Você está na página 1de 7

CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BRUSQUE - UNIFEBE

Pesquisa em Psicologia
Talia Antunes de Souza

A RELAÇÃO DA DESREGULAÇÃO EMOCIONAL COM O DESENVOLVIMENTO


DE TRANSTORNOS DEPRESSIVOS NA INFÂNCIA: UMA REVISÃO
BIBLIOGRÁFICA

Objetivo Geral
Compreender a relação da desregulação emocional como fator desencadeante
de transtornos depressivos na infância.

Introdução
Nos primeiros anos de vida, uma das principais formas de comunicação não
verbal com o meio é dado através das emoções sentidas e expressadas, por meio de
reações comportamentais, como por exemplo o choro do bebê. Conforme se dá o
desenvolvimento físico e cognitivo da criança, ela é exposta a eventos que
desencadeiam emoções e comportamentos, nem sempre compreendidos pela própria
criança. Suas emoções e comportamentos são, portanto, reforçadas ou punidas pelos
adultos, o que pode gerar um bom repertório de regulação emocional ou um déficit no
controle das próprias emoções e enfrentamento de eventos estressores.
O déficit nas habilidades de regulação emocional contribui para uma série de
condições psiquiátricas, incluindo os transtornos depressivos. As dificuldades de re-
gulação emocional são encontradas com maior frequência em indivíduos que passa-
ram por eventos traumáticos, como violência física, principalmente abuso sexual, e
violência emocional, tendo efeitos prejudiciais de longo prazo na expressão, reconhe-
cimento e comunicação das emoções, e desencadeando o uso de estratégias disfun-
cionais para o gerenciamento de emoções fortes, como autolesão abuso de álcool e
maior risco de suicídio. Indivíduos com experiências adversas na infância correm
maior risco de desenvolver estratégias de enfrentamento mal adaptativas (MICHO-
POULOS et al., 2015).
A partir dessa perspectiva, objetiva-se revisar as pesquisas atuais sobre a des-
regulação emocional e a sua relação como fator desencadeante para o desenvolvi-
mento de transtornos depressivos na infância. Espera-se que com a revisão das pro-
duções científicas encontradas, esclareça-se sobre o tema possibilitando encontrar a
relação entre os déficits de regulação emocional e a presença de psicopatologias, em
específico os transtornos depressivos, a fim de contribuir para futuras intervenções e
tratamento da depressão na infância.

Fundamentação teórica
O FUNCIONAMENTO DAS EMOÇÕES

As emoções são eliciadas mediante a aspectos biológicos e sociais, e variam


em nível de duração e intensidade, podendo acarretar ou não, risco para segurança
da pessoa ou dos seus pares. As emoções surgem no corpo a partir das estimulações
do ambiente, e a percepção do indivíduo sobre o evento antecedente, desencadeando
mudanças no sistema límbico, e provocando a experiencia dessas emoções. O
Sistema Límbico inclui áreas cerebrais como: amígdala, hipotálamo, hipocampo,
dentre outras estruturas, e é o sistema responsável por comunicar “alertas de ameaça”
ao organismo. Quando ativado o sistema límbico, aciona de imediato o sistema
nervoso simpático e parassimpático, provocando alterações fisiológicas no individuo
como modificação da respiração, tensão muscular, sudorese, dentre outras mudanças
que podem ocorrer (LINEHAN, 2018).
As emoções possuem um papel primordial para a sobrevivência humana, ainda
que a experiência de algumas emoções sejam desagradáveis, sua função é
comunicar o desconforto ao próprio indivíduo, assim como aos seus pares auxiliando
na comunicação, protegem, alertam sobre possíveis perigos e motivam a ação, além
de que as emoções positivas e prazerosas atuam como fatores protetivos para a
saúde mental (LINEHAN, 2018).
Os estudos apontam diferentes definições para o conceito de regulação
emocional, entretanto, a Terapia Comportamental Dialética que utiliza da regulação
emocional como meio de intervenção principal, e segundo estudos, tem maior
evidências para o aumento dos índices de regulação emocional, define o conceito
como sendo a regulação da sensibilidade a estímulos emocionais, regulação da
intensidade das reações emocionais e capacidade de regular a afetividade a
respostas negativas. A desregulação emocional por sua vez, é a falta dessas
habilidades, ao ponto de trazer prejuízo a vida do indivíduo (ASARNOW et al., 2021).
A regulação emocional é uma habilidade, portanto é possível ser desenvolvida,
o processo envolve uma série de etapas que incluem a modificação das situações que
dão origem as emoções, intervindo nas contingências, como fatores ambientais
estressores. No caso da infância, pode ser elucidada a dinâmica familiar e a escola,
ambientes que podem estar ocasionando uma desregulação emocional e, com a
modificação, se tornam favoráveis para o desenvolvimento das habilidades de
regulação. É necessário também a mudança cognitiva e a modulação das respostas
emocionais, incluindo estratégias como resolução de problemas e reavaliação
cognitiva (COMPAS et al., 2017).

A DESREGULAÇÃO EMOCIONAL E OS SEUS FATORES DE RISCO

Muitos contextos na infância, ao invés de ensinar as habilidades de regulação


emocional, reprimem e controlam agressivamente as experiências e expressões
emocionais. Para que haja o desenvolvimento da habilidade de regulação emocional
é ideal que o ambiente ensine as crianças a como e quando expressar e modular suas
emoções (LINEHAN, 2018). Muitos contextos em que a criança está inserida, punem
e ridicularizam, quando essa tenta expressar suas emoções, muitas vezes de forma
desregulada. Como consequência desses ambientes punitivos, a criança passa a
aprender a não confiar em suas próprias emoções, e não aprende a expressá-las de
maneira assertiva. Sendo assim, a criança também passa a temer as suas emoções,
avaliando como ruins ou negativas e que devem ser evitadas, e apenas as positivas
e boas devem ser sentidas (LINEHAN, 2018).
A capacidade de regulação emocional de uma criança pode ser prejudicada por
comportamentos depreciativos ou de humilhação, provocados pelos pais ou
cuidadores frequentemente dirigidos a ela (CHRIST et al., 2019). A violência física e
emocional e a negligência na infância podem desregular o sistema neurológico que
se encontra em desenvolvimento na criança, reduzindo sua capacidade de suportar
eventos estressores, levando a problemas de desregulação emocional também na
idade adulta, estando fortemente correlacionado a incidência do transtorno
depressivo. Crianças que sofreram violência ou foram negligenciadas tendem a
prestar mais atenção às emoções de raiva e são hipersensíveis à ameaça
(GIOTAKOS, 2020).

TRANSTORNOS DEPRESSIVOS NA INFÂNCIA

O Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 5° edição -


DSM-5, classifica os transtornos depressivos presentes na infância sendo Transtorno
Disruptivo de Humor, Transtorno Depressivo Maior, que classifica a condição clássica
de depressão, e Transtorno Depressivo Persistente. O Transtorno Disruptivo de Hu-
mor, é mais frequentemente presente na infância, e como critério diagnóstico deve-se
iniciar antes dos 10 anos, e não pode ser aplicado a crianças menores de 6 anos, o
humor característico é predominantemente irritável. Já o Transtorno Depressivo Per-
sistente, deve constar o humor irritável na maior parte do dia e na maioria dos dias,
com duração mínima de um ano (APA 2014).
Os sintomas dos transtornos depressivos na infância, segundo o DSM-5, se
dão frequentemente pelo humor irritável em vez de triste. A criança apresenta mu-
dança no comportamento alimentar, sendo perda de apetite e peso, ou o contrário,
como aumento compulsivo do apetite e ganho de peso, mudanças no sono, frequen-
temente tendo insônias, diminuição da energia e perda de interesse por atividades
que antes gostava, como andar de bicicleta ou jogar bola, perda de interesse pelo
contato social, em ver os amigos ou ir à escola.
Como características dos sintomas gerais dos transtornos depressivos na in-
fância, nota-se na criança a queda do rendimento escolar, sendo manifestado na falta
de concentração, na dificuldade de tomar decisões, no humor irritado que pode se
apresentar diante das relações com os colegas, e na falta de interesse pelas ativida-
des escolares. Segundo Cruvinel e Boruchovitch (2011), a presença de sintomas de-
pressivos na infância, é pouco favorecedora para o bom desenvolvimento infantil,
comprometendo o funcionamento cognitivo, familiar, psicossocial e emocional da cri-
ança. As crianças com transtornos depressivos, não empregam de forma eficiente as
estratégias de regulação emocional.
Ainda segundo os mesmos autores, as crianças com sintomatologia de depres-
são, normalmente usam estratégias de regulação emocional ineficazes, como a auto-
lesão, sendo, no entanto, que com a administração das emoções de forma eficaz, com
estratégias psicoterapêuticas funcionais, é possível diminuir os sintomas da depres-
são, e diminuir os riscos do surgimento da psicopatologia se trabalhado a regulação
emocional de forma precoce. Os autores trazem que o primeiro passo para a autorre-
gulação emocional, é a percepção e tomada de consciência de tais emoções, pois as
crianças com os sintomas depressivos, apresentam dificuldade de reconhecer a tris-
teza, o medo e a alegria, não reconhecendo também as suas alterações fisiológicas
(CRUVINEL; BORUCHOVITCH, 2011).
Os sintomas depressivos e os seus prejuízos na vida da criança, podem au-
mentar consideravelmente o risco de suicídio. O maior desafio da prevenção do sui-
cídio na infância, é perceber as mudanças de comportamentos como sinais de risco
suicida, que popularmente é considerado uma fase de temperamento difícil ou retra-
ído, e não como um sinal. Fazendo-se necessário a conscientização sobre a ideia de
que a criança não tem capacidade cognitiva para cometer o suicídio. Alguns fatores
de risco para o suicídio na infância, que estão relacionados com a presença do trans-
torno depressivo e da desregulação emocional, são problemas escolares como bul-
lying, histórico de violência física e sexual, conflitos familiares e a morte de uma pes-
soa próxima por suicídio (SOUSA et al., 2017).

Método
Será realizado uma revisão bibliográfica de cunho investigativo explorató-
ria/descritivo, utilizando artigos científicos com até 5 anos de publicação, tendo sido
publicados entre os anos de 2018 a 2022, nas plataformas de busca Scielo e Pubmed,
considerando apenas os artigos de livre acesso. Como termos de busca será utilizado
as palavras chaves: regulação emocional, desregulação emocional, combinados com
as palavras: infância e depressão infantil. Como critério de seleção, está definido a
leitura dos resumos dos artigos encontrados, onde serão considerados apenas os es-
tudos com enfoque na área da psicologia comportamental e cognitiva, e que discutam
a relação da desregulação emocional com o surgimento do transtorno depressivo na
infância, utilizando-se de pesquisas estatísticas, revisões bibliográficas ou estudos de
caso.
Os artigos selecionados que se enquadrarem nos critérios de inclusão, serão
analisados considerando os seus resultados obtidos, a fim de investigar se existe uma
relação entre a desregulação emocional como fator desencadeante para o surgimento
de transtornos depressivos na infância.
Referências

APA - AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e


estatístico de transtornos mentais: DSM-5. 5.ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.

ASARNOW, Joan Rosenbaum et al. Dialectical Behavior Therapy for Suicidal Self-
Harming Youth: emotion regulation, mechanisms, and mediators. Journal Of The
American Academy Of Child & Adolescent Psychiatry, [S.L.], v. 60, n. 9, p. 1105-
1115.4, set. 2021. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/j.jaac.2021.01.016.
Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33539915/. Acesso em: 14 set.
2022.

CHRIST, Carolien et al. Linking childhood emotional abuse and depressive


symptoms: the role of emotion dysregulation and interpersonal problems. Plos One,
[S.L.], v. 14, n. 2, p. 1-18, 14 fev. 2019. Public Library of Science (PLoS).
http://dx.doi.org/10.1371/journal.pone.0211882. Disponível em:
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/30763360/. Acesso em: 14 set. 2022.

COMPAS, Bruce E. et al. Coping, emotion regulation, and psychopathology in


childhood and adolescence: a meta-analysis and narrative review.. Psychological
Bulletin, [S.L.], v. 143, n. 9, p. 939-991, set. 2017. American Psychological
Association (APA). http://dx.doi.org/10.1037/bul0000110. Disponível em:
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/28616996/. Acesso em: 13 set. 2022.

CRUVINEL, Miriam; BORUCHOVITCH, Evely. Regulação emocional em crianças


com e sem sintomas de depressão. Estudos de Psicologia (Natal), [S.L.], v. 16, n.
3, p. 219-226, dez. 2011. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s1413-
294x2011000300003. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/epsic/a/PCghSbhqVMnQ93yVtzS7sxv/?lang=pt. Acesso em:
26 out. 2022.

GIOTAKOS, O.. Neurobiology of emotional trauma. Psychiatriki, [S.L.], v. 31, n. 2, p.


162-171, 1 jul. 2020. Hellenic Psychiatric Association.
http://dx.doi.org/10.22365/jpsych.2020.312.162. Disponível em:
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32840220/. Acesso em: 26 out. 2022.

LINEHAN, Marsha M. Treinamento de habilidades em DBT: manual de terapia


comportamental dialética para o terapeuta. 2. ed. Porto Alegre – RS: ARTMED,
2018. E-book. Acesso restritivo via Minha Biblioteca. Acesso em: 13 set. 2022.

MICHOPOULOS, Vasiliki et al. The mediating role of emotion dysregulation and


depression on the relationship between childhood trauma exposure and emotional
eating. Appetite, [S.L.], v. 91, p. 129-136, ago. 2015. Elsevier BV.
http://dx.doi.org/10.1016/j.appet.2015.03.036. Disponível em:
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25865667/. Acesso em: 31 out. 2022.

SOUSA, Girliani Silva de et al. Revisão de literatura sobre suicídio na


infância. Ciência & Saúde Coletiva, [S.L.], v. 22, n. 9, p. 3099-3110, set. 2017.
FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232017229.14582017.
Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/txydxpxdvnKtFhXWCJJxwxP/?lang=pt.
Acesso em: 26 out. 2022.

Você também pode gostar