Artigo Resenha 1 - Turismo e Sociedade - 2018.2º

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Por uma Sociologia do Turismo: Estudo Introdutório1

Monlevade, Ana Paula Bistaffa de.


Mestranda em Educação pela Universidade Federal de Sergipe - UFS2

RESUMO

Foi a partir da segunda metade do século XX que o turismo cresceu significativamente até se
tornar uma “indústria” da diversão e do prazer em constante expansão. Mas o que impulsiona
hoje a necessidade de viajar? É, sobretudo criada pela sociedade e marcada pelo cotidiano.
Além disso, o fenômeno turístico desperta interesse, pois causa forte impacto nos indivíduos
que se deslocam, provoca mudanças no comportamento das pessoas e agrega conhecimentos
àqueles que o praticam. Dentro deste contexto, o artigo tem como objetivos fazer um estudo
introdutório sobre a sociologia do turismo e seus principais aspectos e relatar sobre o turismo
como fenômeno social. Pode-se observar que o que faz uma pessoa viajar é tanto o resultado
de um impulso pessoal quanto a influência do meio social, que fornece a cada um as suas
normas existenciais. A decisão pessoal é, de certa forma, condicionada pela sociedade3.

Palavras-chave: Turismo. Sociedade. Fenômeno Social. Fato Social. Ação Social.

INTRODUÇÃO

                                                            
1
Trabalho apresentado ao GT 11 “Tópicos Emergentes no Turismo” do VI Seminário de Pesquisa em Turismo do
MERCOSUL – Caxias do Sul, 9 e 10 de Julho de 2010.
2
Bacharel em Turismo e Especialista em Gestão de Negócios Turísticos pelo Centro Universitário Cândido Rondon –
UNIRONDON. Especialista em Docência no Ensino Superior pelo Instituto Cuiabano de Educação – ICE. Mestranda em
Educação pela Universidade Federal de Sergipe – UFS. anapaula@cuiabatur.com.br
3
Pesquisa financiada pela Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe - FAPITEC/SE.
 

VI Seminário de Pesquisa em Turismo do MERCOSUL (SeminTUR)


Saberes e fazeres no turismo: interfaces
Universidade de Caxias do Sul, RS, Brasil, 09 e 10 de Julho de 2010
 

O turismo deixou de ser apenas um complexo socioeconômico para se converter em


uma das forças transformadoras do mundo pós-industrial. O setor é hoje considerado como a
principal atividade econômica, superando setores tradicionais da economia como a indústria
automobilística, a eletrônica e a petrolífera. Ligado com as novas tecnologias
(telecomunicações, engenharia genética etc.), o turismo está ajudando a redesenhar as
estruturas mundiais, influenciando a globalização, os novos blocos econômicos e, em resumo,
a nova ordem internacional. Este é o setor que mais emprega pessoas em todo o mundo, que
realiza investimentos sólidos para manter a atividade e que apresenta as melhores perspectivas
de expansão nos próximos anos, principalmente em função das novas formas de organização
do trabalho, que permitirão que o homem tenha mais horas para o desfrute do lazer (DIAS,
2008).
São inúmeras as pessoas que se deslocam pelo planeta, pelos mais diferentes lugares
já imaginados, aproveitando todas as oportunidades para viajar e fugir do cotidiano com a
maior freqüência possível, formando-se gradativamente uma cultura do turismo, que acaba o
colocando como uma das mais importantes faces da globalização, contribuindo para reduzir as
distâncias entre as mais variadas partes do globo.
É dessa forma que o prazer antigamente reservado a alguns privilegiados, seja hoje
experimentado pela grande massa. Mas o que impulsiona hoje a necessidade de viajar? Ao
observar como viajam as pessoas, quais as suas principais ocupações nas férias e os assuntos
conversados, chegou-se a seguinte conclusão: viajar deixou de ser, na maioria das vezes, o
desejo de fazer descobertas e de realmente aprender alguma coisa (KRIPPENDORF, 2006).
Nos dias atuais, a necessidade de viajar é, sobretudo criada pela sociedade e marcada
pelo cotidiano. As pessoas viajam porque não se sentem mais à vontade onde se encontram,
seja nos locais de trabalho seja onde moram. Sentem necessidade urgente de se desfazer
temporariamente da rotina massificante do dia-a-dia do trabalho, da moradia e do lazer, a fim
de estar em condições de retomá-la ao regressarem. O trabalho é cada vez mais estressante, o
seu dia-a-dia torna-se mais monótono e sem contar as relações humanas que se esgotaram,
sentimentos são oprimidos e o ser humano perde cada vez mais sua naturalidade. Para muitas
pessoas isso significa o vazio do dia-a-dia, o esgotamento físico e psíquico e o tédio. Na
contramão dessa realidade, para viver a liberdade e se desligar desse dia-a-dia, as pessoas
viajam, refazem as energias, descansam e procuram um pouco de felicidade. Isso significa

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viajar para viver, para sobreviver. Pode-se dizer que todo esse fluxo de turistas dos dias atuais
é conseqüência das condições geradas pelo desenvolvimento da nossa sociedade capitalista.
Com base nestas informações o presente artigo tem como objetivo geral fazer um
estudo introdutório sobre a sociologia do turismo e seus principais aspectos e como objetivos
específicos relatar sobre o turismo como fenômeno social e discorrer sobre a sociedade
industrial. A pesquisa foi desenvolvida com base em livros e artigos científicos e por tais
características trata-se de um estudo qualitativo e bibliográfico.

CONCEITUANDO A SOCIOLOGIA DO TURISMO

A partir da segunda metade do século XX, o setor turístico cresceu


significativamente devido, principalmente, à ampliação do direito as férias remuneradas
conquistadas pelos trabalhadores, particularmente nos países desenvolvidos, e no final do
século XX e início do XXI essa importância tem crescido devido ao aumento do tempo livre
que tem sua origem na variação das formas de trabalho motivadas pelo desenvolvimento da
tecnologia, o que permitirá uma sociedade com menos horas de trabalho e mais
disponibilidade para o lazer e o ócio.
Segundo Dias (2008, p. 11):

Do ponto de vista sociológico, o fenômeno turístico desperta interesse por


vários motivos: causa forte impacto nos indivíduos e grupos familiares que
se deslocam, provoca mudanças no comportamento das pessoas e agrega
conhecimentos àqueles que o praticam, permite comparação entre diversas
culturas, contribui para o fortalecimento da identidade grupal, é um meio de
difusão de novas práticas sociais e aumenta as perspectivas de obtenção da
paz pela compreensão e aceitação das diferenças culturais. Contribui, ainda,
para a formação e a educação daqueles que o praticam.

Como um dos ramos da Sociologia Geral, a Sociologia do Turismo busca analisar o


comportamento do ser humano durante as viagens, as relações com as comunidades
receptoras e os impactos sociais provocados por essa atividade. Desta forma, pretende-se
estudar o turismo em seus aspectos sociais e sua relação com a sociedade mais geral.

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Compreende-o como um fenômeno social, passível de ser estudado em seus aspectos


particulares.
Pode-se afirmar, portanto, que à Sociologia do Turismo cabe o estudo sistemático das
relações sociais e da interação entre indivíduos e grupos relacionados com a atividade
turística, o que inclui seus desdobramentos no que se convencionou denominar de indústria
turística4.
Sobre a abordagem sociológica do turismo, Dann e Cohen apud Dias (2008) refletem
algumas considerações. Primeiramente, afirmam que é importante deixar claro que não existe
uma teoria exclusiva do turismo, pois este compreende muitos setores e áreas, nos quais
podem ser aplicadas corretamente várias abordagens teóricas, e como decorrência pode-se
afirmar que não haverá uma perspectiva sociológica única, reclamando para si o monopólio
da compreensão do fenômeno turístico. Assim, pode-se afirmar que a sociologia por si só
apresenta somente uma interpretação parcial do fenômeno multifacetado do turismo. Para se
obter um resultado mais completo, é necessário combinar os resultados obtidos com aqueles
que foram conseguidos com outras disciplinas do campo das ciências sociais.
Ainda segundo Cohen apud Dias (2008), a Sociologia do Turismo é uma
especialidade interessada no estudo das motivações turísticas, papéis, relacionamentos e
instituições e de seus impactos nos turistas e nas sociedades que os recebem. E, em seu
domínio, apresenta quatro áreas de estudo:

                                                            
4
Segundo Beni (2000, p. 32 e 33), existe uma grande controvérsia na definição precisa do turismo. Alguns autores tratam-
no como indústria e parece ser este qualitativo o de maior uso na literatura comum, não científica. Outros tratam-no
como fenômeno econômico e social, setor econômico ou atividade social e econômica. Alberto Sessa definiu o turismo
não como uma atividade terciária, mas como uma atividade industrial real porque nele existe um processo de
transformação de matérias-primas para a elaboração de produtos que são comercializados e consumidos no mercado.
Convém aqui mencionar Palomo que, em seu livro, define o turismo como atividade econômica pelos seguintes
motivos:
a) a propensão a viajar é um ato humano;
b) a recreação é uma atividade desenvolvida por indivíduos, isolada ou grupalmente;
c) os deslocamentos são atos que compreendem gastos e receitas;
d) o consumo de bens e serviços turísticos pode enquadar-se em mais de uma atividade econômica;
e) a geração de riqueza por meio de um processo produtivo é clara e tipicamente uma atividade econômica.
Ainda segundo Palomo, turismo não é indústria porque esta é um conjunto de operações necessárias para a
transformação de matérias-primas. Com e apesar de Palomo e Sessa, citados como mais uma fonte de definição, a
controvérsia prossegue. Afirmamos que o que ocorre, na realidade, é uma agregação de valores aos diferenciais
turísticos naturais e culturais, e não uma transformação tangível e concreta na matéria-prima original. O produto
turístico final para venda e pós-venda é de natureza compósita e agregada.

 

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a) O turista;
b) A relação entre os turistas e a comunidade local;
c) A estrutura e o funcionamento do sistema turístico;
d) As conseqüências do turismo.
Já para Knebel apud Dias (2008), a Sociologia do Turismo pode ser entendida como
“a ciência que estuda o comportamento social do homem que transforma durante as férias seu
papel social, deixando para trás os diferentes papéis que desempenha (profissional,
econômico, social, etc) e assumindo o papel de turista”.
Ainda segundo o autor, o ponto inicial para o estudo do fenômeno turístico é o
turista, e que há quatro critérios que o definem como tal:
a) A necessidade de mobilidade, que tem sua expressão na mobilidade regional limitada
no tempo;
b) Existência ou inexistência de inter-relações de turistas e habitantes do lugar;
c) Satisfação consumidora de necessidades de luxo com meios obtidos no lugar de
origem;
d) Necessidade de conforto e de segurança física.

Enfim, o objeto de estudo da Sociologia do Turismo são as relações sociais que se


articulam em torno das interações sociais fundamentais, que são as que ocorrem entre os
turistas e a comunidade receptora.

TURISMO COMO FENÔMENO SOCIAL

A Organização Mundial de Turismo – OMT (apud OLIVEIRA, 2005, p. 36) definiu


turismo como “o fenômeno que ocorre quando um ou mais indivíduos se trasladam a um ou
mais locais diferentes de sua residência habitual por um período maior que 24 horas e menor
que 180 dias, sem participar dos mercados de trabalho e capital dos locais visitados”.
Por ser o turismo uma atividade própria de sociedades de consumo, atividade que
combina ações públicas e privadas, ele exige grandes investimentos financeiros e tecnológicos
no fornecimento de bens e serviços aos turistas. Além disso, visa alcançar resultados que

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permitam o desenvolvimento econômico, político, social e cultural da sociedade envolvida.


Esses aspectos são contemplados no conceito que segue:

Dá-se o nome de turismo à atividade humana que é capaz de produzir


resultados de caráter econômico financeiro, político, social e cultural
produzidos numa localidade, decorrentes do relacionamento entre os
visitantes com os locais visitados durante a presença temporária de pessoas
que se deslocam de seu local habitual de residência para outros, de forma
espontânea e sem fins lucrativos (OLIVEIRA, 2005, p. 36).

Se alguns dos fatos que serão citados a seguir ocorrerem numa localidade receptora
de turistas, pode-se afirmar, sem medo de errar, que o turismo está sendo explorado
corretamente. Os fatos são os seguintes: entrada de recursos financeiros pelos gastos
turísticos; formação de novas empresas de serviços; aumento da oferta de empregos nas
empresas públicas e privadas que atendem aos visitantes; estabelecimento da infra-estrutura
urbana (água, luz, rede de esgoto, saneamento básico, comunicação, etc) capaz de responder
às necessidades da própria população e da população flutuante; investimentos em lojas de
souvenires, restaurantes, hotéis, parques de diversões; criação de museus, organização de um
plano diretor de turismo, facilidades para aquisição de material informativo (mapas, folhetos,
revistas, filmes, etc); construção ou reforma de aeroportos, rodoviárias e portos; aparecimento
de escolas de formação de mão-de-obra para o turismo; centros de eventos; aumento do
ingresso de impostos nos cofres públicos com melhoria do padrão de vida da comunidade em
decorrência dos negócios realizados com os turistas; existência de legislação que ordene as
construções e a ocupação do espaço físico; conservação da limpeza das vias e logradouros,
assim como da segurança pública; população falando outro idioma além do próprio; ecologia
defendida e, principalmente, a população sentindo que o turismo traz vantagens para a
comunidade (OLIVEIRA, 2005).
Pode-se considerar todos esses fatos como um conjunto significativo de fenômenos
sociais que passaram a ser aglomerado sob uma mesma palavra – turismo. Os fatos sociais
englobados nesse novo termo passam, portanto, a fazer parte de um subconjunto de
fenômenos perfeitamente identificáveis que nomina-se fenômenos turísticos.
Desta forma, pode-se tomar como referência clássica da sociologia Émile Durkheim
(1858-1917), que tem como objeto de estudo os fatos sociais:

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[...] apresentam características muito especiais: consistem em maneiras de


agir, pensar e sentir exteriores ao indivíduo, e dotadas de um poder
coercitivo em virtude do qual se lhe impõem. (DURKHEIM, 1973, p. 391).

A sociologia é para Durkheim a ciência das instituições sociais, de sua gênese e de


seu funcionamento. Instituições, no caso, entendidas em seu sentido largo que abrange
também as crianças, valores e comportamentos instituídos. Os estudos devem recair sobre
fatos que se conhecem, que se realizem e sejam passíveis de observação.
Sejam eles crenças e práticas constituídas (regras jurídicas, morais, dogmas
religiosos, sistemas financeiros, etc) ou correntes sociais, que são manifestações (de
entusiasmo, de indignação, de piedade, etc). Essas manifestações que podem ser passageiras,
e que nos levam a possibilidade de nos conduzir a ações que poderiam contrariar nossa
própria natureza, apresentam um princípio que segundo Durkheim:

[...] aplica-se também aos movimentos de opinião mais duradouros que se


produzem incessantemente à nossa volta, mesmo em círculos mais restritos,
sobre questões religiosas, políticas, literárias, artísticas, etc. (1973, p. 392)

Desse modo, para o sociólogo, o fenômeno social constitui-se do fato social, que
pode ser religioso, político, literário, artístico, etc e que é externo ao indivíduo e determinador
de suas ações. A sociedade, que é externa aos indivíduos, determina as interações sociais.
Segundo Tura et al (2004, p. 35), o fato social devia estar desembaraçado de razões e
impulsos pessoais, das consciências individuais e de todo o conjunto de idéias longamente
formuladas pela filosofia a respeito da vida em sociedade.
Ainda segundo Durkheim (1987, p. 11), o fato social é toda maneira de agir fixa ou
não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior e a primeira regra para sua
observação é considerá-lo como coisa.
Como objeto da sociologia, o fato social possui três características:
• Coerção Social: trata-se da força que os fatos exercem sobre os indivíduos que se vêm
obrigados a seguir as regras e os comportamentos da sociedade;
• Exterioridade: existe e atua sobre o indivíduo independente da sua vontade;

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• Generalidade: é social todo fato que é geral, que se repete, que é comum a todos ou a
maioria dos membros de um grupo. Representa o consenso social e a vontade coletiva.

De acordo com essa análise, pode-se identificar o fato social turístico, que repreende
os indivíduos, fazendo-os assumir papéis relacionados com esse fenômeno em particular.
Quando o indivíduo se coloca no papel de turista, por exemplo, costuma se comportar de
forma diferente do seu dia-a-dia, extravasando suas emoções, muitas vezes reprimidas pelo
seu ambiente comum. O fato social turístico apresenta, portanto, maneiras de agir, pensar e
sentir que são exteriores ao indivíduo, e que se lhe impõem, pois são dotadas de um poder
coercitivo específico.
Segundo Dias (2008, p. 13), “todas as interações que ocorrem no turismo compõem-
se de ações provocadas pelo poder coercitivo de um tipo de fato social particular, que
denomina-se turismo”. Em outras palavras, a comunidade de uma região turística, os
hoteleiros, demais pessoas que trabalham no setor e, principalmente, os turistas assumem um
comportamento que lhes é imposto pelo poder coercitivo que exerce o turismo como fato
social, atitudes estas que são diferentes daquelas que assumem quando integram outros tipos
de fenômenos sociais, como a religião, a política, o sistema financeiro, etc, no qual assumem
posturas que se identificam com cada tipo em particular.
Enquanto Durkheim prioriza a sociedade na análise dos fenômenos sociais,
considerando-a externa aos indivíduos e determinadora de suas ações, Max Weber prioriza o
papel dos atores e suas ações individuais reciprocamente referidas. A sociedade, para Weber,
deve ser compreendida com base nesse conjunto de interações sociais.
A sociologia para Weber (1991, p. 03), significa “uma ciência que pretende
compreender interpretativamente a ação social e assim explicá-la causalmente em seu curso e
em seus efeitos”. A ação social conquista o significado de uma ação que, quanto ao sentido
visado pelo indivíduo, tem como referência o comportamento dos outros, orientando-se por
estes em seu curso. Exemplo: a ação de comprar uma roupa é realizada a partir de um
conjunto de opiniões de outras pessoas, entre as quais o vendedor, a mãe, o namorado, os
amigos, etc.

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Dessa forma, a ação social, orienta-se pelo comportamento de outros, seja este
passado, presente ou esperado como futuro. Os “outros” podem ser pessoas conhecidas ou
completamente desconhecidas.
Assim, segundo Dias (2008, p. 14), a interação turista-comunidade “constitui-se num
fenômeno social, pois seus agentes têm um ao outro como referência para seus atos”. Da
mesma forma, podem ser tratadas todas as interações existentes no âmbito do turismo, que de
uma forma geral tomam o comportamento do turista como referência, orientando-se seus atos
a partir desse parâmetro.
Após determinado a definição de ação social, explicam-se seus diferentes tipos, de
acordo com as ações de seus indivíduos. Segundo Weber (1991, p. 15), a ação social pode ser
assim classificada: “a. racional, referente a fins; b. racional, referente a valores; c. afetivo,
especialmente emocional; d. tradicional.”.
a) Ação Social Racional referente aos fins: é determinada pelo cálculo racional que
estabelece os fins e organiza os meios necessários. Por exemplo: o turista
escolherá seu destino de viagem levando em conta as acomodações, o preço, às
facilidades de acesso, etc;
b) Ação Social referente a valores: é determinada pela importância do valor, não
importando o êxito que se possa obter assumindo-se esse valor. É uma ação social
valorizada socialmente, e é relevante a opinião do grupo social ao qual pertence o
indivíduo. A escolha do destino, por parte do turista, considerará os valores do
grupo social ao qual pertence. Por exemplo: pode ser fundamentalmente
importante para si e para sua família uma viagem pela Europa, pois integra uma
das ações exigidas para os integrantes de seu grupo de status. As viagens por
motivos religiosos incluem-se nessa categoria.
c) Ação Social de modo afetivo: é determinada pelos afetos ou estados emocionais; a
relação entre os indivíduos expressa-se em termos de lealdade e incompatibilidade.
A escolha do destino turístico será motivada pela emoção, sentimentos etc. Poderá
escolhê-lo por ter sido onde passou a lua de mel, ou por ter sido o local onde seus
pais nasceram, ou porque gosta de lugares quentes, etc.
d) Ação Social de modo tradicional: é determinada pelas tradições, pelos costumes
inveterados. O destino turístico nesse caso será escolhido em função dos costumes
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e tradições adquiridas. A ida ao litoral nas férias e principalmente nos feriados


prolongados é uma tradição dos moradores mais antigos da capital paulista. As
férias de fim de ano já há o costume de viajar com a família, por conta das férias
escolares, para lugares com muita praia e sol; nas férias de julho a maioria dos
brasileiros procura o frio como opção.

Com isso, fica evidente que as ações sociais não são determinadas, de modo geral,
por um único tipo. A ação social para Weber é um componente universal e específico na vida
social e fundamental para a organização da sociedade humana.
Pode-se observar a partir das diferentes abordagens utilizadas por Weber e
Durkheim, que o turismo é um fenômeno social, perfeitamente caracterizado e como tal
passível de ser abordado por uma disciplina específica que corresponde a uma parte da
Sociologia que denomina-se Sociologia do Turismo (DIAS, 2008).

SOCIEDADE INDUSTRIAL

Pode-se considerar a Revolução Industrial do século XVIII, na Inglaterra, como o


acontecimento mais importante na transformação geral do conceito de viagens. Com ela
vieram a urbanização e as horas de trabalho limitadas. Também o ócio passou a ter valor mais
importante que antes, quando a maioria das pessoas vivia no campo e trabalhava na
agricultura; antigamente, o conceito de “tempo livre”, como o conhecemos hoje, não existia,
porque o conceito de trabalho era diferente do que veio estabelecer-se com a consolidação da
indústria; não havia divisão muito clara entre o “tempo de trabalho” e o “tempo de não-
trabalho”, este dedicado ao lazer e ao descanso. Somente no fim do século XIX e início do
século XX é que as condições de trabalho irão sofrer evolução, com a criação de jornadas que
prevêem fins de semana de descanso e férias anuais. Segundo Trigo (2003), isso ocorre após o
término da Segunda Guerra Mundial, quando alguns países capitalistas e (então) socialistas se
estabilizam e começam a garantir, para importantes parcelas de suas populações, a
possibilidade pluralista e democrática de se dedicar a atividades de sua escolha. Isso foi
possível graças a várias conquistas das classes trabalhadoras e ao entendimento de alguns
capitalistas, como Henry Ford, de que os operários deveriam ter um salário mais digno e
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tempo livre para aumentar o mercado de consumo e, conseqüentemente, os lucros dos


empresários. Para Weber apud Carvalho (2005, p. 44): “O Ocidente veio a conhecer, na era
moderna, um tipo completamente diverso e nunca antes encontrado de capitalismo: a
organização capitalística racional assentada no trabalho livre”.
Atualmente, a economia reina, em nossa civilização. Ela dita a conduta a adotar. A
exploração dos recursos naturais, a escala de valores do homem e a política do Estado caíram
sob seu domínio e a ela estão subordinados.
Houve uma “economização” de todas as esferas da existência. Do nascimento à
morte, todas as atividades estão literalmente arriscadas a serem comercializadas. Segundo
Weber apud Carvalho (2005, p. 44 e 45):

A economia capitalista moderna teria se orientado, portanto, pelos interesses


dos homens no mercado, em que o dinheiro e a busca do lucro adquiriram
uma finalidade em si mesmo, destruindo as relações pessoais, resultado da
rivalidade de interesses que o mercado racionalmente organizado exige.

É verdade que apenas após a Segunda Guerra Mundial (cerca de 1950) surge o que
pode ser chamado de turismo de massa acessível às classes médias dos países desenvolvidos.
Todavia, vários analistas internacionais, como John Naisbitt, Peter Drucker, Alain
Touraine e Paul Kennedy, apontam para o fato incontestável de que o setor terciário é hoje
predominante na economia mundial e que o entretenimento e o turismo em geral têm uma
participação bastante prioritária na construção do PIB5 de vários países e no oferecimento de
serviços para mercados cada vez maiores, além de proporcionar postos de trabalho cada vez
mais exigentes em termos de habilidades profissionais. Para Trigo (2003), o significado desse
desenvolvimento excessivo do setor terciário é, em geral, a caracterização das sociedades do
fim do século XX e início do século XXI, como “pós-industriais” – designação feita
principalmente com base na superação da importância econômica que o setor secundário
representou para os países industrializados desde o fim do século XIX. É válido ressaltar que
o crescimento do lazer e do turismo acontece com mais intensidade após as décadas de 1970 e
1980, ou seja, em plena era “pós-industrial”. Fator importante para esse crescimento foi a
disseminação das novas tecnologias e a globalização, que alavancaram o desenvolvimento do
                                                            
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Produto Interno Bruto
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setor em grande parte do planeta. A nova ordem econômica mundial consolidou-se nos
últimos anos e o fenômeno da globalização afeta cada vez mais todos os países,
desenvolvidos e/ou em desenvolvimento.
Como resposta a esse movimento e à padronização que acontece no setor, tem
ocorrido um crescente reconhecimento do valor da diversidade cultural. Paralelamente, esse
reconhecimento é um desejo consciente de manter e divulgar as características únicas e
especiais de grupos étnicos e sociedades receptivas como um princípio fundamental de
promoção e desenvolvimento do turismo.

CONSIDERAÇÕES

A atual situação mundial do setor de serviços refuta a tendência que predominou


durante a maior parte do século XX, quando a indústria garantia aos trabalhadores, mesmo
àqueles com pouca qualificação, oportunidades de trabalho e elevação social. Uma série de
mudanças nas condições mundiais, a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, mais
especificamente a partir de 1950, ofereceu condições para a propagação do turismo de massa.
Outro conjunto de alterações estruturais, a partir da década de 1980, permitiu que se
repensasse sobre a importância do lazer e do prazer nas sociedades agora denominadas pós-
industriais. A condição pós-moderna infere a um estilo de vida marcado pelo conforto e bem-
estar. A alta tecnologia e o poderio econômico dos países desenvolvidos possibilitaram
investimentos para grandes projetos nas áreas de lazer e turismo, levando a grandes parcelas
da população novas opções de lazer e entretenimento. Essas novas opções surgem em um
contexto caracterizado por novas exigências de opções de lazer por parte das pessoas e pela
atuação das grandes empresas que criam novas necessidades e possibilidades para as massas,
até mesmo o consumo sugerido de emoções fortes.
Neste novo século, os indicadores econômicos apontam que, nos países
desenvolvidos e em grande parte dos países em desenvolvimento, a maior parte da população
economicamente ativa está no setor terciário, e que a maior parte do Produto Interno Bruto
(PIB) desses países ou regiões provém igualmente do setor de serviços. Isso não quer dizer
que o setor secundário (indústria) tenha se tornado insignificante. Apenas aponta na direção
de que, no início do século XXI, a economia internacional está, em sua maior parte, assentada
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no vasto e complexo setor terciário, que abrange comércio, finanças, transporte, saúde,
educação, publicidade e propaganda, administração pública e privada, comunicações, artes e
cultura, lazer e turismo etc.
Além do suporte tecnológico e das mudanças econômicas, o que contribuiu para o
aumento das viagens e do turismo foi a valorização que as pessoas começaram a fazer das
atividades ligadas ao lazer, às artes, à cultura e aos contatos internacionais. Nesse contexto,
viajar tornou-se mais fácil, até mesmo um hábito, uma prática social ou profissional comum
ou mesmo uma necessidade para vários segmentos sociais (esportistas, empresários,
religiosos, políticos, acadêmicos e profissionais).
As pessoas desejam aproveitar o tempo livre, as férias, para satisfazer os desejos, as
necessidades que não foram realizadas no dia-a-dia do trabalho, que geralmente são
reprimidas, mas são de muita importância para todos. Segundo Krippendorf (2006), o que
acontece são que essas necessidades só podem ser satisfeitas fora e não dentro de casa, exceto
para alguns poucos beneficiados que exercem uma atividade agradável, criativa e variada, que
determinam eles próprios as tarefas do dia e o ritmo do trabalho, que são livres, a quem nada
falta e cujo lar é tão agradável que podem passar as férias no jardim. Todavia, para aqueles
que trabalham o dia todo e fazem parte da sociedade industrial necessitam de período de
descanso. Para eles, o repouso e as férias são sinônimos de sair, de viajar, pois as cidades
pouco se preocupam com o lazer e com as necessidades de relaxamento dos seus habitantes.
A maioria são cidades do trabalho, incompatíveis com uma vida plena.
O que faz uma pessoa viajar, a procurar fora o que não encontra dentro de casa não é
tanto o resultado de um impulso pessoal quanto à influência do meio social, que fornece a
cada um as suas normas existenciais. A decisão pessoal é, de certa forma, condicionada pela
sociedade. Para o homem em estado de carência, a sociedade oferece o turismo, as férias
longe do cotidiano, sob as formas mais diversas e as enfeitam com todas as qualidades,
permitem a evasão, resolvem os problemas, distribuem força e energia, embelezam a
existência e trazem a felicidade (KRIPPENDORF, 2006). Repouso e férias tornam-se
sinônimos de turismo. No entanto, esta necessidade poderia, em muitos casos, ser satisfeita
em casa, se fossem criadas melhores condições. Desta forma, a viagem tornou-se uma norma
social.
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VI Seminário de Pesquisa em Turismo do MERCOSUL (SeminTUR)


Saberes e fazeres no turismo: interfaces
Universidade de Caxias do Sul, RS, Brasil, 09 e 10 de Julho de 2010
 

“As pessoas saem em férias”. Isso faz parte do modo de vida atual da sociedade ou,
mais precisamente, é uma norma evidente, introduzida nos esquemas mentais. Não se diz “o
que você faz nas férias”, mas “aonde você vai nas férias?”.
Não é mais necessária uma justificativa para a viagem no período de férias ou
feriados, mas sim, deve-se ter motivos para não viajar nesses períodos. Em uma sociedade
que já aderiu a essa cultura, ficar em casa pode parecer difícil de justificar sem que haja uma
perda de prestígio social. Não haveria neste caso uma coerção social de fazer o que todos
fazem? Tais influências afetam diretamente uma pessoa carente: seu desejo chama-se turismo
e a faz acreditar que sua necessidade, na verdade, é uma necessidade turística.
Nesta perspectiva, o turismo, uma “indústria” da diversão e do prazer, em expansão
permanente, assume de forma completa a necessidade de lazer e de férias. É dessa repetição
permanente de necessidades insaciadas e insaciáveis que o ciclo tira sua dinâmica própria. O
turismo funciona como terapia da sociedade, como válvula que faz manter o funcionamento
do mundo de todos os dias.

REFERÊNCIAS

BENI, Mario Carlos. Análise Estrutural do Turismo. 3ed. São Paulo: Editora Senac, 2000.

CARVALHO, Alonso Bezerra de. Max Weber: modernidade, ciência e educação. Petrópolis,
RJ: Vozes, 2005.

DIAS, Reinaldo. Sociologia do Turismo. São Paulo: Atlas, 2008.

DURKHEIM, Émile. As regras do Método Sociológico. São Paulo: Abril, 1973. (Os
Pensadores, 33).

_____. As regras do Método Sociológico. 13 ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional,
1987.

KRIPPENDORF, Jost. Sociologia do Turismo: Para uma nova compreensão do lazer e das
viagens. 3 ed. São Paulo: Aleph, 2006.

OLIVEIRA, Antônio Pereira. Turismo e Desenvolvimento: planejamento e organização. 5


ed. São Paulo: Atlas, 2005.
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Saberes e fazeres no turismo: interfaces
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TRIGO, Luiz Gonzaga Godói. A Sociedade Pós-Industrial e o Profissional em Turismo. 7


ed. Campinas, SP: Papirus, 2003.
WEBER, Max. Economia e Sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Brasília:
UnB, 1991.

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