Você está na página 1de 6

SOTERRAMENTO DA ESTRADA DO GURIRI NA PRAIA DO PERÓ – CABO FRIO/RJ,

ASSOCIADA A DUNAS ESCALONARES (CLIMBING DUNES).

Fábio Esteves Rangel1; João Wagner Alencar Castro2


1
Mestrando em Geologia, Depto de Geologia, UFRJ / Bolsista Cnpq (fabioesteves@mn.ufrj.br)
2
Laboratório de Geologia Costeira e Sedimentologia (LAGECOST), Depto de Geologia e
Paleontologia; Museu Nacional, UFRJ (jwalencastro@mn.ufrj.br)

Abstract: The dunefield of the Peró, situated in the City of Cabo Frio - Rio de Janeiro State.
Characterized for aeolian forms that process morphologies varied with extension around 7km2. Is
limited the east for the beach of the Peró; the west for an extensive composed area for headlands
and the road of the Guriri; and to the south for the Ponta do Cruz. This system sedimentary
extended for the region to the south of the Ponta do Cruz and the Conchas beach, being that
currently this region was busy for land divisions that if had constituted in the quarters of the Peró,
Conchas, Ogiva and Cajueiro. According to (Ramos et al 2003), the predominant wind in the
region throughout all year is of NE, with average speed of 5m/s, that happening inclined on the
beach of the Peró it forms an angle of about 20º, resulting in the development of a dune lace to
the long one of the after-beach. According to (Castro et al 2002), the geological evolution of the
aeolian dune system essentially is related with the variations of the climate, the regimen of winds
and rain mainly, and with the amount of available sediment in the beach band.

Palavras-chave: Praia do Peró; Dunas Escalonares; Estrada do Guriri.

1. Introdução do clima, regime de ventos, pluviometria e


quantidade de sedimento disponível na faixa
O campo de dunas do Peró situa-se no de praia. Sendo assim, a área de estudo
Município de Cabo Frio - Estado do Rio de consiste de um sistema dinâmico, onde
Janeiro / RJ. Trata-se de um conjunto de existe uma inter-relação de diferentes
formas eólicas com morfologias variadas condicionantes ambientais, dos quais os mais
com extensão de 7km2. É limitada a leste importantes são os processos sedimentares,
pela praia do Peró; a oeste por uma extensa climáticos e litorâneos.
área composta por brejos e pela estrada do Do ponto de vista morfológico o campo
Guriri; e ao sul pela Ponta do Cruz. Antes do de dunas da praia do Peró é constituído por
processo de ocupação urbana, o referido feições móveis obliquas com características
campo de dunas estendia-se para sul em escalonares (climbing dunes). Neste sistema
direção a praia das Conchas. Segundo observa-se uma forte tendência de
Ramos et al (2003), o regime de ventos movimentação de dunas sobre áreas rurais e
predominante é de nordeste com velocidades urbanas. A ação antrópica, ocorrida nos
médias de 5m/s. A incidência de ventos últimos anos, através da expansão urbana
constante sobre a zona de alimentação do interrompeu em parte a dinâmica natural das
sistema eólico (praia) forma um ângulo de dunas e, conseqüentemente sua evolução.
20º, resultando no desenvolvimento de Diante do quadro natural, o presente trabalho
dunas. Segundo Castro et al (2002), a tem como objetivo estudar o processo de
evolução geológica dos sistemas eólicos soterramento sobre a estrada de Guriri - RJ e
costeiros está relacionada com as variações recursos naturais associados.
etapa de campo
2. Métodos e Técnicas citadas anteriormente foram selecionadas
três formas de dunas com características
Realizou-se primeiramente uma etapa de distintas, sendo estas classificadas como
gabinete caracterizada pela revisão barcana, barcanóide e transversal;
bibliográfica pertinente ao assunto, A etapa de campo contou do seguinte
envolvendo consultas de teses, dissertações, procedimento:
periódicos e revistas especializadas. 1. Caminhamento transversal sobre o
Em seguida elaborou-se a carta base na sistema eólico do Peró;
escala de 1: 15.000, realizada através do 2. Localização dos pontos através do uso
levantamento fotogramétrico correspondente de um Garmin 72, Global Positioning
ao ano de 2001. As medições relacionadas à System (GPS);
movimentação de dunas foram obtidas a 3. Fotografias digitais para a
partir do monitoramento de campo entre visualização das dunas monitoradas;
janeiro de 2004 a janeiro de 2005. Essas 4. Utilização de marcos de madeira
medições foram realizadas trimestralmente como base para as medições das taxas
conforme estações do ano. Para efeito de avanço das dunas nos diferentes
comparativo interpretou-se também trimestres monitorados;
fotografias aéreas na escala de 1: 60.000 e 1: 5. Utilização de trena para a medição
20.000, dos vôos de 1965 e 1988 dos respectivos avanços;
respectivamente, pertencentes ao Serviço 6. Utilização de um anemômetro portátil
Geológico do Brasil - CPRM e fotografias modelo Kestrel Pocket Wind Meter
aéreas de 1976 na escala 1: 30.000 para medição da velocidade dos
pertencentes ao Departamento de Recursos ventos.
Minerais - DRM-RJ. Após esta etapa,
utilizaram-se técnicas de geoprocessamento 3. Resultados
que permitiram analisar as variações
temporais e espaciais ocorridas na região no A taxa de transporte de sedimento eólico
período de 23 anos (1965 – 1988). Utilizou- para o campo de dunas do Peró foi calculada
se também o programa ArcView do através da velocidade de migração das dunas
Laboratório de Exploração Mineral do barcana, barcanóide e transversais. A partir
Departamento de Geologia - UFRJ para dos dados obtidos em campo juntamente
edição das imagens e obtenção dos dados de com os dados de fotografias aéreas aplicou-
migração eólica das dunas do Peró. Nessa se a fórmula proposta por Simons,
etapa, com o intuito de comparar o processo Richardson & Nordin (1965) apud Castro
de evolução das dunas realizou-se o (2001):
tratamento das fotografias aéreas de Qb = K H V (1)
diferentes datas de vôo correspondente ao
periodo estudado. O procedimento consistiu Onde K: é o fator de forma não
em escanerização, georreferenciamento e dimensional, H: é a altura da duna, V: é a
plotagem, tendo como base às coordenadas velocidade de migração da duna.
geográficas da carta 1:15.000 do Escritório O fator de forma K é igual A / LH, onde
Lisboa da Cunha. A partir dessa etapa A é a seção transversal da duna, e L é o
auxiliada pelos programas ArcGis e espaçamento entre as dunas. Segundo
ArcScene, foram desenvolvidas outras Werner, Ilenberguer & Rust (1988), deve-se
atividades de geoprocessamento: vetorização ter em mente que Qb independe do tamanho
das linhas e cotas topográficas. Em relação a da duna, pois uma duna de tamanho menor
move-se mais rapidamente do que uma duna mais distantes da linha de costa, esta
de dimensões maiores. Na região do Peró as estimativa sobe para 16 m/ano e (Qb) cai
dunas em questão apresentaram variações na para 3,6 m3/m/ano e 1,91 m3 /m/ano
taxa de migração devido aos condicionantes respectivamente (Figuras 2 e 3).
ambientais, que variaram durante as estações
do ano no período amostrado de forma 4. Discussões
atípica aos anos anteriores analisados.
Conforme resultados obtidos através de Os resultados obtidos confirmam a teoria
determinações e medições diretas no terreno, proposta por Simons, Richardson & Nordin
as velocidades de migração das dunas na (1965) apud Castro (2001), a qual parte do
praia do Peró apresentam valores princípio de que quanto maior for à altura da
diversificados conforme Tabela 1. Na duna duna menor será sua taxa de migração anual.
1, que se encontrava a cerca de 800 metros Os valores apontam que o processo de
da linha de praia, a velocidade de migração migração das dunas móveis é proporcional à
foi de 13 m/ano, enquanto que as dunas 2 e altura e tamanho das mesmas, ou seja,
3 que estavam mais distantes da praia quanto maior a altura e tamanho menor é a
atingiram 16 m/ano respectivamente (Figura velocidade de migração. No entanto esse
2). Tal fato deve-se aos índices critério deve ser usado com cautela para a
pluviométricos e velocidades do vento área estudada, visto que a duna 1 (barcana)
durante o período de monitoramento que apresentou no primeiro trimestre de
variaram bastante. As dunas barcanas monitoramento taxa de avanço similar às
passivas de erosão pelo vento mantiveram dunas barcanóides e transversais que
suas características morfológicas após o estavam bem mais distantes da praia
deslocamento. Em alguns pontos do campo . Verificou-se através do programa de
de dunas estudado observou-se um menor monitoramento que as dunas apresentam
transporte de sedimentos devido ao comportamento distinto quanto à velocidade
desenvolvimento da vegetação local, que de deslocamento anual. Tal fato, segundo
fixa a duna e impede a migração. Castro (2001) deve-se a uma série de fatores
Conforme interpretação ambientais, entre estes, tamanho, altura,
aerofotogramétrica o sistema sedimentar do posição em relação à pista de vento “fetch”,
Peró apresenta cinco compartimentos natureza tridimensional e volume dos
morfológicos bem definidos: praia, dunas depósitos.
frontais, planície de deflação, campo de Os resultados obtidos mostram que o
dunas obliquas e dunas escalonares. deslocamento anual das dunas é
A ação antrópica, ocorrida nos últimos proporcional aos índices pluviométricos
anos, através da expansão urbana em torno registrados na região. Ou seja, quanto maior
dos depósitos eólicos principalmente em for este índice menor será a migração das
relação aos empreendimentos imobiliários, dunas.
interrompeu a dinâmica natural das dunas e Durante a estação chuvosa (Outubro a
conseqüentemente a sua evolução. Dezembro), o transporte de sedimento em
Foi constatado que a taxa de transporte de direção ao campo de dunas é parcialmente
sedimento em todo campo de dunas, diminui interrompido, atingindo velocidades de
com a proximidade do mar. Para dunas com migração em torno de 2,5 metros trimestral.
menor distância da linha de costa, o valor da Na estação seca, aproximadamente 9
velocidade de migração de formas foi de 13 meses/ano, o transporte de sedimento eólico
m/ano e (Qb) foi estimado em 5,9 m3/m/ano, é retomado atingindo taxas de até 5 metros
enquanto que as dunas que se encontravam trimestral, neste sentido, a velocidade de
migração das dunas durante a estação 4º Simpósio Nacional de Geomorfologia.
chuvosa é de aproximadamente metade do São Luís - MA, 23 p. (Boletim de resumos).
valor médio obtido durante a estação seca. DAVIES, J.L. 1972. Geographical
Variation in Coastal Development. Oliver &
5. Conclusões Boyd, Edinburgh, 204 p.
WERNER, K; ILENBERGUER, W.K. &
Através do programa de monitoramento RUST, L. 1988. A sand budget for the
conclui-se que as dunas avançam Alexandria coastal dunefield, South Africa.
preferencialmente sobre a Estrada do Guriri, Sedimentology 35. 513 -521 p.
lagoa Brejo do Matadouro e em direção ao SIMONS, D.B; RICHARDSON, E.V. &
Empreendimento Aquadunas, prevendo-se NORDIN, C.F; 1965. Bedload equation for
um processo de soterramento total em 10 ripples end dunes. Bulletin of the U. S.
anos. Tal resultado é comprovado por uma Geological Survey, Washington, 462(2):1-9.
taxa de avanço de 16 m/ano acrescida de um RAMOS, R.R.C; CASSAR, J.C.M &
volume de 3,6 m³/m/ano. GUSMÃO, L.A.B 2003. Modelo Evolutivo
As estimativas de taxas de transporte do campo de dunas do Peró (município de
eólico obtido através da fórmula proposta Cabo Frio/RJ e Cálculo de Transporte
por Simons, Richardson e Nordin (1965) eólico. In: Congresso da Abequa., 9 Recife.
apud Castro (2001) permitiram confirmar a Cd rom... Recife, Abequa).
existência de uma direção de transporte de
sedimento preferencial na região estudada. A
estimativa total de transporte de material em
direção a estrada do Guriri é de 11,41
m3/m/ano, enquanto em direção ao mar é
zero, ocasionado o processo de soterramento
estudado.
Com isso os resultados obtidos visam
possibilitar e fornecer informações no intuito
de colaborar com a solução de problemas
decorrentes da ocupação urbana neste trecho
do litoral Fluminense.

6. Referências

BAGNOLD, R.A. 1941. The physical of


blown sand and desert dunes, 1 ed. Muthuen,
265 p.
CASTRO, J.W.A. 2001. Geomorfologia
do Sistema Sedimentar Eólico de Paracuru –
Ceará / Rio de Janeiro: UFRJ / PPGG. 202p.
Tese (doutorado).
CASTRO, J.W.A., ÁVILA, C.A. &
GONÇALVES, R.A. 2002. O sistema de
dunas oblíquas do litoral de Cabo Frio – RJ.
Dunas Coordenadas em UTM Formas de Velocidade de Qb - taxa de transporte
(Datum WGS 84) Dunas migração (m/ano) eólico (m3/m/ano)

Duna 1 7470244/0192582 Barcana 13 5,9

Duna 2 7470027/0192594 Barcanóide 16 3,6

Duna 3 7469955/0192536 Transversal 16 1,91

Tabela 1 - Estimativas de taxa de transporte eólico obtido para o campo de dunas do Peró no
litoral de Cabo Frio – Rio de Janeiro / RJ.

Figura 1- Mapa de Localização da área de estudo.


Variação das taxas de migração de dunas

18
16
14
12
10
8
6
4
2
0
1 2 3
na na na
du du du
Pontos de medição

Figura 2 - Variação das taxas de deslocamento por metro / ano, em 3 pontos distintos do sistema
eólico do Peró.

Estimativa de taxa de transporte eólico

0
1 2 3
na na na
du du du
Pontos de localização

Figura 3 - Estimativa de transporte eólico em m3/m/ano (Qb) no campo de dunas do Peró.

Você também pode gostar