos obrigados a pagar impostos, o estão fazendo. Observe-se, como
objetivo, a administração tributária deve facilitar a conformidade ao contribuinte e
impor o cumprimento da obrigação tributária, isto tudo no intuito de reduzir a evasão
fiscal e melhorar a governança, a fim de reforçar a legitimidade do sistema
tributário. Então, como pode ser definido a conformidade ou compliance tributário?

2.1 DEFINIÇÃO DE “COMPLIANCE TRIBUTÁRIO”

Num sentido amplo, compliance pode ser definido como cumprimento ou


obediência a regras ou a padrões de comportamento. De acordo com Veríssimo3,
compliance significa “estar de acordo, cumprir com as leis e com os regulamentos
estatais”. Para entender a importância do compliance no âmbito do direito tributário,
mais especificamente no contexto brasileiro, é necessário entender suas origens e
sua relação com a Constituição Brasileira, e também, alguns de seus princípios.

Para Mazza4, o “Direito Tributário é o ramo do direito público que estuda


princípios e normas disciplinadoras do exercício das atividades de instituição,
cobrança e fiscalização de tributos”. Essa definição por si só já demonstra a ligação
do compliance com o Direito Tributário, uma vez que este tem a ver com princípios
(regras gerais) e normas (regras específicas) que disciplinam padrões de
comportamento (instituição, cobrança e fiscalização de tributos).
Um ponto de destaque no estudo do compliance é o seu caráter
interdisciplinar5, haja vista a separação do direito em disciplinas, de acordo com o

3 VERÍSSIMO, C. Compliance – incentivo à adoção de medidas anticorrupção. 1. ed. São Paulo:


Saraiva, 2017, p. 13.
4 MAZZA, A. Manual de Direito Tributário. 5. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p.39.

5 CARVALHO, Paulo de Barros. (Coord). Compliance no Direito Tributário. 1. ed. São Paulo:

Thomson Reuters – Revista dos Tribunais. 2018, p. 11.


5

objeto regulado, porém não há que se falar em compliance tributário sem que afete o
direito administrativo, civil, empresarial e penal. Além disso, há uma
interdisciplinaridade externa, em especial a contábil, além dos potenciais efeitos
econômicos e fiscais, decorrentes de uma maior eficiência e eficácia da
Administração Tributária (AT) sobre a arrecadação e o ambiente de negócios.

2.1.1. O compliance e os princípios constitucionais

O advento do compliance, como objeto de estudo, pode ser relacionado


especialmente a alguns princípios constitucionais. De acordo com Torres6, o
princípio da economicidade, está expressamente previsto no art. 70 da Constituição
Federal de 1988, e, “informa o orçamento público, no sentido de produzir o máximo
de bens e serviços com o mínimo de receita, e a fiscalização das contas públicas”.
Já a Emenda Constitucional 19/98 incluiu o “princípio da eficiência” na Carta
Magna7, em seu artigo 37, relacionando-o diretamente com a atividade tributária
como pode ser verificado em sua exposição de motivos8:

[...] incorporar a dimensão da eficiência na administração pública: o


aparelho de Estado deverá se revelar apto a gerar mais benefícios, na
forma de prestação de serviços à sociedade, com os recursos disponíveis,
em respeito ao cidadão contribuinte. (grifos nossos)

A Emenda Constitucional 42/03 mantém essa lógica da aplicação da


eficiência aplicada à Administração Pública, e refere-se diretamente à Administração
Tributária9 no artigo 37, inciso XXII, da Constituição Federal. Percebe-se uma
preocupação com uma atuação colaborativa: “atuarão de forma integrada, inclusive
com o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, na forma da lei ou
convênio”.

6 TORRES, R. L. Curso de Direito Financeiro e Tributário, 19. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2013. p
99.
7 LIMA, L. M. M. A aplicação do dever de eficiência à Administração Pública Tributária e sua relação

com a Moral Tributária dos contribuintes. Revista Digital de Direito Administrativo, USP, v. 2, n. 1,
2015, p. 275.
8 BRASIL. Constituição (1988). Emenda constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998. Modifica o

regime e dispõe sobre princípios e normas da Administração Pública, servidores e agentes


políticos, controle de despesas e finanças públicas e custeio de atividades a cargo do Distrito
Federal, e dá outras providências.
9 LIMA, L. M. M., op. cit., p. 278.
6

A partir desta análise verifica-se que a busca pelo compliance num sentido
amplo e pela conformidade tributária, em particular, tem suporte nos princípios
constitucionais da economicidade e eficiência. Portanto, se busca o compliance, por
parte dos contribuintes para melhorar a eficiência e a eficácia da Administração
Tributária.
No entanto, é necessário entender como obter esta conformidade pelo
contribuinte. Para esta análise é importante compreender os fatores que levam o
contribuinte a cada comportamento. Para isso, precisamos entender o conceito de
moral tributária, sua relação com o paradigma tradicional de uso sanções (teoria
econômica do crime) e como a conformidade é afetada pelos custos de
conformidade, que são os objetos de análise das próximas seções.

2.1.2. Conformidade e Moral Tributária

Rossini e Kanayama10, a partir da busca da eficiência, ponderam que a


Administração Tributária tem reconhecido a existência de limitações na teoria da
escolha racional (rational choice) e na aplicação de sanções legais para explicar o
comportamento do contribuinte. A partir desta constatação, os autores analisaram
como fatores sociais, psicológicos, culturais ou políticos poderiam auxiliar na
explicação do grau de cumprimento tributário (tax compliance) de uma população.
Quanto maior o grau de obediência por razões não relacionadas a interesses
egoísticos, maior a moral tributária (tax morale) verificada. Nesse contexto, a moral
tributária pode ser definida como a “predisposição para contribuir, uma motivação
intrínseca para pagar tributos, que tem lastro nas convicções e crenças dos
indivíduos, opondo-se à ideia de um indivíduo amoral maximizador de utilidades”.
Dessa forma, certos indivíduos, mesmo diante da oportunidade de evadir, preferem
pagar tributos.
Para Lima11, as modernas teorias de promoção da Moral Tributária dos
Contribuintes (tax morale) aplicam-se ao dever de eficiência, entendido no sentido
de “obrigar que a sua própria implementação implique passos para alcançar os

10 ROSSINI, G. DE M.; KANYAMA, R. L. Tributos Afetados: Perspectivas da Teoria da Escolha


Pública, da Moral Tributária e da Eficiência Econômica. Revista Estudos Institucionais, v. 3, 1, 2017,
p. 576.
11 LIMA, L. M. M., op. cit., p. 275 e 287.
7

programas obrigatórios definidos pela Constituição Federal”. Um potencial aspecto


positivo da aplicação deste princípio à tributação é que a aplicação eficiente das
normas tributárias pode ajudar a obter maior igualdade tributária, respeitando a
capacidade contributiva, permitindo a uniformidade da tributação conforme a renda
de cada contribuinte.
Segundo Cummings et al12, cada vez mais pesquisas empíricas buscam
explicar o motivo pelo qual as pessoas paguem seus impostos – mesmo não
gostando de fazê-lo. Na prática, na maior parte das vezes, elas cumprem suas
obrigações tributárias.
Apesar de existir um entendimento comum que a conformidade tributária
depende da aplicação de sanções e medidas coercitivas, esta também é afetada
pela percepção individual da qualidade da governança, entendida como a prestação
de serviços públicos13. Nesse contexto, as relações governo-indivíduo que
estimulam o pagamento espontâneo dos tributos, o cumprimento das obrigações
formais acessórias, se fundamentam na ideia da Moral Tributária dos Contribuintes.

2.1.3. Moral tributária versus Teoria Econômica do Crime

Segundo Lima14, os estudos sobre a Moral Tributária representam uma


abordagem alternativa à “Teoria Econômica do Crime” (TEC), que considera que
todos os indivíduos têm comportamento oportunista, pensando somente em si
mesmos e na obtenção de ganhos. Alm e Togler15, analisaram a TEC, partindo das
proposições de Allingham e Sandmo, em seu artigo pioneiro de 1972, que acredita
que um indivíduo racional busca maximizar a utilidade esperada num “jogo” de
evasão fiscal, pesando os benefícios de ser bem-sucedido em sua irregularidade
contra o risco de detecção e punição.
Esta visão resultou numa corrente doutrinária que acredita de que apenas
com o aumento da eficiência do aparelho coercitivo do Estado os contribuintes
cumpririam com as obrigações tributárias. Para esta corrente, o aumento da

12 CUMMINGS, R. et al. Effects of Tax Morale on Tax Compliance: experimental and survey evidence.
Journal of Economic Behavior & Organization, v. 70, n. 3, jan. 2009. p. 447.
13 CUMMINGS, R. et al. op. cit., p. 450.
14 LIMA, L. M. M., op. cit., p. 275 e 287.
15 ALM, J.; TORGLER, B. Do ethics matter? Tax compliance and Morality. Tulane Economic Working

Paper Series. Working Paper 1207. New Orleans, LA: Tulane University, 2012, p. 4.
8

conformidade tributária seria decorrente do medo da fiscalização e das multas.


Portanto, a busca da eficiência deveria restringir-se ao controle coercitivo dos
contribuintes, respeitados os limites constitucionais16.
De acordo com Silva Filho et al.17, nos últimos quarenta anos foram realizados
muitos estudos buscando explicar os motivos para o não cumprimento das leis
tributárias. Segundo Stolle e Rodrigues Junior18, o estudo da evasão fiscal identifica
vários fatores que influenciam na conformidade tributária, além das razões
econômicas. Entre estes fatores, como incentivadores da evasão fiscal, pode-se citar
o “parasitismo”, comportamento em que os cidadãos se beneficiam de despesas
públicas e minimizam o pagamento de impostos; e uma percepção da “má
distribuição de renda”. É nessa visão que as práticas de sanções e auditorias fiscais
- poder coercitivo - seriam os principais fatores para obtenção do compliance
tributário, gerando um ambiente de conformidade forçado, que estimula o
pagamento dos tributos.
Nesse cenário, o objetivo do governo e das administrações tributárias seria
desenvolver mecanismos para forçar o contribuinte a cumprir com suas obrigações
tributárias. Por outro lado, estudos mais recentes de Alm e Togler19 levantam
discussões e novas hipóteses sobre o que motiva ou desmotiva a conformidade
tributária.

2.1.4. Custos de Conformidade Tributária

Martins Filho20 analisou outro componente importante, o custo e a


complexidade para o atendimento às exigências de conformidade no Direito
Tributário brasileiro a partir de uma análise comparativa das obrigações tributárias
acessórias no Brasil e em outros países. Segundo o autor, a sistemática de

16 LIMA, L. M. M., op. cit., p. 287.


17 SILVA FILHO et al. Conformidade tributária e comportamento do contribuinte: uma análise dos
fatores que explicam a observância tributária à luz da Teoria do Comportamento Planejado. RC&C -
Revista Contabilidade e Controladoria, Curitiba, v. 10, n. 1, p. 54-70, jan./abr. 2018, p. 55.
18 STOLLE, C.; RODRIGUES JUNIOR. M. M. Influência do Poder Legítimo da Autoridade Fiscal

Sobre a Conformidade Tributária: Um Estudo em Empresas de Serviços. XIX ENGEMA. ISSN


2359-1048, Dezembro, 2017, p. 3.
19 ALM, J.; TORGLER, B. op. cit, p. 31.
20 MARTINS FILHO, L. D. Custo para o Cumprimento das Normas de Conformidade no Direito

Tributário Brasileiro: O Peso das Obrigações Tributárias Acessórias ou dos Deveres Instrumentais.
Revista do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFC. v. 35.1, jan./jun. 2015, p. 219.
9

lançamento por homologação, da forma como é adotada no Brasil, acarreta uma


dupla punição ao contribuinte, que assume totalmente os riscos das obrigações
acessórias e não tem mecanismos de correção pela via administrativa.
Bertolucci21 propõe o conceito de Custos de Conformidade à Tributação, que
são os recursos gastos, pelos contribuintes, para o cumprimento das obrigações
legais tributárias. Este conceito compreende as informações prestadas à
Administração Tributária federal, estadual ou municipal, relativas a tributos, inclusões
e exclusões determinadas pelas normas tributárias, atendimento a fiscalização,
adaptação a alterações da legislação, defesa em autuações e processos
administrativos e judiciais.
De acordo com Zittei et al.22 é importante diferenciar os custos
administrativos, que são “os recursos do poder público destinados a legislar,
arrecadar, controlar e julgar as questões relativas a tributos”; dos custos relativos à
conformidade, que são os gastos que os contribuintes, têm para “cumprir as
obrigações principais e acessórias definidas pelo poder público”. Segundo esses
autores, os custos de conformidade foram por muito tempo “custos ocultos” da
tributação.
Para Sandford, Godwin e Hardwick23, os custos de conformidade tributária
podem ser classificados em três tipos: (i) custos monetários diretos; (ii) custos
temporários; e (iii) custos psicológicos. Os custos monetários compreendem a
estrutura operacional para executar as atividades necessárias ao preenchimento de
declarações e documentação acessória para atender às exigências da
Administração Tributária. Os custos temporários correspondem ao tempo gasto na
execução das atividades fiscais. Já os custos psicológicos se referem ao estresse e
desgaste gerado pela relação entre contribuinte e Administração Tributária.
De acordo com Paulo de Barros Carvalho24, o compliance, obteve maior
destaque no Brasil, a partir de 2014, quando passou a vigorar a Lei 12.846/2013 –

21 BERTOLUCCI, A. V. Uma contribuição ao Estudo da incidência dos Custos de Conformidade às


Leis e Disposições Tributárias: um panorama mundial e pesquisa dos custos das companhias de
Capital Aberto no Brasil. 2001, 178 f. Dissertação (Mestrado em Controladoria e Contabilidade) -
Departamento de Contabilidade e Atuária, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade.
Universidade de São Paulo - USP, São Paulo, 2001, p.6.
22 ZITTEI, M. V.M. et al. O custo de conformidade à tributação no processo orçamentário em uma

indústria alimentícia. Rev. Ciênc. Admin., Fortaleza, v. 21, n. 2, jul./dez. 2015, p. 393.
23 SANDFORD, Cedric; GODWIN, Michael; HARDWICK apud ZITTEI, M. V. M. et al ibid p. 394.

24 CARVALHO, P. B. (Coord). op. cit., p. 9.


10

Lei Anticorrupção, apesar disso, já existiam outras legislações para regular e coibir
várias práticas a serem evitadas.

2.2 ANÁLISE DAS ESPECIFICIDADES DA LEGISLAÇÃO DO IRPJ NA


LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

O art. 3º do Código Tributário Nacional dispõe que: “Tributo é toda


prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir,
que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante
atividade administrativa plenamente vinculada”.
De acordo com Mazza25, tributo é uma obrigação instituída por lei, ou seja,
uma obrigação “ex lege”, e não “ex voluntate”, assim, a lei é a única fonte possível
da obrigação de recolher tributos.
Fernandes26, em sua obra, elencou os princípios constitucionais gerais
tributários, quais sejam, legalidade, anterioridade, irretroatividade, capacidade
contributiva, igualdade e vedação do efeito confisco.
Segundo Rocha27, a legalidade tributária descrita na Constituição da
Federal (CRFB) nos artigos 150, inciso I e 153, parágrafo 1º, tem fundamento no
princípio geral da legalidade previsto no artigo 5º, inciso II, da CRFB, “ninguém é
obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei”. Seguindo este
raciocínio, para o tributo ser obrigatório, ele deve ser estipulado por lei. Por fim,
Rocha conclui que pelo art. 150, I, da CRFB a legalidade tributária é determinação
mais rígida que a cláusula geral do art. 5º, II, CRFB.
Por sua vez, Paulsen28 discorre sobre o princípio da segurança jurídica e
apresenta seus conteúdos, para este trabalho será enfocado no conteúdo da
certeza do direito que engloba os princípios da legalidade, irretroatividade e
anterioridade.
De acordo com a Constituição Federal, em seu artigo 153, inciso III e
parágrafo segundo combinado com os artigos 43 e 45 do Código Tributário

25 MAZZA, A. op. cit., p. 90.


26 FERNANDES, E. C. Imposto de Renda da Pessoa Jurídica – IRPJ e contribuição Social sobre o
Lucro – CSLL – De acordo com a Lei no 12.973, de 2014. São Paulo : Atlas. 2015, p. 11.
27 ROCHA, J. M. Direito Tributário. 11 ed. Rio de Janeiro : Forense, 2018, p. 116.

28 PAULSEN, L., op. cit., p.81.


11

Nacional, o imposto sobre a renda, além dos princípios tributários, deve submeter-
se aos princípios da progressividade, generalidade e universalidade.
Segundo Fernandes29, a definição do fato gerador do imposto sobre a renda
é formada por dois elementos: (i) Aquisição de disponibilidade: a. jurídica, b.
econômica; e (ii) acréscimo patrimonial: a. renda, b. proventos de qualquer
natureza. A base do cálculo do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica é
identificada por Lucro presumido; Lucro real; ou Lucro arbitrado. A alíquota é
progressiva.
Como foi visto anteriormente, o uso de sanções, baseadas na Teoria
Econômica do Crime é um dos principais meios de obter o cumprimento das
obrigações tributárias. No entanto, de acordo com Carvalho30 não podem ser
impostos aos contribuintes obrigações, sanções ou restrições em medida superior
ao necessário para atendimento do interesse público, portanto deve-se observar os
limites da razoabilidade e proporcionalidade, adequação com o ilícito praticado.
No caso do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica, a partir da análise
da IN RFB 1.700/201731 pode-se identificar as principais sanções (multas,
penalidades e acréscimos). Para esta análise é importante diferenciar (i) os
acréscimos legais por atraso, como a multa e os juros de mora, que tem
possibilidade de recolhimento espontâneo, podendo desta forma ser considerados
como um estímulo ao compliance voluntário; (ii) da autuação fiscal, que é uma
multa de ofício, que pode inclusive ser originada de descumprimento de obrigações
acessórias.
A pessoa jurídica submetida à ação fiscal por parte da Receita Federal do
Brasil poderá pagar, até o vigésimo dia subsequente à data de recebimento do
termo de início de fiscalização, os tributos e contribuições já declarados, de que for
sujeito passivo como contribuinte ou responsável, com os acréscimos legais
aplicáveis nos casos de procedimento espontâneo, ou seja, de no máximo 20%,

29 FERNANDES, E. C. op. cit., p. 31.


30 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p.
551.
31 BRASIL. Secretaria da Receita Federal do Brasil. Instrução Normativa RFB Nº 1700, de 14 de

março de 2017. Dispõe sobre a determinação e o pagamento do imposto sobre a renda e da


contribuição social sobre o lucro líquido das pessoas jurídicas e disciplina o tratamento tributário da
Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins no que se refere às alterações introduzidas pela Lei nº
12.973, de 13 de maio de 2014. Disponível em: <
http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=81268>. Acesso em: 13 maio
2019.
12

não prevalecendo, neste caso, a multa de ofício na forma citada acima. Aqui mais
uma vez, pode ser identificado um estímulo ao compliance voluntário e
autorregularização pelo contribuinte.

2.3 TIPOS DE INCENTIVOS À CONFORMIDADE TRIBUTÁRIA VOLUNTÁRIA


PARA A PESSOA JURÍDICA

2.3.1. Estímulos à Conformidade Tributária Voluntária

De acordo com Stolle e Rodrigues Junior32, nas análises sobre evasão fiscal,
pode-se destacar efeitos positivos para a conformidade quando ocorre uma
aproximação entre fisco e contribuintes. Devido a diferença de poder entre as partes,
essa interação é hierarquicamente estruturada, pois a administração tributária pode
impor leis fiscais e punir os contribuintes não conformes. A interação das
autoridades tributárias pode ser dividida em duas: (i) o uso do poder coercitivo, o que
imputa a auditoria e a sanção; e (ii) o poder legítimo, o que decorre da percepção de
que a autoridade tributária está em posição de exigir o cumprimento das obrigações.
Dijk e Siglé33 analisaram estratégias de compliance cooperativo que visam
estimular a conformidade tributária dos contribuintes e concluíram que para obtê-lo a
Administração Tributária deveria investir em: melhorar a percepção de justiça
procedimental, reduzir a incerteza do contribuinte e melhorar o gerenciamento
tributário pelo contribuinte.
Para Bird34, as Administrações Tributárias devem estimular o compliance
facilitando que os potenciais contribuintes façam parte do sistema tributário. Para
isto deve-se simplificar o processo de registro do contribuinte (preferencialmente
com um registro único); facilitar a apuração dos tributos devidos, sejam estes
apurados pela Administração Tributária ou pelo próprio contribuinte; facilitar o
processo de recolhimento e prover o contribuinte com serviços, tais como

32 STOLLE, C.; RODRIGUES JUNIOR. M. M., op cit., p. 3.


33 DIJK, L. V.-V.; SIGLÉ, M. Managing compliance risks of large businesses: A review of the
underlying assumptions of co-operative compliance strategies. eJournal of Tax Research, 760-783,
2015, p 760.
34 BIRD, R. October 31). Smart Tax Administration. Economic Premise. The World Bank - Economic

Premise, pp. 1 – 5, 2010, p. 2.


13

informações, cartilhas, agências de aconselhamento, facilidades de pagamento e


preenchimento eletrônico de declarações.
Braithwaite35, baseado no modelo de compliance da Austrália, propõe que as
administrações tributárias se apoiem em quatro componentes: (i) entender o
comportamento do contribuinte; (ii) criar parcerias com a comunidade; (iii) aumentar
a flexibilidade nas operações para encorajar o suporte ao compliance e (iv) criar
mais opções escaláveis para reforçar o compliance.

2.3.2. Melhores práticas de incentivos à conformidade tributária –


recomendações internacionais

Para levantar os tipos de incentivos aplicáveis a conformidade voluntária é


possível verificar a experiência nacional e internacional, com o compliance
tributário.
No caso da experiência internacional é importante analisar especialmente
as recomendações de organismos multilaterais e instituições de fomento, como a
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), da US
Agency for International Development (USAID) e do Fundo Monetário Internacional
(FMI), conforme detalhado a seguir.
A OCDE36 propõe que a estratégia da Administração Tributária (AT) leve em
conta a atitude dos contribuintes com relação aos tributos, diferenciando a
conformidade voluntária daquela “forçada” por uma intervenção da Administração
Tributária. Para medir a conformidade dos contribuintes são identificadas quatro
categorias: (i) registrar-se para propósitos tributários; (ii) apresentar as declarações
nos prazos; (iii) reportar as obrigações fiscais corretamente; e (iv) pagar os tributos
em dia. Uma abordagem sistêmica avalia o comportamento dos contribuintes ao
longo do tempo com relação ao cumprimento voluntário de suas obrigações, a partir
deste é possível atribuir “selos de bom pagador” e propor segmentações dos
contribuintes, para então, direcionar a abordagem da Administração Tributária em
relação a cada segmento.

35 BRAITHWAITE, J. Meta Risk Management and Responsive Regulation for Tax System Integrity.
Law and Policy, 25(1), pp. 1-16, 2003, p.4-5.
36 OCDE-Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico. Measures of Tax

Compliance Outcomes: A Practical Guide, OECD Publishing, 2014, p. 60-69.


14

Para a USAID37, as administrações tributárias devem adotar uma estratégia


de prestação de serviços e facilitação do pagamento de tributos. Algumas medidas
para estimular a conformidade voluntária são: (i) simplificar os procedimentos; (ii) ter
serviços e procedimentos adequados a cada semento de contribuintes; (iii) prover
suporte e medidas educativas aos contribuintes; (iv) estabelecer um rigoroso
sistema de penalização; (v) sujeitar as decisões a um processo de
contestação/apelo; e (vi) estabelecer uma reputação de tratamento justo.
O FMI38 apresenta um modelo de diagnóstico e melhoria das
administrações tributárias, implantado em vários países do mundo, inclusive em
alguns estados brasileiros. Este modelo abrange os resultados em nove áreas: (i)
integridade da base de registros de contribuintes; (ii) avaliação dos riscos de
conformidade; (iii) qualidade do suporte provido pela Administração Tributária para
a conformidade voluntária; (iv) extensão em que os contribuintes cumprem suas
obrigações; (v) extensão do pagamento das obrigações pelos contribuintes; (vi)
acuracidade com que os contribuintes declaram suas obrigações tributárias; (vii)
adequação do processo de resolução de conflitos/contestações; (viii) eficiência da
administração tributária (métodos de arrecadação, sistemas contábeis, custos de
conformidade); e (ix) nível de responsabilização (accountability) e transparência.

2.3.3. Incentivos à conformidade tributária no Brasil

No Brasil pode-se verificar a experiência com outros tributos federais e


estaduais. Passos39 propõe que para aumentar os índices de conformidade
tributária é preciso analisar o histórico comportamental dos contribuintes visando a
identificação dos fatores que induzem a desconformidade com a legislação. Um dos
itens que comprovadamente, melhoram a conformidade e funcionam como
incentivo, é a simplificação do sistema tributário, pois esta, além de diminuir os
custos de conformidade e de arrecadação muitas vezes também pode levar a

37 USAID. Detailed Guidelines for Improved Tax Administration in Latin America and the Caribbean.
USAID Leadership in Public Financial Management (LPFM), 2013, p. 27.
38 FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL-FMI (2013). A Tax Administration Diagnostic Assessment

Tool (TADAT™ ). Washington: Multi-donor Trust Fund - International Monetary Fund, p. 5-6.
39 PASSOS, G. R. P. SPED – Sistema Público de Escrituração Digital: um novo paradigma em termos

de conformidade tributária. Dissertação de Mestrado. Ciências Contábeis. FECAP. 2010, p. 49.


15

ampliação da base de arrecadação, o que em última análise pode até mesmo criar
oportunidades para redução de alíquotas de tributos.
Considerando o conceito amplo de compliance tributário, duas experiências
brasileiras merecem destaque: A legislação do SIMPLES e do MEI.
A Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006 instituiu o Simples
Nacional, como “um regime compartilhado de arrecadação, cobrança e fiscalização
de tributos aplicável às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte”, que tem a
participação de todos os entes da federação (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios)40. Entre as vantagens do Simples tem-se: (i) Possibilidade de menor
tributação em relação a outros regimes tributários (como Lucro Real ou Lucro
Presumido); (ii) Maior facilidade no atendimento da legislação tributária,
previdenciária e trabalhista; (iii) Simplificação no pagamento de diversos tributos
abrangidos pelo sistema, mediante uma única guia; (iv) Possibilidade de tributar as
receitas à medida do recebimento das vendas ("regime de caixa”); (v) Nas licitações
públicas será assegurada, como critério de desempate, preferência de contratação
para as microempresas e empresas de pequeno porte; (vi) Possibilidade de formar
SPE - Sociedade de Propósito Específico e participar de Consórcios Simples, para
compras e vendas de produtos e serviços; (vii) É facultado ao empregador de
microempresa ou de empresa de pequeno porte fazer-se substituir ou representar
junto à justiça do trabalho por terceiros que conheçam dos fatos, ainda que não
possuam vínculo trabalhista ou societário; (viii) Regras especiais para protesto de
títulos, com redução de taxas e possibilidade de pagamento com cheque; (ix) As
empresas enquadradas no Simples, assim como as pessoas físicas capazes,
também são admitidas como proponentes de ação perante o Juizado Especial; (x) A
grande maioria das empresas das optantes pelo Simples estão dispensadas da
entrega da apresentação da DCTF - Declaração de Débitos e Créditos de Tributos
Federais e de outros demonstrativos e declarações específicos, relativamente aos
períodos abrangidos por esse sistema.
A experiência do MEI pode ser classificada como uma grande iniciativa de
busca do compliance tributário voluntário a partir do uso de incentivos, através de
concessão de benefícios financeiros e simplificação de obrigações. Silveira, Carmo

40 BRASIL. Secretaria da Receita Federal do Brasil. Simples Nacional. Disponível em <


http://www8.receita.fazenda.gov.br/SimplesNacional/Documentos/Pagina.aspx?id=3>. Acesso em:
25 abr. 2019.
16

e Souza41, enumeram os seguintes benefícios: (i) Segurança jurídica: A


formalização está amparada em Lei Complementar que impede alterações por
Medida Provisória e exige quórum qualificado no Congresso Nacional; (ii) Ausência
de burocracia e controle simplificado: para se manter formal, basta uma única
declaração por ano, pela Internet, sobre o seu faturamento; (iii) Registro simplificado
na prefeitura (Alvará com expedição eletrônica) e na junta comercial; (iv) isenção de
taxas para formalização; (v) suporte com serviços contábeis no primeiro ano; (vi)
cobertura previdenciária para o empregador e sua família; (vii) contratação de um
funcionário com menor custo; (viii) acesso a novos mercados e serviços bancários;
e (ix) associação com outros MEIs para compras e vendas em conjunto.
Almeida42 relaciona uma experiência brasileira de conformidade tributária
voluntária mais próxima a proposta do Pró-Conformidade, a IN RFB 1.598/201543,
que estabeleceu uma espécie de conformidade cooperativa aduaneira.
Dias e Silveira44 identificam um conjunto de ações de estímulo a
conformidade tributária ao longo dos anos, notadamente de ampliação da
segurança jurídica, estabilidade e colaboração entre fisco e contribuintes. Entre
estas temos: (i) a pacificação de precedentes, introduzida no Código de Processo
Civil de 1973 pelas Leis 11.418/06 e 11.672/08, que foi reforçada pelo Código de
Processo Civil de 2015, pela determinação de observância de acórdãos na
resolução de demandas repetitivas e julgamento de recursos extraordinário e
especial repetitivos; (ii) a autorização para não contestação e não imposição de
recurso pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, desde que não exista
fundamento relevante; (iii) o Programa Alerta, lançado em 2012, como oportunidade
de autorregularização para os contribuintes; e (iv) a incorporação da conformidade

41 SILVEIRA, A.;CARMO, H. M. O.; SOUZA, R. S. Microempreendedor Individual (MEI): Benefícios e


Desafios da Legislação Brasileira para a Aplicação na Prática da Ação. Revista Livre de
Sustentabilidade e Empreendedorismo, v. 2, n. 1, jan-mar, 2017, p.126 e 127.
42 ALMEIDA, C. O. Fisco e contribuintes devem parar de se enfrentar e passar a cooperar. Consultor

Jurídico. 2017, p. 2.
43 BRASIL. Secretaria da Receita Federal do Brasil. Instrução Normativa RFB Nº 1598, de 09 de

dezembro de 2015. Dispõe sobre o Programa Brasileiro de Operador Econômico Autorizado.


Disponível em: <
http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=70204&visao=anotado>.
Acesso em: 13 maio 2019.
44 DIAS, K, J,; SILVEIRA, F. S. A. O compliance e o exercício da fiscalização tributária. 2018. In:

CARVALHO, P. B. (Coord). Compliance no Direito Tributário. 1. ed. São Paulo : Thomson Reuters –
Revista dos Tribunais. 2018, p. 177 a 181.
17

tributária ao Plano Anual de Fiscalização para 2018 da Secretaria da Receita


Federal do Brasil.

2.4 ANÁLISE DO PRÓ-CONFORMIDADE

Para Matarazzo e Conca45, o programa Pró-Conformidade está sendo


proposto por um ato normativo “inadequado para dispor sobre deveres dos
contribuintes e estabelecer medidas punitivas”. Na visão dos autores, o programa
deveria ser instituído por lei federal e não por um ato discricionário da
Administração Tributária, a fim de cumprir com os princípios da legalidade e a
segurança jurídica.
Segundo a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal
do Brasil (Unafisco)46, iniciativas voltadas para a melhoria da relação entre Fisco e
contribuinte são bem-vindas, desde que “sejam realizadas em consonância com o
Sistema Tributário Nacional e com as normas que o regem, em especial com a
Constituição Federal e com o Código Tributário Nacional [CTN]”. Para a entidade, o
artigo 12, inciso I da minuta de portaria que institui o Pró-Conformidade não está em
consonância com o CTN. A explicação para isso é a concessão aos contribuintes
classificados na categoria “A” do seguinte benefício:

(...)informação prévia sobre indício de infração apurado em análise


realizada por Auditor Fiscal da RFB antes de iniciado o procedimento fiscal
de que trata o Decreto 70.235, de 6 de março 1972, hipótese em que não
serão aplicadas as penalidades previstas na legislação tributária federal,
desde que o contribuinte promova a regularização no prazo indicado na
informação.

O benefício proposto, especialmente por uma portaria, não pode contrariar


uma previsão legal. Outra questão, é que mesmo que expresso por lei específica,
se aplicaria em relação à previsão de uma lei mais geral, da forma que está
expresso implicaria em potencial anistia a infrações sem previsão legal. Uma
solução adequada para esta questão seria, além do estabelecimento por lei, uma

45 MATARAZZO. G. C; CONCA, G. Programa de conformidade da Receita vai na contramão da


desejada colaboração. Consultor Jurídico. 2018. p.1.
46 UNAFISCO. Pró-Conformidade pode ferir ordenamento jurídico se vier como portaria. 2018, p. 1.
18

delimitação clara das situações em que seria possível a autorregularização, que não
contemplaria indícios de infração, mas por exemplo, divergências e inconsistências
entre os registros e informações fiscais da Receita Federal e do contribuinte,
identificadas por processos informatizados e ou análises feitas por fiscais, mas em
casos em que ainda não estivesse caracterizada a infração. Este procedimento já é
adotado no caso do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física, em que num
processamento inicial são identificadas pendências e divergências (“malha fina”)
sendo o contribuinte informado, com a possibilidade de correção antes de iniciado o
procedimento fiscal. Além disso foi adotado também para pessoa jurídica com o
Programa Alerta47, lançado em 2012.
Corrêa et al.48 apresentam cinco itens identificados pelos autores como
“graves inconsistências” da proposta, e que foram objeto de contribuição enviada à
Consulta Pública: (i) para os bons contribuintes, a instabilidade da portaria, que é
um ato unilateral da autoridade administrativa; (ii) princípios expressos apenas
simbolicamente sem correspondência com os dispositivos da portaria; (iii)
retroatividade da portaria até o ano de 2016, gerando insegurança e indo contra os
princípios de estimular a conformidade; (iv) critérios de classificação vagos e
subjetivos, violando os ideais de confiança e lealdade da Administração; e (v)
programa com mais sanções e punições que estímulos.
Com efeito, outra iniciativa do gênero, o programa “Nos Conformes”, do
Estado de São Paulo, endereçou de forma apropriada a maior parte dos itens
criticados pelos autores e poderia servir de exemplo: (i) foi proposto por Lei
Complementar Estadual, a Lei 1.320/2018, em amplo processo de discussão com
várias apresentações à sociedade civil, duas consultas públicas e debate legislativo;
(ii) princípios expressos de forma clara; (iii) implementação gradual, permitindo
adaptação dos contribuintes e contemplando somente conformidade futura; (iv)
critérios de classificação gerais claros e objetivos; e (v) rol de benefícios e
incentivos aos contribuintes expresso na própria lei.
A partir desta análise comparativa, das sugestões enviadas e da
experiência nacional com outros tributos, além das recomendações de organizamos

47 BRASIL. Secretaria da Receita Federal do Brasil. Programa Alerta. Disponível em:


<http://www.fazenda.gov.br/noticias/2012/outubro/receita-federal-orienta-contribuintes-para-a-
autorregularizacao>. Acesso em: 25 abr. 2019.
48 CORRÊA, A et al, op. cit., p. 1-2
19

internacionais, é possível a continuidade da implantação do “Pró-Conformidade”, ou


de outro programa semelhante, sendo sugerido que este enderece os principais
pontos criticados, incorporando as melhores identificadas, em especial as questões:
(i) do estabelecimento por lei complementar, a exemplo do Simples, MEI e do “Nos
Conformes”, trazendo segurança jurídica para a proposta, como proposto por
Corrêa et al49.; (ii) da não retroatividade, neste caso a proposta atual do Pró-
Conformidade viola um princípio constitucional geral tributário; (iii) do
estabelecimento mais claro da exclusão dos critérios de apuração da classificação
dos casos em que o contribuinte apresentar contestação, ainda em análise, seja no
âmbito administrativo ou judicial quanto a exigência de tributo ou obrigação
acessória, pois a proposta somente trata dos casos em que a exigibilidade estiver
suspensa; (iv) do benefício de informação prévia, que deve ser mais bem
delimitado; (v) do rol de benefícios e incentivos expressos na própria lei.

3 CONCLUSÃO

A implantação de programas que busquem a melhoria da conformidade


tributária através de incentivos, da simplificação e da melhoria da relação entre
contribuinte e fisco, encontra respaldo nos princípios constitucionais da eficiência,
economicidade e eficácia. Além disso, essa abordagem é compatível com o Código
Tributário Nacional e os princípios norteadores do Direito Tributário. O programa
também busca se alinhar as melhores práticas, recomendações de organismos
internacionais e acordos aos quais o Brasil é signatário.
No entanto, para implantação deste tipo de programa é importante que
sejam respeitados os princípios de Direito Tributário e que seu processo de
aprovação siga os ritos regulares de modificações tributárias, em especial, o
princípio da legalidade e da anterioridade. Além disso, esta mudança tem que
respeitar o direito à ampla defesa, ao tratamento isonômico para situações
semelhantes, com uso de processos e critérios transparentes.
O principal desafio para implantação desta modificação foi a quebra do
paradigma da fiscalização tributária baseada na “Teorias Econômica do Crime”, que
utiliza sanções como base para obter a conformidade tributária. A partir de

49 CORRÊA, A. et al., op. cit. p. 1-2.


20

abordagens que busquem a simplificação dos processos, através da informatização,


além da segmentação de contribuintes de acordo com sua atitude frente à
tributação pode-se implantar programas que incentivem a autorregularização para
os contribuintes com melhor histórico e atitude colaborativa, liberando recursos
escassos do Estado para a fiscalização mais efetiva dos casos de sonegação,
fraudes e evasão fiscal.
Portanto, o Pró-Conformidade se for implantado considerando as
modificações propostas por juristas e especialista em Direito Tributário tem
potencial para ser um marco importante na mudança de paradigma da Legislação
Tributária Nacional para uma abordagem colaborativa, baseada no uso de
incentivos, simplificação e prestação de serviços, aprofundando experiências
federais anteriores como o Simples, o MEI e o regulamento aduaneiro.

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