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CAMPANHAS

ELEITORAIS
D iá l o g o Po l í t i c o © Konrad-Adenauer-Stiftung
v Ano xxxviii, n.º 1, 2022 Plaza Independencia 749, oficina 201
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responsabilidade exclusiva de comum, para fortalecer o centro
seus autores e não expressam político a partir de suas raízes social-
necessariamente o pensamento do cristãs, liberais e conservadoras.
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Índice

4

Prólogo
Campanhas eleitorais 54

O papel da Internet
em campanhas: lições aprendidas
Marta Rebolledo de la Calle

6

Como serão as campanhas eleito-
rais do futuro?
Roberto Rodríguez Andrés 62 Jornalistas e políticos,
uma relação necessária
Verónica Fumanal

14

Assim deve ser uma líder política
María Gabriela Ortega Jarrín
70 Audácia e antecipação:
novas tendências

22

Erros a evitar
em campanhas eleitorais
Yehonatan Abelson

na publicidade eleitoral
Ricardo Amado Castillo

30 Liderança em tempos
de desconfiança
78

A arte de contar histórias:
por que os relatos funcionam
María Gabriela Páez
Ignacio Martín Granados

40

Pesquisas? Sim, obrigado
Verónica Crespo Val
86 O que podemos aprender
com as campanhas eleitorais
na Roma antiga?
Thomas Schaumberg

48

É a mensagem, estúpido!
Kike Borba
Prólogo

Campanhas eleitorais
As eleições não são tudo na democracia, mas certamente sem elas não há
democracia. Não são um mal necessário, senão um elemento que define a quali-
dade democrática e o elemento-chave que dota as autoridades de legitimidade.
O mesmo se aplica às campanhas eleitorais. As pessoas não votam apenas pela
campanha, mas, sem uma campanha eleitoral profissional e bem planejada, di-
ficilmente se ganha na democracia.
O ponto de partida desta edição especial de Diálogo Político é a cole-
ção de podcasts En Campaña publicada durante 2021 em colaboração com mas
Consulting da Espanha. A coleção recorre diferentes aspectos das campanhas
eleitorais, seus problemas e desafios para o futuro.
Os textos aqui apresentados abordam as diversas áreas que compõem uma
campanha eleitoral e complementam e aprofundam aquelas reflexões:

– Como são construídas as lideranças, principalmente a feminina, em tem-


pos de desconfiança?
– Qual é o papel da pesquisa eleitoral no planejamento da campanha e na cor-
reção de erros?
– Como serão, no futuro, as campanhas, as pesquisas e a construção da men-
sagem? Nesse sentido, qual será o papel da arte de contar histórias?
– Qual será a relevância das redes e da publicidade?
– E, finalmente, qual será o papel do jornalismo e da gestão das mídias?

Com este número especial de Diálogo Político, confirma-se uma mu-


dança conceitual importante das edições especiais. Elas já não estão centradas
em conteúdos associados à conjuntura, mas sim em textos que permanecerão
vigentes por um período mais extenso. Esperamos que se convertam, junto com
os podcasts, em insumos de utilidade para quem está na atividade política, espe-
cialmente com vistas às suas campanhas eleitorais.

4 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


O capítulo final nos mostra que alguns desafios das campanhas eleitorais
são de longa data e que podemos aprender com aqueles precursores de nossos
tempos. A demagogia e a tentativa de manipulação da opinião pública com di-
ferentes artifícios já eram comuns há quase dois milênios.
A democracia está e estará sempre em debate, diante de suas próprias fra-
quezas e de tentações populistas e autocráticas. Estas se propõem a prescindir
dos partidos políticos e contornar a institucionalidade, em troca de um enga-
noso vínculo direto entre os líderes e o povo por fora dos canais institucionais.
As campanhas eleitorais limpas, transparentes e honestas garantem a legiti-
midade dos governantes.
Nesse sentido, um agradecimento especial à equipe de mas Consulting tan-
to na realização tanto dos podcasts quanto desta edição especial.
Diálogo Político, no marco do Programa Regional Partidos Políticos e
Democracia na América Latina da Fundação Konrad Adenauer, oferece um
âmbito de discussão e proposta. A partir disso, conectados e comprometidos
com a liberdade dos indivíduos em uma sociedade fundada no Estado de Di-
reito, queremos dar nossa contribuição.

Sebastian Grundberger
Diretor do Programa Regional
Partidos Políticos e Democracia na América Latina
Fundação Konrad Adenauer

Manfred Steffen
Chefe de Redação
Diálogo Político

CAMPANHAS ELEITORAIS 5
Como serão
as campanhas eleitorais
do futuro?

Roberto Rodríguez Andrés

Podcast
“Cómo planificar con éxito
una campaña electoral”

6 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


O desenvolvimento da comunicação eleitoral anda de mãos
dadas com as novas tecnologias. Portanto, a recente evolução dos
meios, com a incorporação das redes sociais e da publicidade
individualizada, criou uma revolução na comunicação política que
este capítulo resume em dez tendências.

A prática da comunicação política e, com « Não se pode persuadir


ela, a gestão das campanhas eleitorais sem- quem não se conhece e,
pre esteve muito condicionada pelos avan-
por isso, uma das chaves em
ços tecnológicos em dois campos muito es-
pecíficos. Em primeiro lugar, aquele relativo qualquer campanha eleitoral
aos meios, plataformas ou ferramentas que sempre foi conhecer
existiram em cada momento para favorecer a fundo o público. »
a comunicação entre políticos e cidadãos. E,
em segundo lugar, aquele relacionado ao co-
nhecimento preciso de como são os eleitores análise de big data. Por outro lado, vemos
e como pensam, sentem e agem. A respeito também como os avanços tecnológicos es-
disso, os clássicos já diziam que não se pode tão transformando o panorama da comuni-
persuadir quem não se conhece e, por isso, cação, com um protagonismo cada vez mais
uma das chaves em qualquer campanha elei- proeminente da internet e das redes sociais,
toral sempre foi conhecer a fundo o público. mas também de outras vias ou plataformas
Esses dois fatores estiveram já muito pre- de comunicação digitais que estão sendo
sentes, por exemplo, no próprio nascimento implementados em alta velocidade.
do marketing político em meados do século Essas mudanças, das quais se fala no se-
xx nos Estados Unidos, quando a indústria gundo episódio do podcast En Campaña so-
das sondagens começou a aperfeiçoar suas bre como planejar com êxito uma campanha
técnicas e a televisão converteu-se em um eleitoral, nos permitem vislumbrar desafios
meio de massas com grande influência so- de grande importância para a comunicação
cial. E, nestas primeiras décadas do século política dos próximos anos, que podem ser
xxi, os avanços nestes dois campos voltam resumidos nos dez pontos a seguir:
a nos colocar frente a uma mudança mais 1. Um eleitorado cada vez mais conecta-
do que previsível de paradigma na comuni- do, com campanhas cada vez mais depen-
cação política, de que já pudemos ver sinto- dentes da tecnologia. Desde a campanha
mas nas últimas eleições. eleitoral de Obama em 2008, a internet e as
Assistimos, por um lado, a avanços cada redes sociais vêm ganhando cada vez mais
vez mais substanciais no conhecimento do protagonismo na comunicação política.
comportamento humano graças a campos No entanto, a televisão não chegou a ceder
como as neurociências e também a partir da seu trono como o meio mais influente. Até

COMO SERÃO AS CAMPANHAS ELEITORAIS DO FUTURO? 7


quando vai seguir sendo assim? As campa-
nhas do futuro vão ser definitivamente mais
dependentes do ambiente digital do que da
televisão, porque essa está sendo a evolu-
ção das audiências. Além disso, este proces-
so viu-se acelerado pela pandemia do novo
coronavírus. Os partidos devem ser capazes
de contar com infraestruturas e equipes de
campanha suficientemente dimensionadas
para poder enfrentar este desafio, que em
boa medida é técnico, mas também, como
apontaremos mais adiante, de formas e esti-
lo de comunicar.
2. Uma comunicação política projeta-
da preferencialmente pensando nos tele-
fones celulares. O celular vai ser (se já não
é) o meio preferencial de atenção dos cida-
dãos, ao qual destinamos mais minutos de
consumo diário. Pelo celular nos informa-
mos e entretemos, fazemos compras e ges-
tões, geramos e compartilhamos conteúdo,
mantemos contato com nossos entes que-
ridos, conhecemos e interagimos com no-
vas pessoas, nos envolvemos em causas de
todo tipo... Os celulares nos permitem co-
nectividade em qualquer momento e em não significa que a linguagem audiovisual
qualquer lugar, quebrando as barreiras físi- também esteja em declínio. Muito pelo con-
cas, geográficas ou temporais que condicio- trário. As mensagens que predominam em
nam os meios tradicionais. Portanto, os te- sites e redes sociais ou aquelas que compar-
lefones celulares já são (e serão ainda mais tilhamos por meio de aplicativos de men-
no futuro) o principal canal para veicular a sagens instantâneas também são baseadas
comunicação política. Isso exigirá que par- em imagem e som. O vídeo de curta dura-
tidos e candidatos se adaptem ao formato ção, conciso na mensagem, mas ao mesmo
próprio deste suporte, pensando não ape- tempo emotivo e impactante, vai seguir sen-
nas em uma comunicação unidirecional de do o padrão na comunicação política, assim
lançamento de mensagens, mas também em como as transmissões ao vivo, que ganham
como responder às demandas dos cidadãos cada vez mais peso. Em certa medida, isso
e em como conseguir mobilizá-los e envol- significa também que o infoentretenimen-
vê-los para que interajam, colaborem e par- to continuará prevalecendo nas campanhas
ticipem ativamente das campanhas. E tudo eleitorais, porque é um dos recursos mais
isso em tempo real, já que esta é a velocida- efetivos para gerar atenção e lograr virali-
de que este meio impõe. zação das mensagens, atingindo assim uma
3. A comunicação política vai seguir audiência maior e não apenas os que estão
priorizando o audiovisual. O fato de a te- interessados em questões políticas. Os par-
levisão convencional estar perdendo poder tidos e candidatos devem ser capazes de se

8 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


conectar com as pessoas em poucos segun- videoconferências... As possibilidades para
dos e oferecer-lhes algo que consiga fisgá-las os usuários são cada vez mais numerosas
para que não se desconectem. e, com isso, se está produzindo a própria
4. Uma audiência cada vez mais mul- fragmentação das audiências, que agora es-
ticanal e fragmentada. Mas chegar à au- tão muito mais dispersas. Isso implica que,
diência, como foi dito no ponto anterior, é para se dirigir a um número de eleitores
cada vez mais difícil. Os meios de comu- igualmente massivo que em épocas passa-
nicação tradicionais, sobretudo a televisão, das, precisa-se agora de um esforço muito
permitiam que os partidos alcançassem maior, porque é necessário lançar a mensa-
públicos massivos, por meio de notícias ou gem por meio de múltiplos canais ao mes-
publicidade. No entanto, a tecnologia nos mo tempo. Uma mensagem que, ademais,
trouxe uma enorme fragmentação de ca- dificilmente pode seguir sendo comum a
nais, plataformas e vias de comunicação. todos eles e que obriga os partidos e candi-
Além da imprensa, rádio, cinema ou tele- datos a adaptarem-se às peculiaridades e à
visão, foram chegando sites, blogs e redes linguagem própria de cada canal.
sociais, canais de podcasts, apps, emisso- 5. Uma audiência cada vez menos mi-
ras de televisão digital e por satélite, pla- diatizada, o que obriga a reforçar os canais
taformas de streaming, videogames, jogos de comunicação próprios da campanha. A
online, realidade virtual, ferramentas de perda de audiência e poder dos meios tra-
mensagens instantâneas, videochamadas e dicionais está implicando na ruptura de um

COMO SERÃO AS CAMPANHAS ELEITORAIS DO FUTURO? 9


dos princípios básicos da comunicação polí- « O que hoje nos parece
tica, aquele que preconizava a midiatização novo e atrativo acaba
da política. Tradicionalmente, os jornalistas
ficando velho em muito
eram os responsáveis pela mediação entre
os partidos e a opinião pública, o que lhes pouco tempo, e nos leva a
conferia uma grande capacidade de influên- reivindicar novidades de
cia. Eles eram os encarregados de marcar a maneira compulsiva. »
agenda de temas, de selecionar os enfoques
que acabavam sendo notícia, de elevar ou
derrubar um candidato com seus elogios cionando conteúdos específicos para cada
ou críticas. E, embora seja verdade que os um dos eleitores em função de suas prefe-
meios seguem conservando parte deste po- rências e interesses, numa espécie de cam-
der de mediação, inclusive no ambiente di- panha à la carte.
gital, este é cada vez menor, porque há mui- 7. A inteligência artificial será cada vez
tos cidadãos que desviam dos meios e vão mais importante na tomada de decisões na
diretamente para os canais de comunicação comunicação política. A inteligência artifi-
do candidato. Isto é uma oportunidade para cial está revolucionando inúmeras discipli-
as equipes de campanha, mas as obriga a re- nas nos últimos anos. As máquinas já estão
forçar esses canais, gerando conteúdos de por trás de muitas decisões que são tomadas
qualidade, suficientemente atrativos e dinâ- em grandes empresas, ajudando-as a serem
micos para manter o interesse dos eleitores mais eficientes, otimizando processos e re-
e definir a agenda, inclusive tentando condi- duzindo prazos e custos. E este cenário está
cionar com eles a própria agenda midiática. chegando também à comunicação política.
6. Campanhas cada vez mais micros- A inteligência artificial pode estar por trás
segmentadas que acabarão sendo indivi- de muitos dos pontos que mencionamos an-
dualizadas. As neurociências e o big data teriormente. Pode nos ajudar a processar os
estão permitindo que os partidos acumu- dados para tirar conclusões operacionais e
lem uma grande quantidade de informa- projetar estratégias melhores, a traçar per-
ção sobre os eleitores. Mas os dados, por fis psicológicos muito precisos dos eleito-
si só, não aportam nada. O importante é o res, a determinar as mensagens mais efeti-
seu tratamento correto, para que toda esta vas para cada um deles, a ser cada vez mais
informação sirva para conhecer os cida- precisos nas predições de resultados... As
dãos de uma forma muito precisa. Se so- máquinas vão estar inclusive do outro lado
marmos a isso as possibilidades oferecidas do celular quando forem realizadas campa-
pela geolocalização, o resultado é um cená- nhas de telemarketing, vão escrever mensa-
rio em que os candidatos podem estabelecer gens e e-mails mais efetivos, vão responder
microssegmentações do eleitorado que se- aos cidadãos nas redes sociais ou por meio
rão cada vez mais decisivas na hora de pla- de chatbox ou de aplicativos como Siri ou
nejar os esforços comunicativos e publici- Alexa. Chegaremos a ver robôs humanoides
tários em eleições, priorizando os recursos usados em campanhas e, quem sabe, talvez
naqueles segmentos que sejam verdadeira- um dia, até como candidatos.
mente determinantes para obter o êxito. E, 8. Eleitores cada vez mais polarizados
em um futuro não muito distante, a tecno- e aparentemente firmes na defesa de de-
logia acabará permitindo até mesmo que as terminados valores, mas, ao mesmo tem-
campanhas sejam individualizadas, propor- po, cada vez mais voláteis no seu com-

10 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


portamento eleitoral. Nos últimos anos, « En un momento
estamos assistindo a um fenômeno à pri- de fuerte crisis e
meira vista contraditório e que está mol-
incertidumbre, como la
dando o novo cenário eleitoral. Por um
lado, o eleitorado está cada vez mais divi- vivida por el coronavirus, la
dido e polarizado em torno de posiciona- sociedad podría virar hacia
mentos muito definidos e, aparentemente, líderes más prudentes y
estáveis ao longo do tempo. Contudo, por
motivadores, que generen
outro lado, não se deve esquecer que a so-
ciedade atual, como Bauman prognosticou, confianza y seguridad. »
não é marcada precisamente pela estabili-
dade, mas sim pelo temporário ou líquido: surpreendem e acabam ganhando eleições
o que hoje nos parece novo e atrativo aca- com apenas alguns meses de campanha.
ba ficando velho em muito pouco tempo, Isso reforça a necessidade de os partidos se
e nos leva a reivindicar novidades de ma- preocuparem mais do que nunca com a fi-
neira compulsiva. Isso também afeta a po- delidade de seus eleitores, procurando não
lítica e as campanhas eleitorais. Partidos frustá-los. Mas isso é cada vez mais difícil,
aparentemente sólidos, com muito apoio porque os eleitores hoje em dia não esco-
em umas eleições, pode ser que em quatro lhem um programa eleitoral, nem mesmo
anos acabem desaparecendo, vítimas da algumas promessas. Recompensam aquele
transferência do voto para outras forma- que lhes passa confiança de ser firme na de-
ções. E novos líderes quase desconhecidos fesa de determinados valores, e isso os leva

COMO SERÃO AS CAMPANHAS ELEITORAIS DO FUTURO? 11


« Em um momento de meira pessoa os valores e as mensagens da
forte crise e incerteza, candidatura. Mas o que ainda desconhece-
mos é que tipo de liderança vai predominar.
como a vivida em função
Há quem diga que é previsível que a época
do novo coronavírus, de líderes populistas que tivemos nas últi-
a sociedade poderia se mas décadas irá decaindo. Em um momen-
voltar para líderes mais to de forte crise e incerteza, como a vivida
em função do novo coronavírus, a socieda-
prudentes e motivadores, de poderia se voltar para líderes mais pru-
que gerem confiança dentes e motivadores, que gerem confiança
e segurança. » e segurança, que sejam menos carismáticos,
mas capazes de chegar a consensos e traba-
lhar em equipe. No entanto, há quem apon-
inclusive a polarizar-se em seu apoio. Se te em uma direção oposta, a de que este am-
percebem que não faz ou que vacila nessa biente propiciará justamente o contrário, o
defesa, automaticamente viram as costas e, reforço do populismo. Além disso, a pola-
além disso, pode ser que em muito pouco rização pode nos encaminhar a um mode-
tempo. Por isso é tão importante saber de- lo de hiperliderança baseado em líderes for-
tectar no início da campanha quais são os tes e executores, capazes de dirigir o grupo,
principais valores que estão na mesa, aque- de enfrentar seus oponentes com determi-
les que podem marcar o campo de jogo e nação e de lutar por suas ideias e seus prin-
mover a opinião pública em uma direção cípios, o que pode nos levar a campanhas
ou outra. Isso sempre foi feito na comuni- cada vez mais duras e negativas.
cação política, mas as sociedades líquidas 10. Precisaremos reforçar a ética da co-
nos obrigam a agir em um período de tem- municação política se queremos demo-
po muito mais apertado. A tecnologia pode cracias melhores. Os consultores políticos
ajudar a identificar esses valores com base trabalham para conseguir o êxito de seus
no conhecimento dos eleitores, mas tam- candidatos em uma campanha. Mas, nes-
bém é preciso o dom da oportunidade, um se caminho, há momentos em que se esque-
sexto sentido para ler corretamente o con- ceram da ética e justificaram qualquer meio
texto e muito trabalho para conseguir que para atingir esse fim. Levamos anos assistin-
a visão própria do que está em jogo nessa do a campanhas cada vez mais viscerais, em
campanha seja a que monopolize o deba- que se explora a emotividade como único re-
te público. curso mobilizador do voto, deixando a razão
9. A liderança pessoal seguirá sendo de lado. Campanhas em que o medo foi usa-
chave nas decisões de voto, embora ainda do como espoleta para ganhar dos rivais, fa-
não saibamos que tipo de liderança predo- zendo com que sentimentos como a raiva e
minará. Apoiar um líder acima de um par- o ódio tenham se convertido nos principais
tido vai seguir sendo um elemento subs- motivadores do voto de amplos segmentos
tancial da comunicação política do futuro. da população, que votam mais contra alguém
Nisso, portanto, não estão previstas mudan- do que a favor de alguém. Campanhas em
ças substanciais: a personalização e huma- que não houve obstáculos para usar as men-
nização da política e das campanhas con- tiras ou as fake news para desacreditar um ri-
tinuarão a se desenvolver nas próximas val. Campanhas, em suma, muito distantes
eleições, nas quais o líder encarnará em pri- da ética, que nos levaram a um aumento do

12 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


descontentamento dos cidadãos com a polí-
tica e, com isso, ao descrédito das democra-
cias. A comunicação política deve ser capaz
de refletir sobre as práticas que desenvolveu
nos últimos anos, propondo-se a emendar
e tratando de combinar em maior medida a
eficácia com a ética.

Roberto
Rodríguez Andrés
Licenciado e doutor em
Jornalismo pela Universi-
dade de Navarra. Diretor
de Comunicação da Ama-
vir e sócio de mas Consulting Group. Pro-
fessor associado da Universidade Pontifícia
de Comillas e professor convidado da Uni-
versidade de Navarra. Lecionou em mais de
uma dezena de universidades, em mestrados
e cursos de pós-graduação sobre comunica-
ção política e campanhas eleitorais, sua área
de investigação, em que escreveu diversos
livros e artigos acadêmicos. Em 2018, rece-
beu em Washington o prêmio internacional
Napolitan Victory Award pela Excelência no
Ensino da Comunicação Política. Anterior-
mente, atuou como diretor adjunto de Co-
municação nos Ministérios de Educação e de
Saúde do Governo da Espanha.

COMO SERÃO AS CAMPANHAS ELEITORAIS DO FUTURO? 13


Assim deve ser
uma líder política

María Gabriela Ortega Jarrín

Podcast
“El candidato”

14 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Uma líder política deve transmitir duas qualidades: autenticidade
e empatia. Se consegue imbuir essas duas virtudes em uma causa
que represente o eleitorado e a si mesma, poderá comunicar com
efetividade sua posição e obter a credibilidade do projeto político
que representa perante os eleitores.

Se você está se perguntando por que este tex- « Há duas características


to é intitulado no feminino, talvez a primei- que reconheci nos meus pais
ra resposta seja porque quase tudo que se es-
em momentos específicos
creve sobre candidaturas e liderança está no
masculino, e eu gostaria de dar uma contri- e que agora são atributos
buição falando sobre as candidatas e as mu- essenciais em uma liderança:
lheres líderes [lideresas, em espanhol] como a autenticidade e a empatia. »
conceitos que generalizem homens e mulhe-
res. E como segunda resposta à pergunta,
gostaria que o título seja um alarde de ilusão Agora, com o passar do tempo, me dou
e que, no futuro, haja mais mulheres candi- conta de que há duas características que re-
datas e líderes, que já é hora de deixar no pas- conheci nos meus pais em momentos espe-
sado a masculinização destes temas. Se você cíficos e que agora são atributos essenciais
é um senhor, candidato, continue lendo, as- em uma liderança: a autenticidade e a em-
sim alcançaremos dois objetivos: nos capaci- patia. O primeiro é definido pela rae [Real
tar em comunicação política e romper com o Academia Española] como ‘qualidade do au-
estereótipo de gênero. têntico’, enquanto autêntico significa ‘cre-
Entrando no assunto, lembre a primeira denciado como certo e verdadeiro pelos ca-
vez em que viu seu pai ou sua mãe como um racteres ou requisitos que nele concorrem’;
herói ou heroína. Se evoco esses momentos muito mais clara é a definição que o Oxford
na minha vida, imediatamente projetam- Dictionary faz de authenticity: ‘qualidade de
-se dois instantes da minha infância. O pri- ser real ou verdadeiro’. Este atributo aplica-
meiro, sentada entre um público de mais de do ao modo de ser de uma pessoa e, mais
cem pessoas, vendo o meu pai em cima de especificamente, de uma líder política, en-
um palco prestes a dar uma palestra e dizen- fatiza que não é imposto ou construído sob
do “tiro o paletó e a gravata porque quando parâmetros esperados de um eleitorado que
gosto do meu trabalho gosto de estar con- não correspondem ao que é a política.
fortável”; eu, internamente, pensei “uau, é o Depois da pandemia, a valorização das
que ele faz quando jogamos”. E o segundo figuras políticas que mais aumentou é a dos
instante é ver minha mãe desconsolada por- gestores locais. Por um lado, pela proximi-
que havia tido que demitir dois de seus co- dade das autoridades municipais e, por ou-
legas de trabalho. tro, consequentemente, pela tangibilidade

ASSIM DEVE SER UMA LÍDER POLÍTICA 15


da gestão, que permitiu aos cidadãos ver fa- Antes de continuar a falando sobre lide-
tos e não apenas palavras. A concretização rança, cabe ressaltar que existe um vasto le-
da mensagem em ações fez com que os car- que de autores que estudam e conceituam
gos de gestão direta com a cidadania fossem este termo a partir de diferentes perspecti-
os mais valorizados; obviamente, aqueles que vas, embora, em geral, todos girem em tor-
souberam fazer bem o seu trabalho e tam- no da capacidade de transmitir a outros uma
bém comunicá-lo. Por exemplo, temos o caso causa com a qual possam se sentir identifi-
do salto para a política nacional da prefeita cados para se mobilizar. É possível dizer que
de Paris, Anne Hidalgo, graças à boa ava- a liderança é a capacidade de atrair segui-
liação de sua gestão no nível local (Bassets, dores, não para a pessoa, mas para sua cau-
2021); ou o aumento da valorização do prefei- sa. A que nos referimos com causa? Como
to de Madri, José Luis Martínez-Almeida, de alguma vez tive a oportunidade de escu-
4,68 em janeiro de 2019 (Latingua, 2019) para tar meu amigo, semiótico, Marcelo López
6,43 em julho de 2020, justamente no final do (2018), “não se trata do que o candidato é,
confinamento (El País, 2020). mas do que o candidato significa”. Todos os
Por outro lado, a empatia é considerada políticos são símbolos para os eleitores, pois
como um sentimento, uma capacidade das trazem consigo uma série de atributos que
pessoas com inteligência emocional. Princi- os identificam, e as eleições são dilemas que
palmente, trata-se de “identificar-se com al- se resolvem com a vitória de uma pessoa
guém e partilhar os seus sentimentos” (rae, com alguns atributos e não outros.
online). Para isso, é necessário ser conscien- Se falamos de campanhas eleitorais, te-
te tanto de seus pontos fortes como de suas mos que falar sobre o que uma candidata
áreas de melhoria em quanto às emoções e sozinha pode comunicar, por si só, se não
à expressão destas e, dessa forma, reconhe-
cê-las nos outros. O fato de a figura de uma
política ser empática, primeiro, confirma
que ela pensa nos outros e se interessa por
eles; em segundo lugar, confirma que racio-
naliza e controla suas emoções, uma habili-
dade essencial para governar e gerenciar a
maneira como seus atos afetam tanto o con-
junto da cidadania quanto sua equipe de
trabalho.
Tanto a autenticidade quanto a empatia
são duas qualidades que foram recentemente
abordadas na literatura sobre liderança polí-
tica (D’Adamo et al., 2020; Goleman e Boyat-
zis, 2008; Herrero et al., 2019; Molina, 2021;
Rodríguez, 2021) e não pelo acaso de a aca-
demia encontrar nisso um tema interessante,
mas, além disso, porque as últimas eleições
realizadas durante a pandemia e no pós-pan-
demia destacaram um sentimento dos elei-
tores que vinha fermentando há vários anos:
não queremos políticos pré-fabricados.

16 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


« A figura de uma candidata rer ao que foi escrito por López (2018) so-
deve inspirar uma causa, mas bre o ciclo da comunicação que contém cin-
co degraus que são explicadas a seguir:
além disso deve ser capaz de
Interesse. Pode-se até pensar que os cida-
transmiti-la. » dãos escutam as candidatas pelo simples fato
de serem. No entanto, despertar o interesse
tiver um projeto que permita aos eleitores dos públicos-alvo não é fácil e só se consegue
reconhecer um futuro para os anos de go- se o que a candidata propõe atender às neces-
verno com valores que sejam coincidentes. sidades dos públicos-alvo determinados pela
É o que costumamos chamar de inspirar ilu- pesquisa, não todos os eleitores.
são. A figura de uma candidata deve inspi- Conhecimento. Uma vez que se gerou
rar uma causa, mas além disso deve ser ca- o interesse pela candidata, então os elei-
paz de transmiti-la; e, para isso, deve possuir tores, de forma proativa, buscarão infor-
sine qua non as duas características aborda- mação, se interessarão por suas atividades
das anteriormente: autenticidade e empatia. e declarações. Em suma, terão vontade de
Assim, possuir determinadas qualidades conhecê-la.
de liderança é apenas o começo para atrair Afeto. Se o que leram, viram e escuta-
a atenção dos eleitores que, ademais, devem ram da candidata coincide com os atributos
encontrar uma causa compatível com a de- que os eleitores procuram, terão encontra-
les. E, para explicar como se estabelece uma do nela um símbolo no qual se encontram
verdadeira relação de credibilidade entre as representados, iniciando assim uma relação
candidatas e os eleitores, é necessário recor- de afeto.

ASSIM DEVE SER UMA LÍDER POLÍTICA 17


Confiança. Você só pode confiar em al- são todos intangíveis e que se gerenciam a
guém por quem tem afeto; é assim que a es- partir da comunicação. Como posso gerar
cada da confiança, em seu quarto degrau, interesse sem me comunicar ou como al-
trabalha com a própria confiança; quer di- guém pode confiar em mim se nunca nos
zer, não decepcionar o público segundo as comunicamos? E não é necessária uma con-
expectativas que a candidata criou em sua versa, mas simplesmente uma interação en-
audiência. tre candidata e eleitor que permita que esses
Credibilidade. Se a candidata conse- vínculos se abram, não da lógica racional,
guiu despertar interesse, certamente o co- mas da ativação de emoções. Se poderia
nhecimento aumentará por difusão orgâni- pretender conseguir credibilidade sem ter
ca. Posteriormente, conseguirá adeptos que um plano estratégico, o que seria um erro
iniciem uma relação de afeto, que culmina- não só para a gestão de uma campanha elei-
rá em uma relação de confiança não só na toral, mas também, e principalmente, por-
posição política, mas também na pessoal. E que colocaria em risco a reputação da can-
o último degrau: a credibilidade. Conseguir didata, que não teria uma rota para subir os
chegar a este ponto é tão difícil quanto dar o degraus que lhe permitem alcançar credibi-
passo ao primeiro degrau. lidade.
Se prestarmos um pouco de atenção aos Em termos de planejamento estratégico,
nomes dos degraus, nos damos conta de que a comunicação de uma candidata dependerá

18 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


do público ao qual se dirige (target); assim, a « O modelo de liderança
mensagem e o canal serão adaptados a cada será diferente, tanto do
um desses públicos. Sobre o canal, desde o
ponto de vista cultural
surgimento da televisão (como marco na
história da comunicação política, destaca- quanto da conjuntura,
se o debate entre Nixon e Kennedy), a ima- dependendo da cidade,
gem tem especial relevância na profissiona- região ou país. »
lização das campanhas eleitorais, inclusive
sobre a mensagem (Orejuela, 2009).
A personalização da mensagem é uma preensível por seus públicos-alvo e os canais
das ferramentas da comunicação política corretos para alcançá-los. Nesse cenário, o
que permitiu a sua simplificação por meio mais importante é que a marca que que-
da predominância da imagem; no entan- remos projetar de uma figura política seja
to, o aparecimento das redes sociais devol- coerente com a sua identidade, ou seja, que
veu o olhar para a mensagem, para o que não exista informação falsa e que a projeção
as candidatas contam e para se esse storyte- da liderança seja análoga à própria biografia
lling coincide com sua imagem e com o que e qualidades pessoais da candidata, sempre
faze (storydoing). Esse exercício de autentica- potencializando seus pontos fortes enquan-
ção foi possível graças à democratização dos to trabalha suas debilidades.
meios de comunicação em relação ao aces- Assim, não existe uma fórmula para de-
so e à capacidade de publicação de conteú- terminar uma candidata ideal porque o mo-
do quase sem restrições. Antes da internet, delo de liderança será diferente, tanto do
a sociedade se inteirava do que as candida- ponto de vista cultural quanto da conjuntu-
tas queriam comunicar, predominantemen- ra, dependendo da cidade, região ou país. E
te, filtrado por linhas editoriais e intermedia- somente a pesquisa do terreno, dos eleitores
do por formadores de opinião. No entanto, e da concorrência dará luz para gerir a lide-
hoje o acesso ilimitado à grande quantidade rança de uma figura política e saber o que o
de informação que há na internet permite ter eleitorado espera dela. Como se destacou an-
informação praticamente de forma imediata; teriormente, o ponto que devemos ter claro é
a mesma informação que deve ser gerencia- que é preciso incorporar a identidade da can-
da estrategicamente pela equipe de campa- didata na abordagem e desenhar uma estra-
nha, embora, tal como destaca o diretor de tégia que se encaixe nessa identidade, sobre-
mas Consulting, Daniel Ureña, no nono epi- tudo, a partir de seus pontos fortes.
sódio do podcast En Campaña, “o candidato De tal forma, a título de síntese, este ar-
tem que acreditar, assumir e implementar a tigo busca revisar duas características essen-
estratégia” porque senão o desastre está ga- ciais das lideranças políticas atuais: empatia
rantido. A candidata que não crie e não assu- e autenticidade. Deve-se enfatizar que são
ma como própria uma estratégia, não a apli- qualidades de pessoas que se conhecem a si
cará e, portanto, será inexistente. mesmas, que podem reconhecer emoções e
O objetivo final do planejamento estra- características nos demais, que são fiéis aos
tégico para a figura política em campanha é seus princípios e que se apresentam como
conseguir que quem emite a mensagem, pri- são, sem aparecer ou se enquadrar em mol-
meiro, seja reconhecido como alguém com des pré-estabelecidos do que se pode con-
legitimidade para fazê-lo e, segundo, que siderar uma líder. Essas características per-
seja capaz de utilizar uma linguagem com- mitem traçar um planejamento estratégico

ASSIM DEVE SER UMA LÍDER POLÍTICA 19


que transita pelo ciclo da comunicação, que é blicos locales españoles. International Journal
o caminho de toda candidata em uma cam- of Developmental and Educational Psycholo-
panha eleitoral para conseguir um vínculo gy, 4(1), 21-28. https://dehesa.unex.es/bitstre
com seus eleitores. Uma vez atingido o ní- am/10662/11623/1/0214-9877_4_1_21.pdf
vel máximo, a credibilidade — definida pelo Latingua, I. (2019, janeiro 29). Begoña Villa-
dicionário da rae como a ‘qualidade de que cís sería la alcaldesa de Madrid con el
pode ou merece ser acreditado’ —, podemos apoyo del PP y Vox, que adelanta al PSOE.
falar de uma liderança real, uma conquista e El Mundo. https://www.elmundo.es/madri-
tanto na política. d/2019/01/28/5c4f2661fdddffd06f8b45f1.html
López, M. (2018, fevereiro 14). Vota semiótica.
Ver lo que no se ve, oír lo que no se escucha.
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ca-ver-lo-que-no-se-ve-oir-lo-queno-se-es-
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París, Anne Hidalgo, se lanza a la conquista Molina, M. (2021). Un líder para el siglo xxi.
de la presidencia de Francia. El País. https:// La Revista de acop. https://compolitica.com/
elpais.com/internacional/2021-09-10/la-al- un-lider-para-el-siglo-xxi/
caldesa-de-paris-anne-hidalgo-se-lanza-a- Orejuela, S. (2019). Personalización política:
-la-conquista-de-la-presidencia-de-francia. la imagen del político como estrategia elec-
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blicada por Telemadrid. https://elpais.com/
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-nuevo-de-ciudadanos-y-vox-segun-una-
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cional y liderazgo auténtico en los cargos pú-

20 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


María Gabriela
Ortega Jarrín
Doutoranda na Universida-
de Complutense de Madri.
Socióloga e cientista políti-
ca especializada em socio-
demografia e planejamento estratégico de
campanhas eleitorais e comunicação institu-
cional. Trabalhou no Departamento de Re-
solução de Conflitos da Organização dos Es-
tados Americanos (oea) em Washington, no
Instituto Nacional de Estatística (ine) da Es-
panha e como consultora independente em
várias campanhas na América Latina e na
Espanha. A Washington Academy of Politi-
cal Arts & Sciences reconheceu sua trajetó-
ria com o prêmio Líder Emergente em 2016.
Coordena os departamentos de Publicações
e Consultoria do Centro Internacional de
Governo e Marketing Político (cigmap) da
Universidade Camilo José Cela e é vice-dire-
tora da Revista de acop (Associação de Co-
municação Política).

ASSIM DEVE SER UMA LÍDER POLÍTICA 21


Erros a evitar em
campanhas eleitorais

Yehonathan Abelson

Podcast
“Estrategia”

22 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Às vezes é mais efetivo falar sobre erros para contrapor acertos.
Isto é o que faz este texto, que, com uma lista de cinco erros,
reflete as lições aprendidas sobre criação de mensagem, a gestão
de tempo, o planejamento de campanha, o controle de agenda ou a
diferenciação.

Por que escrever sobre erros e não sobre o 1. O candidato como protagonista
que é preciso fazer bem? Primeiro, porque da campanha
há muitos artigos sobre o que fazer e muito
poucos sobre o que não fazer. Por outro lado, Resolvi começar por este erro clássico por-
porque, embora na campanha em que você, que é o mais comum, se repete em todos os
caro leitor, esteja participando, se faça tudo o países e é o mais intuitivo. O clássico quando
que o manual de campanhas diz que é preci- se começa uma campanha é fazê-la ao redor
so fazer, talvez você também esteja cometen- do candidato. Que a foto seja do candidato,
do erros que, mais cedo ou mais tarde, vão que o slogan destaque as qualidades do can-
lhe custar caro no resultado da eleição. didato, que haja vídeos do candidato falan-
Em geral, a maioria dos consultores sa- do para a câmera, que haja outros sorrindo
bemos logo após o início se uma campanha com sua família enquanto um cachorro cor-
é competitiva ou não devido pela quantida- re alegremente no entorno, que as redes so-
de erros que comete. Devo dizer que há sur- ciais tenham milhares de fotos do candidato
presas agradáveis, campanhas que corrigem em diferentes situações, que haja tiktoks em
o rumo, outras que vencem percorrendo os que o candidato dança espetacularmente, ele
caminhos mais improváveis, mas, na gran- inclusive é mostrado jogando futebol e pare-
de maioria dos casos, as eleições são venci- ce que joga bem.
das pelas campanhas que cometem menos Mas… onde estão as pessoas? Sim, as
erros. Por isso, vamos tentar, a partir deste pessoas, aquelas que o candidato preten-
pequeno texto, que você tenha as ferramen- de beneficiar. Também não deveriam fazer
tas básicas para evitar os erros não forçados parte da campanha?
que a maioria das campanhas que fracassam A década de 1990 (há trinta anos já) foi a
comete. década dos meios de comunicação de mas-
Cabe dizer que muitas vezes os erros sa, da televisão, em que grandes ídolos como
muitas vezes se anulam, porque todas as Michael Jackson ou Madonna moviam mul-
campanhas os cometem, o que não per- tidões, a mtv moldava uma geração intei-
mite que nenhuma delas tire proveito des- ra, os jornais vendiam milhões de cópias,
sa situação. A ideia é, justamente, que sua os noticiários marcavam a agenda do dia,
campanha possa sair beneficiada frente aos e os políticos fizeram discursos de um púl-
erros de seus adversários. Comecemos. pito para dezenas de milhares de pessoas.

ERROS A EVITAR EM CAMPANHAS ELEITORAIS 23


Não havia uma comunicação de ida e volta, « Hoje a campanha política
o protagonista emitia informação e nós, os
deve ser um espelho do povo,
espectadores, a recebíamos. Os que hoje te-
mos 35 anos ou mais crescemos e nos forma- refleti-lo, representa-lo. Que
mos nesse mundo, em que todos os holofo- vejam nela seus anseios, seus
tes apontavam para o emissor, e o receptor, sonhos e esperanças. »
sentado confortavelmente em sua poltrona,
só escolhia o que ver, ouvir ou votar.
Nessa década, Giovanni Sartori publicou nho melhor, um pouco mais fácil. O candi-
o livro Homo videns, que descrevia perfeita- dato que ganha aquele que melhor represen-
mente esta relação entre os cidadãos espec- ta os valores da maioria e sua forma de ver
tadores e os políticos protagonistas: a polí- o mundo.
tica como espetáculo. Um ano antes, David Hoje, o cidadão deve ser uma parte iden-
Swanson e Paolo Mancini publicavam o in- titária da campanha, não apenas acessória.
fluente estudo acadêmico Politics, Media, and Transpassar o limite da lente e ser parte das
Modern Democracy, no qual descreviam a de- fotos, participar da elaboração do plano de
mocracia moderna em cinco elementos prin- governo, intervir na comunicação, criar o
cipais, dos quais destacarei dois: a personali- jingle colaborativamente, ser porta-voz, re-
zação da política (os candidatos substituem plicar a mensagem. As pessoas não deveriam
os partidos e as ideologias) e o cidadão como apenas aparecer, senão ser a campanha.
mero espectador do espetáculo político.
Hoje tudo isso mudou, o público exige
ser uma parte ativa do que vê, vota em pro- 2. Pesquisa como despesa
gramas de televisão, gera trending topics no
Twitter, segue suas estrelas favoritas no Ins- Todos concordamos que, para fazer uma
tagram, interage com os streamers da Twi- campanha profissional, é preciso fazer pes-
tch, replica os vídeos do TikTok, viraliza o quisa. De fato, é a única maneira de fazer
conteúdo que gosta ou bloqueia o que não esse tipo de campanhas. Qualquer outra se-
gosta. ria depender da intuição e, portanto, per-
Hoje as pessoas estão no centro da cena e deria o rigor científico. A verdade é que, no
as campanhas políticas não devem ser a ex- mundo real, quando o candidato e sua equi-
ceção. Os cidadãos são quem têm o poder pe se sentam para fazer contas e percebem
do voto, e quem os candidatos devem bene- que os gastos com pesquisa equivalem, por
ficiar. Por isso, eles devem ser os protago- exemplo, a centenas de milhares de panfle-
nistas da campanha. Um candidato sozinho tos ou vários anúncios publicitários, ficam
é um significante incompleto; lhe falta algo, muito relutantes em gastar. “Usamos as pes-
os beneficiários, que são também o público quisas que saem no jornal”, “os militantes fi-
a quem se dirige a mensagem. zeram uma e foi muito bom”, “perguntei às
Hoje a campanha política deve ser um mães da escola do meu filho e disseram-me
espelho do povo, refleti-lo, representá-lo. que...” são as frases mais comuns que su-
Que vejam nela seus anseios, seus sonhos e plantam a pesquisa na maioria das campa-
esperanças. As candidaturas devem ser em- nhas na Ibero-América.
páticas ou, melhor, não ser nada. Os políti- A pesquisa em uma campanha é um in-
cos nada mais são do que uma ferramenta vestimento, ajuda a ser mais efetivos, a dar
para tornar a vida das pessoas um pouqui- sentido à nossa mensagem, a entender o que

24 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


representamos para os eleitores e o que nos- « A pesquisa em uma
sos oponentes representam. Serve para en- campanha é um investimento,
tender seus comportamentos e suas razões.
E, se tivermos sorte, nos serve para saber ajuda a ser mais efetivos,
quais acordes emotivos tocar para conven- a dar sentido à nossa
cê-los a votar em nosso candidato. mensagem, a entender o
Pensar na pesquisa como um gasto é
que representamos para
como entrar em uma sala de cirurgia sem ne-
nhum exame, apenas seguindo a intuição do os eleitores e o que nossos
cirurgião. A pesquisa não só não é um gas- oponentes representam. »
to, mas é o melhor investimento que pode ser
feito com o orçamento da campanha. blemas os eleitores têm, com o que sonham,
Conforme se discute no episódio “Inves- quais pulsões os mobilizam, o que lhes dá es-
tigación electoral” do podcast En Campaña, perança, o que lhes dá medo, entre outros re-
outro dos erros dentro da pesquisa é fazê-la quisitos de informação realmente importan-
apenas para saber quem está ganhando na in- tes para traçar a estratégia da campanha.
tenção de voto. Quando se fazem campanhas Continuando com os erros relacionados
de forma profissional, isso não é o que mais à pesquisa, outro é ser muito literal na leitu-
importa. O que queremos saber é que pro- ra dos resultados. Todas as campanhas em

ERROS A EVITAR EM CAMPANHAS ELEITORAIS 25


uma eleição têm pesquisas, o que é então « Dividimos a política em
que nos diferencia dos demais? O que per- duas: o que nossa campanha
guntamos e como interpretamos os resulta-
propõe e o que vem dos
dos. Mas muitas vezes a leitura é demasia-
do linear; os contextos em que os eleitores oponentes. Chamamos isso de
vivem e sonham são muito mais complexos termos do debate, sob quais
do que ser o presidente do emprego quando temas definimos a eleição. »
há muito desemprego. Por isso precisamos
de diversas pesquisas, qualitativas e quan-
titativas, e de uma equipe multidisciplinar versário mais próximo, levando o voto útil
para interpretar os resultados e conseguir de outras candidaturas para a que está em
uma conexão real com os cidadãos. Acres- segundo. Não há receita para o fracasso mais
cento um comentário: muitas vezes, a me- efetiva do que a arrogância do vencedor an-
lhor mensagem é a mais simples. tecipado.
Por último, e não por isso um erro me-
nos recorrente, é publicar pesquisas que nos
dão vencedores antes da eleição. Está com- 3. Começar a trabalhar quando
provado que isso não serve para nada além a campanha começa
de deixar o candidato e sua família mais feli-
zes. Mas a verdade é que desmobiliza o elei- Não há nada pior para um consultor políti-
torado, desmotiva as equipes de campanha co do que ser contratado quando começa a
e muitas vezes energiza a campanha do ad- campanha eleitoral, porque então já tarde

26 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


demais. Há muito pouco a fazer, além de ten- tender em profundidade a informação arre-
tar resolver a conjuntura para alcançar o me- cadada pela pesquisa.
lhor resultado possível. Depois é preciso começar a montar a
As campanhas começam muito antes de equipe, começando pelo gerente de campa-
realmente começarem, inclusive antes mes- nha, que deve ser alguém de plena confiança
mo de os candidatos serem indicados ou de do candidato, mas nunca ele mesmo. Assim
o contexto estar claro. Investigar, planejar, também para as áreas financeira, jurídica,
montar a equipe de campanha, criar os pro- comunicação, território, conteúdo, política
tocolos para um trabalho organizado e efi- e agenda. Parece fácil, mas encontrar a pes-
ciente, posicionar o candidato para que en- soa certa para o cargo é difícil e leva tempo.
tre na disputa com os atributos corretos e Depois é necessário gerar os métodos e
uma boa imagem são tarefas que não levam o protocolo de trabalho para que estas áreas
dias nem horas: levam meses. possam trabalhar de forma coordenada e
O trabalho deve começar pelo menos eficiente: periodicidade das reuniões, atas,
um ano antes da eleição; quanto mais tempo acompanhamento dos compromissos, qual
de preparação houver, melhor. A primeira plataforma de gestão usaremos, entre ou-
coisa que se faz é investigar, fazer uma pes- tras decisões táticas importantes. Fazer es-
quisa benchmark ou linha de base que, em tas definições também é um trabalho que
geral, são pesquisas com muitas perguntas requer tempo.
para entender o contexto e traçar o rascu- O desenvolvimento da estratégia para
nho do que será a estratégia da campanha. que o candidato chegue na melhor posi-
Também se realizam grupos focais para en- ção possível para a campanha e sua execu-
ção também é um trabalho que deve ser fei-
to antes do início da disputa eleitoral.
Em suma, há muito trabalho a ser feito
antes do início oficial de uma campanha, e
isso não se faz da noite para o dia. O tem-
po, como se costuma dizer, é o único recur-
so que não pode ser recuperado. Sejamos
ricos em tempo, comecemos o mais rápido
possível.

4. Ser reativo aos temas


que a agenda coloca

Para defini-lo de forma simples, a chama-


da agenda pública são os temas da atualida-
de que as famílias falam à mesa quando co-
mem antes de ir dormir. É o que disse o presi-
dente ou a oposição, um escândalo, um erro,
uma nova lei prestes a ser aprovada, os últi-
mos números do desemprego, ou qualquer
outro tópico sobre o qual as pessoas falem
em suas conversas cotidianas.

ERROS A EVITAR EM CAMPANHAS ELEITORAIS 27


Fazendo uma rápida comparação com o atitude mais proativa em marcar o pulso das
passado, antes o estabelecimento da agenda conversas todos os dias.
pública era uma tarefa quase exclusiva dos
jornais. Pela manhã, estes apresentavam em
suas capas os temas sobre os que falaríamos 5. Não se diferenciar
durante o dia; esses temas eram replicados
nos noticiários da manhã e, no resto do dia, Há países da América Latina onde as campa-
tanto os jornalistas quanto os políticos rea- nhas tomam às ruas, onde há uma densida-
giam a esses temas. de insalubre de fotos de candidatos por me-
Hoje, a agenda pública é muito mais ex- tro quadrado nas vias públicas, cartazes em
tensa e é formada a partir de três pontos: os cada poste de luz, outdoors por todas os la-
meios de comunicação, a política e, por úl- dos, panfletos distribuídos em cada esquina
timo, as pessoas, que, a partir das redes so- e jingles que tocam em alto volume em cami-
ciais ou da rua, também têm seu lugar no es- nhões com alto-falantes gigantes.
tabelecimento de temas. O chamativo quando se anda por essas
Se nos colocamos do lado de uma cam- ruas tomadas pela campanha é que toda a
panha, dividimos a política em duas: o que comunicação política parece igual.
nossa campanha propõe e o que vem dos “O segredo de ser chato é contar tudo”,
oponentes. Chamamos isso de termos do de- disse Voltaire. Não ousar se diferenciar em
bate, sob quais temas definimos a eleição: se um estilo, em uma escala de valores, em
a agenda pública toma os temas mais favo- atributos ou em propostas, é o mesmo que
ráveis à nossa campanha, o mais provável é dizer tudo e não dizer nada. Quando nin-
que ganhemos; se toma os temas levantados guém se diferencia, aquele que chegou me-
pelos concorrentes, serão eles quem sairão lhor posicionado no início da campanha ou
vitoriosos. quem pertence ao partido mais popular aca-
Por isso, um dos erros mais graves que ba vencendo. O que acaba definindo não é
uma campanha pode cometer é estar todos o candidato, mas o que o cerca, o contexto.
os dias respondendo os temas que são le- Contudo, cuidado, tampouco é bom
vantadas pela agenda pública. Mesmo que para a campanha se diferenciar a qualquer
seja exitoso nesta tarefa, o fato de estar em custo; nem toda publicidade é boa. A dife-
uma posição reativa aos temas apresentados renciação é boa desde que siga a estratégia,
externamente tirará a campanha da estra- faça parte dos objetivos traçados, e tenha o
tégia, a tornará muito diversificada em re- tom e a linguagem apresentados no docu-
lação aos temas que aborda e não alcança- mento estratégico. Nem todo vídeo que vi-
rá a constância necessária para instalar suas raliza por ser ridículo agrega na campanha.
mensagens na cidadania. A região está repleta de exemplos de campa-
Com isso não quero dizer que não se nhas que ganharam muita notoriedade de-
responda as questões em pauta na agenda, vido a um fato embaraçoso e que, no dia da
mas a campanha deve tentar todos os dias eleição, a única notícia que geraram foi sua
estabelecer os temas que mais lhe convêm falta de votos. Isto é especialmente impor-
de acordo com sua estratégia. Além disso, tante na utilização de novas redes sociais
se amanhã você estiver em uma campanha para fazer comunicação eleitoral, como dis-
que se dedica somente a responder temas le- cutimos no quinto capítulo do podcast En
vantadas externamente, que soe um alarme Campaña, sobre a importância das redes so-
e tente fazer com que a campanha tome uma ciais. Fazer papel de ridículo para chamar a

28 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


atenção não é o objetivo principal, mas sim
o é gerar laços com a comunidade de forma
amena, divertida e diferente.

Yehonathan Abelson
Mestre pela Graduate School
of Political Management
da Universidade George
Washington. Sócio-diretor
de Bia Consulting. Escre-
ve regularmente para o jornal Perfil da Ar-
gentina. Vencedor do prêmio Raising Star
outorgado pela revista Campaigns and Elec-
tions e de um Victory Award como Consul-
tor de Imagem Política, ambos em Washin-
gton dc. Trabalhou em governos e campa-
nhas como consultor político na Argentina,
Bolívia, Brasil, Chile, Equador, Estados Uni-
dos, México, República Dominicana, entre
outros países.

ERROS A EVITAR EM CAMPANHAS ELEITORAIS 29


Liderança em tempos
de desconfiança

Ignacio Martín Granados

Podcast
“Gestión de crisis”

30 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Apesar de os políticos, seus partidos e as instituições em que
trabalham gerarem cada vez menos confiança nos cidadãos, ainda
podem ser transformados em líderes se for feito um bom uso da
estratégia política marcada pelos dez pontos-chave mencionados
neste capítulo.

Warren Bennis, considerado como um dos « A maior parte


pioneiros e maiores especialistas no estudo da das capacidades e
liderança, assessor de quatro presidentes dos
competências da liderança
Estados Unidos, nos deixou uma das melho-
res frases sobre o assunto que abordamos nes- podem ser aprendidas
te livro: “ A liderança é como a beleza, difícil se houver o desejo e a
de definir, mas fácil de reconhecer se a virmos” vontade de fazê-lo. »
(Bennis, 1990). De fato, se pesquisarmos no
Google os termos liderança política, encontra- tos, relatos e ficções que contribuem para en-
remos quase 40 milhões de resultados (412.000 grandecer a liderança de um político. Por
artigos acadêmicos), e isso apenas em espa- esse motivo, Bennis e Goldsmith (1997), em
nhol. Este assunto sempre deu muito o que um dos trabalhos mais interessantes sobre o
falar, não só pesquisado no âmbito acadêmico, tema, analisam o que consideram mitos so-
mas também na própria consultoria — cons- bre a liderança.
truindo líderes — e entre os meios de comuni- Como, por exemplo, que a liderança é uma
cação — analisando suas características —, e é habilidade natural, questão que contribui para
um dos atributos por excelência para todo can- fazer do líder um ser supremo, um atributo
didato político. que poucos podem ter. No entanto, nada está
Se afirmamos — e acredito que falo por mais longe da realidade. Todos temos poten-
toda a comunidade de profissionais da co- cial de liderança. Algumas pessoas podem ser
municação política — que os líderes não líderes em uma organização em circunstân-
nascem, senão tornam-se, também podemos cias determinadas e, em outras, não.
inferir que a liderança política não é ape- Outro exemplo: os líderes nascem, não se
nas um processo, mas também uma série fazem. É uma idealização na linha da ante-
de atributos que apresenta um determinado rior, mas muitas pesquisas mostram que, sob
político que consegue ou perde em função certas condições, pessoas que até então não
das vicissitudes da política. tinham se identificado como tal convertem-
Por outro lado, a política tem muito de -se em líderes. A maior parte das capacida-
religião (confiamos em um líder e acredi- des e competências da liderança podem ser
tamos em sua palavra, seguindo-o e justifi- aprendidas se houver o desejo e a vontade de
cando-o frente a outros candidatos) e, como fazê-lo — suprindo a ausência de determina-
em toda doutrina, nos deparamos com mi- das qualidades naturais.

LIDERANÇA EM TEMPOS DE DESCONFIANÇA 31


Ou que os líderes são carismáticos, algo
que, como sabemos, alguns são e outros
nem tanto. O carisma é mais o resultado de
uma liderança efetiva do que o contrário.
Outro mito, marcadamente elitista, é aque-
le que os líderes existem apenas nos níveis
mais altos de uma organização, quando po-
dem ser encontrados em qualquer nível (e,
de fato, cada um deles costuma ter suas pró-
prias microlideranças).
Podemos destacar mais mitos, como
que os líderes controlam, mandam, mani-
pulam os outros; que são infalíveis; nunca
se equivocam; sempre têm as respostas cer-
tas ou que, simplesmente, a liderança vem
com a idade.
Para exercer a liderança política, deve-
mos conhecer o contexto social em que de-
vemos desenvolvê-la, qual é o humor políti-
co do eleitorado, quais as necessidades que
a sociedade demanda para o momento em
que as eleições são realizadas.
Atualmente, tanto na Europa quanto na
América Latina, a classe política e as insti-
tuições relacionadas com ela não passam ropeus. Depois dos partidos políticos, as
pelo seu melhor momento. E isso é um in- instituições que geram maior grau de des-
conveniente, porque se aqueles que devem confiança são o Congresso dos Deputados
resolver as dificuldades dos cidadãos são e o Governo da Espanha, dos quais cerca de
vistos como parte do problema e não da so- 75% dos cidadãos afirmam desconfiar.
lução, o que se coloca em dúvida é a própria A nível europeu, os partidos políticos
existência da democracia. também são os mais castigados na avalia-
De acordo com as conclusões do últi- ção: apenas 21% dizem confiar, frente a 75%
mo Eurobarômetro elaborado pela Comis- que desconfiam. Nos Parlamentos, 60% dos
são Europeia e publicado no mês de abril cidadãos desconfiam, contra 35%, e, quan-
(Eurobarometer, 2021),1 90% dos espanhóis to aos governos, 60% confiam, frente a 36%.
desconfiam das formações políticas, um ní- Os meios de comunicação tampouco se
vel muito elevado quando comparado com livram do questionamento da opinião pú-
os 75% apresentados pelo conjunto dos eu- blica, também em níveis mais elevados que
a média europeia. De maneira geral, a visão
dos espanhóis é “claramente de desconfian-
1 O estudo foi realizado entre os dias 12 de fevereiro e
18 de março de 2021 nos 27 países membros da União
ça majoritária” e, o relatório constata, 83%
Europeia, além de Reino Unido, Bósnia e Herzegovi- afirmam que costumam encontrar notícias
na, Islândia, Noruega, Suíça, Comunidade Turco-ci- falsas na mídia, refletindo que, para 85%, a
priota e território do Kosovo, e para isso se levaram desinformação é um problema para a Espa-
a cabo 32.743 entrevistas domiciliares, 1.007 delas na
Espanha. nha e para a democracia (86%).

32 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Se olharmos para a América Latina, 36% e depois o presidente com 32%. As ins-
também não encontramos sinais de espe- tituições eleitorais de cada país ocupam o
rança. Segundo o último Latinobarômetro,2 quinto lugar com 31%. As outras quatro ins-
publicado em outubro de 2021, mas corres- tituições mais importantes para a democra-
pondente a 2020, “a América Latina é a re- cia estão no final da lista: Governo (27%),
gião do mundo mais desconfiada da Terra, Poder Judiciário (25%), Parlamento (20%) e
comparada com a África, a Ásia e os paí- partidos políticos (13%).
ses árabes” (Corporación Latinobarómetro, A confiança nos presidentes da região,
2021). que por si já é baixa, tende a cair de 47% em
Em média, a Igreja está em primeiro lu- 2006 para 32% em 2020, número que tam-
gar com 61%; seguida pelas Forças Armadas bém já havia alcançado em 2004.
com 44%, a instituição estatal com a maior Contudo, como acontece na Europa, as
confiança. Em seguida está a polícia, com instituições que têm a pior avaliação das de-
mocracias latino-americanas são os parti-
2 O estudo foi aplicado presencialmente em 17 países dos políticos. Desde 2010, o número de ci-
entre os dias 26 de outubro e 15 de dezembro de 2020. dadãos que se sentem “próximos” de um
Na Argentina, não pôde ser aplicado cara a cara de-
vido às condições da pandemia, motivo pelo qual fi-
partido político diminuiu de 40% para 29%.
nalmente decidiu-se aplicá-lo online entre os dias 26 A este panorama de desconfiança, ou tal-
de abril e 16 de maio de 2021. No total, foram reali- vez por causa dele, devemos acrescentar que
zadas 20.204 entrevistas em 18 países. A margem de nos encontramos no que alguns chamam de
erro das amostras nacionais é de 3% e a margem de
erro da base total é de 1%.

LIDERANÇA EM TEMPOS DE DESCONFIANÇA 33


ambiente vuca,3 sigla para volatilidade, in- « Atualmente a política
certeza, (uncertainty, do inglês), complexi-
dade e ambiguidade. Quer dizer, elementos aborda muitos campos e,
que contribuem para desconfiar das ins- tal qual maestro de
tituições políticas e nos dão razão no mo- orquestra, o papel do líder
mento de afirmar que as características para é conseguir que todos os
uma liderança política efetiva devem ser di-
ferentes das de outros contextos políticos, solistas (especialistas em
sociais e econômicos. suas áreas) brilhem para que
a sinfonia (sua mensagem)
soe o melhor possível. »
Dez princípios para construir
um líder político
periência e no contexto atual. Certamente
Em seu trabalho durante cinco décadas com existem outros, é evidente, pois, como indi-
líderes de diferentes tipos de organizações, camos no início, a liderança é um processo
Peter Drucker (1999) — como temos defen- que deve ser sempre aprimorado. Ser cons-
dido ao longo deste artigo — chegou à con- ciente disso é outro sinal de liderança.
clusão de que não existem noções como uma
personalidade de líder ou os traços e as carac- 1. Deixe-se assessorar
terísticas de um líder. Ele ressalta que, entre
os líderes mais eficazes que conheceu e com É curioso que a primeira recomendação para
quem trabalhou, alguns se trancam em seus algo aparentemente tão individual quanto a
escritórios e outros são demasiado sociáveis; liderança seja, justamente, a de saber ser
outros, não muitos, são “gente boa” e outros acompanhado e deixar-se ser aconselhado.
são rígidos e autoritários. Alguns impulsivos Cercar-se de uma equipe de pessoas que se-
e rápidos, outros estudam a situação e levam jam melhores que você é fundamental por-
séculos para chegar a uma decisão. Alguns que elas o ajudarão a crescer politicamente.
são calorosos, outros distantes, alguns vai- Liderar é acompanhar, é organizar pessoas e
dosos, outros retraídos e modestos. Alguns equipes favorecendo o talento e a motivação.
têm o dom de saber ouvir, enquanto outros Seja seu primeiro crítico e busque a opinião
são lobos solitários que não escutam mais do de seus assessores, valorize outros pontos de
que sua própria voz. vista, não caia na auto complacência nem co-
Em outras palavras, não existe uma fór- meta o erro de pensar que pedir conselho é si-
mula para o êxito. Portanto, os pontos-cha- nal de fraqueza, muito pelo contrário. Atual-
ve propostos a seguir não deixam de ser mente a política aborda muitos campos e, tal
uma visão pessoal baseada na própria ex- qual maestro de orquestra, o papel do líder
é conseguir que todos os solistas (especialis-
3 A noção de vuca foi criada pela Escola de Guerra do tas em suas áreas) brilhem para que a sinfo-
Exército dos Estados Unidos para descrever a volati- nia (sua mensagem) soe o melhor possível.
lidade, a incerteza, a complexidade e a ambiguidade
do mundo que emergiu após o fim da Guerra Fria. O
Conforme afirmava Tom Peters, escritor es-
termo começou a ser utilizado de forma generalizada pecialista em gestão empresarial, “os líderes
na década de 1990; posteriormente, passou a ser utili- que trabalham de forma mais eficaz nunca
zado nos campos da estratégia empresarial, aplicado dizem eu. Eles não pensam eu. Eles pensam
a todo tipo de organizações, e novamente adquire im-
portante repercussão. nós e pensam equipe.”

34 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


2. Adote um comportamento exemplar « O líder deve ser capaz
para gerar confiança de motivar para convidar
à eleição e inspirar que a
Como já afirmava Dwight Eisenhower, o
34º presidente dos Estados Unidos, “a qua- mudança, outra forma de
lidade suprema da liderança é a integrida- governar, é possível. »
de”. Especialmente em um contexto de gran-
de desconfiança em relação aos políticos, teve o pior resultado de sua história), senão
aos partidos e às instituições políticas. Sem criou um novo movimento em torno de sua
exemplaridade não há credibilidade, sem ela pessoa, fugindo dos questionados partidos
não há confiança e, se não confiam em você, políticos tradicionais e conectando-se com
não votam em você. as preocupações dos franceses.
Ser exemplar é ter um comportamento Sêneca já dizia: “Quando um homem
capaz de suscitar admiração e de querer ser não sabe para onde navega, nenhum vento
imitado. Hoje a habilidade estética, retórica lhe é favorável”.
ou gestual, embora sejam importantes, não
são elementos-chave, mas é a exemplarida- 4. Exerça uma liderança emocional
de do comportamento individual que se tor-
na a prova definitiva da credibilidade de um John Quincy Adams, sexto presidente dos Es-
político. tados Unidos, disse que “se suas ações inspi-
Um exemplo disso é Angela Merkel, a ex- ram outras pessoas a sonhar mais, aprender
-chanceler alemã que, após 16 anos de man- mais, fazer mais e ser mais, você é um líder”.
dato, manteve sua popularidade intacta. De Um líder não apenas dirige, mas tam-
acordo com uma pesquisa do Conselho Eu- bém deve servir de exemplo e inspiração.
ropeu de Relações Exteriores (ecfr, na sigla As emoções afetam nossa maneira de ver e
em inglês), entre 16.000 cidadãos de 12 paí- pensar o mundo, influenciam na atenção, na
ses, 41% optariam por Merkel frente a Ma- memória e no raciocínio lógico.
cron (14%) em uma hipotética eleição para As lideranças que se baseiam unicamen-
presidente da União Europeia. te na razão são insuficientes. O conceito de
inteligência emocional chegou à política, e
3. Ative os sentidos os políticos, cada vez mais, se preocupam
em gerenciar melhor as emoções de seu
Escutar em vez de ouvir; ter tato para sentir o eleitorado e gerar os sentimentos que fa-
que preocupa os cidadãos; olfato político para voreçam a transmissão de uma determina-
medir os tempos; e observar para gerar planos da mensagem em uma determinada condi-
de ação é ter os sentidos ativos. Os cidadãos ção. Lembre-se de um dos slogans com que
procuram políticos que os representem, com Barack Obama ganhou suas primeiras elei-
os quais se sintam identificados. Que saibam ções: “Esperança” (Hope).
ler corretamente os sinais que lhes são envia-
dos, que tenham empatia com seus problemas 5. Seja otimista
e se mostrem compreensivos e acessíveis.
Veja Emmanuel Macron, que soube ler A política precisa de líderes que sejam capa-
perfeitamente a conjuntura para a qual a zes de transmitir e gerar otimismo. Líderes
França se encaminhava: não quis participar para quem o futuro seja uma energia mobi-
das primárias do Partido Socialista (que ob- lizadora e que sejam capazes de recuperar a

LIDERANÇA EM TEMPOS DE DESCONFIANÇA 35


ilusão coletiva. A política que vence conta- exemplar em suas ações, comportar-se com
gia ilusão. E o ânimo é energia mobilizadora. responsabilidade e ser consequente com
O líder deve ser capaz de motivar para suas mensagens. Em suma, dizer o que você
convidar à eleição e inspirar que a mudança, faz (storytelling) e fazer o que você diz (story-
outra forma de governar, é possível. doing), como mencionado no quarto episó-
Se o “dizem que sou chato” de De la Rúa dio do podcast En Campaña sobre a constru-
lhe permitiu ganhar as eleições argentinas ção da mensagem.
em 1999 amparando-se na gestão econô- A autenticidade é uma anomalia na polí-
mica, na Espanha, com o candidato socia- tica, em que há muita impostura camuflada
lista para a Comunidade de Madri em 2021, de supostos interesses superiores. É por isso
Ángel Gabilondo, sua adaptação para “Sou que a coerência é tão valorizada na política e
insosso, sério e formal” foi um fracasso re- está intrinsecamente ligada à sua reputação.
tumbante (não soube ler o contexto, como Uma boa imagem leva anos para ser criada
viemos insistido neste artigo, nem irradiar e mantida, mas pode desaparecer em um se-
qualquer tipo de otimismo). gundo diante de uma incoerência, por mais
legítima que seja.
6. Seja coerente
7. Escolha que tipo de líder você quer ser
A coerência na política é fundamental para
edificar a imagem e a reputação de qualquer O dramaturgo George Bernard Shaw dizia
candidato. É muito simples, você deve ser que “as pessoas culpam as circunstâncias.

36 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


« A fórmula do êxito da
liderança política é a soma
de atributos racionais e
emocionais [...] junto com
as adequadas qualidades
profissionais e pessoais para
o exercício da política e da
gestão pública. »

F. Kennedy, que sabia com clareza que a lide-


rança precisa do aprendizado para exercer e
regular suas funções.
Em tempos de mudança, o aprendizado
é contínuo. Já viemos advertindo: a lideran-
ça é um processo, um caminho, em que o
importante não é chegar a um destino, mas
aprender ao longo da viagem. E, da mesma
forma, os líderes se fazem, à custa de apren-
der, de se informar, de se deixar aconse-
lhar... e de se equivocar. Você deve aceitar os
erros como parte desse aprendizado. E fu-
gir dos yes man, aqueles que sempre te dão
Não acreditem nas circunstâncias. As pes- a razão e inflam sua bolha de autocompla-
soas que avançam buscam as circunstâncias cência sem advertir seus possíveis fracassos.
e, se não as encontram, as criam”. Graças a esta predisposição, você terá capa-
Qual é o papel que você quer desempe- cidade de reação para resolver os problemas
nhar em uma campanha eleitoral? Leia o con- que certamente encontrará no seu caminho
texto econômico-social, adapte-se ao humor e enfrentar situações imprevistas.
político, às demandas da sociedade, às suas
circunstâncias... e converta-se nesse líder. 9. Lidere a mudança
Manfred F. R. Kets de Vries (2019) ideali-
za até oito arquétipos de liderança de acordo Mais uma vez, Warren Bennis nos deixa ou-
com diferentes padrões de comportamen- tra de suas famosas frases: “ A liderança é a
to: o estrategista, o catalisador da mudança, capacidade de transformar a visão em reali-
aquele que realiza a transação, o construtor, dade”. Mostre que você é diferente. Mude o
o inovador, o processador, o treinador e o co- caminho, rejeite o habitual, porque Albert
municador. Einstein já disse: para buscar resultados dife-
rentes, é preciso fazer atividades diferentes.
8. Mantenha-se sempre disposto Explore novas vias, procure novos cami-
a aprender nhos, que os eleitores percebam você de for-
ma diferente do resto dos candidatos. A cria-
“Liderança e aprendizado são indispensáveis tividade nada mais é do que a capacidade de
um para o outro”. Isto foi afirmado por John ver a realidade de uma forma inusitada.

LIDERANÇA EM TEMPOS DE DESCONFIANÇA 37


10. Não existe o candidato político ça, desafios em oportunidades, sacrifícios
perfeito em futuros compartilhados. Precisamos de
novas competências e habilidades que nos
A afirmação de que todos os políticos são iguais permitam enfrentar o novo ambiente e nos
está muito generalizada e procura referir-se a acomodar melhor aos desafios atuais, com
eles de forma pejorativa. Esta frase também empatia, otimismo e aprendizado contínuo.
é o refúgio dos medíocres. Por esse motivo, Porque no novo ecossistema — caóti-
como líder político que você aspira a ser, mos- co, turbulento e mutável — a incerteza con-
tre-se diferente dos demais candidatos, desta- tínua é a nova normalidade. E para novos
que-se acima deles, encontre seu próprio esti- tempos, novos líderes são necessários.
lo, seja coerente com suas ideias e lhe respeita-
rão por sua naturalidade e carisma.
Todos os políticos são diamantes brutos Referências bibliográficas
que devem ser polidos (lembre-se que o lí-
der se torna), lapidar seus defeitos e valo- Bennis, W. (1990). Cómo llegar a ser líder. Bogo-
rizar seus atributos. Mas não existe um só tá: Norma.
candidato que reúna todas as qualidades Bennis, W., e Goldsmith, J. (1997). Learning to
ideais. Assim como tampouco concordamos Lead. Workbook on Becoming a Leader. Nova
cem por cento com o programa eleitoral do York: Addison Wesley. Eurobarometer.
partido político em que votamos. (2021, abril). Standard Eurobarometer 94
Embora eu tenha mencionado anterior- —Winter 2020-2021. European Union. Recu-
mente que não existe uma fórmula secreta, perado de https://europa.eu/eurobarometer/
na verdade eu estava me referindo ao fato de surveys/detail/2355
que não existe uma única fórmula. Corporación Latinobarómetro. (2021, ou-
A fórmula do êxito da liderança políti- tubro 5). Opinión pública latinoamericana.
ca é a soma de atributos racionais e emocio- Recuperado de https://www.latinobarome-
nais (coloque aqui toda a série de caracte- tro.org
rísticas e aptidões que você pode pensar que Drucker, P. (1999). Los desafíos de la gerencia
não devem faltar na construção simbóli- para el siglo xxi. Barcelona: Norma.
ca do candidato perfeito, do candidato per- Diálogo Político e mas Consulting. (2021).
feito), junto com as adequadas qualidades En Campaña [podcast]. Recuperado de ht-
profissionais e pessoais para o exercício da tps://dialogopolitico.org/category/podcast/
política e da gestão pública (acrescente no- en-campana
vamente outra lista de habilidades e compe- Kets de Vries, M. F. R. (2019). Down the Rab-
tências), temperado com o adequado rela- bit Hole of Leadership. Leadership Pathology
to pessoal (por que está na política), servido in Everyday Life. Palgrave Macmillan.
de uma imagem bem cuidada e cozido por
uma magnífica equipe de assessores, pelo
menos, tão inteligente quanto você.
É isso, aqui está a sua fórmula. Contudo,
como adverti anteriormente, em ambientes
complexos e incertos como o que estamos
vivendo, ademais, fazem falta resultados. Os
cidadãos anseiam por novas lideranças ca-
pazes de transformar medos em seguran-

38 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Ignacio Martín
Granados
Licenciado em Ciências Po-
líticas e da Administração,
com especialização em Aná-
lise Política (Universidade
Complutense de Madri). Diploma de Estudos
Avançados em Ciências Políticas (dea). Espe-
cialista universitário em Consultoria de Em-
presas (uned). Diretor de comunicação do
Conselho de Segurança Nuclear (csn). Co-
labora como docente em diversos mestrados
sobre comunicação, política, liderança, as-
suntos políticos e marketing político. Mem-
bro do conselho diretivo da Associação de
Comunicação Política (acop) desde 2014 e
atualmente é seu vice-presidente. Em 2017, foi
selecionado entre os cem profissionais políti-
cos mais influentes do ano pelo conselho edi-
torial da revista Washington compol (Napoli-
tan Victory Awards 2017).

LIDERANÇA EM TEMPOS DE DESCONFIANÇA 39


Pesquisas?
Sim, obrigado

Verónica Crespo Val

Podcast
“Investigación eleitoral”

40 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Conduzir uma campanha sem pesquisas seria como deixar o acaso
decidir as eleições, principalmente em uma época em que os dados
se converteram em guia necessário para todas as decisões. Mas, para
poder utilizar pesquisas, é preciso compreender como funcionam,
quais tipos existem e como desenhá-las.

Sinto pena dos gurus. A fórmula mágica para « Aventurar-nos


alcançar o êxito nas campanhas eleitorais já a empreender
não emana de sua intuição. A realidade é me-
uma campanha política
nos assombrosa; é pragmática e mundana. A
base de uma campanha efetiva, o alinhamen- sem fazer um diagnóstico
to de táticas, mensagens, canais e meios para adequado é como construir
chegar ao público, é o resultado de um traba- um edifício sobre o barro. »
lho de pesquisa preciso; um estudo objetivo
e sustentado por uma base científica que ci-
mente a estrutura de forma robusta. Por isso, cisam de processamento, análise e reflexão
aventurar-nos a empreender uma campanha para interpretá-los e convertê-los em co-
política sem fazer um diagnóstico adequado nhecimento útil para harmonizar uma es-
é como construir um edifício sobre o barro. tratégia. Como diz Gutiérrez-Rubí, “com-
A pesquisa exploratória do ambien- preender é governar”.
te geral, do momento político, do ambien- As estratégias semeiam o antecedente a
te social, dos adversários, do próprio parti- partir do qual serão tomadas as decisões tá-
do... permite conhecer o mercado eleitoral, ticas e operacionais da campanha. Antes de
as bases e os tetos de eleitores do partido e enviar uma nota de imprensa ou de realizar
aqueles indecisos que uma campanha pode um comício eleitoral, é conveniente traçar
incorporar. A professora María José Canel um caminho que parta dos dados e termine
(2021) explica no primeiro episódio do po- no voto. Trata-se de um plano harmonizado
dcast En Campaña sobre pesquisa eleitoral: em diferentes fases, cujo passo inicial será a
compilação de informação estratégica sobre
A pesquisa eleitoral é feita para en- a qual determinar os objetivos da campanha.
contrar o eleitor. Um gestor de campa- Ganhar as eleições? Posicionar um candida-
nha precisa saber onde está seu voto [...] to? Evitar um sorpasso? Liderar a oposição? A
e para isso, deve-se levar em conta o esta- análise do contexto oferecerá pistas para res-
do do mercado de votos quando se con- ponder a essas perguntas e permitirá priori-
vocam eleições. zar canais, mensagens, assuntos e zonas geo-
gráficas para atingir o público-alvo.
Neste ponto, o dado é o valor mais co- A digitalização facilitou e acelerou a
tado. Como ouro sem polir, os dados pre- coleta de dados em grande escala. Tanto é

PESQUISAS? SIM, OBRIGADO 41


« A pesquisa política tações desta. Estes métodos de pesquisa so-
eleitoral dispõe de cial, cada vez mais, são forçados a se adaptar
a uma sociedade líquida — como a batizou o
ferramentas quantitativas
sociólogo Zygmunt Bauman — e a aperfei-
e qualitativas que çoar seus instrumentos de coleta de dados.
[...] oferecerão um O método mais utilizado para avaliar a
diagnóstico para entender opinião pública é a pesquisa, que vem sendo
aperfeiçoada teórica e metodologicamen-
bem a sociedade e
te desde que começou a ser usada de forma
propor políticas que sistemática e exitosa no período entreguer-
respondam às aspirações ras do século xx por Lazarsfeld e Gallup.
e inquietações desta. »
Pesquisas: amostragem, margens de
assim que se fala do paradigma do dataís- erro e principais características
mo (Pérez, 2020). O big data deixou de ser
um recurso exclusivo de perfis técnicos para Por décadas, as pesquisas foram o procedi-
atravessar fronteiras e permear os estudos mento principal nas democracias para medir
sociológicos. Este foi o motivo pelo qual, a temperatura da opinião pública. Uma pes-
às equipes de campanha, somaram-se esta- quisa é uma foto fixa que oferece informação
tísticos e matemáticos que trabalham com sobre características objetivas e subjetivas da
cientistas políticos, sociólogos e jornalistas. população, e serve para saber o que as pessoas
As equipes multidisciplinares e a tecnologia fazem e pensam; ou seja, reflete comporta-
ampliaram as capacidades de medição para mentos e opiniões em um determinado mo-
desenhar produtos políticos mais alinhados mento. Como técnica de pesquisa, segue um
com as necessidades e os interesses da cida- procedimento sistematizado marcado por
dania. Apesar de os estudos demoscópicos uma série de regras para a sua correta execu-
geralmente serem realizados por empresas ção. Só assim os resultados obtidos da amos-
especializadas — que oferecem seus servi- tra — número reduzido de pessoas que vão se
ços a instituições, partidos políticos e meios submeter à pesquisa — poderão ser inferidos
de comunicação —, a própria formação po- — extrapolados, generalizados — para o total
lítica terá que ser capaz de interpretar e usar da população.
essa informação em seu benefício. É imprescindível que, para apresentar
conclusões sobre uma população — por
exemplo, a totalidade dos indivíduos com
Um método científico para estudar direito a voto em determinadas eleições —,
a realidade social que as amostras sejam representativas, tan-
to em número quanto em composição. Para
A pesquisa política eleitoral dispõe de ferra- isso, são aplicadas fórmulas que calculam
mentas quantitativas e qualitativas que, apli- o tamanho da amostra em função do nú-
cando a triangulação — o uso complemen- mero de indivíduos que compõem o total
tar de técnicas para contrastar e enriquecer da população. Calcular adequadamente a
os resultados — oferecerão um diagnóstico amostra sobre a qual se deve realizar o estu-
para entender bem a sociedade e propor po- do é a fase mais importante da pesquisa. Se
líticas que respondam às aspirações e inquie- não representa todas as zonas geográficas,

42 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


grupos populacionais, idades, sexos, profis- ticas e as limitações deste método científico.
sões, etc., os resultados da pesquisa não se- O erro médio das pesquisas eleitorais ao lon-
rão válidos. E nessa tarefa, o método de se- go da história foi calculado pelos pesquisa-
leção dos participantes da sondagem, deve dores Jennings e Wlezien (2018) e é de 2%,
ser probabilístico: todos os membros da po- dado que obtiveram após realizar uma análi-
pulação têm, em princípio, a mesma proba- se de mais de 30.000 sondagens em 351 elei-
bilidade de serem escolhidos para serem en- ções gerais de 45 países entre os anos de 1942
trevistados. e 2017. Este dado verificado revalida o uso da
Mesmo assim, os resultados de uma pes- pesquisa científica como método para prever
quisa nunca serão exatos ao aplicá-la a um o comportamento eleitoral.
grupo reduzido de sujeitos. O ideal seria ter Aqueles pesquisadores que desejem re-
a capacidade de questionar toda a popula- duzir este parâmetro podem consegui-lo
ção, tarefa impossível atualmente com os ampliando a amostra sobre a qual aplicam
meios tecnológicos e recursos disponíveis a pesquisa.
às empresas demoscópicas. Por isso, todas
as pesquisas são obrigadas a assumir uma Quanto maior for a amostra, me-
margem de erro, um dado estatístico que nor será o erro e vice-versa. Embora che-
fala da confiabilidade do estudo em termos gue um momento em que o aumento da
percentuais. amostra não implica a diminuição do
Para entendê-lo com um exemplo, pen- erro na mesma proporção, de modo que
semos nos resultados de uma hipotética não compensa continuar a expandi-la.
pesquisa eleitoral: o Partido Liberal obtém (Vinuesa, 2010)
49,5% do apoio entre os eleitores entrevis-
tados, enquanto o Partido Conservador ob- O desenho da pesquisa apresenta uma
tém 50,5%. Se nossa pesquisa tem uma mar- segunda fase crítica em que as decisões to-
gem de erro de 2%, o Partido Liberal poderá madas terão consequências no resultado fi-
obter um resultado que oscila entre 47,5% nal. Trata-se da elaboração dos questioná-
e 51,5%; enquanto o Partido Conservador rios, o conjunto de perguntas que se aplica
estaria entre 48,5% e 52,5%. Nesta pesqui- a cada um dos sujeitos entrevistados, com
sa, estaríamos obrigados a falar de empate uma redação clara, textos curtos e elimina-
técnico; a estatística nos impediria de dar o ção de tecnicismos. Perguntas que enviesem
Partido Conservador como vencedor. a pesquisa, e termos com carga negativa ou
Este exemplo serve para ilustrar uma das duplos sentidos são itens para não direcio-
principais desvantagens que a demoscopia nar ao entrevistado em sua resposta.
enfrenta na atualidade. Em muitas ocasiões, Este questionário será realizado, princi-
o fervor midiático se aventura em manche- palmente:
tes espetaculares quando os dados falam
em outros termos. Aconteceu nas eleições – Via telefônica: são pesquisas mais bara-
de 2016 na Espanha com o debatido sorpas- tas que, nos últimos anos, incorporaram
so do Podemos no psoe, ou nas eleições de bases de dados de telefones celulares, re-
2019 na Argentina, entre Mauricio Macri e duzindo o viés.
Alberto Fernández. – Cara a cara: são as mais custosas em ter-
Este apontamento não pretende transmi- mos econômicos, mas podem expandir-
tir desconfiança nem deslegitimar a utilida- -se mais no tempo e fornecer respostas
de da ferramenta, mas relembra as caracterís- mais aprofundadas.

PESQUISAS? SIM, OBRIGADO 43


– Digitalmente: tornaram-se populares
com o avanço da digitalização, mas este
método de sondagem ainda apresen-
ta um viés. Para citar alguns casos, no
Peru, 29,7% da população não tem aces-
so à internet4, cifra que chega a 36% na
República Dominicana5.

Essas entrevistas são realizadas no con-


texto da vida cotidiana, e os entrevistados
têm a liberdade de responder, não respon-
der, dizer a verdade ou mentir. De novo,
apresenta-se outro fator que fala da impre-
cisão das pesquisas e que deve ser levado em
consideração na hora de apresentar conclu-
sões.
De qualquer forma, a pesquisa é uma foto
fixa de um cenário momentâneo que exigirá:

– Corrigir possíveis desvios (a polêmica co-


zinha das pesquisas).
– Replicar a mesma pesquisa de forma pe-
riódica para descobrir tendências. Se as
pesquisas refletem o estado de opinião
de um determinado momento, para co-
nhecer a evolução dos resultados, apli- « O imediatismo com que
ca-se o mesmo questionário a uma nova é possível compilar esses
pesquisa. São habituais as pesquisas de
monitoramento trimestral ou mensal dados e a capacidade de
em ano eleitoral, incluindo os trackings processá-los e convertê-los
a cada três dias durante o último mês da em conhecimento tangível
campanha. Aplicar a prospectiva amplia
pressagiam a relevância que
a capacidade de observar a realidade so-
cial, permite estabelecer relações causais estas técnicas digitais irão
e explicar fenômenos. adquirir nos próximos anos. »
– Fazer a triangulação com outros méto-
dos de pesquisa qualitativos que permi- cas do eleitor. Para os partidos políticos,
tam ampliar o conhecimento das lógi- compaginar metodologias pode expli-
car o porquê do voto e as motivações do
eleitor. No caso das pesquisas que têm
4 No terceiro trimestre de 2020, 70,3% da população do
Peru com mais de seis anos tinha acesso à Internet
como fim sua publicação em meios de
(inei, 2020). comunicação, a triangulação metodoló-
5 Em janeiro de 2019, a penetração da internet na Re- gica fará mais consistentes os resultados
pública Dominicana era de 64% da população, de e facilitará a explicação de mudanças de
acordo com relatório Digital 2019: Global Internet Use
Accelerates. tendência.

44 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


No planejamento da campanha, os dados bre quando, por que e como o eleitor decide
da pesquisa e suas replicações são integrados seu voto. Por um lado, há o monitoramento
no diagnóstico junto com outros resultados de de mídias digitais que possibilita, por exem-
pesquisa para complementar a estratégia elei- plo, a detecção de debates em tempo real para
toral — exposição explicada no início do ca- recompor um argumento a tempo, especial-
pítulo —. Para conseguir informação com- mente em um contexto de agitação social e
plementar que possa servir para elaborar o mudança permanente. O imediatismo com
questionário da pesquisa, ou para explicar os que é possível compilar esses dados e a capa-
resultados desta uma vez realizada, é impor- cidade de processá-los e convertê-los em co-
tante contar com outras fontes, como os ins- nhecimento tangível pressagiam a relevância
titutos públicos de pesquisa ou o Centro de In- que estas técnicas digitais irão adquirir nos
vestigaciones Sociológicas (cis) espanhol, que próximos anos. Além disso, enquanto as pes-
levam décadas coletando dados sobre uma va- quisas refletem opiniões, que podem ou não
riedade surpreendente de temáticas, e que es- ser verdadeiras, a análise da pegada digital
tão acessíveis de forma aberta em seu site. dos usuários estabelece padrões de compor-
Para aprofundar casos de boas práticas que tamento. Por outro lado, inclui-se neste ponto
complementem os resultados das pesquisas, os a psicologia social, que fornecerá pistas para
estudos demoscópicos tradicionais se combi- os estudos eleitorais sobre como se produz o
nam cada vez mais com novas ferramentas de processamento da informação ou o papel de-
escuta social, que fornecem informações so- sempenhado pelas emoções.

PESQUISAS? SIM, OBRIGADO 45


O crack das pesquisas sondeocracia [sondeo, do espanhol, relacio-
em uma sociedade mutável nado à pesquisa de opinião] para alertar so-
bre as decisões políticas baseadas nos dados
O sistema político se transformou na últi- da última pesquisa eleitoral. Amantes ou
ma década. A estabilidade de tradições bi- detratores do método, o fenômeno das pes-
partidárias foi quebrada em um contexto de quisas tem sido estudado pelas implicações
tensão que afetou muitos Estados a partir de que seus resultados podem gerar no clima
2010. Movimentos de protesto como a Pri- de opinião para orientar o voto e os quadros
mavera Árabe, Occupy Wall Street, YoSoy123, mentais da cidadania.
15M ou os protestos estudantis no Chile fo- O que as pesquisas dizem se incorpora
ram o germe do surgimento de novos parti- ao ideário coletivo, que age em consequên-
dos políticos. cia. As pesquisas podem incentivar o voto
O aumento de opções políticas em um ou estimular a abstenção? Têm elas mesmas
contexto geral de incerteza provocou um em conta o efeito que a publicação de suas
comportamento anômalo do sistema elei- revelações pode gerar? Para o cis (2016), o
toral, que afetou a capacidade das pesquisas conhecimento dos resultados de sondagens
de predizer o futuro. Trump, o Brexit, o pro- pré-eleitorais teve alguma influência em
cesso de paz na Colômbia ou as eleições em pouco mais de dez por cento dos entrevis-
Israel em 2015 são páginas tensas na história tados. As empresas demoscópicas têm ca-
da demoscopia. Diante desse cenário, logo pacidade para desequilibrar as eleições em
começou o debate sobre a efetividade do um cenário em que os governos são deci-
método, obrigando as empresas demoscó- didos por maiorias mínimas? Para o presi-
picas a repensarem suas metodologias. Sur- dente do gad3, Narciso Michavila, “não há
gem vários aprendizados que as empresas mentira maior na democracia do que men-
internalizaram em suas dinâmicas de traba- tir em nome dos eleitores” (Insights Analy-
lho para refinar sua tarefa: aprimorar a aná- tics España, 2021). O respeito, a integridade
lise de um contexto que se encontra em con- e a credibilidade a longo prazo são princí-
tínua transformação, ampliar o tamanho de pios que devem caracterizar os profissionais
suas amostras, cruzar seus dados com ou- da demoscopia. Ao fim e ao cabo, eles carre-
tras fontes e repensar o peso que se dá à me- gam um dos valores da democracia: escutar
mória do voto, entre outros fatores. o que as pessoas pensam.
Longe de considerar as pesquisas como
um método de pesquisa social ultrapassa-
do, elas constituem uma ferramenta insubs-
tituível, testada e comprovada, para conhecer
a realidade. A sua otimização, o uso da tec-
nologia, a especialização de profissionais e a
predisposição do público para responder são
fatores que denotam um futuro promissor.
Prova disso é a expectativa que geram
para os partidos políticos, os meios de co-
municação e os cidadãos. Tal tem sido sua
exploração e a atenção da mídia que rece-
bem que o famoso teórico da democracia
Giovanni Sartori introduziu o conceito de

46 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Bibliografia Verónica Crespo Val
Jornalista e doutora em Co-
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PESQUISAS? SIM, OBRIGADO 47


É a mensagem,
estúpido!

Kike Borba

Podcast
“La construcción
del mensaje”

48 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


A mensagem é um dos elementos básicos de uma campanha e, por
isso, não é fácil criá-la de forma eficaz. Para isso, deve-se escutar
o público-alvo, ser coerente e conciso com as ideias que se quer
transmitir, e fazer com que se conecte com as necessidades de
nossos eleitores.

A mensagem é uma peça fundamental de « Não há melhor


toda comunicação política. Na verdade, não ferramenta para construir
há política sem mensagem. É a engrenagem
uma mensagem potente
que faz o maquinário funcionar. Como se
menciona no quarto episódio do podcast En do que escutar os cidadãos
Campaña, a mensagem é a expressão da es- ou eleitores.»
tratégia política. Uma vez que definimos a
estratégia, é hora de materializá-la, e a men-
sagem é um elemento essencial para levá-la que escutar os cidadãos ou eleitores. Escu-
adiante. tá-los estando nas ruas, mas também por
Vamos começar por defini-la. O que en- meio de pesquisas quantitativas, qualitati-
tendemos por mensagem política? Em uma vas (as mais comuns são os grupos focais),
visão ampla, a mensagem política é o que di- monitoramento do diálogo na internet e
zemos, mas também o que fazemos. É dis- outras técnicas de pesquisa hoje muito mais
curso e é ação. A agenda é mensagem, as fo- acessíveis do que há alguns anos.
tografias são mensagem, a vestimenta que Os slogans publicitários surgidos da
usamos é mensagem, os cenários pelos pura criatividade costumam ser becos sem
quais passamos são mensagens, inclusive a saída. As mensagens devem ser testadas,
imagem de nossa organização ou o trato de contrastadas, conhecendo suas implicações
nossa equipe com os meios de comunicação e significados diversos para as diferentes au-
faz parte da mensagem. diências. Devem ser entendidas tal como
Portanto, para não deixar nada ao acaso pretendemos, e representar os mesmos sig-
e levar adiante uma estratégia de comunica- nificados que queremos transmitir. Porque,
ção profissional, a primeira coisa que deve- como diz Frank Luntz, “o importante não é
mos fazer antes de começar a trabalhar na o que você diz, mas o que as pessoas enten-
construção de uma mensagem política é co- dem”. Por exemplo, o termo liberdade, que,
nhecer perfeitamente nosso público: defini- em decorrência da pandemia, voltou a estar
-lo, caracterizá-lo, saber tudo o que for pos- na moda nos discursos políticos, pode signi-
sível sobre ele. Nesse sentido, a mensagem ficar para alguns a liberdade de ir e vir com
política deve ser produto de uma pesqui- normalidade e sem restrições pelas cidades
sa profissional. Não há melhor ferramenta e, ao mesmo tempo, despertar em outros a
para construir uma mensagem potente do ideia relacionada ao neoliberalismo econô-

É A MENSAGEM, ESTÚPIDO! 49
mico associado a um Estado enxuto em que « As mensagens-chave
prevaleça o livre mercado e a privatização devem ser acompanhadas
dos serviços públicos. O termo de referên-
de submensagens
cia é o mesmo (liberdade), mas o significado
é diametralmente oposto. Saber como nosso elaboradas com o objetivo
público vai decodificar a mensagem e não de explicar ou aprofundar
perder de vista quem está nos ouvindo é es- detalhes ou nuances sobre
sencial. Conhecer como e quando ativar um
os temas, tornando-os
ou outro sentido da mensagem faz parte do
resultado da pesquisa. mais interessantes para
Uma vez que contamos com os resulta- as diferentes audiências
dos da pesquisa, estamos em condições de selecionadas. »
definir quais serão as mensagens-chave e as
submensagens. As mensagens-chave são es-
cassas — duas ou três no máximo — e cen- cisão entre o povo e os políticos de Washin-
tram todo o nosso agir, nosso projeto polí- gton, ou entre os brancos e os afro-ameri-
tico e a campanha. São mensagens centrais, canos. A mensagem principal era de que ele
em torno das quais girará toda a comuni- vinha para unir e as submensagens se refe-
cação. riam a quais questões Obama estava vindo
Como exemplo de mensagens-chave para unir.
podemos recordar Barack Obama apelan- Esta definição de mensagens-chave e es-
do à «união de uma nação fragmentada en- pecíficas é tão importante que uma elabora-
tre “azuis e vermelhos”»; ler no boné do ex- ção equivocada da mensagem pode destruir
-presidente Donald Trump a inscrição com uma liderança e levar qualquer estratégia
o Make America Great Again ou descobrir o eleitoral à ruína. Na verdade, uma mensa-
tweet fixado que a presidenta da Comuni- gem equivocada é a principal causa de morte
dade de Madrid, Isabel Díaz Ayuso, mante- de campanhas fracassadas.
ve durante a última campanha eleitoral, que Por isso, devemos parar e pensar naque-
dizia: “Liberdade ou comunismo”. Como ve- las características que nos permitem cons-
mos, mensagens que definem os temas, tons truir uma mensagem política atrativa, seja
e abordagens em que a campanha será leva- para uma campanha eleitoral, seja para uma
da adiante. comunicação governamental. Longe de
Mas como essas mensagens-chave po- abordar todas as características (o que exi-
dem ser muito gerais para o público, elas giria um texto acadêmico exclusivo), lista-
devem ser acompanhadas de submensa- remos aquelas questões que podem ser mais
gens elaboradas com o objetivo de explicar determinantes, assim como nos deteremos
ou aprofundar detalhes ou nuances sobre os nos erros ou omissões mais comuns.
temas, tornando-os mais interessantes para O primeiro, por ser óbvio, não deve ser
as diferentes audiências selecionadas. Nor- ignorado: o objetivo da mensagem políti-
malmente, trata-se do mesmo conceito ves- ca. A mensagem deve se conectar com nos-
tido de outra forma. Voltando ao exemplo sa audiência. Sua finalidade é a persuasão e
da campanha de Obama em 2008, as sub- para isso é necessário estabelecer uma co-
mensagens tratavam de outras fraturas mais nexão com o cidadão, que permita captar
específicas do que a mencionada entre de- a sua atenção, isolando-o por um momen-
mocratas e republicanos, para avançar na to de outras mensagens que também lutam

50 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


para se impor. Isso parece óbvio, mas não « A mensagem política deve
é. As campanhas eleitorais e a comunica- ser simples. […] vivemos
ção de governo estão repletas de exemplos
com mensagens difusas, enigmáticas, des- em um momento em que a
conexas. Mensagens ineficientes que se per- atenção da audiência é um
dem em meio à sobrecarga de informações. bem escasso. »
Por isso é essencial ter uma mensagem úni-
ca, original, facilmente lembrada e, sobretu-
do, compreensível para a sua audiência, não manos temos diante da imensa quantidade
apenas para aqueles que a idealizaram. Uma de mensagens que recebemos diariamente e
mensagem política que não se conecta com em todos os momentos. Por isso, uma men-
seu público é um verso inútil; é ruído. sagem simples, que não requer atenção ex-
É por causa dessa busca por persuasão cessiva, tem mais possibilidades de penetrar
que a mensagem política deve ser simples. em nosso público. Mas, atenção, tampouco
Não — como muitas vezes se acredita — se deve confundir simplicidade com falta de
porque nosso público careça de habilidades conteúdo. A mensagem simples, longe de
cognitivas para compreendê-lo, mas porque ser vazia, deve sintetizar em sujeito, verbo e
vivemos em um momento em que a atenção predicado uma grande ideia, transforman-
da audiência é um bem escasso. Este concei- do-a em conceitos próximos e de fácil diges-
to, que se enquadra na economia da atenção, tão para o receptor. Na comunicação políti-
nos fala da capacidade limitada que nós hu- ca atual, devemos entender que não estamos

É A MENSAGEM, ESTÚPIDO! 51
em um concurso de inteligência nem deve-
mos demonstrar nossos conhecimentos téc- « A comunicação política
nicos elaborados; temos de conseguir que moderna nos obriga a pensar
os cidadãos nos entendam, seja para nos es- nas diversas audiências
colher entre nossos adversários, seja para
que devemos impactar com
apoiar nossas medidas de governo.
Como vemos, uma parte da mensagem nossa mensagem. »
é transformada e traduzida em palavras. A
mensagem também é discurso: é o que diz se fotografaram juntos em protesto contra
um líder político ou um candidato. A pa- o Governo, foi uma mensagem tão potente
lavra, nesse sentido, tem um protagonismo que acabou legitimando um Vox incipiente
especial na construção da mensagem. Uma e mergulhando o “liberal” Albert Rivera, lí-
seleção cuidadosa de uns termos por ou- der do Ciudadanos, em uma profunda cri-
tros pode mudar radicalmente nossa men- se. Este é um grande exemplo que evidencia
sagem. Da mesma forma, as entonações e as como a agenda, as pessoas com quem nos
ênfases fazem com que um discurso emo- reunimos e os espaços que visitamos são
cione ou caia no esquecimento. Deixar este parte da mensagem política.
aspecto para as habilidades inatas de um di- Isso, que parece efêmero, fica evidente
rigente é não aproveitar o potencial do dis- quando pensamos na foto que todos os lí-
curso e das capacidades do emissor político. deres buscam na Casa Branca. Estar no Sa-
Uma boa narrativa com recursos estilísticos lão Oval, ao lado do presidente dos Estados
e símbolos que encapsulem muito signifi- Unidos, é um símbolo e tanto. Um cenário
cado em pouco espaço é um elemento en- e uma ação que transcende as palavras e ad-
riquecedor que leva nossa mensagem a um quire muito mais sentido em um momen-
novo patamar. to em que o visual prevalece sobre o escrito,
Por outro lado, a mensagem deve ser coe- nas redes sociais e nas mídias tradicionais.
rente. Coerente com o líder, com a campa- Isso nos leva ao fato de que a mensagem
nha ou com a corporação que a enuncia. política deve ser visual. Toda mensagem po-
Coerente com seus ideais e com os valores derosa deve ser concebida e enunciada em
que historicamente defende. Vimos como imagens. A fotografia de George W. Bush
a perda de coerência enterra os partidos de com um alto-falante, de pé sobre os escom-
centro quando se inclinam para um lado; os bros das Torres Gêmeas logo após o ataque
partidos locais quando se concentram em de 11 de setembro e cercado por bombeiros e
temas nacionais; ou os líderes que hoje di- policiais é, por exemplo, a mensagem ante-
zem uma coisa e pouco depois dizem o con- cipatória que ilustrou a subsequente incur-
trário. A coerência, um ingrediente essen- são no Iraque e no Afeganistão.
cial na construção da confiança, deve ser Mas não se deve pensar na mensa-
constante, permanente e resistir a qualquer gem visual só como uma fotografia, senão
hemeroteca. que o próprio discurso poderá apelar para
Mas a mensagem política é mais do que imagens que sejam facilmente decodifica-
palavras em um pedaço de papel ou um das e ilustradas visualmente na imaginação
tweet. A mensagem são os cenários e as ati- de nossos públicos. Públicos que uma boa
tudes. “A foto de Colombo” [“La foto de Co- mensagem deve segmentar.
lón”], em que três líderes espanhóis — de A comunicação política moderna nos
partidos de direita, centro-direita e centro — obriga a pensar das diversas audiências que

52 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


devemos impactar com nossa mensagem. quecem do que você diz, mas lembram de
No início do marketing político, a diversi- como você as fez sentir”. Essa mesma ava-
ficação da mensagem era um pecado. Anos liação pode ser trasladada à mensagem po-
depois, se começou a dividir as audiências lítica, em que as palavras de um discurso
por idades, segmentos socioeconômicos, podem ser esquecidas, mas o rastro do que
gênero e talvez por população. A comuni- sentimos ao ouvi-lo permanece no tempo.
cação atual nos obriga a pensar em um sem- Em suma, a mensagem política deve
-fim de segmentos específicos que comple- identificar um objetivo; deve ser produto
xificam as antigas mensagens padrão. Esta de uma pesquisa bem pensada em que se
diversificação da mensagem nos obriga a definam os públicos. Requer uma elabora-
dizer a mesma coisa, mas de diferentes for- ção que diferencie entre mensagens-chave
mas; em diferentes formatos — texto, vídeo, e mensagens segmentadas por audiências.
meme, gift, etc.; e em diversos canais — mí- Necessita ser pensada como um grande con-
dias tradicionais, redes sociais, novas mí- junto de ações e cenários. A mensagem po-
dias, etc. lítica é muito mais do que palavras, embora
Um aspecto interessante da mensagem estas sejam fundamentais. A mensagem po-
política é que o resultado não é completamen- lítica deve ser visual e emocional. Deve des-
te próprio. Nós podemos construí-la perfeita- pertar sentimentos e mover a fibra dos pú-
mente, mas a decodificação é feita pelo outro blicos que são escolhidos.
e nesse processo de decodificação não impor- Deve ser simples, sintética e com uma
ta tanto o que queremos contar, senão o que linguagem clara. Tudo isso para vencer a
o outro quer ouvir. Por isso, a mensagem po- batalha na economia da atenção e poder ser
lítica deve contemplar o estudo do chama- persuasiva, provocando, mais cedo ou mais
do metro quadrado do eleitor ou do cidadão. tarde, uma ação: que votem em nós.
Aquele espaço pessoal onde estão localizados
os problemas reais e cotidianos das pessoas. Kike Borba
Se queremos que nossa mensagem seja per- Licenciado em Comunica-
suasiva, então falemos de algo que a audiên- ção Social, mestre em Con-
cia quer escutar. Se a mensagem política tra- sultoria Política pela Uni-
ta sobre faixas para bicicletas (ciclovias) e a versidade Pontifícia de Sa-
preocupação cidadã trata sobre inseguran- lamanca. Doutorando pela Universidade de
ça, deveremos adaptar nossa mensagem para Navarra. Especialista em gestão da reputa-
que nossa proposta seja vista como uma so- ção, assuntos públicos e gestão de crises tan-
lução para os problemas de insegurança ou, to para o setor público quanto para o setor
do contrário, não conseguiremos nos conec- privado. Colaborou com organizações pú-
tar com esse segmento. blicas e privadas da Alemanha, Argentina,
Chegados a este ponto, seria bom não Áustria, Canadá, Colômbia, Espanha, Esta-
focarmos na mensagem como um simples dos Unidos, México, Nicarágua, Paraguai,
discurso ou como uma concatenação racio- República Dominicana e Uruguai. É convi-
nal de palavras, mas no que elas significam dado regular em cursos de graduação e pós-
e simbolizam para os públicos que as escu- -graduação nas universidades Católica (Ar-
tam. O que sentem e quais valores os mobi- gentina), De la Sabana (Colômbia), Cami-
lizam. Há algum tempo, o ator e produtor lo José Cela (Espanha), National Democratic
estadunidense Warren Beatty mencionava Institute (ndi) e Fundação Konrad Adenauer
sobre as artes cênicas que “as pessoas se es- no México.

É A MENSAGEM, ESTÚPIDO! 53
O papel da Internet
em campanhas: lições
aprendidas
Marta Rebolledo de la Calle

Podcast
“La importancia
de las redes sociales
en campaña”

54 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


A Internet tornou-se tão elementar nas campanhas políticas como
na vida cotidiana, de tal forma que já não é possível propor uma
campanha sem estabelecer uma presença nas redes. O artigo
apresenta oito conselhos sobre como criar uma campanha
na internet.

A Internet mudou todos os âmbitos da ativida- « As novas mídias digitais


de humana e, portanto, também a política. Se a mudaram as regras do
televisão mudou a forma de fazer política, a ir-
jogo no ambiente político;
rupção das novas tecnologias fez com que, atual-
mente, vivamos em uma transformação perma- sobretudo no que diz
nente e constante. A novidade em relação ao res- respeito à implementação
to das mudanças produzidas desde a introdução de estratégias eleitorais:
da imprensa no século xv é a velocidade com
mudou o uso que fazemos
que se desenvolvem e a dificuldade em assimi-
lá-las. Embora, no início, muitos políticos des- das formas tradicionais
confiassem da internet e encontrassem dificul- de comunicação. »
dades para se adaptar a este novo meio e lingua-
gem, hoje em dia a maioria é consciente de que
eleições não podem ser vencidas sem que se es- 1. Não subestimar ou sobrestimar
teja presente na esfera digital. o poder da internet
As novas mídias digitais mudaram as regras
do jogo no ambiente político; sobretudo no que A Internet é mais uma ferramenta de co-
diz respeito à implementação de estratégias municação que temos à nossa disposição.
eleitorais: mudou o uso que fazemos das for- Os meios digitais vêm complementar ou-
mas tradicionais de comunicação, assim como tras vias de comunicação tradicionais como
a busca pelo voto e a mobilização do eleitorado. a televisão ou a imprensa. Quando falamos
Apesar do uso generalizado que os políticos fa- de meios digitais, nos referimos a uma gran-
zem das mídias sociais, seu uso ainda pode ser de variedade de elementos: blogs, páginas
bastante aprimorado. da web, fóruns, diferentes tipos de redes so-
As redes sociais permitem criar uma co- ciais como Facebook, Twitter e aplicativos de
munidade por meio da interação de seguido- mensagens como WhatsApp ou Telegram.
res e potenciais eleitores. Para tal, são necessá- A Internet não deve ser considerada
rios tempo e dedicação. A seguir, são expostas como uma panaceia: as eleições não são
as principais lições que podemos extrair do ganhas apenas por meio da internet; no
uso da internet em campanhas e que devemos entanto, não se pode ganhá-las sem ela.
levar em conta antes de empreender qualquer Por exemplo, no caso dos jovens, é notá-
disputa eleitoral. vel a importância que o digital adquire para

O PAPEL DA INTERNET EM CAMPANHAS: LIÇÕES APRENDIDAS 55


acessá-los. Precisamente, os nativos digitais « A Internet não deve ser
— a chamada geração Z — tendem mais a considerada como uma
usar as redes sociais como a principal fonte
panaceia: as eleições não
de notícias do que a acessar um site de uma
mídia específica (risj, 2021). são ganhas apenas por meio
A Rede tem muitas vantagens das quais internet; no entanto, não se
é necessário saber tirar proveito. Entre mui- pode ganhá-las sem ela. »
tas outras, nos permite aplicar técnicas de
persuasão muito mais econômicas e efeti-
vas. Graças à enorme quantidade de infor- candidato fez de um simples lápis o símbolo
mações fornecidas pelas redes sociais, po- e eixo de sua campanha eleitoral. Este objeto
demos identificar aqueles grupos de pessoas cotidiano estava presente em todos os seus
que são potenciais eleitores e dirigir a eles comícios e atos de campanha, bem como
um anúncio. Além disso, nos permite fazer nos elementos tradicionais de publicidade,
uma escuta da conversa que é gerada nas re- e chegou inclusive a ser logo do seu próprio
des, o que se chama de social listening, e ana- partido político, Perú Libre. Além disso, tor-
lisar quais assuntos são de interesse. nou-se o elemento estrela do merchandising
No entanto, não se deve esquecer que da campanha. As imagens de Castillo com
há vida além do âmbito digital. Em outras seu lápis e as de seus seguidores com répli-
palavras, a realidade supera o digital. Nem cas e pinturas do objeto em diversos espa-
todo mundo está presente nas redes. Por ços públicos foram distribuídas pelas redes
isso, nunca devemos negligenciar as outras sociais da campanha, contribuindo assim
formas de comunicação que temos à nossa para reforçar e ampliar o efeito mobilizador
disposição ou subestimá-las devido ao pro- que se buscava com dita campanha. Na Es-
tagonismo adquirido pela Internet. panha, nas eleições gerais de abril de 2019,
o psoe (Partido Socialista Operário Espa-
nhol) imitou o estilo de expressão das re-
2. Off-line e online: duas caras, des sociais para transferi-lo para o restan-
uma mesma campanha te dos espaços públicos tradicionais; de tal
forma que o símbolo do coração (como um
Um dos erros habituais é considerar a par- like) inundou cada um dos eventos de cam-
te digital da campanha como um elemento à panha ao passo que se propagava também
parte. No entanto, a estratégia digital faz par- nas redes sociais.
te da estratégia geral, ou seja, se entendemos
a estratégia como a espinha dorsal de uma
campanha, a parte digital faz parte desse 3. A importância do visual
eixo. São duas caras da mesma moeda. Para
isso, é necessário que haja uma convivência e Na fase de elaboração de uma mensagem,
coordenação entre ambas as esferas. Na prá- é necessário concentrar-se não somente na
tica, porém, ainda há candidatos e partidos própria mensagem; ainda mais importantes
que planejam suas campanhas como se fos- são as imagens geradas por essa mensagem.
sem duas realidades diferentes. Conforme se destaca no podcast En Cam-
Um exemplo dessa convivência entre as paña no episódio 4, dedicado à construção
duas esferas é a campanha de Pedro Castillo da mensagem, é necessário converter a men-
para as eleições no Peru em 2021. O então sagem em imagens. As imagens têm um im-

56 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


pacto poderoso na atenção e retenção dos es- pelo papel dos elementos visuais nas cam-
pectadores; graças a elas, é mais fácil atrair panhas eleitorais (Veneti, Jackson e Lilleker,
a atenção do cidadão e se conectar com ele 2019), ou seja, o chamado visual framing, a
ou ela, e que a mensagem seja lembrada. O forma como enquadramos a mensagem vi-
uso estratégico de imagens e vídeos é uma sualmente (Grabe e Bucy, 2009).
ferramenta útil para que os partidos políti- Os políticos são muito conscientes do
cos criem e mantenham a confiança e a re- papel crítico que as imagens desempenham
putação. quando o público os avalia. É por isso que
Precisamente, as melhores campanhas cada vez mais exploram as plataformas de
são aquelas que têm um componente vi- redes sociais como o Instagram, focadas no
sual muito forte, seja através de símbolos, visual. Um exemplo disso é o uso que Justin
imagens, seja por meio de outros elemen- Trudeau, primeiro-ministro do Canadá, faz
tos visuais. Para isso, temos que ir renovan- das redes sociais. Desde que assumiu a lide-
do e disponibilizando uma série de imagens rança do Partido Liberal em 2013, ele e sua
que se associem à mensagem que quere- equipe demonstraram uma extraordinária
mos transmitir. E é aqui que as redes so- gestão das redes, acompanhada de uma estra-
ciais como Instagram ou Facebook, nas tégia calculada milimetricamente para cons-
quais prevalece o componente visual, po- truir uma imagem de líder acessível, afável e
dem nos ajudar. De fato, no campo da in- simpático; em suma, uma imagem de con-
vestigação em comunicação política, os aca- senso que, por sua vez, complementa e refor-
dêmicos demonstram um maior interesse ça a essência de seu legado político baseado

O PAPEL DA INTERNET EM CAMPANHAS: LIÇÕES APRENDIDAS 57


na defesa de liberdades individuais e no reen- Esses fenômenos ajudam os candidatos a
contro com a população nativa do país. apresentar uma imagem atraente para seus
eleitores e, por sua vez, a aumentar a iden-
tificação cidadã e diminuir a distância psi-
4. O lado mais pessoal da política cológica entre eles e seus potenciais eleito-
res. Dessa forma, as lideranças enquadram
No momento de elaborar a mensagem em estrategicamente as imagens mostrando um
uma campanha eleitoral, devemos pen- caráter mais pessoal e privado, sendo as re-
sar qual é a história que queremos contar, o des sociais o ambiente ideal para isso. Con-
storytelling. Hoje, isso recai principalmente cretamente, e em comparação com outras
sobre o próprio candidato ou candidata. A redes sociais, o Instagram promove um ca-
centralidade na figura do candidato ou lide- ráter mais informal com imagens mais es-
rança política se reflete no fenômeno da per- pontâneas, apolíticas e casuais; há mais es-
sonalização da política. Trata-se de uma ten- paço para mostrar a dimensão privatizadora
dência que se refere ao protagonismo que os da personalização (Farkas e Bene, 2021).
líderes adquiriram nos processos políticos Por isso é comum nos depararmos, nos
(Rebolledo, 2017). Se, anteriormente, aspec- perfis de candidatos nas redes, com pos-
tos como a ideologia, o pertencimento a uma ts com imagens jantando em família, cozi-
classe social e a religião eram fatores deter- nhando em casa, praticando esportes ao ar
minantes para a decisão do voto, atualmente livre, curtindo um show do seu grupo favo-
o político em nível individual parece ser um rito ou comendo um hambúrguer em uma
elemento que vertebra as decisões políticas conhecida e popular rede de restaurantes,
tomadas pelos eleitores (Rico, 2009; Garzia, como Barack Obama fez em várias ocasiões.
2014). A personalização se materializa em
uma estratégia de comunicação enfatizando:
a visibilidade do candidato em relação ao seu 5. Internet como agente
partido e políticas, os traços mais marcantes de mobilização
de sua personalidade, bem como certos as-
pectos de sua vida privada. A Internet propiciou um novo contexto mi-
No entanto, a preocupação com a ima- diático e social conhecido como sistema mi-
gem do político sempre existiu na política; diático híbrido (Chadwick, 2013). Este novo
muda o contexto, assim como os meios para sistema implica em mudanças nas relações
gerenciá-la. Se a televisão é o meio por ex- entre o poder político, a mídia e os cidadãos.
celência da personalização, as redes sociais Precisamente, uma mudança é a troca e mo-
intensificam esse fenômeno e configuram o dificação dos papéis antes adotados pelos
ambiente ideal para que se desenvolvam ou- políticos, pelos jornalistas e pelas pessoas.
tros semelhantes, como a popularização ou Os cidadãos-usuários não são apenas recep-
a chamada pop-politics.6 tores de mensagens, mas se tornaram emis-
sores, criadores de conteúdo e até influen-
ciadores em seus círculos. Nesse contexto, é
6 A popularização é entendida como outra estra-
tégia de comunicação que busca apresentar o
necessário entender a campanha como um
candidato interagindo com ambientes e perso- espaço de construção em que intervêm esses
nalidades do mundo da televisão, da música, do novos agentes que são os seguidores e poten-
esporte e do cinema, e também reproduzindo o ciais eleitores. É por isso que, hoje em dia, é
cotidiano dos cidadãos, ou os costumes e as prá-
ticas dominantes em relação à cultura popular. cada vez mais difícil pensar em uma modali-

58 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


dade de campanha centralizada, pois conta- « O usuário e potencial
mos com usuários autônomos, espontâneos eleitor é um consumidor
e, às vezes, até criativos.
multitela, a maior parte
Esta nova dinâmica, que favorece o diá-
logo e a mobilização, supõe uma vanta- da informação que recebe
gem para nossa campanha se conseguir- é para consumo imediato
mos aproveitar a contribuição dos usuários. e há um tal excesso de
Nessa linha, temos um caso recente de uma
mensagens que se encontra
campanha descentralizada graças ao poder
mobilizador da Internet. Trata-se de Éric em um contexto de
Zemmour, personagem polêmico e possível saturação de informação, a
candidato às eleições presidenciais francesas chamada infoxicação. »
de 2022. Até o momento, não confirmou sua
candidatura, mas, graças a um movimento
organizado e promovido por seus seguido- decorridas, este perfil seja fechado ou per-
res, Génération Z, a expectativa em torno de maneça no esquecimento. Este tipo de ação
sua figura e do próximo tabuleiro eleitoral é diminui a credibilidade e os usuários a in-
máxima, e se tornou um ator onipresente na terpretam como uma prática oportunista.
cobertura midiática do país. Um exemplo disso é Nicolas Sarkozy, quan-
do em 2012 decidiu reabrir seu perfil no
Twitter justamente poucas horas antes de
6. As redes sociais, além da campanha anunciar sua candidatura à reeleição presi-
dencial em uma entrevista na televisão.
As redes sociais são plataformas que permi-
tem ao candidato, candidata ou liderança
política interagir com seus seguidores, sim- 7. A necessidade de uma
patizantes e potenciais eleitores. Como não profissionalização das redes
há intermediação alguma, o político pode
encaixar a mensagem que quiser e como qui- No contexto das democracias midiáticas, os
ser: ele tem controle absoluto na emissão. No políticos vêm se adaptando continuamen-
entanto, para que a mensagem tenha o efei- te à lógica midiática com o fim de garantir
to desejado, deve haver uma conexão com os um espaço em uma esfera midiática cada vez
seguidores para estes o identifiquem como mais competitiva; esfera onde mais canais de
uma fonte confiável e próxima. Para isso, é comunicação tentam coexistir em um con-
preciso alimentar as redes de forma paulati- texto pautado pelo imediatismo, ubiquidade
na com conteúdo bem elaborado e interagir e um ciclo de informação de vinte e quatro
com os seguidores para ir construindo uma horas diárias, e onde a atenção se torna um
relação. bem escasso. Hoje em dia continuam se es-
Às vezes, os candidatos mostram explici- forçando para se adaptar ao novo ambiente
tamente que só entendem as redes como um de mídia digital que muda em um ritmo ver-
mero instrumento eleitoral, ao invés de con- tiginoso com o surgimento de novas tecno-
siderá-las como uma via para seguir cons- logias como é o caso do Snapchat, do TikTok
truindo sua liderança. É uma prática muito ou da Twitch.
comum abrir um perfil em uma mídia so- Deve-se entender que o usuário e po-
cial pouco antes de eleições e que, uma vez tencial eleitor é um consumidor multitela,

O PAPEL DA INTERNET EM CAMPANHAS: LIÇÕES APRENDIDAS 59


a maior parte da informação que recebe é segmentação baseada em uma série de variá-
para consumo imediato e há um tal excesso veis padronizadas para uma microssegmen-
de mensagens que se encontra em um con- tação dos eleitores tão específica que se che-
texto de saturação de informação, a chama- ga quase a uma busca individualizada.
da infoxicação. Além disso, o usuário não Essa microssegmentação ou microtarget-
utiliza a Internet apenas para a busca de no- ing aproveita o sistema de coleta de dados de
tícias, mas também para socialização, diver- plataformas como Facebook ou Twitter para
são e entretenimento. Daí que a adaptação direcionar uma mensagem a um determina-
também deve ser refletida por meio da lin- do perfil de usuário-eleitor. É, portanto, uma
guagem e de modos específicos de expressão ferramenta fundamental por meio da qual
de cada plataforma ou meio digital, inclusi- podemos identificar nichos de eleitores. A lo-
ve da criatividade. Por exemplo, mediante o calização de nichos é extremamente impor-
uso de emoticons ou hashtags. tante no contexto político atual, onde cada
E aqui é ainda mais necessária, se pos- vez há mais competitividade, um eleitorado
sível, a profissionalização das redes so- mais fragmentado, mais partidos em cena,
ciais; nem todas as plataformas funcionam um voto mais volátil que não se rege pelo
da mesma forma e são destinadas ao mes- eixo esquerda-direita e o desaparecimento
mo tipo de usuários. Um erro comum é pu- de governos com maioria absoluta. Por cau-
blicar a mesma mensagem e da mesma ma- sa dessas dinâmicas, alguns poucos votos po-
neira em todos os canais sem adaptá-los às dem fazer a diferença em eleições apertadas.
idiossincrasias de cada um deles. Se se trata As vitórias de Trump nos Estados Unidos e
de nutrir uma relação aparentemente mais de Bolsonaro no Brasil são alguns casos re-
pessoal, respondendo a demandas especí- centes em que se demonstrou a efetividade
ficas ou direcionando mensagens para pú- dessa segmentação minuciosa.
blicos mais precisos, deve-se levar em conta
que cada plataforma possui uma arquitetura
digital própria, com protocolos técnicos que Referências bibliográficas
influenciam no comportamento dos usuá-
rios no espaço virtual: cada plataforma fun- Bosetta, M. (2018). The Digital Architectures
ciona e impulsiona diferentes interações en- of Social Media: Comparing Political Cam-
tre os usuários, o que afeta o engajamento paigning on Facebook, Twitter, Instagram,
(Bosetta, 2018). and Snapchat in the 2016 U.S. Election. Jour-
nalism and Mass Communication Quarterly,
95(2), 471-496.
8. Da segmentação tradicional ao Chadwick, A. (2013). The hybrid media system:
microtargeting Politics and power. Oxford: Oxford Universi-
ty Press.
A digitalização permitiu que sejamos mais Farkas, X., e Bene, M. (2021). Images, Politi-
eficientes com nossos recursos para a gestão cians, and Social Media: Patterns and Ef-
de campanhas. Graças ao mundo digital, é fects of Politicians’ Image-Based Political
possível ajustar melhor nossos públicos, ob- Communication Strategies on Social Media.
jetivos ou targets e dirigir-lhes uma mensa- International Journal of Press/Politics, 26(1),
gem criada ad hoc para cada um dos segmen- 129-142.
tos identificados. Desta maneira, atingiu-se Garzia, D. (2014). Personalization of politics and elec-
tal grau de sofisticação que passamos de uma toral change. Basingstoke: Palgrave Macmillan.

60 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Grabe, M. E., e Bucy, E. P. (2009). Image bite po- Marta
litics: News and the visual framing of elections. Rebolledo de la Calle
New York: Oxford University Press. Possui um duplo doutora-
Rebolledo, M. (2017). La personalización de do internacional pela Uni-
la política: una propuesta de definición para versidade de Navarra e pela
su estudio sistemático. Revista de Comunica- Université Paris-Est. É professora de Comu-
ción, (16)2, 147-176. nicação Política no Departamento de Co-
Reuters Institute for the Study of Jour- municação Pública e subdiretora do Mes-
nalism (RISJ). (2021). Digital News Re- trado Executivo em Reputação Corporati-
port, 2021. https://reutersinstitute.politics. va (merc) da Universidade de Navarra. Foi
ox.ac.uk/sites/default/files/2021-06/Digital_ membro da direção do Mestrado de Comu-
News_Report_2021_final.pdf nicação Política e Corporativa (mcpc) da
Rico, G. (2009). Líderes políticos, opinión públi- Universidade de Navarra (unav) nos últi-
ca y comportamiento electoral en España. Ma- mos anos. Faz parte da direção da Seção de
drid: CIS. Pesquisa em Comunicação Política da Asso-
Veneti, A., Jackson, D., e Lilleker, D. (eds.) ciação Internacional de Ciência Política (In-
(2019). Visual Political Communication. Pal- ternational Political Science Association —
grave Macmillan, Cham. ipsa). Seus interesses de pesquisa incluem
marketing político, campanhas eleitorais,
comunicação digital e transparência e comu-
nicação pública de instituições.

O PAPEL DA INTERNET EM CAMPANHAS: LIÇÕES APRENDIDAS 61


Jornalistas e políticos,
uma relação necessária

Verónica Fumanal

Podcast
“Gestión con los medios
de comunicación”

62 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Lidar com um mercado de informação fragmentado e polarizado
é complexo. No entanto, manter uma boa relação com os meios
de comunicação tradicionais segue sendo uma estratégia vital se
quisermos que eles ecoem a mensagem que queremos transmitir,
conforme refletido pelos nove pontos-chave propostos pelo artigo.

As eleições são basicamente um espaço tem- « O monopólio [dos


poral em que mais cidadãos do que os habi- meios de comunicação]
tuais concentram sua atenção na classe po-
lítica. Os meios de comunicação também se transformou em
dedicam mais espaço do que o habitual às um oligopólio, no
manchetes resultantes da batalha eleitoral, qual as redes sociais
propiciando uma sobreinformação duran-
desempenham um papel
te um período em que os eleitores devem de-
cidir sobre o futuro da circunscrição. Embo- fundamental, sobretudo
ra seja verdade que os meios de comunicação quando segmentamos os
tradicionalmente eram o principal modo de eleitorados por coortes
informação política, agora seu monopólio se
transformou em um oligopólio, no qual as re-
geracionais. »
des sociais desempenham um papel funda-
mental, sobretudo quando segmentamos os tante agora do que na época em que alguns
eleitorados por coortes geracionais. Grosso poucos meios de comunicação dominavam
modo, pode-se dizer que as pessoas com mais o mercado da informação. Atualmente, ao
de cinquenta anos têm um consumo de meios consumo diferenciado de informação com
de comunicação mais tradicional, a saber, rá- base na idade somam-se outros fenômenos
dio, televisão e imprensa; aqueles entre trin- como a atomização da mídia, a substituição
ta e quarenta são uma geração de transição, dos meios catch-all pelos meios de nicho, a
que consome meios de comunicação e redes bunkerização editorial ou a importância da
sociais indistintamente. No entanto, os com diversificação da narrativa transmídia.
menos de trinta anos foram socializados no No entanto, e apesar de os meios de co-
âmbito da comunicação e da informação por municação tradicionais terem perdido peso
meio dos dispositivos móveis e das redes so- específico como únicos veículos de trans-
ciais, de modo que todos os conteúdos que missão de informação, em sociedades de pi-
consomem são on demand ou por meio de râmide invertida e em campanhas em que
plataformas de streaming em que a comuni- parte do seu público-alvo está acima da
cação é bidirecional, com participação direta. meia-idade, os jornalistas e os meios de co-
Assim, a segmentação da informação municação seguem sendo um canal fun-
em uma campanha eleitoral é mais impor- damental ao que não se pode nem se deve

JORNALISTAS E POLÍTICOS, UMA RELAÇÃO NECESSÁRIA 63


« A segmentação da
informação em uma
campanha eleitoral é mais
importante agora do que na
época em que alguns poucos
meios de comunicação
dominavam o mercado da
informação. »

renunciar. Este capítulo trata de analisar di-


versas questões que devem ser avaliadas no
momento de propor uma estratégia com os
meios de comunicação e os jornalistas.

Má relação

“Má relação”, esta seria a manchete do capí-


tulo se tratarmos de uma forma superficial a
relação predominante entre jornalistas e as-
sessores de imprensa. Basicamente, ambos
querem o mesmo, mas no sentido contrário. que em muitas ocasiões pode terminar em
Ambos querem controlar o que aparece nos amizade, se ambas as partes permitirem.
meios e, infelizmente, esses conteúdos não Gosto de dizer que os jornalistas são, para a
são coincidentes, senão opostos. O staff de equipe de campanha, como os filhos: você tem
campanha sempre buscará uma manchete que amá-los, mesmo que eles não te amem,
positiva, uma proposta, uma fotografia bo- porque como guardiões da goleira depende-
nita, mas devemos estar cientes de que as in- mos deles para chegar aos eleitores que os
formações boas não costumam ser notícia, escolhem para se informar.
nem o conteúdo que mais vende jornais. Um
escândalo, um erro, uma polêmica, uma in-
vestigação que revela abusos... são os conteú- Relação simbiótica
dos que um jornalista mais gosta, mais ven-
de e dos quais mais se orgulha. Portanto, a Se a má relação é a manchete, que precisamos
relação que se estabelece entre campanha um do outro mutuamente é a grande verda-
e meios de comunicação é a luta constante de. Os meios de comunicação vendem infor-
para impor o enquadramento, para contro- mação e a que vem do poder público é graças
lar o relato e, sobretudo, para que nada de aos profissionais de imprensa e comunica-
negativo seja publicado durante os últimos ção que trabalham diariamente selecionan-
dias de campanha, cada vez mais decisivos do, preparando e transmitindo conteúdos.
em eleições com alta volatilidade. Mas, além disso, por parte da política e das
Não obstante, tenho que reconhecer que campanhas, precisamos dos meios de comu-
sob essa má relação, se tece uma associação, nicação para que levem nossa mensagem aos

64 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


cidadãos de uma forma estruturada e siste- Batalha do relato
mática. Assim, a estratégia mais inteligen-
te é aquela que encontra pontos de encontro Tradicionalmente, os meios de comunica-
entre ambos os profissionais da informação, ção eram chamados de gatekeepers ou golei-
com uma máxima comum: que uma socie- ros porque, de alguma maneira, eles eram
dade bem informada é uma sociedade livre os guardiões da atualidade, quem decidia o
e mais democrática. Como essa estratégia que importava, o que merecia ser contado.
é colocada em prática? Adaptando a publi- Atualmente, as redes sociais são um ambien-
cação de informação aos ciclos informati- te autônomo com dinâmicas que nada têm
vos, respeitando os profissionais por meio a ver com as reuniões de redação que deci-
de uma relação baseada em conteúdos ver- diam o que era notícia. A batalha do rela-
dadeiros e objetivos, oferecendo tratamento to, o que é notícia e o que não é, hoje é mais
igualitário a todos os meios de comunicação participativa do que nunca, embora na mi-
e sendo democrático com as exclusivas ou nha opinião não chegue a ser democrática.
vazamentos. O que devemos esperar dos jor- Os meios estão tão polarizados — um tema
nalistas, em troca, os gabinetes de comunica- que abordaremos mais à frente — que as ca-
ção política? Respeito aos off the records ou às pas de uns e outros não costumam coincidir,
informações nas fontes, rigor no tratamento como se informassem sobre sociedades di-
das informações, honestidade no tratamen- ferentes; além disso, as redes sociais são ge-
to de conteúdos interessados ou de parte e, radoras de notícias que muitas vezes trans-
sempre, o recolhimento da versão dos inte- cendem o mundo online para permear nos
ressados. meios de comunicação tradicionais. E, claro,

JORNALISTAS E POLÍTICOS, UMA RELAÇÃO NECESSÁRIA 65


a terceira coluna nesta batalha somos os ga- dores mais fervorosos não hesitam em atacar
binetes de comunicação política, que tam- os meios de comunicação que não são per-
bém utilizamos todas nossas ferramentas cebidos com simpatia. Esta crise de credibi-
para tentar superar a barreira dos meios de lidade faz com que se ressintam das institui-
comunicação e das redes sociais para colocar ções e, portanto, da democracia. Precisamos
nossa mensagem. recuperar a credibilidade junto aos cidadãos
se quisermos preservar os sistemas institu-
cionais da democracia liberal.
Crise de credibilidade

Tanto os meios de comunicação como a po- Perda de intermediação


lítica experimentam na atualidade uma cri-
se de credibilidade importante. Os dados nos Vinculada à crise de credibilidade decorre a
dizem que, na maioria dos países, os políti- perda da intermediação, tanto da imprensa
cos são um dos principais problemas dos ci- quanto da política, o que faz com que os ci-
dadãos, mas os meios de comunicação não dadãos procurem outros canais de duvido-
estão muito melhor. Já é habitual ver como os so profissionalismo para se informar e re-
jornalistas são atacados pelos cidadãos como corram a partidos populistas como opção de
porta-vozes da manipulação. De fato, não representação. Se analisamos alguns dos fe-
são poucos os atos políticos em que os segui- nômenos políticos recentes na Espanha, mas

66 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


« Cada vez são mais as
plataformas pseudo-
informativas com
interesses não declarados
ou conteúdos que circulam
sem assinatura nas redes. »
ganizações para as quais trabalham, sendo
rigorosos, confiáveis, em uma relação sim-
biótica capaz de responder, sobretudo, aos
direitos e necessidades das e dos cidadãos-
-eleitores.

Atomização midiática

Responder a todas as solicitações dos meios


de comunicação em meio à campanha é qua-
se impossível, e isso se deve basicamente a
duas questões, uma técnica e outra políti-
ca. Em primeiro lugar, pela fragmentação do
mercado midiático. Desde o surgimento dos
meios na Internet, a oferta se multiplicou, fa-
zendo com que a demanda por entrevistas,
também em outros países, estes foram lide- informação e conteúdos voltados para a po-
rados por plataformas não vinculadas a par- lítica também crescesse. Assim, é material-
tidos políticos, como, por exemplo, o movi- mente impossível dedicar um espaço de tem-
mento #MeToo, que tomou os partidos en- po do candidato ou candidata para atender
redados em outras questões, e se somaram a todos os meios de comunicação que hoje
à onda feminista sem liderá-la. No âmbito se dedicam a publicar informação. É preciso
da imprensa, cada vez são mais as platafor- escolher, tomar decisões estratégicas como a
mas pseudoinformativas com interesses não de gerir o tempo, que se converteu em um
declarados ou conteúdos que circulam sem dos recursos mais limitados que temos na
assinatura nas redes, que aparecem como política.
as opções preferidas dos cidadãos em detri- A segunda questão tem a ver com o ideo-
mento dos meios de comunicação tradicio- lógico e também está relacionada às deci-
nais, com garantias de rigor e profissionalis- sões estratégicas. A própria fragmentação
mo. De modo que os partidos políticos e os midiática trouxe uma atomização que trans-
meios estão em uma crise de intermediação formou o mercado midiático da grande mí-
como pilares democráticos da representação dia catch-all em mídia de nicho, com uma
política e do direito à informação. Por isso, marcada tendência ideológica. Esta conse-
gabinetes de comunicação e jornalistas de- quência guia a decisão estratégica da esco-
vem ser plenamente conscientes do desafio lha à que me referi anteriormente. Desper-
que têm à frente: recuperar o papel das or- diçar tempo atendendo a veículos em que

JORNALISTAS E POLÍTICOS, UMA RELAÇÃO NECESSÁRIA 67


não temos nem mesmo um de nossos eleito- uma campanha eleitoral. A nova medida de
res potenciais é um luxo que não podemos tempo é o instante, tudo expira em minutos
nos permitir durante uma campanha eleito- e planejar com uma semana de antecedência
ral, por mais audiência que tenham ou mais se converteu em estratégia. São tempos de
simpáticos que nos pareçam. grande aceleração, em que a informação po-
lítica é consumida como fast food, sem mui-
ta cozinha de reflexão nem grande qualida-
Bunkerização da opinião de dos conteúdos. Os formatos televisivos de
infotainment buscam o ritmo e o dinamismo
Outra das consequências da atomização mi- e, infelizmente, os discursos calmos, profun-
diática é a bunkerização da opinião publica- dos já não se encaixam na forma de consu-
da, um efeito que consiste na homogeneiza- mo da política do espectador. Os meios de
ção dos formadores de opinião nos meios de comunicação procuram ser os primeiros a
nicho. Cada vez mais, e devido à fragmenta- dar um furo, não poucas vezes passando por
ção, a luta pelos recursos publicitários se ba- cima da máxima da confirmação das três
seia nas audiências, a propósito, mais dispu- fontes, o que levou a grandes erros e peque-
tadas e discutíveis. Há certos meios que lu- nas retificações.
tam no terreno do prestígio, outros no da Em uma campanha eleitoral, o ritmo ace-
influência de setores poderosos, outras se lera ainda mais, cada candidatura luta para
guiam pelo número de vendas ou cliques. Es- impor seu relato e se prepara todo tipo de re-
tes últimos são os mais orientados à homo- viravoltas para focar o mercado mais com-
geneização editorial, para concentrar usuá- plexo que se conhece, o da atenção do eleitor
rios que buscam ou esperam confirmar suas indeciso. Portanto, a partir dos gabinetes de
opiniões e crenças. Assim, com o ânimo de campanha e estratégia, deve-se planejar uma
satisfazer esse tipo de audiência, os meios estratégia que imponha o ritmo, que não se
buscam formadores de opinião cada vez deixe levar pelos ventos dos adversários, se-
mais ortodoxos em relação a seus posicio- não que contenha elementos para controlar a
namentos ideológicos, produzindo um efei- agenda e mudar o cenário de forma constan-
to túnel que converte os leitores em mais ho- te e com a cadência adequada para não ficar
mogêneos em função do efeito de Festiger atrás da resposta do resto.
chamado dissonância cognitiva. Esta ques-
tão tem muitos desdobramentos para a nar-
rativa eleitoral, pois, entre os eleitores du- Demos-kracia
ros, reafirmados nessa bunkerização da opi-
nião pública, podem parecer pouco atrativas A cada dia mais, a influência da tendência
as mensagens mais moderadas ou centristas mainstream ou modal é mais significativa
que costumam ser lançadas durante as cam- durante as campanhas devido, fundamental-
panhas com o objetivo de atrair os indecisos. mente, à alta volatilidade e à diminuição do
número de eleitores fiéis, principalmente nas
contendas em que há o chamado voto estra-
Capital impaciente tégico. Este voto ocorre em sistemas parla-
mentaristas, nos quais são necessários vários
Foi mencionado antes que o tempo, possivel- partidos para formar uma maioria parla-
mente junto com o financiamento, é o recur- mentar que outorgue confiança ao Gover-
so mais valioso na política, e mais ainda em no. Conforme relata a teoria sobre compor-

68 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


tamento eleitoral, o voto útil é ativado em Verónica Fumanal
determinadas ocasiões, dependendo da con- Mestra em Marketing Polí-
juntura e dos possíveis cenários marcados tico. Licenciada em Ciências
nas pesquisas; nem sempre é ativado, por- Políticas pela Universida-
tanto, em função de nossos objetivos. Temos de Autônoma de Barcelona.
que saber como manejar as informações de Possui ampla experiência no
sondagem [demoscópicas] publicadas sobre setor da comunicação pública, bem como na
porcentagem de voto, principalmente nas úl- direção de gabinetes de comunicação e cam-
timas horas decisivas. panhas eleitorais. Docente em vários mes-
trados em comunicação política, colabo-
ra em diversos meios de comunicação, bem
Conclusão como em publicações e apresentações espe-
cializadas. É a atual presidenta da Associa-
De uma forma muito resumida, foram re- ção de Comunicação Política (acop).
passados alguns dos fenômenos que afetam
a relação entre política e meios de comunica-
ção em nível global. Certamente, se se ana-
lisa conjuntura por conjuntura, encontram-
-se outros fenômenos específicos também
importantes, como os mencionados no ca-
pítulo 7 do podcast En Campaña, de Andoni
Aldekoa, sobre a gestão dos meios de comu-
nicação. No entanto, quisemos realizar uma
análise desde uma perspectiva global, que
pretende abranger as principais característi-
cas das democracias liberais.
Os jornalistas buscam notoriedade, vi-
sitas, vender jornais e, portanto, obter ren-
da, enquanto as empresas de comunicação,
com suas contas anuais e seu conselho de
administração, o exigem. Na política busca-
mos notoriedade, visitas e captação de votos
e, portanto, resultados com os quais alcan-
çar o poder como elemento de transforma-
ção social. Precisamos uns dos outros e, por
isso, devemos estabelecer uma relação ba-
seada na confiança, na lealdade e na veraci-
dade, que ajude a consolidar a confiança em
nossas instituições e, portanto, em nossas
democracias, cada vez mais ameaçadas pe-
los fenômenos populistas no terreno da po-
lítica, e das fake news no terreno dos meios
de comunicação.

JORNALISTAS E POLÍTICOS, UMA RELAÇÃO NECESSÁRIA 69


Audácia e antecipação:
novas tendências
na publicidade eleitoral

Ricardo Amado Castillo

Podcast
“La publicidad”

70 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Hoje em dia, o ambiente da propaganda eleitoral pode parecer
complexo. Isso faz com que aderir às seis prioridades (eleitores,
essência, estilo, expectativas, estratégia e emoções) marcadas por
este artigo facilite o êxito na criação de uma campanha publicitária
adaptada ao novo ambiente de comunicação.

“Quem é Xavier Hervas?”. Assim chamava- « Há momentos em que


-se uma das peças da campanha presiden- o objetivo central da
cial de Xavier Hervas (Equador, 2021), que
buscava apresentar o candidato a partir dos publicidade é romper a
olhos de cidadãos que iam contando ele- inércia, chutar o tabuleiro,
mentos biográficos de Hervas, destacando conseguir ser parte
suas primeiras atividades empresariais, seus
da conversa pública,
principais êxitos, seu perfil empresarial, seu
uso regular do TikTok e seus valores expres- fazer a mídia falar
sos a partir da relação com seus empregados. sobre sua campanha.»
Dois objetivos fundamentais da comunica-
ção política em uma só peça: contar sua his-
tória e se conectar com a história daqueles conectada com a estratégia. Este foi o caso
que você aspira a representar. da campanha de Xavier Hervas, a quem tive
Duas frases fundamentais do spot: “Não, o prazer de acompanhar. Tudo em sua cam-
pa; não é um político, é um empreende- panha estava alinhado e pensado para po-
dor” e “Esta é a oportunidade de escolher sicionar um personagem diferente, autênti-
algo diferente para o nosso futuro, estamos co. Por isso foi tão importante o branding; o
cansados da velha politicagem”. A estraté- slogan “Atreva-se! Somos gente nova” repre-
gia de campanha estava baseada fundamen- sentava a reivindicação permanente da dife-
talmente em duas ideias complementares renciação e, além disso, um grito de guerra,
que deviam ser ressaltadas uma e outra vez um convite a ser protagonistas coletivos de
por todas as vias: por um lado, diferenciar uma nova história.
Hervas da classe política tradicional, desta- Há momentos em que o objetivo central
cando o seu contraste com “os mesmos de da publicidade é romper a inércia, chutar o
sempre” e, ao mesmo tempo, visibilizar seu tabuleiro, conseguir ser parte da conversa
perfil empresarial de sucesso (tradução: ‘ge- pública, fazer a mídia falar sobre sua cam-
rador de empregos’). panha. Isso foi alcançado em boa medida
Assim como se pode ver no sexto episó- por meio de uma campanha digital absolu-
dio do podcast En Campaña, a publicidade tamente disruptiva, com um Hervas que foi,
eleitoral é sempre mais efetiva quando, ade- sem dúvida, o rei do TikTok: se fantasiou de
mais de ser criativa, está verdadeiramente bruxa, adaptou uma música do caminhão

AUDÁCIA E ANTECIPAÇÃO: NOVAS TENDÊNCIAS NA PUBLICIDADE ELEITORAL 71


de gás, zombou de si mesmo em um vídeo cidadãos (professores, médicos, policiais, ta-
usando imagens do filme infantil Shrek, se xistas, empreendedores etc.), e isso ainda se
uniu a peças já feitas por outros candidatos tornou um aplicativo digital para que sim-
e incluiu sua imagem nelas. A aposta cria- patizantes e militantes também fizessem seu
tiva, comunicacional e publicitária rendeu próprio cartaz digital.
seus frutos. Passamos de ter um candidato Nessa mesma linha, podemos estudar
desconhecido a liderar um movimento de três casos de imagens publicitárias recentes
“gente nova” que reivindicava uma forma em que se privilegiava mostrar o(a) candi-
diferente de fazer política. dato(a) rodeado de cidadãos. Falamos sobre
Hoje, quando falamos em publicidade, os casos de Pablo Iglesias com Unidas Po-
nos referimos a muitas coisas ao mesmo demos em 2019, com o slogan “Um governo
tempo: à imagem e ao branding da campa- com você”, Beatriz Sánchez, candidata a pre-
nha com seu slogan, às peças nas vias pú- sidente no Chile em 2017 com a mensagem
blicas, a produtos centrais (audiovisuais, di- “O poder de muitos”, e John Vinueza, candi-
gitais e impressos) e ao imenso desafio de dato para prefeito de Riobamba no Equador
desenvolver conteúdo associado ao dia a em 2019 com sua mensagem de “O poder do
dia. E, como se não bastasse, à geração de cidadão”. Com motivos e contextos diferen-
temas segmentados para as diversas redes, tes, não há dúvida de que essas campanhas
atendendo aos públicos-chave. queriam posicionar a ideia de que estavam
Como ordenamos tudo isso para não do lado do povo, e é preciso destacar a coe-
nos perdermos no caos da vida cotidiana? rência que a imagem de cidadãos e cidadãs
Proponho seis “E”, que explico abaixo, e que confere a esses slogans.
nos ajudam a organizar o ecossistema publi-
citário de conteúdos:
E2: Essência
– Eleitores
– Essência Precisamos contar a história de nosso(a)
– Estilo candidato(a). Contar sua história deve
– Expectativas transcender o currículo, as conquistas, a tra-
– Estratégia jetória. Deve permitir-nos conhecer a pes-
– Emoções soa, seus valores, suas origens, os momentos
mais importantes da sua vida, e não apenas
os seus grandes êxitos. No caso de John Hi-
E1: Eleitores ckenlooper, em 2003, o spot “Suit” conta uma
história muito interessante em que antes de
Frequentemente dizemos que os cidadãos ser candidato a prefeito havia sido geólogo e,
são os protagonistas da eleição. De acordo, após ser demitido, dedicou-se a fazer cerveja
então busquemos alternativas para demons- com seu próprio restaurante. A partir dessa
trar de forma tangível que eles e elas também história, ele tinha todos os elementos para se
são protagonistas da campanha e da publi- posicionar como o oposto dos políticos tra-
cidade. Um bom exemplo disso é o cartaz dicionais (MayorHickenlooper, 2008).
eleitoral utilizado em via pública pela cam- Em algumas campanhas, parecem acre-
panha da Frente de Todos na Argentina em ditar que contar a sua história é apenas parte
2019. Nele, de um lado aparecia o candida- de uma fase inicial da campanha, mas, pelo
to a presidente do outro apareciam rostos de contrário, acho que é algo a fazer durante

72 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


toda a campanha, inovando na forma de re- « A narrativa é uma
petir a mesma coisa de maneiras diferentes.
É exatamente isso que podemos apreciar na
ferramenta muito
campanha do então candidato Joe Biden. poderosa que nos permite
Em um post e em um vídeo na mesma linha, ordenar a mensagem
o agora presidente compartilhava um mo- a partir das categorias:
mento doloroso de sua vida, a trágica morte
de sua primeira esposa e de sua filha, ou so- ameaça, oportunidade,
bre como todos os dias ele devia ir e voltar vítimas, vilões, soluções
de Washington d.c. de trem para compar- e herói. »
tilhar pelo menos “um beijo pelas manhãs”
com seus filhos (Joe Biden, 2020). Além de
humanizar o candidato, tudo isso permite de estilos. Em muitos casos, simplesmente
conectar a história do candidato com a his- mostrando um Biden capaz de escutar em
tória do eleitorado, neste caso por meio de meio a momentos tão difíceis quanto os vi-
um valor superior, o valor da família. vidos após o assassinato de George Floyd;
em outros, mostrando um líder capaz de
ouvir representantes da comunidade cientí-
E3: Estilo fica, algo especialmente relevante em meio à
crise da pandemia.
A forma é pano de fundo na cena publicitá- O estilo tem a ver principalmente com a
ria. Precisamos dar às nossas campanhas um forma como o candidato se relaciona com
estilo que nos ajude a nos diferenciar. Vol- o eleitorado e com a forma como, no dia a
tando à campanha de Hervas, parte também dia, mostramos a intenção de construir um
de seu posicionamento teve que ver com o vínculo especial. O estilo também tem a ver
esforço permanente de mostrá-lo escutando com o que desejamos projetar.
a população: via Facebook Live ou por Zoom
com interessados, praticamente diariamen-
te, respondendo pessoalmente às mensagens E4: Expectativas
do WhatsApp, e reunindo-se frequentemen-
te com jovens em cafetarias, em um formato O que prometemos? O que vamos mudar?
que acabou por se chamar “Cai onde Xavi” As mudanças que oferecemos, quão profun-
[“Cae donde Xavi”]. E tudo isso, levado em das elas são? Contra o que lutamos? Con-
peças que plasmavam a ideia do candida- tra quem? A favor de quê? Quais são nossas
to diferente, que sim escuta. Dada a percep- bandeiras centrais? A campanha de Trump
ção generalizada de que muitos políticos não de 2016 sem dúvida deve ser estudada a par-
escutam, o posicionamento de que estamos tir de sua narrativa. A narrativa é uma ferra-
verdadeiramente dispostos a ouvir em mui- menta muito poderosa que nos permite or-
tos casos é um grande diferencial. denar a mensagem a partir das categorias:
Na campanha presidencial dos Estados ameaça, oportunidade, vítimas, vilões, solu-
Unidos em 2020, o estilo dos dois candida- ções e herói. Trump foi especialmente claro
tos, Biden e Trump, não poderia ser mais em uma mensagem sobre a potencial perda
diferente. Isso foi usado com grande inte- do sonho americano (ameaça), que os me-
ligência pela campanha de Biden, que fre- xicanos e Washington d.c. eram em grande
quentemente evidenciava esse contraste parte os vilões, e que um muro tinha que ser

AUDÁCIA E ANTECIPAÇÃO: NOVAS TENDÊNCIAS NA PUBLICIDADE ELEITORAL 73


construído para controlar as fronteiras (so- promissos que assumimos a partir da defi-
lução). nição de ameaças, oportunidades, vilões,
Tudo isso pode ser visto no spot “En- vítimas e soluções. No spot “Acabar com a
emies” (Wall Street Journal, 2016) e é re- corrupção” (amlo 2018, no México) tam-
forçado no conceito publicitário Drain the bém encontramos uma narrativa que de-
Swamp. Washington d.c. (vilão, os políticos finia que a causa dos problemas mais im-
corruptos que não tomam decisões) é um portantes no México (pobreza, insegurança
pântano, e qual melhor maneira de apresen- etc.) estava relacionada principalmente com
tar uma promessa de mudança radical do a corrupção dos políticos.
que o conceito literal de limpar o pântano. A verdadeira intenção dessas peças era
Nesse ponto, o principal efeito da publicida- posicionar amlo como o único que ver-
de de Trump passa por posicionar-se fron- dadeiramente lutaria contra esse flagelo. E
talmente com os inimigos externos e inter- amlo repetia várias vezes, de diferentes ma-
nos, assumindo a capital como origem de neiras, este compromisso de lutar contra a
todos os problemas, dada a corrupção pre- corrupção. Em alguns casos de forma ge-
dominante dos políticos tradicionais. ral e em outros com medidas concretas que
A narrativa, mais do que uma proposta deram à população expectativas sólidas de
explícita, acaba por posicionar a promessa mudanças. Neste caso, o spot “Eliminar pen-
central e define as expectativas que nossos são mensal de 5 milhões para ex-presiden-
eleitores podem ter de nós, dados os com- tes” (Andrés Manuel López Obrador, 2018)

74 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


reflete uma medida concreta e ao mesmo pandemia. A campanha de Biden rapida-
tempo dá um rosto aos vilões. mente preparou várias peças publicitárias
No meio de uma campanha eleitoral, fa- afirmando que Trump não tinha se prepara-
lamos de muitas coisas, mas temos que ten- do a tempo, mesmo com muitos sinais e evi-
tar posicionar bandeiras, ideias centrais, dências, e que também havia tentado enga-
que acabem gerando uma expectativa po- nar o eleitorado minimizando a ameaça que
sitiva nos cidadãos. A grande maioria dos a pandemia representava. Tudo isso é sin-
eleitores não vai se lembrar de todas as nos- tetizado nos spots “Unprepared”, “Timeline”
sas mensagens, muito menos de todas as e “Totally negligent”, que mostram um pre-
nossas propostas. O que sim podem e de- sidente errático, negligente, absolutamente
vem ter com clara é uma expectativa do que vencido pela crise.
queremos mudar, continuar e promover, de Na campanha presidencial de 2004 nos
nossas posições sobre temas fundamentais Estados Unidos, o ex-presidente Bush (fi-
ou sensíveis, e das coisas que não faremos. É lho) buscava sua reeleição e concorria con-
o caso da campanha de Biden com um spot tra John Kerry, então senador democrata
“My Plan”, em que se compromete a não au- do estado de Massachusetts. Kerry era nada
mentar nem um centavo em impostos para mais nada menos que veterano do Vietnã
quem ganha menos de us$ 400 mil. com a condecoração Coração Púrpura. No
início da campanha, Bush (filho) parecia
ter o vento contra ele, mas o contraste com
E5: Estratégia Kerry foi devastador. Por um lado, surgiram
peças apresentadas por grupos de veteranos
Embora para muitos consultores e comu- do Vietnã questionando justamente o que
nicadores a estratégia passe pela ideia de até aquele momento era uma das grandes
construir um roteiro, um mapa com objeti- forças de Kerry, como a apresentada por um
vos, ações e metas, para mim isso é, em todo pac chamado Swift Boat Veterans for Truth
caso, mais como o plano de campanha. Mi- (BattleCryOf Freedom, 2006).
nha abordagem conceitual da estratégia em A outra peça publicitária fundamental
uma campanha eleitoral é de que ela passa, na definição de Kerry foi apresentada des-
fundamentalmente, por construir um posi- de a campanha de Bush, uma peça conheci-
cionamento que nos permite diferenciar-nos da como “Windsurf ad”, que mostra o candi-
(de todos) nossos oponentes. Em outras pala- dato Kerry praticando windsurf enquanto a
vras, em um mundo em que, com maior fre- voz de um narrador em off comenta múlti-
quência, muitos eleitores manifestam / sen- plas posições “incongruentes” do candidato
tem / percebem que todos são iguais, nosso sobre temas como apoio (ou rejeição) à guer-
trabalho passa por nos diferenciar de forma ra no Iraque, apoio (ou rejeição) ao aumen-
correta. to do orçamento para as tropas, aumento (ou
Outro dos elementos estratégicos fun- rejeição) à reforma educacional. A mistura
damentais passa por definir o adversário. das imagens do fazendo windsurf mudando
Idealmente, chegando ao ponto de rotulá- de direção com o vento gera um efeito bru-
-lo com um conceito que visibilize os riscos talmente simples de posicionar: “John Kerry,
de que seja (re)eleito, dependendo do caso. em qualquer direção que o vento o leve” (Ma-
A eleição dos Estados Unidos em 2020 sem viglio, 2006). Esta peça foi muito importan-
dúvida foi, em boa medida, um referendo te na definição de Kerry como um candidato
sobre a gestão do ex-presidente Trump na em quem não se podia confiar.

AUDÁCIA E ANTECIPAÇÃO: NOVAS TENDÊNCIAS NA PUBLICIDADE ELEITORAL 75


A definição do adversário também se « Passando para o lado da
aplica a sistemas não bipartidários. Como
esperança, há momentos
exemplo, nas eleições relativamente recen-
tes da comunidade de Madrid (2021), Isabel em que o desejo de
Díaz Ayuso definiu Pablo Iglesias como seu mudança se torna tão
adversário, para além da presença de outros poderoso que em grande
candidatos, alguns igualmente competiti-
vos. Esta aposta se refletiu publicitariamen-
medida é o principal
te na definição da ameaça, na definição dos objetivo da publicidade. »
termos do debate, como uma decisão entre
liberdade ou comunismo. Este exemplo tal- se, posicionando-se como o candidato que
vez seja um dos mais poderosos para estu- “caminhava com os sapatos do povo”.
dar sobre o poder que a publicidade pode O golpe de misericórdia veio quando,
chegar a ter na definição do que está em diante de uns ataques que queriam posicio-
jogo em uma eleição. ná-lo como louco, seus publicitários inver-
teram a situação e transformaram este tema
em uma poderosa identidade coletiva: “os
E6: Emoções loucos somos mais”.

Sempre dizemos que votar é emocional. As


principais emoções pelas quais decidimos Comentários finais sobre os desafios
nosso voto são o medo ou a esperança. Medo da publicidade
de que as coisas que tememos continuem
ou piorem. Medo de perder nossa identida- Vivemos, sem dúvida, uma mudança de épo-
de, nossa qualidade de vida. E esperança de ca em termos de publicidade. Precisamos,
que as coisas mudem. Uma das primeiras pe- por um lado, pensar na geração de capaci-
ças da campanha de Biden, “A Battle for the dades para produzir muito mais peças que,
soul of the nation” (Joe Biden, 2019), conecta- além disso, devem ser executadas com ra-
va emocionalmente com o momento de con- pidez. O jogo também passa por responder
vulsão que se vivia em meio à tensão racial bem e antecipar-se aos adversários. Ao mes-
resultante do assassinato de George Floyd, e mo tempo, temos que assumir que vivemos
especialmente como produto da reação do em uma era em que, estando todos mais co-
presidente Trump a esses eventos. Biden dei- nectados, estamos ao mesmo tempo mais
xava claro que tínhamos diante de nós uma desconcentrados (pouco atentos). Isso nos
possibilidade certa de que o país continuas- traz o desafio de conseguir chamar atenção,
se se dividindo e fraturando, como resultado ou nada do que dissermos funcionará.
da ruptura causada por Trump. Como se isso não bastasse, estamos
Passando para o lado da esperança, há diante de um ecossistema fragmentado em
momentos em que o desejo de mudança se canais e meios, no qual temos que avaliar o
torna tão poderoso que em grande medida melhor desenvolvimento de mensagens por
é o principal objetivo da publicidade. Nas plataformas diversas chegar com efetivida-
eleições presidenciais do Panamá, em 2009, de em nossas audiências.
Ricardo Martinelli conquistou espaço rapi- Podemos assumir que tudo mudou e
damente apropriando-se totalmente do de- se complexificou, é verdade, mas ao mes-
sejo de mudança e, como se isso não bastas- mo tempo não mudou a necessidade de es-

76 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


tudar em profundidade necessidades, ex- com/watch?v=7ef8xufT-KI
pectativas, percepções, medos e sonhos do Joe Biden. (2019, julho 21). Soul of the Nation |
eleitorado para, com base na melhor com- Joe Biden For President [vídeo]. https://www.
preensão das emoções e do estado de espí- youtube.com/watch?v=CGSMcO8snQI
rito deste, construir mensagens que conec- Maviglio. (2006, maio 3). Historical Campaign
tem verdadeiramente e que sejam capazes Ad: Windsurfing (Bush-Cheney ‘04). [vídeo].
de captar sua atenção. https://www.youtube.com/watch?v=pbdz-
Muitos dos exemplos apresentados têm a MLk9wHQ
ver com a autenticidade. Autenticidade para Mayorhickenlooper. (2008, abril 8). John Hi-
fazer coisas diferentes, autenticidade para ckenlooper “Suit” 2003 Mayoral Campaign Ad
dizer coisas de outra maneira, autenticidade [vídeo]. https://www.youtube.com/watch?-
para experimentar novos formatos, diferen- v=6Edwq9vHTWs
ciando-nos no processo. Autenticidade que Wall Street Journal. (2016, janeiro 4). Do-
praticamente constrói marcas, personagens, nald Trump Releases First TV Ad [vídeo]. ht-
e que nos permite dominar a agenda estabe- tps://www.youtube.com/watch?v=qa3edsM-
lecendo os termos do debate. zHkA
O outro ingrediente que permanece uma
das chaves da publicidade é o contraste. Ricardo
Contraste que não é sinônimo de ataque, se- Amado Castillo
não de diferenciação. A melhor publicidade Tem pós-graduação em Ad-
tem que nos ajudar a definir a nós mesmos, ministração de Empresas,
nossos adversários e, ao longo do caminho, Ciência Política e Gestão de
definir os termos do debate. Campanhas Eleitorais. É professor do Mes-
Falamos muito sobre a política estar em trado em Comunicação Política e Gover-
crise. Talvez possamos dizer que a publici- nança Estratégica da The George Washing-
dade política também está. A melhor publi- ton University e consultor político com ex-
cidade não é a mais criativa, para além do periência em todo o continente americano.
fato de que a criatividade é sempre aprecia- Assessorou candidatos, governos e partidos
da, pois também há momentos para uma políticos na Argentina, no Brasil, no Equa-
publicidade mais autêntica e que não trans- dor e no México. Participou das equipes de
mita excessos desnecessários de produção. estratégia e comunicação política de campa-
nhas presidenciais, municipais e legislativas,
e dirigiu processos de formação destinados
Referências bibliográficas a lideranças políticas na Argentina, no Peru
e no Uruguai. Atualmente divide residência
Andrés Manuel López Obrador. (2018, abril entre Washington d.c. e Quito.
8). Eliminar pensión de 5 millones mensuales
a expresidentes [vídeo]. https://www.youtu-
be.com/watch?v=oLFGsnclNZw
Battlecryoffreedom. (2006, novembro 9).
Swiftboat Veterans Ad on John Kerry—Sellout
(2004) [vídeo]. https://www.youtube.com/
watch?v=phqOuEhg9yE
Joe Biden. (2020, julho 10). 4 Hours | Joe Biden
For President [vídeo]. https://www.youtube.

AUDÁCIA E ANTECIPAÇÃO: NOVAS TENDÊNCIAS NA PUBLICIDADE ELEITORAL 77


A arte de contar
histórias: por que
os relatos funcionam

María Gabriela Páez

Podcast
“El discurso político”

78 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


O storytelling, ou assimilação das características de um produto
a uma narração, é uma frutífera ferramenta de marketing que,
trasladada para a propaganda eleitoral, garante que a mensagem do
candidato chegue ao eleitor de uma forma que este rapidamente a
entenda e internalize.

Os seres humanos precisamos de relatos sim- empresarial, social ou eleitoral, são muitas
ples para compreender a realidade. Natural- as atividades cotidianas que estão impregna-
mente os procuramos. São eles que nos per- das de relatos. No entanto, os primórdios do
mitem compreender e ordenar as situações storytelling remontam às empresas na déca-
e contradições do mundo em que vivemos, da de 1990, especificamente nos Estados Uni-
que facilitam que identifiquemos e tenha- dos. Naquela época, as corporações entende-
mos empatia com um determinado cenário. ram que, além de destacar as características de
De geração em geração, esta necessidade ina- seus produtos, ao oferecer valores associados
ta fomentou que façamos uso dos relatos para à sua marca poderiam comprometer ainda
conectar e aprender; para transferir com efi- mais seus clientes com o projeto. Atualmente,
ciência uma informação, para que esta seja já sabemos que esta técnica transcendeu para
entendida e retida pelo ouvinte; para persua- outros âmbitos.
dir e mobilizar.
De fato, o relato acompanha a história do
homem. É uma parte elementar de nossa cul- Cercados de histórias
tura, tradições, memória coletiva e muito mais.
Os formatos têm variado: discursos, imagens, Para ilustrar como os relatos permearam a
vídeos, áudios; mas a essência segue sendo sociedade, recapitulemos o que pode ser uma
a mesma. Por que, então, se há tanto tempo manhã qualquer durante a semana. Você se
o relato tem estado presente em nossa expe- prepara em casa para ir trabalhar. Você liga a
riência, agora parece que contar relatos — ou televisão enquanto faz o café da manhã e as-
storytelling — é a nova grande descoberta? siste a um comercial protagonizado por um
casal de idosos, desfrutando de uma refeição
em família. Ao mesmo tempo, uma voz em
Origem do storytelling off fala sobre a importância de passar tem-
po com nossos entes queridos. Segue um
À direita e à esquerda observamos como (parti- carrossel de vídeos: o casal brincando com
cularmente nas últimas duas décadas) o termo os netos, vendo um entardecer, indo às com-
storytelling é mencionado pelos especialistas pras. Nos últimos três segundos do comer-
como uma técnica elementar para, dependen- cial, a frase “Nós cuidamos dos seus” apare-
do das audiências, captar a atenção de clientes, ce ao lado de um frasco de comprimidos de
usuários ou cidadãos. Seja para uma campanha cálcio. Você muda de canal e estão repetindo

A ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS: POR QUE OS RELATOS FUNCIONAM 79


os discursos do comício da noite anterior de
um dos candidatos a governador para as pró-
ximas eleições. Você aumenta o volume:

[...] é minha prioridade. Juana, aqui


à minha direita, acaba de compartilhar
seu caso comigo. Ela não tem emprego
desde março, e Juana tem dois pequenos
em casa. Sua situação econômica é bas-
tante apertada, a ponto de haver dias em
que não há dinheiro suficiente para fazer
o mercado. Mas graças à escola pública
onde seus filhos estudam, ao seu refeitó-
rio e às ajudas do Estado, Juana não preci-
sa se preocupar com a fome de seus filhos.
É pela experiência dela, e pela de milhares
de mães solteiras sem trabalho, que sem-
pre defenderei o grande esforço das ins-
tituições públicas de ensino, ao contrário
de outros candidatos. É a razão pela qual
lutarei incansavelmente por [...].

Você desliga a televisão, recolhe o que é


da cozinha e abre a porta da sua casa para
sair para o escritório. Nisso, você se depa-
ra com um panfleto que deixaram na sua
entrada, com uma imagem de uma criança
com semblante triste e a frase “Juan tem que
andar quinze quilômetros todos os dias para
conseguir água potável”. Você vira a página
e encontra os dados de uma ong para fazer
doações. Relatos, relatos e relatos. Para lhe
vender um produto, para criar empatia com
e humanizar um candidato, para persuadi-
-lo a fazer uma doação. E assim, você sabe
que um relato é bom quando você encontra « Os relatos costumam fazer uso
um ponto de conexão. Quando você reco- de diferentes recursos literários
nhece ou se reconhece.
para acentuar e amplificar as
emoções: metáforas, hipérboles,
Como nos conectamos nas anáforas, ferramentas que
campanhas? potencializam a transmissão dos
O storytelling tem sido explorado por orga- valores subjacentes à mensagem. »
nizações, líderes sociais, empresas, parti-

80 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


dos político, administrações e muitos ou- do ou candidato queira impulsionar no de-
tros atores. E, de fato, as figuras políticas não bate público. Quando as histórias são boas,
são alheias à conclusão de que os relatos são não é que se vá acreditar nelas, é que se quer
efetivos. Contar histórias é uma ferramenta acreditar nelas.
eficiente para captar a atenção dos diferen- Em seu livro Storytelling: a máquina de
tes grupos de interesse de uma campanha fabricar histórias e formatar mentes, o es-
(stakeholders). Quanto mais atenção derem critor francês Christian Salmon afirma que
ao detalhamento da história, mais ouvirão, nas campanhas eleitorais a realidade se en-
mais perceberão, mais reterão e, portanto, contra coberta em uma “rede narrativa, ca-
mais estarão familiarizados com os concei- paz de filtrar percepções e estimular aque-
tos e discursos que um determinando parti- las emoções que sejam de maior utilidade”.

A ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS: POR QUE OS RELATOS FUNCIONAM 81


« Se o relato é positivo, se Certamente, não se deve acreditar que
toda comunicação é um relato. É possível
construirão mais mensagens
proporcionar uma informação sem gerar
de reforço em torno do nenhum tipo de emoção. Para fazer a dis-
candidato e do partido: tinção entre comunicar algo e contar um re-
experiência e qualificações lato, pensemos que este último suscita uma
reação emotiva.
do indivíduo, trajetória O storytelling é capaz de comover, de ge-
e êxitos do partido rar afinidade ou rechaço e, eventualmente,
em gestões anteriores. » até de mobilizar. Por isso, na esfera políti-
ca, reconhecer o alcance e a importância das
histórias dentro das estratégias comunica-
Dessa maneira, um bom relato impacta, cionais e desenhar mensagens que, seguin-
mas não ofende. Concretamente, permi- do dita estratégia, ressoem com as audiên-
te acionar enquadramentos determinados, cias, marca a diferença entre uma campanha
formar vínculos e estabelecer uma memória eleitoral exitosa e um grande desacerto.
em seus receptores.
Outra característica dos relatos é que
costumam fazer uso de diferentes recursos Direção dos marcos discursivos
literários para acentuar e amplificar as emo-
ções: metáforas, hipérboles, anáforas, fer- Além disso, o relato também definirá o dis-
ramentas que potencializam a transmissão curso e o tipo de aproximação que as campa-
dos valores subjacentes à mensagem. Deve- nhas terão. Em uma campanha negativa, se
-se acrescentar também que os relatos cos- apelará à memória, procurando gerar uma
tumam ser baseadas em mitos universais, agenda que parta das lembranças: por exem-
grandes arcos narrativos que representam plo, “os erros que o outro partido cometeu no
alguns dos obstáculos do homem, como o passado são o que nos levou à desgraça atual”.
mito do herói, a fundação de uma nova pá- Ao contrário, se o relato é positivo, se
tria, o escolhido, o êxodo e muitos outros. construirão mais mensagens de reforço em
Ligia Balderrama, professora de lite- torno do candidato e do partido: experiên-
ratura, cinema e televisão, especializada cia e qualificações do indivíduo, trajetória e
em roteiros, distingue seis elementos-cha- êxitos do partido em gestões anteriores. Da
ve do storytelling: o sujeito, herói da histó- mesma forma, há campanhas que decidi-
ria; o destinado, a força interna ou externa rão centrar o relato na trajetória do parti-
que move o sujeito a agir; o oponente, que do político mais do que no próprio candi-
tenta impedir o sujeito de atingir seu objeti- dato (entre outros, no caso de um candidato
vo; o objeto, aquilo que o sujeito defende ou que não é muito conhecido). Enquanto há
pretende alcançar, o que orienta sua ação; o outras que optam por destacar a figura do
destinatário, que se beneficia diretamente candidato acima de tudo (no caso de um es-
se o sujeito alcança seu objetivo; e, por fim, cândalo do partido, convém separar a pes-
o ajudante, aquele que assessora o sujeito a soa da crise de reputação que seu agrupa-
realizar a ação. O objetivo deste esboço é o mento possa ter).
de esclarecer as peças que devem ser leva- Voltando à construção do relato, ou-
das em conta para construir uma narrativa tro fator elementar a ser levado em con-
atraente e coerente. ta é o destacado pelo professor e jornalista

82 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Roberto Rodríguez, que ressalta que “toda Definitivamente, o storytelling é uma téc-
campanha trabalha com a ideia de tentar nica formidável para comunicação externa.
controlar a pergunta que o eleitor tem que É preciso mencionar, ainda, que também
se fazer na cabeça ao ir votar: ‘por que vou se revelou útil para a comunicação inter-
votar nesse candidato ou nesse partido?’”. A na, particularmente para a gestão de equi-
isso respondemos que as motivações são di- pes. Usá-lo dentro da campanha pode aju-
versas. Uma delas, das mais potentes, acon- dar a unir os grupos de trabalho, aumentar a
tece quando as campanhas apelam ao medo motivação e fortalecer o sentido de propósi-
como emoção principal em suas narrativas. to dos envolvidos no projeto. Séries e filmes
Estes marcos podem conseguir mobilizar relevantes dos últimos anos que recriam as
um cidadão às urnas, não porque acredite dinâmicas das administrações, como The
no candidato em que votará, mas porque a West Wing, Borgen, Madam Secretary, Veep e
alternativa gera angústia e aversão. The Ides of March, acertadamente produzem
situações em que o storytelling interno da
campanha foi um ponto de virada para uma
Casos potentes de storytelling mudança de panorama. Sem dúvida, quem
o líder de um movimento primeiro deve se-
Um exemplo claro deste cenário é aquele ge- duzir e persuadir são os membros de sua
rado pelo Daisy Girl spot. Embora tenha sido equipe direta. Estes serão os primeiros re-
emitido oficialmente apenas uma vez para a plicadores das mensagens de sua campanha.
campanha de Lyndon B. Johnson em 1964, Analisando outro aspecto que tem fa-
considera-se que foi um fator chave no triun- vorecido e ampliado o fenômeno do story-
fo sobre Barry Goldwater nas eleições presi- telling paralelamente ao mencionado, vale
denciais dos Estados Unidos, e um ponto de destacar o crescimento das redes sociais e
inflexão na história política e publicitária. das novas tecnologias. Não só os spots, os ví-
Em suma, fazendo referência às posições de deos e as imagens na era digital têm um efei-
ambos os candidatos sobre a energia nuclear, to multiplicador ao poderem ser enviados
o comercial mostrava uma garotinha brin- diretamente entre usuários por qualquer
cando no campo, quando se ouve uma con- plataforma, mas também as formas e os vo-
tagem regressiva em off que, ao se aproximar cabulários próprios de cada rede social, bem
do zero, aproxima o foco da pupila da crian- como a possibilidade de editar a partir do
ça. No final da contagem, vê-se no reflexo do próprio celular, permitiram que, com me-
seu olho a explosão de uma bomba. Imedia- nos orçamento e mais velocidade, os par-
tamente a seguir, com as imagens da explo- tidos respondam com relatos precisos e vi-
são na tela, ouve-se a voz de Johnson enun- suais aos acontecimentos das campanhas.
ciando: “Isto é o que está em jogo. Fazer um
mundo no qual todos os filhos de Deus pos-
sam viver, ou ir para a escuridão. Ou deve- Enquadramentos, símbolos e imagens
mos nos amar uns aos outros, ou devemos
morrer”. O comercial termina com a reivin- Quanto ao storytelling na política, deve-se re-
dicação “Vote no presidente Johnson em 3 de conhecer que muito se joga no simbólico.
novembro. Há muito em jogo para você fi- Portanto, para que o relato seja efetivo, é fun-
car em casa”. Até hoje, continua sendo classi- damental que, após definir claramente as li-
ficado como um dos anúncios políticos mais nhas discursivas, instaurem-se alguns símbo-
controversos. los claros: imagens potentes que resumam as

A ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS: POR QUE OS RELATOS FUNCIONAM 83


« O que se deve levar em
conta no momento de
construir as mensagens?
Inquestionavelmente, a
dinâmica do contexto e os
interesses e problemas de
sua audiência objetiva. »

lação, já que quando você imagina o que estão


contando, você vai entender melhor, vai reter”.
Durante o mesmo podcast, o jornalista Andoni
Aldekoa conclui que “se a mensagem não gera
imagens, perde força e potência”.
Por outro lado, consideremos agora que
um dos principais objetivos que qualquer
equipe estratégica deseja alcançar por meio do
storytelling em um contexto eleitoral (além de
organizar voluntários, arrecadar dinheiro, re-
crutar filiados e persuadir eleitores) é impor
sua agenda de temas nas conversas cotidianas.
Figura 1. Hope. Cartaz da campanha Obama. Que seu framing (sua narrativa, seu enquadra-
mento, suas palavras, suas imagens) seja aque-
mensagens da estratégia. Igualmente, deve-se le que ressoe com os cidadãos. O que deve le-
mencionar que somente quando se tenha a es- var em conta no momento de construir suas
tratégia com clareza é que a mensagem pode mensagens? Inquestionavelmente, a dinâmica
ser elaborada, para logo fixar os símbolos. do contexto e os interesses e problemas de sua
Estes devem ser capazes de conden- audiência objetiva.
sar muitos significados e apelar à ação. Um Os frames necessitam símbolos e imagens
exemplo claro disso é a campanha de Oba- que os façam ser lembrados, seja em nível cul-
ma em 2008. O pôster “Hope” do candidato, tural, midiático ou psicológico. Para que os
um retrato estilizado de Obama em estêncil nossos públicos-alvo se interessem pelo que
em vermelho, bege e azul com a palavra Hope dizemos, é fundamental saber o que os preo-
(‘progresso, esperança ou mudança’) abaixo, cupa e os afeta (segurança, economia, educa-
foi uma imagem icônica distribuída de for- ção, futuro...). No livro Storytelling para el éxi-
ma impressa e digital que conseguiu aglome- to: conecta, persuade y triunfa gracias al poder
rar os principais elementos de sua campa- oculto de las histórias, Peter Gerber reconhece
nha presidencial nessa única figura. Daniel que as histórias mais impactantes começam
Ureña, sócio fundador e diretor da mas Con- colocando um interesse crucial no centro de
sulting, aponta no décimo episódio do pod- uma ameaça, uma promessa ou uma possibi-
cast En Campaña que “as melhores cam- lidade que o público jamais havia imaginado
panhas são aquelas que têm componentes e que agora não pode ignorar.
visuais muito fortes, quando somos capazes Desenvolvendo com mais profundidade
de gerar imagens mentais na cabeça da popu- sobre a importância e a necessidade de impor

84 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


um enquadramento, o renomado linguis- María Gabriela Páez
ta George Lakoff afirma em seu livro Don’t Licenciada em Estudos Li-
think of an elephant, no qual analisa as dife- berais pela Universidade
renças entre as campanhas e os discursos de Metropolitana da Venezue-
democratas e republicanos nos Estados Uni- la. Cursou o Mestrado em
dos, que a forma de enquadrar uma ideia de- Comunicação Política e Corporativa (mcpc)
termina em grande medida a resposta a esta. da Universidade de Navarra. É consultora de
Como amostra para explorar a eficácia de um comunicação digital e redes sociais com ex-
frame, basta que atores externos a uma cam- periência na Espanha e na América Latina.
panha, como meios de comunicação, analis- Atualmente trabalha como Account Mana-
tas e cidadãos comuns comecem a empregar ger na Dog Social Intelligence, uma empre-
em suas mensagens os conceitos e termos es- sa consultora em comunicação e desenvolvi-
tabelecidos pela campanha do adversário. mento de produtos digitais.

O que você compra?

Assim, sem perceber, estamos cercados de re-


latos em quase todas as atividades de nosso dia
a dia. De histórias que captam, conectam, con-
vencem e, por fim, ativam. Agora, da próxima
vez que você escutar um discurso de campa-
nha, quando passar na frente dos novos anún-
cios da sua prefeitura, quando lhe enviarem
um e-mail para pedir assinaturas para o novo
projeto de lei, pense: que relato estão tentan-
do me vender?

Referências bibliográficas

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plicado. Punto Cero. 13(16), 91-97.
Gerber, P. (2011). Storytelling para el éxito: conec-
ta, persuade y triunfa gracias al poder oculto de
las historias. Madrid: Empresa Activa.
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guaje y debate político. Madrid: Editorial Com-
plutense.
Salmon, Ch., e Roig, M. (2008). Storytelling: la
máquina de fabricar historias y formatear las
mentes. Madrid: Península.
Ureña, D., Rodríguez, R., Aldekoa, A., y Ro-
dríguez, R. (convidados). (2021). En Campaña
[podcast]. Spotify.

A ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS: POR QUE OS RELATOS FUNCIONAM 85


Lições para o presente

O que podemos
aprender com as
campanhas eleitorais
na Roma antiga?
Thomas Schaumberg

86 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Na Roma antiga, fazer campanhas eleitorais significava ativar redes
sociais, demonstrar tanto apoio quanto reputação em toda a cidade
e mobilizar as massas do eleitorado. Em cidades romanas como
Pompeia, não havia programas eleitorais nem partidos políticos
organizados. No entanto, os cartazes eleitorais nas paredes de
Pompeia mostram uma campanha estrategicamente planejada pelos
candidatos e, ao mesmo tempo, um alto grau de envolvimento da
população. Há algo que podemos aprender com o mundo antigo
para nossas campanhas eleitorais?

Pompeia, março de 79 d.C. No átrio da lu- Fazer campanhas eleitorais: três


xuosa residência de Caio Cúspio Pansa, uma rituais sociais e muita atenção
multidão barulhenta se acumula esperan- midiática
do que o dono da casa a receba. Ele vem de
uma família de Pompeia conhecida por sua 1. A salutatio matutina: recepção dos
riqueza e seu êxito político. Já o pai e o avô de seguidores na casa do candidato
Cúspio Pansa haviam ocupado cargos polí-
ticos na cidade. Além disso, uma estátua ho- Estamos a poucos dias das eleições, em ple-
norária e um altar da família testemunham a na campanha eleitoral. Como todas as ma-
influência política e a popularidade da gens nhãs, Pansa convidou para uma recepção
Cuspia. Não deve ter surpreendido ninguém em sua casa (fig. 1). Ele veste uma toga cândi-
que um descendente daquela família con- da, ou seja, de um branco muito puro, quase
corresse a um cargo político. deslumbrante. Com essa vestimenta, todos
Na primavera de 79 d.C., ninguém po- veem que ele é candidatus (vestido de bran-
dia imaginar a catástrofe que atingiria a co), um signo distintivo de todos os candida-
Baía de Nápoles alguns meses depois e que tos a cargos públicos.
custaria a vida de milhares de pessoas. A Pansa se candidatou para ser um dos dois
trágica erupção do Vesúvio congelou a vida edis (aediles) da cidade responsáveis pelo
cotidiana em Pompeia sob uma camada de abastecimento de grãos e pela manutenção
25 metros de cinzas e pedra-pomes. Enter- dos edifícios públicos. Também a organiza-
rados por séculos, também foram preser- ção dos jogos de gladiadores fazia parte de
vados depoimentos dos últimos candidatos suas tarefas. Dessa forma, o cargo de edil era
às eleições municipais. Um deles é o nosso importante para garantir a popularidade na
Caio Cúspio Pansa. população e obter um dos cobiçados postos

O QUE PODEMOS APRENDER COM AS CAMPANHAS ELEITORAIS NA ROMA ANTIGA? 87


Figura 1. O átrio de uma casa luxuosa em Pompeia com impluvium (tanque retangular para transportar a água da chuva)
no centro e o tablinum que levava ao peristilium (recinto interno cercado por colunas). Aqui era realizada a salutatio, o ri-
tual matinal para receber a seguidores. Fonte: Pinterest.

no conselho (ordo), onde se concentrava a tecedem as eleições, bem como as pessoas que
elite da cidade. Ao mesmo tempo, era um vêm diariamente recebê-los e jurar sua lealda-
cargo caro, pois uma grande parte das medi- de, ou seja, seu voto no candidato.
das tinha que ser financiada pelo titular do Pessoas de todos os grupos sociais vie-
cargo com sua fortuna privada. No ano de ram para prestar homenagem ao candida-
79 d.C., quatro pessoas se apresentaram aos to: o núcleo familiar com todos os servos, os
dois postos de edis, o que tornou o ambiente escravos libertos (que devem sua liberdade
político altamente competitivo. Para os can-
didatos, era preciso fazer campanha e con- « [...] esta atenção ao
quistar a maioria do eleitorado.
cliente é o momento de
Nesse sentido, Pansa saúda a todos que
se reuniam no átrio de sua casa, os ouve com mostrar publicamente
atenção e promete ajuda. Sabe bem que esta que se preocupa com
atenção ao cliente é o momento de mostrar as necessidades de seus
publicamente que se preocupa com as neces-
eleitores e que possui
sidades de seus eleitores e que possui os recur-
sos sociais e econômicos para desempenhar os recursos sociais
o cargo desejado. No final, todos recebem e econômicos para
um pequeno presente, geralmente comida ou desempenhar
dinheiro. Esses presentes — sportulae em la-
tim — geralmente aumentam nos dias que an- o cargo desejado. »

88 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Figura 2. O fórum de Pompeia. Ao lado esquerdo da praça principal, o templo de Júpiter; do lado oposto, a cúria, onde o
conselho se reunia. Provavelmente as eleições eram realizadas ao ar livre, entre todos os homens livres de 25 anos ou mais,
com cidadania da cidade. Fonte: Wikicommons (CC BY-SA 4.0/ElfQrin).

para Pansa) e o grande grupo de famílias tes desempenhava um papel importante


que estão sob a proteção da gens Cuspia, sua para ganhar e manter novos seguidores e,
clientela. Não faltam representantes e líderes assim, aumentar a rede de clientes. Ao mes-
de famílias importantes e membros do pode- mo tempo, a salutatio oferecia ao patrão a
roso conselho da cidade para apoiar a candi- oportunidade de se mostrar com outros lí-
datura do jovem Pansa. deres de famílias socialmente iguais, ou seja,
É um ritual social impressionante que sobretudo ricas e, portanto, politicamente
está acontecendo todas as manhãs nesta casa. influentes. O objetivo da salutatio era reu-
Além disso, constitui um pilar fundamental nir o maior número de seguidores na casa
das campanhas eleitorais no mundo antigo. A do candidato e mostrar que, entre eles, tam-
salutatio matutina (saudação matinal) era um bém estavam pessoas influentes e membros
ritual social que estabelecia uma relação de da elite.
patronato entre um patrono de nível socioe-
conômico superior e vários clientes de nível 2. Deductio e adsectatio: percurso ao
socioeconômico inferior. O patrão oferecia fórum acompanhado de seguidores
proteção e, em troca, esperava lealdade, o que
também implicava apoio político nas eleições. Quinto Túlio Cícero, o irmão do famoso es-
Em tempos de campanha eleitoral, a reu- critor e orador Marco Túlio Cícero, em seu
nião diária patrão-candidato com seus clien- Commentalorium petitionis (breve manual

O QUE PODEMOS APRENDER COM AS CAMPANHAS ELEITORAIS NA ROMA ANTIGA? 89


Figura 3. A Via dell’Abbondanza em Pompeia: uma das principais ruas da cidade que levava diretamente ao fórum. Pas-
sar por aqui com os seguidores era imprescindível para os candidatos. Fonte: Flickr.

de campanha eleitoral), distingue três tipos Para chamar a atenção, Pansa sai de casa
de seguidores: “os que vêm cumprimentá-lo acompanhado de seus seguidores. Eles gri-
em sua casa, os que você leva ao fórum e os tam seu nome, mencionam suas virtudes e
que o seguem em todos os lugares”.7 O texto deixam claro que ele é o melhor candida-
faz referência à salutatio e menciona outros to. Esse desfile de seguidores, a adsectatio,
dois rituais relacionados com os seguidores. é o momento para que Pansa mostre a todo
Após a saudação matinal, Pansa sai de mundo sua popularidade por meio da quan-
casa e dirige-se ao fórum, a praça central do tidade de seguidores que sacrificaram seu
centro da cidade (fig. 2). Este percurso cha- tempo para acompanhá-lo.
ma-se deductio. A casa de Pansa está locali- Pansa para nos pontos de concentração,
zada em uma das ruas principais de Pompeia se aproxima das pessoas, cumprimenta e
que leva diretamente ao fórum. Devido às chama as pessoas pelo seu nome. Conver-
muitas lojas, oficinas e tabernas, os arqueó- sa com donos de lojas e tabernas, com co-
logos nomearam esta rua de Via dell’ Abbon- merciantes ou com os prefeitos dos bairro e
danza (fig. 3). Passar por aqui significava representantes de associações profissionais
atravessar o bairro mais povoado e economi- ou religiosas. Dessa forma, quer convencer
camente importante da cidade, ideal para um também multiplicadores em bairros fora de
candidato que queria ser visível para o maior sua área de influência a mobilizar as massas
número possível da população. e ganhar apoio em todos os grupos sociais.

7 Q. Cic., comm. pet., 9.

90 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Figura 4. Propaganda eleitoral na taberna de Asellina, Via dell’Abbondanza (ix, 11, 2), Pompeia. É possível ver cartazes
eleitorais de diferentes campanhas eleitorais dos últimos anos da cidade.

3. Cartazes eleitorais e graffiti: A « A parede na antiguidade é


parede como meio de comunicação
como uma timeline de uma
Quando Pansa anda pela cidade, seu nome rede social hoje em dia: um
está muito presente. Há semanas, sua equipe meio de comunicação para
de campanha colocou centenas de inscrições informações semioficiais,
eleitorais pintadas de preto e vermelho so-
anúncios, publicidades e
bre o reboco ou cal das paredes (fig.4). Nes-
ses cartazes eleitorais8 — que os especialistas listas de preços. »
chamam de programmata — pede-se o apoio
a Cúspio Pansa como edil. Escritores profis- Nos programmata, pede-se que se vote em
sionais os pintaram em letras bem visíveis um candidato, e há associações trabalhistas e
nas paredes próximas à casa do candidato, pessoas famosas, sacerdotes e parentes dos can-
nas ruas principais e pontos de concentração didatos que levantam a voz em favor de uma
da cidade (fig. 5). No manual da campanha determinada candidatura. Há também vários
eleitoral, recomenda-se ter sempre em mãos grafites que reagem à propaganda eleitoral com
um mapa da cidade e planejar sua campanha comentários mais ou menos políticos.
de maneira estratégica. A evidência epigrá- A parede na antiguidade é como uma time-
fica nos permite entender que os candidatos line de uma rede social hoje em dia: um meio
em Pompeia aplicavam este conselho. de comunicação para informações semiofi-
ciais, anúncios, publicidades e listas de pre-
ços. Além disso, servia como superfície para
8 Peças de comunicação realizadas com a técnica do comentários, insultos e depoimentos de pas-
afresco que se conservam nas paredes de muitos edi-
fícios em Pompeia. satempos de todos os tipos, desde rabiscos

O QUE PODEMOS APRENDER COM AS CAMPANHAS ELEITORAIS NA ROMA ANTIGA? 91


Figura 5. O último chamado às urnas em Pompeia. Localização dos cartazes eleitorais da campanha eleitoral de 79 d.C.
em Pompeia. Uma área de concentração é a Via dell’Abbondanza, no sudeste da cidade.

sem sentido até poemas artísticos. Similar Os candidatos preparavam sua candida-
ao que podemos ver hoje nas paredes de ba- tura muito antes de se inscreverem. Tenta-
nheiros públicos, ou talvez também no feed vam aumentar sua popularidade por meio
de nossas redes sociais. de doações generosas, jogos de gladiadores
ou estabelecendo vínculos com as famílias
mais importantes, por exemplo, por meio
Cinco características das eleições de jantares opulentos.
romanas e suas implicações Uma vez no cargo, o eleito tinha pouco
em campanhas eleitorais tempo para mostrar suas habilidades de ges-
tão e sua generosidade. As eleições davam
As particularidades da campanha eleitoral ritmo à vida política cotidiana.
de Pansa estão relacionadas ao contexto po-
lítico e social em que as eleições ocorriam. 2. Eleições parcialmente livres
Aqui algumas características: e altamente injustas

1. Onipresença das eleições Cabe destacar que as eleições romanas se-


na vida pública guiam outros valores de liberdade e justiça
do que as eleições nas democracias liberais
As eleições na Roma antiga eram onipresen- modernas. Em Pompeia, apenas uma par-
tes, devido à anuidade dos cargos políticos. te da população, os homens com mais de 25
Cada ano os magistrados responsáveis pelas anos, com cidadania urbana, tinham direito
políticas públicas eram eleitos e conduziam- ao voto. O resto, mulheres, escravos, liber-
-se ferozes campanhas eleitorais nos meses tos, estrangeiros, estavam excluídos. Para
anteriores à votação. concorrer a um cargo político ainda havia

92 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


mais limitações jurídicas, como ter certa « [...] as eleições no
fortuna ou um domicílio na cidade.
É um fato interessante que nos cartazes mundo romano nunca
eleitorais apareciam mulheres e muitos es- eram somente um assunto
cravos libertos que mostravam seu apoio a político, mas sempre um
um candidato.
evento social relevante para
3. Um sistema eleitoral toda a comunidade.»
que favorecia a elite

Já o requisito de ter uma certa fortuna para atitude pragmática e não ideológica. As
concorrer a um cargo político limitava sig- alianças políticas e os grupos de seguidores
nificativamente o grupo de possíveis candi- não eram partidos políticos em um sentido
datos e favorecia as famílias abastadas. Para moderno. Tinham características de movi-
reforçar ainda mais esta vantagem, os filhos mentos sociais que se formavam ao redor de
dos membros do conselho, constituído por um político carismático. Se algo exigia uma
antigos titulares de cargos políticos, eram gestão política — por exemplo, regular os
convidados para as reuniões e tinham opor- preços dos grãos ou restaurar as termas —
tunidade de opinar em determinadas situa- era feito para aumentar a popularidade pes-
ções. Isto permitia-lhes serem conhecidos soal, não com base em algum programa po-
pelos chefes de família politicamente in- lítico.
fluentes e melhorar a sua posição frente aos
candidatos que tentavam concorrer por fora 5. Eleições como rituais religiosos
deste círculo. e eventos sociais

4. Um panorama político sem partidos O caráter exclusivo das eleições fazia com
políticos e sem programas eleitorais que o direito ao voto fosse um privilégio.
Exercer esse privilégio e participar das elei-
Para estabelecer vínculos com outras famí- ções criava identidade política: se como ci-
lias importantes, alguns candidatos se apre- dadão se ia votar, isso mostrava que se per-
sentavam com outros depois de formar uma tencia ao grupo dos livres — mais próximo
aliança política. Na última campanha eleito- dos mais privilegiados da sociedade, embora
ral de Pompeia, Pansa, por exemplo, concor- quase sempre fossem estes últimos que po-
reu junto com outro candidato — Lucio Po- diam se candidatar e ganhar.
pidio Secundo — para os dois cargos de edis. Outro aspecto que contribuía para for-
Isso pode ser observado em cartazes eleito- mar identidade coletiva era o contexto re-
rais em que se pedia para votar em ambos. ligioso em que se enquadravam as eleições.
Além disso, cartazes de um candidato são Uma sequência de rituais e sacrifícios no
vistos perto da casa do outro. início e no final de cada votação devia ga-
O discurso político, como se pode ver rantir a boa vontade dos deuses e, portanto,
nas fontes literárias ou na evidência epigrá- legitimar o resultado das eleições de forma
fica, é estruturalmente conservador; a men- religiosa. Desta forma, as eleições no mun-
talidade romana orientava-se para a tradi- do romano nunca eram somente um assun-
ção dos antepassados e para a manutenção to político, mas sempre um evento social re-
do status quo. As coisas eram mudadas com levante para toda a comunidade.

O QUE PODEMOS APRENDER COM AS CAMPANHAS ELEITORAIS NA ROMA ANTIGA? 93


Cinco lições das campanhas eleitorais quantidade possível de pessoas que estejam
na Antiguidade dispostas a dar seu nome para a minha cam-
panha. Tal como os seguidores que, nos car-
1. A preparação é tudo tazes eleitorais, pediam o voto para Caio
Cúspio Pansa como edil.
Como visto durante o percurso de Pansa, é
preciso pensar bem nos detalhes. Quem eu 5. Personalizar a campanha
quero alcançar e como posso me dirigir a
eles? Eu sei onde está meu grupo-alvo e quais Cada campanha é única e deve responder às
são suas necessidades? Isso não se faz pou- características do candidato e às suas neces-
cas semanas antes das eleições, senão é um sidades. Isso cria autenticidade e é a base de
trabalho contínuo de muito tempo antes de uma boa reputação.
concorrer ao cargo. Não se sabe se Caio Cúspio Pansa ganhou
as eleições em 79 d.C. em Pompeia. O que
2. Ampliar redes de seguidores sim sabemos é que, quase certamente, ele fez
em toda a população uma campanha baseada em sua boa reputa-
ção para garantir o maior número de votos
Conheço gente em todos os bairros, de dife- por meio de uma rede heterogênea de segui-
rentes grupos profissionais e de todas as clas- dores. Talvez isso nos possa servir como uma
ses sociais? É imprescindível ter pessoas do referência melhor para o presente.
meu bairro como seguidoras, mas não é o su-
ficiente para ganhar. Se quero ganhar, preci-
so mostrar minha boa reputação em todas as
partes da cidade. É o que mostra a distribui-
ção dos programmata em Pompeia.

3. Mobilizar as massas
com multiplicadores

Para chegar lá, preciso de multiplicadores.


Os que têm boa reputação, os que conhecem
o bairro e os que o povo segue. Entre eles en-
contram-se os aliados políticos, mas além
destes, preciso de outros tipos de multiplica-
dores, como líderes de bairro, porta-vozes de
associações profissionais e religiosas, donos
de lojas e negócios.

4. Nas redes sociais:


deixe os outros falarem

Se um seguidor fala bem de mim e deixa seu


nome em uma publicidade eleitoral, isso
conta mais do que minhas próprias apresen-
tações. É preciso se certificar de ter a maior

94 DIÁLOGO POLÍTICO 1 | 2022


Bibliografia Thomas Schaumberg
Doutor em História Antiga.
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O QUE PODEMOS APRENDER COM AS CAMPANHAS ELEITORAIS NA ROMA ANTIGA? 95

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