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Enfermagem da Família

Autora: Profa. Juliana Gimenez Amaral


Colaboradoras: Profa. Raquel Machado Coutinho
Profa. Renata Guzzo Souza Belinelo
Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano
Professora conteudista: Juliana Gimenez Amaral

Enfermeira, especialista em oncologia pela EE-USP. Mestre em Enfermagem com ênfase em saúde do idoso
pela UNG e doutora em Patologia pela UNIP. Professora titular da UNIP nas áreas de saúde do adulto e do idoso.
Coordenadora do curso de Enfermagem no campus Alphaville.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

A485e Amaral, Juliana Gimenez.

Enfermagem da Família / Juliana Gimenez Amaral. - São Paulo:


Editora Sol, 2018.

136 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXIV, n. 2-011/18, ISSN 1517-9230.

1. Enfermagem da família. 2. Atenção domiciliar. 3. Acolhimento.


I. Título

CDU 616-083-0053.8

W500.60 – 19

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.

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Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor

Prof. Fábio Romeu de Carvalho


Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças

Profa. Melânia Dalla Torre


Vice-Reitora de Unidades Universitárias

Prof. Dr. Yugo Okida


Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa

Profa. Dra. Marília Ancona-Lopez


Vice-Reitora de Graduação

Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Souza
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Fabricia Carpinelli
Giovanna Oliveira

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Sumário
Enfermagem da Família

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7

Unidade I
1 CONCEITO DE FAMÍLIA E SUAS TRANSFORMAÇÕES NO DECORRER DA HISTÓRIA..................9
1.1 A família como um sistema.............................................................................................................. 12
1.2 Enfermagem da família...................................................................................................................... 15
1.3 Avaliação da família............................................................................................................................. 18
1.4 Intervenção na família........................................................................................................................ 24
1.5 Ciclos de vida familiar......................................................................................................................... 25
1.5.1 Infância........................................................................................................................................................ 28
1.5.2 Adolescência.............................................................................................................................................. 33
1.5.3 Fase adulta.................................................................................................................................................. 41
1.5.4 Envelhecimento........................................................................................................................................ 61
2 POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO BÁSICA........................................................................................... 63
3 ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA (ESF).............................................................................................. 67
3.1 Outras equipes de atuação da atenção básica.......................................................................... 72
3.1.1 Equipes de atenção básica a populações específicas................................................................ 72
3.2 Territorialização em estratégia de saúde da família............................................................... 75
4 ATENÇÃO DOMICILIAR................................................................................................................................... 76

Unidade II
5 ACOLHIMENTO................................................................................................................................................... 86
6 ACOLHIMENTO E CLASSIFICAÇÃO DE RISCO EM EMERGÊNCIAS................................................. 94

Unidade III
7 VIOLÊNCIA INTRAFAMILIAR.......................................................................................................................105
8 CUIDADOS PALIATIVOS................................................................................................................................114

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APRESENTAÇÃO

Quem nunca ficou triste ou sem saber o que fazer perante um membro da família doente? Quem
nunca foi chamado para auxiliar no cuidado direto ou transporte de uma pessoa enferma?

Sim, a família é um sistema que envolve uma estrutura interna e outras pessoas ao redor, isto é, no
trabalho, igreja, escolas, cursos, unidades de saúde etc.

Este material introduz os conceitos de família e as suas transformações no decorrer dos tempos, além
das implicações causadas por essas modificações. Serão abordados os ciclos de vida como nascimento,
infância, adolescência, o ser idoso e a finitude, evidenciando as maiores necessidades do indivíduo e da
família em cada fase e o papel do enfermeiro ante cada ciclo.

Serão apresentadas formas de avaliação da família, visando identificar as necessidades individuais e


comunitárias de cada região, para, assim, respeitar e traçar estratégias específicas para as necessidades,
as quais variam muito de um local para outro.

Assuntos como cuidados paliativos e violência intrafamiliar também farão parte da nossa leitura,
pois demandam alguns cuidados especiais, e o enfermeiro tem papel essencial como educador em saúde
e mediador de cuidados e atenção.

Ao término da leitura deste material, espera‑se que você consiga entender a importância do
enfermeiro na saúde da família e da comunidade de forma efetiva e educacional.

Bom estudo!

INTRODUÇÃO

A saúde da família é uma especialidade que vem apresentando grande demanda nos últimos tempos.
A família é vista como um sistema que interfere diretamente de forma positiva ou negativa na saúde de
seus membros, além de ser considerada a maior rede de apoio de uma pessoa.

No Brasil, o governo federal vem buscando atender às demandas apresentadas pela família por meio
da Estratégia de Saúde da Família e outras práticas integradas na Política de Humanização, nas quais o
enfermeiro é fundamental no desenvolvimento de ações diretamente ligadas a essa população.

A saúde da família aborda o cuidado individual e coletivo dos membros da família, avaliando riscos,
identificando problemas e auxiliando no contexto do processo de promoção da saúde, adaptação a
algum problema de saúde que aconteça e no processo de reabilitação.

O enfermeiro visa avaliar a família como um todo, em seus contextos sociais, psicológicos, culturais,
econômicos entre outros, e não somente no contexto saúde e doença. Para tanto, é importante que o futuro
profissional de Enfermagem entenda todo o contexto que envolve o processo saúde e doença da família, os
programas e políticas existentes acerca da família, suas formas de atenção e as fases do ciclo de vida.
7
O trabalho do profissional de Enfermagem poderá atingir a família no domicílio ou no ambiente
hospitalar em diversas vertentes, como, por exemplo, no apoio ao cuidado de um membro com doença
crônica, em cuidados paliativos, no nascimento, entre outros.

Iniciaremos o material falando um pouco do conceito de família, comunidade, sujeito visando iniciar
nosso estudo com conceitos bem definidos. Esse material é de grande importância e permitirá que o
futuro enfermeiro tenha o contexto teórico das maiores necessidades da família e de que forma poderá
implementar a melhor assistência possível.

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ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Unidade I
1 CONCEITO DE FAMÍLIA E SUAS TRANSFORMAÇÕES NO DECORRER DA HISTÓRIA

O conceito tradicional da família como centro de estabilidade e garantia social tem mudado nos
últimos tempos. Em um mundo em grande transformação, influenciado pela globalização e aumento
das mulheres no mercado de trabalho, a família vem passando por diversas alterações, porém, sem
perder o seu valor. É preciso identificar e reconhecer essas mudanças para que ações ilimitadas e efetivas
sejam realizadas na construção de um conjunto de estruturas sociais que auxiliem as pessoas a se
adaptarem e lidarem com tantas mudanças. É preciso adequar as necessidades atuais das famílias de
forma mais dinâmica e adaptada a nossa sociedade.

Hoje, com todas essas transformações ocorrendo no contexto da família, fica difícil encontrar um
conceito que se encaixe perfeitamente na sociedade atual. Uma concepção mais tradicional seria a
que traz Durham (1968, p. 31): “As famílias são grupos sociais, estruturados por meio de relações de
afinidade, descendência e consanguidade que se constituem como unidades de reprodução humana”.

Antigamente, na Era Romana, por exemplo, a família era constituída pela autoridade do pai, que
tinha o poder de vida e morte dos filhos, por castigos e até vendê‑los, caso quisesse; já a mulher, esposa,
era submissa ao marido, realizava os serviços domésticos e cuidava dos filhos. Nessa época, a instituição
familiar era uma unidade econômica, religiosa, política e jurisdicional.

No Brasil, a Lei Civil de 1916 (BRASIL, 1916) traz que a família, por meio do matrimônio, realizava
várias funções, como a econômica, pois era responsável pela sua sobrevivência, sendo composta
por tios, tias, primos e avós, que acabavam residindo no mesmo local e, juntos, trabalhavam para a
subsistência. A família limitava‑se exclusivamente aos componentes originados do casamento e sua
dissolução era proibida.

A Constituição de 1988 (BRASIL, 1988) trouxe a não obrigatoriedade do casamento para a proteção
da família e, em seu artigo 226, possibilitou o divórcio, desde que houvesse separação conjugal por mais
de três anos, permitindo a formação da família monoparental, constituída por um dos pais e sua prole.
Essa Constituição passou a priorizar a família como base da sociedade, admitindo suas novas formas e
privilegiando o cuidado à criança e ao adolescente baseados na dignidade humana.

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Unidade I

Figura 1 – Família nuclear tradicional

Figura 2 – Família monoparental

Figura 3 – Família homoafetiva

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ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Analisando tal contexto, vemos que a família precisou se adequar às novas exigências que
foram surgindo, as quais trouxeram mudanças na cultura, nos costumes, hábitos e tipos de
relacionamentos. Não é mais uma celebração de casamento, nem a diferença de sexo do par ou
envolvimento sexual. É preciso a presença de um vínculo afetivo a unir as pessoas com objetivos
e propósitos em comum, gerando um comprometimento mútuo. Essa visão afasta cada vez mais
a ideia de família associada ao casamento. O conceito de família vem se adaptando, buscando ser
uma união constituída por carinho, amor, afeto e respeito, sem regras impostas pela sociedade e
necessidade de existir somente para procriação.

Outra transformação importante é a luta e o reconhecimento da união homoafetiva, isto é, pessoas


do mesmo sexo ligadas por elo afetivo que desejam formar uma família. Isso deixa claro o quanto a
constituição da família, atualmente, é muito baseada no afeto, fugindo do modelo patriarcal que era
focado no poder, hierarquia e autoritarismo. Também não se pode deixar de comentar o conceito de
família nuclear, encontrada em muitos lares, que é assentado na presença do pai, da mãe e dos filhos,
trazendo o conceito da união pelo casamento e do parentesco como base da família.

A família é a base da formação do indivíduo, além de ser responsável por promover educação, saúde,
proteção e lazer de seus entes, influenciando o comportamento do indivíduo perante sociedade. Em
nossa realidade, podemos dizer que os pais ou responsáveis são o modelo de boas ou más ações para
os filhos, impactando diretamente na postura deles em relação ao contexto da educação e da saúde.
Por exemplo, estudos mostram que pais que fumam tendem a influenciar os filhos a desenvolverem o
mesmo hábito. Pais violentos tendem a ter filhos violentos, que vão reproduzir aquilo que viveram em
sua infância (TRINDADE; ALBINO, [s.d.]).

Vale resumir algumas conquistas relacionadas à família na Constituição Brasileira após a carta
Magna, como a Lei nº 8.009, de 29 de março de 1990 (BRASIL, 1990), que aumentou o amparo do bem
familiar; a Lei nº 8.560, de 29 de dezembro de 1992 (BRASIL, 1992), que versou sobre características da
investigação de paternidade e da certidão de nascimento dos filhos consagrados fora do matrimônio; e
as Leis nros 8.971, de 29 de dezembro de 1994 (BRASIL, 1994), e 9.278, de 10 de maio de 1996 (BRASIL,
1996), que estabeleceram os direitos e obrigações dos companheiros, ambas leis dando amparo às
mulheres que eram discriminadas após o divórcio.

Hoje em dia também existem famílias que são formadas por outras, que foram dissociadas, como,
por exemplo, a união de um casal que já foi casado anteriormente e traz filhos de outras relações. É uma
estrutura importante de se conhecer, visto que algumas questões mudam, como a não responsabilidade
do padrasto ante demandas vivenciadas pelo enteado.

Outro fato que ocorre em algumas regiões do nosso país é o aumento da migração de pessoas devido
ao desenvolvimento do capitalismo. Como resultado, temos a dissolução de vínculos matrimoniais e de
uniões de origem, a criação de novos relacionamentos conjugais, o aumento do número de famílias sem
pai e a dispersão da mulher e dos filhos para casa de parentes, avolumando o número de famílias mais
amplas, como, por exemplo, avós que criam netos.

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Unidade I

É notório o aumento da gravidez na adolescência, com o registro do incremento de 25% do número


de adolescentes grávidas no país nos últimos tempos. Tal valor traz a possibilidade do crescimento
de mães solteiras e pais desertores, causando uma série de conflitos para a adolescente e a criança
(MARTINS et al., 2011).

O idoso tem perdido seu lugar na família. Devido à necessidade de todos os entes, na maioria da
vezes, trabalharem, ele tem ficado deslocado dentro do contexto familiar pela sua potencial falta de
atividade. Em outros casos, porém, possui um papel fundamental na economia e na responsabilidade da
família. Em ambos os cenários, existem conflitos que precisam ser identificados e mediados.

Lembrete

A família é a base da formação do indivíduo, além de ser responsável por


promover educação, saúde, proteção e lazer de seus entes, influenciando o
comportamento do indivíduo ante a sociedade.

Atualmente, lidar com a família é trabalhar com a diversidade, e ela pode ter várias classificações:
famílias intactas (que ainda não sofreram processo de separação); em processo de separação;
monoparentais; reconstruídas; constituídas por casais homossexuais; com filhos adotivos; e formadas
por meio de novas técnicas de reprodução. Esses diversos tipos de família impactam diretamente na
forma do cuidado e nas demandas de saúde em que o enfermeiro atua.

Saiba mais

A fim de saber mais sobre as transições que ocorreram na família, leia:

DESSEN, M. A. Estudando a família em desenvolvimento: desafios


conceituais e teóricos. Psicologia Ciência e Profissão, v. 30, núm. esp., dez.
p. 202‑219, 2010.

Levando em consideração que a família é influenciada pelos seus membros e por outras redes sociais
e de apoio, a seguir detalharemos essa temática.

1.1 A família como um sistema

Inicialmente, discutimos a evolução das famílias e seus principais conceitos. Assim, podemos
relembrar que família é mais que uma ligação de parentesco, é uma união de afeto entre os membros.
A família é considerada um sistema.

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ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

A Teoria Geral dos Sistemas (TGS) foi desenvolvida pelo biólogo húngaro Ludwig von Bertalanffy em
1936. Mas o que é um sistema? Ele pode ser definido como um complexo de elementos em interação
mútua. Tal conceito pode ser aplicado ao indivíduo, à família ou mesmo à sociedade. Cada sistema pode
se constituir de subsistemas e estar inserido em outros sistemas maiores.

A família é composta de vários subsistemas: conjugal, filial, paternal e parental. O conjugal ocorre
quando duas pessoas adultas se unem em uma relação interdependente e complementar, formando um
casal que identifica uma relação entre os cônjuges. Um fato que poderia afetá‑lo seria o divórcio.

O filial acontece quando nasce o primeiro filho e os seguintes. O nascimento do bebê pode ser
um fato que afete a família positiva ou negativamente, dependendo de alguns contextos, tais como o
desejo real da chegada desse filho, preparo para a nova rotina e a probabilidade de doenças congênitas.

Já o parental é responsável por questões consideradas básicas, porém fundamentais em uma família,
como a educação, a socialização e a proteção. Nesse contexto, um ato de violência em um dos seus
membros afeta diretamente a todos os integrantes.

Por fim, o fraternal diz respeito à relação entre os irmãos, a qual deveria ser estreita e de
companheirismo. A mudança de um irmão para estudar, se casar ou até o adoecimento de um deles
pode ser um fato que sensibiliza a família.

Os exemplos citados anteriormente nos subsistemas servem para que você, como enfermeiro, tenha a
visão crítica da necessidade de intervenção da sua prática com a família e inicie o processo de raciocínio
crítico e clínico visando à melhor prática, dependendo da influência externa ou interna que essa família
poderá sofrer.

Existem também os suprassistemas, os quais estão relacionados com o trabalho, a igreja, os vizinhos
e instituições de saúde. Um suprassistema pode atingir positivamente uma família, como na situação
de pessoas que possuem a espiritualidade fortalecida e conseguem lidar melhor com as adversidades
do processo saúde e doença, assim como um ambiente de moradia com tráfico de drogas e violência ao
redor da família poderá comprometer a questão da segurança desta, além de oferecer maus exemplos
às crianças e adolescentes.

O indivíduo também é considerado um sistema, cuja estrutura é formada por sua rotina e pelas
pessoas ao seu redor. É dinâmico e as mudanças ocorrem de acordo com as interações que vivencia. Sua
realidade é uma reformulação de experiências vividas. O comportamento de uma pessoa ou do seu meio
influencia diretamente o comportamento da outra de forma recíproca.

Lembrete

Toda e qualquer parte de um sistema está relacionada de tal modo


com as demais partes que qualquer mudança em uma delas provocará
alterações no sistema total.
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Unidade I

Na teoria geral dos sistemas, nada acontece isoladamente, e qualquer episódio que afete um dos
componentes atinge todos os outros.

A família é vista como um todo e este é muito mais do que a soma das partes, e o enfermeiro precisa
ter a dimensão disso. Um exemplo do todo seria o brinquedo móbile, que é um conjunto de peças unidas
em interação, em que cada uma interfere no movimento das outras. O móbile, porém, não se esgota
nelas, mas enriquece à custa delas.

Figura 4 – Modelo de móbile

Um dos desafios do enfermeiro é querer atender a família como um todo, relatando que nunca
consegue reunir todos, porém, a partir do momento em que atua diante de um membro, indiretamente
todos serão afetados.

Fazendo uma transposição para a abordagem do cuidado da família como um sistema, um todo
único é maior que a soma das partes, pois, no cuidado com essa família, o enfermeiro precisa visar à
relação entre os membros, alguém de dentro do sistema que tenha influência sobre o subsistema e
estabelecer uma postura de empatia com os membros para uma melhor compreensão do todo.

Nessa teoria dos sistemas, o enfermeiro poderá atender a família como um todo e também os
indivíduos que fazem parte dela. Ele deve ter flexibilidade conforme o processo for acontecendo e
trazendo resultados. É preciso traçar um plano de cuidados e reavaliar cada ação, ou seja, se esta atinge
o objetivo individual e/ou grupal.

É importante que o enfermeiro saiba o limite de cada sistema. Existem os sistemas considerados
abertos, aqueles que têm entrada e saída de influência, estão abertos para o meio; e aqueles que estão
fechados para o meio. No que tange aos limites, podemos dizer que cada sistema tem seus valores,
regras e normas que determinam até que ponto ocorrem as interações com o ambiente e com o grupo,

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ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

incluindo o enfermeiro. Precisamos entender que o ambiente é um instrumento de troca importante


para que a família possa se manter saudável. Por isso, quando falamos do sistema aberto, entende‑se
que ele precisa ter um equilíbrio fundamentado em regras internas de comportamento. A família precisa
ter objetivos grupais e individuais. Aquelas com muitos membros e objetivos individuais geralmente
entram em conflito e não conseguem viver em sociedade na construção de um bem comum.

Pensando nessa abertura, ou não, do sistema, alguns conceitos foram inseridos, os quais são: a
família emaranhada e a desmembrada ou desagregada. Nas emaranhadas, os vários elementos
inter‑relacionam‑se de modo indiferenciado, não se reconhecendo quem é quem, enquanto desmembrada
ou desagregada não se verificam trocas efetivas entre os subsistemas, com cada elemento vivendo
desgarrado face a outro. O ideal seria um meio‑termo entre esses dois conceitos, visto como um possível
funcionamento saudável com contato entre os subsistemas e respeito à individualidade.

Identificar esses meios e o que está em desequilíbrio é papel do enfermeiro no cuidado à família,
porém, ele precisa estar ciente de que nem sempre uma ação de educação em saúde terá o mesmo
resultado para todas elas. Isso depende de essa família vir ou não de um sistema aberto ou fechado
e o quanto a ação influenciou ou não a dinâmica dela. Podemos dizer que estímulos iguais resultam
em respostas diferentes, podendo haver imprevisibilidade das respostas e necessidade de mudança na
forma de intervenção profissional perante essa família.

Entender que cada família tem sua estrutura própria e única é importante para que o enfermeiro
entenda que as necessidades são específicas de cada uma, assim como as ações deverão ser sistematizadas
e direcionadas para cada indivíduo e família de forma única.

Dentro de um mesmo sistema, os membros podem absorver a informação de formas variadas, porém,
possuem uma maneira individual de organização através da qual, ao final, todos chegam ao objetivo comum.

A perspectiva sistêmica da família pressupõe que cada indivíduo/família é um sistema vivo que
se gera e desenvolve numa interação dinâmica com os sistemas que vive, no qual os enfermeiros que
trabalham com famílias naturalmente estão envolvidos, resultando no cuidado de enfermagem.

1.2 Enfermagem da família

A enfermagem, enquanto profissional, é reconhecida como uma prática social que se relaciona e
complementa outros trabalhos na saúde em resposta às demandas sociais e de saúde.

O cuidado tem perdido o foco do coletivo no decorrer das transformações da sociedade e


epidemiologias, mirando‑se somente no indivíduo. A saúde da família traz a oportunidade e tem sido a
forma de retomarmos o cuidado do coletivo e olhar para o todo.

Em qualquer contexto em que os enfermeiros desenvolvam a sua prática profissional, a família surge
como uma área de atenção relevante para a sua intervenção. O cuidar é um dos primordiais interesses
da enfermagem. Cuidar da família no contexto da promoção, recuperação e reabilitação da saúde traz a
questão de tratar da sobrevivência da nossa sociedade, do bem‑estar das pessoas, incluindo a saúde; o
15
Unidade I

cuidar de um todo, não somente do indivíduo e de que o cuidado de enfermagem em conjunto com a
família traz resultados positivos para todos envolvidos.

Um dos resultados que o cuidado de enfermagem traz na família deve ser voltado não só para o
indivíduo, mas também focado no ambiente em que ele vive. Um dos conceitos de enfermagem na
família é: “Uma filosofia é um modo de interação com os clientes, que diz respeito ao modo como os
enfermeiros colhem informação, intervêm com pacientes, advogam os pacientes e abordam o cuidado
espiritual com as famílias” (SANTOS, 2012, p.12).

Figura 5 – Visita de enfermeira indiana à uma família no século passado

No decorrer dos anos 1960, o cuidado na família ganhou maior ênfase e foi inserido nos currículos
dos cursos de enfermagem, incluindo a forma de avaliação da família por meio dos profissionais
enfermeiros. Foi preciso adaptar algumas teorias e práticas que eram voltadas exclusivamente aos
indivíduos. Um exemplo é a Teoria de Enfermagem de Callista Roy, criada em 1976 e baseada na Teoria
dos Sistemas. Em 1981, ela sofreu uma modificação e introduziu a família como um sistema adaptativo,
e o enfermeiro a assiste no processo de adaptação. Ainda nesse contexto, o ambiente e coping surgem
como elementos importantes na enfermagem de família. A teorista Imogene King, igualmente, incluiu a
interação com a família (também como cliente) e o sujeito como parte de sua teoria.

Lembrete

A teoria de enfermagem é uma conceituação articulada e comunicada


da realidade inventada ou descoberta na enfermagem com a finalidade de
descrever, explicar, prever ou prescrever o cuidado de enfermagem.

16
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Hoje, a família é reconhecida como uma unidade importante de cuidados não só da enfermagem, mas
também de outros profissionais de saúde, que podem intervir de forma positiva no contexto deste cliente.

O cuidado de enfermagem à família pode ser descrito como o processo de prover as necessidades de
saúde que estejam no âmbito da prática de enfermagem, podendo ser aplicado diretamente à família,
ao indivíduo, à sociedade e ainda como um todo, dando visão da abordagem social complexa que
desafia os enfermeiros ao uso de tratamentos sistemáticos da família como cliente.

Para outros autores, o enfermeiro pode cuidar da família em três contextos: indivíduo, família ou
o todo. No caso do indivíduo, o enfermeiro foca o zelo no indivíduo e preocupa‑se com o bem‑estar
individual, podendo a família participar através de informações complementares e auxiliar nos cuidados,
sem, contudo, sofrer avaliação ou intervenção. Quando a doença está relacionada com a família do
indivíduo, o enfermeiro avalia e presta os cuidados diretos à família dele, no modo como os entes veem
e agem diante de um problema, como, por exemplo, um idoso acamado. Na ocasião em que o foco
é o todo, o enfermeiro cuida da família e do sujeito integralmente. Podemos citar como exemplo o
nascimento de uma criança, em que há uma adaptação de todos os membros.

A ênfase do enfermeiro é integrar a família nos cuidados e a sua forma de interagir com eles. Essas
ações são peças‑chaves para um bom resultado na assistência a essa população.

Saiba mais

Para entender um pouco mais sobre comunicação nas práticas de saúde,


faça a leitura complementar do texto:

CORIOLANO‑MARINUS M. W. L. et al. Comunicação nas práticas de


saúde: uma revisão integrativa. Saúde Sociedade, São Paulo, v. 23, n. 4,
p. 1356‑1369, 2014.

A comunicação pode ser entendida como prática social que advém da interação entre seres humanos,
expressa por meio da fala, escrita, comportamentos gestuais, distância entre os participantes e toque. No sistema
de saúde, o encontro em profissionais e usuários é feito por meio da comunicação. Nem sempre ela consegue
ser efetiva, ocorrendo ruídos por meio de ambos envolvidos, muitas vezes pela diferença de linguagem e saberes
diferentes, limitações orgânicas de uma das partes e valores diferentes. O diálogo é um eterno exercício de
estabelecer uma relação que exige treino, reflexão, aprendizagem e prática. É o instrumento básico do cuidado.

Com o passar do tempo, o paciente deixou de ser visto como doença, mas sim como um todo,
favorecendo a humanização do cuidado. Por meio da interlocução, o enfermeiro passou a conseguir
mais informações, as quais o auxiliam na avaliação do paciente e família, para melhor entender suas
necessidades e agir de forma efetiva, beneficiando a todos. Quando a confiança entre ambas as partes
ocorre, as mensagens são mais claras, e o acamado é convidado a uma ação mais ativa no seu cuidado,
em uma interação que permite estratégias para atingir a saúde ideal.

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Unidade I

Porém, o enfermeiro precisa estar atento para que esse tipo de relação não seja mecânica, como
vivenciamos em vários serviços de saúde e diferentes profissionais. É preciso entender que a comunicação
não se resume a falar e ouvir, uma troca de mensagens, mas sim a uma ação que integre bem o ouvir e
seja individualizada, levando em consideração as características daquele indivíduo e família.

A partir da comunicação desenvolvida com o paciente, o enfermeiro identifica suas necessidades,


informa sobre procedimentos ou situações, promove o relacionamento entre pacientes, com a
equipe multiprofissional ou com familiares, viabiliza a educação em saúde, troca de experiências e
mudança de comportamentos, entre outras ações visando ao melhor resultado possível no cuidado
à saúde do paciente.

1.3 Avaliação da família

A avaliação e intervenção em saúde exigem a utilização de modelos que permitam a concepção de


cuidados orientados tanto para a coleta de dados como para o planejamento das intervenções.

Analisar a família como um sistema é apreciá‑la na sua dinâmica e estrutura, num processo de
interação com outros sistemas. O alcance dessa apreciação depende da habilidade do enfermeiro
de identificar os elementos e as interações que definem família, a sua força e a sua necessidade.

Wright e Leahey, pesquisadoras da Universidade de Calgary, propuseram um modelo de avaliação


da família que a analisa como um sistema por meio de identificação dos seus problemas de saúde, seus
mecanismos de apoio e recursos potenciais para resolução de problemas.

O modelo Calgary contempla uma estrutura multidimensional, com categorias referentes aos
aspectos estrutural, de desenvolvimento e funcional, com a possibilidade de obter uma visão ampliada
das relações significativas, das redes de apoio familiar, dos laços, dos conflitos e da comunicação. Esse
modelo sugere prudência em sua aplicação e atenção a alguns detalhes:

• O enfermeiro determina os tipos de informações de que precisa. Todos os membros da família


necessitam ser avaliados, porém nem com todos conseguiremos ter contato.

• Após a coleta dos dados, tentar discutir com base nas informações que possui e não se deixar
levar por dados inferenciais ou sugestivos de alguns membros.

• Ter a consciência de que as informações obtidas são o que a família quer falar naquele momento;
porém, elas podem mudar em um outro momento de contato.

• Enfermeiros precisam estar atentos às várias verdades que podem ocorrer dentro de uma mesma
família, não se deixando levar por emoções e sendo imparciais no julgamento.

• O foco é menor nas pessoas e maior na interação entre os meios.

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ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Para a avaliação dos familiares, são usados o genograma (desenho da família) e o ecomapa
(representação das relações internas e externas da família) que avaliam quem é o grupo social dela, suas
influências diretas e indiretas, os tipos de relação de vínculo entre os meios e indivíduos e o contexto
em que estão inseridos.

Conhecer a estrutura da família, sua composição, como os membros se organizam e interagem entre
si e com o ambiente, os problemas de saúde, as situações de risco, os padrões de vulnerabilidade, é vital
para o planejamento do cuidado à saúde familiar.

À medida que vai colhendo dados, o enfermeiro deverá mentalmente rever a informação e validar
com a família a interpretação que faz dela, reformulando e levando os parentes a tecer narrativas
compreensivas da situação apresentada.

Iniciaremos nossa avaliação pelo genograma, que é o desenho da árvore da família. É uma prática
antiga, também chamada de árvore genealógica, por alguns autores, que detalha a história e, a estrutura
das famílias, fornece informações sobre os seus membros e suas diferentes gerações, e por meio de
entrevista, dá informações significativas para análise e discussão da situação. A entrevista precisa ser
estruturada e a comunicação entre o profissional e a família é essencial para que haja recuperação
das memórias importantes, informações demográficas, de posição social e funcional, recursos e
acontecimentos presentes e passados que atingem e atingiram a dinâmica familiar.

A aplicação do genograma em saúde da família permite uma visualização do processo de adoecer,


facilitando o plano terapêutico e, à família, uma melhor compreensão sobre o desenvolvimento de suas
doenças. Esse instrumento oferece uma visão histórica de como os entes familiares enfrentam situações
críticas, inclusive em mudanças do ciclo de vida.

No geral, as informações mínimas que o enfermeiro precisa ter para a elaboração do genograma são:
identificação das pessoas e sua hierarquia; idade e ano de nascimento; doenças que tiveram ou têm; pessoas
ou locais envolvidos na rotina dessa família; datas de casamentos e divórcios. Deve‑se também indicar os
membros que vivem juntos na mesma casa (família nuclear), os familiares de origem (pai e mãe), estressores,
relacionamentos intergerações, interpessoais e os papéis de cada um no seio familiar. Sempre que possível, o
genograma deve ser iniciado na primeira consulta, pois é uma boa estratégia para ter acesso ao conhecimento
da estrutura da família. Ele precisar ser principiado com o registro da pessoa que suscitou a sua construção.

O uso do genograma possibilita ao profissional da saúde uma revisão rápida da estrutura da família,
identificando, por exemplo, divórcios ou um novo casamento; sua avaliação e compreensão, visto que
olhar a estrutura como um todo em forma de desenho facilita; promove elaboração de um vínculo mais
estreito com os familiares; reconhecimento de pacientes de alto risco; e a promoção de mudanças de
hábitos positivos. Tais ações mostram que a família é de interesse dos profissionais da saúde.

Quais as vantagens do genograma?

• observar e analisar barreiras e padrões de comunicação entre as pessoas;

19
Unidade I

• explorar aspectos emocionais e comportamentais em um contexto de várias gerações;

• auxiliar os membros da família a identificar aspectos comuns e únicos de cada um deles;

• discutir e evidenciar opções de mudanças na família;

• prevenir o isolamento de um membro dos membros familiares.

Existem alguns símbolos que são padrão e devem ser seguidos para a elaboração do genograma.
'55 Ano de nascimento
Homem
David Nome
Mulher
Idade (ou ano) da morte
ou Morte
48

ou Paciente-índice 30-'48 Ano de nascimento e morte


ou probando

Dois homens normais CA Causa da morte

Três mulheres normais Casamento e ano


1964
Quatro nascimentos,
sexo não específicado
ou desconhecido
1977 Divórcio e ano
Abortamento espontâneo

Abortamento induzido Separação e ano


1975

Gravidez - criança in útero Não casado, ano em que


1982 começaram a viver juntos

Gêmeos dizigóticos

Linha contínua ou
Gêmeos monozigóticos tracejada indica indivíduos
que vivem juntos

A
Adotado
Relação conflituosa

Figura 6 – Símbolos padrão do genograma

20
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Problemas matrimoniais Relacionamento fraco


Relacionamento próximo
Relacionamento extremamente próximo
Relacionamento dominante
Problemas matrimoniais e
namorada

Divórcio - a mãe tem a


custódia das duas filhas

'76 '80 '84 '82 '76

Casal casado, cada um com vários cônjuges

Figura 7 – Símbolos padrão do genograma e ecomapa

Vamos a um exemplo de genograma. Atente‑se à história clínica a seguir:

João, 68 anos, casado com Maria, 66 anos, há 42 anos. Possuem dois filhos, Laura, de
40 anos, e Mauro, de 35 anos. Laura é separada e mora com os pais com a filha Julia, de 21
anos. Laura é atendente de caixa de supermercado e trabalha oito horas por dia, de segunda
a sábado. Julia faz faculdade de Letras no período da manhã e auxilia os avós nos outros
períodos nos afazeres de casa e idas a médicos etc. Mauro é solteiro, mas mora em outra
cidade, pois foi onde arrumou um emprego em sua profissão. João e Maria são aposentados
e vivem de uma renda de três salários mínimos. João é hipertenso e cardiopata, fazendo
uso de medicamentos contínuos, porém desordenadamente. Vai à igreja com a esposa às
quartas e domingos. É ele quem faz compras, paga contas e resolve problemas diários da
casa. Fora isso, seu maior lazer é ouvir noticiário. Maria é diabética e possui osteoartrose,
o que, às vezes, a impossibilita de realizar os afazeres de casa e ir à igreja às quartas e
domingos, como tem costume. Ela lava e passa as roupas em casa e arruma o restante com
a ajuda da neta. Maria não tem um bom relacionamento com a filha Laura, pois esta não a
ajuda, reclama o tempo todo, nunca cuidou direito da filha e, às vezes, chega alcoolizada em
casa, conforme relatou. Fala que sua maior dificuldade é controlar a diabetes, pois se sente
mal com os remédios e acaba tomando‑os de vez em quando. João e Laura pouco se falam,
mas porque João é mais reservado. Laura e sua filha se dão bem e costumam sair juntas.
Mauro visita a família a cada três meses aproximadamente.

21
Unidade I

Diante desta história, o genograma seria da seguinte forma:

Unidade de saúde

Igreja
João, 68 anos 42 anos Maria, 65 anos
Supermercado aposentado aposentada
hipertenso e cardiopata DM + osteorartrose

Trabalho
Laura, 40 anos
cx. de supermercado Mauro, 35 anos
?
Alcoolismo? mora em outra cidade

Unidade Julia, 21 anos


de saúde estudante

Escola

Figura 8 – Modelo de genograma

Perceba que João e Maria estão em destaque. Inicialmente, eles são o foco da nossa história. Porém,
no decorrer da entrevista e das visitas a esta família, pode ser que eles não sejam o enfoque da nossa
intervenção, isso é possível de acontecer. Percebam também que esta é a estrutura da família. Como
não tínhamos informações sobre o ex-companheiro de Laura, incluímos o ponto de interrogação em
seu símbolo. O alcoolismo de Laura ficou interrogado, pois temos somente as informações fornecidas
pela mãe dela, o que poderemos confirmar, ou não, durante uma avaliação mais detalhada. Ainda não
falamos das relações que serão expressas a seguir, após a explicação do ecomapa.

O ecomapa é uma avaliação mais ampla, relacionada ao tipo de relação que os membros da família
têm entre si e com o ambiente em que vivem. Ele é complementar ao genograma e é considerado
dinâmico, pois está ligado ao externo e por isso pode apresentar mudanças. É uma representação do
suprassistema, além de um diagrama das relações entre a família e a comunidade, o que ajuda a avaliar
os apoios e suportes disponíveis e sua utilização pela família.

Devem‑se incluir no ecomapa:

• serviços da comunidade (creche, escolas, unidade de saúde etc.);

• grupos sociais (igrejas, associação de moradores do bairro etc.).

22
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• relações significativas (amigos, vizinhos, família etc.);

• trabalho – outros (lazer etc.).

A partir da avaliação das relações dessa família, pode‑se dizer ela possui poucas conexões com a
comunidade, necessitando de maior atenção e intervenção da enfermagem.

Relendo a história clínica que demos no exemplo do genograma, veremos a seguir como seria o
ecomapa, complementando a avaliação.

Unidade de saúde

Igreja
João, 68 anos 42 anos Maria, 65 anos
Supermercado aposentado aposentada
hipertenso e cardiopata DM + osteorartrose

Trabalho

Laura, 40 anos
cx. de supermercado Mauro, 35 anos
?
Alcoolismo? mora em outra cidade

Unidade Julia, 21 anos


de saúde estudante

Escola

Figura 9 – Modelo de ecomapa

Percebe‑se que o casal tem uma ótima relação (três traços), enquanto Maria e Laura possuem uma
relação conflituosa, demostrada na linha irregular. A ligação do casal e da neta é próxima, demonstrada
com dois traços, segundo o padrão de símbolos, e o vínculo de todos com o filho Mauro, que mora fora,
é um relacionamento distante, porém ainda não podemos dizer que é um relacionamento fraco.

Seguindo na linha da avaliação, é fundamental identificar a maneira como a família enfrenta e


supera as adversidades físicas, culturais e espirituais, pois é esse enfrentamento que auxiliará no seu
crescimento e desenvolvimento. Conhecer a história de vida da família auxiliará a entender também
como ela manteve a estabilidade em face do que já ocorreu.

De acordo com Cecílio (2014); Figueiredo (2010) e Souza et al. (2017), o Modelo Calgary não utiliza
os diagnósticos de enfermagem em sua avaliação, pois as autoras relatam que esses são pouco flexíveis
23
Unidade I

e não abrangem diretamente o problema apresentado. Nesse modelo é importante que o enfermeiro
consiga identificar, ao final da avaliação, as forças e as fragilidades do contexto familiar, que seria a
última categoria do Modelo Calgary, a funcional, a qual se refere à maneira como as pessoas da família
interagem, seus modos de comunicação, solução de problemas, crenças, papéis, regras e alianças.

Na atuação junto às famílias, a conclusão da fase da avaliação representa o momento em que o


enfermeiro coelabora com os membros familiares um possível diagnóstico e determina com eles se a
intervenção é ou não necessária.

O Modelo Calgary pode ser utilizado em vários contextos: para analisar a família em face de um
momento novo, como o nascimento de uma criança, ou a adaptação a uma cirurgia de mastectomia
de um de seus membros. Vale a pena conhecer esse instrumento e utilizá-lo na prática da enfermagem.

1.4 Intervenção na família

As intervenções de enfermagem devem centrar‑se em dar segurança, aumentar a proximidade do


doente e da família/pessoa significativa, tratar de informação, facilitar o conforto e reforçar o apoio.

Para que ocorra a efetividade de uma intervenção, todas as etapas discutidas anteriormente precisam
ter ocorrido com empatia, criando um vínculo de confiança entre o enfermeiro e a família.

Profissionais de enfermagem que não acreditam que a família é núcleo importante no processo de
cuidar são os que mais apresentam conflitos com ela. Uma postura positiva com a família possibilita
melhores resultados a todos os envolvidos.

Por mais que tenhamos dito a todo momento que o enfermeiro precisa atuar junto aos familiares,
existe ainda uma dicotomia em relação a sua prática, a qual, por diversas vezes, é voltada para o
indivíduo. Ela nem sempre favorece esse cuidado realmente voltado para a família.

A intervenção de enfermagem é a ação do enfermeiro perante o modo como a própria família o


estimulou a pensar e agir. A resposta dessa interposição será uma resposta da família, eficaz ou não,
determinada também pelo seu funcionamento usual e/ou adaptável.

A atitude dos profissionais é determinante na qualidade das relações que se estabelecem entre o
enfermeiro e os familiares, sendo reconhecido que uma atitude de suporte favorece o desenvolvimento
de um trabalho de parceria, de partilha e de corresponsabilização entre os intervenientes.

O tratamento de enfermagem eficaz será aquele mais útil à mudança na estrutura biopsicossocial e
espiritual dos membros da família, sendo esse o maior desafio de enfermeiros.

O Modelo Calgary de intervenções na família possibilita uma estrutura organizadora de intercepção


entre um determinado domínio do funcionamento familiar e uma intervenção específica de enfermagem,
a qual tem por finalidade a mudança do sistema. A figura a seguir demonstra os elementos do Modelo
Calgary de intervenção da família.
24
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Domínios do
funcionamento
familiar

Intervenções Cognitivo afetivo


propostas pelo comportamental
enfermeiro

“Ajuste” ou eficácia

Figura 10 – Elementos do Modelo Calgary de intervenção familiar

Para a intercessão da enfermagem, a teoria da mudança oferece atributos importantes para essa
prática. Nem sempre ela ocorre. Muitas vezes, é preciso que algum desconforto aconteça para que se
perceba a sua necessidade e ela efetivamente ocorra. Em geral, toda alteração gera desconforto.

Sabe‑se, contudo, que a mudança mais profunda e contínua é aquela que ocorre sobre as crenças
da família. Ela depende da percepção do problema. Assim, enfermeiro e família podem achar a melhor
solução para o problema encontrado.

Existem situações em que a proposta do enfermeiro não atende às necessidades ou expectativas


da família, a qual pode querer suspender o cuidado ou procurar outro profissional. Alguns exemplos
de foco de atenção do enfermeiro com as famílias são: planejamento familiar, adaptação à gravidez,
satisfação conjugal, entre outros.

1.5 Ciclos de vida familiar

O ciclo de vida familiar tem várias etapas pelas quais as famílias passam desde a sua constituição
em uma geração até a morte dos indivíduos que a iniciaram. Elas podem ter impactos sociais, culturais,
biológicos ou econômicos. Nessas etapas, algumas mudanças são esperadas enquanto outras não, e o
comportamento da família diante disso precisa ser conhecido, demandando avaliação e intervenção
quando não são vistas como algo bom.

25
Unidade I

Figura 11 – Ciclo natural de vida familiar

Algumas das modificações que podem ocorrer no ciclo de vida são: casamento, nascimento de um
filho, separação, adolescência ou morte, dentre outros. Na literatura, são apontadas seis fases do ciclo
de vida, descritas em oito etapas:

1 – Começo da família (casamento).

2 – Família com filhos com até 30 meses.

3 – Família com filhos pré‑escolares (entre 30 meses e anos anos de idade).

4 – Família com filhos escolares (entre seis e 13 anos de idade).

5 – Família com adolescentes (entre 13 e 20 anos).

6 – Família em fase de lançar os filhos (filhos saem de casa para estudar, trabalhar, casar etc.).

7 – Famílias maduras (do ninho vazio até a aposentadoria).

8 – Famílias anciãs (aposentadoria até o falecimento de ambos os cônjuges).

Quadro 1 – Ciclos de vida, tarefas e problemas que cada ciclo de vida pode apresentar

Etapa Tarefa e mudanças familiares necessárias Problemas que podem se apresentar


• Compromisso com um sistema familiar novo.
• Disfunções sexuais.
• Pactuação de papéis e metas.
• Infertilidade.
Formar o casal • Negociação da intimidade.
• Sintomas inespecíficos (cefaleia, lombalgia,
• Reordenação das relações (família ampliada e amigos). cansaço).
• Estabelecimento de relações mutuamente satisfatórias.

26
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• Integrar um novo membro.


• Choro dos filhos.
• Ajustar o par ao trio.
Tornar‑se pai e • Negociar papéis parentais. • Problemas de alimentação.
mãe • Tensão, infidelidade.
• Restringir a vida social.
• Sintomas variados, sobretudo nas mães.
• Reordenar as relações com a geração dos avós.
• Obter um equilíbrio entre o lar e o mundo exterior
(escola, amigos). • Filhos fora de controle.
Crescimento • Ensaiar a separação/promover a diferença do subsistema • Enuresis e encopresis.
dos filhos familiar.
• Sintomas vários (cefaleia, dores).
• Lidar com os irmãos.
• Saídas noturnas e do lugar.
• Alterar a flexibilidade dos limites. • Recusa à escola e faltas não autorizadas.
Filhos • Obter um equilíbrio entre o controle e a independência. • Violência familiar, transtornos alimentares,
adolescentes
• Permitir ao adolescentes entrar e sair da família. problemas sexuais.
• Sintomas dos pais.
• Ir e deixar ir.
• Reestruturar a relação entre os pais e os filhos. • Desavenças matrimoniais.
Filhos que se
emancipam • Pais: começar a construir uma nova relação com o • Crise da meia‑idade.
ninho vazio. • Divórcio.
• Filhos: irem‑se do lar e tornarem‑se independentes.
• Aceitar a mudança geracional dos papéis.
• Dores patológicas.
• Enfrentar a enfermidade e a morte dos pais e avós.
Família na vida • Aprender a ser avós. • Depressão.
tardia • Demência.
• Adaptar‑se com o papel de aposentado ou pensionista.
• Falta de adesão às orientações médicas.
• Restabelecer‑se da morte do cônjuge.

Em famílias de classe social vulnerável, alguns fenômenos contribuem para encurtar as fases do
ciclo de vida: em primeiro lugar, a gravidez que ocorre precocemente, geralmente em adolescentes e,
assim, as fases do casamento e nascimento do primeiro filho dão lugar a famílias com filhos pequenos.
A estrutura, geralmente monoparental, e a aglomeração de gerações sob um mesmo teto faz com que
famílias populares tenham ciclos de vida abreviados, de até três fases:

Quadro 2 – Os ciclos de vida das famílias vulneráveis

Fase do ciclo Características


Adolescentes são levados a buscar formas de subsistência fora de casa ou são
Família composta por jovem fonte muito explorada de ajuda, tornando‑se um adulto sozinho, que cresce por
adulto. conta própria, sem que outro adulto se responsabilize por ele. Começa muito
precocemente, por volta dos dez anos de idade.
Ocupa grande parte do ciclo, incluindo dentro da mesma casa três ou quatro
Família com filhos pequenos. gerações. As tarefas dessa fase se misturam: formar um sistema conjugal, assumir
papéis paternos e reorganizar os papéis com as famílias de origem.
É mais raro ocorrer um ninho vazio de fato, uma vez que os idosos costumam
ser membros ativos da família, com papel de sustentar e educar as gerações mais
Família no estágio tardio. novas. As mulheres tornam‑se avós precocemente, mesmo que ainda estejam
consolidando sua fase reprodutiva e reconstruindo sua vida afetiva. Essa é a fase
que mais vem crescendo ao longo dos anos.

27
Unidade I

A seguir será abordada a assistência de enfermagem nos diferentes ciclos de vida.

1.5.1 Infância

Avaliar o crescimento e desenvolvimento infantil é uma das atribuições do enfermeiro na estratégia


saúde da família e parte integrante da consulta de enfermagem à criança. É importante que o profissional
conheça detalhes sobre condições de nascimento e de vida da criança. Investigar as condições em que
a mãe realizou o pré‑natal e possível interferências que possam ter ocorrido, como hipertensão arterial,
diabetes, infecções, fumantes etc. é tarefa importante.

Figura 12 – Criança após nascimento

Nessa fase do ciclo vital, avaliar o crescimento e desenvolvimento infantil é papel fundamental do
enfermeiro, devendo ser realizado durante a consulta de enfermagem. Medidas antropométricas, assim
como os perímetros cefálicos, torácicos e abdominais, fazem parte dessa avaliação para elaborar o
gráfico que qualificará o crescimento da criança.

Saiba mais

Para saber mais sobre a saúde da criança, leia:

BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde da criança: crescimento e


desenvolvimento. Brasília: Ministério da Saúde, 2012c. (Cadernos de
Atenção Básica, n. 33).

Dentre outros problemas que podemos encontrar, vale atentar para:

• Avaliação do peso: pode ser alterado se a criança sofreu algum agravo de saúde ou se a família
tem dificuldades para lidar com as recomendações feitas para determinada faixa etária ou se
possui condições socioeconômicas desfavoráveis.

28
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• Avaliação da altura: pode revelar algum problema crônico e, tardiamente, por desnutrição.

• Perímetro cefálico: sua avaliação é útil até que a criança complete dois anos e pode sinalizar
algum problema de Sistema Nervoso Central.

O Ministério da Saúde (BRASIL, 2012c) sugere que até o primeiro ano de vida a criança passe, pelo
menos, por sete consultas médicas; no segundo ano de vida, por duas consultas, e do terceiro ao quinto
ano, uma consulta por ano. Essa sequência é para uma criança com crescimento e desenvolvimento
dentro do esperado e que não tenha anormalidades identificadas em seu estado de saúde.

O enfermeiro deve acompanhar a família desde o pré‑natal e identificar quais são as angústias,
dúvidas e dificuldades diante da situação de um novo ente familiar, visando auxiliar na melhor forma
de adaptação possível. Os laços afetivos formados, em especial entre pais e filhos, influenciam no
desenvolvimento saudável do bebê e determinam modos de interação positivos, que possibilitam o
ajustamento do indivíduo aos diferentes ambientes de que ele irá participar.

É de suma importância incluir o pai nessa avaliação e nas orientações para que ele participe do
crescimento e desenvolvimento da criança e assessore nos cuidados.

Algumas dificuldades são comuns da fase do nascimento, e o enfermeiro precisa estar atento. A
depressão pós‑parto é um dos agravos com os quais podemos nos deparar, afetando entre 12% e 19%
das puérperas e envolvendo diretamente o bebê e o pai da criança. Um dos problemas ocasionados pela
depressão pós‑parto é o desmame precoce (primeiros dois meses). O profissional enfermeiro deverá
verificar sinais compatíveis de depressão na puérpera, tais como tristeza, irritabilidade, choro frequente,
transtornos alimentares e de sono, além de queixas psicossomáticas.

O nascimento do segundo filho também merece atenção do enfermeiro. Ele pode causar ciúmes no
primogênito e alterações emocionais que levam a diarreia, febre e outros sintomas, além de retrocessos,
como voltar a querer mamadeira, fazer xixi na calça etc. É importante que o enfermeiro note as mudanças
decorrentes desse acontecimentos, tranquilizando, apoiando e orientando a família para que ela consiga
se adaptar e superar esse momento de ambivalência entre a felicidade pelo nascimento de um segundo
filho e a ansiedade que pode advir do evento.

É importante que o enfermeiro incentive e auxilie os pais a criarem redes de apoio complementares
para ajudar nessa fase, passando por ela da melhor forma possível, evitando conflitos. O enfermeiro pode,
por meio da avaliação de Calgary, identificar quais são as possíveis redes de apoio disponíveis, como
membros da família, amigos, vizinhos, colegas de trabalho e profissionais de saúde como psicólogos,
médicos, entre outros.

Percebe‑se que o fenômeno de distribuição de papéis, que na família tradicional era fortemente
delimitado, hoje se encontra flexibilizado, principalmente nas classes mais populares, sendo, muitas
vezes, os avós os detentores de maior parte do cuidado da criança.

29
Unidade I

Com a presença mais frequente do enfermeiro no contexto domiciliar da família, algumas ações se
tornam possíveis e os resultados positivos são visíveis. Durante a visita à casa da paciente, o enfermeiro
consegue identificar sinais e sintomas de depressão pós‑parto, dificuldades no processo de amamentação
e cuidados de higiene da mãe e da criança, orientar sobre possíveis dificuldades na nova rotina e no
desenvolvimento da paternidade.

Em relação à criança, o enfermeiro pode apontar problemas como: dificuldade de alimentação,


vômito, apneia, letargia, taquipneia, atividade reduzida, febre, batimento de asas do nariz, icterícia,
cianose, problemas de pele entre outros.

Para bebês maiores de dois meses, é importante observar se a criança consegue mamar no peito, se
vomita tudo o que ingere, se apresenta convulsões ou se está letárgica ou inconsciente.

Com frequência, as crianças são acometidas por problemas respiratórios e gastrointestinais. Sendo
assim, o enfermeiro deve conseguir distinguir sinais de maior gravidade dessas doenças por meio do
conhecimento sobre a fisiopatologia delas.

Orientações sobre imunização e alimentação são essenciais para a família.

O acompanhamento do desenvolvimento da criança na atenção básica objetiva sua promoção,


proteção e a detecção precoce de alterações passíveis de modificação que possam repercutir em sua
vida futura. Dentro do que é esperado para um desenvolvimento normal, a família da criança pode
interferir e inserir crenças e valores que deixam os pais sem saberem o que é realmente esperado para
aquela determinada idade da criança, como, por exemplo, a comparação com outros.

A identificação de problemas tais como: atraso no desenvolvimento da fala, alterações relacionais,


tendência ao isolamento social, dificuldade no aprendizado, agressividade, entre outros é fundamental
para o desenvolvimento e a intervenção precoce para o prognóstico dessas crianças.

Para a avaliação do desenvolvimento da criança, podemos obter informações dos pais, da rede de
apoio, como pessoas que auxiliam no cuidado, e da escola que a criança frequenta. Um instrumento
muito utilizado para tal ação em nosso país é o teste de Denver. Ele foi criado na tentativa de acompanhar
objetivamente o desenvolvimento neuropsicomotor de crianças de zero a seis anos. Criado por
Frankenburg em 1967, avalia quatro áreas do desenvolvimento infantil: motor‑grosseiro e motor fino
adaptativo (controle de aquisições motoras), linguagem (percepções de sons, imagens e suas respostas)
e pessoal‑social (avaliação do comportamento perante estímulos culturais).

30
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Saiba mais

Para se aprofundar no assunto, leia:

ZAGO, J. T. C. et al. Associação entre o desenvolvimento neuropsicomotor


e fatores de risco biológico e ambientais em crianças na primeira infância.
Cefac, v. 19, n. 3, p. 320‑329, maio‑jun. 2017.

É importante que o enfermeiro saiba que alterações significativas no crescimento também


podem afetar o desenvolvimento da criança, cujo tratamento poderá ser individualizado ou em
grupo, dependendo muito de sua complexidade. O manejo adequado poderá ser feito mediante
orientações aos pais sobre a importância da relação entre o desenvolvimento da criança e a maneira
como eles lidam com ele.

A obesidade infantil é outro problema que deve ser visto pelo enfermeiro da família. Hoje, é
considerado um problema de saúde pública, pois a prevalência de sobrepeso e obesidade infantil está
aumentando em todo o mundo, com incidência entre 10,8% e 33,8% em diferentes regiões e reflexos
em curto e longo prazos na saúde pública (BRASIL, 2012c). Intervir precocemente, visando prevenir
a obesidade na infância, significa diminuir, de uma forma racional e menos onerosa, a incidência de
doenças crônico‑degenerativas na fase adulta.

Algumas informações que o enfermeiro deve verificar nesse contexto são:

• se a criança realizou aleitamento materno;

• se há sobrepeso ou obesidade dos pais;

• se os pais e a criança realizam alguma atividade física;

• avaliar os hábitos alimentares da família, incluindo o horário das refeições.

Essas indicações auxiliarão muito na avaliação da família e na elaboração das intervenções.

Outro motivo de interferência na família relacionado à criança é a violência. Ela interpõe‑se como
uma poderosa ameaça ao direito à vida e à saúde da criança e de sua família. A exposição dela a
qualquer forma de violência, assim como a negligência e o abandono, principalmente na fase inicial da
sua vida, pode comprometer seu crescimento e desenvolvimento físico e mental.

Nesse sentido, desde 1996, há uma recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) de que
as violências sejam encaradas como importantes problemas de saúde pública. No Brasil, a violência já
atingiu o quinto lugar nos motivos de mortes de crianças até um ano de idade (MAGALHÃES, 2017).

31
Unidade I

O enfermeiro precisa entender a violência, seus fatores de risco e avaliar algumas questões:

• identificar casos suspeitos de violência;

• conhecer e reconhecer sinais de violência;

• identificar redes de apoio e proteção social no território;

• realizar acompanhamento contínuo da criança e da família em situação de violência;

• desempenhar atividades de prevenção da violência com a população.

A suspeita de violência, também conhecida como maus‑tratos, surge, em geral, no momento em


que se procede à anamnese ou ao exame físico da criança. Distúrbios de sono, desnutrição, dificuldade
de aprendizado ou fobias são alguns dos muitos sintomas que podemos identificar na criança durante
a consulta de enfermagem. Hematomas, queimaduras e fraturas podem ser sugestivos de possível
violência física.

É importante que o enfermeiro desenvolva ações de prevenção da violência e identificação de sinais


e sintomas nas escolas e creches, pois também são ambientes que auxiliam na identificação de possíveis
problemas e ajudam no processo de apoio à família e à criança.

A atenção básica assume um papel importante para a atenção integral à saúde das crianças e de
suas famílias em situações de violência por ser o serviço responsável pela coordenação das ações de
cuidado antiviolência.

Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2009b), existe uma linha de cuidado que precisa ser seguida
na atenção básica à saúde, conforme figura a seguir:

Acolhimento
Atendimento
Notificação
Seguimento na rede

Figura 13 – Linha de cuidado para a criança e família vítimas de violência

Ainda em relação à violência à criança, é importante que o enfermeiro conheça os fatores de


vulnerabilidade:

32
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• pais muito jovens;

• pais solteiros;

• pais de nível socioeconômico baixo;

• ambiente familiar instável (uso de drogas e álcool);

• pais com baixa autoestima;

• fatores que aumentam o nível de conflito, como o desemprego;

• crianças com distúrbios psíquicos e mentais, entre outros.

Para que o enfermeiro consiga atingir de forma efetiva o cuidado nessa etapa do ciclo vital,
é preciso conhecer todas as vulnerabilidades possíveis que a criança vivencia, como as citadas
anteriormente.

1.5.2 Adolescência

A adolescência é uma das fases mais importantes e peculiares do desenvolvimento humano que chega
de uma forma intensa, manifestada por meio de crescimento físico acelerado, além da evolução psicológica.

Por mais que tenhamos políticas públicas bem-estruturadas, quando falamos da adolescência,
essa não é a realidade. Ainda há muita dificuldade em se assegurar a atenção integral à saúde dessa
população, levando em consideração as peculiaridades existentes nessa fase do ciclo vital.

O Programa de Saúde do Adolescente (Prosad) criado em 1989, e o Estatuto da Criança e do


Adolescente, de 1990, são as políticas brasileiras que apresentam diretrizes voltadas para a atenção
à saúde e proteção social dos adolescentes, porém, ainda se mostram insuficientes para atingir a
integralidade dessa população.

A compreensão das demandas e necessidades de saúde dos adolescentes pode subsidiar estratégias
de melhoria do cuidado a esse grupo. E a gravidez na adolescência é uma das principais exigências de
saúde que merecem atenção.

33
Unidade I

Figura 14 – Gravidez na adolescência

Geralmente, as mulheres descrevem a experiência de ser mãe como maravilhosa e muitas, inclusive,
têm a maternidade como um sonho de mulher. Na adolescência, esse contexto passa a ser problema de
saúde pública por não ser planejado, e não pela gestação propriamente dita. A adolescente passa por
intensas transformações que já impactam diretamente na sua rotina, e uma gravidez não planejada
pode ser um problema ainda maior do que se ocorresse na vida adulta.

O estilo de vida atual, de mais liberdade de expressão e independência da mulher e da adolescência,


associado à grande explosão emocional da fase, são os principais motivos do aumento da incidência de
gravidez na gestação.

O segundo aspecto é um pouco mais subjetivo e parece não ter relação, mas impacta, sim. Nas
populações de classes econômicas mais baixas, que geralmente não têm acesso à saúde, cultura, lazer
e emprego, uma gravidez pode representar instantânea elevação de benefícios, como, por exemplo, ter
preferência em filas de estabelecimentos comerciais.

A adolescente, muitas vezes, apresenta complicações na gestação, pois, em sua maioria, não entende
a importância do pré‑natal, tem vergonha da barriga, não possui acesso às consultas e não o realiza da
forma indicada.

Como enfermeiros, precisamos orientar a adolescente sobre as complicações mais comuns na


gestação precoce, como:

• mortalidade neonatal;

• baixo peso ao nascer;

• anemia ferropriva;

• mortalidade materna;

34
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• aborto espontâneo;

• doença hipertensiva exclusiva da gestação;

• prematuridade, entre outros.

Figura 15 – Recém‑nascido prematuro. Consequência possível na gravidez na adolescência


Ainda sobre as consequências, a interrupção dos estudos é uma delas. Infelizmente, escolas
e universidades não possuem alguma forma de apoio a essas alunas, ocasionando alto número
de evasões escolares, tendo como consequência a falta de preparo para o mercado de trabalho,
desemprego e pobreza.

Saiba mais

Sobre o impacto causado pela gravidez na adolescência, leia:

BICA, I. et al. Situação de risco com impacto em toda família: gravidez


na adolescência. Millenium, v. 2, n. 1, p. 65‑75, 2016.

A atuação do profissional enfermeiro é imprescindível por criar oportunidades de diálogo e


apoio, os quais a adolescente não possui em sua família e podem ser supridos por uma atenção
multiprofissional qualificada.

35
Unidade I

Outra problemática ainda dentro da gravidez na adolescência não planejada é o aborto. Várias são as
opções clandestinas e ilegais oferecidas e sugeridas geralmente pelo companheiro ou amigos. Segundo
estimativas da Organização Mundial da Saúde (GENIOLE, 2011), cerca de metade das gestações são
indesejadas e uma em cada nove mulheres recorre ao aborto.

A Agência Nacional dos Direitos da Infância (ANDI, 2003) relata que mais da metade das adolescentes
grávidas de classe média alta recorrem ao aborto quando não podem ou não querem a gestação. Os
abortos malsucedidos, realizados de forma precária e que apresentam complicações, obrigam as mulheres
a procurar assistência médica na rede pública de saúde, entrando para as estatísticas nacionais.

Exemplo de aplicação

Por meio da escuta e do acolhimento, os profissionais de saúde têm a possibilidade de considerar


as crenças, os valores e o modo como representa e age a família perante a situação e também suas
potencialidades e limitações. Reflita sobre o papel do enfermeiro nesse contexto.

Outro problema que pode ocorrer nessa fase do ciclo vital é a violência urbana. Ela inclui acidentes
de trânsito, óbitos por arma de fogo, arma branca, afogamento, suicídio entre outros. Este problema
acomete principalmente jovens entre 20 e 24 anos e vem aumentando cada vez mais nas estatísticas
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (BRASIL, 2001). Recentemente, a violência urbana,
representada também pelos assaltos, sequestros, estupros, dentre outros tipos, vem sendo executada
basicamente por jovens e adolescentes.

Figura 16 – Violência urbana na adolescência

A violência traz sempre um cunho de poder, de domínio de um sobre o outro; assim, os indivíduos
considerados mais frágeis ou pertencentes a classes minoritárias, como as mulheres, idosos, crianças e
adolescentes, são sempre os mais atingidos.

A promoção da saúde por meio de ações educativas contra qualquer tipo de violência ainda é a
melhor forma de conscientizar jovens e adolescentes sobre os riscos diante dessa demanda. Por conta
36
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

desse tipo de problemática, devido aos óbitos precoces, a família sofre uma mudança radical na estrutura
e precisa de apoio para lidar com esse tipo de adaptação que poderia ser evitado.

O bullying é uma temática nova e atual, que vem tomando dimensões inclusive judiciais e que
impacta diretamente na vida do adolescente, podendo ocasionar violência, depressão e isolamento
social. É preciso que o enfermeiro auxilie a família e o jovem a lidar com esse tipo de contexto.

A prática do bullying não se restringe ao ambiente escolar, podendo estar presente também nas
famílias, nos locais de trabalho, nos condomínios residenciais, enfim, onde existam relações interpessoais.

Figura 17 – Bullying na adolescência


As causas são diversas, tais como: carência afetiva, ausência de limites e modo de afirmação de
poder e de autoridade dos pais sobre os filhos, por meio de práticas educativas que incluem maus‑tratos
físicos e explosões emocionais violentas. Cabe ao enfermeiro estar atento a sinais de bullying durante a
avaliação da família e no decorrer do acompanhamento.

Assim, como comentamos no ciclo vital da infância, a violência intrafamiliar também pode ocorrer
na adolescência. Essa prática é constantemente encoberta pelos membros da família, inclusive pela
própria vítima, seja por vergonha, medo ou pela situação de dependência da vítima com relação ao
agressor. A violência pode ser física, emocional, sexual ou ainda negligência.

O enfermeiro que estiver acompanhando uma vítima de violência intrafamiliar deve considerar seus
relatos, ainda que se trate de uma criança, não se precipitando na conclusão de que se trata de fantasia.
Portanto, deve ficar atento a sinais sugestivos de violência em crianças e adolescentes, como lesões
repetidas, isolamento, depressão, exibicionismo, interesse sexual impróprio para a idade, manipulação
da genitália, DSTs.

O comportamento dos pais também pode ser suspeito, como a criança ser levada com frequência
à unidade de saúde e os pais demonstrarem cuidado excessivo, não permitindo que ela fique nem um
momento longe de sua presença. Esse tipo de comportamento pode demonstrar insegurança e receio de
que a criança relate a realidade. A atuação multiprofissional nesta situação é essencial.

37
Unidade I

Saiba mais

Para saber mais sobre a violência infrafamiliar, leia:

MAGALHÃES, J. R. F. et al. Violência intrafamiliar: vivências e percepções


de adolescentes. Escola Anna Nery Revista de Enfermagem, v. 21, n. 1,
p. 1‑7, 2017.

O uso e abuso de drogas e álcool na adolescência também é uma problemática possível dentro
das famílias e que muitos pais apresentam dificuldade de identificar ou de lidar com essa situação,
necessitando de auxílio multiprofissional.

Figura 18 – Uso de drogas e álcool entre os adolescentes

As características emocionais típicas da adolescência impulsionam o adolescente a experimentar


novas sensações e a buscar o prazer imediato, atitudes decorrentes de dois importantes fatores que
integram esse processo, a curiosidade e a pressão do grupo.

Em nossa cultura e contando com o auxílio da mídia, o álcool tem sido a primeira droga utilizada
pelos jovens, muitas vezes até estimulados pelos pais. Acreditava‑se que a função de atuar como porta
de entrada para o uso de outras drogas era atribuída à maconha; porém, hoje, considera‑se principal
marcador de risco para a utilização de outras drogas o uso regular de bebidas destiladas.

Um dos primeiros sinais de que um jovem está utilizando algum tipo de droga, principalmente no
caso da maconha, é a queda do rendimento escolar. O estado apático decorrente do uso dessa droga
com frequência compromete os estudos.

De uma forma geral, as drogas alteram as funções cognitivas, responsáveis pela noção de tempo
e espaço e pelos reflexos de autopreservação. O uso, ainda que em pequenas doses, pode resultar em
graves acidentes de trânsito e de trabalho que podem levar a mutilações e óbitos.

38
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Durante a abordagem à família com essa problemática, deve‑se considerar na avaliação o tipo de
droga utilizada e o tempo de uso.

Saiba mais

Veja mais sobre o assunto noa rtigo:

CANAVEZ, M. F.; ALVES, A. R.; CANAVEZ, L. S. Fatores predisponentes


para o uso precoce de drogas por adolescentes. Cadernos Uni FOA, ed. 14,
p. 57‑63, 2010.

É preciso que o enfermeiro esteja preparado para atuar com essa clientela, pois o cuidado deve
estar voltado à necessidade de diagnosticar o abuso de drogas e os prejuízos causados por ela à vida do
adolescente de forma precoce, minimizando os problemas.

A família deve fazer parte desse atendimento, dado o significado do contexto familiar nessas
situações. Ela atuará na responsabilização do adolescente perante seu tratamento e ainda necessitará
de apoio para lidar de forma compreensível com a situação. O profissional deverá participar da busca de
estratégias e parcerias envolvendo uma sensibilização para as causas e consequências do problema; num
entendimento biopsicossocial, oferecendo informações sobre as substâncias psicoativas e os problemas
relacionados ao seu uso; proporcionando oportunidades para explorar as perdas e ganhos ocorridos no
plano pessoal e social quando se escolhe ou se abdica do uso de drogas.

Os transtornos alimentares são uma realidade muito presente na adolescência. O capitalismo


e o mundo da moda determinam biótipos muitas vezes não saudáveis e que levam adolescentes a
desenvolver desordens alimentares com sérias consequências em sua saúde.

Figura 19 – Transtornos alimentares na adolescência: anorexia na adolescência

39
Unidade I

Figura 20 – Transtornos alimentares na adolescência: bulimia na adolescência

A anorexia nervosa e a bulimia são os distúrbios alimentares mais comuns entre os adolescentes. Na
família, os pais podem não conseguir identificar facilmente esses problemas e precisarão de ajuda do
enfermeiro para identificação e tratamento desses distúrbios junto ao adolescente.

Saiba mais

Obtenha mais informações lendo:

MORGAN, C. M.; VECCHIATTI, I. R.; NEGRÃO, A. B. Etiologia dos transtornos


alimentares: aspectos biológicos, psicológicos e sócio‑culturais. Revista
Brasiliera de Psiquiatria, v. 24, supl. III, p. 18‑23, 2002.

Alterações de saúde graves como alterações cardiológicas (arritmias), endócrinas (hipotireoidismo),


anemia, dificuldade de coagulação, depressão, alteração do sono, pele descorada, queda de cabelo entre
outras podem ocorrer caso o distúrbio não seja identificado.

Observação

A anorexia é visivelmente fatal. Pode levar a óbito por falência múltipla


dos órgãos.

Algumas intervenções de enfermagem numa família vivenciando um adolescente com transtornos


alimentares são sugeridas, tais como:

• avaliar e explorar o grau de dependência e envolvimento entre os membros da família;

• identificar as regras de alimentação dentro da família;

40
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• distinguir limites adequados para alimentação;

• incentivar meio de comunicação entre os familiares sobre o problema;

• ajudar o paciente a desenvolver habilidades na resolução de problemas e incentivar a iniciativa;

• incentivar a participação em grupos de terapia de família.

Como já visto anteriormente com as crianças, é preciso incentivar práticas saudáveis que alcancem
cada vez mais o adolescente, que é responsável pela sociedade futura, por meio de informações,
acolhimento e escuta de suas necessidades. Esses costumes poderão favorecer um suporte social e
emocional ao adolescente, contribuindo para o fortalecimento de ações individuais de enfrentamento
frente as demandas dessa fase do ciclo vital.

1.5.3 Fase adulta

A fase adulta apresenta várias condições que merecem atenção do enfermeiro. Iniciaremos esse
tema falando um pouco das demandas exclusivas das mulheres.

Até a década de 1970, a mulher era designada única e exclusivamente para os cuidados domésticos e
maternos, e assim também eram as políticas voltadas a sua saúde e para a maternidade (gravidez e parto).

A ativação da participação feminina na sociedade e a mudança de papéis foram essenciais para que
essa visão exclusiva de mãe e dona do lar ocorresse e outras necessidades recebessem atenção, como a
contracepção, as doenças sexualmente transmissíveis, entre outras.

Em 1983, o Ministério da Saúde elabora o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher


(PAISM) com objetivo de promover ações educativas, de prevenção, diagnóstico, tratamento e
reabilitação relacionados ao pré‑natal, parto e puerpério, climatério, planejamento familiar, DST,
câncer de colo de útero e mama.

Lembrete

Por mais que tenha evoluído a discussão sobre a saúde da mulher, a


prioridade das ações ainda é voltada para a saúde materno-infantil.

Durante a consulta de enfermagem, seja no domicílio ou na instituição de saúde, o enfermeiro


deve aproveitar a oportunidade para ouvir o que a mulher tem a dizer, suas queixas, medos, anseios e
dúvidas, e aproveitar esse tempo para auxiliar no que for possível. A Sistematização da Assistência de
Enfermagem (SAE) é uma atividade privativa do enfermeiro e suas etapas possibilitam uma avaliação
minuciosa da mulher, propiciando diagnósticos de enfermagem para o planejamento de intervenções
efetivas e individualizadas, além da possibilidade de realizar educação em saúde.

41
Unidade I

A Resolução nº 358/2009 do Conselho Federal de Enfermagem dispõe sobre a Sistematização da Assistência


de Enfermagem e a implementação do Processo de Enfermagem em ambientes públicos e privados.

Saiba mais

Para saber os principais motivos da procura de serviços de saúde por


mulheres, leia o artigo a seguir:

LEVORATO, C. D. et al. Fatores associados à procura por serviços de saúde


numa perspectiva relacional de gênero. Ciência & Saúde Coletiva, v. 19, n.
4, p. 1263‑1274, jun.‑abr. 2014.

As doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) são uma das demandas da saúde da mulher. As
vulvovaginites são um dos principais motivos de consultas ginecológicas. Apesar de muitas vezes não
serem graves, causam desconforto e devem ser identificadas e tratadas. Durante a consulta ginecológica,
é realizada a sua avaliação e há a oportunidade de identificar e orientar sobre outras DSTs.

Importante lembrar que quando falamos de doenças sexualmente transmissíveis, nossa atenção não
deve estar voltada somente para a questão homem‑mulher. Hoje, temos muitos casais homossexuais
que devemos conscientizar e com os quais atuar de forma preventiva na educação em saúde, pois eles
também podem desenvolver doenças como o HIV. Também deve‑se ter atenção com as gestantes, que
podem transmitir aos filhos, na hora do parto, na transmissão vertical, a conjuntivite gonocócica.

As DSTs podem provocar consequências graves como:

• infertilidade tanto do homem quanto da mulher;

• dor pélvica crônica;

• gravidez ectópica;

• câncer do colo do útero, além de acarretar graves problemas de saúde aos filhos gerados em uma
mãe portadora sem tratamento se a gestação chegar a termo. Muitas vezes, a gravidez poderá ser
interrompida por complicações de alguma DST.

42
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Saiba mais

Para saber mais sobre as DSTs, leia o material a seguir:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde.


Programa Nacional de DST e Aids. Manual de Bolso das Doenças Sexualmente
Transmissíveis. Brasília: Ministério da Saúde, 2005b.

Pensando em dados epidemiológicos atuais e preocupantes, uma doença sexualmente transmissível


à qual precisamos estar atentos é a sífilis, pois, quando diagnosticada, na maioria das vezes, o é em
sua fase tardia. O enfermeiro deve orientar e acompanhar o casal em todo processo de diagnóstico e
tratamento dessa doença.

Observação

O Ministério da Saúde lançou uma ação nacional de combate à sífilis.


A meta é mobilizar gestores e profissionais de saúde para a importância da
detecção e tratamento da sífilis durante o pré‑natal.

O HIV, vírus da imunodeficiência humana, também merece atenção. Antigamente, era associado à
população homossexual, porém, hoje, se estende para todos os gêneros, sem distinção. Uma vulvovaginite
fúngica de repetição pode ser sinal da presença do vírus e deve ser investigada.

Uma informação assustadora e de grande valia para nós, enfermeiros, e outros profissionais de
saúde é que estudos realizados pelo Ministério da Saúde apontam que das cerca de 630 mil pessoas
infectadas pelo HIV, 330 mil desconhecem seu estado sorológico positivo (BRASIL, 2005b). Assim, cabe
ao enfermeiro, durante a consulta de enfermagem, colher dados para investigação efetiva da situação
clínica da mulher e encaminhá‑la para possível diagnóstico e acompanhamento. Falar sobre isso para a
mulher pode ser difícil, assim, o espaço aberto pelo enfermeiro no domicílio ou na instituição de saúde
precisa ser propiciado e incentivado para que possamos prevenir agravos e iniciar tratamento o mais
rápido possível, evitando uma possível depressão e isolamento social, além da discriminação.

O SUS, a participação e mobilização de usuários e da sociedade civil têm sido decisivos para esse
enfrentamento e para a melhora da qualidade de vida dos pacientes portadores de HIV. Testes rápidos
são disponibilizados em unidades de saúde do SUS, que são referência em atenção a essa doença.

43
Unidade I

Figura 21 – Teste rápido para diagnóstico de HIV disponível em algumas unidades de saúde do SUS

Outra questão para atenção e cuidado das mulheres são os cânceres de colo de útero e de mama,
os mais incidentes entre as mulheres. Anualmente, cerca de 500 mil novos casos de câncer são
diagnosticados no mundo e, desses casos, em torno 230 mil evoluem para óbito.

O câncer de colo de útero representa 20% de todos os casos de câncer na população feminina
brasileira. A faixa etária de 20 a 29 anos apresenta maior evidência de casos, porém é entre os 45 e 49
anos que atinge seu pico de maior incidência.

Útero

Cérvix Câncer

Vagina

Figura 22 – Câncer de colo de útero

Conhecer os fatores de risco para o câncer de colo de útero é essencial para o trabalho do
enfermeiro, que deve estar atento às práticas educativas de prevenção e vacinação dos adolescentes
conforme protocolo do Ministério da Saúde de identificação precoce da doença. Durante a consulta de
enfermagem, o enfermeiro deve atentar para:

44
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• início precoce da atividade sexual;

• multiplicidade de parceiros;

• higiene íntima inadequada;

• ingestão nutricional com baixa quantidade de vitaminas;

• tabagismo;

• uso prolongado de anticoncepcionais orais;

• relações sexuais sem preservativos;

• exame positivo para HPV (Papiloma Vírus Humano).

A Organização Mundial de Saúde (OMS) indica o HPV como o principal fator de risco para o câncer
de colo de útero.

Saiba mais

Para saber mais sobre o tema, leia:

INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER. Coordenação Geral de Ações


Estratégicas. Divisão de Apoio à Rede de Atenção Oncológica. Diretrizes
brasileiras para o rastreamento do câncer do colo do útero. Instituto
Nacional de Câncer. Coordenação Geral de Ações Estratégicas. Divisão de
Apoio à Rede de Atenção Oncológica. Rio de Janeiro: 2011.

O Instituto Nacional de Combate ao Câncer (Inca), maior referência em pesquisa sobre câncer em
nosso país, lançou, em 2011, as diretrizes brasileiras de rastreamento do câncer de colo de útero. Elas
trazem informações sobre os possíveis resultados de exame para diagnóstico de câncer de colo de útero
e como proceder. O exame de Papanicolau é um exame ginecológico que possibilita o diagnóstico do
câncer de colo de útero.

O câncer de colo de útero e o de mama causam grande impacto, além de demandarem atenção
e acompanhamento do paciente e sua família. Mulheres com câncer de colo de útero se encontram
fragilizadas e ansiosas com o diagnóstico, prognóstico e com as mudanças na vida pessoal e familiar
provocadas pela doença. O enfermeiro precisa estar preparado e ter conhecimento sobre esse problema,
seus sintomas e tratamento, e, a partir daí, identificar as maiores dificuldades que podem envolver o
contexto biopsicossocial, espiritual e tomar medidas que possam auxiliar a paciente e sua família por
meio de uma equipe multiprofissional.

45
Unidade I

O câncer de mama é um dos males mais temidos pelas mulheres. Talvez porque quando falamos
do câncer de mama, algumas associam a doença com a mutilação, devido à mastectomia, tratamento
utilizado em alguns casos da doença.

Observação

O Inca (2016) estimou 600 mil novos casos de câncer entre 2016 e 2017.
Entre os mais comuns entre as mulheres, estão: cânceres de mama (28,1%),
intestino (8,6%), colo do útero (7,9%), pulmão (5,3%) e estômago (3,7%).

Temos duas informações que precisamos levar em conta quando falamos do câncer de mama. Uma
é que o tipo de câncer mais incidente no mundo, porém, a outra é que, se diagnosticado precocemente,
tem bom prognóstico.

Gânglios
linfáticos

Tumor

Figura 23 – Câncer de mama

O enfermeiro deve conhecer e investigar os seguintes fatores de risco para câncer de mama,
lembrando que não há uma causa única para essa patologia, e todas devem ser levadas em consideração
durante a avaliação:

• obesidade e sobrepeso após a menopausa;

46
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• sedentarismo;

• consumo de bebida alcoólica;

• exposição frequente a radiações ionizantes (raio x, mamografia e tomografia);

• primeira menstruação antes dos 12 anos de idade;

• não ter tido filhos;

• gravidez após os 30 anos;

• não ter amamentado;

• parar de menstruar após os 55 anos;

• uso de anticoncepcional por tempo prolongado;

• ter feito reposição hormonal por mais de cinco anos após a menopausa;

• fatores hereditários e genéticos.

Além deles, a mulher que possui alterações genéticas herdadas na família, especialmente nos genes
BRCA1 e BRCA2, tem risco elevado de câncer de mama.

Durante a consulta de enfermagem, o enfermeiro deve investigar possíveis sinais e sintomas que
exigem maior atenção, tais como:

• caroço (nódulo) fixo e geralmente indolor;

• alterações no bico do peito (mamilo);

• pele da mama avermelhada, retraída ou parecida com casca de laranja;

• pequenos nódulos na região embaixo dos braços (axilas) ou no pescoço;

• saída de líquido anormal das mamas.

Quando investigamos na literatura quais ações são realizadas pelo enfermeiro na mulher em
relação ao câncer de mama, encontramos certa carência na atenção básica, sendo citadas a consulta
de enfermagem e o exame clínico das mamas. É preciso que o enfermeiro desenvolva programas de
educação em saúde e outras formas de abordagem, de modo a garantir uma atenção de qualidade às
usuárias dos serviços de saúde.

47
Unidade I

Uma das ações educativas que o enfermeiro deve desenvolver é ensinar a mulher a fazer o autoexame
de mama, que pode auxiliar no diagnóstico precoce da doença.

Figura 24 – Autoexame de mama

Segundo o Ministério da Saúde (INCA, 2016), é recomendado que mulheres de 50 a 69 anos façam
uma mamografia a cada dois anos. A mamografia diagnóstica serve para avaliar uma alteração suspeita
na mama e poderá ser feita em qualquer idade.

A mamografia e o exame clínico das mamas identificam alterações suspeitas, mas a confirmação de
câncer de mama é feita em laboratório, pelo exame histopatológico, que analisa uma pequena parte
retirada da lesão (biópsia).

Figura 25 – A mamografia é indicada no rastreamento do câncer de mama

O acesso à investigação diagnóstica das alterações suspeitas da mama, de modo ágil e com qualidade,
é um direito da mulher. Para aquelas com maior risco de câncer de mama, é recomendado que elas
48
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

conversem com o médico para avaliação do risco e a conduta a ser seguida. Os serviços de saúde devem
priorizar a consulta das mulheres com nódulo ou outras alterações suspeitas da mama. A rapidez da
avaliação facilita a detecção precoce da doença.

Uma ação que vem sendo desenvolvida pelo enfermeiro é o Outubro Rosa. O movimento popular
Outubro Rosa é internacional, começou na década de 1990 para estimular a participação da população
no controle do câncer de mama. Anualmente, no mês de outubro, várias atividades são realizadas com
o objetivo de compartilhar informações sobre o câncer de mama, promover a conscientização sobre
a doença, proporcionar maior acesso aos serviços de diagnóstico e de tratamento e contribuir para a
redução da mortalidade.

Figura 26 – Símbolo do outubro rosa, mês da conscientização do câncer de mama

Cabe ao enfermeiro indicar e fornecer orientações relativas às medidas preventivas e de diagnóstico,


acompanhar a paciente e a família, e manter em mente que as ações de enfermagem devem ser
individualizadas, considerando suas características pessoais e sociais. As orientações na forma impressa
têm sido indicadas, pois esse recurso ajuda a elucidar quaisquer dúvidas da paciente e da sua família em
um momento em que a equipe médica não esteja disponível.

Saiba mais

Para mais informações sobre o câncer de mama, leia a obra a seguir:

BUSHATSKY, M. et al. Câncer de mama: ações de prevenção na estratégia


de saúde da família. Journal of Research: Fundamental Care Online, v. 6, n.
2, p. 663‑675, abr./jun. 2014.

49
Unidade I

Mesmo a gestação sendo vista como um momento de alegria e realização, 25% das mulheres
apresentam algum tipo de complicação no pré‑natal ou puerpério. Estudos revelam que mais de 90%
dos casos de óbito materno ocorrem por causas evitáveis, dentre as quais destacam‑se as infecções,
doenças hipertensivas e hemorragia (BRASIL, 2005a).

O principal objetivo da assistência pré‑natal e puerperal realizada pelo enfermeiro é que a mulher e
a família sejam assistidas desde o início da gravidez e que essa assistência seja garantida até o término
da gestação, garantindo o nascimento de uma criança saudável, assim como conforto e serenidade à
mãe, ao recém‑nascido e a toda família.

Deve ser ofertado e incentivado à mulher a realizar as consultas de pré‑natal e, com elas, o
acompanhamento pelo enfermeiro, que usa a consulta de enfermagem e a Sistematização da Assistência
de Enfermagem para conhecer a gestante, suas fragilidades, dificuldades, dúvidas e amenizar todas as
questões de maneira que ela e a família se sintam confortáveis com essa nova fase. É importante
também que a família se sinta acolhida pelo profissional enfermeiro para tirar dúvidas e amenizar
qualquer anseio que possa ocorrer.

Algumas ações podem ser identificadas durante o acompanhamento familiar, além de outras ações
às quais o enfermeiro poderá atentar com proatividade para que a gestante ou puérpera seja bem
atendida. O Ministério da Saúde publicou o Manual Técnico de Pré‑natal e Puerpério, que auxilia muito
no direcionamento das ações às quais os profissionais de saúde precisam atentar e nas quais atuar.
Algumas delas são:

• captação precoce de gestação na comunidade;

• garantia de atendimento a todas as gestantes que procuram o serviço


de saúde, mínimo de seis consultas de pré‑natal;

• garantia de realização dos exames complementares a todas as


gestantes atendidas;

• escuta ativa da mulher e de seus(suas) acompanhantes, esclarecendo


dúvidas e informando sobre o que vai ser feito durante a consulta e
as condutas a serem adotadas;

• atividades educativas a serem realizadas em grupo ou individualmente,


com linguagem clara e compreensível, proporcionando respostas às
indagações da mulher ou da família e as informações necessárias;

• anamnese e exame clínico‑obstétrico da gestante;

• prevenção e tratamento dos distúrbios nutricionais;

• tratamento das intercorrências da gestação, entre outras (BRASIL, 2005a).


50
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Saiba mais

Para mais informações sobre o tema, consulte a obra a seguir:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.


Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde
da Mulher. Pré‑natal e puerpério: atenção qualificada e humanizada –
manual técnico. Brasília: Ministério da Saúde, 2005a. 163 p.

O enfermeiro deverá se organizar para realizar uma visita domiciliar, preferencialmente na primeira
semana após a alta hospitalar, para que o aleitamento materno seja iniciado o mais precocemente
possível. Ele deve observar como está sendo a pega do recém‑nascido e responder a perguntas quanto
ao aleitamento materno e demais dúvidas que surgirem. Se o recém-nascido (RN) tem classificação de
risco, recomenda‑se que a visita seja realizada nos primeiros três dias após a alta.

Durante a assistência ao pré‑natal, a gestante deve ser incentivada a procurar a Unidade de


Saúde para realização da primeira consulta da mãe e RN; caso a unidade tenha a possibilidade de
pré‑agendamento, o enfermeiro poderá programar com o agente comunitário de saúde a marcação das
consultas para facilitar para a gestante e a família.

É imprescindível conscientizar a gestante e os familiares a procurarem a unidade de saúde para


apoio e consulta assim que possível, pois há relatos na literatura de que um número pequeno e
insuficiente de mulheres consegue receber essa visita no domicílio nos primeiros dias de vida, o que
pode prejudicar no processo de criação de elo mãe‑filho e na amamentação, a qual, para muitas
mulheres, é difícil (BRASIL, 2005a).

Durante a primeira consulta, o enfermeiro deverá realizar exame clínico ginecológico minucioso,
junto com a Sistematização da Assistência de Enfermagem e orientações sobre cuidados gerais com
a mama, a higiene íntima e o RN, além de orientar e sanar as dúvidas sobre amamentação. Caso essa
consulta não seja no domicílio da mulher, deve‑se avaliar a possibilidade de alguém acompanhá‑la para,
assim, participar das orientações e ser fonte de apoio próxima dessa puérpera.

51
Unidade I

Figura 27 – Orientações sobre amamentação pelo enfermeiro

Geralmente, a gestante procura algum sistema de apoio mais velho e interno da família para auxiliar
na manutenção da amamentação, porém, isso pode ter resultados positivos e negativos, dependendo
das crenças e valores. Cabe ao enfermeiro identificá‑los e atuar em acordo com eles.

A participação do companheiro no contexto geral de cuidados com a criança vem crescendo; assim,
podemos dizer que ele também deve ser inserido nesse contexto de orientações e cuidados.

É importante que o enfermeiro se sinta capacitado para praticar as orientações e manejo da


amamentação de maneira que também consiga melhor adesão da mulher às orientações que irá prestar,
sejam elas verbais, folhetos explicativos, entre outras formas, e que saiba identificar a necessidade
individual de cuidado de cada puérpera. É preciso que o enfermeiro saia do paradigma de cuidados
baseados no tecnicismo, como verificação de pressão arterial, avaliação de lóquios e exame físico, e
crie vínculos com a puérpera e a família, propiciando que eles confiem no profissional e expressem
todos os medos e anseios, possibilitando que eles sejam minimizados ou sanados pelo enfermeiro. Nesse
contexto, a humanização do cuidado é essencial para a prática profissional.

Outra demanda importante no cuidado à mulher é o climatério. O que é o climatério? Vamos


entender a diferença de climatério e menopausa.

O climatério é definido pela Organização Mundial da Saúde como uma


fase biológica da vida e não um processo patológico, que compreende a
transição entre o período reprodutivo e o não reprodutivo da vida da
mulher. A menopausa é um marco dessa fase, correspondendo ao último
ciclo menstrual, somente reconhecida depois de passados 12 meses da sua
ocorrência e acontece geralmente em torno dos 48 aos 50 anos de idade
(BRASIL, 2008b).

52
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

O climatério não é considerado uma doença, e sim uma fase natural da vida da mulher, e muitas
passam por ela sem queixas ou necessidade de medicamentos. Outras têm sintomas que variam na sua
diversidade e intensidade. No entanto, em ambos os casos, é fundamental que haja, nessa fase da vida,
um acompanhamento sistemático visando à promoção da saúde, ao diagnóstico precoce, ao tratamento
imediato dos agravos e à prevenção de danos, sendo o enfermeiro também responsável por essas ações,
em conjunto com uma equipe multiprofissional.

Durante as consultas de enfermagem ginecológicas ou de rotina às mulheres, o enfermeiro deve identificar


possíveis sinais e sintomas, e iniciar a orientação sobre o climatério. Pouco se fala dele em instituições de
saúde e pouca é a procura dessas mulheres para orientação com enfermeiros. Geralmente, sua principal
atitude é marcar o ginecologista para avaliação dos sintomas que desconhecem ser do climatério. Porém,
cabe ao enfermeiro identificar na pré‑consulta as mulheres que demandam atenção nesse contexto.

Após a identificação do climatério, alguns temas são sugeridos pelo Ministério da Saúde para serem
abordados com essa clientela. São eles:

• sexualidade;

• alimentação saudável;

• DSTs;

• prevenção de câncer (BRASIL, 2008b).

É importante que o enfermeiro identifique as maiores necessidades da mulher e a encaminhe para


outras opções que não somente medicamentosas, visando à melhor adaptação possível a essa fase do
ciclo vital. Muitas modalidades terapêuticas têm sido utilizadas, aliadas a um estilo de vida saudável no
que diz respeito à alimentação, atividade física, saúde mental e emocional, as quais podem apoiar de
forma satisfatória a mulher durante o climatério.

É de suma importância que a mulher saiba identificar os sinais e sintomas, e a educação em saúde
dentro das unidades de saúde é essencial para esse resultado. Essas práticas devem ser incentivadas pelo
gestor da instituição e incentivadas pelo enfermeiro, de forma que a mulher tenha acesso às informações
de forma clara e que permita-lhe buscar ajuda. Dessa forma, evitamos possíveis desconfortos de
intervenção, promovendo melhor qualidade de vida a essas mulheres durante esse ciclo de vida.

Saiba mais

Sobre o climatério, leia o texto a seguir:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.


Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Manual de atenção à
mulher no climatério/menopausa. Brasília: 2008b. 192 p.

53
Unidade I

Dando continuidade aos cuidados necessários, iniciaremos a discussão de outras demandas


importantes: a saúde do adulto e do idoso. E os problemas que mais necessitam de cuidado e atenção
são as doenças crônicas não transmissíveis.

Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2013c), doenças crônicas são um grupo de condições
crônicas relacionadas às múltiplas causas com início gradual ou assintomático de prognóstico incerto
de longa duração. Podem ter quadro clínico estável ou que muda ao longo do tempo, com períodos de
agudização, podendo gerar alterações funcionais e incapacidade, interferindo diretamente na qualidade
de vida do paciente e família. Necessitam de mudanças no estilo de vida, o que requer conscientização
e entendimento sobre a doença em um processo contínuo de adaptação para essa fase da vida.

A Organização Mundial de Saúde (BRASIL, 2013c) alerta que as doenças crônicas constituem
problema de saúde pública importante, correspondendo a 72% das causas de mortes. Hoje, são
responsáveis por 60% de todo o ônus decorrente de doenças no mundo. Prevê‑se que, no ano 2020, as
doenças crônicas serão responsáveis por 80% da carga de doença dos países em desenvolvimento, como
o Brasil. Essa necessidade se dá pelo perfil epidemiológico que nosso país passa de envelhecimento
acentuado da população. Outros responsáveis por esses números são a obesidade, hipertensão arterial,
diabetes, dislipidemias, câncer e outras comorbidades, além dos determinantes sociais importantes, tais
como diferenças na aquisição dos bens e dos serviços, baixa escolaridade e desigualdade no acesso à
informação, que influenciam diretamente na maior prevalência das doenças crônicas e dos agravos
decorrentes de sua evolução.

Figura 28 – Controle de hipertensão arterial – doença crônica incidente na fase adulta.

Segundo o Ministério da Saúde, a Rede de Atenção às Pessoas com Doenças Crônicas tem por
objetivos gerais:

1. Fomentar a mudança do modelo de atenção à saúde, fortalecendo o


cuidado às pessoas com doenças crônicas.

54
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

2. Garantir o cuidado integral às pessoas com doenças crônicas.

3. Impactar positivamente nos indicadores relacionados às doenças


crônicas.

4. Contribuir para a promoção da saúde da população e prevenir


o desenvolvimento das doenças crônicas e suas complicações
(BRASIL, 2013c).

Diante do contexto anterior, podemos afirmar que a Estratégia da Saúde da Família é o principal
método de organização e expansão da atenção básica de saúde (ABS), e o Programa de Requalificação
das Unidades Básicas de Saúde possibilita a qualificação da infraestrutura da ABS. Entende‑se que a
ação multiprofissional da equipe de saúde que irá atender essa demanda deve ser voltada aos principais
problemas de saúde daquela população e coerente com a atuação em rede, respondendo de forma
efetiva às necessidades encontradas.

O enfermeiro tem papel essencial em ações como orientações sobre a doença, seus sinais e sintomas
e complicações, auxílio na adesão ao tratamento e nas orientações de polifarmácia e no autocuidado,
essencial para o controle da doença. O acolhimento realizado por esse profissional é uma das ações
mais importantes no início do diagnóstico das doenças crônicas. É preciso que o enfermeiro tenha
conhecimento sobre todo o contexto que essas doenças envolvem para poder ser o elo de confiança e
de cuidado ativo com os pacientes.

A acolhida é um modo de operar os processos de trabalho em saúde de forma a atender a todos


que procuram os serviços médicos, ouvindo seus pedidos e assumindo uma postura capaz de acolher,
escutar e dar respostas adequadas aos usuários. É preciso que o enfermeiro exercite a escuta com
responsabilização e resolutividade, e oriente o usuário e a família para a continuidade da assistência por
meio de referência e contrarreferência efetivos.

Como enfermeiros com foco na família, precisamos entender e atuar com a atenção colaborativa e
centrada na pessoa e na família, transformando a relação entre os usuários e os profissionais de saúde.
É essencial a participação e colaboração de todos nas decisões, implementação e monitoramento do
paciente com a família.

Observação

A atenção centrada na pessoa e na família baseia‑se em dignidade e


respeito, bem como no compartilhamento de informações completas entre
os envolvidos (usuário, família e profissionais).

O resultado dessa tríade (paciente, família e profissionais) resulta em melhor adesão ao tratamento,
controle da doença e consequente melhoria na qualidade de vida de ambos.

55
Unidade I

Dentre as ações comuns à equipe multiprofissional com participação efetiva e direta do


enfermeiro, temos:

• promoção da saúde (ações educativas com ênfase em mudanças do estilo de vida, correção dos
fatores de risco e divulgação de material educativo);

• capacitação de profissionais;

• encaminhamento a outros profissionais, quando indicado;

• ações assistenciais individuais e em grupo;

• gerenciamento do programa conforme orientações do Ministério da Saúde.

Saiba mais

Consulte:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.


Departamento de Atenção Básica. Diretrizes para o cuidado das pessoas
com doenças crônicas nas redes de atenção à saúde e nas linhas de cuidado
prioritárias. Brasília, 2013c. 28 p.

Como educadores em saúde que somos, devemos pensar em ações direcionadas às mudanças de hábito
para a prevenção da doença e de agravos que podem piorar a situação clínica do paciente e causar perda da
autonomia e dependência funcional, impactando diretamente na qualidade de vida dele e de sua família.

Um exemplo é auxiliar o paciente no controle do peso, responsável, hoje, por até 30% dos casos de
hipertensão arterial. O ideal seria um índice de massa corporal (IMC) inferior a 25 kg/m2 e circunferência
da cintura inferior a 102 cm para homens e 88 cm para mulheres, porém, a diminuição de 5% a 10% do
peso corporal inicial já é capaz de produzir redução da pressão arterial.

Figura 29 – Incentivar hábitos saudáveis

56
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

A adoção de hábitos alimentares saudáveis é essencial para a meta descrita anteriormente. Para isso,
não podemos esquecer aquilo que é privativo do enfermeiro, e, nesse contexto, precisamos trabalhar
com a equipe multiprofissional. Falaremos a seguir sobre o Nasf (Núcleo de Apoio de Saúde da Família),
que dispõe de nutricionista de apoio às ações voltadas aos pacientes na atenção básica.

A dieta desempenha um papel importante no controle das doenças crônicas. Um regime orientado à
redução de sódio, à base de frutas, verduras e legumes, cereais integrais, leguminosas, leite e derivados
desnatados, quantidade reduzida de gorduras saturadas, trans e colesterol, demonstra ser capaz de
reduzir a pressão arterial e comorbidades associadas e impactantes nas outras doenças crônicas como
a diabetes mellitus.

A orientação referente à redução da ingestão de bebida alcoólica e abandono do tabagismo também


é importante, pois estudos relatam o aumento da pressão arterial e da diabetes mellitus sob o uso
contínuo de ambas as substâncias. Nesse contexto também é preciso intervir de forma a identificar o
uso e atuar com a equipe multidisciplinar, visando à melhor forma de abordagem e intervenção para
que essas ações não sejam temporárias, e sim uma real mudança do hábito de vida. O enfermeiro
é essencial no processo de conscientização para a adesão a essas mudanças, servindo de apoio ao
paciente e a família.

A inatividade física é um dos fatores de risco mais importantes para as doenças crônicas, associada
à dieta inadequada e ao uso do fumo. É bastante prevalente o sedentarismo entre os adultos e idosos.

É importante que o enfermeiro conheça os benefícios da atividade física para incentivar os


pacientes a aderir a essa prática. Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2013c), são vantagens da
prática de exercícios:

• melhor funcionamento corporal, diminuindo as perdas funcionais,


favorecendo a preservação da independência;

• redução no risco de morte por doenças cardiovasculares;

• melhora do controle da pressão arterial;

• manutenção da densidade mineral óssea, com ossos e articulações


mais saudáveis;

• melhora da postura e do equilíbrio;

• melhor controle do peso corporal;

• melhora do perfil lipídico e glicemia.

As orientações tratam de uma vida mais ativa e englobam a realização de caminhadas, subir e descer
escadas, e atividades em geral que durem de preferência 30 minutos, cinco dias por semana.
57
Unidade I

Algumas dicas são importantes ao profissional de saúde, para que alcance melhores resultados com
o paciente e a família:

• estabelecer metas e prazos de controle;

• estimular à corresponsabilidade ou empoderamento do paciente e família no processo


saúde‑doença;

• orientar sobre as mudanças do estilo de vida e esquema medicamentoso;

• prevenir quanto a apresentação assintomática de algumas doenças crônicas e às consequências


de não tratá‑las;

• enfatizar os benefícios e efeitos da medicação e a importância do acompanhamento.

Saiba mais

Para saber mais sobre o tema, leia o texto indicado a seguir:

MATURATO, S.; MANSO, B. T. S. O trabalho clínico da enfermeira: para


além das doenças crônicas. Journal of Research: Fundamental Care Online,
v. 7, n. 4, p. 3.430‑3.437, out./dez, 2015.

Com relação aos homens, a proposição da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem
visa qualificar a saúde da população masculina na perspectiva de linhas de cuidado que resguardem a
integralidade da atenção.

Figura 30 – Saúde do homem

58
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Estudos comparativos entre homens e mulheres têm comprovado o fato de que os homens são mais
vulneráveis às doenças, sobretudo às enfermidades graves e crônicas, e que morrem mais precocemente
do que as mulheres (BRASIL, 2013c).

Muitos agravos poderiam ser evitados caso os homens realizassem, com regularidade, as medidas de
prevenção primária, porém, em sua maioria, são resistentes na atenção à saúde. Eles alegam que, como
provedores da família, precisam trabalhar e não têm tempo de cuidar da saúde.

Os homens têm dificuldade em reconhecer suas necessidades, rejeitando a possibilidade de adoecer.


Além disso, os serviços e as estratégias de comunicação privilegiam as ações de saúde para a criança, o
adolescente, a mulher e o idoso.

A violência é uma das demandas de saúde mais comum no público masculino, principalmente os
jovens e adolescentes. É um fenômeno difuso, complexo, multicausal, com raízes em fatores sociais,
culturais, políticos, econômicos e psicobiológicos, que envolve práticas em diferentes níveis.

As causas externas constituem um grande problema de saúde pública com forte impacto na
mortalidade e morbidade da população. Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2008c), os óbitos por
causas externas constituem a primeira causa de mortalidade no grupo populacional dos 25 aos 59 anos.

Nesse contexto, o enfermeiro precisa estar atento aos problemas sociais e à questão multicausal que
envolve essa exigência. É preciso atuar de forma que haja abertura do paciente para tal avaliação com
a equipe multidisciplinar.

O câncer de próstata é uma questão importante, pois é permeada de uma evolução lenta e possível
de cura se diagnosticado precocemente, porém, com o perfil do homem em não buscar serviços de
saúde, esse tipo de patologia pode levar à morte. Na população masculina, é o segundo tipo de tumor
mais incidente, ficando atrás somente do câncer de pele.

Os principais fatores de risco aos quais o enfermeiro deve estar atento na avaliação desse paciente
são: idade (maior incidência após os 50 anos), alimentação (pobre em frutas e hortaliças e rica em
gorduras e carne vermelha), história familiar (pai ou irmão com caso de câncer antes dos 60 anos),
consumo excessivo de álcool, tabagismo e vasectomia, que também estão relacionados a fatores de
risco para o câncer de próstata.

59
Unidade I

Figura 31 – Câncer de próstata

O toque retal e a dosagem de PSA são as formas de rastreio da doença sugeridos pelo Ministério da Saúde.
O diagnóstico do câncer da próstata é feito pelo estudo histopatológico do tecido obtido pela biópsia da
próstata, que deve ser considerada sempre que houver anormalidades no toque retal ou na dosagem do PSA.

Muitos homens não apresentam sinais e sintomas da doença, e, quando eles aparecem, são similares
aos de hiperplasia da próstata. Sendo assim, é essencial realizar o diagnóstico diferencial por meio dos
exames de rastreamento e complementares.

Inicialmente, os sintomas do câncer de próstata podem ser dificuldade de urinar, necessidade de


urinar mais vezes durante o dia ou à noite; em situação tardia, pode provocar dor óssea, sintomas
urinários ou, quando mais grave, infecção generalizada ou insuficiência renal.

Partindo‑se do preceito ético de que o conjunto das estratégias de detecção precoce e tratamento
de um câncer deva resultar em mais benefícios do que danos, tanto na perspectiva do indivíduo quanto
na da população, o Inca (BRASIL, 2002) recomenda:

• sensibilizar a população masculina para a adoção de hábitos saudáveis de


vida (dieta rica em fibras e frutas e pobre em gordura animal, atividade
física e controle do peso) como uma ação de prevenção do câncer;

• indicar o rastreamento oportunístico, ou seja, a sensibilização de


homens com idade entre 50 e 70 anos que procuram os serviços
de saúde por motivos outros que o câncer da próstata sobre a
possibilidade de detecção precoce de câncer de próstata;

• sensibilizar os profissionais de quanto a novos avanços nos campos


da prevenção, detecção precoce, diagnóstico, tratamento e cuidados
paliativos no câncer da próstata;

60
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• estabelecer parcerias com instituições universitárias visando ao


melhor conhecimento de temas relacionados à prevenção, detecção
precoce, tratamento e cuidados paliativos no câncer da próstata e sua
inclusão no currículo das escolas biomédicas.

Cabe ao enfermeiro incentivar o rastreamento do câncer de próstata com os homens do seu território,
seja por meio de campanhas educativas de conscientização, por acolhimento daqueles que vão ao serviço
de saúde por outro motivo ou por meio de visitas domiciliares. A avaliação pode ser feita através da
consulta de enfermagem, levando em consideração os fatores de risco para esse tipo de tumor, sinais e
sintomas e outras queixas. Cabe ao enfermeiro achar meios de atingir homens para que eles cuidem de sua
saúde e se conscientizem da importância do diagnóstico precoce, evitando mutilações e morte.

Saiba mais

Para saber mais sobre o câncer de próstata, leia o texto a seguir:

PEREIRA, E. P.; SALVADOR, M. C. M.; HARTER, R. G. Conhecimentos,


atitudes e práticas acerca da detecção do câncer de próstata. Acta Paulista
de Enfermagem, v. 23, n. 1, p. 88‑93, 2010.

1.5.4 Envelhecimento

O mundo vem sofrendo uma transição demográfica constante, em que o número de idosos tende a
ser cada vez maior, isso porque, hoje, os idosos têm maior acesso e melhores cuidados de saúde.

O envelhecimento é um processo dinâmico, progressivo e irreversível, ligado intimamente a fatores


biológicos, psíquicos e sociais. Pode ser compreendido como um processo natural, de diminuição progressiva
da reserva funcional dos indivíduos – senescência –, o que, em condições normais, não costuma provocar
qualquer problema. No entanto, em condições de sobrecarga, como, por exemplo, doenças, acidentes e
estresse emocional, pode ocasionar uma condição patológica que requeira assistência.

Figura 32 – Saúde do idoso

61
Unidade I

Como enfermeiros, precisamos desmistificar a questão de que tudo que acontece com o idoso
é devido ao envelhecimento. É necessário identificar e tratar esses problemas da forma mais rápida
possível, visando manter a sua autonomia e qualidade de vida.

O Ministério da Saúde disponibilizou a Caderneta de Saúde da Pessoa Idosa, que é um instrumento


valioso que auxilia na identificação das pessoas idosas frágeis ou em risco de fragilização. Para os
profissionais de saúde, ela possibilita o planejamento, a organização das ações e um melhor
acompanhamento do estado de saúde dessa população.

Mais uma vez, o acolhimento é papel essencial do enfermeiro com o idoso e sua família. Para isso, é
importante que alguns quesitos sejam levados em conta e valorizados:

• estar preparado para lidar com o envelhecimento;

• reconhecer a necessidade da interdisciplinaridade no cuidado do idoso;

• facilitar o acesso do idoso nas diversas áreas de atenção à saúde;

• investir na qualificação dos profissionais que atendem a essa demanda;

• estabelecer uma relação respeitosa;

• entender que o idoso é capaz de compreender as perguntas que lhe são feitas ou as orientações
que lhe são fornecidas, nunca se dirigindo primeiramente a seu acompanhante;

• chamar o idoso pelo nome e manter o contato visual;

• utilizar linguagem clara e evitar termos técnicos.

As principais exigências dessa população são: doenças crônicas e suas comorbidades, depressão,
quedas, vacinação, incontinência urinária, sexualidade e alimentação. Muitos desses contextos já foram
comentados neste livro‑texto e devem ser direcionados aos idosos também, como na situação de DSTs,
doenças crônicas e mudanças de hábito.

É preciso que o enfermeiro conheça o perfil epidemiológico da sua população de idosos para
posteriormente traçar metas para ações mais efetivas de acordo com as reais necessidades. Além das
visitas domiciliares, é necessário que o profissional agende consultas/atendimentos específicos para
idosos em sua agenda de atendimentos. Essa população tem necessidade dessa programação para expor
suas necessidades e atendimento sistematizado e individualizado.

Estimular a independência, a autonomia e o autocuidado são ações essenciais que devem ser
estimuladas pelo enfermeiro. Identificar possíveis problemas que podem alterar essa dinâmica é essencial,
visando prevenir e/ou minimizar agravos e promover melhor qualidade de vida ao paciente e à família.

62
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

2 POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO BÁSICA

No Sistema Único de Saúde (SUS), por um lado, podemos, apontar avanços na descentralização e na
regionalização da atenção e da gestão da saúde, com ampliação dos níveis de universalidade, equidade,
integralidade e controle social; por outro, a fragmentação e a verticalização dos processos de trabalho
esgarçam as relações entre os diferentes profissionais da saúde e entre estes e os usuários.

Lançada em 2003, a Política Nacional de Humanização (PNH) busca produzir mudanças nos modos
de gerir e cuidar. Como política, a humanização deve traduzir princípios e modos de operar no conjunto
das relações entre profissionais e usuários, entre especialistas de outras áreas, as diversas unidades
e serviços de saúde e entre as instâncias que constituem o SUS. Humanizar se traduz, então, como
inclusão das diferenças nos processos de gestão e de cuidado.

O baixo investimento na qualificação dos trabalhadores, especialmente no que se refere à gestão


participativa e ao trabalho em equipe, diminui a possibilidade de um processo crítico e comprometido
com as práticas de saúde e com os usuários em suas diferentes necessidades.

Figura 33 – Interdisciplinaridade é uma das metas da Política Nacional de Humanização

O Ministério da Saúde propõe alguns princípios norteadores da Política de Humanização, são eles:

1. Valorização da dimensão subjetiva e social em todas as práticas de atenção


e gestão, fortalecendo/estimulando processos integradores e promotores de
compromissos/responsabilização.

2. Estímulo a processos comprometidos com a produção de saúde e com a


produção de sujeitos.

3. Fortalecimento de trabalho em equipe multiprofissional, estimulando a


transdisciplinaridade e a grupalidade.

63
Unidade I

4. Atuação em rede com alta conectividade, de modo cooperativo e solidário,


em conformidade com as diretrizes do SUS.

5. Utilização da informação, da comunicação, da educação permanente


e dos espaços da gestão na construção de autonomia e protagonismo de
sujeitos e coletivos (BRASIL, 2004).

E ainda indica quais serão as prioridades na PNH:

1. Serão reduzidas as filas e o tempo de espera, com ampliação do acesso e


atendimento acolhedor e resolutivo baseados em critérios de risco.

2. Todo usuário do SUS saberá quem são os profissionais que cuidam de


sua saúde, e os serviços de saúde se responsabilizarão por sua referência
territorial.

3. As unidades de saúde garantirão as informações ao usuário, o


acompanhamento de pessoas de sua rede social (de livre escolha) e os
direitos do código dos usuários do SUS.

4. As unidades de saúde garantirão gestão participativa aos seus


trabalhadores e usuários, assim como educação permanente aos
trabalhadores (BRASIL, 2004).

Cabe ao enfermeiro, gestor de unidade, conhecer essa política e planejar ações com os gestores
municipais, profissionais e usuários, visando à humanização e efetivação do cuidado.

Várias estratégias são sugeridas nesta política, entre elas as de ação na atenção básica em que o
enfermeiro é fundamental:

• elaborar projetos de saúde individuais e coletivos para usuários e sua rede social, considerando as
políticas intersetoriais e as necessidades de saúde;

• incentivar práticas promocionais de saúde;

• estabelecer formas de acolhimento e inclusão do usuário que promovam a otimização dos serviços,
o fim das filas, a hierarquização de riscos e o acesso aos demais níveis do sistema;

• comprometer‑se com o trabalho em equipe, de modo a aumentar o grau de corresponsabilidade,


e com a rede de apoio profissional, visando maior eficácia na atenção em saúde.

64
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Observação

Humanizar requer estratégias que são construídas entre os trabalhadores,


usuários e gestores do serviço de saúde.

Integrar os trabalhadores na gestão é fundamental para que eles, no dia a dia, reinventem seus
processos de trabalho e sejam agentes ativos das mudanças no serviço de saúde. Incluir usuários e suas
redes sociofamiliares nos processos de cuidado é um poderoso recurso.

Naquilo que a PNH acredita ser uma diretriz, o acolhimento é uma das ações voltadas para a busca
da humanização. O profissional de saúde, incluindo o enfermeiro, deve acolher, isto é, entender que cada
indivíduo é único e tem necessidades específicas. Por meio do acolhida, o profissional deve sustentar a
relação entre a equipe, serviços e usuários.

O acolhimento deve ser o elo para a construção da relação de confiança, a qual necessita ser feita de
forma coletiva e contínua, criando um compromisso de vínculo entre as equipes, serviços, trabalhadores
e usuário. A consulta de enfermagem favorece esse tipo de ação por meio de escuta ativa e sistematizada,
atendendo o indivíduo como um ser único, conhecendo suas necessidades para melhor intervenção,
bem como de sua família, de acordo com o grau de vulnerabilidade e risco.

A família entra no processo de cogestão da PNH, que nada mais é do que inserir outras pessoas
(usuários ou profissionais) nas tomadas de decisão, de modo a produzir movimentos de desestabilização
que favoreçam mudanças nas práticas de gestão e de atenção.

Outra proposta da PNH é a ambiência, que diz respeito a proporcionar um ambiente receptivo e
confortável, que permita a privacidade do paciente, sem, contudo, privá-lo de encontrar com outras
pessoas. Um exemplo prático de ambiência seria uma brinquedoteca.

Figura 34 – Brinquedoteca, modelo de ambiência

65
Unidade I

A clínica ampliada e compartilhada também faz parte da PNH, que busca a singularidade do paciente,
sem foco exclusivo na doença. Trata‑se da prática interdisciplinar, fazendo conexões e parcerias com outros
modos de fazer saúde em busca das soluções possíveis para às necessidades do usuário. Isso inclui outros
profissionais, tratamentos e até locais onde eles ocorrem. São necessários arranjos e dispositivos de gestão
que privilegiem uma comunicação transversal na equipe e entre equipes (nas organizações e rede assistencial).

O Ministério da Saúde sugere algumas práticas para profissionais de saúde que visam atuar com a
clínica ampliada e compartilhada (BRASIL, 2009b):

a) A escuta: em primeiro momento acolher toda queixa e relato do paciente,


sem colocar como prioridade sua doença ou tratamento. É preciso ajudá‑lo
a reconstruir e respeitar os motivos que ocasionaram o seu adoecimento e as
correlações que o usuário estabelece entre o que sente e a vida. Pode ser que
não seja possível realizar este tipo de escuta com todos os pacientes, porém,
temos a capacidade de classificar aqueles que precisam de prioridade.

b) Vínculos e afeto: a equipe de referência é muito importante, porque a


relação de cada membro da equipe com o usuário e familiares é singular,
permitindo que as possibilidades de ajudar o sujeito doente se multipliquem.
É preciso que a própria equipe se atente para não criar um mal‑estar com o
paciente por algum problema pessoal seu.

c) Diálogo e informação: se queremos tornar o usuário autor da sua própria


saúde, não devemos iniciar o diálogo com perguntas imperativas do tipo:
Tomou o remédio? Comeu? Ou de forma a infantilizá‑lo, perguntando
se comportou‑se? Devemos estar atentos também ao tipo de linguagem
que deve ser utilizada, não usar termos técnicos. É importante também
questionar o que o paciente entendeu do que foi dito pela equipe, pois isso
faz todo sentido para adesão ao tratamento ou prática necessária. Auxiliar
o indivíduo a lidar com a nova fase de saúde e se adaptar é essencial,
lembrando que cada indivíduo se adapta de um jeito.

A equipe na atenção básica tem mais chance de conhecer a família, a situação afetiva, as dificuldades,
o sistema de apoio, as consequências e o significado do adoecimento de um deles. Assim, mais uma vez,
mostramos o quanto a família é um sistema e que a intervenção deve ser conjunta.

Saiba mais

Leia:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política


Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS. Clínica ampliada e
compartilhada. Brasília: Ministério da Saúde, 2009b.

66
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

A valorização do trabalhador também é uma meta da PNH. Acredita‑se que, com a sua experiência
diária, ele seja capaz de auxiliar nas tomadas de decisão com o usuário e a família.

Informar o indivíduo e familiares sobre seus os direitos também faz parte das práticas da PNH. O
paciente tem direito de saber sobre sua saúde, tratamento e necessidades, a fim de, como já falamos, ser
coautor do cuidado à sua própria saúde.

Para auxiliar na difusão dos propósitos da PNH, foi criado um portal colaborativo, o Humaniza
SUS. Esse portal produz e difunde informações de humanização em saúde para gestores e profissionais
envolvidos nessa política, visando à troca de experiências voltadas para o cuidado humanizado.

A PNH investe em diversos materiais de formação, como cartilhas, documento base e outras
publicações disponíveis on‑line no portal do Ministério da Saúde.

Observação

Segundo o Ministério da Saúde, humanizar é construir relações que


firmem os valores que orientam as políticas públicas de saúde.

3 ESTRATÉGIA DE SAÚDE DA FAMÍLIA (ESF)

No decorrer dos anos, o governo federal vem buscando adequar o SUS à sua realidade
sociodemográfica e de saúde. Muitas são as mudanças no perfil epidemiológico da população e
medidas precisaram ser tomadas para um melhor atendimento.

Na reunião da Comissão Intergestores Tripartite, realizada em setembro de 2011, o Ministério da


Saúde pactuou o lançamento da Portaria MS/GM nº 2.488, de 21 de outubro de 2011, que revisou
as diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica para a ESF e o Programa de Agentes
Comunitários de Saúde (Pacs).

A ESF segue a linha do que discutimos até agora sobre o cuidado com o indivíduo e a família.
Traz a questão do atendimento em equipe, o acolhimento, a escuta, promovendo a saúde e
minimizando agravos.

São estratégias centrais da ESF:

• participar do processo de territorialização;

• identificar situações de risco e vulnerabilidade, realizando busca ativa e notificando doenças e


agravos de notificação compulsória;

• cadastrar famílias e indivíduos, garantindo a qualidade dos dados coletados e a fidedignidade do


diagnóstico de saúde do grupo populacional da área adstrita;
67
Unidade I

• realizar reuniões sistemáticas interdisciplinares, organizadas de forma compartilhada, para


planejamento e avaliação das ações;

• incentivar a autonomia do cuidado ao usuário e sua família;

• atividades educativas que interfiram no processo saúde‑doença;

• incentivo à participação da comunidade no processo saúde e doença da sua região.

Alguns quesitos são essenciais para o funcionamento da ESF:

• Existência de equipe multiprofissional: médico generalista ou da


família, enfermeiro generalista ou especialista em saúde da família,
auxiliar ou técnico de enfermagem, cirurgião dentista, auxiliar e/ou
técnico em saúde bucal.

• Cada equipe pode ter até 12 ACS, sendo que cada um deles poderá
atender até 750 pessoas.

• Cada equipe de ESF poderá ser responsável por até 4 mil pessoas,
sendo recomendado 3 mil pessoas. Deve‑se respeitar o grau de
vulnerabilidade da comunidade. Quanto mais vulnerabilidade e
risco a população tiver, menor deverá ser o número de pessoas
por equipe.

• Os profissionais da ESF deverão trabalhar em 40 h em uma única


unidade, com exceção do médico, que poderá atuar em até duas
equipes. Os profissionais podem trabalhar 32 h e dedicar 8 h aos
serviços de emergência do município caso isso esteja em contrato e
seja solicitado pelos gestores públicos (BRASIL, [s.d.]).

Quem são os profissionais que atuam na ESF:

• Enfermeiro: atende a saúde dos indivíduos da ESF e suas famílias cadastradas, realiza a consulta
de enfermagem, procedimentos em geral, como a coleta do exame de Papanicolau (diagnóstico
precoce do câncer de colo de útero), realiza atividades em grupo (gestantes, idosos, tabagistas etc.),
elabora rotina e protocolos de atendimento que envolvem a equipe de enfermagem, solicita exames e
prescreve medicamentos conforme legislação vigente do conselho de classe (Coren, Cofen), gerencia
insumos e relatórios referentes à ESF no município, realiza o gerenciamento da equipe e a educação
permanente de seus membros, em especial do técnico de enfermagem e agente comunitário de
saúde. Exerce papel fundamental no acolhimento e escuta dos pacientes atendidos.

• Médico: atua com o enfermeiro na educação permanente da equipe. É um profissional que se


ocupa da saúde humana, promovendo a saúde, prevenindo, diagnosticando e tratando doenças
68
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

com competência e resolutividade, responsabilizando‑se pelo acompanhamento do plano


terapêutico do usuário, seja na unidade de saúde ou no domicílio.

• Agente Comunitário De Saúde (ACS): responsável pelo elo entre a comunidade e a equipe,
levando informações da sua comunidade para o planejamento e execução de ações direcionadas
às necessidades prioritárias. Um pré‑requisito para ser ACS é residir na região, para que conheça
a realidade da população e do território. Cabe a esses profissionais cadastrar todas as pessoas
do território, mantê‑las atualizadas e orientar as famílias quanto à utilização dos serviços de
saúde disponíveis. Deve acompanhá‑las por meio de visitas domiciliares e ações educativas
individuais e coletivas. Necessita manter uma visita/família/mês e, se a família demonstrar alguma
vulnerabilidade ou risco, essa proporção de visitas deve ser maior. Sua cobertura de atuação deve
abranger no máximo 750 pessoas e uma equipe de ESF pode ter no máximo 12 ACSs.

• Técnico de Enfermagem: este profissional, sob a supervisão do enfermeiro, deve realizar


procedimentos regulamentados no exercício de sua profissão tanto na unidade de saúde quanto
em domicílio e outros espaços da comunidade, educação em saúde e educação permanente.

• Cirurgião Dentista: deve definir o perfil epidemiológico da população para o planejamento e a


programação em saúde bucal, a fim de oferecer atenção individual e coletiva voltadas à promoção
da saúde e à prevenção de doenças bucais.

• Auxiliar e técnico em saúde bucal: sobre a supervisão do cirurgião‑dentista, realiza o acolhimento


do paciente nos serviços de saúde bucal, a manutenção e a conservação dos equipamentos
odontológicos, a remoção do biofilme e as fotografias e tomadas de uso odontológicos, a limpeza
e a antissepsia do campo operatório, antes e após atos cirúrgicos, e as medidas de biossegurança
de produtos e resíduos odontológicos.

Observação

Perceba que todos esses profissionais devem ter o compromisso com


o acesso, o vínculo entre usuários e profissionais, e a continuidade e a
longitudinalidade do cuidado, trabalho que só é possível com muito diálogo.

Avaliando o perfil epidemiológico da população atual, muitos agravos vêm sendo considerados
problemas de saúde pública e demandam um olhar multifacetado, necessitando de outros profissionais
para atender à exigência diversa que vem ocorrendo. Seria um apoio às equipes de ESF que já atuam
com o objetivo de atendimento multi e interdisciplinar. Para suprir essa necessidade populacional, foi
criado o Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf), composto por profissionais de diferentes áreas
de atuação, de maneira integrada à ESF, possibilitando práticas de uma vida mais saudável e ativa.

O Ministério da Saúde criou os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf), mediante a Portaria
GM nº 154, de 24 de janeiro de 2008, republicada em 4 de março de 2008. O principal objetivo foi o de
apoiar a inserção da Estratégia de Saúde da Família na rede de serviços, além de ampliar a abrangência
69
Unidade I

e o escopo das ações da atenção básica, e aumentar a sua resolutividade, reforçando os processos de
territorialização e regionalização em saúde.

A composição do Nasf deve ser definida pelos próprios gestores municipais e as equipes de SF
mediante critérios de prioridades identificados a partir das necessidades locais e da disponibilidade de
profissionais de cada uma das diferentes ocupações.

É importante entender que o Nasf não é uma porta de entrada para o usuário, mas uma ponte de
apoio à ESF e seus usuários. Os usuários devem ser encaminhados pela equipe de ESF.

O Nasf deve atuar dentro de algumas diretrizes relativas à atenção primária a saúde:

• ação interdisciplinar e intersetorial;

• educação permanente em saúde dos profissionais e da população;

• desenvolvimento da noção de território;

• integralidade, participação social, educação popular;

• promoção da saúde e humanização.

O Nasf é composto de nove áreas estratégicas, que representam os diversos capítulos da presente
publicação:

• saúde da criança/do adolescente e do jovem;

• saúde mental/reabilitação/saúde integral da pessoa idosa;

• alimentação e nutrição;

• serviço social;

• saúde da mulher;

• assistência farmacêutica;

• atividade física/práticas corporais;

• práticas integrativas e complementares.

70
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Segundo a Portaria 154, existem duas modalidades de Nasf:

• O Nasf 1, composto por no mínimo cinco profissionais com


formação universitária, entre os seguintes: psicólogo, assistente
social, farmacêutico, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, ginecologista,
profissional da educação física, homeopata, nutricionista,
acupunturista, pediatra, psiquiatra e terapeuta ocupacional.

• Cada um desses Nasf deve estar vinculado a um mínimo de oito e


máximo de 20 equipes de SF, exceto nos estados da região Norte,
onde o número mínimo passa a ser cinco.

• O Nasf 2 deverá ter no mínimo três profissionais, entre os


seguintes: psicólogo, assistente social, farmacêutico, fisioterapeuta,
fonoaudiólogo, profissional da educação física, nutricionista e
terapeuta ocupacional; e se vincular a no mínimo três equipes de SF
(BRASIL, 2008d).

A ESF e o Nasf devem priorizar (BRASIL, 2010a):

• atendimento compartilhado: com intervenção interdisciplinar, divisão


de responsabilidades e saberes;

• intervenções específicas dos profissionais do NASF junto ao usuário/


família e equipe de ESF;

• ações comuns nos territórios: apoio a consultas, grupos, trabalhos


educativos e inclusão social etc.

O Nasf compartilha tais desafios da ESF e deve contribuir para o aumento da resolutividade e a
efetivação da coordenação integrada do cuidar na atenção básica. Assim, apoio e compartilhamento de
responsabilidades são aspectos centrais da missão dos Nasf.

Saiba mais

Para saber mais sobre esse assunto, leia o texto a seguir:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.


Departamento de Atenção Básica. Diretrizes do NASF: núcleo de apoio a
saúde da família. Brasília: Ministério da Saúde, 2010a.

71
Unidade I

3.1 Outras equipes de atuação da atenção básica

3.1.1 Equipes de atenção básica a populações específicas

A população de rua é uma das demandas de atenção. Essa população, assim como qualquer outra,
é de responsabilidade dos serviços de saúde e dos profissionais que nela atuam. É preciso ampliar o
atendimento a ela, e esse é um dos papéis dos profissionais de saúde da atenção básica.

Figura 35 – Moradores de rua que demandam atenção à saúde

O consultório convencional não é algo que poderia dar certo para moradores de rua. A equipe
que atende esse grupo precisa ser itinerante, sempre articulando ações com as unidades de saúde do
território que demandarem atenção (Caps, redes de urgência e emergência, ESF).

As equipes dos consultórios na rua deverão cumprir a carga horária mínima semanal de 30 horas.
O seu horário de funcionamento deverá ser adequado às demandas das pessoas em situação de rua,
podendo ser diurno ou noturno. Essas equipes podem estar vinculadas ao Nasf.

Segundo o Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde, para o cálculo do teto das
equipes dos consultórios na rua de cada município, são tomados como base os dados dos censos
populacionais relacionados à população em situação de rua realizados por órgãos oficiais e reconhecidos
pelo Ministério da Saúde (BRASIL, [s.d.]).

Se a equipe precisar de locomoção, o gestor poderá acrescer o custo da unidade móvel no incentivo
financeiro mensal. Caso isso ocorra, será necessário disponibilizar um veículo que comporte toda equipe,
equipamentos, materiais e insumos indispensáveis para a realização do atendimento e a ainda permitir
que algumas atividades sejam realizadas no seu interior.
72
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

A população ribeirinha da Amazônia Legal e Pantanal Sul Mato‑Grossense é atendida pela


atenção básica e apresenta várias demandas de atenção à saúde.

Figura 36 – População ribeirinha

Para esses indivíduos, pode‑se optar por um dos dois arranjos disponíveis para eles:

1. Equipes de Saúde da Família Ribeirinhas (eSFR): desempenham a maior parte de suas funções em
unidades básicas de saúde construídas/localizadas nas comunidades pertencentes à área adscrita e cujo
acesso se dá por meio fluvial.

2. Equipes de Saúde da Família Fluviais (eSFF): desempenham suas funções em unidades básicas de
saúde fluviais (UBSF).

Sua composição básica deve conter um médico (generalista ou especialista em saúde da família),
um enfermeiro (generalista ou especialista em saúde da família), um auxiliar ou técnico de enfermagem
e seis a 12 ACSs. Em regiões endêmicas, é preciso presença de um microscopista, um técnico de
laboratório e um bioquímico. Pode‑se incluir também na composição básica o cirurgião dentista e um
técnico‑auxiliar de saúde bucal.

O ACS deve trabalhar 40 horas semanais e também residir na área de atuação, assim como os
auxiliares e técnicos de enfermagem. O restante da equipe deverá prestar atendimento à população no
mínimo 14 dias da semana durante 8 horas por dia e dois dias para atividades de educação permanente,
planejamento e avaliação das ações e registro de produção.

As unidades básicas de saúde fluviais (UBSF) devem:

• funcionar, no mínimo, 20 dias/mês, com pelo menos uma equipe de saúde da família fluvial;

• nas situações em que não forem possíveis os 20 dias no mês, deve‑se fazer uma justificativa ao
governo federal e propor o que for possível;
73
Unidade I

• planejar circuito de deslocamento que garanta o atendimento a todas as comunidades assistidas,


ao menos até 60 dias, para assegurar a execução das ações de atenção básica pelas equipes, como,
por exemplo, o pré‑natal;

• delimitar área de atuação;

Devido à grande dispersão populacional, os municípios poderão solicitar ampliação da composição


mínima das equipes de saúde da família fluviais e equipes de saúde da família ribeirinhas, podendo ser:

• ACS: até 12 agentes para 100 pessoas cada;

• auxiliar ou técnico de enfermagem: até quatro profissionais para cada 500 pessoas;

• técnico bucal: até um técnico para 500 pessoas;

• enfermeiros: até dois enfermeiros para no mínimo 1.000 pessoas.

As unidades básicas de saúde fluviais e as equipes de saúde da família ribeirinhas poderão prestar
serviços a populações de mais de um município.

Outra demanda de grande importância na atenção básica é o Programa Saúde na Escola (PSE). Ele
foi instituído pelo Decreto Presidencial nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007, e surgiu como uma política
intersetorial entre os Ministérios da Saúde e da Educação, com o objetivo de proporcionar atenção
integral (promoção, prevenção, diagnóstico e recuperação da saúde e formação) à saúde de crianças,
adolescentes e jovens do ensino público básico, no âmbito das escolas e unidades básicas de saúde,
realizada pelas equipes de saúde da atenção básica e educação de forma integrada.

São ações do PSE:

• avaliação clínica e psicossocial que objetivam identificar necessidades de saúde;

• promoção e prevenção que articulem práticas de formação, educativas e de saúde, visando à


promoção da alimentação saudável, de condutas corporais e atividades físicas nas escolas, à
educação para a saúde sexual e reprodutiva, à prevenção ao uso de álcool, tabaco e outras drogas,
à promoção da cultura de paz e prevenção das violências, à promoção da saúde ambiental e
desenvolvimento sustentável; e

• educação permanente para qualificação da atuação dos profissionais da educação e da saúde e


formação de jovens.

74
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Saiba mais

Para saber um pouco mais sobre os serviços de atenção básica e sua


forma de custeio e implantação, leia:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.


Departamento de Atenção Básica. Política nacional de atenção básica.
Brasília: Ministério da Saúde, 2012b. 110 p.

3.2 Territorialização em estratégia de saúde da família

Como já foi discutido, o perfil epidemiológico da população tem mudado com o tempo. Além disso,
as exigências de saúde e o grau de vulnerabilidade variam de região para região, impossibilitando ações
padronizadas e unificadas dentro do nosso país. Para cada região, é preciso planejar ações que atendam
e auxiliem no perfil daquela população, e, para isso, algumas ferramentas podem ser utilizadas, entre
elas a territorialização.

O que é territorialização?

É a compreensão atual do processo saúde‑doença, apontando que as variáveis biológicas, psíquicas


e sociais remetem à necessidade de ações que possam intervir nos problemas que afetam um território.
A concepção de território diz respeito às áreas econômica, política, cultural e epidemiológica,
configurando, assim, uma realidade de saúde sempre em movimento e nunca pronta, em constante
construção e reconstrução.

A territorialização é essencial para o planejamento das ações da ESF, pois possibilita a visão geral e
também detalhada da população, além da elaboração de indicadores de atuação baseados na realidade
daquela região.

Na avaliação da territorialização, conhecer o perfil socioeconômico é parte importante. Devem ser


verificados os hábitos, as condições de moradia, os costumes, a cultura, o estilo de vida, as atividades
econômicas desenvolvidas, de onde vem a renda da população, crenças, meios de comunicação, transporte,
entidades que fazem parte do cotidiano desse povo (escolas, igrejas, ONGs, conselhos municipais) e,
especialmente, que papel a própria comunidade assume perante o coletivo. Outras informações nesse
enfoque devem ser: saneamento básico, destino do lixo, rede de abastecimento de água, esgoto, presença
de água contaminada e esgoto a céu aberto, foco de vetores, poluição (das mais diversas fontes: visual,
sonora, ar, água, radiação, dentre outras), meio ambiente e desenvolvimento sustentável.

Para que ocorra o reconhecimento do território é feita uma visita ao local, sistematizada e planejada.
Dessa forma, será possível aprofundar‑se nas mais variadas dimensões da realidade da localidade. O
território reconhecido é a área de responsabilidade da equipe. Após o seu reconhecimento, é essencial
que se avalie a equipe que está disponível para o cadastramento dessa população.
75
Unidade I

A cartografia auxilia muito no diagnóstico e planejamento das ações na ESF. A visualização espacial
de informações traz subsídios ao processo de vigilância e atenção à saúde através dos mapeamentos
das áreas de riscos e dos serviços de saúde. Podemos identificar e marcar unidades de apoio como
escolas, igrejas, áreas endêmicas etc. Um espaço bem-demarcado, bem-representado graficamente,
com ilustrações e observações, instrumentaliza a organização das ações de saúde e se torna a base de
informações sobre o perfil desse território. Geralmente, esse processo é realizado pelo ACS e toda equipe
da ESF por meio de visitas locais, entrevistas e observação.

A definição do território e a construção dos mapas representam as bases para a realização do


diagnóstico da comunidade. Cabe ao enfermeiro entender a dinâmica desse processo e direcionar a
equipe para que o diagnóstico da população seja efetivo, além auxiliar no planejamento de ações que
ajudem na prevenção de doenças e promoção da saúde dessa comunidade.

4 ATENÇÃO DOMICILIAR

A mudança do perfil epidemiológico traz uma realidade: o envelhecimento populacional.


À medida que a população envelhece e há aumento da carga de doenças crônico‑degenerativas,
cresce também o número de pessoas que necessitam de cuidados continuados e mais intensivos,
demandando o auxílio domiciliar.

Figura 37 – Desospitalização é o eixo da atenção domiciliar

Um dos eixos centrais da atenção domiciliar (AD) é a desospitalização. A possibilidade da


desospitalização pode:

• acelerar o processo de alta hospitalar com cuidado continuado no domicílio;

• minimizar intercorrências clínicas a partir da manutenção de cuidado sistemático das equipes de


atenção domiciliar;

76
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• diminuir os riscos de infecções hospitalares por longo tempo de permanência de pacientes no


ambiente hospitalar, em especial, os idosos;

• oferecer suporte emocional necessário para pacientes em estado grave ou terminal e familiares;

• instituir o papel do cuidador, que pode ser um parente, um vizinho, ou qualquer pessoa com
vínculo emocional com o paciente e que se responsabilize pelo cuidado em conjunto com os
profissionais de saúde;

• propor autonomia para o paciente no cuidado fora do hospital.

A AD pode ser classificada em AD1, AD2 e AD3.

Na AD1 estão os usuários que possuem problemas de saúde controlados/compensados com algum
grau de dependência para as atividades da vida diária (não podem se deslocar até a unidade de saúde).
Essa modalidade tem as seguintes características:

• permite maior espaçamento entre as visitas;

• não necessita de procedimentos e técnicas de maior complexidade;

• não precisa de atendimento médico frequente;

• o indivíduo possui problemas de saúde controlados/compensados, por exemplo, idoso com


hipertensão controlada.

Os usuários classificados para AD2 são pacientes que têm problemas de saúde e dificuldade de
locomoção até alguma unidade de saúde, necessitam de maior frequência de cuidado, recursos de
saúde e acompanhamento contínuo até a estabilização do quadro. Necessitam pelo menos de uma
visita por semana.

Os usuários classificados como AD3 são semelhantes aos AD2, mas em uso de aparelhos e necessitam
de procedimentos especiais, como CPAP, aspiração orotraqueal etc.

Segundo a Portaria nº 963, de 27 de maio de 2013, que reorganiza a Portaria anterior de atenção
domiciliar nº 2.527, de outubro de 2011, a AD constitui‑se como uma

[...] modalidade de atenção à saúde substitutiva ou complementar às já


existentes, caracterizada por um conjunto de ações de promoção à saúde,
prevenção e tratamento de doenças e reabilitação prestadas em domicílio,
com garantia de continuidade de cuidados e integrada às Redes de Atenção
à Saúde (BRASIL, 2013d).

77
Unidade I

A portaria em questão ainda traz os conceitos a seguir:

• Serviço de atenção domiciliar (SAD): serviço que poderá substituir ou complementar o cuidado ao
paciente em atendimento ambulatorial.

• Cuidador: pessoa que pode ou não ter vínculo familiar com o paciente, que deverá ser capacitado
para auxiliar nas demandas necessárias do paciente e suas atividades cotidianas.

A atenção domiciliar visa à reorganização do processo de trabalho de equipes da atenção básica que
prestam serviço no domicílio, em ambulatórios, em serviços de urgência e emergência e hospitais. Essa
reorganização visa à desospitalização, à redução do período de permanência do paciente internado e à
humanização do cuidado, incentivando sua autonomia.

Importante deixar claro que AD não proporciona redução de custos, mas sim o uso mais adequado
dos recursos; gasta-se menos para se fazer o mesmo, caracterizando uma ação de gestão de custos.

Por ser realizada no domicílio do paciente, expõe as equipes à realidade social na qual a família está
inserida, à sua rotina, a seus valores e às formas de cuidar instituídas no senso comum de geração em geração.

Ainda de acordo com a Portaria nº 963/2013, a atenção domiciliar deverá seguir algumas diretrizes.
São elas:

• ter a atenção básica como ordenadora do cuidado e da ação territorial;

• estar incorporada ao sistema de regulação, articulando com outros


serviços, inclusive o de retaguarda;

• ser estruturada de acordo com os princípios de ampliação do acesso


(acolhimento, equidade, humanização e integralidade do cuidado);

• estar inserida nas linhas de cuidados baseado nas necessidades do


usuário, reduzindo a fragmentação da assistência;

• adotar modelo de atenção centrado no trabalho em equipe


multiprofissional e interdisciplinar;

• estimular a participação dos profissionais de saúde envolvidos,


usuários e família (BRASIL, 2013d).

A atenção domiciliar na atenção básica apresenta alguns princípios (BRASIL, 2012a; idem, 2013b)

1 ‑ Abordagem integral à família: ao profissional de saúde que se insere na dinâmica da vida familiar
cabe uma atitude de respeito e valorização das características peculiares daquele convívio humano. A
abordagem integral e a construção de ambiente saudável fazem parte da assistência domiciliar por
78
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

envolver múltiplos fatores no processo saúde–doença da família, influenciando as formas de cuidar.


Assistir no domicílio é cuidar da saúde da família com integralidade e dinamicidade, reconstruindo
relações e significados.

2 ‑ Consentimento da família, participação do usuário e existência do cuidador: a família


precisa consentir para que seja iniciada a atenção domiciliar. É preciso que a família tenha sido orientada
sobre as necessidades do paciente antes da alta hospitalar, para que tenha ciência sobre a situação
que irá vivenciar. É de suma importância a formalização da assinatura do termo de consentimento
informado por parte da família e/ou do usuário (se consciente) ou de seu representante legal.

3 ‑ Trabalho em equipe e interdisciplinaridade: para impactar sobre os múltiplos fatores que


interferem no processo saúde–doença, é importante que a assistência domiciliar esteja pautada em uma
equipe multiprofissional e com prática interdisciplinar.

4 ‑ Estímulo a redes de solidariedade: a participação do usuário em seu processo saúde‑doença


é fundamental. O enfermeiro e a equipe interdisciplinar devem investir na retomada da autonomia do
paciente, no seu empoderamento como sujeito social. Deve‑se estimular também a procurar redes de
apoio, visando à participação da sociedade civil e à retomada da rotina.

Quando falamos de atendimento domiciliar, precisamos estar cientes de que nem todo paciente
é eletivo para atendimento profissional de 24 horas; assim, é preciso que a família esteja consciente
da necessidade de um ou mais membros que desenvolverão o papel de cuidador, ou seja a pessoa que
vai realizar a maior parte do cuidado durante o dia e noite, podendo ser da família ou não. Algumas
famílias preferem contratar profissionais cuidadores para auxiliar nessa prática, porém, não é uma
realidade comum, tendo em vista o alto custo desse profissional e a característica socioeconômica
desfavorável de muitas famílias. Porém, não é preciso que o cuidador tenha formação específica na
área da saúde.

Figura 38 – O cuidador presente na atenção domiciliar

79
Unidade I

Independentemente de quem será o cuidador, ele deve ser acolhido e orientado pela equipe de
saúde. Suas tarefas devem ser pactuadas entre a equipe, familiares, paciente e cuidador, respeitando
saberes e poderes. Geralmente, o cuidador auxilia em atividades como:

• cuidado corporal: cabelo, unhas, pele, barba, banho parcial ou completo, higiene oral e íntima;

• estímulo e auxílio na alimentação;

• ajuda para sair e voltar da cama, mesa, cadeira;

• locomoção e atividades físicas apoiadas (andar, tomar sol, movimentar as articulações);

• participação do tratamento diretamente observado (TDO);

• mudança de decúbito e massagem de conforto;

• atuação como elo entre o usuário, a família e a equipe de saúde;

• administração de medicações, exceto em vias parenterais, conforme prescrição;

• comunicação à equipe de saúde das intercorrências;

• encaminhamento de solução quando do agravamento do quadro, conforme orientação da equipe;

• suporte emocional aos pacientes em AD.

Auxiliar o cuidador a criar um elo de confiança com a equipe é fundamental para um planejamento
efetivo das ações e bons resultados. O cuidador será a ligação entre equipe e paciente, e detentor de
informações que auxiliarão nas tomadas de decisões para melhor resultado do objetivo proposto. Assim,
é importante também que fique claro o papel da equipe com o usuário no atendimento domiciliar. O
Ministério da Saúde delimitou no Caderno de Atenção Domiciliar as seguintes atribuições da equipe de
saúde da família na atenção domiciliar (BRASIL, 2012a):

• respeitar os princípios da assistência domiciliar, buscando estratégias


para aprimorá‑los;

• compreender o indivíduo como sujeito do processo de promoção,


manutenção e recuperação de sua saúde e visualizá‑lo como agente
corresponsável pelo processo de equilíbrio entre a relação saúde‑doença;

• coordenar, participar e/ou nuclear grupos de educação para a saúde;

• fornecer esclarecimentos e orientações à família;

• monitorar o estado de saúde do usuário, facilitando a comunicação


entre família e equipe;
80
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

• desenvolver grupos de suporte com os cuidadores;

• realizar reuniões com usuário e família para planejamento e avaliação da AD;

• otimizar a realização do plano assistencial;

• fazer abordagem familiar, considerando o contexto socioeconômico e


cultural em que a família se insere;

• garantir o registro no prontuário domiciliar e da família na unidade de saúde;

• orientar a família sobre sinais de gravidade e condutas a serem adotadas;

• dar apoio à família tanto para o desligamento após a alta da AD,


quanto para o caso de óbito dos usuários;

• avaliar a condição e infraestrutura física do domicílio;

• acompanhar o usuário conforme plano de assistência traçado pela


equipe e família;

• pactuar concordância da família para AD;

• buscar garantir assistência integral, resolutiva e livre de danos ao usuário da AD;

• trabalhar as relações familiares na busca pela harmonia, otimizando


ações para um ambiente familiar terapêutico;

• solicitar avaliação da equipe de referência após discussão de caso;

• dar apoio emocional;

• orientar cuidados de higiene geral com o corpo, alimentos, ambiente e água.

Quando alguém da família assume o papel de cuidador, vivencia um misto de ansiedade e medo,
devido às novas requisições e alteração no seu papel social e à nova condição de cuidador. Algumas
pessoas se adaptam bem a essa nova função, enquanto outras precisarão de apoio e orientação para
ajustamento e organização das exigências do dia a dia perante o usuário.

A equipe de saúde, com ênfase no enfermeiro, precisa saber identificar essas necessidades e
implementar mecanismos que facilitem a rotina do cuidador no cotidiano. Para tanto, é preciso realizar
a escuta ativa desse cuidador, criar possibilidade de acesso dele à equipe, criar espaços para a discussão
dos casos, auxiliar, por meio de ações educativas, cartilhas, cartazes ou folhetos explicativos e ainda criar
oficinas temáticas incluindo outros cuidadores, considerando as dificuldades mais relatada por eles.
81
Unidade I

Essa oficina com os cuidadores deve envolver a equipe multidisciplinar e deixar que os participantes
dividam suas angústias, formas de enfrentamento das dificuldades e experiências boas também. Essa
prática possibilita uma espécie de alívio para quem fala e para quem ouve, entendendo que aquela
preocupação não é particular, propiciando que outros membros se manifestem para o auxílio e se sintam
úteis. A experiência de um participante pode ser valiosa para o outro. Automaticamente, as pessoas
envolvidas no grupo formam uma rede de apoio social entre si, possibilitando trocas de grande valia. É
interessante que essas oficinas aconteçam na própria unidade, pois será um centro de apoio e referência
para esses cuidadores.

O cuidador, geralmente, é o cônjuge ou os filhos, ou, em sua maioria, as mulheres da família. Esse
cuidado é considerado um ato solidário, sem previsão de término. Quando falamos de cônjuges e filhos,
muitas vezes esses apresentam também alguma doença crônica ou comorbidade que precisa de cuidado.
Quando tal situação ocorre com o cônjuge, muitos deixam de cuidar de si para cuidar do outro, o que
pode acarretar um problema duplicado para a equipe e para a família. Quando a família é grande e
estruturada, a sobrecarga pode ser evitada, porém, muitas vezes, devido à rotina do dia a dia, cuidador e
paciente estão sós, ocasionando sobrecarga, aflições, medos, anseios, por essa função demandar atenção
24 horas por dia, todos os dias da semana. O enfermeiro precisa estar atento, pois a sobrecarga física e
mental do cuidador pode acarretar efeitos negativos em sua vida, como isolamento social, sintomas de
depressão e ansiedade. Havendo a possibilidade, a adesão ao cargo de cuidador precisa ser espontânea,
estimulada e com a segurança de apoio tanto da instituição de saúde que atende esse paciente quanto
da própria família. Esse suporte deve ser técnico, emocional, de referência e de informações. É preciso
que a família entenda que ser cuidador demanda cuidados também.

Sugere‑se que a avaliação emocional e de sobrecarga do cuidador seja avaliada com frequência,
podendo ser utilizada a Escala Zarit Burden Interview (ZBI), validada por Scazufca e regularizada para
uso no Brasil, se mostrando eficaz para esse fim. A aplicação dessa escala é sugerida no Caderno de
Atenção Básica: Envelhecimento e Saúde da Pessoa Idosa do Ministério da Saúde.

O ambiente domiciliar passa a ser um lugar mais que doméstico: envolve o cuidado do outro que
demanda atenção e acolhimento. As equipes de atenção básica e domiciliar precisam resguardar essa
família, usuário e cuidador principalmente, visando identificar possíveis fragilidades e apoiar de forma
que auxilie na autonomia, na resolução de problemas e do favorecimento de uma rotina menos cansativa
e de incertezas.

Saiba mais

Leia:

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Secretaria


de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Guia prático do cuidador.
Brasília: Ministério da Saúde, 2008a. 64 p.

82
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

Resumo

A saúde da família envolve diretamente os profissionais de atenção


básica e seus usuários. Por meio da atenção básica, o SUS tenta atender
todas as demandas das diferentes fases do ciclo vital, visto que cada uma
delas tem seus detalhes específicos e importantes.

O envelhecimento é um dos assuntos que merece atenção dos


profissionais, família e círculo social, pois pode impactar diretamente
em todos os âmbitos da vida do indivíduo caso não seja bem atendido
e direcionado.

A atenção domiciliar vem com uma nova proposta de reorganização


do sistema, visando a uma atenção mais humanizada e focada
no indivíduo e família. Com essa nova prática, os profissionais
conseguem entender melhor as necessidades individuais e grupais
dos usuários e desenvolver ações para ambos os contextos na
educação em saúde, prevenção de agravos, tratamento e reabilitação
da saúde da população.

Cabe ao enfermeiro estar atento às práticas, ao perfil da sua população,


identificando precocemente suas necessidades e atendendo de forma
efetiva a toda população.

Exercícios

Questão 1. (Fepese 2014) O instrumento de abordagem familiar que permite identificar, de maneira
mais rápida a dinâmica familiar e suas possíveis implicações, com criação de vínculo entre profissional
e a família/indivíduo é o:

A) Geomapa.

B) Genograma.

C) Territorialização.

D) Heredograma.

E) Demanda.

Resposta correta: alternativa B.

83
Unidade I

Análise das alternativas

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: geomapa pertence à área de geoprocessamento, que trata das informações geográficas,
ou de dados georreferenciados, por meio de softwares específicos e cálculos. Ou, ainda, o conjunto de
técnicas relacionadas ao tratamento da informação espacial.

B) Alternativa correta.

Justificativa: o genograma é a representação gráfica da família. Nele são representados os


diferentes membros da família, o padrão de relacionamento entre eles e as suas principais morbidades.
Podem ser acrescentados dados como ocupação, hábitos, grau de escolaridade e dados relevantes da
família, entre outros, de acordo com o objetivo do profissional. Enfim, é um diagrama no qual está
representada a estrutura familiar. A demonstração gráfica da situação permite que o indivíduo pare
e reflita sobre a dinâmica familiar, os problemas mais comuns que a afligem e o enfrentamento do
problema pelos membros da família.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: territorialização é um conceito biogeográfico de significados distintos em diferentes


escolas teóricas da antropologia, biologia e geografia. O termo está geralmente relacionado a formas
de organização e reorganização social, modos distintos de percepção, ordenamento, reordenamento em
termos de relações com o espaço.

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: heredograma é um tipo de gráfico que representa a herança genética de determinada


característica dos indivíduos representados.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: demanda é uma solicitação ou manifestação de um pedido.

Questão 2. (FCC 2012) Dentre os princípios do programa de atenção à saúde de jovens e adolescentes,
consta que:

A) Os adolescentes e jovens devem ser atendidos somente na presença de pais ou outro familiar.

B) O sigilo profissional e a confidencialidade devem ser mantidos, inclusive nas situações de abuso sexual.

C) As visitas domiciliares estão excluídas nas estratégias de captação de jovens para o atendimento
em saúde.

84
ENFERMAGEM DA FAMÍLIA

D) Os menores de 18 anos devem ser atendidos mediante apresentação da carteira de identidade, e


a não apresentação do documento acarretará a dispensa do menor no programa.

E) As informações obtidas no atendimento em saúde não serão repassadas aos pais e/ou responsáveis
sem a concordância explícita do assistido.

Resolução desta questão na plataforma.

85

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